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■■ INTRODUÇÃO
O bom médico trata a doença, mas o ótimo médico trata a pessoa que tem a
doença. (Sir William Osler)
Ao final de recente aula sobre a “abordagem centrada na pessoa”,1 um aluno perguntou: “Professor, por
que ao invés de estudar essas ‘coisas todas’ e utilizá-las de forma sistematizada, como o Sr. falou, eu
não posso ir aprendendo, criando e improvisando conforme vou trabalhando e adquirindo experiência?”
A pergunta do aluno representa o que a maioria dos médicos ainda pensa sobre as habilidades
de comunicação e a respectiva adoção de um modelo de abordagem que efetivamente contemple
e atenda às necessidades das pessoas que buscam ajuda, ou seja, centrado na pessoa. Menos
de 10% dos médicos têm contato ou estudam habilidades de comunicação e técnicas de consulta
durante a graduação. Depois de formados, a grande maioria, mesmo reconhecendo a importância
da falta desse conhecimento, não pretende fazer nada para supri-la.2
A identificação com um modelo de prática da medicina fica apenas relacionada a valores familiares,
traços de personalidade, de experiências de vida e de influências de modelos internalizados a partir de
pessoas, professores, livros, filmes, entre outras influências. Embora sejam aspectos significativos,
que contribuem de forma positiva ou não para moldar o médico e sua atuação profissional, não são
suficientes para desenvolver uma abordagem centrada na pessoa. A abordagem às pessoas e aos
seus problemas de saúde não deve ser apenas intuitiva, deve ser técnica.
qualificada e centrada na pessoa. Então, necessita-se de um método que garanta que essa
abordagem ocorra de forma sistematizada.
O ensino clínico tradicional nas escolas médicas enfatiza uma abordagem centrada na doença e,
por conseguinte, centrada no médico.3 De acordo com esse modelo tradicional, o médico “acerta”
ou “identifica” as queixas dos doentes e busca informações que irão ajudá-lo a interpretar a
doença da pessoa de acordo com seu próprio arcabouço de referência: os conceitos que domina
e o conhecimento científico.
É necessário romper com a formação tradicional em que predomina uma preocupação explícita
com o “saber científico” sobre a doença (seu diagnóstico e tratamento), deixando de lado o “saber
sobre a pessoa-que-busca-ajuda” e a sua experiência com a doença. Para isso, é essencial
aprofundar o estudo, construindo ou apresentando instrumentos ou metodologias a serem
incorporados na bagagem tecnológica médica.4
Os conceitos utilizados na língua inglesa disease e illness1 não encontram uma correspondência
etimológica em português. Portanto, optou-se por utilizar “doença” para disease por se tratar de
tradução já consagrada, e “experiência com a doença” para illness.5,6
O termo “doença” é uma construção teórica ou abstrata pela qual o médico busca explicar
os problemas das pessoas em termos de anormalidades de estrutura e/ou funções
de órgãos do corpo e de sistemas, incluindo desordens físicas e mentais. Já o termo
“experiência com a doença” refere-se à experiência pessoal da pessoa com sua saúde.
O trabalho diagnóstico explica aquilo que cada indivíduo com uma doença tem em comum com todos
os outros com a mesma enfermidade, mas a experiência com a doença de cada pessoa é única.1,5,6
Um modo simples e objetivo de diferenciar os termos “doença” e “experiência com a doença”: doença
é o que está no papel, enquanto experiência com a doença é o que está na pessoa.
O tipo de abordagem a ser utilizado no cuidado das pessoas por parte do médico deve
levar em conta aspectos culturais, pessoais e o tipo de problema ou situação que levou a
pessoa a procurar auxílio. Isso significa que o modelo de abordagem deve ser adaptado
a esses aspectos, mas, independentemente do modelo utilizado para cada situação, o
médico e a equipe devem ter sempre como pano de fundo o modelo centrado na pessoa.
■■ ESQUEMA CONCEITUAL
Caso clínico
Intensificando a relação
médico-pessoa
Médico: Boa tarde, Paulo. Entre. Sua esposa pode aguardar na sala de espera. Se for
preciso, iremos chamá-la. Sente-se.
Médico: Vejo que faz tempo que não realiza exames... Você está usando a medicação
corretamente?
Médico: Vá até a mesa de exames, para que eu possa examiná-lo, verificar sua pressão,
escutar seu pulmão, coração...
Médico: Bem, vou lhe pedir alguns exames e fazer novamente algumas recomendações.
Médico: Ah, sim? Conte-me como é essa dor. É em aperto? Piora quando realiza algum esforço?
Paulo: A dor iniciou há alguns dias, após a falta de ar ter piorado. É constante, em todo
peito e não piora com o esforço.
Médico: Bem, provavelmente é uma dor muscular. Vou lhe receitar um anti-inflamatório
não hormonal e paracetamol, e vamos ver se melhora.
Médico: Olha, Paulo, já gastamos todo o tempo de consulta. Lembre-se de falar sobre
isso no início do próximo encontro.
A consulta se encerra com o médico orientando retorno em 15 a 20 dias para nova revisão.
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Resposta no final do artigo
de uma abordagem centrada na pessoa. O estudo Patient-Centered Care and Outcomes,1 que analisou
consultas, mostra que 89% dos adultos expressam ideias sobre seus problemas; 72% expressam
expectativas sobre seu cuidado; 57% expressam problemas relacionados à função; 55% expressam
questões de família, ciclo de vida ou contexto e 42% expressam preocupações, medos ou raiva.
A percepção, por parte de quem é atendido, dos componentes da abordagem centrada na pessoa
pode ser medida com segurança e predizer diferentes resultados, de acordo com esses estudos.3
Se os médicos não proporcionam essa abordagem, a pessoa vai sentir-se menos satisfeita, menos
capaz e pode ter seus problemas agravados e com altas taxas de referência.
