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CAPÍTULO 4

Estratigrafia

Já vimos, na Introdução, que o estudo estratigráfico pode ser realizado


por meio da Litoestratigrafia (estratigrafia tradicional) ou da Estratigrafia de
Seqüências (estratigrafia moderna). Até a presente data são empregados
métodos litoestratigráficos em estudos arqueológicos, pois permitem análises
e interpretações em áreas tão restritas como 1m2 ou menos
(microestratigrafia), ao contrário da Estratigrafia de Seqüências.
As relações temporais e espaciais entre sedimentos e solos são
estabelecidas porque os ambientes deposicionais são dinâmicos, estão sujeitos
a constantes mudanças que se refletem em estágios de agradação1,
estabilidade2 ou degradação3. Como o reconhecimento dessas relações é
importante na interpretação arqueológica, pode-se facilmente deduzir o papel
desempenhado pelas análises estratigráficas na separação temporal de
distintas assembléias de artefatos e de feições de origem antrópica existentes
em um sítio arqueológico. Além disso, é fundamental estabelecer os contatos
vertical e horizontal entre os sedimentos e os solos antes, durante e após a
ocupação humana do local, bem como determinar se as mudanças ali
ocorridas tiveram causas naturais ou se foram provenientes de desequilíbrios
ambientais promovidos pelos indivíduos daquela comunidade.
A investigação estratigráfica é realizada em um sítio arqueológico com a
intenção de alcançar os seguintes objetivos: (1) agrupar o solo e os

1
Domínio da deposição.
2
Equilíbrio entre acumulação e erosão, condição essencial para formação de solo.
3
Domínio da erosão que remove os sedimentos e os solos.
56

sedimentos em unidades estratigráficas físicas a partir da observação de suas


características e de seus contatos; (2) ordenar essas unidades estratigráficas
na sua seqüência temporal original, ou seja, as mais velhas deverão
posicionar-se na base do perfil, e as mais novas, no topo; (3) determinar as
idades das unidades estratigráficas e o tempo decorrido de agradação,
estabilidade e, se for o caso, degradação delas, e (4) correlacionar as
unidades estratigráficas do sítio com a estratigrafia regional e do entorno.
As unidades estratigráficas foram definidas pelos geocientistas de forma
a descrever e categorizar o conhecimento sobre os 4,6 bilhões de anos de
idade do nosso planeta. As divisões e combinações de sucessões de
sedimentos e solos são realizadas de acordo com as composições, texturas,
idades, discordâncias e conteúdos fossilíferos apresentados, o que permite
tratá-las como unidades litoestratigráficas4, cronoestratigráficas5,
aloestratigráficas6, bioestratigráficas7, pedoestratigráficas8, litodêmicas9, etc.,
nem todas adotadas na Arqueologia, pois ela desenvolve suas investigações
sobre objetos e acontecimentos que, normalmente, ocorreram até 30.000
anos A.P. ou pouco mais. Por isso, nas atividades arqueológicas investigativas,
são empregadas, com algumas adaptações, as unidades litoestratigráficas,
pedoestratigráficas e cronoestratigráficas.

4
Unidade composta por um conjunto de rochas distintas e limitada por suas características
litológicas, independente de sua história geológica ou de conceitos cronológicos.
5
Unidades imateriais usadas para dividir o tempo com base em elementos geocronológicos.
6
Unidades limitadas por discordâncias.
7
Unidade representada por um pacote de camadas com determinado conteúdo fossilífero
distinto das rochas adjacentes.
8
Unidades que consistem em corpos de rochas compostos por um ou mais horizontes
pedológicos ocorrentes em uma ou mais unidades litoestratigráficas, litodêmicas ou
aloestratigráficas definidas.
9
Unidades compostas por rochas que, diferentemente das litoestratigráficas, apresentam
aspectos litoestruturais diversos daquelas e, também, por não observarem o princípio da
superposição.
57

Litoestratigrafia

Como já visto anteriormente, o objetivo primordial da litoestratigrafia é


dividir e combinar as sucessões de sedimentos de um sítio arqueológico para
ordená-los como pacotes expressivos, reconhecíveis e distintos, constituídos
como unidades litoestratigráficas, que possuem composições, texturas e
estruturas diferentes de pacotes laterais, superpostos e sotopostos. Essas
unidades são identificadas apenas pelas características físicas e propriedades
dos sedimentos que as compõem e, portanto, os artefatos, os restos da flora e
fauna e a idade do pacote não são considerados na sua definição.
Os sedimentos componentes de uma unidade litoestratigráfica foram
depositados durante um dado intervalo temporal; a quantidade específica de
tempo representada numa única unidade pode variar de lugar para lugar. As
unidades litoestratigráficas são, via de regra, transgressivas no tempo,
colocando-se as mais velhas na base e as mais novas na direção do topo,
fenômeno que também pode ser observado lateralmente quando, então, uma
unidade pode ser mais velha em um local e mais nova em outro. Tal é o caso
dos depósitos de barra em pontal constituídos na porção convexa das curvas
de rios, em particular os meandrantes, que avançam lateralmente na planície
de inundação, percorrendo de uma margem do vale à outra. Em decorrência,
a datação radiométrica de elementos da flora e da fauna indicará idades
decrescentes para o depósito no mesmo sentido de deslocamento do canal
fluvial.
A grandeza da transgressão também é função do valor temporal
representado pela deposição da unidade, ou seja, a natureza transgressiva do
pacote e seus limites diminuirão à medida que a quantidade de tempo
representada pela unidade decresce. Deposições de curta duração
correspondem à natureza transgressiva de tempo diminuto, que são
normalmente desprezadas, tais como, por exemplo, os tufos vulcânicos que
58

