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Resumo
A arte contemporânea se mostra inconciliável com as limitações impostas pelas
instituições de arte tradicionais. Essas precisam repensar seus processos para abarca-la e,
assim, se aproximarem do cotidiano contemporâneo efêmero. Faz-se essencial a investigação
de práticas críticas que revelem a arte contemporânea junto ao museu a fim de mapear
possíveis diálogos e novas formas de relação entre eles. Este artigo compara três instalações
efêmeras urbanas contemporâneas em espaços museológicos e busca os caminhos dessas
práticas frente às instituições.
Palavras-chave: Arte Contemporânea; Arquitetura; Instalações Efêmeras; Espaço
Público Urbano; Musealização.
Introdução
“A arte contemporânea é por demais pluralista em intenção e realização para se
permitir ser apreendida em uma única dimensão” escreveu Arthur Danto em seu livro “Após
o fim da arte”, de 2006. Há mais de uma década, a afirmação de que parte dessa arte seria
incompatível com as restrições dos espaços de arte ainda parece ecoar. Ela deu as costas para
o sistema institucional estabelecido e passou a usar locais alternativos para o
desenvolvimento e a exibição de seus trabalhos. A aproximação e inserção da arte
contemporânea aos espaços de arte, segundo Arthur (2006), exigiria mudanças em toda sua
estrutura no intuito de aproximá-la da vida das pessoas ou, como afirmou Cauquelin (2005),
um modelo inteiramente novo para captar a realidade contemporânea.
1Fabiane Schafranski Carneiro é aluna especial da disciplina “O corpo urbano e suas performances” do
Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte da Universidade de São Paulo.
defende o evento, ou o espaço eventural, como sendo prática de espacialização e
espacialidade engendrada por uma ação militante:
A cápsula foi instalada na passarela externa que passa por cima da entrada principal
do edifício e faz a ligação entre a sala de exposições e a biblioteca do pavilhão. Com 4m2, era
composta de materiais baratos como tubos e chapas de aço, em parte reaproveitados de outra
obra efêmera de Santiago, um andaime habitável nomeado de Situação Urbana no5. Prótesis
Institucional 1 ampliou a capacidade espacial e funcional do Pavilhão ao acolher uma
programação de eventos paralelos, sem o controle da instituição, gerida de forma
independente dos critérios de seleção usados pela fundação. A proposta incluía campanha
publicitária para oferecer ao público interessado o uso livre da cápsula em períodos de 20
dias por evento.
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Figuras 1, 2 e 3 – Prótesis Institucional 1 (capsula 1 s.c.) no Pavilhão da Finlândia, em Sevilha, Espanha:
http://www.recetasurbanas.net/index1.php?idioma=ESP&REF=1&ID=0004 <acesso em 24/06/2018>
A seleção era feita por ordem de chegada dos diferentes pedidos - individuais ou
coletivos - para o seu uso expositivo, lúdico ou de habitação. A independência da gestão das
ações desenvolvidas dentro da Cápsula, conferiu uma posição distanciada da instituição,
difundindo trabalhos e vivências de pessoas não examinadas cultural e curricularmente, o que
foi objeto de questionamento pela fundação. Porém, Cirugeda, apoiado no contrato de
responsabilidade, conseguiu um mecanismo para que os cidadãos pudessem acessar
livremente o uso de um espaço institucional em caráter temporário, gerando assim uma nova
situação social. E a instituição, de maneira involuntária, ampliou durante esse ano sua oferta
de atividades, seu número de visitantes e sua função pública.
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Figura 4 – Paracaidista, Av. Revolución, 1608 bis, Cidade do México, México:
https://lsd.com.mx/artwork/paracaidista-av-revolucion-1608-bis/ <acesso em 24/06/2018>
Outra discussão importante trazida pelo trabalho foi a ilegalidade. A começar por
Zamora não ser arquiteto e pela aprovação ter se iniciado na prefeitura como uma pequena
reforma. Passando também pela questão da privatização do espaço público, a partir da
construção do apartamento suspenso, um espaço privado em área pública. O trabalho, que
atrasou cinco meses por conta dos trâmites burocráticos, foi feito a partir de uma posição
ilegal, friccionando ainda mais a realidade das ocupações irregulares da periferia da Cidade
do México em uma construção irregular no centro da cidade. A execução do projeto ocorreu
de fevereiro a maio de 2.004, a montagem em julho, a ocupação de 28 agosto a 28 novembro
e a desmontagem em dezembro desse mesmo ano.
“Desde un comienzo busqué llevar las obras fuera de los espacios de los museos
con la ambición de poder establecer un diálogo más abierto con un público más
amplio. Al final, los museos son espacios públicos, pero son espacios internos.