O MFC, para alcançar uma atuação de acordo com os princípios fundamentais que regem
essa especialidade, deve utilizar a abordagem centrada na pessoa como modelo para garantir
uma abordagem integral dos problemas de saúde das pessoas. Os princípios relacionados no
Quadro 11 são considerados fundamentais, pois, a partir deles, outros princípios ou objetivos
podem ser desenvolvidos na prática do MFC.
Quadro 1
■■ cuidado;
■■ pessoa;
■■ modelos de abordagem médica;
■■ tecnologia na medicina;
■■ processo de trabalho em saúde;
■■ prática médica;
■■ consulta;
■■ processo de cuidar.
ATIVIDADE
I – O termo “doença” é uma construção teórica ou abstrata pela qual o médico busca
explicar os problemas das pessoas em termos de anormalidades de estrutura e/ou
funções de órgãos do corpo e de sistemas, incluindo desordens físicas e mentais.
II – O termo “experiência com a doença” refere-se à experiência pessoal da pessoa
com sua saúde.
III – O trabalho diagnóstico explica aquilo que cada indivíduo com uma doença tem em
comum com todos os outros que também sofrem da mesma enfermidade, mas a
experiência com a doença de cada pessoa é única.
A) Apenas a I e a II.
B) Apenas a I e a III.
C) Apenas a II e a III.
D) A I, a II e a III.
Resposta no final do artigo
A) Apenas a I e a II.
B) Apenas a I.
C) Apenas a I e a III.
D) A I, a II e a III.
Resposta no final do artigo
Esse ceticismo é denominado terapêutica niilista, que vem do vocábulo niilismo, significando
rejeição às crenças existentes. No caso da medicina, rejeição a todos os tipos de tratamentos
empíricos empregados na época.
A terapêutica niilista negou por completo, desacreditou os tratamentos empíricos propostos até
então. Os niilistas tiveram, na segunda metade do século XIX, poder e influência na medicina
acadêmica, “[...] ensinando a gerações de estudantes médicos que a real função da medicina
era acumular informações científicas sobre o corpo humano, mais do que curar”.12 O niilismo
terapêutico teve início em grandes centros médicos europeus por volta de 1840. Dietl12 disse:
A medicina como uma ciência natural não pode ter a tarefa de inventar panaceias
e descobrir cura milagrosa que enxote a morte, mas, em vez disso, deve ter de
descobrir as condições sob as quais as pessoas adoecem, melhoram e perecem
em um mundo dependente de uma doutrina na qual a condição humana está
baseada cientificamente sobre o estudo da natureza, da física e da química.
LEMBRAR
A ideia de ver o paciente como pessoa não é recente. Surgiu como doutrina no ano
de 1880 e estendeu-se até a Segunda Guerra Mundial, fazendo surgir o “médico
de cabeceira”, em contraponto ao movimento niilista (1841) que dominava as
academias médicas.
A ideia está bem representada por G. Ganby Robinson13, em seu livro “The Patient as a Person
– A study of the social aspects of illness”, com a primeira edição publicada em maio de 1939. Na
obra, o autor relata estudos de casos considerando as doenças não só clinicamente, mas também
sob seus aspectos biopsicossociais. É um trabalho interessante, no qual foram estudados 174
pacientes admitidos no Hospital Johns Hopkins com diversas patologias. Robinson13 talvez tenha
sido um dos primeiros a buscar explicitar a diferença entre “doença” e “experiência com a doença”,
e suas repercussões na prestação do cuidado médico.
Unidos e Canadá e concluiu que, das 155 faculdades de medicina existentes, 120 apresentavam
condições péssimas de funcionamento. O relatório de Flexner, “Medical Education in the United
States and Canada”, teve o efeito de um terremoto, e, nos anos seguintes, a quase totalidade das
instituições por ele criticadas fechou suas portas. O modelo proposto por Abraham Flexner foi
amplamente difundido pelo mundo, contando para isso com apoio da Fundação Rockefeller, da
qual um irmão de Flexner era diretor.
Com a supremacia do modelo proposto por Abraham Flexner, a partir de 1910, houve uma maior
valorização de hospitais e da tecnologia, considerados suficientes para resolver os problemas de
saúde, deixando-se de lado outros instrumentos da prática médica e a visão do paciente como
pessoa. Mas, afinal, como a medicina, como o médico vê a pessoa? Qual o uso prático que
o médico faz desse conceito? Qual sua repercussão na relação médico-pessoa quando se
refere aos seres humanos que se atende e nomeia pacientes?
Paciente é um papel a ser assumido pela pessoa quando está doente. A definição de paciente
traz nela implícita a definição de como deve se comportar uma pessoa que está doente.
Parece que existe um consenso sobre o paciente e seu papel no processo de cuidar da saúde.
Inclusive os textos médicos que tratam das estratégias para aumentar a adesão das pessoas
aos tratamentos e a sua colaboração com eles ressaltam a relação médico-paciente como
fundamental, definindo inclusive papéis e tarefas pertinentes a cada um desses personagens.
Tais textos, porém, preocupam-se com o paciente sempre como alguém sofredor de uma ação,
por exemplo, a prescrição, e com os fatores que interferem na adesão do paciente ao tratamento.
Mesmo Stewart,1 que propõe uma nova abordagem da pessoa-que-busca-ajuda, vendo o
paciente como pessoa inteira, intitulou seu livro de “Medicina centrada no paciente”.6
LEMBRAR
Na definição de paciente relacionada à saúde,11 aparece o uso do vocábulo pessoa,
portanto “paciente” pressupõe “pessoa doente”, sem que com isso ela perca “[...]
independência, livre-arbítrio, ação de acordo com sua vontade e respeito aos
preceitos éticos”.
Ao longo do tempo, foram desenvolvidas diversas estruturas teóricas que podem ajudar os
médicos a entender o desenvolvimento individual das pessoas sob seus cuidados e proporcionar
explicações e previsões sobre seu comportamento.