representam um evento eruptivo rápido (horas a poucos anos). Já o exemplo


da deposição das barras em pontal, citado acima, reflete uma duração maior
para a formação da unidade.
A transgressão no tempo é avaliada pela datação direta da unidade
litoestratigráfica estudada e daquelas superpostas e sotopostas com as quais
se limita. Como os artefatos, cinzas de fogueiras, esqueletos, restos de
plantas, etc., componentes dos sítios arqueológicos brasileiros possuem idade
14
normalmente inferior a 15.000 anos, a datação pelo método do C tem
apresentado resultados muito satisfatórios. Apesar disso, são exigidos
cuidados especiais na coleta de amostras e na análise dos dados finais, pois os
objetos datados podem ter sofrido algum tipo de contaminação. Esse é o caso
da datação, por exemplo, de níveis com conchas calcárias, pois o carbonato
de cálcio pode ser dissolvido pelo ácido carbônico (H2CO3) contido na água das
chuvas percolantes; o carbonato, assim liberado, desloca-se por lixiviação
desde um nível superior para um outro inferior onde se acumula. Se este
último também contiver conchas, há uma grande possibilidade de que a data
original do depósito seja mascarada (figura 4.1).
Segundo o Código Brasileiro de Nomenclatura Estratigráfica, ocorrem as
seguintes categorias de unidades litoestratigráficas formais: Supergrupo,
Grupo, Subgrupo, Formação, Membro, Camada, Complexo, Suíte e Corpo
(tabela 4.1).

Continuidades e descontinuidades

Um aspecto importante na interpretação dos depósitos sedimentares


que é extensível à Arqueologia é o do contato ou limite entre as unidades
litoestratigráficas. O limite corresponde a uma superfície contínua entre rochas
de um mesmo grupo (sedimentares, por exemplo) ou de grupos diferentes
(sedimentar/metamórfica, por exemplo). Enquanto os contatos abruptos
59

podem estar indicando mudanças rápidas no processo de transporte, os


gradacionais retratam as mudanças ambientais gradativas mais transgressivas
no tempo, e os erosivos evidenciam o término das condições sedimentares
construtivas na área e o advento das destrutivas.
Os contatos de continuidade e descontinuidade são marcados
fisicamente por superfícies planas ou irregulares.

Figura 4.1. Perfil estratigráfico arqueológico realizado em Mato Grosso do Sul com o objetivo
de, entre outros, recolher amostras (conchas) para datação com 14C. Os resultados deixam
evidentes os problemas de amostragem e a contaminação dos níveis conchíferos, pois não são
continuamente decrescentes em idade para o topo do corte representado. Fonte: Schmitz et
al. (1998), modificado.
60

Tabela 4.1. Unidades litoestratigráficas brasileiras com as suas propriedades destacando a


formação, que é a unidade fundamental.

UNIDADE CARACTERÍSTICAS
É formado pela reunião de grupos com características litoestratigráficas
Supergrupo
inter-relacionadas.
É constituído pela associação de duas ou mais formações com feições ou
Grupo características litoestratigráficas comuns. As formações que compõem o
grupo não necessariamente são as mesmas em toda a área de ocorrência.
Subgrupo É composto apenas a algumas formações de um grupo.
Unidade litoestratigráfica fundamental constituída por um corpo de
relativa uniformidade litológica, contínuo e mapeável em subsuperfície
FORMAÇÃO e/ou superfície. Ela se diferencia fisicamente das formações adjacentes,
superpostas e sotopostas, podendo apresentar espessura e extensão
variáveis e representar intervalo de tempo longo ou curto, mas devendo
ser mapeável ou traçável por longas distâncias.
Membro Faz parte de uma formação e apresenta características litológicas próprias
que o distinguem do restante da unidade a que está confinado.
Unidade litoestratigráfica formal de menor hierarquia, com dimensões
milimétricas a métricas. Corresponde a um litossoma em uma sucessão
estratificada, que se distingue das rochas adjacentes pela litologia. Ela não se
Camada
apresenta restrita a uma formação ou membro, podendo estender-se para
outras unidades formais mantendo sua denominação.
Complexo É formado pela reunião de rochas de diversos tipos (sedimentares, ígneas ou
metamórficas).
Suíte Associação de rochas intrusivas ou metamórficas de alto grau, de diversos
tipos.
Corpo Associação de rochas intrusivas ou metamórficas de alto grau, formadas
apenas por um tipo de rocha.

Existem duas possibilidades quanto ao tipo de limite vertical entre as


unidades litoestratigráficas: limites de conformidade ou de continuidade e os
de não-conformidade ou descontinuidade. Diz-se que ele é de conformidade
quando aparentemente inexiste quebra importante na sedimentação, ou seja,
quando ela for contínua e não houver registro de evento erosivo maior. O
contato conformante pode ser abrupto (abrupt), gradacional (gradational) ou
intercalado (intercalated); por essa razão, os artefatos aí encontrados foram
ressedimentados ou estão in situ sendo indicativos da ocupação humana
daquela superfície e do seu rápido e contínuo soterramento.
61

