Vous êtes sur la page 1sur 381

TESE DE DOUTORAMENTO

Revitalização dos ambientes participativos e interactivos na


educação bilingue em Moçambique através do Translanguaging
e do Cross-Cultural Learning

Gervásio Absolone Chambo

2018

Mención internacional
Escola Internacional de Doutoramento

Gervásio Absolone Chambo

TESE DE DOUTORAMENTO

Revitalização dos ambientes participativos e interactivos na


educação bilingue em Moçambique através do Translanguaging e do
Cross-Cultural Learning

Dirixida polo doutor: Fernando Ramallo Fernández

Ano: 2018

“Mención internacional”
Dedicatória

À Niyezani, ao Kaluange e à minha esposa Carmen.

Filhos, estudem!
Agradecimentos

Queria, em primeiro lugar, agradecer ao meu supervisor, Prof. Doutor Fernando Ramallo pela
sua inteira dedicação, atenção e apoio incondicional à minha formação. Chego ao doutoramento
pela sua força e motivação impressionante que me concedeu desde o mestrado. Muito obrigado
Prof. Ramallo!
Ao meu tutor Prof. Doutor Joaquin Sueiro, chego ao fim através da sua mão. Obrigado. A todos
os professores do programa de doutoramento em estudos linguísticos e em especial ao Prof. Doutor
José M. García-Miguel. Agradeço por tudo!
Aos membros do GRADES agradeço imensuravelmente pela ajuda em momentos pontuais da
minha formação.
Em segundo lugar, vão os meus profundos agradecimentos às direcções das escolas primárias dos
distritos de Homoine, Inharrime e Jangamo que amavelmente me receberam e me apoiaram na
realização da pesquisa. Aos meus professores “co-investigadores” agradeço-vos pela vossa
paciência, coragem, colaboração activa em todo o processo da nossa pesquisa. Experimentámos,
observámos, analisámos e concluímos juntos e sempre juntos. Todos éramos alunos que
aprendíamos com os nossos alunos. Vencemos!
A todos os alunos e alunas vai o meu apreço e admiração. Vocês demonstraram que são
inteligentes, criativos e flexíveis. Foram abertos e impecáveis nas aulas. Mostraram-me novos
caminhos, os caminhos da uma nova pedagogia, a vossa pedagogia.
Em terceiro lugar, gostaria de exprimir os meus agradecimentos ao Prof. Catedrático Armindo
Ngunga, à Prof.a Doutora Letícia Cao e a Prof.a Doutora Ezra Chambal pela leitura crítica desta
tese. Ao Prof. Doutor Feliciano Chimbutane agradeço profundamente por ter aceite viajar para
tão longe a fim de ajudar-me na finalização desta formação. O seu gesto ubuntu orgulha-lhe.
“Nabonga ngu m´mbilu ni ngu cisofu n´gondisi”!
Aos colegas da nossa Secção de Línguas Bantu na Universidade Eduardo Mondlane em
Moçambique, a vossa força transformou-se em energia intelectual que me iluminou neste longo
percurso. Kanimambo Prof.a Doutora Samima, Prof. Doutor David Langa, Prof. Aurélio
Simango, Prof.a Nelsa Nhantumbo, “muxadis” Tembe e Mateus, “Filhou” Mpiuka, Magona e
Quiraque.
Aos meus amigos Paulino, Dimande e Laquene “kanimambo” por tudo.

I
E em último lugar, agradeço aos meus pais Bacelane, Diolinda, Pipia, Laura; aos meus irmãos
Ilídio, Lino, Joni, Alice, Eni e Maria. De vós recebi o suporte familiar e espiritual. “Nabonga ta
tinene!”
À minha esposa Carmen e aos meus filhos Niyezani e Kaluange, à “muzaya” Stela, obrigado pela
força, amor e carinho.

II
Resumo

Esta tese explora as práticas pedagógicas de translanguaging (García 2009, Creese & Blackledge 2010,
García & Wei 2014) e as de collateral learning e cross-cultural border (Jegede 1995, 1999, Jegede &
Aikenhead 1999, Aikenhead & Jegede 1999, Aikenhead 2001, 2006) com o objectivo de revitalizar,
por um lado, os ambientes participativos e interactivos dos alunos e, por outro lado, os níveis de
flexibilidade e dinamismo do processo de ensino-aprendizagem de Ciências Naturais nas classes
de pós-transição do programa transicional em Moçambique. Nas primeiras três classes antes da
transição (1ª, 2ª e 3ª classes), os alunos aprendem em ambientes de alta participação e de interacção
que proporcionam a flexibilidade e dinamismo do processo de ensino-aprendizagem em L1.
Porém, quando ocorre a transição da L1 para a L2 na 4ª classe, os alunos não mais participam
activamente no ensino-aprendizagem em L2 senão através de estratégias de participação passiva e
disfarçada (silêncio, murmúrio, voz baixa, coro, repetição, terminação de palavras e respostas
fechadas “sim/não”) sob insistência e persistência dos professores. Os alunos apresentam baixos
níveis de proficiência e de competência interaccional em L2 (bilingues emergentes) (García et al.
2008, García & Kleifgen 2018) e não têm a autonomia de participar e a interagir livremente em
L1 senão sob indução dos professores. A política linguística-pedagógica vigente no ensino-
aprendizagem e nas classes de pós-transição apregoa o princípio de separação das línguas através
da maior exposição da L2 e da evitação do uso da L1. A pesquisa desenvolveu-se com base no
método de pesquisa-acção participativa (Stringer 2007, McNiff & Whitehead 2006 e 2010) em
duas fases (I e II fases), envolvendo 15 professores, 170 alunos de 6 turmas da 4ª classe e 4 escolas
de educação bilingue EPC´s (duas escolas (EPC´s de Acção Inovadora), uma EPC de Crítica e
Validação e uma EPC de Controle). Os ciclos de práticas pedagógicas de translanguaging, collateral
learning e cross-cultural border desenvolveram-se nas EPC´s de Acção Inovadora sob monitoria das
práticas pedagógicas em L2 observadas na EPC de Controle.
A I fase da pesquisa desenvolveu ciclos de práticas pedagógicas de translanguaging nas quais, a L1
foi, gradualmente, introduzida nas escalas de 20-25% e de 30-50% nas aulas em L2 (I etapa). Os
alunos envolvidos nesta fase tinham dois trimestres de experiências de ensino-aprendizagem
baseadas nas práticas pedagógicas em L2. Na II etapa, desenvolveram-

III
se simultaneamente as práticas pedagógicas de translanguaging na escala de 30-50% de L1 nas aulas
em L2 e as de collateral learning e cross-cultural border (incorporação dos fundos de conhecimentos
socioculturais no ensino-aprendizagem) em turmas cujos alunos transitavam de um ensino-
aprendizagem em L1 para um ensino-aprendizagem baseado nas práticas pedagógicas propostas
nesta II fase. Os resultados de ambas as fases ilustram que as práticas pedagógicas de translanguaging
e as de collateral learning e cross-cultural border superam as estratégias de participação passiva e
disfarçada dos alunos na medida em que motivam a participação voluntária, espontânea,
competitiva, construtiva e flexível dos alunos em L1 e em L2 (práticas discursivas de translanguaging).
Os alunos conceptualizam e interpretam os conteúdos da ciência, constroem os conhecimentos
académicos e/o científicos a partir dos seus fundos de conhecimentos socioculturais (práticas
pedagógica de collateral learning e cross-cultural border) bem como a partir da L1 e de ambas as línguas.
Nestes ambientes, os alunos aprendem facilmente os conteúdos da ciência, desenvolvem, por um
lado, a proficiência e as competências interaccionais e metalinguísticas bilingues a partir da L1,
das práticas pedagógicas de translanguaging, do bilinguismo dinâmico (García 2009, García & Wei
2014) e flexível (Creese & Blackledge 2010) e, por outro lado, as competências cognitivas,
académicas e científicas transculturais a partir de visões policêntricas dos conteúdos da aula. A
pesquisa conclui que a optimização dos ambientes participativos e interactivos dos alunos bilingues
emergentes e a flexibilidade e o dinamismo do ensino-aprendizagem nas classes de pós-transição
dependem sobremaneira da: (i) re-valorização e liberalização linguística (discursiva), académica e
pedagógica da L1 e da L2 nas aulas; (ii) inclusão dos fundos de conhecimentos socioculturais locais
diante dos conteúdos da ciência e (iii) da centralização das aulas nos alunos. Neste contexto, os
professores tornam-se mediadores linguísticos, culturais e pedagógicas que, a partir de práticas
pedagógica e discursivas de translanguaging e incorporação dos fundos de conhecimentos
socioculturais locais nas aulas de Ciências Naturais encorajam a participação dos alunos bilingues
emergentes na aprendizagem crítica e construtiva dos conteúdos da ciência nos ambientes
transculturais e de bilinguismo dinâmico e flexível.

Palavras-chave: translanguaging, collateral learning e cross-cultural border, fundos de conhecimentos,


participação e interacção, educação bilingue.

IV
Resumen en español

Título: Revitalización de los ambientes participativos e interactivos en la educación bilingüe en


Mozambique a través del Translanguaging y del Cross-Cultural Learning.

Esta tesis aborda las prácticas pedagógicas de translanguaging (García 2009; Creese & Blackledge
2010; García & Wei 2014) y de collateral learning & cross-cultural border [en adelante, CL&C-CB]
(Jegede 1995, 1999; Jegede & Aikenhead 1999; Aikenhead & Jegede 1999; Aikenhead 2001a, 2006)
como una propuesta pedagógica aplicable a la enseñanza-aprendizaje de los cursos de post-
transición (4º y 5º) del programa de educación bilingüe en Mozambique. La finalidad es contribuir
a superar las barreras lingüísticas y pedagógicas que imposibilitan la participación e interacción
del alumnado bilingüe emergente en la construcción de los conocimientos académicos y/o
científicos en la enseñanza-aprendizaje, debido a que este alumnado posee un dominio bajo en L2
(portugués), el principal medio de instrucción.

A la luz de la teoría de la educación anticolonial (Dei 2001, 2002, 2010; Dei & Simmons 2012; Dei
& Asgharzadeh 2001; Shizha 2005, 2009, 2010; Shizha & Abdi 2014), esta tesis doctoral explora
la restitución, la incorporación y revalorización pedagógica de las identidades lingüísticas del
alumnado (L1´s) ante la L2 como medio de instrucción (pedagogía de translanguaging) y de sus
realidades culturales (fondos de conocimientos socioculturales: cosmovisiones y saberes locales;
prácticas, experiencias, técnicas, realidades cotidianos, hábitos y costumbres locales; recursos y
materiales didácticos locales) como recursos imprescindibles en la enseñanza de ciencia y en la
construcción de los conocimientos académicos y científicos (pedagogía de CL&C-CB) con el
objetivo de revitalizar, por un lado, los ambientes de participación y de interacción del alumnado
en los diferentes cursos y, por otro lado, la flexibilidad y el dinamismo del proceso de enseñanza-
aprendizaje de Ciencias Naturales.

En los primeros cursos antes de la transición, en los que la L1 (lenguas bantúes) es el medio de
instrucción (1º, 2º y 3º), el alumnado aprende en ambientes de alta participación y de interacción,
lo cual le proporciona la flexibilidad y el dinamismo necesarios para el proceso de enseñanza-
aprendizaje. Cuando tiene lugar la transición de la L1 a la L2, en 4º curso, el alumnado es bilingüe
emergente (García et al. 2008; García & Kleifgen 2018) con bajos niveles de dominio y de
cualificación interaccional en L2. En esta lengua, los discentes no participan de forma voluntaria,

V
activa y segura en la enseñanza-aprendizaje, sino a través de estrategias de participación pasiva y
disfrazada (silencio, murmullo, voz baja, coro, repetición, terminación de palabras y respuestas
cerradas “sí/no”) bajo la inducción, insistencia y persistencia del profesorado. Por tanto, el
alumnado no tiene la autonomía para participar e interaccionar libremente en L1, medio auxiliar
de la L2, porque en estos cursos se pregona el principio de criba de las lenguas a través de una
mayor exposición a la L2 y de evitar el uso de la L1 en la enseñanza-aprendizaje. Esta pedagogía
monolingüe desmotiva, intimida y silencia al alumnado; inflexibiliza y hace inviable el dinamismo
de las aulas, además de crear dificultades de comprensión de los contenidos académicos una vez
que el alumnado no domina la lengua de instrucción.

Desde el punto de vista metodológico (capítulo 4), la investigación se desarrolló a partir de una
propuesta de investigación-acción participativa (Stringer 2007; McNiff & Whitehead 2006, 2010),
en 3 fases diferentes (pre-fase, I fase e II fase) en diversas escuelas. En la pre-fase, se realizó la
observación de 14 cursos en 6 Escuelas Primarias y Completas ( EPC´s), de los cuales, en 10, la L2
fue el idioma de las diferentes disciplinas de los cursos de post-transición (4º y 5º curso), 1 curso de
Lengua Citshwa (4º curso) y 3 impartidos en L1 en los cursos previos a la transición (2º y 3º curso).
Esta pre-fase pretendía validar el problema de la investigación, observando críticamente los niveles
de participación y de interacción del alumnado, analizando los niveles de flexibilidad y de
dinamismo del proceso de enseñanza-aprendizaje en las disciplinas enseñadas en L1 antes de la
transición y en las enseñadas en L2 en los cursos de post-transición; y analizando los
posicionamientos del profesorado sobre el problema y el objetivo de la investigación.

En la I fase, se inició con ciclos de acción y de innovación (planificación, enseñanza, observación,


análisis/reflexión) de prácticas pedagógicas de translanguaging y de CL&C-CB desarrolladas en
dos EPC´s de Acción Innovadora y dos Grupos de Acción Innovadora (TAI´s) (8º y 6º curso en
cada EPC) y de observación de 6 cursos en la EPC de Control en un Grupo de Control ( TC) en
los que la enseñanza-aprendizaje se sustento en base a las prácticas pedagógicas en L2. El grupo-
objetivo en esta I fase frecuentaba el III trimestre del año 2016 tras dos trimestres de experiencias
de enseñanza-aprendizaje en L2. Esta I fase consistía en evaluar la participación y la interacción
del alumnado, así como la flexibilidad y el dinamismo de la enseñanza-aprendizaje con el fomento
de las prácticas pedagógicas de translanguaging, en las cuales la L1 era, gradualmente, introducida
en escalas de 20-25% y en las de 30-50% (I etapa) en las clases leccionadas en L2. Después de la
evaluación de los resultados constatados en esta I etapa, se pasó a la II etapa, que combinó las

VI
prácticas pedagógicas de translanguaging en una escala de 30-50% de L1 en las clases en L2 e
incorporó los fondos de conocimientos socioculturales a través las prácticas pedagógicas de
collateral learning & cross-cultural border.

Los resultados y las evidencias de esta I fase fueron extensivamente explorados en la II fase de la
investigación como una única propuesta pedagógica de enseñanza-aprendizaje de Ciencias
Naturales en alumnos de 4º curso que, en el I trimestre del año 2017, transitaban de una
enseñanza-aprendizaje en L1 para una enseñanza-aprendizaje basada en dos lenguas y dos
sistemas de conocimientos en el I trimestre del año 2017. En esta II fase, la investigación pretendía
analizar la validez pedagógica integrada del translanguaging y del CL&C-CB como una propuesta
pedagógica en la enseñanza-aprendizaje del alumnado bilingüe emergentes en los cursos de post-
transición (4º y 5º) a la luz de determinados criterios y patrones de juicio relacionados con la
participación y de interacción en las clases; flexibilidad, dinamismo y facilitación de la enseñanza-
aprendizaje, así como la construcción de los conocimientos académicos y científicos.

En la etapa final de la investigación, se abordaron los procesos de validación interna (efectuada


por dos grupos de profesores que participaron como colaboradores en los ciclos de acción
innovadora en la I y en la II fases en las dos EPC´s de Acción Innovadora) y de validación externa
(efectuada por dos grupos de profesores de educación bilingüe provenientes de dos EPC´s de
Crítica y Validación que co-participaban como evaluadores críticos y externos). Estos dos procesos
proponían, según criterios y patrones de juicio definidos, someter la investigación a la evaluación
y crítica a partir de posicionamientos de grupos de profesores de educación bilingüe y tejer
consideraciones sobre su validez como propuesta de enseñanza-aprendizaje en los cursos de post-
transición.

Los resultados de esta investigación ilustran que las prácticas pedagógicas de translanguaging y de
CL&C-CB superan las estrategias de participación pasiva y disfrazada de los alumnos en los cursos,
en la medida en que participan de forma voluntaria, espontánea y competitiva tanto en L1 como
en L2 para construir, por medio de prácticas discursivas bilingües, los conocimientos académicos
y/o científicos a través de puentes y/o transiciones transculturales entre sus fondos de
conocimientos socioculturales y los contenidos de ciencias (y viceversa). En estos ambientes, el
alumnado aprende fácilmente los contenidos académicos y/o científicos; desarrolla, por un lado,
la competencia y la cualificación interaccional y metalingüística bilingüe a partir del bilingüismo

VII
dinámico y flexible (García 2009; Creese & Blackledge 2010); por otro lado, desarrolla también las
cualidades cognitivas, académicas y científicas a través de visiones policéntricas.

El capítulo 5 describe los resultados de la participación y de interacción del estudiantado en las


prácticas lingüísticas y pedagógicas en L2 y en las primeras prácticas pedagógicas de
implementación planificada del translanguaging. Como hemos señalado, las prácticas lingüísticas
y pedagógicas en L2 inhibían la participación y la interacción de los alumnos y inflexibilizan las
clases. Ante varias preguntas del profesorado, el alumnado activaba el silencio y permanecía
cabizbajo. En las pocas ocasiones en que alguna persona se animaba a responderlas, recurría a una
voz baja, inaudible y con actitud de vergüenza. En el caso de otras preguntas, algunos alumnos y
alumnas se mostraban capaces de responderlas, pero titubeando, inseguros de sí mismos cuando
el profesorado invitaba a la participación, llamándolos por sus nombres. En estas escenas, el
profesorado recurría a las estrategias de persistencia y de insistencia –tanto lingüística como
pedagógica–, a partir de la cual formulaba y reformulaba repetidas veces una pregunta. En esos
casos, el alumnado transitaba del silencio al murmullo incomprensible. Algunas veces, algunos
alumnos y alumnas intervenían discretamente en voz baja entre los murmullos del grupo. Ante la
insistencia de los docentes, parte del alumnado emitía respuestas discretas y las repetían en voz
media, fingiendo y disfrazando su participación. Otras veces, era el propio profesorado el que
incentivaba las estrategias de participación pasiva y disfrazada del alumnado a través del coro, la
repetición y la terminación de palabras y o frases que alguna persona había iniciado.

El hecho de recurrir a estas estrategias tenía como objetivo exclusivamente que el alumnado
hablase un mínimo y garantizar así el incipiente progreso de la clase, de otra manera inflexible. En
otras ocasiones, el profesorado desbloqueaba el silencio y reactivaban la participación mediante el
recurso ocasional de la L1 (prácticas de translanguaging ocasional) y a través de algunos ejemplos
de los contextos socioculturales y cotidianos locales. En estos casos, el alumnado se activaba y
aumentaba su motivación para participar, exponiendo voluntaria y activamente varias respuestas
e ideas en la clase en L1. Ahora bien, cuando el discente retornaba al discurso en L2, se reactivaban
la desmotivación y las estrategias de participación pasiva y disfrazada. Las experiencias de fomento
de prácticas pedagógicas de translanguaging planificadas liberalizaban las lenguas y promovían
activamente las prácticas discursivas basadas en dos lenguas (discurso de translanguaging) en las
clases.

VIII
En definitiva, podemos decir que estas experiencias restituían niveles de participación y de
interacción del alumnado en ambas lenguas, con un claro enfoque hacia la L1. Así, el alumnado
se predisponía a participar en la clase. Esto era muy diferente a lo que ocurría en las clases en L2.
Es decir, cuando el translanguaging está presente, el alumnado se muestra ávido por intervenir, se
ofrece como voluntario y compite espontáneamente por participar en el aula.

Las evidencias de esta experiencia muestran que es posible superar los problemas de participación
y de interacción del alumnado en la clase, la inflexibilidad y el estatismo de las aulas y el aprendizaje
expositivo, pasivo y centralizado por parte del profesorado a través de un nuevo abordaje
pedagógico consistente en prácticas discursivas y pedagógicas de translanguaging.

El capítulo 6 aborda los resultados de las prácticas pedagógicas con translanguaging y de CL&C-
CB aplicadas en las TAI´s en contraste con las prácticas pedagógicas en L2 observadas
continuamente en la TC. El grupo-objetivo estaba compuesto por alumnos y alumnas que en 4º
curso transitaban de la enseñanza-aprendizaje en L1 a la pedagogía de translanguaging y de
CL&C-CB. El alumnado no se adaptó a las primeras prácticas pedagógicas de translanguaging.
Inicialmente participaban de manera discreta y sin dar la cara. A medida que los cursos se iban
desarrollando con este abordaje, se superaban las estrategias de participación pasiva (voz baja y
silencio) en un clima de inseguridad y de miedo y gradualmente aumentaba la participación de
forma discreta, es decir, respondían a las preguntas del profesorado, pero las asumían como
propias. Con la inclusión parcial de fondos de conocimientos, los discentes presentaban nuevos
patrones de participación y de interacción en las clases evidenciado a través del voluntarismo
espontáneo, competitivo y colaborativo. El alumnado participaba motivado y eufórico siempre que
las clases contemplaran las experiencias, los materiales y los recursos socioculturales locales en la
construcción de conocimiento académico. De esta forma, las prácticas discursivas de
translanguaging y la pedagogía de CL&C-CB se arraigaban como norma en las aulas. Alumnas y
alumnos participaban activamente en la construcción de los conocimientos académicos y
científicos a partir de sus fondos de conocimientos y aprendían L2 con base en la L1. Con el avance
del curso, el alumnado se familiarizaba con las nuevas prácticas pedagógicas, de tal modo que se
evidenciaban, por un lado, escenarios de voluntarismo espontáneo y competitivo para responder
a las preguntas efectuadas y, por otro lado, momentos de discusión entre los alumnos en la
conceptualización de los contenidos. Profesoras y profesores asumían el papel de mediadores

IX
lingüísticos y culturales que mediaban en el proceso de enseñanza-aprendizaje a la luz de las dos
pedagogías, exploradas como una y única propuesta pedagógica.