A pessoa que vai à consulta é pai, mãe, filho, avô e tem uma história a ser narrada, com certas
circunstâncias presentes e com uma expectativa de futuro. Tem relações, obrigações e uma
organização de vida que pode ser saudável ou não.
Uma personalidade saudável define-se por um sólido sentido de si mesma, autoestima positiva,
posição de independência e autonomia emparelhadas com a capacidade de relacionar-se e de ter
intimidade. Cada etapa do desenvolvimento vital tem suas próprias tarefas evolutivas e papéis a
cumprir, assim como riscos biológicos e psicossociais.
O contexto da pessoa doente inclui sua família, amigos, trabalho, religião, escola e
recursos de saúde. O reconhecimento desse contexto permite que o médico não veja os
problemas de saúde como eventos isolados, mas, sim, como uma resposta a, ou inseridos
em, crises vitais, estresse, hábitos inadequados, disfunção familiar, entre outros.
LEMBRAR
No ciclo de vida da pessoa, deve-se considerar o desenvolvimento da própria
personalidade, bem como os vários estágios de desenvolvimento da família e suas
repercussões frente à doença.
Para tornar efetiva a sua atuação, o médico (bem como qualquer outro profissional da saúde)
necessita utilizar um método de abordagem dos problemas de saúde que de fato promova
um cuidado eficaz o suficiente para gerar mudanças. Isso só é possível com a participação
corresponsável e intercessora da pessoa doente, estabelecendo as trocas na relação do
profissional com a pessoa.
O vocábulo “médico” deriva do substantivo medicus, que, por sua vez, provém do verbo
mederi, cujo significado primário é pensar. Ou seja, na língua latina, confere-se ao médico,
antes de tudo, o atributo de pensador, e o pensamento por ele acionado é o ponto de partida
para a cura do paciente. A propósito, a etimologia de médico (mederi = pensar) explica um
sentido, hoje menos empregado na língua portuguesa, do verbo “pensar”, sentido esse de
curar ou tratar um ferimento. É interessante também observar que, no mesmo contexto
da prática terapêutica, o verbo mederi se relaciona com o verbo latino meditari, origem da
palavra meditar, que significa refletir, a fim de curar. (Simão de Miranda)
O método clínico centrado no paciente1 traz uma proposta de abordagem que considera o paciente
como uma pessoa, sugerindo mudanças na concepção do “clinicar”, com o médico dando poder ao
paciente e renunciando ao controle tradicional. Segundo Lown,14 em “A Arte Perdida de Curar”, o
médico e a pessoa devem “[...] tornar-se sócios, parceiros, e, para que haja parceria em medicina, o
sócio principal tem que ser o paciente, que não deve ser impedido de pronunciar a palavra decisiva,
a última palavra”. Considerando esse pensamento e a proposta do método clínico centrado no
paciente, o método deveria ser denominado método clínico de abordagem centrado na pessoa.6
A partir das reflexões feitas, talvez o caminho seja mudar o slogan de ver o paciente
como pessoa para ver a pessoa como paciente, pois a condição de doente é um dos
papéis que alguém assume sem deixar de lado os demais.
Desse momento em diante, irá deixar-se de usar o termo “paciente”, exceto em citações ou
reproduções, substituindo-o por pessoa. Busca-se, assim, causar a ruptura necessária com
uma abordagem médica voltada ao cuidado em seu sentido mais amplo, pois o termo “pessoa”
é autoexplicativo. Ele define a relação entre os profissionais e os doentes como uma relação
entre pessoas, envolvendo todos os aspectos que aproximam, afastam, facilitam e dificultam as
relações pessoais, considerando todos os contextos existentes.
LEMBRAR
A concepção de paciente como pessoa surgiu em 1880, mas foi Balint quem,
em 1970, trouxe o termo “medicina centrada no paciente” para contrastar com
“medicina centrada na doença”. Desde então, vários autores contribuíram para o
aperfeiçoamento do conceito.1
Em 1981-1982, o Dr. Joseph Levenstein chegou ao Canadá como professor visitante de medicina
de família, vindo da África do Sul, para estimular o grupo de Toronto e compartilhar seu método
clínico centrado no paciente.
A pergunta da aluna foi motivada pelo fato de a abordagem do Dr. Levenstein ser diferente do que a
aluna havia observado até então no hospital, de modo que ela não conseguia reconhecer nenhum
padrão na técnica que ele usava.1 Ele explicou que o que fazia era baseado no seu conhecimento
prévio de cada pessoa, em saber a frequência das diferentes doenças na comunidade e no valor que
ele colocava na continuidade, no cuidado abrangente, na prevenção e na relação médico-pessoa.
O Dr. Levenstein encontrou, nas gravações, intervenções efetivas e não efetivas. Identificou
que as consultas nas quais percebeu as queixas e expectativas sobre a visita foram bem, mas
quando ele esqueceu ou não percebeu as “dicas” da pessoa sobre “sua agenda”, ou seja, quais
as verdadeiras razões ou objetivos pelos quais a pessoa o tinha procurado, a consulta foi menos
efetiva. Estava ali alguma coisa que poderia ser ensinada.
Em vez de motivar seus estudantes a terem mais cuidado, deixando-os confusos e ofendidos,
Joseph Levenstein pôde guiá-los para escutar as “dicas” das pessoas sobre suas queixas,
medos e expectativas e sobre por que elas procuravam o médico naquele momento particular.
Os fatores dessa abordagem foram a base para o denominado método centrado no paciente
(patient-centered method). Dr. Levenstein aprimorou seu entendimento do método na Western
Ontário University e ensinou-o a estudantes de medicina e residentes em medicina de família com
resultados encorajadores.