O contato abrupto (figura 4.2) caracteriza-se por uma repentina e


marcada mudança na composição, textura ou estrutura dos
sedimentitos/sedimentos formadores das unidades que se limitam, coincidindo
com os planos de acamadamento deposicional formados pelas variações nas
condições locais de deposição. Justamente devido às flutuações no processo
deposicional, esses planos de acamadamento são pequenos hiatos10 de curta
duração (poucas horas ou anos), chamados diastemas. No contato intercalado
(figura 4.3), ocorre uma zona de transição de finos leitos interestratificados
das litologias/sedimentos das unidades sotoposta e superposta. Finalmente,
no limite gradacional (figura 4.4), há uma zona de transição onde se misturam
rochas sedimentares/sedimentos das unidades inferior e superior.
Os limites representam eventos erosivos ou um intervalo temporal de
não-deposição. Eles significam uma ausência de registro entre os sedimentos
que constituem o leito sotoposto e o superposto, o que equivale a dizer que
há uma lacuna temporal entre as duas camadas. O geoarqueólogo pode
deparar-se, então, com três situações: (a) os artefatos que, porventura, aí
existiram foram erodidos, (b) podem ser encontrados misturados artefatos
com idades e origens diferentes se o limite é uma superfície de
ressedimentação e (c), mesmo que pareça tratar-se de um sítio num contexto
primário, os artefatos podem estar representando diversas ocupações
sobrepostas em uma superfície estabilizada.
As descontinuidades, também chamadas discordâncias, são limitadas
por superfícies que representam quebras na sedimentação, com duração de
centenas ou milhares de anos de não-deposição (superfície estabilizada) ou
erosão (degradação do relevo). Quando os processos deposicionais reativam-
se no local, a superfície estabilizada ou erodida é soterrada, representando
essa superfície de descontinuidade o lapso de tempo decorrido entre os

10
Intervalo na sedimentação.
62

fenômenos pedogenéticos (superfície estabilizada) ou erosivos e a nova fase


deposicional.
As discordâncias (figura 4.5) podem ser de quatro tipos: discordância
angular (angular unconformity), quando duas sucessões sedimentares
apresentam mergulhos diferentes, pois o conjunto rochoso mais antigo sofreu
dobramento ou basculamento antes de ser erodido e de, sobre ele, se
assentar a sucessão mais jovem; discordância litológica (nonconformity),
quando uma sucessão de rochas sedimentares se assenta sobre rochas ígneas
ou metamórficas, correspondendo a superfície de descontinuidade a diversos
ciclos de erosão; discordância erosiva (disconformity), quando ocorre uma
superfície irregular de erosão (paleorrelevo) entre duas sucessões de rochas
sedimentares não-perturbadas, com paralelismo dos planos de estratificação e
discordância paralela (paraconformity), quando duas sucessões de
sedimentitos essencialmente paralelos não mostram os sinais da
descontinuidade, o que só pode ser detectado por comparação do conteúdo
fossilífero entre elas.
Assim como uma unidade litoestratigráfica é finita na vertical, ela
também o é lateralmente (figura 4.6). O contato lateral pode ser abrupto
(abrupt) quando uma unidade trunca erosivamente outra; em cunha,
(pinchout) no caso de uma unidade extinguir-se progressivamente na forma
de cunha; interdigitado (interfingering), quando ocorrer recorrência entre
duas unidades vizinhas cujos níveis deposicionais são em forma de cunha, e
gradacional (gradational) se o contato lateral gradual e indistintamente muda
de uma unidade para a outra.
63

Figura 4.2. Contato abrupto entre camadas Figura 4.3. O retângulo salienta o
de arenitos da Formação Palermo, Permiano contato intercalado entre níveis de
da Bacia do Paraná. Na parte inferior do arenito muito grosso na base e arenito
testemunho, ocorre um nível muito muito fino siltoso no topo. Formação
bioturbado, que é abruptamente cortado, para Palermo, Permiano da Bacia do Paraná.
o topo (seta), por laminações cruzadas Testemunho da perfuração IB-177/RS
truncadas por ondas. Testemunho da realizada pela CPRM em Cachoeira do
perfuração IB-177/RS realizada pela CPRM em Sul. Foto: Carlos Henrique Nowatzki.
Cachoeira do Sul. Foto: Carlos Henrique
Nowatzki.
64

Figura 4.4. Testemunho de


perfuração com contato gradacional
granodecrescente para o topo entre
uma brecha e um arenito.
Formação Sanga do Cabral,
Triássico da Bacia do Paraná. São
Leopoldo, RS. Foto: Carlos Henrique
Nowatzki.

Figura 4.5. Representação esquemática dos quatro tipos de discordâncias. Fonte: Popp
(1987), modificado.
65

Discordâncias podem ser inferidas pela presença de depósitos residuais


(lag), compostos por um conjunto de artefatos em regiões de deflação11
eólica, de solo ou nível intemperisado soterrado ou ainda por mudanças no
mergulho de camadas entre unidades litoestratigráficas sedimentares. Seu
caráter erosivo é resultado de abrasões eólicas, fluviais, glaciais,
gravitacionais, marinhas ou de processos transgressivos e regressivos
costeiros e, portanto, as discordâncias podem estar indicando que os artefatos
encontrados nesses limites foram redepositados e não estão em contexto
primário.

A B

C D

Figura 4.6. Unidades litoestratigráficas e seus contatos laterais. A.Contato abrupto. B.


Contato em cunha. C. Contato interdigitado e D. Contato gradacional. Fonte: Waters (1992),
modificado.

Pedoestratigrafia

Uma unidade litoestratigráfica aflorante sujeita a períodos de mínima


gradação (deposição) e degradação (erosão) será submetida aos processos
pedogenéticos por se tratar de uma superfície estabilizada. A profundidade do
alcance dessa transformação depende de alguns fatores, tais como a duração