El capítulo 7 ilustra los resultados finales de la investigación, que evidencian la normalización de


las prácticas discursivas y pedagógicas de translanguaging y las prácticas pedagógicas de CL&C-
CB como una propuesta pedagógica única viable para la enseñanza-aprendizaje de Ciencias
Naturales entre los alumnos bilingües emergentes en los cursos de post-transición. Se evidenció
que los fondos de conocimientos y las prácticas discursivas y pedagógicas bilingües facilitan la
enseñanza-aprendizaje. El alumnado se convertía en sujeto activo y responsable en la construcción
de nuevos conocimientos académicos y/o científicos, incluso en situaciones en que los contenidos
de ciencias son complejos e incompatibles con las realidades y los conocimientos socioculturales
locales. En estos contenidos, el profesorado recurría a las experiencias prácticas a partir de los
materiales didácticos locales. Los alumnos y las alumnas participaban de las experiencias prácticas
observándolas con atención y comentando sobre la manifestación de los fenómenos científicos y
respondiendo a las preguntas planteadas en la dinámica docente. Las experiencias prácticas
concedían oportunidades pedagógicas para que el alumnado observase, reflejase y participase de
la construcción de conocimientos académicos, explicando los fenómenos observados en un
discurso bilingüe y en ambientes de emoción (alegría y diversión). En estos ambientes, para
elaborar sus reflexiones y conclusiones sobre los fenómenos naturales científicos, el alumnado
recurría a sus fondos de conocimientos socioculturales a través de sus L1´s y después interpretaban
y traducían cautelosamente sus intervenciones a la L2 de forma flexible y fácil. Además, se
convertían en voluntarios para explicar los fenómenos naturales a partir de sus conocimientos y,
en esas situaciones, surgían momentos de discusión que servían para promover la discrepancia, la
discusión y la rectificación.

El capítulo 8 aborda el proceso de validación de los resultados de la propuesta pedagógica


planteada en la investigación a través de su sometimiento a la crítica y evaluación por parte del
profesorado que participó activamente en las dos fases de la investigación como colaboradores
(proceso de validación interna) y por parte del profesorado que fue invitado a evaluar externamente
los resultados y las evidencias de las etapas iniciales, intermedias y finales de la investigación
(proceso de validación externa). Los docentes desarrollaron perspectivas, reflexiones y
posicionamientos críticos sobre los resultados y las evidencias de la investigación a partir de
determinados criterios y patrones de juicio. En ambos procesos, evaluaron críticamente la

X
autenticidad de los resultados de la investigación y reflexionaron sobre la viabilidad de la propuesta
pedagógica basada en las prácticas discursivas y pedagógicas de translanguaging y en los fondos
de conocimientos propuestos por la pedagogía de CL&C-CB en la enseñanza y aprendizaje de
Ciencias Naturales en los cursos de post-transición (4º y 5º).

Las visiones y los posicionamientos críticos de los profesores en ambos procesos de validación
interna y externa ilustraron que la propuesta pedagógica planteada constituye un beneficio de
extrema relevancia para el alumnado y para los propios profesores. Para ellos se evaluaron los
graves problemas que caracterizan la enseñanza-aprendizaje en L2 en los cursos de post-transición
y las evidencias de una necesaria reversión si se pretende optimizar la participación de los alumnos
y la construcción de los conocimientos científicos. En sus posicionamientos, los profesores y las
profesoras se mostraron unánimes al afirmar que la propuesta en estudio tiene un potencial
pedagógico, pues permite que el alumnado tenga la libertad de participar en las clases en una y/o
en otra lengua y de exponer sus fondos de conocimientos. Los materiales didácticos delimitan la
clase y atraen al estudiante y por eso, participa de forma abierta en una o en la otra lengua
movilizada en las prácticas docentes. Estas ventajas no solo son beneficiosas para la enseñanza-
aprendizaje de contenidos científicos, sino que además son necesarias pues favorecen el
aprendizaje de la L2 incluso con bajoa niveles de competencia. En estos ambientes, las
posibilidades para aprender, conceptualizar y comprender los contenidos a los que se expone el
alumando aumentan. No obstante, en los posicionamientos unánimes del profesorado, detectamos
momentos de divergencia y de discusión en lo que concierne al uso arbitrario de las lenguas en los
enunciados o el uso excesivo de la L1 en las clases. Algunos profesores y profesoras se posicionaban
a favor dela relevancia del fomento de las prácticas pedagógicas y discursivas de translanguaging
siempre que se sean usadas con algunas restricciones o reglas, sobre todo cuando el alumnado
demuestre dominio de la L2; otros, en cambio, sugerían mantener las lenguas separadas una de la
otra para evitar que el alumnado trabaje excesivamente con la L1 en vez de la L2. Este argumento
se establecía a partir de la justificación de que el discente puede no aprender la L2 y, como
consecuencia, puedan surgir problemas adicionales en el examen de 5º curso que, con el programa
vigente, ha de ser realizado en L2. Ante esta divergencia, se puso sobre la mesa un posicionamiento
que fundamentaba una visión contraria a los posicionamientos anteriores. Así, para uno de los
docentes, de acuerdo con las prácticas discursivas de translanguaging experimentadas, se constata
un fortalecimiento y un refuerzo de la L2, siempre que la enseñanza-aprendizaje promueva estas

XI
prácticas en los cursos precedentes a la transición. Esto se debe a que tal promoción favorecerá las
facilidades de comprender los contenidos académicos en dos lenguas, desarrollando así la
competencia lingüística bilingüe que habilitará al alumnado a realizar el examen de 5º curso con
mucha seguridad.

Las sesiones de evaluación crítica de los resultados de esta investigación suscitaron oportunidades
de reflexión entre el profesorado sobre los problemas de la transición y el impacto de la enseñanza-
aprendizaje en base a la propuesta pedagógica en estudio y la metodología usada. Para ello, se
discutieron los problemas de la transición a partir de la confrontación crítica que los docentes
efectuaron entre las evidencias y los resultados de la investigación y sus experiencias pedagógicas
como profesionales que trabajan en programas de educación bilingüe en Mozambique. Los
profesores y las profesoras validaron favorablemente la propuesta pedagógica en investigación a
sabiendas de que, además de proporcionar ventajas pedagógicas, lingüísticas y culturales al
alumnado, concedía oportunidades pedagógicas, planteaba nuevos horizontes y constituía un
momento de auto-reflexión y aprendizaje para el docente. Todo ello permitirá a los profesores
innovar en sus prácticas pedagógicas en los cursos de post-transición, explorando las prácticas y
experiencias desarrolladas en los ciclos de la investigación. De manera consensuada, los profesores
y las profesoras concordaron en la viabilidad de la propuesta para la enseñanza-aprendizaje en los
cursos de post-transición y sugirieron que fuera legitimado e implementado en el sistema educativo.

Las conclusiones de la investigación ilustran que la optimización de los niveles de participación y


de interacción del alumnado –que favorece la flexibilidad y del dinamismo de las aulas en los cursos
de post-transición– depende, en primer lugar, de la revalorización de la L1 y de las visiones
socioculturales de los medios en los cuales el alumnado vive. Esto implica que la enseñanza de
ciencias debe conceder espacios para que la L1 y las visiones socioculturales del medio propio de
los discentes formen parte de todo el proceso de enseñanza-aprendizaje, en conjunción con la L2
y las visiones universales y “científicas” que integran el programa de contenidos de Ciencias
Naturales. La combinación de L1 y la L2 como un único repertorio pedagógico y discursivo
(translanguaging) en las clases y la interacción entre las visiones de los fondos de conocimientos
socioculturales y las visiones de los conocimientos universales (CL&C-CB) permiten que el proceso
de enseñanza-aprendizaje se desarrolle en base a las prácticas pedagógicas bilingües y
transculturales. A medida que son conscientes de los resultados de esta investigación, la
consecución de esta propuesta pedagógica suscita altos niveles de motivación entre el alumnado,

XII
favoreciendo su participación, competitiva y constructiva. Por tanto, concluimos que, si los
docentes promueven métodos de enseñanza centrada en el alumnado, dicha praxis elevará los
niveles aceptables de flexibilidad y de dinamismo de la enseñanza-aprendizaje. A partir de esta
postura pedagógica por parte del profesorado, el alumnado podrá capitalizar las oportunidades y
las facilidades de aprendizaje, además de participar activa y críticamente en la construcción de los
conocimientos académicos y/o científicos; todo ello facilita el desarrollo de la competencia, la
cualificación interaccional y metalingüística bilingüe a partir de la L1.

Palabras clave: participación e interacción, translanguaging, collateral learning e cross-cultural border,


fondos de conocimientos, cursos de post-transición, educación bilingüe.

XIII
Índice
Agradecimentos....................................................................................................................... I
Resumo ................................................................................................................................. III
Resumen en español ............................................................................................................... V
Lista de figuras e de tabelas ............................................................................................... XXI
Lista de convenções de transcrição ................................................................................... XXII
INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 1

PRIMEIRA PARTE. Abordagem Teórica e Metodológica da Pesquisa.................. 5


CAPÍTULO 1. Aproximação ao objecto de estudo: currículo, línguas e pedagogia .....7
Introdução .............................................................................................................................. 7
1.1 Educação bilingue em Moçambique ............................................................................. 7
1.1.1 Currículo de Educação Bilingue.................................................................................... 9
1.2 Problemas curriculares e linguísticos ............................................................................... 10
1.3 Objectivos da pesquisa..................................................................................................... 13
1.4 Perguntas da pesquisa ...................................................................................................... 14
1.5 Justificação da pesquisa................................................................................................... 16
CAPÍTULO 2. Marco teórico .......................................................................................... 19
Introdução ............................................................................................................................ 19
2.1 Teoria anti-colonial e a contínua descolonização ............................................................. 19
2.1.1 Teoria da educação anti-colonial .................................................................................. 23
2.1.1.1 Educação, línguas coloniais e a colonização mental.................................................... 27
2.1.1.2 Educacão anti-colonial: o poder das línguas africanas ................................................ 34
2.1.1.3 A instrução em línguas africanas ................................................................................ 38
2.1.2 Educação anti-colonial: os conhecimentos indígenas na escola ...................................... 41
2.1.2.1 Indigenização e africanização da educação ................................................................ 46
2.1.2.2 Interacção intercultural entre os conhecimentos indígenas e os ocidentais .................. 48
2.2 Pedagogia linguística bilingue e cultural ........................................................................... 50
2.2.1 O paradigma do monolinguismo no ensino bilingue ..................................................... 50
2.2.2 Translanguaging: pedagogia bilingue ................................................................................ 52
2.2.2.1 Translanguaging na aula ................................................................................................ 54

XV
2.2.2.2 Translanguaging como pedagogia flexível e dinâmica.................................................... 56
2.3 Pedagogia cultural e dois conhecimentos ......................................................................... 59
2.3.1 Pedagogia collateral learning ............................................................................................. 60
2.3.2 Pedagogia cross-cultural learning ....................................................................................... 62
CAPÍTULO 3. Revisão da literatura ............................................................................. 67
Introdução ............................................................................................................................ 67
3.1 Translanguaging como pedagogia prática bilingue .............................................................. 67
3.1.1 Práticas de translanguaging: participação e interacção dos alunos na aula ......................... 67
3.1.1.1 O papel da L1 no ensino em L2 ................................................................................. 68
3.1.1.2 Code-switching e a interacção na aula ....................................................................... 70
3.1.1.3 Translanguaging e a interacção na aula ......................................................................... 73
3.1.2 Translanguaging e a aprendizagem da ciência .................................................................. 76
3.1.2.1 Construção dos significados ....................................................................................... 77
3.2 Border crossing e collateral learning: pedagogia de ciências universais e socioculturais ............. 80
3.2.1 Crossing-cultural border na aula de ciência ......................................................................... 83
3.2.2 Collateral learning na aula de ciência ................................................................................ 87
3.2.2.1 Fundos de conhecimentos e experiências extra-escolares ............................................ 89
CAPÍTULO 4. Desenho metodológico da pesquisa .................................................... 93
Introdução ............................................................................................................................ 93
4.1 Local da pesquisa............................................................................................................. 93
4.1.1 Participantes da pesquisa .............................................................................................. 94
4.2 Desenho da pesquisa........................................................................................................ 95
4.2.1 Pré-fase - Pesquisa da evidência e da validação do problema......................................... 95
4.2.2.1 Selecção das EPC´s e formação dos grupos de pesquisa ............................................. 97
4.2.1.1.1 EPC´s de Acção Inovadora ..................................................................................... 97
4.2.1.1.2 EPC de Controle..................................................................................................... 99
4.2.1.1.3 EPC´s de Crítica e Validação .................................................................................. 99
4.2.2 I fase - pesquisa preliminar.......................................................................................... 100
4.2.2.1 Ciclos da I etapa: práticas de translanguaging .............................................................. 101
4.2.2.2 Ciclos da II etapa: práticas de translanguaging e de collateral learning e cross-cultural border101
4.2.3 II fase - pesquisa de validação ..................................................................................... 102

XVI
4.2.3.1 Ciclos de aulas ......................................................................................................... 103
4.2.3.1.1 Ciclos de planificação e de acção........................................................................... 103
4.2.3.1.2 Ciclos de observação e de análise e/ou reflexão .................................................... 104
4.3 Colecta de dados ........................................................................................................... 105
4.3.1 Observação................................................................................................................. 105
4.3.1.1 Notas de campos ...................................................................................................... 106
4.3.1.2 Diários de pesquisa .................................................................................................. 106
4.3.1.3 Fichas de observação e reflexão de aulas .................................................................. 106
4.3.2 Conversas críticas ....................................................................................................... 107
4.3.3 Gravação áudio-visual ................................................................................................ 107
4.3.4 Entrevistas grupais não-estruturadas ........................................................................... 108
4.4 Análise de dados ............................................................................................................ 108
4.4.1 Sistematização e codificação dos dados ....................................................................... 109
4.4.2 Triangulação de dados................................................................................................ 109
4.4.3 Processo de validação da pesquisa ............................................................................... 110
4.5 Aspectos éticos ............................................................................................................... 111
4.6 Limitações da pesquisa .................................................................................................. 112

SEGUNDA PARTE. Resultados da Investigação.............................................115


CAPÍTULO 5. Iniciação às práticas de translanguaging e seu impacto na
participação e interacção na aula ............................................................................... 117
Introdução .......................................................................................................................... 117
5.1 Práticas linguísticas e pedagógicas em L2 ....................................................................... 117
5.1.1 Persistência linguística e pedagógica do professor e as estratégias de participação e
interacção dos alunos........................................................................................................... 117
5.1.2.1 Murmúrio e o silêncio .............................................................................................. 121
5.1.2.2 Coro e repetição ...................................................................................................... 125
5.1.1.2 Voluntários a dedos ................................................................................................ 127
5.1.3 Práticas ocasionais de translanguaging e a participação e interacção dos alunos em L1 ... 130
5.1.3.1 Reformulação, transição à L1 e a participação dos alunos........................................ 130
5.1.3.2 Participação e interacção dos alunos em L1 diante dos conhecimentos socioculturais.... 134
5.1.3.3 Coro e interacção em L1.......................................................................................... 137

XVII
5.2 Experiências práticas e pedagógicas de translanguaging planificado ................................... 140
5.2.1 Reacção linguística e pedagógica dos alunos ............................................................... 140
5.2.1.1 Revitalização dos ambientes participativos e interactivos ......................................... 143
5.2.1.2 Participação espontânea e competitiva ..................................................................... 146
5.2.1.3 Discurso dominante em L2 e o impasse à participação ............................................. 152
CAPÍTULO 6. Translanguaging, conhecimentos socioculturais, participação e
interacção no ensino-aprendizagem ........................................................................... 155
Introdução .......................................................................................................................... 155
6.1 Ciclos I e II: Despertar a participação aberta e flexível dos alunos ................................. 155
6.1.1 Reacção dos alunos às primeiras práticas do translanguaging na aula ............................. 157
6.1.1.1 Silêncio e voz baixa.................................................................................................. 157
6.1.1.2 Participação discreta e às escondidas ........................................................................ 161
6.1.1.3 Participação incrementada pelos materiais didácticos............................................... 164
6.1.1.4 Discussão dos alunos na aula.................................................................................... 169
6.1.2 Padrões de participação e interacção dos alunos ......................................................... 171
6.1.2.1 Voluntarismo participativo ...................................................................................... 172
6.1.2.2 Voluntarismo espontâneo e competitivo................................................................... 178
6.1.2.3 Aprendizagem participativa e colaborativa .............................................................. 180
6.2 Ciclo III: Interacção e participação e a ponte entre os conhecimentos socioculturais e os
universais............................................................................................................................. 185
6.2.1 Negociação interactiva dos conhecimentos e das línguas ............................................. 186
6.2.1.1 Interacção dinâmica e eufórica dos alunos diante de recursos locais ......................... 191
6.2.1.2 Construção participativa e interactiva de novos conhecimentos ............................... 198
CAPÍTULO 7. Normalização pedagógica das práticas de translanguaging,
collateral learning e cross-cultural border nas aulas............................................... 205
Introdução .......................................................................................................................... 205
7.1 Ciclo IV e V: Participação e interacção a partir de materiais didácticos locais ............... 205
7.1.1 Enraizamento dos ambientes participativos e interactivos, flexíveis e dinâmicos .......... 206
7.1.1.1 Interacção espontânea e emocional dos alunos no ambiente de aula ........................ 211
7.1.1.2 Reflexão e explicação dos fenómenos naturais em L1 e em L2 ................................. 216
7.1.1.3 Explicação dos fenómenos naturais a partir das experiências locais .......................... 220

XVIII
7.2 Ciclo VI: Aprendizagem de novos conhecimentos a partir dos recursos linguísticos e das
materiais locais .................................................................................................................... 227
7.2.1 Facilidade de aprendizagem de conteúdos académicos mais exigentes ........................ 228
7.2.1.1 Experiências práticas e a aprendizagem de novos conhecimentos............................. 229
7.2.1.2 Conceptualização científica dos fenómenos da ciência ............................................. 236
7.2.1.3 Elaboração interactiva e dinâmica do texto na aula.................................................. 241
7.1.1.4 Avaliação criativa e interactiva da aprendizagem de olhos vendados ........................ 245
CAPÍTULO 8. Avaliação crítica dos professores sobre a viabilidade e validade
pedagógica da pesquisa................................................................................................. 249
Introdução .......................................................................................................................... 249
8.1 Impacto pedagógico da pesquisa: posicionamentos e visões críticas dos professores ........ 250
8.1.1 Visões críticas dos professores no processo de validação interna .................................. 250
8.1.1.1 Co-participação dos alunos ...................................................................................... 250
8.1.1.2 Co-participação colaborativa através de pontes entre as línguas e os conhecimentos 252
8.1.2 Visões críticas dos professores no processo de validação externa ................................. 255
8.1.2.1 Participação aberta, activa e voluntária .................................................................... 256
8.1.2.2 Níveis de interacção e de participação ...................................................................... 258
8.1.2 3 Facilitação do ensino-aprendizagem......................................................................... 261
8.1.2.4 Considerações gerais: delimitação das línguas e aprendizagem da L2 ....................... 264
8.1.3 “Aprendemos sim e daqui em diante o que nos espera?” ............................................. 269
8.1.3.1 “Antes dávamos aulas mas agora construímos o conhecimento” .............................. 269
8.1.3.2 “E agora, como nos deixa?” ..................................................................................... 271

TERCEIRA PARTE. Discussão e Conclusões ................................................273


CAPÍTULO 9. Discussão e conclusões ........................................................................ 275
Introdução .......................................................................................................................... 275
9.1 Discussão dos resultados ................................................................................................ 278
9.1.1 Pergunta 1 .................................................................................................................. 278
9.1.1.1 A L1 activa a participação dos alunos ...................................................................... 279
9.1.1.2 Participação nas práticas de translanguaging................................................................ 281
9.1.1.3 Super-participação: cruzamento entre o translanguaging e os fundos de conhecimentos .... 282
9.1.2 Pergunta 2 .................................................................................................................. 285

XIX
9.1.2.1 Aprendizagem construtiva ....................................................................................... 285
9.1.2.2 Pontes entre os conhecimentos e entre as línguas ..................................................... 288
9.1.2.3 Clima dos alunos no ambiente da aula ..................................................................... 290
9.1.3 Pergunta 3 .................................................................................................................. 291
9.1.3.1 Novos ambientes: flexibilidade e dinâmica das aulas ................................................ 292
9.1.3.2 Mãos e mãos no ar e “sou eu… sou eu…” ............................................................... 294
9.2 Implicações práticas da pesquisa .................................................................................... 295
9.2.1 Oportunidades de estratégias inovadoras de ensino..................................................... 298
9.2.1.2 Adaptar e potenciar as práticas dos professores ........................................................ 300
9.2.1.3 Capitalização das oportunidades de fluxo das práticas de biliteracia......................... 301
9.3 Recomendações ............................................................................................................. 302
Conclusões .......................................................................................................................... 305
Referências bibliográficas ............................................................................................ 309
Anexos ............................................................................................................................... 327