Dr. Levenstein ensinou o modelo em forma de curso e colaborou em pesquisas para medir o
impacto do método no cuidado das pessoas e no ensino médico. O método foi utilizado e
apresentado desde então em numerosos seminários, em diversos países do mundo. O feedback
dos participantes tem sido considerado para o aperfeiçoamento do método.
Existem alguns mitos sobre a abordagem centrada na pessoa que devem ser desfeitos. Por exemplo:
A) É muito recente.
B) Surgiu como doutrina no ano de 1980.
C) Fez surgir o “médico de cabeceira”.
D) Surgiu como consequência do movimento niilista (1841) que dominava as
academias médicas.
Resposta no final do artigo
I – O paciente não é um papel a ser assumido pela pessoa quando está doente.
II – Paciente não define como deve se comportar uma pessoa que está doente.
III – A definição de paciente reforça os aspectos volitivos, a autonomia da pessoa,
determina um comportamento, transforma a pessoa em um indivíduo.
IV – A definição se contrapõe à própria definição de pessoa, dentro da abordagem dos
problemas de saúde da pessoa-que-busca-ajuda e na participação que se espera
dela no cuidado à sua saúde
A) Apenas a I, a II e a III.
B) Apenas a II.
C) Apenas a IV.
D) A II, a III e a IV.
Resposta no final do artigo
10. Em relação à ideia de ver a pessoa como paciente, analise as afirmativas a seguir.
A) Apenas a I e a II.
B) Apenas a I e a III.
C) Apenas a II e a III.
D) A I, a II e a III.
Resposta no final do artigo
A partir desse primeiro componente da abordagem centrada na pessoa os médicos verão além
da doença, explorando a experiência com a doença das pessoas atendidas e suas concepções a
respeito de “ter saúde”.
LEMBRAR
O primeiro componente da abordagem centrada na pessoa, “explorando saúde,
doença e experiência da pessoa com a doença”, envolve o entendimento pelo
médico de três conceitos relacionados às pessoas: saúde, doença e experiência
com a doença. Esses conceitos são fundamentais para definir o locus da atenção
dispensada à pessoa acometida por uma patologia.
A prestação de um cuidado efetivo requer assistência tanto para a experiência da pessoa com a
doença quanto para sua doença. O método médico convencional identifica a doença, mas o
entendimento da experiência com a doença requer uma abordagem adicional.
A abordagem centrada na pessoa tem foco na saúde, na doença e nas quatro principais
dimensões da experiência da pessoa com a doença:
O acréscimo do conceito de saúde e sua representação para cada pessoa são um diferencial
na terceira edição do método clínico centrado no paciente.1 O método clínico centrado no paciente
(MCCP) considera que os médicos devem ter presente que a definição de saúde é única para
cada pessoa, e envolve não somente a ausência de doença como também o significado de saúde
para a pessoa e sua habilidade de realizar suas aspirações, objetivos e propósitos em sua vida.
LEMBRAR
Deve-se perguntar à pessoa que busca atendimento “O que a palavra ‘saúde’
significa ou representa em sua vida?”, e essa questão deve ser adaptada à cultura e à
individualidade de cada pessoa. Com isso, vão revelar-se dimensões desconhecidas
da vida da pessoa para o médico, promovendo o conhecimento da pessoa.
Pessoas muito doentes ou com multimorbidades podem ter suas aspirações sobre a saúde
exploradas em questões como, por exemplo, “O que realmente está preocupando você de tudo isso?
Existem coisas que você sente que são muito importantes, que você quer fazer agora? Coisas que
você fez ou que você começou e com as quais você teria uma sensação de bem-estar?”
LEMBRAR
Buscar um entendimento terapêutico da “experiência da pessoa com a doença”
requer habilidade do médico ao entrevistar, obtendo informações que o capacitem a
“entrar no mundo de quem busca ajuda”. Um exemplo de que isso não foi alcançado
no decorrer da consulta é o “comentário da maçaneta” (quando a pessoa, ao final da
consulta, diz algo como: “Ah! Doutor, tem mais uma coisa que eu ia esquecendo...”),
significando que o médico perdeu as dicas inicias ou que a pessoa finalmente reuniu
coragem para falar de um assunto difícil antes que fosse tarde.
A experiência com a doença tem apresentações diversas. Pessoas com a mesma doença podem
apresentar sofrimento e repercussões em sua função diferentes, pois a doença de cada pessoa é única.
Por vezes, pessoas com uma doença assintomática não se sentem doentes e
não aceitam ajuda ou não seguem o tratamento. Por outro lado, há pessoas que,
preocupadas com a possibilidade de ter algum problema, podem sentir-se doentes
sem ter doença alguma e buscam realizar exames ou mesmo tratamentos. Em
função desses dois aspectos, pessoas e médicos que reconhecem essas situações,
que conseguem ver a diferença e perceber o quanto isso é comum, estão menos
propensos a buscar desnecessariamente por uma patologia.1,5
Mesmo quando a doença está presente, a doença pode não explicar de modo adequado o
sofrimento, uma vez que a quantidade de aflição que a pessoa experimenta refere-se não só
à quantidade de dano tecidual, mas ao significado pessoal da experiência com a doença. Por
isso, dentro de uma abordagem centrada na pessoa, o médico deve obter de quem está doente a
resposta para estas perguntas:
A partir das respostas às perguntas anteriores, serão evitadas as interações típicas centradas
no médico, nas quais o médico tem como primeira tarefa fazer o diagnóstico, em geral não
ouvindo a pessoa sobre suas próprias tentativas de dar sentido ao seu sofrimento.
É necessária uma abordagem na qual o médico dê prioridade para a pessoa expor seu modo de
vida como base para entender, diagnosticar e tratar os problemas. Ao mesmo tempo, o profissional
deve realizar uma abordagem detalhada das queixas, sinais e sintomas, dentro da melhor técnica.
Pode-se dizer que as razões para uma pessoa ir ao médico costumam ser mais importantes
do que o diagnóstico, o qual frequentemente é óbvio ou já é conhecido por contatos anteriores.