11
Remoção de fragmentos menores pelo vento e conseqüente acumulação dos detritos
maiores.
66

da estabilidade e o rigor da pedogênese, podendo atingir uma ou mais


unidades litoestratigráficas. Caso a deposição seja retomada, o solo será
soterrado, e o contato entre o topo desse paleossolo e a base da camada
superposta é uma superfície de discordância e representa o lapso de tempo
decorrido entre a estabilidade da região e o novo período deposicional. Não
devemos esquecer que o contato pode ser paralelo ao tempo, se a
sedimentação foi rápida e sobre toda a superfície do solo, ou transgressivo, se
o soterramento ocorreu paulatinamente. Por essa razão, os artefatos sobre o
paleossolo podem ser contemporâneos ou não e, neste último caso,
representariam ocupações sucessivas.
O Código Norte-Americano de Nomenclatura Estratigráfica contempla as
unidades pedoestratigráficas, que são corpos rochosos com um ou mais
horizontes pedológicos desenvolvidos em uma ou mais unidades
litoestratigráficas, aloestratigráficas ou litodêmicas formalmente definidas. Os
horizontes referidos correspondem, normalmente, aos horizontes A e B dos
solos atuais, sendo identificáveis por propriedades como cor, estrutura e
conteúdo em matéria orgânica. Apesar de os termos solo soterrado e
paleossolo estarem consagrados, a orientação da Comissão de Estratigrafia
Norte-Americana enfatiza o uso da expressão geossolo como a unidade
pedoestratigráfica fundamental e única; seu limite inferior é o nível mais baixo
de um horizonte pedológico dentro de um perfil de paleossolo, e o superior, o
nível mais basal da camada superposta.
A descoberta de um paleossolo implica a detalhada descrição das
relações estratigráficas dele com as unidades litoestratigráficas, sua extensão
e mapeamento, com o objetivo de reconstituir a paleotopografia da região.
Caso os processos pedogenéticos atuem sobre duas unidades
litoestratigráficas com idades diferentes, mas em contato lateral, será criada
uma seção lateral de solo contínua e os artefatos porventura contidos nas
67

duas unidades poderão coexistir em um mesmo horizonte, sugerindo


erroneamente que todos sejam contemporâneos.

Cronoestratigrafia

A Cronoestratigrafia é a parte da Estratigrafia que estuda os estratos e


os organiza em unidades cronoestratigráficas de acordo com a sua idade ou o
seu tempo de formação. As unidades são formadas por um conjunto de
estratos originados em um determinado intervalo de tempo geológico, e são
limitadas por superfícies isócronas12.
Durante o decurso do tempo, há alternância entre os processos
deposicionais, erosivos e de estabilidade numa determinada região, os quais
ficam registrados em um sítio arqueológico por uma ou mais combinações de
unidades litoestratigráficas (deposição), pedoestratigráficas (estabilidade) e
discordâncias erosivas (degradação). A análise cronoestratigráfica desse sítio
procura, portanto, responder a questões como: (1) Quantos foram os
episódios deposicionais, erosivos e de estabilidade? (2) Qual foi a ordem
relativa de ocorrência desses intervalos? (3) Qual a idade absoluta desses
episódios? (4) Qual a duração em tempo absoluto de cada um desses
processos deposicionais, erosivos e de estabilidade? (5) Qual o
posicionamento estratigráfico do sítio na Escala Geológica do Tempo (tabela
4.2)?
Enquanto a ordenação dos eventos é solucionada com a aplicação direta
da Lei da Superposição ou Lei de Steno-Smith13 e dos contatos entre as
unidades litoestratigráficas e pedoestratigráficas presentes, a idade e a
duração são determinadas com o uso de métodos de datação radiométricos e

12
Superfícies de mesma idade.
13
Numa sucessão de rochas sedimentares ou ígneas extrusivas sem deformações pós-
formacionais, a camada mais nova situa-se no topo, e a mais velha, na base.
68

não-radiométricos, como o do Carbono 14 (14C) e o da termoluminiscência,


ambos já discutidos na Introdução, do paleomagnetismo e da
dendrocronologia.
O paleomagnetismo é o magnetismo ainda existente em um mineral ou
rocha mesmo que tenha mudado ou cessado o campo magnético que orientou
sua posição por ocasião de seu surgimento. Existe a comprovação de que
acontece, periodicamente, a inversão da polaridade magnética terrestre e,
portanto, um mineral ou rocha constituída no passado contém o registro da
posição dos pólos magnéticos quando de sua formação.
Os estudos indicam que, nos últimos cinco milhões de anos, ocorreram
quatro épocas de polaridade, isto é, períodos em que o campo geomagnético
apresentou determinado tipo de polaridade. Essas épocas podem ser
interrompidas por intervalos breves de mudança da polaridade chamados
eventos. Como essas épocas e eventos são vinculados à escala geológica
absoluta, se encontrados em rochas sedimentares originadas no fundo de
oceano ou em ígneas, possibilitam a datação absoluta delas (tabela 4.3).
A dendrocronologia é a datação de árvores por meio da contagem e
medição da espessura dos seus anéis de crescimento (figura 4.7). A estrutura
anelar tem sua espessura e crescimento diretamente relacionado à absorção
de água para realizar a fotossíntese e, portanto, aumentos e diminuições na
disponibilidade daquele líquido afetam o seu desenvolvimento. Períodos de
seca (verão) e longas estiagens são registrados pelo vegetal em seu xilema
secundário na forma de pequenos e finos anéis, enquanto os invernos, em
climas equatoriais, tropicais e subtropicais (fases chuvosas) o são por
estruturas grandes e espessas. Em resumo, o anel de crescimento reflete a
quantidade de xilema secundário produzido em um período de crescimento, o
que o torna um bom indicador das oscilações climáticas.
Alguns arqueólogos fazem uma distinção entre a idade da amostra e a
idade do evento. A primeira, obtida com o emprego de técnicas
69