XX
Lista de figuras e de tabelas

Figura 1: Modelo de programa de transição com características de manutenção

Diagrama: Ciclo de pesquisa-acção adoptado nesta pesquisa

Tabela 1: Observação de aulas na pré-fase da pesquisa

Tabela 2: Aulas de Acção Inovadora e de Controle

Tabela 3: Programa de conteúdos seleccionados na II fase da pesquisa

Tabela 4: Critérios e padrões de julgamento de aulas dos ciclos I e II

Tabela 5: Critérios e padrões de julgamento de aulas do ciclo III

Tabela 6: Critérios e padrões de julgamento de aulas dos ciclos IV e V

Tabela 7: Critérios e padrões de julgamento de aulas ciclo VI

Tabela 8: Posicionamento dos professores sobre a participação aberta, activa e voluntária dos

alunos

Tabela 8: Posicionamento dos professores sobre os níveis de interacção e participação dos alunos

Tabela 9: Posicionamento dos professores sobre a facilitação do ensino-aprendizagem

Tabela 10: Posicionamentos convergentes dos professores

Tabela 11: Posicionamentos divergentes dos professores

XXI
Lista de convenções de transcrição

(( )) comentários do pesquisador
MAÍSCULA ênfase acentuado
↑ tom elevado
↓ tom baixo
( ): interveniente não identificado
pa-la-vra silabação ou segmentação das palavras
(.) pausa curta
(0.3) pausa por segundo (s)
= continuação de um/dois intervenientes
: alongamento do som
- interrupção do discurso e ou da palavra
°° voz baixa
() transcrição impossível, inaudível
(...) omissão
-- retificação da ideia e ou desvio de tema
(2x) repetição do enunciado oral duas vezes
itálico língua moçambicana (citshwa ou cicopi)
“entre aspas” leitura no quadro, caderno ou livro
[ sobreposição de discursos
? interrogação
. fim e início de palavras
<> fala pausada
>< fala rápida
(palavra) tradução

XXII
Introdução

Esta tese centra-se sobre os aspectos pedagógicos da educação bilingue em vigor em Moçambique,
um país multilingue e multicultural formado por cerca de 23 línguas moçambicanas de origem
bantu, 5 línguas afro-asiáticas (árabe, gujarati, memane, indu e urdu), 1 língua de sinais e 1 língua
oficial, o português (Lopes 2004). A educação bilingue é desenvolvida através do programa
transicional em línguas moçambicanas (L1´s) e em língua oficial, o português (L2). Este programa
é a única experiência de integração das línguas bantu moçambicanas no Sistema Nacional de
Educação no Moçambique pós-independência.
No passado colonial, as línguas bantu moçambicanas (“línguas indígenas”) foram usadas para fins
de colonização religiosa (evangelização e expansão do cristianismo) e linguística (expansão e a
assimilação da língua e da cultura portuguesa) entre os nativos através do ensino de
adaptação/ensino rudimentar (Mazula 1995; Mondlane 1995). Estes dois sistemas visavam
civilizar os alunos indígenas, ensinando-lhes a L2 e as habilidades de leitura, escrita e contagem
durante dois anos (1ª e 2ª classes). As línguas moçambicanas serviam de instrumentos para facilitar
o ensino da L2 (Mondlane 1995). A posterior, os alunos realizavam o exame em L2 português para
aceder ao ensino primário leccionado em L2 (Mazula 1995; Mondlane 1995).
No actual programa transicional, os alunos assimilam a L2 através da escolarização inicial em L1
(1ª, 2ª e 3ª classes). Os alunos aprendem a L1 para que possam aprender em L2 nas classes de pós-
transição, porém a transição para a L2 efectua-se de forma precoce (4ª classe), isto é, transitam ao
ensino em L2 proficientemente não desenvolvida. Por conseguinte, os alunos têm dificuldades para
aprender em L2 sem a inclusão da L1 à semelhança dos alunos de diferentes países africanos que
frequentam os programas de transição precoce (Heugh 2011a, 2011b).
A partir de 2018, o Ministério de Educação e Desenvolvimento Humano (MINEDH) iniciou com
a expansão nacional do programa transicional. Contudo, as pesquisas realizadas ao longo dos 14
anos nos quais hai um projecto-piloto (2004-2018) mostram que a transição precoce da L1 para
L2 na 4ª classe, as abordagens usadas no ensino do português como L2 e a pedogogia de separação
das línguas a favor da maior exposição da L2, bem como a desvalorização da L1 são alguns dos
principais factores por detrás dos problemas de participação e de interacção dos alunos nas classes
de pós-transição (Chimbutane 2011, 2012 e 2015). A baixa proficiência dos alunos em L2 e a
exclusão e/ou marginalização da L1 nas classes de pós-transição têm dificultado a consecução de

1
uma aprendizagem eficiente, participativa e construtiva dos alunos em idade propícia para o
desenvolvimento da capacidade cognoscitiva e intelectual. Os professores encaram muitas
dificuldades para garantir que os alunos aprendam em L2 como fora nas classes antes da transição.
Esta tese entende que a liberalização pedagógica das L1´s dos alunos e a incorporação pedagógica
dos seus fundos de conhecimentos socioculturais (conhecimentos prévios, saberes culturais e locais,
práticas, experiências, realidades quotidianas, visões, hábitos e costumes socioculturais) são
algumas das alternativas que superam as dificuldades de aprendizagem dos alunos e de ensino dos
professores em L2 nas classes de pós-transição (4ª e 5ª classes). Por esta razão, a pesquisa desta tese
focalizou-se a avaliar a viabilidade e a validade da proposta pedagógica centrada nas práticas
pedagógicas de translanguaging e nas de collateral learning e cross-cultural border no ensino-aprendizagem
de Ciências Naturais na 4ª classe por forma a restituir os ambientes participativos e interactivos
dos alunos e relançar os níveis de flexibilidade e de dinamismo do processo de ensino-
aprendizagem.
A tese está estruturada em 3 partes e 9 capítulos. A primeira parte apresenta 4 capítulos teóricos.
O capítulo 1 contextualiza a pesquisa, descrevendo o seu problema, a sua justificação e os seus
objectivos. A seguir, o capítulo 2 debruça-se sobre o marco teórico que alicerça esta pesquisa (teoria
da educação anti-colonial) e as teorias pedagógicas bilingues (translanguaging) e transculturais
(collateral learning e cross-cultural border) com as quais se materializa a teoria da educação anti-colonial.
O capítulo 3 restringe-se a efectuar a revisão literatura referente ao papel e o valor pedagógico das
línguas bem como dos aspectos socioculturais na aprendizagem construtiva dos conhecimentos
académicos/científicos. O capítulo 4 descreve detalhadamente o desenho metodológico desta
pesquisa (pesquisa-acção participativa) a partir do qual se desenvolveram ciclos de acação
(planificação, leccionação, observação e reflexão/análise) com vista a superar o problema da
participação e inflexibilidade dos alunos e das aulas nas classes de pós-transição.
A segunda parte é constituída por 4 capítulos referentes aos resultados evidenciados nas duas fases
da pesquisa. O capítulo 5 ilustra os resultados referentes ao cenário de aulas leccionadas em L2 e
parte dos resultados que surgiram na planificação de algumas experiências práticas de introdução
da L1 através da pedagogia de translanguaging. O capítulo 6 analisa os resultados iniciais relativos
ao fomento das pedagogias de translanguaging e das de collateral learning e cross-cultural border e o
despertar das primeiras atitudes participativas dos alunos bem como os resultados subsequentes no
que concerne à negociação dos conhecimentos. Nesta mesma parte, consta o capítulo 7 que

2
evidencia o enraizamento e a normalização das práticas pedagógicas de translanguaging e collateral
learning e cross-cultural entre os alunos, no processo de ensino-aprendizagem. Neste capítulo
evidenciam-se resultados finais sobre quão a proposta pedagógica em estudo respondeu ao
problema da pesquisa. Por fim, o capítulo 8 reflecte sobre os posicionamentos críticos dos
professores no âmbito da validação interna e externa dos resultados alcançados pela pesquisa.
A terceira e última parte, é constiuída pelo capítulo 9, onde se discute, na generalidade, os
resultados pedagógicos alcançados à luz das perguntas e dos objectivos desta pesquisa. No fim deste
capítulo, expõem-se as reflexões sobre as implicações práticas e pedagógicas desta pesquisa bem
como uma proposta de recomendação (política linguística-pedagógica) específica para o ensino-
aprendizagem nas classes de pós-transição.

3
PRIMEIRA PARTE. Abordagem Teórica e
Metodológica da Pesquisa
CAPÍTULO 1. Aproximação ao objecto de estudo: currículo, línguas e
pedagogia

Introdução

Neste capítulo contextualizo e delimito a minha pesquisa, debruçando-me resumidamente sobre


a educação bilingue em Moçambique, os problemas curriculares que afectam pedagogicamente
o ensino-aprendizagem nas classes de pós-transição1, com destaque para a participação e a
interacção dos alunos nos ambientes de sala de aulas, apresento os objectivos e as perguntas
centrais desta pesquisa e por fim, justifico as razões que sustentam a realização desta pesquisa.

1.1 Educação bilingue em Moçambique

A educação bilingue em Moçambique introduziu as línguas moçambicanas no Sistema Nacional


de Educação (SNE) em resposta aos altos índices de repetências e desistências dos alunos nas
décadas de 80 e 90 devido ao facto de português (L2), língua de instrução, não ser a L1 dos alunos
ingressados na escola (Benson 1997).
Com vista a reduzir os índices de reprovação e a qualidade de ensino-aprendizagem, o Instituto
Nacional de Desenvolvimento da Educação (INDE) concebeu o projecto piloto denominado
PEBIMO “Uma Experiência de Escolarização Bilingue de Moçambique” desenvolvido de 1993
a 1997 nas províncias de Gaza (Xichangana e Português) e Tete (Cinyanja e Português). Este foi
o primeiro projecto e experiência pioneira de educação bilingue em Moçambique. Em

1O programa transicional de Moçambique prevê que a L1 seja o meio de instrução nas primeiras três classes de
ensino–aprendizagema (1ª, 2ª e 3ª). Na 4ª classe ocorre a transição do meio de instrução L1 (língua moçambicana)
para a L2 (português). A partir desta classe, a L2 assume o papel de língua de instrução nas restantes quatro classes
(4ª, 5ª, 6ª e 7ª). Nestes termos, a designação “classes pós–transição” é referente as classes leccionadas em L2 depois
da transição enquanto a designação “antes da transição” representa as primeiras três classes leccionadas em L1.

7
comparação com as turmas de SNE, o PEBIMO atingiu maior índice de retenção dos alunos na
escola, elevados níveis de aprovação nas três classes leccionadas em L1´s (Cinyanja e
Xichangana), tendo baixado na 4ª classe devido à transição brusca para L2 (Benson 1997).
Relativamente à interacção, a experiência do PEBIMO revelou que, em geral, os alunos
participavam activamente nas aulas respondendo, discutindo e dialogando abertamente com o
professor em L1 num ambiente de sala de aula mais cómodo e à vontade do que os alunos do
modelo monolingue que geralmente são menosinteractivos em L2 (calados, com respostas curtas
e incapazes de discutir na aula) e aprendem em ambientes ritualizados. Os alunos da educação
bilingue pensavam, expressavam-se e sentiam-se à vontade na sala de aulas, mostrando confiança
e auto-estima, sabiam ler e escrever funcionalmente em L2 e tinham altos níveis de alfabetização
nas L1 (Benson 1997).
Contudo, nas classes pós-transição (4ª e 5ª), os alunos demonstraram dificuldades nas provas
realizadas numa altura em que a L2 era o meio de instrução. Benson (1997) justifica que por
detrás das dificuldades demonstradas pelos alunos está patente a questão da transição brusca e
ou precoce da L1 para a L2 na 4ª classe, pois ela foi uma decisão política oposta aos pressupostos
científicos segundo os quais a transição à L2 deve efectuar-se após 4 ou 5 anos de instrução em
L1 e de aprendizagem da L2.
No âmbito da implementação da transformação curricular do ensino básico, em 2004 o
Ministério da Educação (MINED) propôs, a título piloto, o programa transicional com
características de manutenção, um programa de educação bilingue destinado às zonas rurais
linguisticamente homogéneas. A utilização das línguas moçambicanas através da educação
bilingue é justificada pelas razões de natureza linguístico-pedagógica, cultural, identitário e
direitos humanos (INDE/ MINED 2003b). O princípio deste programa defende que “quando o
aluno tiver adquirido habilidades cognitivas e linguísticas na L1, e quando tiver as habilidades
básicas de comunicação, pode transferir todas as habilidades cognitivas e linguísticas para a L2”
(INDE/ MINED 2003a:110). Este princípio básico do programa de educação bilingue, inspirada
da hipótese de interdependência evolutiva (Cummins 1979) e na teoria de competência
subjacente comum (Cummins 1980) acautela-se sobre a transição da L1 para a L2 após 2 a 3
anos, pois entende que os alunos não terão desenvolvido as habilidades cognitivas e linguísticas
em L1 e as habilidades básicas de comunicação em L2. Para evitar um possível défice linguístico-

8
pedagógico devido à transição precoce, o programa em causa define a manutenção da L1 como
disciplina e meio auxiliar do ensino-aprendizagem nas classes a seguir à transição nas quais o
meio de instrução é a L2 (INDE/MINED 2003a).

1.1.1 Currículo de Educação Bilingue

O programa transicional com características de manutenção possui sete classes e três ciclos de
aprendizagem (I, II e III ciclos) (vide a Figura 1), prevê a transição do meio de instrução L1 para
a L2 e distingue dois períodos de leccionação em meios de instrução, a saber: no primeiro período
(classes antes da transição), a L1 é o meio de instrução na 1ª, 2ª (I ciclo) e 3ª classes (II ciclo)
enquantono segundo período (classes de pós-transição), a L2 assume o papel de meio de instrução
na 4ªe 5ª classes (II ciclo) bem como na 6ª e 7ª classes (III ciclo).
Nas primeiras duas classes do I cicl o (1ª e 2ª classes), os alunos aprendem a ler e a escrever
(literacia inicial), a contar e a calcaular (numeracia) em L1 como meio de instrução e
desenvolvem a oralidade em L2.

Figura 1: Modelo de programa de transição com características de manutenção.


(INDE/MINED 2003a).

No início do II ciclo (3ª classe) a L1 continua a ser meio de instrução. Nesta classe introduz-se a
disciplina de Ciências Naturais que é também leccionada em L1 enquanto na disciplina de L2

9
inicia o processo de transferência de habilidades de leitura e escrita desenvolvidas em L1,
preparando os alunos para o início da transição gradual do meio de instrução L1 para a L2 na
4ª classe, estendendo-se até ao fim do ensino básico (INDE/MINED 2003a).
As línguas são usadas em três modalidades no programa transicional. A L1 é: meio de instrução
(1ª à 3ª classes); recurso e meio auxiliar no processo de ensino-aprendizagem das disciplinas de
Matemática, Ciências Naturais e Ciências Sociais em L2 nas classes de pós-transição (4ª à 7ª
classe) e é uma disciplina da 1ª a 7ª classe. A manutenção da L1 visa proporcionar o
desenvolvimento do bilinguismo mais equilibrado (INDE/MINED 2003a). A L2 é uma
disciplina nas 3 primeiras, nas quais a L1 é meio de instrução (1ª, 2ª e 3ª classes), meio de
instrução nas classes pós-transição (4ª à 7ª classes).
De acordo com o INDE/MINED (2003a), no ensino da L2 não é permitida a tradução da L2
para L1, pois os alunos não prestarão atenção à compreensão da L2. O ensino de L2 deve ser
exclusivamente em L2 e com reforço de materiais didácticos e dramatização. O uso da L1 como
recurso no ensino-aprendizagem em L2 visa explicar conceitos difíceis nas disciplinas de
Matemática, Ciências Naturais e Ciências Sociais contudo, o seu uso deve ser mediante a
delimitação dos momentos em que se usa uma ou outra língua e avaliar o nível de conhecimento
dos alunos através de perguntas abertas em L1. As línguas são usadas mediante fronteiras,
privilegiando a L2. Por esta razão, propõe-se o método “prever-rever” que é uma evidência clara
de fronteira de línguas nas aulas em L2 (INDE/MINED 2003a).

1.2 Problemas curriculares e linguísticos

A transição precoce do meio de instrução (L1) para a (L2) efectua-se numa altura em que os
alunos estavam em processo de aprendizagem da L2 e de emergência do bilinguismo. A L1
desvaloriza-se e passa a meio auxiliar da L2 sem nenhum valor para o desenvolvimento contínuo
do bilinguismo. Os alunos transformam-se em bilingues emergentes que requerem uma atenção
linguística-pedagógica no ensino-aprendizagem numa L2 proficientemente sub-desenvolvida. As
evidências de sala de aulas mostram que as práticas pedagógicas definidas pelo currículo e as dos
professores ignoram o facto de que os alunos são ainda aprendizes da L2 e que não são capazes

10
de desenvolver o ensino-aprendizagem através da maior exposição da L2 sem a L1 (García et al.
2008; García & Kleifgen 2018).
A participação e a interacção dos alunos bilingues emergentes nas aulas das disciplinas
leccionadas em L2 (português), referentes às primeiras classes de pós-transição (4ª e 5ª classes),
no programa transicional de Moçambique é baixa do que nas três classes (1ª, 2ª e 3ª) leccionadas
em L1 antes da transição. Por este motivo, as aulas tornam-se monótonas e lentas, os alunos
desmotivam-se, silenciam-se e mostram-se desconfortáveis, tímidos e indispostos para participar
e interagir em L2 na aula contrariamente aos seus altos níveis de participação e de interacção,
flexibilidade e dinamismo demonstrados pelos mesmos alunos nas classes antes da transição.
Chimbutane (2011, 2012) constatou que a participação e motivação exuberante dos alunos nas
aulas é mais notória em L1 antes da transição do que em L2 depois da transição, pois nesta
última, a comunicação professor-alunos nas aulas em L2 é muito problemática. Os níveis de
participação e de interacção dos alunos nas aulas em L2 são muito baixos se comparados com
os em L1.
Nas classes de pós-transição, os alunos são espontaneamente participativos e interactivos somente
nos cenários em que professor/a promove ocasionalmente a L1 nas aulas em L2. No entanto, o
silêncio e as estratégias de participação e de interacção passivas reaparecem logo que os
professores retomam o desenvolvimento da aula em L2. O processo de ensino-aprendizagem em
L2 é menos dinâmico e menos flexível. Os alunos não participam e não interagem em L2. Os
professores recorrem às estratégias de persistência e insistência e as de participação passiva e
disfarçada para garantir o mínimo progresso da aula.
Nas classes antes da transição, os alunos possuem altos níveis de proficiência e de competência
interaccional em L1 a partir dos quais garantem o desenvolvimento de um ensino-aprendizagem
participativo, interactivo, flexível e dinâmico. As experiências quotidianas, os conhecimentos e
ou saberes socioculturais locais (parte do currículo local) integram-se nas aulas através da L1 e
consequentemente, os níveis de participação e de interacção dos alunos elevam-se e as aulas
desenvolvem-se num ambiente de flexibilidade e dinamismo.
Na primeira classe de pós-transição (4ª classe), os alunos aprendem em L2 proficientemente sub-
desenvolvida. A L1 que outrora fora meio de instrução passa a disciplina e, simultaneamente,
desempenha o papel de língua recurso, auxiliar e ou meio compensatório que é usada pelos

11
professores exclusivamente para explicar os conceitos difíceis das Ciências Naturais e da
Matemática, rever a aula anterior, elaborar perguntas de avaliação da aula e reforçar os
objectivos da aula que não tenham sido alcançados. Os alunos são somente permitidos a usar a
L1 para responder exclusivamente a algumas perguntas formuladas em L1 (INDE/MINED
2003b; INDE/MINED 2003a). O currículo determina que os professores devem adoptar
práticas pedagógicas monolingues centradas na maior exposição da L2 nas aulas, estabelecer
rigorosamente fronteiras linguísticas que limitem a promoção de espaços e de oportunidades de
actuação e/ou uso da L1 e/ou de quaisquer práticas pedagógicas bilingues nas aulas. Portanto,
as classes pós-transição evidenciam um ensino-aprendizagem baseado nas abordagens de ensino
monolingue, veiculado pelo princípio de separação de línguas no ensino (Jacobson 1990),
também conhecido como “separate bilingualism” (Creese & Blackledge 2010), “parallel monolinguism”
(Heller 2006) e “two solitudes assumptions” (Cummins 2008).
As experiências quotidianas, os conhecimentos e ou saberes socioculturais locais (currículo local)
veiculados em L1 não são explorados porque o currículo não liberaliza o uso aberto da respectiva
L1 em paralelo com a L2 nas aulas. Perante este cenário, os alunos transitam da L1 para a L2 e
dos ambientes de ensino-aprendizagem participativos, interactivos e de aulas flexíveis e
dinâmicas em L1 para ambientes de ensino-aprendizagem em L2 caracterizados pelos baixos
níveis de participação e de interacção dos alunos na construção do conhecimento e de aulas
monótonas e lentas.
Baker (2001) mostra que os programas transicionais fazem parte dos modelos subtractivos e
visam política e ideologicamente assimilar os alunos das línguas minoritarizadas à língua
dominante, conduzindo-os ao monolinguismo. Nos programas de rápida transição (três classes
em L1), os alunos são obrigados a transitar precocentemente da L1 dominada para a L2 não
dominada, isto é, sem os níveis de proficiência e de competência linguísticas em L2 necessários
para o desenvolvimento linguístico, cognitivo e académico dos alunos no currículo (Cummins
1979). Cummins (1976), teorizando sobre a hipótese dos limiares defende que a interacção dos
alunos no ambiente da L2 depende do nível de competência linguística “input” e “output” que
tenham alcançado na L2. Se o nível do “input” e do “output” em L2 for baixo, as competências
interactivas dos alunos em L2 serão improvisadas. Se a L2 não for suficientemente desenvolvida,
os alunos registarão uma pobre performance linguística e académica nas aulas (Cummins 1979,

12
1981, 2000). Recorrendo aos padrões de “Basic Interpersonal Communication Skills” (BICS) e de
“Cognitive Academic Language Proficiency” (CALP), Cummins (1979) sustenta que quanto mais
elevado for o BICS em L2, facilmente os alunos aprenderão os conteúdos académicos em L2 e
num nível exigente de CALP. Todavia, se o nível BICS for baixo, dificilmente os alunos terão
capacidades para aprender os conteúdos académicos em L2 e num contexto de CALP.
A transição constitui um ponto crítico à eficácia e flexibilidade do ensino-aprendizagem
sobretudo nas classes subsequentes (4ª e 5ª classes). Os alunos transitam da L1 para a L2 e sofrem
um choque linguístico e cultural causado pela L2 e um choque pedagógico que os obriga a
assimilar um ensino-aprendizagem de altos níveis de exigência académica, cognitiva e linguística
em L2.
À luz da visão de García et al. (2008), os bilingues emergentes desenvolvem a emergência do
bilinguismo através da L1 usada como meio de instrução bem como o ensino-aprendizagem da
L2, porém quando transitam para a 4ª classe constata-se que possuem uma proficiência limitada
em L2 que não lhes possibilita continuar a aprender os conteúdos das diferentes disciplinas
exclusivamente em L2. Para reverter este problema e garantir o sucesso do ensino-aprendizagem,
García et al. (2008) e García & Kleifgen (2018) propõem que os professores potenciem as
oportunidades de práticas pedagógicas bilingues através das L1´s e da L2 no desenvolvimento
dos conteúdos académicos. Em outras palavras, uma vez que os alunos são bilingues emergentes
que enfrentam sérias dificuldades de participação e de interacção nas aulas devido a sua baixa
proficiência em L2, García et al. (2008) e García & Kleifgen (2018) advogam que os professores
devem superar este fenómeno através da potencialização pedagógica da L1 e a cultura dos alunos
como recursos explorados de forma paralela e flexível com as da L2, gerando assim, as práticas
bilingues nas aulas e garantindo que os alunos se tornem bilingues.