A razão pode estar vinculada aos estágios que representam a experiência com a doença:
preocupação, desorganização, reorganização, e aos quais se deve estar atento.
Para compreender a experiência com a doença, é fundamental o médico estar atento às “dicas e
movimentos” durante a consulta, que geralmente a pessoa manifesta sobre as razões pelas quais
está indo ao médico naquele momento. Tais sinais podem ser verbais ou não verbais e podem
ser representados por expressões, sentimentos, gestos para entender ou explicar sintomas,
dicas que enfatizam preocupações particulares da pessoa, histórias pessoais que relacionam
a pessoa com condições médicas ou de risco, comportamento sugestivo de preocupações não
resolvidas ou expectativas.
LEMBRAR
Uma consulta pode ter um bom início com perguntas abertas, como:
nos primeiros três a cinco segundos da consulta, assim se consegue criar vínculo. Deixando a
pessoa falar sem interrupções por cerca de dois minutos, obtém-se a maior parte das informações
necessárias (cerca de 90%) para manejar o problema.
Depois, pode-se complementar os dados obtidos nos momentos iniciais com as perguntas
objetivas que forem necessárias, sem que se esqueça de avaliar as quatro dimensões da
experiência com a doença: sentimentos, ideias da pessoa sobre o que está errado com ela,
efeito da doença sobre o funcionamento da pessoa e suas expectativas com relação ao médico.
LEMBRAR
A narrativa da experiência com a doença por parte da pessoa, recontando sua
história de doença, é importante, pois expandir o foco da entrevista da doença para
incluir a experiência da pessoa sobre o adoecer pode levar a um resultado rico,
mais significativo e produtivo para todos; mas isso em geral não acontece, pois os
médicos interrompem as pessoas precocemente na consulta e suas histórias não
são narradas, o que representa uma falha no tão necessário “ir e vir”.
Esse conhecimento sobre quem é a pessoa que está sendo atendida vai além de diagnosticar
a doença e assistir à resposta à doença. O médico começa a conhecer a pessoa inteira e a sua
experiência com a doença em um determinado contexto de vida e estágio de desenvolvimento
pessoal. Muitas vezes, essas informações são obtidas antes mesmo de a pessoa adoecer.
O conhecimento da pessoa inclui família, trabalho, crenças e lutas nas várias crises do ciclo vital.
Doenças graves em um membro da família reverberam por todo o sistema familiar. Um médico que
entende a “pessoa inteira” pode reconhecer o impacto que a família exerce em melhorar, agravar
ou mesmo causar doenças em seus membros.
As crenças culturais e atitudes da pessoa também influenciam o cuidado. O uso desse segundo
componente pode auxiliar o médico a aumentar sua interação com a pessoa em períodos específicos.
LEMBRAR
Para conhecer a “pessoa inteira”, é necessário compreender o desenvolvimento
individual, saber o que é um desenvolvimento saudável (ter sentido do eu – self –,
possuir autoestima positiva, ter independência e autonomia, capacidade de relacionar-
se e ter intimidade) e saber, também, que a formação da personalidade surge como
resultado do modo como cada fase do desenvolvimento acontece e é negociada.
É fundamental, ainda, ter consciência de que as fases do desenvolvimento afetam a vida das
pessoas. Para isso, é preciso saber a posição em que a pessoa se encontra no ciclo de vida, as
tarefas que ela assume e o(s) papel(is) que desempenha. Tudo isso influencia o cuidado que a
pessoa busca e também aquele que presta o cuidado.
doença é uma entidade específica, com uma existência separada de quem a sofre. Eles permitem,
também, que o médico parta para uma visão ampliada – na qual o importante é entender os múltiplos
fatores e suas relações na causa da experiência com a doença, que é pessoal e subjetiva – fazendo
o diagnóstico da pessoa (os sentimentos, pensamentos, alterações nas atividades de alguém que se
sente doente) e instituindo uma abordagem terapêutica multifatorial e interdisciplinar.1,6
ATIVIDADE
A) 1–2–4–3
B) 2–1–4–3
C) 2–1–3–4
D) 3–1–4–2
Resposta no final do artigo
A) V–F–V–F
B) F–V–F–V
C) V–F–F–V
D) F–V–V–F
Resposta no final do artigo
14. Mesmo quando a doença está presente, ela pode não explicar de modo adequado
____________________, uma vez que a quantidade de aflição que a pessoa
experimenta se refere não só à quantidade de dano tecidual, mas ao significado
pessoal ________________________________. Assinale a alternativa cujos termos
preenchem corretamente as lacunas da frase.
A) o sofrimento – da doença.
B) o diagnóstico – da experiência com a doença.
C) o diagnóstico – da doença.
D) o sofrimento – da experiência com a doença.
Resposta no final do artigo
15. Com relação à utilização da abordagem centrada na pessoa, é INCORRETO afirmar que
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Resposta no final do artigo
Desenvolver um plano efetivo de manejo requer do médico e da pessoa a busca por uma
concordância em três áreas principais:
Em geral, médicos e pessoas doentes têm grandes divergências em cada uma dessas três áreas. O
processo de encontrar uma solução satisfatória envolve não só barganha e negociação, mas um
movimento em direção a um encontro de opiniões ou de um terreno comum. Essa estrutura
chama a atenção do médico para incorporar ideias, sentimentos, expectativas e preocupações da
pessoa ao planejar intervenções. Para isso, serve como ajuda responder às seguintes questões:
Também se deve levar em conta que as pessoas costumam formular uma hipótese sobre o que
têm antes de se apresentarem ao médico. Assim, cabe ao profissional explicar o problema e o
manejo recomendado de forma consistente com o ponto de vista da pessoa e que faça sentido nas
palavras dela, de forma que ela entenda e concorde com as recomendações.