geocronológicas, indica a idade de determinado componente da matriz do


sítio, o qual está sujeito à contaminação e a alterações diversas, que podem
afetar a datação precisa do evento. Além disso, é importante (a) escolher o
método geocronológico levando em consideração suas limitações e (b) coletar
as amostras com o devido cuidado para não contaminá-las. A inobservância
desses quesitos poderá resultar em idades e interpretações estratigráficas
errôneas. Os métodos utilizados para datação do Quaternário e seus
resultados esperados estão listados na tabela 4.4. A elaboração dessa tabela
levou em consideração algumas perguntas básicas e o método geocronológico
a ser usado para respondê-las. Entre essas questões, estão as seguintes: (1)
Quando ocorreu? (2) Quanto durou o período de deposição, erosão ou
estabilidade? (3) Qual a área fonte da amostra (proveniência)? (4) Qual a
idade do evento?
A idade de uma unidade é obtida por meio da datação de amostras
retiradas ao longo de uma seção vertical (figura 4.8). A amostra da base nos
dará a data de início da deposição, e a do topo, a do fim dela; o tempo de
duração do processo será a diferença entre as duas idades, porém poderão
contribuir para essa avaliação os conteúdos arqueológicos e paleontológicos.
Alguns cuidados devem ser tomados na hora da coleta para que não ocorram
problemas com os dados da datação, entre eles os da ocorrência de rochas
ígneas intrusivas, de clastos ressedimentados (fragmentos de carvão, por
exemplo) e amostras bioturbadas. As intrusivas fornecerão idades posteriores
ao evento da deposição da unidade, os ressedimentados, de quando foram
primariamente formados antes de serem erodidos e redepositados, e as
bioturbadas poderão mostrar uma mistura de datas.
Ainda que o tempo de duração para a formação de uma unidade
litoestratigráfica possa ser determinado, a sua taxa de sedimentação não é
tão simples de ser obtida. Não se trata da divisão de sua espessura pelo
tempo conhecido, pois ela (taxa) pode variar de local para local ao longo
70

desse tempo. Contudo, usando métodos tais como datação radiométrica,


observação direta, paleontologia e contagem de varves, pode-se calcular a
provável taxa de sedimentação ocorrente em um ambiente deposicional
específico.
As maiores taxas de sedimentação são referidas para ambientes
deltaicos (6.000 a 45.000cm a cada 1.000 anos), e uma das menores, para as
das profundezas abissais dos oceanos (2cm a cada 1.000 anos).
Desde que a taxa pedogenética seja conhecida, é possível estimar o
tempo entre a estabilidade da paisagem e o da formação do solo. Para
determinar a duração da estabilização, datam-se materiais da porção inferior
do paleossolo autóctone (fim de agradação e início da estabilização e da
pedogênese) e da base da unidade litoestratigráfica superposta (fim da
estabilização e da formação de solo e início de agradação).
As discordâncias, exceção à paralela, deixam os registros de sua
ocorrência na forma de superfícies erosivas. A discordância erosiva constitui-
se do hiato e da vacuidade degradacional14, ambos processos reunidos no
termo lacuna. O tempo de vacuidade é variável de local para local em razão
do rigor da erosão e, portanto, a lacuna (discordância erosiva) pode variar no
tempo, de um sítio para outro. Em princípio, a duração da degradação da
paisagem (hiato) é determinada pela datação de amostras da parte superior
da unidade litoestratigráfica mais jovem truncada pela superfície de
desconformidade e das amostras da porção inferior da unidade
litoestratigráfica mais velha superposta à discordância.
Durante um determinado intervalo de tempo, os períodos de agradação,
estabilidade ou degradação podem ser processos muito longos intercalados a
fases com breves mudanças ou eles podem ser de curta duração com
mudanças freqüentes. Essa atuação pode ocorrer sobre uma extensa região

14
Parte da lacuna correspondente ao tempo de duração para a remoção de rochas
previamente depositadas. Também chamada vacuidade erosiva.
71

Tabela 4.2. Escala Geológica do Tempo. Fonte: modificada de Pearl (1971) e Popp (1998).

ESCALA GEOLÓGICA DO TEMPO


ÉONS ERAS PERÍODOS ÉPOCAS INÍCIO ANIMAIS VEGETAIS
Ma15
Holoceno 0,01
Quaternário Mamíferos Modernas plantas com
sementes
Pleistoceno 1,6-0,01
F Cenozóica
A Plioceno 5-1,6
N Mioceno 23-5
E Terciário Oligoceno 35-23
R Eoceno 56-35
O Paleoceno 65-56
Z Cretáceo (Superior, 144-65 Répteis e Primeiras plantas com
Ó Mesozóica Jurássico Médio ou 205-144 amonites sementes
I Triássico Inferior) 247-205
C Permiano 290-247
0 Carbonífero (Superior, 362-290 Anfíbios Plantas com
Paleozóica Devoniano Médio ou 408-362 Idade dos esporos
Siluriano Inferior) 439-408 peixes Algas marinhas
Ordoviciano 510-439 Invertebrados
Cambriano 570-510
P
R
O Superior 900-570
T
E
R Médio 1.600-900
O
Z
Ó Inferior 1.600-
I 2.500
C
O
A
R 2.500-
Q Superior 4.600
U
E
O
Z Evidências indiretas de vida
Ó
I Inferior 4.600?
C
O

15
Milhões de anos.
72

Tabela 4.3. Polaridade geomagnética dos últimos 5 milhões de anos. Fonte: Mendes (1984),
modificada.

ÉPOCAS EVENTOS
0
BRUNHES

normal
P
L
E
0,73
I
X Jaramilo 0,90 - 0,97 S
T
O
--- 1 Ma
MATUYAMA C
E
XX Olduval 1,67 - 1,85 N
O
inversa

X 2,01 - 2,04
--- 2 Ma
Reunião
X 2,12 - 2,14

2,48
P
GAUSS
L
--- 3 Ma X Koena 2,90 - 3,01
I
normal X Mamute 3,05 - 3,15
O

2,40 C

E
X Cochiti 3,80 - 3,90
GILBERT N
--- 4 Ma X Nunivak 4,05 - 4,20
X Sidufjall 4,32 - 4,47 O
inversa