1.3 Objectivos da pesquisa

Com esta pesquisa-acção participativa procuro estudar uma proposta pedagógica prática para o
ensino-aprendizagem de Ciências Naturais nas classes de pós-transição (4ª e 5ª) referentes ao
programa transicional em Moçambique. A minha proposta está centrada no uso liberalizado e
dinâmico das L1 e da L2 como um único repertório discursivo de sala de aulas (pedagogia de

13
translanguaging (García 2009; García & Wei 2014)) e no fomento dos fundos de conhecimentos
socioculturais (saberes, experiências, recursos materiais, conhecimentos prévios, etc (Moll et al.
(1992)) diante dos conteúdos universais (pedagogia de collateral learning (Jegede 1995, 1999; Jedege
& Aikenhead 1999) e cross-border cultural (Aikenhead 1996; Aikenhead & Jegede 1999; Aikenhead
2001a e 2006)) com o objectivo de avaliar a superação tanto dos baixos níveis de participação e
de interacção dos alunos na construção do conhecimento como dos baixos níveis de flexibilidade
e de dinamismo das aulas causados pela fraca proficiência linguística e competência interaccional
dos alunos em L2. Assim, proponho-me a:

1. Analisar a funcionalidade pedagógica do translanguaging como estratégia que impulsiona


a participação e a interacção dos alunos nas aulas;
2. Analisar o impacto pedagógico de collateral learning e de cross-cultural border como estratégias
que facilitam o ensino-aprendizagem de Ciências Naturais;
3. Avaliar a viabilidade do translanguaging, de collateral learning e de cross-cultural border como
proposta pedagógica, linguística e cultural aplicável no ensino-aprendizagem
participativo, interactivo, dinâmico e flexível das Ciências Naturais nas classes de pós-
transição (4ª classe);
4. Proporcionar ferramentas teóricas, metodológicas e pedagógicas que contribuem para a
superação dos problemas linguístico-pedagógicos, inovando as práticas pedagógicas no
programa transicional em vigor em Moçambique através de abordagens pedagógicas
centradas no multilinguismo e no multiculturalismo.

1.4 Perguntas da pesquisa

A literatura mostra que a participação e a interacção na aula ela são as chaves de todo o processo
de ensino-aprendizagem. A interacção na sala de aulas é o centro de todas as actividades de
ensino e de aprendizagem, pois dela se acedem novos conhecimentos, se adquirem e se
desenvolvem novas habilidades, se identificam e se compreendem os problemas (Walsh 2011). O
ensino-aprendizagem centrado na interacção dos alunos cria oportunidades para a negociação
dos conteúdos e um ambiente favorável para a aprendizagem através da participação dos alunos.
A interacção dos alunos engaja a negociação dos significados, abre oportunidades para a

14
expressão livre de ideias e opiniões, os alunos auto-responsabilizam-se pela sua aprendizagem
(Antón 1999), assim como estimula altos níveis de processamento do pensamento (Chin 2006).
Lemke (1990) mostra que aprender a ciência significa aprender a falar a ciência. O ensino da
ciência é essencialmente um processo social que deve promover habilidade de uso da língua da
ciência, conceder oportunidades de diálogo nas aulas de ciência através de práticas concretas de
uso da língua e dos conteúdos temáticos da ciência.
As línguas desempenham um papel relevante na interacção e na construção do conhecimento.
Nos contextos bilingues e/ou multilingues, as práticas pedagógicas bilingues flexibilizam a
interacção (Creese & Blackledge 2010) através do uso dinâmico dos seus repertórios multilingues
(García 2009; García & Wei 2014). A pedagogia de translanguaging é, em si uma pedagogia de
práticas bilingues/multilingues a partir da qual, o professor e os alunos constroem e participam
dinâmica e flexivelmente na construção dos conteúdos académicos e na aprendizagem das
respectivas línguas. Conforme García & Leiva (2014) as práticas de translanguaging abrem
oportunidades para a participação discursiva dos bilingues emergentes silenciados por práticas
monolingues em L2, expondo as suas ideias e respondendo a questões no ambiente da
aprendizagem, ainda que elaboradas em L2.
Com o uso das L1´s através do translanguaging, os alunos interligam a casa e a escola (Baker 2001)
e integram os conhecimentos extra-escolares na aprendizagem dos conteúdos universais (Shizha
2005). Todo o ensino é mediado pela cultura do contexto social (Jegede & Aikenhead 1999). A
compreensão do conhecimento da ciência depende do ambiente sociocultural do aluno. Por isso,
há que explorar estes ambientes socioculturais para minimizar os conflitos cognitivos e culturais
e para que haja a compreensão da ciência (Jegede 1995, 1999) usando as línguas (Aikenhead
1997).
As perguntas que guiam esta pesquisa surgem da hipótese de que o fomento das práticas
pedagógicas de translanguaging e as de collateral learning e cross-cultural border revitalizam os ambientes
participativos e interactivos dos alunos bilingues emergentes e proporcionam a flexibilidade e o
dinamismo do ensino-aprendizagem de Ciências Naturais nas classes de pós-transição,
especificamente na 4ª classe do programa de educação bilingue de Moçambique. Guiado por
esta hipótese, questiono-me:

15
1. Pergunta 1: Como influenciar os alunos bilingues emergentes a revitalizarem os
ambientes participativos e interactivos no ensino de Ciências Naturais através da
promoção de práticas pedagógicas de translanguaging e as de collateral learning e cross-cultural
border?

2. Pergunta 2: Como facilitar e melhorar o ensino-aprendizagem de Ciências Naturais


através de ambientes participativos e interactivos suscitados pelas práticas pedagógicas
de translanguaging e as de collateral learning e cross-cultural border?

3. Pergunta 3: Como impulsionar a flexibilidade e o dinamismo dos alunos bilingues


emergentes no ensino-aprendizagem a partir práticas pedagógicas de translanguaging e as
de collateral learning e cross-cultural border?

A partir destas perguntas, desenvolverei de ciclos de práticas pedagógicas nas quais fomentarei
o repertório linguístico e discursivos em duas línguas (pedagogia de translanguaging) e dois sistemas
de conhecimentos (científicos e socioculturais através da pedagogia de collateral learning e cross-
cultural border) sem fronteiras nem restrições linguísticas e culturais prescritas pelo programa
transicional com o objectivo contribuir na melhoraria a qualidade do ambiente de ensino-
aprendizagem de Ciências Naturais dos alunos bilingues emergentes que apresentam baixa nível
de proficiência e competência interaccional em L2. No decurso da pesquisa analisarei os
resultados relacionados com os níveis de participação e de interacção dos alunos bilingues
emergentes, os níveis de facilitação pedagógica, linguística e académica e os níveis de
flexibilidade e dinamismo do processo de ensino-aprendizagem.

1.5 Justificação da pesquisa

A transição de meio de instrução L1 para a L2, os baixos níveis de proficiência e de competência


interaccional em L2 e a pedagogia de separação das línguas e ou pedagogia monolingue em L2
são alguns dos factores que suscitam os problemas de participação, interacção dos alunos
bilingues emergentes nas aulas e, que, por conseguinte, afectam negativamente a flexibilidade e

16
o dinamismo do ensino-aprendizagem. No âmbito da Experiência de Escolarização Bilingue em
Moçambique (PEBIMO 1993-1997), Benson (1997) constatou que em L1 os alunos
demonstraram elevados níveis de participação, interacção, auto-estima, expressividade activa
nas aulas, mostravam-se estar à vontade nas aulas e num ambiente cómodo de ensino-
aprendizagem. Chimbutane (2011, 2015) reafirma que a L1 proporciona qualidade de
interacção nas aulas e de aprendizagem, contrariamente à L2 que considera como sendo
problemática ao nível da interacção e ou comunicação, comprometendo o desenvolvimento
académico dos alunos nas classes pós-transição. De facto, ao longo da observação de aulas
evidenciei que os altos níveis de participação e de interacção dos alunos em L1 são substituídos
por um ensino-aprendizagem em L2, nos quais os alunos aprendem num clima de desconforto,
timidez, insegurança e de alta desmotivação. Consequentemente, os alunos são obrigados a
aprender passiva e forçosamente os conteúdos academicamente exigentes e numa língua
proficientemente subdesenvolvida e na qual não possuem a competência interaccional para
participar e interagir activamente nas aulas tal como ocorria em L1 nas classes antes da transição.
Neste estudo desenvolvo acções práticas e pedagógicas de sala de aula inseridas na pesquisa-
acção por forma a encarar, reflectir e agir sobre o problema pedagógico, linguístico e cultural
que afecta a qualidade de aprendizagem das Ciências Naturais na 4ª classe. A finalidade desta
pesquisa é garantir que os alunos possam se beneficiar de uma proposta de ensino-aprendizagem
dinâmica, flexível através da abertura linguística e pedagógica para a participação e a interacção
dos alunos e do professor em ambas as línguas e a integração pedagógica e cultural dos
conhecimentos socioculturais no ensino de Ciências Naturais. Desta forma, revitalizaria o clima
de sala de aulas construído nas classes anteriores em L1, desenvolveria o bilinguismo dinâmico e
flexível com base num repertório linguístico e discursivo em duas línguas L1 e L2 (García 2009;
Creese & Blackledge 2010; García & Wei 2014), facilitaria a aprendizagem flexível das Ciências
Naturais através da redução de conflitos entre as cosmovisões dos conhecimentos
científicos/universais e os socioculturais no ensino-aprendizagem (Jegede & Aikenhead 1999;
Aikenhead & Jegede 1999).
Esta pesquisa concorre como um contributo para a compreensão dos problemas linguísticos,
culturais e pedagógicos associados à transição para a L2 bem como propor uma inovação
pedagógica específica para o ensino-aprendizagem nas classes de pós-transição (4ª e 5ª classes)

17
que por enquanto não permite que os alunos que são bilingues emergentes (García et al. 2008;
García & Kleifgen 2018) aprendam através de práticas pedagógicas bilingues, participando e
interagindo flexivelmente num repertório linguístico e discursivo de duas línguas e numa
pedagogia de pontes e de diálogo entre os conhecimentos socioculturais e os científicos.

18
CAPÍTULO 2. Marco teórico

Introdução

Neste capítulo discuto a teoria anti-colonial (Fanon 1968 e 2008; Cabral 1973; Memmi 1974;
wa Thiong´o 1981 e Cesáire 1978) e educacional (Dei & Asgharzadeh 2001; Dei 2002, 2008 e
2010; Kempf 2009; Shizha 2005, 2009 e 2010; Shizha & Abdi 2014) com enfoque para os
aspectos linguísticos-pedagógicos (García 2009; Creese & Blacklegde 2010; García & Wei 2014)
e pedagogias culturais (Villegas 1990; Ladson-Billings 1995a e 1995b; Aikenhead 1996, 2001a,
2006; Gay 2000 e 2002; Jegede 1993, 1995, 1999; Jegede & Aikenhead 1999; Aikenhead &
Jegede 1999) que contribuem para o enquadramento teórico da presente pesquisa.

2.1 Teoria anti-colonial e a contínua descolonização

Segundo Rassool (2007), a descolonização representa o processo complexo de desintegração do


jugo colonial, envolvendo não apenas a mudança sócio-política como também o reajuste da
ideologia cultural e económica. A teoria anti-colonial está associada à resistência colonial contra
o colonialismo e as lutas pela independência em África nos anos 1950, 1960 e 1970 (Kempf
2009). O anti-colonialismo é a acção do colonizado ou oprimido contra a ideologia do
colonizador, contra a imposição e superioridade racial, cultural, intelectual que o inferioriza
(Memmi 1965). Com recurso ao anti-colonialismo, o colonizado ou oprimido luta, por um lado,
pela restituição da sua dignidade identitária, cultural, linguística, racial, religiosa ou étnica
oprimida, inferiorizada pelo colonizador e pela colonização e por outro lado, resiste como forma
de auto-defesa contra as acções e tendências de dominação pelo outro (Memmi 1965). Por este
motivo, a teoria anti-colonial está interligada com as vozes e a intelectualidade dos sujeitos
segundo apontam Simmons & Dei (2012a:75):

19
Working with the anti-colonial framework means engaging such concepts as
colonialism, oppression, colonial encounter, decolonization, power, agency and
resistance, as well as claiming the authenticity of local voice and intellectual
agency of peoples.

Com base nos teóricos anti-coloniais Memmi (1965), Fanon (1968), Cesáire (1978), Cabral (1973)
e wa Thiong´o (1981) constato diferentes formas de opressão colonial que caracterizam e
fundamentam o anti-colonialismo. Cesáire (1978) sustenta o anti-colonialismo a partir da análise
crítica sobre a imposição da civilização ocidentalem África. Cesáire (1978:21) vê a colonização e
a respectiva civilização como um acto de embrutecimento, descivilização e de dominação que é
em si a característica do colonizador:

(...) ninguém coloniza inocentemente, nem ninguém coloniza impunemente, que


uma nação que coloniza, que uma civilização que justifica a colonização (...) é já
uma civilização doente, uma civilização moralmente ferida (...) (Cesáire 1978:21).

Nota-se em Cesáire (1978) uma profunda revolta ao descrever a ideologia do colonialismo, do


colonizador bem como as formas e os objectivos da dominação, da “animalização”,
“asselvajamento” e instrumentalização do/a indígena.
De acordo com Fanon (1968), o anti-colonialismo está associado à libertação, ao renascimento e
à restituição da nação ao povo. Para este efeito, tem de haver a descolonização através da
violência. Uma violência para repor as coisas, isto é, restabelecer as formas culturais, económicas
e políticas destruídas. Nesta perspectiva, Fanon (1968) vê no acto da descolonização, como uma
condição mínima do colonizado que garantirá a substituição de uma ordem (sistema colonial)
por outra (independência e progresso social). Para Cabral (1973), a colonização é a destruição
da história e da cultura do povo. A dominação imperialista danifica o desenvolvimento histórico
do povo dominado e isto danifica o desenvolvimento da cultura (Cabral 1973:43). Portanto, a
luta anti-colonial é um acto cultural em prol da cultura. A cultura é a arma e a base de toda a
luta pela cultura. Cabral (1973) e Cesáire (1978) encontram na cultura, o elemento mais
importante que o imperialismo colonial oprime. Por este motivo, Cesáire (1978:25) critica o
colonialismo como uma imposição cultural e uma civilização igual a “coisificação” do outro. A

20
reclamação contra a ideologia desumanizadora do imperialismo colonial por Cesáire (1978) é
considerada por Cabral (1973) como a destruição do povo através da destruição da sua cultura.
Da mesma forma que Cabral (1973) e Cesáire (1978), Fanon (1968) conceptualiza o colonialismo
como a domesticação das raças não brancas consideradas inferiores pelas raças superiores dos
brancos e que nesta desumanização, o colonizador destrói a cultura do outro, animaliza-o e
submete-o à violência físico-corporal e psicológica. Estas formas cruéis de dominação suscitam
no colonizado a revolta, uma revolta anti-colonial que se vinga e resiste através da violência. O
colonizado descobre o real e transforma-o no movimento de sua praxis, no exercício da violência,
em seu projecto de libertação (Fanon 1968). Desta descoberta da realidade, o colonizado
compreende que:

Está dominado, mas não domesticado. Está inferiorizado, mas não convencido de
sua inferioridade. Espera pacientemente que o colono relaxe a vigilância para lhe
saltar em cima. (...) está sempre pronto a abandonar seu papel de caça para tomar
o de caçador. O caçador é um perseguido que sonha permanentemente em se
tornar perseguidor (Fanon 1968:40).

Entretanto, o projecto da luta anti-colonial e de descolonização não visa ocupar o lugar e a


ideologia colonial mas sim:

(...) o colonizado sonha sempre em se instalar no lugar do colono. Não em se


tornar um colono, mas em substituir o colono. Esse mundo hostil, pesado,
agressivo, pois que rechaça com todas as suas asperezas a massa colonizada,
representa não o inferno do qual todos desejariam afastar-se o mais depressa
possível (...) (Fanon 1968:39).

wa Thiong´o (1981) observa que ainda existem formas neo-colonização veiculadas secretamente
pelo imperialismo e que representam uma bomba cultural. Segundo este autor, os efeitos da
bomba cultural manifestam-se ao nível psicológico, espiritual e material. Os colonizados sofrem
a aniquilação compulsiva das suas culturas, distanciam-se dos seus nomes, línguas, habitat,
desacreditam da sua identidade cultural através da assimilação forçada da cultura e das línguas
dos colonizadores. A descolonização da mente é, na óptica de wa Thiong´o (1981), uma
manifestação da resistência anti-colonial necessária e urgente para o continente africano.

21
No seio de escolas académicas, a resistência anti-colonial notabiliza-se como uma teoria de
estudos anti-coloniais. Esta teoria aborda sobre a dominação racial, linguística, cultural, sexual,
étnica, económica e da produção, validação do conhecimento (Dei 2000, 2010). Nestes termos,
a teoria anti-colonial procura, segundo Dei & Asgharzadeh (2001), compreender a
marginalização, a subordinação e a dominação política e social que continuam vigentes nos
tempos actuais e propõe uma nova filosofia de resistência. O paradigma da teoria anti-colonial
está baseado nos sistemas culturais, nas tradições locais, nas línguas e saberes indígenas locais
(Dei & Asgharzadeh 2001). É uma resistência e uma luta intelectual que visa romper a hegemonia
de dominação dos colonizados, opor-se ao pós-colonialismo e ao neo-colonialismo através da
exploração das tradições e conhecimentos culturais locais:

(...) whereas postcolonial theorists depend on Western models, anti-colonial


theorists work with alternative/oppositional paradigms based on the use of
indigenous concepts and analytical systems and cultural frames of reference (Dei
2000:118).

Os teóricos anti-coloniais advogam haver ainda novas formas de colonialismo e de dominação


(Simmons & Dei 2012) e que por esse motivo, a teoria anti-colonial baseada nas culturas, nas
línguas e nos conhecimentos culturais locais constitui uma postura actual e uma oportunidade
para os colonizados e os marginalizados construírem o seu futuro.
A análise histórica do anti-colonialismo africano distingue duas correntes temporalmente
distintas contudo, epistemologicamente semelhantes. Há, por um lado, o anti-colonialismo
desenvolvido no período colonial pelos pensadores anti-coloniais Memmi (1965), Fanon (1968),
Cesáire (1978), Cabral (1973), wa Thiong´o (1981) e, por outro lado, um anti-colonialismo
contemporâneo focado, especificamente, à educação e é representado por Dei (2002, 2010),
Shizha (2009, 2005, 2010), Shizha & Abdi (2014), Aikenhead (1996, 2001b, 2006), Jegede (1999),
Jegede & Aikenhead (1999), Aikenhead & Jegede (1999). Estes últimos defendem a teoria anti-
colonial como uma perspectiva educacional que visa restituir o passado, a história, a cultura, a
produção do conhecimento e subverter a contínua subjugação e marginalização intelectual,
cultural, espiritual das sociedades africanas (Dei 2010, 2011a) através da integração da herança

22
tradicional (identidade cultural, linguística, conhecimentos culturais locais) nos sistemas de
educação (Shizha 2005; wa Thiong’o 2013; Dei 2010, 2002).

2.1.1 Teoria da educação anti-colonial

Os sistemas de conhecimento indígenas africanos foram desvalorizados, ignorados e excluídos


nos currículos (Dei & Asgharzadeh 2001) devido a forte hegemonia cultural do colonialismo que
se apropriou das mentes africanas (wa Thiong’o 1981; Mazrui 1993) e degenerou uma síndrome
de dependência à piedade e à caridade do ocidente (Ngara 2007). Abdi (2012:134) observa que,
a educação colonial em África, caracterizava-se por:

(...) impositions of colonial education on native populations were primary ways of


achieving the psychological and cultural domination of Africans. This was, of
course, complemented by the systematic, colonialist deriding of indigenous
systems of learning as at best ineffective and rudimentary, or outright useless and
unacceptable.

As escolas africanas foram e continuam a ser centros de hegemonia cultural, centros de


desacreditação, desconfiguração das culturas indígenas africanas (Shizha 2005), espaços de
marginalização, alienação cultural, identitária e linguística dos alunos africanos com base na
democratização, globalização, produção, validação do conhecimento ocidental (Shizha
2015:70):

Colonial schools were the vehicles through which European “enlightenment” and
“civilization” (...) Schools became institutionally created and privileged sites for
the production of hegemonic knowledge. Indigenous knowledge, which is
intergenerational and intra-generational, and embedded in the customs, habits,
rituals, and social institutions of the community, was regarded as “ignorant
knowledge.” That is how cultural knowledge was victimized and marginalized
from school curricula.