As dificuldades de manejo surgem quando o médico e a pessoa têm ideias diferentes sobre o
problema. Por exemplo, o médico diagnostica hipertensão arterial sistêmica, mas a pessoa atribui
os níveis tensionais elevados ao fato de estar apressada ou trabalhando muito. Nesse processo
de entendimento e definição do problema, o médico deve evitar jargões e termos científicos e
estimular a pessoa a perguntar.
É importante ter cuidado para definir em que momento determinar o manejo. Para isso,
algumas questões devem ser observadas:
LEMBRAR
Habitualmente, aquilo que os médicos definem como “não adesão” pode ser a
expressão da discordância sobre os objetivos do tratamento. Quando caminhos ou
opções diversas são igualmente efetivos, em geral não existem dilemas no processo
de estabelecimento do manejo por parte do médico; os dilemas surgem quando a
escolha da pessoa recai sobre um tratamento que o médico considera menos eficaz
ou mesmo inadequado.
Pode-se dizer que costumam ocorrer problemas na definição dos papéis entre o médico e a
pessoa quando
■■ a pessoa está buscando por uma autoridade médica que lhe diga o que está errado e o que
ela deve fazer; o médico, por outro lado, deseja uma relação mais igualitária, na qual ele e a
pessoa compartilhem a tomada de decisão;
■■ a pessoa deseja uma profunda e significativa relação com uma figura parental que faça por ela
o que os próprios pais não fizeram; o médico, por sua vez, deseja ser um cientista biomédico
que possa aplicar as descobertas da medicina moderna aos problemas das pessoas;
■■ a pessoa busca apenas assistência técnica do médico; o médico, entretanto, aprecia uma
abordagem holística e deseja conhecer o paciente como pessoa.
Para prestar um cuidado centrado na pessoa, deve-se estar atento a aspectos culturais,
ao tipo de problema e ao perfil da pessoa, e também ser flexível com relação à
abordagem que a pessoa busca ou de que necessita. O grau de participação da pessoa
na tomada de decisão irá variar, dependendo de suas capacidades emocionais e físicas.
O médico deve adaptar-se.
LEMBRAR
Outro aspecto importante a ser levado em conta, principalmente no trabalho em
equipe, é que, quando a pessoa está recebendo cuidado de múltiplos profissionais
de saúde, ela assume diferentes papéis e relacionamentos com cada um desses
profissionais.
Ao final, o médico deve sumarizar, para confirmar o entendimento, o plano e os papéis. Quando as
divergências são grandes, pode-se utilizar uma grade5,6 e preenchê-la conjuntamente, pois essa
visualização permite um trabalho melhor na busca do manejo conjunto.
Quando voltou, contou. Disse que tinha contemplado, lá do alto, a vida humana. E
disse que somos um mar de fogueirinhas.
Cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Não existem duas
fogueiras iguais. Existem fogueiras grandes e fogueiras pequenas e fogueiras
de todas as cores. Existe gente de fogo sereno, que nem percebe o vento, e
gente de fogo louco, que enche o ar de chispas. Alguns fogos, fogos bobos, não
alumiam nem queimam; mas outros incendeiam a vida com tamanha vontade que
é impossível olhar para eles sem pestanejar, e quem chegar perto pega fogo.
As descrições das diferentes visões das “gentes” e seus “fogos” resumem, de certo modo, o que foi
dito até agora sobre pessoa e sobre como o médico deve encarar a relação com os doentes, além de
introduzirem dois aspectos da Teoria da Resiliência. O primeiro se refere à potencialidade de cada
pessoa para desenvolver-se, e o segundo traz a ideia da diversidade, da diferença entre as pessoas.
O vocábulo “resiliência” tem sua origem no latim, do termo resilio, que significa voltar atrás, voltar
de um salto, ressaltar, rebotar. O termo foi adaptado para as ciências sociais para caracterizar
aquelas pessoas que, apesar de passarem por situações de grande risco ou estresse, se
desenvolvem psicologicamente sãs e vitoriosas.20 Em física e em engenharia, utiliza-se o
termo para a capacidade de certos metais de retornar à sua forma original mesmo depois de
submetidos à força ou pressão que os deforme.
O médico, ao prestar cuidado, deve agir em uma variedade de modos para alcançar as diferentes
necessidades de quem busca ajuda, “caminhando com” a pessoa e colocando a si mesmo e seu
relacionamento a trabalharem para mobilizar as forças da pessoa com propósitos curativos. Para
isso, o médico deve ter conhecimento sobre:
■■ focalizando antes de iniciar o atendimento, tendo consciência de que está pronto para iniciar a
consulta e dedicar atenção sem disputas à pessoa que vai atender;
■■ estabelecendo uma conexão com a pessoa pelo desenvolvimento de rapport (harmonia) e um
acordo sobre as agendas de cada um;
■■ avaliando a resposta da pessoa à doença e ao sofrimento;
■■ comunicando-se com a pessoa de uma forma que promova o cuidado;
■■ usando o poder do toque, ao cumprimentar e ao examinar;
■■ utilizando o riso e o sorriso, de forma adequada e somente quando sentir-se seguro e
confortável para isso;
■■ mostrando postura empática por meio de escuta ativa, gestos, expressões e frases.
Outro aspecto que atualmente tem conexão direta com a relação médico-pessoa está relacionado
com o princípio primum nom nocere, com o qual o profissional se defronta intensamente diante
do arsenal tecnológico e das demandas trazidas pelas pessoas. Para exercer esse princípio,
deve conjugar a medicina baseada em evidências e a medicina centrada na pessoa. Para isso,
é importante conhecimento e adequada utilização dos conceitos de prevenção quaternária,
sobrediagnóstico, sobretratamento e segurança do paciente.
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Resposta no final do artigo
18. Reescreva a consulta do caso clínico 1, incluindo os diálogos, partindo de uma análise
crítica do que faltou segundo cada componente da abordagem centrada na pessoa.