X Thvera 4,85 - 5,00

--- 5 Ma
5,26

ou uma pequena área, criando-se, assim, sucessões estratigráficas (unidades


litoestratigráficas, pedoestratigráficas e contatos erosivos) diferentes.
73

Alguns supõem, erroneamente, que o empilhamento de unidades


observado num perfil vertical representa um processo de agradação contínuo
ocorrido naquele local através do tempo. Na realidade, é comum que, no
tempo, o processo de agradação (deposição) seja substituído, paulatinamente,
pelo de degradação (erosão) com passagem anterior pelo de estabilidade
(pedogênese). Ambos (erosão e pedogênese) originam uma quebra na
sucessão do evento deposicional (gap), ou seja, ausência de registro geológico
de unidades litoestratigráficas, cuja duração é, geralmente, maior do que o do
próprio registro físico representado pelas unidades. Como o comportamento
deposicional pode ser diferente de local para local, a solução pode ser a
criação de uma seqüência estratigráfica composta, elaborada a partir da
correlação com unidades de áreas adjacentes ou de distribuição regional.

A B

Figura 4.7. Cortes transversais em lenho atual (A) e fóssil (B) expondo os anéis de
crescimento. Na porção inferior de A, observa-se uma gema lateral. O sílex xilóide (madeira
fossilizada) mostrado em B foi coletado no Arenito Mata, unidade informal (Faccini 1989) do
Triássico Superior do Estado do Rio Grande do Sul, Bacia do Paraná. Fotos: Carlos Henrique
Nowatzki.
74

Tabela 4.4. Relação dos métodos usados na datação do Quaternário e os resultados esperados. IN:
métodos que determinam as idades quantitativas estimadas; IC: métodos que produzem uma idade pela
medição sistemática de mudanças individuais resultantes de processos não relacionados a grupos. As
taxas desses processos dependem de variáveis ambientais, como litologia e clima, e devem ser
calibradas por controle cronológico independente; IR: métodos que determinam uma seqüência de idade
fornecendo, a maioria deles, uma medida de idade das diferenças entre membros de uma seqüência.
ICo: método que indica idade somente pela equivalência entre depósitos ou eventos anteriormente
datados. As setas indicam os resultados esperados, os quais normalmente são produzidos pelos métodos
listados abaixo delas. Em algumas extremidades de setas, ocorrem linhas cheias, que mostram os
resultados menos esperados produzidos pelos métodos abaixo delas. Sideral: método que determina
datas do calendário ou conta eventos anuais. Isotópico: método que mede mudanças na composição
isotópica devido ao decaimento radioativo. Radiogênico: método que mede efeitos cumulativos não-
isotópicos do decaimento radioativo, como ruptura microscópica em cristais e trampas de energia
eletrônica. Químico e biológico: método que mede os resultados de processos químicos e biológicos
desencadeados ao longo do tempo (temporais). Geomórfico: método que mede os resultados de
processos geomórficos complexos e inter-relacionados temporalmente incluindo processos químicos e
biológicos. Correlação: método que estabelece idade equivalente usando propriedades não-temporais.
Traços de fissão: quantificação dos vestígios deixados num cristal pela fissão do U238, o que causa
ruptura microscópica no mineral. 14C, K-Ar, Rb-Sr, U-Pb e Traços de Fissão produzem idades numéricas.
Fonte: modificado de Waters (1992).

RESULTADOS

==============IDADE NUMÉRICA ==============______________ (IN)

(IC) ____________ ====== IDADE CALIBRADA ========_______________

(IR_)___________________===== IDADE RELATIVA =========__________________

(ICo)______________________________=IDADE CORRELATA=

MÉTODO UTILIZADO
Sideral Isotópico Radiogênico Quím./Biol Geomórfico Correlação
.
14
Registro C Traços de fissão Linhagem Desenvolvi- Litoestratigra-
histórico de amino mento do perfil fia
ácido de solo
Dendrocro- K-Ar Termolumines- Hidratação Intemperismo Tefrocronolo-
nologia cência de dos minerais e gia
(não radioativo) obsidiana/ rochas
tefra
Varves Rb-Sr Liquenome- Modificação do Paleomagne-
tria entorno tismo
U-Pb Química do Taxa de Arqueomag-
solo deposição netismo
Química do Taxa de Fósseis e
verniz da deformação artefatos
rocha
Posição Isótopos
geomórfica estáveis

Variações
orbitais
Tectitos e
microtectitos
75

Figura 4.8. Bloco diagrama de uma sucessão fluvial hipotética composta por unidades
litoestratigráficas (1 a 6), paleossolo (PS), discordância erosiva (sobre a unidade 4) e os
registros das datações realizadas com o método do 14C. A unidade 3 foi depositada entre
7.500 e 6.000 A.P. A estabilidade da paleossuperfície na porção superior de 3, que deu início
à formação do paleossolo, iniciou a 6.000 A.P. e se estendeu até 4.500 A.P., quando ocorreu a
retomada da deposição que formou a unidade 4. A unidade 5 soterrou uma superfície erosiva
(discordância erosiva), fato bem demarcado no ponto de ocorrência de um canal preenchido,
onde a degradação da paisagem atingiu todas as unidades anteriormente sedimentadas. A
lacuna (vacuidade degradacional + hiato) varia de um máximo em X [7.000 anos, que é
diferença entre a idade da unidade 1 (10.000) e a idade obtida na porção inferior do
preenchimento do canal (3.000), que é a porção inferior da unidade 5], a um mínimo de
1.500 anos no ponto Y, que é a diferença entre a idade da porção superior da unidade 4
(4.000) e a idade da unidade 5 (2.500). A duração do hiato é obtida por comparação das
idades do topo da unidade 4 (4.000), que é o último período de deposição, e a porção mais
inferior da unidade 5 (2.500), que foi depositada sobre a discordância erosiva. A erosão deve
ter ocorrido, portanto, entre 4.000 e 3.000 A.P., o que significa que sua duração foi de, no
máximo, 1.000 anos. Por conseqüência, a vacuidade degradacional em X é de 6.000 anos, e
em Y, de 500 anos. Fonte: Waters (1992), modificado.