As inovações curriculares implementadas nos países africanos pós-independência não


descolonizaram o ensino da ciência (Shizha 2010a, 2014). Ainda se verifica a dependência e a
importação de sistemas educacionais eurocêntricos (Shizha 2014) e por conseguinte, a exclusão

23
dos conteúdos e línguas indígenas nos currículos que na perspectiva da “Teaching Africa”,
questionariam a hegemonia, a universalidade e o domínio dos conhecimentos ocidentais na
educação em África (Dei 2010). O ensino da ciência tem-se desenvolvido divorciado da
pedagogia e do contexto socio-cultural dos alunos (Shizha 2010b), em línguas e livros de
instrução coloniais sob acusação da impossibilidade de usar as línguas africanas no ensino dos
conhecimentos científicos (Ogunniyi 2005). Nestes termos, a educação transformou-se num
fenómeno de “europeização” ao invés da “indigenização” dos alunos, resultando em dificuldades
de aprendizagem em línguas coloniais (Ogunniyi 2005). Com base na escolarização e na
hegemonia cultural ocidental nos currículos, os alunos transformaram-se em cúmplices e co-
construtores do imperialismo cultural ocidental através de processos de desconstrução e
reconstrução (Shizha 2005).
Conforme Dei (2000), a colonização está vigente através da dominação dos conhecimentos e
culturas ocidentais nos currículos escolares. Os conhecimentos culturais, indígenas e locais que
representam a realidade social local bem como as experiências e práticas locais são
negligenciadas e reprimidas dos currículos escolares. Para Shizha (2005), os currículos escolares
em África, manifestam o poder dos discursos e de práticas hegemónicas dos colonizadores e que
através da educação, desumanizam os colonizados. A razão desta constatação é despoletada por
Dei (2010) ao referir que os conhecimentos ocidentais são considerados científicos, lógicos
enquanto os conhecimentos indígenas e culturais são considerados incapazes de deduzir o
pensamento racional e a validade científica. Os conhecimentos, os pensamentos, as realidades e
as experiências africanas são silenciados, dominados pelos conhecimentos ocidentais nos
currículos escolares (Shizha 2005). A colonização causou a disrupção e desconfiguração do
sistema educativo colonial e impôs a dissonância entre as experiências dos indígenas e a educação
colonial hostil:

Europeanized education, in other words, is a means of mystifying knowledge and


reality, an alienating and dehumanizing process that continues to this day. (...)
Schooling reflects foreign cultural symbols that are maintained through
curriculum dependency and educational neocolonialism. (...) indigenous thought
systems are being continuously challenged by Euro-American so-called New
World Order of globalization which is reinventing colonization. Globalization is
consistent with colonization or neocolonization in that it seeks to “universalize”

24
and “internationalize” the Western concept of knowledge and science, thus
continuing the marginalization of non-Western knowledge systems. (...) (Shizha
2005:72-73).

Perante este cenário, Shizha (2014) advoga ser oportuno reformar, descolonizar os currículos
educacionais com base na indigenização ou africanização com vista a proporcionar o progresso
académico e cognitivo dos alunos. A teoria da educação anti-colonial defende a descolonização
da educação, a luta contra o neo-colonialismo e a globalização com base na aposta dos
conhecimentos indígenas e culturais do meio sociocultural dos alunos e com base nas suas línguas
africanas. Segundo Kempf (2009), a partir da teoria anti-colonial podem compreender-se as
relações de poder que se materializam através da dominação e da opressão. A educação, a
produção, a validação e a difusão do conhecimento nos contextos pós-coloniais (Shizha 2010b,
2015) são alguns dos exemplos de partida.
A teoria da educação anti-colonial defende a tese de que todos os conhecimentos indígenas e
culturais devem lutar contra a imposição colonial (Simmons & Dei 2012, Cabral 1973, Kempf
2009). Os sistemas de conhecimentos, segundo Dei (2010), são significativos dentro do seu
contexto cultural, isto é, a ciência e a tecnologia não são ensinadas e aprendidas no vazio
sociocultural (Ogunniyi 2005). Abagi (2005) desafia os educadores africanos a reconstruirem, a
re-conceptualizarem e redefinirem uma educação responsável ao desenvolvimento baseada no
ambiente, nas experiências e nas necessidades africanas. Shizha (2005 e 2010a) avança com o
exemplo de uma educação culturalmente sensível que permita a convivência entre dois sistemas
de conhecimentos (ocidentais e indígenas) e entre duas línguas (a língua colonial e a língua
indígena) na sala de aula e uma forte pesquisa-acção participativa dos alunos nas suas
comunidades. Dei (2000) recorre aos conhecimentos indígenas como o ponto de partida para a
teorização e fundamentação da educação anti-colonial. Assim, a abordagem do discurso anti-
colonial reconhece a importância dos conhecimentos produzidos localmente, das línguas locais,
das categorias cognitivas dos indígenas e da lógica cultural que permitam criar uma percepção
social.
A educação anti-colonial dá continuidade ao legado filosófico dos fundadores do anti-
colonialismo. A perspectiva anti-colonial de Cabral (1973) é substancialmente retomada na
fundamentação da educação anti-colonial. Cabral (1973) via o colonialismo como uma

25
dominação cultural cujas consequências paralisavam a história e a cultura do povo através da
assimilação da cultura e da história do colonizador. Cabral (1973) apostou numa luta anti-
colonial baseada na cultura dos colonizados. De facto, a cultura e as línguas dos colonizados são
as bases de argumentação de sustentação teórica da educação anti-colonial. Esta teoria de
educação pretende desenvolver uma educação centrada nos indígenas tanto do ponto de vista
cultural e do conhecimento como do ponto de vista linguístico por forma a resistir e lutar a favor
da história, da identidade, da cultura, do conhecimento, do pensamento e das línguas dos
colonizados em prol da solução dos problemas e do desenvolvimento local (Dei 2010). Fanon
(1968:30) vê a descolonização como a libertação, renascimento cultural e a restituição do povo,
uma nova humanidade que se constrói:

A violência que presidiu ao arranjo do mundo colonial, que ritmou


incansavelmente a destruição das formas sociaisindígenas, que arrasou
completamente os sistemas de referências da economia, os modos de aparência e
do vestuário, será reivindicada e assumida pelo colonizado no momento em que,
decidindo ser a história em atos, a massa colonizada se engolfar nas cidades
interditas (Fanon 1968:30).

Assim, a educação anti-colonial é uma forma da libertação, do renascimento cultural e a


restituição do povo, da sua história, da sua cultura e das suas línguas (Mazrui 1993). Ela
preocupa-se com a reposição e valorização do legado histórico, cultural dos colonizados e com
o processo de produção e da validação do conhecimento cultural dos indígenas na academia
opondo-se à valorização de um único conhecimento considerado válido, científico e homogénico
cujos alunos são educados para se desconectarem ideologicamente da sua língua e de toda a sua
realidade cultural e social (Dei & Asgharzadeh 2001, Shizha 2005):

In many African schools, European education continues to distort,


misappropriate, and misrepresent African realities, their lives, experiences, and
thoughts. Since independence, there has been little significant shift from
Eurocentric definitions of official knowledge and school pedagogy. Much of
African education systems inherited from colonial regimes are not in touch with
contemporary Africa. (...) african school curricula promote and give privilege to

26
alien cultures while excluding particular readings, voices, aesthetics, and
representations of African reality (Shizha 2005:71).

Por estas razões, a educação anti-colonial é uma resistência pedagógica contra a aniquilação da
cultura, da história, dos conhecimentos, da cosmovisão e dos valores dos colonizados
perpetuados pela produção e disseminação do conhecimento e línguas ocidentais nas escolas e
uma contínua inferiorização dos povos indígenas e das suas culturas (Dei 2010). O saber do
indígena resiste à dominação ocidental e ao poder de subordinar todas as outras formas de
pensamento com noções tais como razão, progresso, racionalidade e discurso iluminado (Dei
2010).
A educação anti-colonial ressuscita a civilização indígena, uma civilização descivilizada pelo
colonialismo, pelo imperialismo (Cesáire 1972), pelo pós-colonialismo e que, segundo Shizha
(2005), é, actualmente, veiculada pelo neo-colonialismo através da globalização e da
homogeneização da produção, disseminação e transmissão dos conhecimentos ocidentais e em
línguas não indígenas.
Portanto, Dei (2010) conclui que a educação em África deve estar contextualizada à história,
tradições e culturas indígenas, conhecimentos locais e permitir a solução dos problemas correntes
localmente. Esta visão conduz à indigenização dos currículos que é o reconhecimento da
intelectualidade dos africanos como agentes de construção de conhecimentos com base nas das
experiências de vida socioculturais aplicados numa educação centrada para África (Dei 2012b).

2.1.1.1 Educação, línguas coloniais e a colonização mental

A reflexão sobre os dilemas que marcam o estágio actual da educação em África evoca
historicamente a análise do passado colonial do continente africano e por conseguinte, exige uma
postura de análise e fundamentação enraizada no pós-colonialismo. Nesta subsecção, analiso as
políticas linguísticas e educacionais coloniais e as consequências na educação na África pós-
independência. Com esta análise, procuro mapear a fundamentação dos objectivos da educação
anti-colonial como uma perspectiva de educação de descolonização das mentes (wa Thiong´o
1981; Brock-Utne 2000) através das línguas e dos conhecimentos culturais locais africanos
(Mazrui 2002, 2004; Mchombo 2014; Dei 2002; Shizha 2009; Babaci-Wilhite 2013).

27
O imperialismo não só implantou o sistema colonial mas também as línguas europeias (inglês,
francês, português) que se tornaram em meios de poder, de governação, exploração e de
dominação dos nativos através da evangelização, civilização e da educação (Phillipson 1992,
Brock-Utne 2000, Rassool 2007). Segundo Rassool (2007:70):

In addition to the subjugation of local languages, and the under-development of


literaciesin local languages and cultures, the centrality of the colonial language to
the formal education process, secured the hegemonic consciousness of colonized
peoples through the curriculum content, knowledges, ways of knowing, and ways
of seeing the world that it legitimated.

De acordo com Babaci-Wilhite (2013), as línguas assim como o legado cultural colonial que
veiculavam na educação colonial visavam forçar os africanos a usar as línguas coloniais e assim,
conseguir a sua des-africanização, a alienação, a colonização e a dominação. As línguas coloniais
posicionaram-se como línguas superiores que as africanas. O multilinguismo africano sofreu a
deslegitimação e desintegração na educação colonial (Bunyi 1999). Adegbija (1994) refere que os
colonizadores impuseram a hegemonia das suas línguas e inculcaram estatutos de
marginalização, negligência e de inferioridade contra as línguas africanas.
Shizha (2005:70), ao analisar a situação da educação colonial, aponta que:

(...) In colonial Africa, schools were centers for cultural hegemony, centers for
discrediting and disengaging the culture of the indigenous Africans. Colonial
schools were the vehicles through which European “enlightenment” and
“civilization” were forced on to and where colonization and exploitation were
rationalized. Schools became institutionally created and privileged sites for the
production of hegemonic knowledge. Indigenous knowledge (...) was regarded as
“ignorant knowledge”.

O colonialismo abalou profundamente a história cultural das sociedades africanas. Houve a troca
do paradigma social e cultural africano pelo paradigma colonial e ocidental com destaque para
a destruição da cultura e o desprezo pelas línguas africanas (Cabral 1973, Mazrui 2002). O
sistema de educação tradicional africano baseado na vida quotidiana, na cultura e nas línguas
maternas indígenas foi substituído pela educação em línguas coloniais para fins de subjugação

28
do continente aos objectivos imperiais e coloniais (Ki-Zerbo 1999 apud Brock-Utne 2000:111)
através de uma política linguística e educacional colonial e de práticas pedagógicas que
estigmatizavam e ignoravam as tradições e as culturas locais (Phillipson 1992).
Nas colónias inglesas e belgas, a educação priorizava politicamente a iniciação da escolarização
em línguas indígenas e a posterior, transitava-se ao inglês com o objectivo de promover o
desenvolvimento separado entre os colonizadores e os colonizados (Bamgbose 1983, Phillipson
1992, Rassooll 2007) e formar uma classe de intermediários entre os colonizadores, a
administração colonial e as massas colonizadas, escolarizada inicialmente em línguas africanas e
depois em inglês (Kamwendo 2010, Prah 2009). O domínio e uso do inglês condicionava a
mobilidade social entre os colonizados ao invés das línguas maternas africanas. Nas colónias
francesas e portuguesas, a política colonial subjugava, inferiorizava as línguas e as culturas dos
colonizados (Appiah 1992). Segundo Rassool (2007:45):

The cultural politics of French, and Portuguese, colonialism resulted in overt


forms of linguistic and cultural imperialism. (...) whilst validating their own
language and cultures, they silenced African language, and subjugated indigenous
cultures, supplanting them with European ´knowledges´ cultural ways of knowing,
imbuing them thus the colonial worldview. This policy approach insidiously
eroded the indigenous culture base, ultimately contributing to mental and cultural
alienation amongst the colonized.

As línguas francesa e portuguesa dominavam por completo o sistema de dominação colonial


incluindo o sector da educação (Bamgbose 1983) na sua política colonial “civilizing mission”
(Phillipson 1992). Nesta política civilizadora, a título de exemplo, o colonizador francês tinha o
objectivo de não apenas colonizar para civilizar, inculcar forçosamente o francês mas, sobretudo,
colonizar a mente através da educação:

(...) by the School: this should ensure the predominance of our language over the
various local idioms, inculcate in the muslims our own idea of what France is and
of its role in the world, and replace ignorance and fanatical prejudices by the
simple but precise notions of Europeans science (Colonna 1975:40 apud Phillipson
1992:114) (...) To transform the primitive peoples in our colonies (...) the safest
method is to take the native in childhood, bring himinto assiduous contact with

29
us and subject him to our intellectual and moral habits for many yearsin
succession, in a word to open for him where his mind can be shaped at our will
(Hardy 1917 apud Phillipson 1992) (...) to attach them to the Metropole by a very
solid psychological bond, against the day when their progressive emancipation
endsin a form of federation, asis possible … that they be, and they remain French
in language, thought and spirit (Foncin apud Ashby 1966:365 em Phillipson
1992:114)

Esta política era severamente intolerante às línguas e às culturas dos colonizados. Nas colónias
portuguesas e francesas constituíam-se os “assimilados” que na condição deste estatuto social,
identitário e cultural, deviam ser convertidos de africanos a colonos portugueses ou franceses da
terceira. A título de exemplo, Mazula (1995) aponta que em Moçambique, as línguas africanas
foram usadas no ensino somente como instrumento de difusão, aprendizagem da língua e da
cultura portuguesa. Ainda sobre Moçambique, Mondlane (1995) refere que os sistemas de ensino
coloniais (ensino rudimentar/ensino de adaptação e o ensino primário) visavam conduzir o
indígena à vida civilizada e criar, por um lado, uma pequena classe de indígenas que desprezam
as suas línguas e culturas tradicionais mas que, por outro lado, não tem preparação para utilizar
correctamente a língua portuguesa. Como se pode depreender nestes autores, as línguas africanas
foram desencorajadas e excluídas nos sistema de ensino. A educação empenhava-se no sentido
de civilizar e colonizar linguística e culturalmente os nativos de Moçambique.
Tanto na política de desenvolvimento separado como na de assimilação, as línguas coloniais
ostentavam o alto estatuto na administração colonial que as línguas africanas. De acordo com
Mazrui (2004), o processo da educação colonial afectou a marginalização das línguas africanas a
favor das línguas europeias e legitimou a reprodução de divisões de poder e de recursos entre os
falantes das línguas europeias e os falantes das línguas africanas. Para wa Thiong´o (1981), o pior
da dominação colonial foi o controlo do universo mental do colonizado através da cultura:

For colonialism this involved two aspects of the same process: the destruction or
the deliberate undervaluing of a people´s culture, their art, dances, religions,
history, geography, education, orature and literature, and the conscious elevation
of the language of the colonizer. The domination of the people´s language by the
languages of the colonizing nations was crucial to the domination of the mental
universe of the colonized (wa Thiong´o 1981:16).

30
A dominação e colonização mental (wa Thiong´o 1981) ocasionaram o surgimento do complexo
de inferioridade dos africanos devido à desconstrução da originalidade cultural. Os colonizados
assimilaram os valores culturais e linguísticos do colonizador tal que, quanto mais assimilar os
valores culturais da metrópole, mais o colonizado escapará da sua selva. Quanto mais ele rejeitar
sua negridão, seu mato, mais branco será (Fanon 2008).
Na perspectiva de Bamgbose (1999), a dominação colonial desfigurou as mentes dos africanos
que constroem estereótipos, atitudes negativas e de inferioridade contra as línguas africanas.
No período pós-independência, a maioria dos países africanos, adoptou políticas educacionais e
linguísticas coloniais. As línguas coloniais assumiram o estatuto de línguas oficiais sobretudo nos
países da África Sub-sahariana (Bamgbose 2011; Brock-Utne 2000). Dentre os 53 países
africanos, as línguas africanas são oficiais em 10 países e nos restantes 46 países as línguas oficiais
são coloniais (Bamgbose 1991). De acordo com Babaci-Wilhite (2013), os africanos foram
forçados a adoptar as línguas coloniais devido à forma colonial pela qual lhes foi colonizada a
mente.
As políticas linguísticas e educativas dos países da África Sub-sahariana impulsionaram as línguas
coloniais e mais uma vez, a maioria das línguas africanas foi secundarizada e marginalizada dos
domínios oficiais, em especial na educação (Trudell 2007; Mazrui 2002). As atitudes negativas
sobre as línguas africanas foram institucionalizadas pelas elites e lideranças políticas pós-
independência. Justificando a razão pela qual não se adoptaram políticas a favor das línguas
africanas Mateene (1999:176) apud Rassool (2004:86), aponta que:

(...) in the immediate aftermath of decolonization, national leaders were


influenced by the widely held belief ´that the best way to (...) quick progress was
to adopt or maintain the so-called “already developed” colonial language, as the
exclusive media of instruction.

Adegbija (1994) conclui que os países africanos pós-independência não cortaram completamente
o cordão umbilical do colonizador nas áreas económicas, educacionais e linguísticas. As políticas
linguísticas e educativas perpetuaram as políticas linguísticas coloniais, resultando na dominação
e dependência das línguas coloniais. Esta dependência criou a colonização das mentes das elites

31
políticas africanas (wa Thiong´o 1981) que questionavam a prontidão das línguas africanas nos
domínios oficiais e na educação. Bunyi (2008) constata que os currículos transplantados na África
pós-independência foram os do período colonial. Os conhecimentos indígenas e culturais
africanos e as línguas sofreram a desvalorização na educação. A educação não empodera os
africanos para a resolução dos seus problemas e alcançar o desenvolvimento.
A escolha da língua ex-colonial para a educação é a manifestação da resistência do poder a favor
das elites que perpetuam o uso das línguas coloniais na educação contra as massas que dominam
as línguas africanas excluídas na educação (Brock-Utne, 2000). Com efeito, Trudell (2007), Wolff
(2011) referem que, os encarregados de educação dos alunos africanos acreditam que a
verdadeira educação e a ascensão social são possíveis através da educação em línguas coloniais
e conhecimentos ocidentais. Os governos e a sociedade em África deduzem que a
intelectualidade, o conhecimento, a modernidade e o ser educado só se alcançam através da
língua ex-colonial (Djité 2008).
Mchombo (2014) mostra uma preconceituosa equação formulada no contexto africano que
relaciona a língua de instrução à inteligência:

(...) in the African context (...) belief that intelligence could correlated with the
ability to speak English or other European language. (...) those who make
academic progress do so in a formal education that is conducted in those
languages. (...) their proficiency in the Europeans languagesis construed as a mark
of intelligence. Failure to master those languages shows lack of intelligence
(Mchombo 2014:30).

A oficialização das línguas africanas e o uso como meios de instrução no período pós-
independência colidia com os interesses políticos relacionados com a construção da nação e da
unidade nacional, rápida industrialização, desenvolvimento económico e isenta de guerras
étnicas ou tribais. Diante destes objectivos, as línguas coloniais eram consideradas ferramentas
preparadas para servirem aos objectivos dos novos estados africanos (Bamgbose 1983).
De acordo com Prah (2009), os argumentos das elites contra as línguas africanas na África pós-
independência resumiam-se no seguinte:

32
(i) A África possui muitas línguas e etnias e portanto, a escolha de uma língua como
oficial e de educação colocaria em causa a unidade nacional e criaria tensões e
conflitos étnicos;
(ii) As línguas africanas são pobres e limitadas lexicalmente para expressar as noções
científicas, tecnologia e léxicos de domínios oficiais, senão na expressão poética;
(iii) As línguas africanas não têm uma literatura, dicionários e estudos linguísticos que lhes
permitam ser línguas de instrução e oficiais;
(iv) O desenvolvimento das línguas africanas assim como a sua promoção na educação é
financeiramente dispendioso;
(v) Os africanos não precisam de trabalhar em suas línguas. As línguas de poder são o
inglês, português e francês.

Prah (2009) considera os argumentos acima como ilógicos e falaciosos. Estes procuram
inferiorizar as línguas e a cultura dos africanos e impor a superioridade das línguas ocidentais. O
autor afirma que não há nenhuma língua que seja incapaz de se desenvolver como língua da
ciência e da tecnologia. As línguas desenvolvem-se quando as pessoas também se desenvolvem.
A perpetuação do neo-colonialismo, dependência e da dominação intelectual dificultam o
projecto de intelectualização das línguas africanas e da descolonização da mente (Wolff 2011, wa
Thiong’o (1981):

(...) the use of language as a symbol and tool for maintaining neo-colonial
dependency is represented by the various institutions related to the notion of
Francophonie. Apart from nationalist or even neo-colonialist motivations on the side
of former colonial powers, reference must also be made to the role that the World
Bank used to play in the past (...) (Wolff 2011:58).