Após, compare com o modelo proposto pelo autor que se encontra nas respostas ao
final do artigo.
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Resposta no final do artigo
19. Qual dos itens NÃO representa o componente “elaborando um projeto comum ao
médico e à pessoa para manejar os problemas”?
20. Qual deve ser a conduta do médico ao perceber que o doente diverge nas decisões
do tratamento?
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Resposta no final do artigo
problemas de saúde?
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Resposta no final do artigo
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Resposta no final do artigo
■■ CONCLUSÃO
A prestação do cuidado à saúde na sociedade atual está caracterizada pela busca de uma
integração entre a medicina baseada em evidências e a medicina centrada na pessoa, com
situações complexas que abrangem o despreparo dos médicos para cuidar e proporcionar
confiança às pessoas, os danos provocados por remédios ou tratamentos que deveriam curar, a
realização de cirurgias e de exames caros e desnecessários e o risco que esses aspectos trazem.
A implementação de um método de abordagem que privilegie a pessoa e sua autonomia na busca
de um cuidado significativo passa por fazer uma consulta que permita uma visão caleidoscópica
de quem está sendo atendido.
Na maioria das vezes, o motivo apresentado pela pessoa leva a um diagnóstico óbvio, sendo
de alta importância conhecer e entender as razões que a levaram ao médico e suas relações na
causa ou agravamento da doença. Isso somente será alcançado se for olhado para quem busca
ajuda de diversos ângulos, fazendo um diagnóstico da pessoa. Apesar de parecer simples e
óbvio, esse é o desafio que tem acompanhado o médico ao longo do tempo, e é essencial para
que se possa realizar uma intervenção terapêutica multifatorial e interdisciplinar.
O método clínico de abordagem centrado na pessoa tem sido usado não apenas para melhorar
o cuidado médico, mas também no ensino médico. Um ensino médico centrado no aluno é uma
maneira de proporcionar aos estudantes de medicina uma formação mais adequada às suas
necessidades de aprendizagem.
Também já se observa sua utilização por outras áreas da saúde, como fisioterapia, enfermagem,
odontologia, farmácia e nutrição. Isso demonstra a validade e a eficácia da aplicação desse método.
Atividade 2
Resposta: D
Comentário: Um modo simples e objetivo de diferenciar os termos “doença” e “experiência com a
doença”: doença é o que está no papel, enquanto “experiência com a doença” é o que está na pessoa.
Atividade 3
Resposta: B
Comentário: O ensino clínico tradicional nas escolas médicas enfatiza uma abordagem centrada na
doença e, por conseguinte, centrada no médico. De acordo com esse modelo tradicional, o médico
“acerta” ou “identifica” as queixas dos doentes e busca informações que irão ajudá-lo a interpretar a
doença da pessoa de acordo com seu próprio arcabouço de referência: os conceitos que possui e
o conhecimento científico. É necessário romper com essa formação tradicional em que predomina
uma preocupação explícita com o “saber científico” sobre a doença (seu diagnóstico e tratamentos),
deixando de lado o “saber sobre a pessoa-que-busca-ajuda” e a sua experiência com a doença.
Resposta: C
Comentário: Uma atuação centrada na pessoa, se comparada aos modelos tradicionais, apresenta
resultados mais positivos, tais como:
Atividade 5
Resposta: B
Comentário: Apesar de muitos médicos confundirem as duas práticas, “ver a pessoa como um
todo” não é o mesmo que uma abordagem centrada na pessoa. A medicina de família é influen-
ciada por fatores da comunidade, e o tipo de abordagem a ser utilizado pelo MFC no cuidado das
pessoas deve levar em conta aspectos culturais, pessoais e o tipo de problema ou situação que
levou a pessoa a procurar auxílio. Estudos demonstram que o método de abordagem centrado na
pessoa aumenta a satisfação de pacientes e médicos.
Atividade 6
Resposta: B
Comentário: A terapêutica niilista negou por completo, desacreditou os tratamentos empíricos
propostos até o século XIX. Os niilistas tiveram, na segunda metade do século XIX, poder e
influência na medicina acadêmica, “[...] ensinando a gerações de estudantes médicos que a
real função da medicina era acumular informações científicas sobre o corpo humano, mais do
que curar”.12 O niilismo terapêutico teve início em grandes centros médicos europeus por volta
de 1840. Dietl12 disse: “A medicina como uma ciência natural não pode ter a tarefa de inventar
panaceias e descobrir cura milagrosa que enxote a morte [...]”.
Atividade 7
Resposta: C
Comentário: A ideia de ver o paciente como pessoa não é recente. Surgiu como doutrina no ano
de 1880 e estendeu-se até a Segunda Guerra Mundial, fazendo surgir o “médico de cabeceira”, em
contraponto ao movimento niilista (1841) que dominava as academias médicas.
Atividade 8
Resposta: C
Comentário: O paciente é um papel a ser assumido pela pessoa quando está doente, portanto
o uso do termo “paciente” define como deve se comportar uma pessoa que está doente. Mas a
definição de paciente retira os aspectos volitivos, a autonomia da pessoa, determina um compor-
tamento, transforma a pessoa em um indivíduo e se contrapõe à própria definição de pessoa,
dentro da abordagem dos problemas de saúde da pessoa-que-busca-ajuda e na participação que
se espera dela no cuidado à sua saúde.6
Atividade 10
Resposta: C
Comentário: As afirmativas II e III estão corretas. A afirmativa I está incorreta, pois talvez o caminho
seja mudar o slogan de ver o paciente como pessoa para ver a pessoa como paciente, pois a
condição de doente é um dos papéis que alguém assume sem deixar de lado os demais.
Atividade 11
Resposta: B
Comentário: Ver Quadro 2.
