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UM GESTOR EM COMPOSIÇÃO

A manager in composition

Renato Ferracini
Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP

Resumo: Esse artigo versa sobre a organização de produção do LUME – Núcleo Interdisciplinar
de Pesquisas Teatrais – UNICAMP em seu caráter híbrido: tanto como um grupo de pesquisa
vinculado a uma universidade quanto como um grupo artístico. Discorre sobre essa
especificidade enquanto diferenças, potências e impotências e discute a singularidade de um
profissional de gestão e produção com uma capacidade de compor criativamente essas questões
híbridas em constante contaminação.
Palavras-chave: Grupo de Teatro, Pesquisa, Gestão, Composição criativa.

Abstract: This paper discusses the organization of LUME - Interdisciplinary Center for
Theatrical Research – UNICAMP’s production in its hybrid character: as research group linked
with university and as artistic group. Discusses this specificity while differences, power and
powerlessness and debates the uniqueness of a professional production and management with an
ability to creatively compose these hybrid issues constantly contamination.
Keywords: Theatre Group, Research, Management, Creative Composition.

O LUME possui uma situação segundo caso as exigências e demandas


bastante específica enquanto coletivo de passam pela criação de projetos a
criação teatral: ele se organiza tanto fundações de amparo a pesquisa e uma
como um grupo teatral independente sempre crescente necessidade básica de
quanto como um núcleo acadêmico. No reflexão/escrita sobre seu fazer que
primeiro caso ele necessita um tipo de culmina em livros, artigos, e trabalhos
organização comum à grande maioria pedagógicos práticos e teóricos. O
dos grupos de pensamento e reflexão com/sobre esse
teatro/dança/performance, como ambiente produtivo/criativo híbrido
participação em editais, busca de pode gerar uma certa ressignificação
patrocínios para montagens e criações sobre a produção artística muitas vezes
através de projetos de captação dualisticamente pensada como "de
realizados por meio de leis de incentivo dentro" e "de fora" do ambiente
federais, estaduais e municipais. No acadêmico. O LUME pensa que a

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produção artística é sempre gerada em meu próprio olho, que já tem uma
infinidade de partes, é uma parte entre as
locais de produção criativa, ou seja, não partes do meu corpo, ele é uma parte do
rosto, e o rosto, por sua vez, é uma parte
é o locus topológico que qualifica a do meu corpo, etc. Portanto vocês têm
todos os tipos de relações que irão se
produção, mas seu território criativo que compor umas com as outras para formar
potencializa formas de pensar/fazer uma individualidade deste ou daquele
grau. Mas em cada um desses níveis ou
teatro. O núcleo/grupo, portanto, pode graus, a individualidade será definida por
uma certa relação composta de
ser pensado como um corpo de movimento e de repouso. O que pode
acontecer se meu corpo é feito desse
produção cujas partes, aparentemente modo, uma certa relação de movimento e
de repouso que subsume uma infinidade
contraditórias, podem se compor e de partes? Podem acontecer duas coisas:
recompor de forma sempre criativa. eu como alguma coisa que eu adoro, ou
então, outro exemplo, eu como alguma
Essa questão leva claramente a coisa e caio envenenado. Literalmente,
em um caso eu fiz um bom encontro, e
exigir essa mesma postura criativa do no outro, fiz um mau encontro. Tudo isso
refere-se à categoria do "occursus".
profissional de gestão e produção que Quando eu faço uma mau encontro, isso
quer dizer que o corpo que se mistura
trabalha no LUME. Para esclarecer esse com o meu destrói minha relação
“corpo de produção em partes” e o tipo constitutiva, ou tende a destruir uma de
minhas relações subordinadas. Por
de postura que se exige desse exemplo, eu como alguma coisa e tenho
dor de barriga, e isso não me mata; mas
profissional dentro do LUME podemos isso destruiu ou inibiu, comprometeu
uma das minhas sub-relações, uma das
recorrer a Espinosa (1992), que pensa relações que me compõe. Depois eu
como alguma coisa e morro: nesse caso,
qualquer corpo enquanto conjunto isso decompôs minha relação composta,
relacional e um grau de potência de decompôs a relação complexa que
definia minha individualidade. Isso não
afetar e ser afetado. destruiu simplesmente uma das minhas
relações subordinadas que compunha
uma de minhas sub-individualidades,
isso destruiu a relação característica do
A teoria sobre o que é um corpo (ou
meu corpo. Quando eu como alguma
então uma alma, dá no mesmo) encontra-
coisa que me convém, se dá o inverso.1
se no livro II da Ética. Para Spinoza, a
individualidade de um corpo se define
assim: é quando uma relação composta
ou complexa (eu insisto nisso, muito
Qualquer corpo é um conjunto
composta, muito complexa) de de partes - e “partes” deve ser entendido
movimento e de repouso se mantém
através de todas as mudanças que afetam aqui como qualquer elemento extensivo
as partes desse corpo. É a permanência
de uma relação de movimento e de - partes concretas visíveis e atuais que o
repouso através de todas as mudanças
que afetam todas as partes, ao infinito, do formam - ou elementos intensivos -
corpo considerado. Vocês compreendem
que um corpo é necessariamente
partes singulares, econômicas, sociais,
composto ao infinito. Meu olho, por culturais invisíveis e virtuais – que o
exemplo, meu olho e a relativa
constância de meu olho, se define por 1
uma certa relação de movimento e de DELEUZE, Gilles. Curso sobre Espinosa. 24/01/78.
repouso através de todas as modificações Tradução: Francisco Traverso Fuchs. Disponível em:
<www.renato.lumeteatro.com.br/RenatoFerracini/Tex
das diversas partes do meu olho; mas
tos.html>. Acesso em 02/05/2014.