A exclusão das línguas africanas da educação suscitou graves problemas de desenvolvimento na


maioria dos países africanos tal que, segundo Prah (2009), jamais deve ser responsabilizada aos
colonizadores, mas sim aos próprios africanos e, em especial, às elites africanas.

33
2.1.1.2 Educacão anti-colonial: o poder das línguas africanas

As línguas coloniais são consideradas “tools” para a educação formal, “symbol” da dominação
política e da superioridade cultural e antagonicamente, as línguas africanas são “tools” inferiores,
inadequadas para fins de educação formal e são política e culturalmente “symbol” de inferioridade
e de subdesenvolvimento (Wolff 2011). Esta constatação é desafiada pela teorização anti-colonial.
Pese embora se observe o antagonismo entre os “tools” e “symbols”, Brock-Utne & Alidou (2011)
vêem o valor pedagógico das línguas e também das culturas locais na elevação da capacidade de
aprendizagem crítica centrada nos alunos. Por sua vez Prah (2009:7) entende que:

(...) if language is the main feature of language, in which all social and human
activities are transacted, then we should ensure that our languages become
developed and refined instruments capable of yielding developmental benefitsin
our quest for scientific and technological advancement and emancipation of
Africans.

As elites com poder de decisão em África resistem com a tese de que as línguas coloniais devem
dominar os espaços da intelectualidade, da ciência, da tecnologia mesmo havendo opiniões e
estudos a favor do uso das línguas africanas (Prah 2009). Contudo, Dutcher (2004:8) apud Brock-
Utne (2012:484) mostra-se indignada ao constatar o problema da língua de instrução que é
enfrentado pelos alunos quando tendem a usufruir da educação na África Sub-sahariana:

It is shocking that (...) children face when they enter school not understanding the
medium of instruction, when they are expected to learn a new language at the
same time as they are learning in and through the new language. The basic
problemis that children cannot understand what the teacher is saying!

A língua de instrução constitui um dos principais problemas que suscitam vozes anti-coloniais.
São vozes que desafiam contra o legado educacional herdado do colonialismo e massificado em
África através das línguas coloniais na educação ao invés das línguas africanas (Prah 2011),
resultando na transgressão pedagógica, académica, cultural e identitária e sócio-económica da
África. Bamgbose (1991 e 1999); Bunyi (1999); Wolff (2011); Mazrui (1993 e 2002); Brock-Utne
& Alidou (2011) e Heugh (2011a, 2011b) afirmam que a língua de instrução é o maior obstáculo

34
que enfrenta a educação em África. A exclusão das línguas africanas na educação isola a cultura
da língua de instrução e por conseguinte, ocorrem problemas de aprendizagem (Shizha 2005 e
2009).
Segundo mostra Roy-Compbell (2006), a crítica anti-colonial sobre as línguas na educação está
para além da apropriação das línguas coloniais como meio de instrução. Heugh (2011a) e
Bamgbose (1991) defendem a substituição das línguas coloniais pelas africanas, isto é, mais do
que as línguas africanas como meios de instrução nas classes iniciais três a quatro classes em
programas transicionais, propõem que sejam alargadas até cinco classes e garantir a
aprendizagem paralela das línguas coloniais, africanas e regionais. Nesta mesma perspectiva,
Mazrui (2002, 2004) e Alidou (2011) advogam que o ensino em L1 não devia se limitar
exclusivamente ao ensino da literacia em línguas africanas nas quatro classes, mas sim devia
estender-se até as classes nas quais ocorre o ensino da ciência porque, segundo constatam, as
línguas africanas limitam-se à literacia inicial ao passo que a ciência é reservada às línguas
coloniais através da transição das línguas africanas para as línguas coloniais no quarto ano.
Brock-Utne (2012:489) questiona:

Having English or French as the LOI does not promote understanding and
learning in the majority of schoolsin so-called Anglo- or Francophone Africa. The
great majority of pupils lose out. They drop out of school, have to repeat grades,
lose their self-confidence. So why does this system persist? Who benefits fromit?
Whose interests doesit serve?

Para a consecução duma educação anti-colonial linguística, Wolff (2011) propõe que os governos
africanos deviam rever profundamente as políticas educacionais, destruindo os sistemas coloniais
herdados pois, na óptica deste autor, o uso exclusivo das línguas coloniais empobrece o sistema
educativo na sua globalidade. As línguas coloniais, línguas estrangeiras ou não familiares não são
funcionais para a maioria dos alunos africanos. Na visão de Shizha (2015) e de Dei &
Asgharzadeh (2001), as línguas desempenham um papel fulcral na produção, transmissão do
conhecimento e determinam o desempenho e a participação dos alunos na contribuição do seu
conhecimento e da situação na qual aprendem. A dominação das línguas coloniais distorce as
habilidades académicas da maioria dos alunos porque não as dominam e, por conseguinte, são

35
excluídos do direito de aprender inclusive na sua língua materna (Shizha 2015:12). Prah
(2011:12-14) constata que:

If we are waiting for the day when all Africans will learn, read and write in colonial
language, that day will take forever to arrive, and even when or if that day arrived
we would find that Africans have ceased to be Africans, and become “Europeans”
(...) The persistence of colonial language usage in Africa will in effect mean that
aura of inferiority will continue to linger around Africa and Africans.

A educação em línguas africanas no mundo actual tem o desafio de encarar as políticas de


dependências impostas pelas agências de desenvolvimento, pelos doadores, pelo Banco Mundial
e Fundo Monetário Internacional que determinam a educação em línguas maternas africanas
exclusivamente nos níveis iniciais do ensino primário e a seguir, transitar para um ensino em
línguas coloniais (Adegbija 1994; Mazrui 2002, 2004; Prah 2009; Wolff 2011). Esta imposição
condiciona as expectativas da inclusão efectiva das línguas africanas na educação para além das
falácias e argumentos ilógicos das elites africanas.
Segundo wa Thiong´o (1981) e Shizha (2015), o uso das línguas coloniais sob imposição das
organizações acima citadas é uma evidente revelação e demonstração do poder e da hegemonia
política e económica que visa perpetuar as línguas coloniais através do neo-colonialismo e da
globalização. Nestes termos, e dada a fragilidade financeira da África para o desenvolvimento
da educação, ela torna-se dependente. Segundo Mazrui (2004), o Banco Mundial isenta-se de
contribuir na construção e implementação duma política linguística na educação que dê
primazia às línguas africanas. Incumbe a qualquer país a responsabilidade de opção por uma
política linguística educacional desde que assuma as respectivas implicações financeiras. Este
posicionamento, na óptica de Mazrui (2004), é uma estratégia de massificação e consolidação da
hegemonia, do poder e do imperialismo das línguas coloniais nos países africanos e em
simultâneo, representa a subalternização e inferiorização do poder das línguas maternas
africanas na educação. Por esta razão, Mazrui (2004) advoga que o uso das línguas maternas nos
níveis iniciais e de forma reduzida é reconhecido pelo Banco Mundial como fundamental porque
as línguas maternas são elementos essenciais à elevação da qualidade pedagógica e rápida
aprendizagem da língua colonial.

36
Coincidentemente ou não, as línguas maternas africanas são meios de instrução em apenas dois,
três a quatro anos nos programas de educação bilingue de rápida transição (Brock-Utne 2000;
Heugh 2011a, 2011b; Babaci-Wilhite 2013). Na perspectiva de Wolff (2011) estes programas são
ineficientes, são usados para preparar os alunos à aprendizagem, à assimilação forçada da língua
colonial e para garantir a aprendizagem nas classes subsequentes em língua colonial. Por esta
razão, observa-se a subtracção da língua materna sobretudo nos níveis academicamente mais
exigentes e nas disciplinas de ciências. As línguas maternas são empobrecidas e desvalorizadas,
inculcando atitudes negativas nas mentes dos alunos (wa Thiong’o 1983; Mazrui 1993; Bunyi
1999; Brock-Utne 2000; Shizha 2005, 2009; Dei 2011b e Babaci-Wilhite 2013). Este facto
difunde-se e massifica-se através de programas de transição precoce comuns no continente
africano que são contrários a uma educação baseada nas línguas maternas como meios de
instrução. Na visão de Shizha (2005) e de Dei & Asgharzadeh (2001) entre outros educadores,
pensadores e pesquisadores anti-colonais, a educação em África deve proporcionar a
indigenização, a re-africanização e o renascimento cultural do continente, contemplando a
aprendizagem das línguas coloniais como línguas segundas. Benson (2008:2) mostra o poder das
línguas maternas em África nos seguintes termos:

Some argue that just changing the language of teaching will not solve all the
problems of an education system. However, change in the medium of instruction
also brings about other changes: It makes the home culture visible, it allows
learners to talk about their prior knowledge and experience and link them to new
information, it brings the home and the school closer together, it opens up
communication between families and teachers, it facilities communication and
participation in the classroom, it helps learners gain self-esteem and stronger sense
of identity… in sum, using the learner´s language goes a long way toward
resolving many of the access and quality issues that would lead us closer to
reaching Education for All goals. (...) Our goal should be for every learner -
whether young or old, poor or rich, female or male - to gain access to a quality
education that helps her/him reach her/his full potential and live a good live.

As vozes anti-coloniais africanas clamam por uma educação profundamente baseada nas línguas,
nas culturas, nos contextos e nas necessidades diárias das sociedades africanas. Esta resiliência é
manifestada através do interesse continental em romper o passado colonial que se prolongou

37
inclusive no período pós-independência e na actualidade. A África clama pela descolonização,
pela mudança do paradigma da educação com base na conversão da experiência colonial de
dominação cultural, linguística, política, económica e religiosa (Dei 2000; Shizha 2005; Bunyi
1999). Há que combater as atitudes negativas, neo-coloniais dos governos africanos e dos
doadores que perpetuam a marginalização das línguas africanas na educação, bloqueando a
indigenização da educação baseada nas línguas, criatividade intelectual, sistemas de valores,
heranças culturais e indígenas africanas a favor da dominação ocidental através do universalismo
ou globalização (Wolff 2011).

2.1.1.3 A instrução em línguas africanas

O uso das línguas coloniais na instrução contribui, ininterruptamente para a fragilização e


desvalorização da qualidade da educação na África Sub-sahariana pós-independência
(Bamgbose 1999; Bunyi 1999; Brock-Utne 2000; Mazrui 1993 e 2002; Benson 2004; Heugh
2011a; Alidou & Brock-Utne 2011). Wolff (2011:92) debruçando-se sobre a qualidade da
educação para África aponta que “Language is not everything in education, but without language everything
is nothing”.
wa Thiong´o (1983), Mazrui (2002, 2004) e Bamgbose (1983, 2006), entre outros, reclamam a
descolonização da educação na África Subsaariana. Estes autores concluem que a educação pós-
independência continua a hegemonizar as línguas e a subjugar física e espiritualmente os alunos
de línguas africanas (wa Thiong´o 1981). A descolonização, conforme refere Babaci-Wilhite.
(2013) poderia ser uma das partes fundamentais da luta contra o legado colonial, permitindo
assim o uso das línguas maternas na educação. Na perspectiva de Dei (2002, 2005 e 2012b); Dei
& Asgharzadeh (2001); Shizha (2005, 2011, 2014 , 2015), a língua materna africana contribuiria
para a re-africanização ou indigenização dos currículos ou ainda o renascimento africano,
permitindo o ensino dos conhecimentos culturais locais e a promoção de modelos pedagógicos
culturalmente africanos. Roy-Campbell (2006) defende que as línguas africanas são veículos de
criação, codificação e transmissão de conhecimento cultural e que, pelo facto de estas não serem
usadas na educação, a diversidade de conhecimentos culturais desaparece já que estes
conhecimentos não são transmitidos.

38
Os argumentos da descolonização da educação em África ultrapassam o uso das línguas
maternas africanas em apenas três ou quatro e da rápida transição para a língua colonial. Roy-
Campbell (2006:3) questiona:

Why not help them improve their social, economic and political activities via the
indigenous languages, rather than insisting upon them learning English, French
or Portuguese before modern technology can be introduced to them?

O progresso da educação numa língua colonial a partir do terceiro ou quarto ano continua a ser
considerado como um mecanismo curricular de inculcar o neo-colonialismo, a reprodução do
colonialismo que, numa nova era, promove a opressão e a dominação (Dei & Asgharzadeh 2001).
De acordo com a Declaração de Asmara (2000), citada por Mazrui (2004:129), o colonialismo
criou sérios obstáculos contra as línguas africanas e por esta razão, não se deve admitir que
retorne a bloquear o pensamento ou a mente do continente. A África deve recusar a
incongruência imposta pelas línguas coloniais e retornar às línguas da herança africana.
Bamgbose (2006) admitindo que a educação bilingue e ou multilingue em África poderá ser uma
norma, adverte que as línguas maternas africanas deviam ser meios de instrução e nunca
substituídas pelas coloniais. Estas últimas seriam disciplinas. Diante desta observação, Prah
(2011:10) propõe uma transformação dos programas bilingues subsaarianos e conceder uma
educação em línguas maternas africanas:

The argument we are making here, however, goes beyond the use of African
languages or mother-tongue education for the first two to four years. The point is
that like the policy adopted by all developmentally successful countries, African
languages should be used throughout the different stages of the educational
system. The argument goes further to suggest that Africa languages should be used
in all areas and dimensions of social life. Thisis not to suggest that English, French
and Portuguese (the colonial languages of Africa) should not be taught at schools.
Rather they should be taught as second, third or fourth languagesin educational
systems, which allow the acquisition and learning of foreign languages at the
primary and secondary levels.

39
A observação de Bamgbose (2006) assim como a proposta de Prah (2011) incidem sobre a
resistência contra a dominação, a opressão, a descolonização da educação e das mentes a partir
das línguas maternas africanas uma vez que, as línguas coloniais, conforme refere Mazrui (1993)
exercem o controlo do pensamento dos africanos.
Se, por um lado, a descolonização advém de educadores e pesquisadores, há por outro lado, as
declarações continentais e regionais em prol de línguas e da sua efectiva utilização na educação
numa perspectiva anti-colonial. Por exemplo, a Asmara Declaration (2000) citado por Mazrui
(2004:130) propôs uma declaração anti-colonial sobre as línguas e a literatura em África que, na
questão educacional, decidiu que:

All African children have the inalienable right to attend school and learn in their
language mother tongues. Every effort should be made to develop African
languages at all levels of education. African languages are essential for
decolonization of African minds and the African Renaissance.

A ACALAN (2006:3-4) retoma e desenvolve a Asmara Declaration, promulgando a declaração


que prevê que a educação a todos os países membros da União Africana deverá estar baseada
nas línguas maternas africanas em diferentes níveis de ensino e de forma equitativa com as
línguas coloniais:

That the mother tongue has an irreplaceable role and place as a language for
learning (...) We call on governments to adopt and generalize the principle of
Mother Tongue-based Multilingual Education (MT-based MLE): Mother
tongue-based multilingual education is the manifestation of an equitable
partnership between local languages and the dominant (foreign and international)
language or languagesin national education systems. MT-based MLE thus
guarantees that the mother tongue of the learner is taken into account alongside
the other languagesin the educational system, in compliance with the principles
of multilingualism and linguistic diversity recommended by UNESCO, to
promote the development of children as agents of national advancement
(ACALAN 2006:3, 4).

De uma forma geral, as nações subsaarianas, reconhecem que, neste século XXI, há necessidade
continental de fortificar a educação e desafiar o desenvolvimento através da descolonização da

40
educação e libertação das línguas e das mentes. Porém, os programas transicionais continuam a
manter a supremacia das línguas coloniais, destruindo as línguas africanas (Mazrui 1993), dando
a impressão de que as línguas africanas são inferiores às coloniais quando se trata de avançar
seriamente no desenvolvimento cognitivo, científico e académico dos alunos nas classes mais
avançadas depois da transição (Babaci-Wilhite 2015).

2.1.2 Educação anti-colonial: os conhecimentos indígenas na escola

Emeagwali & Dei (2014) afirmam que a África é rica em sistemas de conhecimentos indígenas,
culturais e locais produzidos e criados pelas civilizações africanas. Este acervo de conhecimento
indígena, cultural e local garante a vida quotidiana das comunidades. A educação pré-colonial
(tradicional e informal) em África, segundo refere Rodney (1973), interessava-se por uma
educação de relevância e baseada na transmissão dos conhecimentos indígenas e culturais que
incluía os aspectos socioculturais da vida quotidiana, aspectos materiais, espiritual e da natureza.
Ela era feita com base na observância das fases de desenvolvimento físico, emocional e mental
das crianças. Os métodos pedagógicos e de instrução, na óptica de Dei (2011a), eram
diversificados contudo, todos estavam culturalmente circunscritos nos valores, hábitos, costumes,
tradições, línguas e recursos locais tais como: provérbios; canções; contos tradicionais e
folclóricos; espiritualidade; danças e ritos de iniciação e uma pedagogia centrada no aluno. Neste
género de educação, conforme Shizha (2015:307) os conhecimentos indígenas e culturais eram
transmitidos dentro dos contextos ecológicos, sociais e culturais locais:

Learners in traditional African societies were taught to be masters of their natural


environment and to actively take part in social and cultural activities. Learning
was not an oppressive experience that silenced learners into passive recipients of
knowledge but through dialogical education learners were active co-creators of
knowledge (Shizha 2015:307).

Os alunos eram encorajados a observar e a aprender através dum forte envolvimento na vida
familiar e nas actividades económicas e culturais. Os domínios de conhecimento não se
aprendiam subdivididos senão integrados como aspectos da vida num único currículo de

41
educação tradicional (Nsamenang 2005). Segundo este autor, a família e a comunidade
responsabilizavam-se pela preparação do aluno para a aquisição das habilidades de comunicação
interpessoal, a língua, a cultura, as habilidades cognitivas e mentais que lhe permitiam alargar
os horizontes e propósitos da vida. Assim, o aluno não é instruído mas sim desenvolve habilidades
para a vida com base na participação nos processos culturais existentes na família e na
comunidade.
Com a colonização, segundo constatam Rodney (1973); Shizha (2005, 2015) e Dei (2005), os
colonizadores introduziram uma nova educação caracterizada por um género de instituições
formais de educação fundamentalmente baseadas na imposição das línguas e dos conhecimentos
ocidentais nos currículos coloniais, com o objectivo de inculcar a subordinação, exploração,
confusão mental e o desenvolvimento do subdesenvolvimento dos colonizados. Shizha (2005)
debruçando-se sobre a educação na África colonial, ilustra que as escolas coloniais eram
ideologicamente consideradas centros da cultura e do conhecimento hegemónico, veículos do
iluminismo e da civilização a favor da exploração e da colonização. Os conhecimentos indígenas
e culturais, os hábitos, os rituais e instituições sociais e comunitárias eram sub-categorizados
como símbolos da ignorância e da ausência de conhecimento entre os indígenas africanos. Bunyi
(2008); Mazrui (1993, 2002) enfatizam que este género de instituições de ensino foi herdado e
novamente imposto no período pós-independência, tendo-se verificado algumas mudanças
marcadas pela introdução da geografia e história de África em substituição da geografia e história
das potências colonizadoras. Segundo Abdi (2005), houve a adopção da tradição e estilos de
ensino-aprendizagem ocidentais, abarcando substancialmente as disciplinas, estruturas das lições
e ou dos conteúdos. Dei (2008:231) aponta que:

This has been a form of education that can only be characterized as “non-
indigenized education.” It is education imposed on Africa by external forces. It
has been an education that has for the most part failed to deeply cultivate self-
esteem and pride in peoples of African descent. It was and still is a Eurocentric
education, and it continues to distort, misappropriate and misinterpret African
human condition and reality.

Dei (2008) observa que a educação colonial contrastava com a condição humana e a realidade
africana. As políticas da educação não se descolonizaram das raízes coloniais. No continente, as

42
políticas da educação e especificamente as práticas dos currículos escolares continuaram a
marginalizar, oprimir e a omitir os africanos, os seus conhecimentos indígenas e as suas formas
de saber.
A escola veicula somente o conhecimento eurocêntrico pois há uma perspectiva dos educadores
ocidentais que indica que a África não possui um conhecimento civilizado, racional e
sistematizado que projectaria uma educação de desenvolvimento (Abdi 2005). Os planificadores
dos currículos no contexto africano consideram que as culturas e os conhecimentos africanos
estão retardados, e por sua vez, constituem obstáculos para a aprendizagem e para o alcance da
modernidade (Serpell 1993 apud Nsamenang 2005). Há uma intensa estigmatização dos
conhecimentos indígenas e culturais e um forte desencorajamento nos currículos. Algumas
dentre as razões que estão por detrás da exclusão dos conhecimentos indígenas e culturais nos
currículos africanos têm sido a falácia de que estes são primitivos, bárbaros, selvagens,
irracionais, ilógicos (Bunyi 2008, Abdi 2005), mitos, superstição e não são científicos (Emeagwali
& Dei 2014), não são capazes de deduzir a lógica e o pensamento científico (Dei 2010) e que, por
causa destes estereótipos são classificados como inadequados para o ensino.
Diante deste cenário, verifica-se uma oposição entre a educação tradicional e a educação formal,
isto é, enquanto a educação tradicional procura conectar o aluno ao seu contexto sociocultural
local através de actividades diárias e de vida, a educação formal tende a separá-lo e distanciá-lo
do seu contexto sociocultural, da família e dos conhecimentos indígenas (Nsamenang 2005). Sob
o ponto de vista pedagógico, a exclusão dos conhecimentos indígenas do ensino contribuiu para
a fraca qualidade de desempenho dos alunos na aprendizagem das Ciências Naturais e
Matemáticas bem como a aplicação dos respectivos conhecimentos científicos na resolução de
situações do contexto real e da vida quotidiana dos alunos e da comunidade (Nsamenang &
Tchombe 2011). Uma das razões que justificam este problema pedagógico é apontada por Taale
et al. (2012) que diz existir uma grande diferença entre os conhecimentos indígenas desenvolvidos
no contexto sociocultural e os conhecimentos veiculados na escola. Estes últimos não tomam em
consideração os primeiros ou por outra, ignoram os conhecimentos indígenas dos alunos e por
conseguinte, estes aprendem as ciências de forma passiva e em línguas por si desconhecidas
(línguas coloniais não dominadas). Há diferenças, oposições e incompatibilidades entre os
aspectos socioculturais, os conhecimentos culturais dos alunos e a cultura ocidental e hegemónica

43
promovida pela escola (Ladson-Billing 1995a, Gay 2002). Estes factores contribuem para o
insucesso pedagógico dos alunos das minorias, a alienação e a assimilação cultural (Vogt et al.
1987) e o insucesso académico dos alunos minoritarizados (Villegas 1990). Não há a libertação
do conhecimento e do pensamento num ensino progressivo, no qual os alunos aprendem o seu
mundo sociocultural de forma crítica senão um ensino de supremacia e de interpretação com
base na dominação do conhecimento ocidental (hooks 2003). Este género de ensino sobretudo
das ciências no continente africano é criticado por Jegede & Aikenhead (1999:1) nos seguintes
termos:

(...) knowledge is not a passive commodity to be transferred from a teacher to


learners, (...) pupils cannot and should not be made to absorb knowledge in a
spongy fashion, (...) knowledge cannot exist separate from the knower, (...) learning
is a social process mediated by the learner’s environment, and (...) the prior or
indigenous knowledge of the learner is of significance in accomplishing the
construction of meaning in a new situation. All learning is mediated by culture
and takes place in a social context.