COMPONENTES DA ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA
■■ Explorando a saúde, a doença e a experiência com a doença
•• representação da saúde para cada pessoa;
•• história, exame clínico, laboratório;
•• dimensão da doença (illness) – sentimentos, ideias, efeitos na função, expectativas.
Atividade 12
Resposta: B
Comentário: O primeiro componente da abordagem centrada na pessoa envolve o entendimento
pelo médico de três conceitos relacionados às pessoas: saúde, doença e experiência com a doença.
Resposta: C
Comentário: As afirmativas I e IV são verdadeiras. A II é falsa, pois a história de uma experiência
com a doença – a história da pessoa – tem dois protagonistas: o corpo/mente e a pessoa. A III é
falsa, pois por meio de um questionamento cuidadoso é possível separar os fatos que falam de um
funcionamento corporal disfuncional da patofisiologia que leva ao diagnóstico.
Atividade 14
Resposta: D
Comentário: Mesmo quando a doença está presente, ela pode não explicar de modo adequado
o sofrimento, uma vez que a quantidade de aflição que a pessoa experimenta refere-se não só à
quantidade de dano tecidual, mas ao significado pessoal da experiência com a doença.
Atividade 15
Resposta: A
Comentário: A abordagem centrada na pessoa deve ser utilizada num “ir e vir” constante entre os
seus componentes, sem necessidade de uma sequência rígida, exigindo do médico desenvolver
habilidade nesse sentido, bem como identificar o momento mais adequado para cada intervenção.
Alguns dos mitos associados à abordagem centrada na pessoa é o de que ela toma mais tempo,
mas estudos mostram que a abordagem centrada na pessoa pode ser implementada em consultas
com duração média variando entre 13 e 15 minutos. Embora existam evidências de que uma
atuação centrada na pessoa, se comparada aos modelos tradicionais, apresenta resultados mais
positivos, algumas pessoas, porém, principalmente as idosas, ainda mantêm valores tradicionais
e preferem uma abordagem centrada no médico, geralmente expressa por frases como “o doutor
sempre sabe mais” ou “o senhor decide”. Essa posição deve ser respeitada.
Atividade 16
Resposta: O genograma permite identificar doenças que se repetem na família e, principalmente,
conhecer a estrutura e o funcionamento familiar.
Atividade 17
Resposta: Identificação dos problemas e concordância do médico e da pessoa sobre eles,
definição de papéis do médico e da pessoa, estabelecimento de objetivos e elaboração conjunta
à do plano de manejo.
Atividade 18
Resposta: Exemplo de como o caso clínico poderia ser refeito a partir de uma abordagem
centrada na pessoa.
Paulo vai ao consultório de seu médico acompanhado pela esposa.
Dr. Gilson: Boa tarde, Paulo. Vejo que veio acompanhado hoje. Entrem e acomodem-se. Pode me
apresentar sua acompanhante?
Paulo: Esta é minha esposa Marta.
Dr. Gilson: Já nos vimos antes. Que bom que você veio. Em que posso ajudá-los hoje?
Paulo: Bem, Doutor, estou com uma piora da falta de ar há muitos dias, com muita dificuldade de
respirar, mesmo quando não faço nada, e para dormir então... Trabalhar nem se fala: não consigo mais.
Marta: É, Dr. Gilson, a situação piorou muito, e ele também está impossível de aguentar. Briga com
todo mundo, como se fossem culpados por ter fumado tanto tempo.
Dr. Gilson: Mais alguma coisa que gostariam de tratar hoje?
(Paulo balança a cabeça em sinal de negação).
Dr. Gilson: Não? (Se certifica o médico...).
Atividade 19
Resposta: C
Comentário: Pelo contrário, nesse componente busca-se ao máximo a participação de quem está
buscando ajuda, como forma de aumentar sua aderência ao manejo.
Atividade 20
Resposta: Deve buscar junto à pessoa um entendimento das dificuldades, razões em realizar o trata-
mento, e, a partir daí, buscar apoio da família, da equipe e de outros recursos da rede disponíveis.
Atividade 21
Resposta: Entendendo sobre seus problemas de saúde e tendo claro qual seu papel no manejo
desses problemas.
Resposta: Utilizando habilidades de comunicação, tais como linguagem verbal e não verbal,
implementado uma atitude empática e reconhecendo suas emoções e as da pessoa que buscou
ajuda médica durante o atendimento, conseguindo estabelecer que tipo de médico aquela pessoa
necessita, e ter consciência do seu self.
■■ REFERÊNCIAS
1. Stewart M. Patient-centered medicine: transforming the clinical method. 3rd ed. Abingdon: United King-
don: Redcliffe Medical; 2014.
2. Feldman MD. Behavioral medicine: a guide for clinical practice. 4th ed. New York: McGrawHill; 2014.
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4. Merhy EE. Um ensaio sobre o médico e suas valises tecnológicas: contribuições para compreender as
reestruturações produtivas do setor Saúde. Interface. 2000;(6):109-16.
5. Gusso G, Lopes JMC. Tratado de medicina de família e comunidade. Porto Alegre: Artmed; 2012.
6. Lopes JMC. A pessoa como centro do cuidado: a abordagem centrada na pessoa no processo de produção
do cuidado médico em Serviço de Atenção Primária à Saúde [dissertação]. Porto Alegre: UFRGS; 2005.
Disponível em: https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/5873/000521470.pdf?sequence=1.
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9. Hudon C, Fortin M, Haggerty JL, Lambert M, Poitras ME. Measuring Patients’ Perceptions of Patient-Cen-
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■■ LEITURAS RECOMENDADAS
Anastasiou LG, Alves LP. Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégias de
trabalho em aula. Joinville: Univille; 2003.
Boff L. Saber cuidar, ética do humano: compaixão pela terra. 9. ed. Petrópolis: Vozes; 2003.
Freire P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra; 1996.
Helman CG. Cultura, saúde e doença. 4. ed. Porto Alegre: Artmed; 2003.
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