Correlação
76

A correlação implica o uso de evidências físicas (ou geológicas) e


biológicas (ou paleontológicas) para determinar a equivalência estratigráfica e
de idade, em áreas separadas, dentre duas ou mais unidades estratigráficas
(figura 4.9). A continuidade do depósito, as similaridades do material
componente e da seqüência, o grau de metamorfismo, as relações estruturais
e os tipos de minerais pesados estão entre as evidências geológicas, enquanto
a identidade das espécies, as semelhanças de assembléias fossilíferas, o grau
de evolução dos organismos e a percentagem de espécies viventes estão
entre as biológicas.

Figura 4.9. Perfil do sítio MS-MA-50 e a localização dos cortes C1, C3, C4 e C5. Os quatro
cortes permitem correlacionar a camada mais superior (húmica bioturbada), pois ela ocorre
em todos os perfis. Já a camada sotoposta (húmica, pouco perturbada com material
arqueológico) apenas é correlacionada nos cortes C1, C3 e C5, onde foi encontrada. Por sua
ausência no corte C4, é interpretada como uma lente. A geometria lenticular também é
inferida para a camada arenosa com conchas e muito material arqueológico porque ocorre
apenas corte C1 e C3, sendo, portanto, aí correlacionada. A camada de concreção carbonática
foi tomada como limite inferior dos cortes C1,C3 e C5, por ser, provavelmente, material
carreado das regiões superiores. Ela também foi entendida como uma lente, pois não foi
detectada no corte C4. Já camada areno-argilosa de deposição aluvionar foi reconhecida
apenas nos cortes C5 e C4, o que a caracteriza como outra lente. Essa deposição, juntamente
com a mais superior (camada húmica bioturbada), são as únicas que afloram. A mais inferior
das camadas (argilosa de deposição aluvionar), apesar de ter sido detectada somente nos
cortes C5 e C4, estende-se, segundo os autores, por todo o sítio. Fonte: Schmitz et al.
(1998), modificado.
77

Num sítio arqueológico, suas unidades litoestratigráficas ou


pedoestratigráficas e respectivos contatos devem ser, sempre que possível,
diretamente correlacionados à estratigrafia regional. Às vezes, por motivos
diversos, tais como erosão e soterramento, torna-se impossível observar a
continuidade física entre as unidades ou contatos, necessitando-se estabelecer
a correlação de modo indireto. Para tanto, se analisam certas características
das unidades estudadas, entre elas: (1) as litológicas ou pedológicas (textura,
estrutura, cor, etc.); (2) os contatos e a posição estratigráfica; (3) as
assembléias de fauna e flora e os artefatos; (4) as idades e (5) a associação
com uma camada-guia16 (marker bed) depositada em uma extensa região
durante um curto intervalo de tempo (por exemplo, cinzas vulcânicas).
Esse método permite correlacionar regiões geograficamente separadas,
mas que estiveram, no passado, submetidas a eventos similares e sincrônicos
de erosão, deposição e estabilidade. Esse sincronismo implica que regiões
diferentes possam ter condições geomórficas17 similares e que as mudanças
climáticas gerem respostas também similares, o que permite correlacionar
sucessões estratigráficas, ainda que distanciadas.
Outrossim, se ocorrem variações climáticas de uma região para a outra
ou se a paisagem de regiões diferentes responde de modo diverso a um
mesmo clima porque as suas condições geomórficas não são iguais, as
sucessões estratigráficas poderão ser desiguais. Impossibilita-se, nesses casos
a correlação entre as unidades deposicionais, as discordâncias e os
paleossolos. É possível ainda que alguns fatores, tais como o uso antrópico do
solo e o tectonismo, possam criar condições para que ocorra agradação,
degradação ou estabilidade em uma região e não em outra.
Além do clima, podem ser responsáveis pela formação de unidades
litoestratigráficas (deposição = agradação), pedoestratigráficas (estabilidade)

16
Camada de valor para correlação ou para delimitação estratigráfica.
17
Relevo, posicionamento do lençol freático, cobertura vegetal, etc..
78

e discordâncias erosivas (degradação = erosão) os eventos geológicos


(terremotos, erupções vulcânicas, eustasia18) e os culturais (abandonos ou
migrações).

Instrumentos básicos para orientação em campo: a bússola e o GPS

Consideram-se aqui instrumentos básicos para a orientação e para a


coleta de dados em campo, além do martelo, a bússola de geólogo e a
unidade receptora do GPS (Global Positioning System).
A bússola geológica (figura 4.10) é um instrumento de campo usado
para medir a direção e o mergulho das camadas e também, quando for o
caso, a paleocorrente delas. Trata-se de uma caixa metálica portátil com
forma prismática (modelo Brunton), que pode ser fechada por meio de uma
tampa articulada. Nesse tipo de bússola, há inversão dos pontos cardeais este
(E) e oeste (W), procedimento que permite a leitura direta das direções. Ela é
um instrumento composto, pois é formada pela bússola propriamente dita e
pelo clinômetro. Sua agulha imantada, oscilando sempre em um plano
horizontal, aponta para o pólo norte magnético, com o qual faz um ângulo que
representa o azimute19 magnético da direção. O valor desse ângulo é lido em
um limbo circular, em cujo centro se encontra suspensa a agulha. Ao
realizarmos a coincidência da linha que liga o centro de suspensão ao zero da
graduação com a reta cujo azimute desejamos saber, a ponta da agulha
deter-se-á sobre o traço da graduação do limbo que indica o valor de tal
azimute. A bússola geológica ainda conta com um nível circular no interior da
caixa para que se proceda ao nivelamento do plano instrumental.