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atravessam. Ë a relação dinâmica dessas numa seta que tende tanto ao micro
partes intensivas e extensivas que como ao macro.
compõe e recompõe qualquer corpo em
sua singularidade. Exemplo: meu corpo [...] e até agora, concebemos um
Indivíduo que não é composto senão de
– singularizado como Renato – ou o corpos que só se distinguem entre si pelo
movimento e repouso, pela rapidez e pela
corpo do LUME – singularizado como lentidão, isto é, de corpos simplíssimos.
Se agora concebermos um outro
um grupo de produção artística - define- composto de vários indivíduos de
se por um conjunto de partes intensivas natureza diversa, verificaremos que pode
também ser afetado de muitas outras
e extensivas que em sua relação compõe maneiras, conservando, todavia, sua
natureza. Com efeito, uma vez que cada
esse e somente esse individuo/corpo uma de suas partes é composta de vários
corpos, cada uma poderá, portanto, sem
Renato e LUME. A composição que qualquer mudança de natureza, mover-se
ora mais lentamente, ora mais
define um corpo está, então, deslocada rapidamente. Se além disso concebermos
da afirmação cristalizante de um “eu um terceiro gênero de Indivíduos,
compostos de indivíduos do segundo
sou” para uma pergunta dinâmica do gênero, verificaremos que ele pode
também ser afetado de muitas outras
tipo “como compor afetivamente esse maneiras, sem qualquer mudança em sua
forma. E se continuarmos assim até o
plano de forças que atravessa esse corpo infinito, conceberemos facilmente que a
natureza inteira é um só indivíduo. 2
e essas partes extensivas que os forma?”
(Espinosa, 1992; Deleuze e Guatarri,
Podemos pensar em um corpo
1997(1); Pelbart, 2008). Um
como um corpo humano, mas a mesma
deslocamento prático-ontológico do
relação se emprega para qualquer parte
plano das simples definições para um
desse corpo, como por exemplo, um
campo complexo das composições. O
olho: meu olho é um conjunto de partes
corpo não mais como uma demarcação
que em sua relação compõe e define
fixa mas um elemento relacional que se
meu olho e só ele nessa dada relação
compõe em dinâmica e em gerúndio;
(seta que tende para o micro), ou mais, a
mais uma cartografia de partes
pupila desse olho é formada por um
intensivas e extensivas humanas e não-
conjunto de partes que em sua relação
humanas do que uma essência fixa
definem essa pupila nessa dada relação
definidora. Ou seja, deslocamos
e assim por diante ao infinitamente
qualquer acepção de corpo para a
pequeno. O mesmo se aplica para a seta
relação dinâmica das partes que o
macroscópica. Um coletivo, uma
compõem e não pelo simples conjunto
sociedade, uma cultura podem ser
delas. Outra questão importante é que
os corpos se compõem em sua relação 2
Espinosa, Livro II, Proposição VII, Escólio.