Estando fuera del museo, no hay una barrera: cualquier persona va a tener una
interacción con las obras, y creo que la obligo de alguna manera a eso. De ese
modo, obtienes reacciones que muchas veces sorprenden más que las que puedes
encontrar dentro del espacio del museo. Obviamente, esto también viene por mis
preocupaciones por cuestiones sociales y políticas”.
(HÉCTOR, [20—?])
A terceira obra estudada foi Cidade Dormitório, uma instalação efêmera idealizada
por Guga Ferraz, artista brasileiro, para o projeto Parede Gentil da galeria A Gentil Carioca,
na região central do Rio de Janeiro, em 2007. Esse projeto convida um artista a realizar uma
intervenção na parede externa da galeria pelo período de quatro meses. Guga propôs uma
instalação, que também era uma sugestão de mobiliário urbano. Uma cama beliche de oito
andares com estrutura de ferro chumbada à parede, grades de madeira e colchonetes em todos
os andares. Um equipamento urbano que pode ser usado, e não somente contemplado,
provocando o passante comum a partir da transformação de sua paisagem cotidiana, criando
novas funções para o espaço público e novas formas de ocupação através de uma instalação
mutável.
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Figuras 5 e 6 – Cidade Dormitório, galeria A Gentil Carioca, Rio de Janeiro, Brasil:
http://intervencoestemporarias.com.br/intervencao/cidade-dormitorio/ <acesso em 24/06/2018>
Figuras 7 – Cidade Dormitório, museu M HKA, Antuérpia, Bélgica:
http://ensembles.mhka.be/items/523/assets/3777 <acesso em 24/06/2018>
As três obras em questão propuseram, cada uma a sua maneira, novas formas de
exposição, de diálogo junto ao público e mesmo de relação com a instituição. A condição de
estarem no espaço público, fora do espaço de arte, mas acoplado a esse, permitiu o contato
com um público maior do que o habitual em museus, galerias e centros culturais. Esse
público, seja contemplando ou experimentando a obra, produziu diferentes discursos,
interpretações e até mesmo novas ocupações e usos, afirmando a característica incerta e
mutável dos trabalhos. Essa efemeridade é alcançada também pela condição espacial das
instalações, que se encontra entre a arquitetura e a arte, e sua proposta de não perenidade. As
obras podem ser desmontadas e montadas em outros contextos e outros tempos.
A inserção no espaço público urbano e o apoio das instituições às propostas, por vezes
subversoras, possibilitaram que as práticas críticas, as preocupações com questões sociais e
políticas inerentes aos trabalhos dos três artistas, permanecessem mesmo estando vinculadas
ao espaço museológico. Todos os exemplos dados questionam a forma e postura das
instituições de arte em relação ao público e à separação entre o que está dentro ou fora de
suas coleções e espaços. Dado o caráter inicial do estudo e os limites deste texto para um
assunto tão amplo, é necessária a continuidade da pesquisa e do mapeamento, a escolha de
novos objetos de estudo e análises extensas. A eleição de situações onde essas obras,
originalmente pensadas para o espaço público urbano como Paracaidista, foram adaptadas ao
espaço tradicional de artes pode contribuir para novas propostas e processos de recolhimento,
catalogação, exposição, comunicação, conservação e investigação das obras de arte.
Conclusão
Este artigo procura colaborar para o entendimento da inserção da arte contemporânea,
mais especificadamente as instalações efêmeras urbanas que contemplam práticas espaciais
críticas, nos espaços de arte. Essa compreensão visa auxiliar na discussão e criação de novas
estratégias das instituições para esse fim. A partir do estudo é possível constatar que a
inserção da obra no espaço público, possibilitando sua experimentação pelas pessoas e não
determinando seu uso, pode colaborar para o contato da arte contemporânea com um público
amplo. A prática espacial crítica também permite que novos contextos sejam apresentados
para e pela instituição, auxiliando na sua busca pela contemporaneidade. A qualidade efêmera
das instalações, além de reportar ao contemporâneo, permite que sejam montadas e
desmontadas, habitando outros espaços e contextos. O acolhimento dessas instalações no
âmbito dos espaços de arte pode, portanto, ajudar no incremento do público, na atualização
da pauta desses espaços, reinvenção de modos de preservação, de investigação e de
comunicação dessas obras nesse contexto e aproximação com a vida das pessoas e com a
realidade contemporânea. É nessa conjuntura, de estudo da produção e circulação da arte, que
a presente pesquisa espera contribuir para novas estratégias de inserção da arte
contemporânea nos espaços de arte.
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