18
Variação no nível do mar por razões diversas. Aumento ou diminuição das calotas polares é
a mais significativa.
19
Direção horizontal de uma linha, medida no sentido horário, a partir do norte magnético de
um plano referencial, comumente o meridiano.
79

O clinômetro constitui-se de um ponteiro que gira livremente ou por


ação manual em um plano vertical, sobre um limbo semicircular graduado,
sendo sua linha de fé20 perpendicular ao plano horizontal igual ao desvio zero
da graduação em relação ao fio de prumo, o que é indicado pela posição do
ponteiro sobre o limbo.
A tampa, cuja superfície interna possui um espelho, está presa a uma
articulação posicionada na extremidade sul da linha de fé, o que permite sua
inclinação em qualquer ângulo com a caixa. Junto à dobradiça, há um orifício
na tampa metálica e transparência do vidro; na porção oposta (ao orifício),
existe uma pequena pínula. Também há uma pínula longa, articulada, presa
no lado N (norte) da caixa da bússola.

Pínula pequena Espelho Nível longo Agulha imantada


Limbo circular

Caixa metálica

Orifício na tampa e
Pínula longa
transparência no
vidro
Tampa metálica Nível Limbo semicircular

Figura 4.10. Bússola de geólogo tipo Brunton. O clinômetro está posicionado, na fotografia,
sob a ponta não imantada da agulha (branca), onde também se localiza o norte. O oeste (W)
é bem visível. Foto: Carlos Henrique Nowatzki.

A grande maioria dos artefatos é encontrada nos solos ou em


paleossolos, não sendo raro que sedimentos detríticos também os contenham.
Nesse caso, os clastos foram sedimentados após sofrer algum tipo de

20
Linha que liga o centro da suspensão ao zero da graduação.
80

transporte, fenômeno que poderá gerar estruturas sedimentares que


permitam a medição das paleocorrentes, tais como estratificações cruzadas,
turboglifos, imbricação de seixos, etc. O procedimento é bastante simples: 1)
abre-se a caixa da bússola, na horizontal, e ajusta-se manualmente o
clinômetro (em algumas bússolas é o 0° do ponteiro) fazendo coincidir seu 0°
com os 90° do seu limbo semicircular, no lado N; 2) direciona-se a pínula
longa aberta na mesma direção para onde se deslocava a corrente, o que é
feito após a observação das estruturas sedimentares do depósito; 3) apóia-se
a bússola sobre as estruturas sedimentares com a pínula longa dirigida para a
jusante; 4) se a agulha ficar presa de encontro ao vidro, ela pode ser liberada
nivelando-se o instrumento, sem retirá-lo completamente do sedimentito, com
o auxílio do nível circular; 5) para encontrar a medida, gira-se a bússola, sem
levantá-la, até que esteja nivelada de acordo com o nível alongado; 6) a
leitura dos graus é feita pela observação, no limbo circular, dos graus
apontados pela extremidade imantada da agulha. A leitura dos graus é direta,
ou seja, o número resultante indica diretamente qual a direção e o sentido de
deslocamento da forma de leito que originou o depósito.
O Sistema de Posicionamento Global foi desenvolvido pelo
Departamento de Defesa dos Estados Unidos da América para uso militar. O
sistema é formado por 24 satélites colocados em seis órbitas diferentes, cada
uma delas com quatro satélites, orbitando a aproximadamente 12.000 milhas
acima da Terra.
Os satélites remetem sinais registrando o tempo e a data da órbita para
calcular a posição do satélite e a data de calendário. A unidade receptora
(figura 4.11) necessita de bons sinais de pelo menos três satélites para que
seja determinada a posição na superfície terrestre e de um quarto para obter
posicionamento tridimensional que determinará a altitude. A conversão dos
sinais dos satélites é feita pela unidade receptora que os transforma em
posição, velocidade e tempo estimado.
81

O número de satélites do sistema que orbita a Terra possibilita que o


GPS possa ofertar, durante 24 horas, os sinais do número mínimo de quatro
satélites em qualquer ponto da superfície terrestre, pois cada satélite cobre 28
graus e apresenta uma inclinação de 55 graus em relação à linha do Equador.

Figura 4.11. Pequeno receptor (11cm


x 5,5cm x 3cm) dos sinais dos satélites
do Global Positioning System – GPS. O
visor mostra que o aparelho estava em
processo de localização dos sinais dos
satélites. Foto: Carlos Henrique
Nowatzki.

Como o GPS foi desenvolvido para fins militares, os receptores de uso


civil apresentam uma degradação intencional (erro) imposta pelo
Departamento de Defesa dos USA, chamada Disponibilidade Seletiva
(Selective Availability, S.A.). Ela, em geral, é de 30m, mas pode atingir 100m,
ficando reservada aos militares uma melhor precisão. A Geometria dos
82

Satélites (posicionamento entre eles e em relação ao receptor) também afeta


a precisão porque os quatro satélites podem estar numa mesma região do
céu, ou seja, a geometria é pobre. Também a interferência devida à reflexão
do sinal em algum objeto (semelhante à imagem fantasma na televisão) afeta
a medida, pois o receptor interpreta que o satélite está mais longe do que na
realidade ele se encontra.
No visor do receptor, a localização pode ser observada em graus, que
indicam a latitude e a longitude onde se encontra o aparelho. A latitude é a
distância do Equador medida em graus no meridiano desse ponto. As linhas
imaginárias que circundam a Terra a partir do Equador chamam-se paralelos,
os quais variam de 0° (no Equador) a 90° (nos pólos) para o norte ou para o
sul. A longitude, linha imaginária que circunda a Terra é a distância do
meridiano de Greenwich, contado sobre o Equador. Ela também é medida em
graus, que variam de 0° (Greenwich) a 180° para este ou para oeste.

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