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considerados corpos na medida em que partes de um corpo coletivo que na sua


a relação de suas partes intensas e composição criativa podem gerar
extensas compõe dinamicamente aquele aumento de potência de afetar e ser
coletivo, sociedade, cultura. A definição afetado pelo entorno. O profissional
de corpo – coletivo ou singular - não (produtor ou gestor do LUME) deve ter
passaria mais pelo cristalizador verbo essa postura criativa e ética de causar
de definição “é” (eu sou), mas pela alegria (aumento de potência das partes-
relação dinâmica da capacidade que corpo-LUME).
esse corpo tem de afetar e ser afetado. A Infelizmente sabemos que não há
definição ”um corpo é...” seria nenhuma receita pré-estabelecida para
substituída pela capacidade de relação e se realizar tal tarefa. A única
composição com as forças de fora e de possibilidade é o gestor ou produtor
dentro que atravessam esse mesmo adentrar de forma ética-criativa no
corpo. campo de experiência que isso gera e lá
Esses corpos se compõem pela dentro, como um maestro, fazer o
capacidade de afetarem e serem possível para orquestrar composições
afetados numa dinâmica de composição alegres. Mas o que seria esse campo de
absolutamente complexa. Nessa esteira experiência? Primeiramente devemos
de pensamento podemos dizer que entender aqui que o conceito de
qualquer corpo, seja ele singular ou experiência não está atrelado nem a uma
coletivo, passa a ser um grau de experiência como acúmulo de
potência de afetar e ser afetado (Pelbart, conhecimento (conhecimento profundo
2008). Quando nos encontros e na sua em um determinado assunto) nem a
composição há aumento dessa potência experiência como um dispositivo de
de afetar e ser afetado gera-se, segundo prova ou comprovação (conhecimento
Espinosa, alegria. Ao contrário, quando científico). O gestor do LUME deve
a potência de afetar de um corpo é proceder por perguntas e verificar como
diminuída nos encontros e em suas essas questões podem levar a uma
recomposições, gera-se tristeza. composição aumentativa de potência
No LUME dilui-se a questão do (alegria). O gestor do LUME deve
falso paradoxo do mercado (fora) com a sempre perguntar: como saber compor
academia (dentro). Esses supostos com forças que ampliam a capacidade
paradoxos devem ser tratados como (afetos alegres de Espinosa) ou com

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forças que diminuem a capacidade de forma, não é o corpo que cria a


ação (afetos tristes de Espinosa)? Qual a experiência, mas esse corpo é lançado
capacidade de composição com essas em diferenciação contínua pelo plano da
forças? Ou numa pergunta típica de experiência. Outra questão é que o
Espinosa: o que pode um corpo plano de experiência é que é movido
enquanto potência de afetar e ser por tensões entre suas linhas e
afetado? Como nosso corpo compõe elementos sem qualquer previsão a
com esse plano dinâmico de forças? A priori de como a experiência vai
resposta a essas perguntas não passam terminar ou como o irá se reconfigurar
pela racionalização e/ou categorização em sua re-composição. Um plano de
das relações dessas forças (quais são experiências será sempre dinâmico,
boas ou más no aspecto moral e nem imprevisível e metaestável e jamais
quais são de fora ou de dentro ou quais teleológico. Um território com uma
são pertencentes a academia ou cartografia dinâmica de forças, ou seja,
pertencentes ao mercado), mas pela uma micropolítica que não passa por
experiência de composição com elas. uma moral (no sentido de
Portanto, estar inserido num plano de hierarquizações ou catalogações numa
experiência é estar aberto, poroso e série específica de forças boas ou ruins),
receptivo para os afetos que essa mas por uma ética de composição de
dinâmica contém e ao mesmo tempo forças que determinam aumentos ou
compor ativamente com esse plano de diminuições de potência de ação:
forças buscando, de forma ética, realizar micropolítica enquanto micropotência.
a ampliação de potência de ação e nisso Esse deverá ser o gestor do
compor outros modos de gestão e LUME: um cartógrafo ético-criativo
produção mais ativos e potentes - mais que busca a alegria de Espinosa. Um
alegres, diria Espinosa. Um plano de gestor-compositor.
experiências não passa somente pelo
corpo que experimenta, mas esse Referências Bibliográficas
mesmo corpo busca composições com
essa cartografia de forças na qual ele é ARTAUD, Antonin. O teatro e seu
Duplo. São Paulo: Martins Fontes,
tão somente uma linha que compõe esse
1999.
plano cartográfico, mas que pode gerar
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix.
diferenças qualitativas, criações e O Anti Édipo. Trad. Georges Lamazière.
recriações nessa composição. Dessa Rio de Janeiro: Imago, 1976.

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Renato Ferracini

DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix. PELBART, Peter Pál. Elementos para


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DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix.


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