Em contrapartida, Bunyi (2008) e Dei (2008) defendem que a solução dos problemas de
desenvolvimento de África exige um empoderamento das línguas e dos conhecimentos indígenas
e culturais através da educação. Corroborando com as visões de Bunyi (2008) e de Dei (2008),
Abdi (2005) entende que o “know-how” e os conhecimentos dos africanos precisam de uma
formulação e de uma epistemologia legítima que sustentem um sistema de educação que não
sejam necessariamente ocidentais senão assentes na história, cultura e interesses dos africanos.
As análises e constatações dos autores acima citados desafiam o continente a construir uma
educação profundamente sustentada pelos conhecimentos, línguas, culturas, história, identidade,
pedagogias e objectivos dos sujeitos. Trata-se duma educação para a descolonização e para a
resistência anti-colonial imposta através dos conhecimentos veiculados e transmitidos aos alunos
sem que se tenha atenção e consideração pedagógica, cultural e social dos seus contextos
socioculturais. O profundo interesse da África é, na perspectiva de Shizha (2005:67), desenvolver
uma educação que não seja uma imposição ocidental mas sim:

44
(...) a redefined African education system should aim at reclaiming the African
cultural histories and memories. Schools should be cultural spaces and centers
that provide strategies to reclaim African indigeneity and overcome threats from
cultural alienation. Schools should empower students to define their own destiny
and cultural selves.

Na mesma visão, Dei (2011a:99) acrescenta que tal educação caracterizar-se-ia, possivelmente
no retorno às identidades africanas:

Perhaps education that goes back to the “roots” to cultivate and work with the
teachings of local culture, social history and knowledge systems can be a good
starting point to educate the contemporary African learner.

A descolonização através dos conhecimentos indígenas marca uma nova perspectiva


concentrada num processo de desconstrução do currículo colonial, rompendo com as suas
estruturas hegemónicas, reconstruindo uma nova educação sustentada na cultura, nas línguas,
nos conhecimentos e no quotidiano dos africanos (Shizha 2005). É uma perspectiva que
reconhece o quão a colonização é imposta aos africanos, considerados inferiores pelos ocidentais
(Mazrui 1993) e que, com a educação, os colonizados perdem a sua identidade e a sua confiança,
tornam-se vítimas do imperialismo cultural ocidental (Shizha 2005). O interesse colonial
implícito nos currículos africanos é de reprimir e desvalorizar a cultura africana, desumanizar e
alienar o sujeito de tal forma que a sua mente não reconheça o valor dos conhecimentos
indígenas como suas identidades construídas e transmitidas de geração em geração durante
séculos (Shizha 2015).
Dei & Asgharzadeh (2001) e Dei (2000) recorrem aos conhecimentos indígenas e culturais como
fundamentos que sustentam a perspectiva teórica anti-colonial e interrogam a supremacia
científica que se atribui ao conhecimento ocidental. O discurso anti-colonial, segundo Dei (2000),
reconhece o valor do conhecimento produzido nos contos, culturas, experiências humanas,
línguas indígenas, na cognição, lógica e nas interacções sociais e diárias. Estes elementos formam
a tese de Dei (2012a:127) em relação à transformação da educação em África:

A transformed African education must be informed by local understandings of the


complex linkages between natural, spiritual, social, cultural, political and

45
economic forces of society. Such recognition givesintellectual agency to African
peoples as agentsin the construction of our own knowledges.

A educação, na perspectiva anti-colonial, deve integrar a diversidade dos valores que fazem parte
dos princípios identitários africanos outrora excluídos dos currículos educacionais. Sob o ponto
de vista pedagógico, os currículos anti-coloniais e africanizados devem representar as convenções
simbólicas e experiências culturais, sociais e comunitárias. Nesta óptica, advoga-se que o ensino-
aprendizagem esteja baseado nas culturas, nos conhecimentos, nas línguas e nos procedimentos
da educação indígena, eliminando desta forma a distância entre o contexto específico de ensino
e as práticas e actividades culturais e identitárias da comunidade (Shizha 2015; Nsamenang
2005).

2.1.2.1 Indigenização e africanização da educação

De acordo com Nsamenang & Tchombe (2011) a educação em África devia ser reconstruída por
forma a apropriar-se do contexto do rico património cultural e da prática educativa e cultural
indígena e africana ou educação tradicional. Estes autores entendem que a transformação da
educação em África poder-se-ia concretizar através duma filosofia de educação generativa que
incorpora pedagogicamente a reapropriação da epistemologia dos conhecimentos indígenas,
culturais e as pedagogias africanas (tradições educativas africanas):

The aim of generative education is to secure African cultural identity and teach
African knowledges bases, complementing them with productive techno-cognitive
contents and responsible values. The intention is to open and appreciate
Africanity (indigenous African institutions, knowledge systems, and techniques).
(...) global trends oblige teachers to not only instruct along domain-specific
knowledge and skills but more importantly to build into their pedagogic strategies
generic skills (...) as well as sensitivity to learners´ rights to a cultural identity. (...)
provides teachers with opportunities to be learners, too; teachers become learners
who teach (Cordeiro 1993) and learners become knowledge generators with
teachers as facilitators (Nsamenang & Tchombe 2011:12).

46
Dei (2008, 2010) afirma que o desenvolvimento da África poderá advir da aposta pelos sistemas
de conhecimentos indígenas, culturais e locais. A perspectiva de Dei (2010) indica que é com
base nos conhecimentos indígenas quais as comunidades interpretam o seu mundo e definem
como nele agir. Desta forma, o desenvolvimento centrado no africano propõe que os povos locais
devem recorrer aos conhecimentos relevantes, à sua história, às tradições e às culturas indígenas
para solucionar os seus problemas. Conforme Shizha (2005) a africanização da educação é um
projecto de desenvolvimento, de descolonização e do anti-racismo cuja intenção está assente na
emancipação e no empoderamento dos alunos e das comunidades. Mungwini (2013) defende
que a reapropriação das epistemologias africanas poderá destruir o legado do colonialismo,
legitimar as formas de conhecer da África e colocar a África a contribuir, universalmente com a
multiplicidade de conhecimentos ou epistemologias policêntricas ao nível global, quebrando
desta maneira, a hegemonia dum único conhecimento ocidental. Segundo este autor, é com a
reapropriação e reconstrução epistemológica que a África construirá a sua modernidade. Na
visão de Dei (2010) o ensino em África deve articular-se com base na génese da etno-
epistemologia do conhecimento cultural e nos sujeitos locais. Para Shizha (2005), a africanização
da educação rompe com a lógica e mentalidade colonial inculcada no colonizado e no
colonizador e exige a integração das realidades africanas e as realidades impostas pela
globalização. O ensino se torna contextualizado aos factores ecológicos locais dos alunos tais
como: experiências; ambiente comunitário; “background” cultural; identidades étnicas dos alunos
e dos professores (Gay 2000; Taylor & Sobel 2011):

(...) all learners bring multiple readings and knowledges to the pursuit of education
and its goals of social development. Such a multiple knowledge base allows for
critical interrogation (and possible subversion) of dominant/hegemonic
perspectives (...) bringing more critical, local, and cultural resource knowledge to
bear on an academic project - challenging deployment and appropriating the
discourse of neo-liberal reform - we offer alternative and genuine education and
development options (Dei 2008:230).

Diante destes desafios, a educação é chamada a regenerar-se e a construir uma filosofia de


educação anti-colonial africana com objectivo de que ela seja um factor de desenvolvimento e
de modernidade em África após paralisação e destruição pela hegemonia da educação colonial.

47
2.1.2.2 Interacção intercultural entre os conhecimentos indígenas e os
ocidentais

Na construção da filosofia de educação africana observa-se um profundo objectivo de africanizar


e indigenizar a educação em África (Dei 2010; Shizha 2005, 2014). Entretanto, Dei (2000)
sustenta que o conhecimento não é estático, mas sim constantemente criado e recriado no
contexto. Os conhecimentos indígenas e culturais na educação descolonizam a hegemonia e o
domínio dos conhecimentos ocidentais e abrem espaços para a interacção e complementaridade
entre os dois modelos. Assim, ambos podem co-existir e as suas diferenças anulam a dicotomia
entre o tradicional (conhecimento indígena) e o moderno (conhecimento ocidental) (Shizha
2005). Na óptica de Dei (2010:75), os conhecimentos indígenas e os ocidentais são ambos
relevantes para a educação de desenvolvimento:

Indigenous knowledges do not reveal a conceptual divide with “Western


knowledge”. Indigenousis not strictly in opposition to “Western”. The concept of
“Indigenous” is to be thought of in relation to Western knowledge (Dei 2010:75).

Sob o ponto de vista pedagógico, a interacção entre dois conhecimentos contribui para o
enriquecimento da educação no contexto africano mais do que a transmissão e acumulação de
conhecimentos inaplicáveis na vida quotidiana devido à dissonância entre os conhecimentos
ocidentais transmitidos na escola e os usos e costumes contextuais e socioculturais dos alunos
(Shizha 2005).
A hibridização dos conhecimentos indígenas e ocidentais na educação é necessária (Shizha 2005,
2014). Conforme Shizha (2009) os conhecimentos indígenas e culturais são os elementos
essenciais que garantem a sobrevivência de diversas comunidades rurais africanas. O problema
que se coloca tem a ver com a reconciliação e a construção de sinergias destes últimos com os
ocidentais sem que haja substituição dum pelo outro na educação (Shizha 2009). As sinergias
surgirão da combinação de conhecimentos que invocam uma educação culturalmente
contextualizada que a de alienação, destruição, dominação cultural. Este género de educação
integra-se na filosofia da construção da modernidade africana na qual, segundo ilustra Mungwini
(2013) as realidades sociais estariam em diálogo e em interacção com os conhecimentos

48
ocidentais. Esta perspectiva policêntrica baseada nos conhecimentos indígenas e culturais
possibilitaria a libertação e a descolonização mental e conceptual da África através da educação,
anularia a inferioridade colonialista imposta contra os conhecimentos indígenas e culturais
diante da superioridade dos conhecimentos ocidentais (Mungwini 2013). Relacionados com esta
perspectiva, destacam-se algumas abordagens teóricas que pedagogicamente defendem uma
educação culturalmente contextualizada, baseada na hibridização, na dualidade ou ainda na
“pedagogia de pontes” (Gay 2013) entre os conhecimentos indígenas, culturais dos alunos e os
conhecimentos ocidentais no ensino, a destacar: collateral learning proposto por (Jegede 1993,
1995), cross-cultural border idealizado por (Aikenhead 1996, 2001a, 2006). A partir destas
abordagens, o ensino destruiria o dogma de interpretar o conhecimento duma forma monolítica
e numa única visão hegemónica ocidental (Shizha 2009). O ensino passaria a cruzar os
conhecimentos indígenas e ocidentais, as línguas indígenas e as ocidentais e as formas de
conhecer e pensar complementam-se dentro da africanização do currículo (Shizha 2005). Os
alunos e a comunidade local teriam espaços de intervenção pedagógica na produção do
conhecimento caracterizado pelas experiências socioculturais dos intervenientes que teriam uma
valiosa relevância no desenvolvimento dos alunos e da respectiva comunidade:

Pedagogy should be approached from diverse perspectives that allow the


pedagogical process to be culturally sensitive accepting cultural variations that
may exist within the classroom. Classroom life should reflect the social and
cultural contexts that relate to students’ experiences. At the same time, classroom
experiences should also focus on the need to meet the current societal needs. This
means that although pedagogy should be culturally sensitive, it should not ignore
aspects of Western knowledge constructs that have benefited society for the past
century under colonialism. Pedagogical practices that integrate history are
conducive to reconstructed curricula that incorporate reality as perceived from
different cultural and social backgrounds. Learning, in this context, becomes a
meaningful and fulfilling experience that helps students to be useful participantsin
their society (Shizha 2005:68).

A hibridização veiculada pela africanização da educação fortaleceria a resistência do continente


contra a imposição da globalização neo-liberal do conhecimento eurocêntrico que domina os
programas de educação em África (Shizha 2005:73):

49
African indigenousness is being weakened by the cultural onslaught from global
processes that reify and mystify Western cultural realities. (...) Globalization has
tended to universalize, validate, and legitimate Western knowledge while
trivializing indigenous knowledge systems.

A resistência anti-colonial com base na africanização da educação abrange não apenas os alunos
como também a comunidade. Esta comunidade detém e produz novas epistemologias globais
policêntricas de conhecimentos indígenas mesmo não sendo alfabetizada. Segundo wa Thiong´o
(2013) há, na perspectiva colonial, a percepção de que o sujeito analfabeto, o sem caneta, é
ignorante ou o conhecimento que possui não tem validade. Estes sujeitos, os sem caneta, são os
recursos que, com base na pesquisa-acção participativa, introduziriam os conhecimentos
indígenas resultantes de experiências comunitárias e ou individuais na escola (Dei 2010).

2.2 Pedagogia linguística bilingue e cultural

Neste secção discuto a fundamentação teórica da pedagogia linguística translanguaging (García


2009, García & Wei 2014) e a pedagogia cultural collateral learning (Jegede 1993, 1995, 1999) e
cross-cultural border (Aikenhead 1996, 2001a, 2006). O enquadramento teórico desta perspectiva
nesta pesquisa justifica-se pelo facto de os seus aportes teóricos valorizarem a integração e
exploração das línguas indígenas como um único repertório discursivo no ensino-aprendizagem
opondo-se ao princípio de separação ou de fronteiras entre as línguas. Esta nova abordagem
liberaliza o uso das línguas de forma dinâmica e flexível o que é de extrema relevância para
estudar as possibilidades de superação linguístico-pedagógica causados pela L2, língua de
instrução nas classes de pós-transição.

2.2.1 O paradigma do monolinguismo no ensino bilingue

De forma dominante, a educação bilingue orienta-se pelo “princípio monolingue” (Howatt 1984
apud Cummins 2007), separação de línguas e o ensino centrado no método directo em língua-
alvo, L2 (Cummins 2007; García 2009; Creese & Blackledge 2010; García & Wei 2014). As

50
práticas de ensino da/em L2 excluem o uso da L1. Nestes termos, a L1 (língua forte) é
pedagogicamente vista como uma língua negativa e perturbadora da aprendizagem da L2 (Cook
2001). Para Cummins (2008), a separação rígida de línguas no ensino da L2 e nos programas de
educação bilingue evidencia a materialização da abordagem monolingue de ensino e do
fenómeno “two solitudes”. Segundo Cummins (2007, 2008), o fenómeno “two solitudes” foi
inicialmente expresso por Lambert (1984:13 apud Cummins 2007:229) para proibir a ocorrência
de práticas bilingues no programa de imersão. Este advogava que o bilinguismo seria
desenvolvido com base na separação de línguas por aula e no incentivo de práticas monolingues
para evitar a contaminação ou perturbação da aprendizagem da L2, conforme refere Jacobson
(1990:4):
Bilingual educators have usually insisted on the separation of two languages, one
of which is English and the other, the child´s vernacular. By strictly separating the
languages, the teacher avoids, it is argued, cross-contamination, thus making it
easier for the children to acquire a new linguistic system as he/she internalizes a
given lesson.

De acordo com García & Sylvan (2011) a educação bilingue recorre à pedagogia monolingue
que em termos pedagógicos, torna as línguas como se fossem estáticas, homogéneas e monolíticas
e os alunos são tidos como monolingues que adicionam a L2 depois da L1. A constatação destes
autores evidencia a ausência de oportunidades pedagógicas para a acção de estratégias de ensino-
aprendizagem que promovem a “cross-language transfer” entre duas línguas (Cummins 2008) muito
menos tolerar o uso da língua do aluno e de ambas as línguas para “cultivar” a outra (L1/L2)
(Creese & Blackledge 2010). Os programas de educação bilingue ainda pautam por uma
abordagem de ensino monolingue em L2 ou seja, um ensino num modelo de bilinguismo
separado (separação entre a L1 e a L2, um ensino de insistência de uso da L2 (Creese &
Blackledge 2010)).
Cook (2001) refere que, embora haja uma forte tendência para separar a L2 da L1, as práticas
da sala de aulas e a interacção entre os alunos evidenciam a ocorrência simultânea da L1 e da
L2 em forma de “code-switching” que, segundo García & Wei (2014), se considerava sinal da
deficiência linguística e cognitiva dos alunos. Porém, os professores consideram-na como uma
estratégia linguística e pedagógica de facilitação de aprendizagem dos conteúdos aplicável na

51
aula quando os alunos aprendem numa L2 de baixa proficiência (Arthur & Martin 2006;
Ferguson 2003). Jacobson (1990) ilustra padrões de distribuição das línguas como estratégias
eficientes de ensino que permitem desenvolver simultaneamente a proficiência linguística e
académica em L2 e L1 nos alunos. Concluindo, o uso de duas línguas no ensino-aprendizagem
tende a ser visto como sendo linguística e pedagogicamente viável do que a separação de línguas
e a maior exposição da L2 que se hegemoniza em diferentes programas aditivos e subtractivos.

2.2.2 Translanguaging: pedagogia bilingue

O translanguaging afigura-se como uma nova perspectiva teórica linguístico-pedagógica do século


XXI que defende o uso de duas línguas no mesmo contexto de ensino (García 2009). Esta
perspectiva foi concebida por Williams em 1980 e popularizada por Baker (2001) e García (2009).
De acordo com Lewis et al. (2012a), o translanguaging surge no contexto educacional do País de
Gales em reacção contra o monolinguismo, a separação de línguas, a opressão e dominação do
inglês cuja superioridade extinguia o galês. O translanguaging propunha a revitalização do galês
no ensino de inglês. Williams (1994, 1996) apud Baker (2001) compreendia o translanguaging como
prática pedagógica bilingue na qual ambas as línguas são exploradas em simultâneo com o
intuito de desenvolvê-las e garantir uma aprendizagem efectiva dos conteúdos. Lewis et al.
(2012a:643) mostram o que translanguaging representa:

(...) pedagogical practice which deliberately switches the language mode of input
and output in bilingual classrooms: translanguaging means that you receive
information through the medium of one language (e . g., English) and use it
yourself through the medium of other language (e . g., Welsh).

Lewis et al. (2012a:644), citando Williams (1996, 2002, 2003) ilustra que o translanguaging
corresponde aos diferentes usos e intercâmbios de duas línguas (a língua fraca L2 e a língua forte,
L1) que se desenvolvem de forma equilibrada e suscitam vários processos cognitivos no sucesso
do ensino.
No contexto de ensino-aprendizagem, o translanguaging recorre aos recursos linguísticos
disponíveis ao aluno através duma funcionalidade dinâmica que envolve a mediação dos

52
processos mentais de compreensão, da fala, literacia que maximizam a aprendizagem (Lewis et
al. 2012b). García (2009) interpreta o translanguaging como práticas discursivas múltiplas nas quais
os bilingues constroem significados no seu mundo bilingue. Estas práticas referentes ao
translanguaging não representam o bilinguismo aditivo ou bilinguismo equilibrado que vê as
línguas como unidades monolingues separadas. Elas são evidências dum bilinguismo dinâmico
no qual as duas línguas formam um único repertório linguístico. Canagarajah (2011) enfatiza a
visão de García (2009) ilustrando que o translanguaging é um fenómeno que ocorre naturalmente
no contexto educativo bilingue ou multilingue no qual, os professores e os alunos adoptam os
seus repertórios multilingues como recursos para fins do ensino. Hornberger & Link (2012:240)
discutem o translanguaging como:

(...) translanguaging refers broadly to how bilingual students communicate and


make meaning by drawing on and intermingling linguistic features from different
languages.

O translanguaging parte do code-switching no qual as línguas são usadas como códigos que embora
sejam usadas em simultâneo num modo monolingue, elas mantêm-se como línguas separadas
(Cook 2001). Wei (2011b) apud Lewis et al. (2012b) advoga que o code-switching não é apenas a
combinação de duas línguas mas como estratégia criativa dos usuários das duas línguas. Para
Wei (2011b) apud Lewis. et al. (2012b) esta característica do code-switching assemelha-se a do
translanguaging. Garcia (2009) refuta a ideia da semelhança entre o code-switching e o translanguaging.
A autora entende que o translanguaging é mais do que o code-switching. O translanguaging não separa
as línguas, tal como conceptualiza o code-switching. Lewis et al. (2012b:663) com base num
contexto galês, mostram como se caracteriza o translanguaging no ensino:

Pupils can read a worksheet that contain both Welsh and English texts and then
go to write (a) in Welsh and or (b) in English, using information received from
both the Welsh and English texts. Thisis the flexibility that is evident in classrooms
where teachers are experimenting with translanguaging.

53
Este género de práticas explora as duas línguas como único recurso linguístico numa perspectiva
do bilinguismo e não as duas línguas consideradas códigos separados que, na perspectiva do code-
switching, promovem práticas linguísticas monolingues (García 2012).

2.2.2.1 Translanguaging na aula

O translanguaging é uma teoria pedagógica que desafia a separação de línguas e o code-switching na


educação bilingue (Lewis et al. 2012b). Nenhuma língua é superior ou inferior, dominante ou
dominada, maioritária ou minoritária. Ambas são, na perspectiva de García (2009), necessárias
para a formação do bilinguismo dinâmico e dum único repertório linguístico. Nestes termos, o
translanguaging é pedagogicamente uma perspectiva teórica que transforma substancialmente os
professores, os alunos e a educação bilingue na medida em que ambas as línguas
representamuma prática discursiva bilingue adequada para o ensino nos contextos de educação
bilingue (García & Wei 2014). O translanguaging é em si uma oportunidade pedagógica que
permite aos alunos usar as práticas linguísticas bilingues com base na L1 e na L2 como um único
repertório linguístico discursivo que, por conseguinte, flexibiliza o ensino e a compreensão dos
conteúdos complexos (García 2012). Noutra abordagem, García (2011a:147) apud García & Wei
(2014:65) demonstra que o translanguaging abrange por completo todas as práticas bilingues de
sala de aulas e, por este motivo, considera ser uma estratégia metadiscursiva essencial para os
alunos e para o contexto de sala bilingue no século XXI. Tanto o translanguaging oficial planificado
pelo professor, como o translanguaging natural apresentado pelo aluno no acto de aprender na sala
de aulas (Williams 2012 apud García & Wei 2014:91) constituem uma grandiosa vantagem na
aprendizagem dos alunos (Lewis et al. 2012b). O professor e os alunos interagem na construção
da aprendizagem através duma pedagogia bilingue flexível caracterizada pela negociação sem
fronteiras e sem a obrigatoriedade de separação entre línguas (Creese & Blacklegde 2010). Esta
visão é corroborada por García & Sylvan (2011:386) ao referir que:

(...) teaching in today´s multilingual/multilingual classrooms should focus on


communicating with all students and negotiating challenging academic content
with all of them by building on their different language practices, rather than
simply promoting and teaching one or more standard languages (...)

54
O translanguaging rompe com a pedagogia duma única língua no contexto de ensino tanto de L2
como de conteúdos nos programas de educação bilingue e promove práticas pedagógicas
bilingues. O interesse em construir significados e uma comunicação efectiva num contexto de
práticas discursivas bilingues no ensino, torna-o num mecanismo, numa ferramenta estratégica
e pedagógica de facilitação de aprendizagem (García 2009; Hornberger & Link 2012).
Baker (2001) interpreta o translanguaging como perspectiva pedagógica bilingue que ultrapassa o
uso concorrente de duas línguas. Para Baker (2001), o translanguaging desenvolve o “input” (leitura
e audição) numa língua e o “output” (fala e escrita) noutra língua e por conta disso, promove a
compreensão elevada dos conteúdos; o desenvolvimento das habilidades dos alunos na língua
fraca (L2); a proporção dum forte bilinguismo e de habilidades linguístico-académicas em ambas
as línguas (L1 e L2); a facilidade e a cooperação entre o contexto social do aluno e o da escola e;
por último, as línguas são desenvolvidas em paralelo com os conteúdos.
Jones & Lewis (in press) apud Lewis et al. (2012b) apontam que os alunos consideram o
translanguaging como uma estratégia que proporciona uma aprendizagem efectiva, constrói o
sentido nas actividades da aula e constitui uma ferramenta que facilita a compreensão dos
conteúdos. Esta constatação assemelha-se ao que Creese & Blackledge (2010) consideram como
pedagogia flexível bilingue que, à semelhança da aprendizagem efectiva reconhecida pelos
alunos, estes e o professor constroem um género de interacção e participação em duas línguas.
García & Wei (2014), explorando a flexibilidade que o translanguaging proporciona aos alunos no
contexto de ensino, concluem que estes auto-desenvolvem, auto-controlam e auto-regulam a sua
aprendizagem. Makalela (2015) num estudo sobre o translanguaging em três línguas no contexto
sul-africanas cita um extracto de posicionamento dum aluno após a experiência de aprendizagem
num repertório formado por três línguas nos seguintes termos:

Even though I cannot myself and learners who use only one language to learn, I
realize that I was able to think in Sepedi, in English and in other languagesi know.
I had to know an idea three or four times. Sometimesi find that there are no words
to explain from one language. My mind was challenged and I think that is why I
concentrated in this class and passed the course so well (Makalela 2015:212).

55
A aplicação pedagógica do translanguaging não exige necessariamente que os alunos ou os
professores sejam bilingues equilibrados. Cummins (2008), na abordagem de sobre o “cross-
language transfer”, observa que a manifestação de diferentes L1´s nas actividades de literacia em
L2 não está condicionada aos níveis elevados de proficiência dos alunos em ambas as línguas.
Portanto, a pedagogia de translanguaging pode efectivar-se tanto com os alunos de diferentes L1e
diferentes proficiências em L2 (Cummins 2008) como com os alunos “emergent bilinguals” (García
et al. 2008; García & Kleifgen 2018). Os alunos vêem vantagens pedagógicas quando o ensino-
aprendizagem permite que a L1 seja usada em paralelo com a L2 segundo ilustra o extracto dum
dos alunos:

When I am allowed to use my first language in classit helps me with my writing


and reading of English because if I translation in english to urdu then urdu give
me help for English language. I also think better and write more in English when
I use urdu because I can see in urdu what I want to say in English (Cummins
2008:71).

Na situação dos alunos bilingues emergentes e da pedagogia do translanguaging, ambas as


línguassão usadas de forma dinâmica e funcional para maximizar a fala, a literacia, a
aprendizagem e a compreensão académica do conteúdo e da língua (Lewis et al. 2012a) e
contribuem para o engajamento dos alunos que García & Wei (2014) denominam por “bilinguals
continuum”. Neste processo, subjaz a interdependência entre as duas línguas através da “cross-
linguistic transfer” através da competência linguística bilingue (Lewis 2012).

2.2.2.2 Translanguaging como pedagogia flexível e dinâmica

O translanguaging opõe-se criticamente com os tipos de bilinguismo aditivo e subtractivo e introduz


o bilinguismo dinâmico (García 2009; García & Wei 2014) e o bilinguismo flexível (Creese &
Blackledge 2010). Estes tipos de bilinguismo promovem a flexibilidade e a dinâmica de uso das
línguas como práticas bilingues e como uma norma. As línguas têm entre si uma relação de
interdependência, “cross-linguistic transfer” (Cummins 2007, 2008; García & Wei 2014) e sem
fronteiras semióticas (Creese & Blackledge 2010).

56
Os alunos encontram na estratégia do translanguaging uma oportunidade pedagógica que os
possibilita, usar as duas línguas de forma flexível e transformá-las em recursos linguísticos
(Blackledge & Creese 2014) ou num único repertório linguístico (García 2009). Lewis et al.
(2012b:655) observa que a flexibilidade do translanguaging proporciona uma funcionalidade
pedagógica e cognitiva integral:

In the classroom, translanguaging tries to draw on all the linguistic resources of


the child to maximize understanding and achievement. Thus, both languages are
used in dynamic and functionally integrated manner to organize and mediate
mental processesin understanding, speaking, literacy, and not, least, learning.

Não obstante a forma dinâmica e funcional que resulta do uso de duas línguas no contexto de
ensino, Canagarajah (2011) mostra que o translanguaging é um fenómeno que se verifica de forma
natural e que ocupa as práticas pedagógicas nos contextos de ensino multilingue. Por detrás desta
constatação, Velasco & García (2014) referem que, quando os alunos usam os seus recursos
linguísticos mais do que assumi-los como estratégia de facilitação da aprendizagem “scaffolding
instruction”, desenvolvem as suas habilidades metacognitivas, activam o pensamento crítico e
auto-regulam a sua aprendizagem. Em outras palavras, os alunos usam as estratégias e os
recursos linguísticos ao seu dispor para resolver situações da aprendizagem. Segundo
Hornberger & Link (2012) os alunos vêem no translanguaging um mecanismo pedagógico flexível
que facilita e dinamiza a aprendizagem linguística e académica.
A perspectiva “continua biliteracy” desenvolvida por Hornberger (2003) representa um género de
comunicação escrita baseada no translanguaging que ocorre em duas ou mais línguas
(Hornberger 2003). A “continua biliteracy” sugere o desenvolvimento contínuo de habilidades de
literacia bilingue (biliteracia) com base na intersecção de dois ou mais meios de instrução com
ou sem semelhanças ortográficas, etc (Hornberger 2003). Esta perspectiva possibilita, de forma
flexível e dinâmica, o desenvolvimento infinito de práticas de literacia bilingue “biliteracy continua”,
facilitando a aprendizagem e o desenvolvimento multilingue e académico dos alunos “emergent
bilinguals” a partir de duas ou mais línguas (Hornberger & Link 2012).
De acordo com Arthur & Martin (2006) e García (2009), nos contextos pós-coloniais, os alunos
têm o desafio de aprender numa língua colonial que não a dominam. Clegg & Afitska (2011)

57
ilustram que todo o esforço de inclusão das línguas maternas africanas na educação como meio
de instrução visa transitar, a curto prazo para a língua colonial que é, hegemonicamente, o meio
de instrução nos subsequentes níveis de escolarização. Quando os alunos transitam para a língua
colonial como meio de instrução, estes apresentam fracas habilidades linguísticas e académicas
na língua colonial que reduz as possibilidades duma aprendizagem activa de Ciências Naturais
(Probyn 2015). O princípio linguístico e pedagógico nestes contextos pós-coloniais subsarianos
defende a separação entre a língua colonial e as línguas indígenas dos alunos. O ensino é
desenvolvido na perspectiva monolingue contudo, os professores adoptam o code-switching ou a
alternância de códigos entre a L1 e L2 como recurso metadiscursivo na aula para garantir a
aprendizagem dos alunos mesmo reconhecendo a proibição deste género de práticas linguísticas
instituídas pelo currículo (Arthur & Martin 2006; Clegg & Afitska 2011; Chimbutane 2015). Os
professores na África Subsaariana, vêem-na como uma estratégia pedagógica que ocorre de
diversas formas, e diante de diversos objectivos, entretanto ela permite o ensino dos professores
e aprendizagem dos alunos (Ferguson 2003; Chimbutane 2011, 2012 e 2015).
A separação das línguas e a sua classificação como códigos hierarquizados manifestam-se dentro
das práticas do code-switching (García 2009, 2012). Todavia, a perspectiva teórica do translanguaging
é oposta ao code-switching (García 2009; García & Wei 2014). O code-switching é uma das formas
de manifestação da resistência histórica e cultural do monolinguismo imposto pela educação em
línguas coloniais contra os alunos de línguas minoritarizadas (García & Leiva 2014). Em
continuidade, estas autoras defendem que:

(...) what makes translanguaging different from these other fluid languaging
practicesis that is transformative, attempting to wipe out hierarchy of languaging
practices (...) translanguaging could be a mechanism for social justice, especially
when teaching students from languages of minoritized communities (García &
Leiva 2014:200).

A pedagogia de translanguaging abre oportunidades e espação para a participação dos alunos dos
programas transicionais em África. Os alunos podem expor as suas vozes, as suas ideias através
da liberdade de usar uma ou as línguas numa relação “cross-language transfer” da L1 a L2 e vice-
versa (Cummins 2007, 2008) de forma linguisticamente dinâmica (bilinguismo dinâmico) e flexível

58
(bilinguismo flexível) uma vez que as duas línguas se transformam num único repertório
linguístico, discursivo e pedagógico (García 2009; Creese & Blackledge 2010). As estratégias
pedagógicas de translanguaging são flexíveis por conta dos alunos que participam, abordando sobre
os seus domínios sociais, culturais, comunitários e das suas vidas (Creese & Blackledge 2010).
Esta constatação corrobora com a visão de Cummins (2008) segundo a qual, os alunos possuem
os conhecimentos socioculturais codificados em L1. Assim, a partir do momento que a L1 é
integrada no ensino em L2, os alunos dos programas de educação bilingue transferirão os seus
conhecimentos socioculturais para a aprendizagem da/em L2. Como se pode depreender, a sala
de aula transforma-se num espaço pedagogicamente ecológico no qual os alunos efectuam
transições de sistema de conhecimentos para outro e de uma língua para outra. Estas transições
são significativas para o desenvolvimento das competências linguísticas, culturais, cognitivas e
académicos dos alunos dos programas de educação bilingue. García & Leiva (2014) referem que
o translanguaging, mais além de ser uma perspectiva pedagógica, ela é, em si, uma pedagogia que
luta a favor da restituição da justiça social na medida em que os alunos das línguas
minoritarizadas têm as oportunidades para participar nos processos de construção de
conhecimento a partir das suas L1´s e da L2. Os alunos utilizam as habilidades adquiridas na L1
para suportar o desenvolvimento do bilinguismo dinâmico e compreender o conhecimento na
aula (Lewis et al. 2012b).
Opostamente ao princípio de separação das línguas assente no uso da pedagogia monolingue
nos contextos de ensino de L2 e dos programas bilingues, a pedagogia do translanguaging possibilita
a construção de um género de participação bilingue e flexível dos alunos e dos professores (Creese
& Blacklegde 2010), tornando a aprendizagem de línguas e dos conteúdos académicos
compreensíveis. Esta pedagogia elimina as barreiras de incompreensão associadas aos baixos
níveis de proficiência linguística na L2 bem como a pedagogia monolingue que separa as línguas
e favorecem a hegemonia da L2 (García 2012).

2.3 Pedagogia cultural e dois conhecimentos

As pedagogias culturais collateral learning (Jegede 1993, 1995, 1999) e cross-cultural border (Aikenhead
1996, 2001a, 2006) são, teoricamente, duas abordagens de ensino de ciências através de pontes

59
entre os conhecimentos universais e ou considerados científicos e os conhecimentos, experiências
e práticas da vida quotidiana e que representam as formas socioculturais de ser e de estar das
comunidades dos alunos. A partir destas duas abordagens inter-relacionadas constatei que o
ensino das ciências passa a contextualizar-se às realidades e às vivências quotidianas dos alunos,
criando desta forma, oportunidades para uma aprendizagem com representatividade
sociocultural e participação dos alunos.

2.3.1 Pedagogia collateral learning

As transições pedagógicas dos alunos entre dois ou mais visões de conhecimentos determinam o
sucesso da aprendizagem da ciência. Os conhecimentos e as experiências socioculturais dos
alunos são dinamizadores do ensino-aprendizagem:

(...) learning is a social process mediated by the learner’s environment (...) the
prior or indigenous knowledge of the learner is of significance in accomplishing
the construction of meaning in new situation. All learning is mediated by culture
and takes place in a social context (Jegede & Aikenhead 1999:1).

Medvitz (1985) partindo do pressuposto de que o ensino da ciência é uma forma cultural com
pouca aplicabilidade no contexto sociocultural do aluno, vê a escola como um espaço de
ritualização em que os alunos de diversos contextos socioculturais são ensinados a pensar com
base na ciência ocidental desconectada e inaplicável nas suas realidades:

Science learned in school is learned as science in school, not as science on the farm
or in the health clinic or the garage. (...) student learns what the teacher teaches
to get good grades or pass the exam (Medvitz (1985:19).

A abordagem baseada no collateral learning averigua cognitivamente a forma na qual os alunos de


contextos não-ocidentais aprendem a ciência num ambiente escolar culturalmente hostil e
diferente dos seus conhecimentos indígenas (Jegede & Aikenhead 1999:1) bem como procura
compreender os conflitos culturais e cognitivos que dele surgem:

60
(...) how the pupils cope with disparate worldviews mediated by transcending
cultural border between their everyday culture and the culture of science. The
assistance that most pupils receive when they attempt to negotiate these cultural
borders will influence their success at science.

De acordo com Aikenhead & Jegede (1999), no ensino da ciência surgem choques culturais que
afectam aos alunos pelo facto de os conhecimentos da ciência não se relacionarem com os seus
conhecimentos socioculturais. O ensino da ciência passa por um processo, no qual os alunos
memorizam os conhecimentos da ciência inaplicáveis entre os fenómenos do seu meio
socioculturale tradicional. Segundo Jegede (1999), esta falta de interligação entre os
conhecimentos da ciência e os socioculturais e tradicionais cria a perturbação cognitiva ou
dissonância porque os alunos aprendem melhor quando estão em contacto directo com o
fenómeno natural, quando se omitem as barreiras culturais e se reduzem os indícios de confusão
cognitiva aos alunos criados pelo ensino da ciência fora dos seus contextos socioculturais,
exemplos locais, línguas maternas, tecnologias locais no ensino da ciência (Medvitz 1985).
As experiências cognitivas postuladas pela teoria de collateral learning envolvem dois ou mais
esquemas de memória a longo prazo em conflito que se distinguem em quatro tipos:

(i) Collateral learning paralela - os alunos adquirem e mantêm dois esquemas de conceitos
compartimentados, em oposição e seminteracção na memória a longo prazo (Jegede
1999). Este conflito condiciona os alunos a recorrerem apenas a um e único esquema
de conceito num dado contexto da aprendizagem para compreender o conteúdo da
aula (Jegede & Aikenhead 1999);
(ii) Collateral learning simultânea - os alunos memorizam os esquemas de conceitos a longo
prazo através da análise, comparação entre dois esquemas de conceitos e processam
a informação num dado tempo e com base num ou noutro esquema de conceitos;
(iii) Collateral learning dependente - os alunos recorrem a um esquema de cada vez para
julgar o outro diferente, aceitando ou rejeitando um dentre os dois esquemas;
(iv) Collateral learning seguro - os alunos resolvem os conflitos cognitivos, perturbações
mentais ou dissonância do conhecimento através da convergência de conceitos,
resultando na aprendizagem duma nova concepção na memória a longo prazo.

61
Na visão de Jegede (1999), os quatro tipos de aspectos cognitivos de collateral learning são relevantes
para o ensino. Contudo, o ambiente e o background sociocultural dos alunos são os elementos
centrais de todo o processo de ensino que, em interacção com os conhecimentos da ciência
ocidental devem permitir que os alunos possam explicar qualquer fenómeno dependendo do
contexto ou situação:

(...) pupils might engage in parallel collateral learning by adding a science schema
(one conflicts with pre-existing schemata) to their long-term memory (...) the
culture of science is understood by pupils (just as anthropologist understand
another culture), but scientific thinking does not guide their everyday thinking; yet
these pupils can do either type of thinking, depending on the context (Jegede &
Aikenhead 1999:20).

A proposta de Medvitz (1985) complementa os tipos de collateral learning ao sugerir que os alunos
devem aprender a ciência contextualizada às tecnologias reais e do seu mundo cultural. Jegede
(1995) enfatiza a visão de Medvitz (1985) teorizando o “ecocultural paradigm”. À luz deste
paradigma, Jegede (1995) mostra que a percepção do conhecimento depende do ambiente
sociocultural no qual o aluno vive e, por isso, no processo de ensino-aprendizagem torna-se
imprescindível explorar informações do meio e do contexto diário do aluno para explicar os
fenómenos naturais, identificar e usar a ciência, tecnologia, teorias indígenas e conceitos da
comunidade do aluno e ensinar os valores indígenas e comunitários na prática da ciência e da
tecnologia.

2.3.2 Pedagogia cross-cultural learning

A cross-cultural learning é uma perspectiva antropológica sobre o ensino da ciência, subcultura do


ocidente em contextos culturais não-ocidentais em que os alunos possuem conhecimentos
indígenas, culturais e locais (Cobern & Aikenhead 1996) ).
Cobern (1996) afirma que todas as ciências existem num contexto cultural e que o ensino-
aprendizagem da ciência é uma actividade “cross-cultural”. Esta afirmação não é tida em
consideração uma vez que Medvitz (1985) aponta que os educadores e cientistas dão uma

62
inadequada atenção à natureza da ciência como artefacto cultural cujo ensino deve ser encarado
antropologicamente como se se tratasse de aprender outras culturas. O posicionamento de
Aikenhead (2006:108) defende que o ensino da ciência é um acto cultural de transmissão da sub-
cultura ocidental associado à colonização, dominação e assimilação ou alienação cultural dos
alunos de contextos não-ocidentais:

(...) Whose culture is being transmitted in schools science? If Western ways of


knowing and valuing continue to dominate science teaching for these students,
then science classrooms continue to be instruments of colonization because
Western cultural ways of knowing are transmitted with the expectation that
students will reject their indigenous ways of knowing to participate in the
classroom’s community of science learners (Aikenhead 2006:108).

Aikenhead (2006), entende que, constantemente, nos contextos culturais não-ocidentais, os


alunos são culturalmente violentados, dominados e alienados pela ciência ocidental e em muitos
casos registam o fracasso na aprendizagem mesmo tendo outros sistemas de conhecimentos
culturais ou locais. Cobern (1996) concordando com Aikenhead (2006), adverte que o ensino da
ciência nos contextos não-ocidentais seria relevante se se valorizassem as diversas perspectivas
da ciência através de diversidades de conhecimentos culturais sobre o mundo. Em outras
palavras, a multiplicidade de visões sobre os fenómenos incluindo os “backgrounds” culturais dos
alunos, permitiriam a mudança da dominação cultural imposta pela ciência ocidental às culturas
não-ocidentais. Esta visão, segundo Aikenhead (2001b), opõe-se ao cientificismo no ensino
(hegemonia cultural da ciência (Cobern 1996)) que vê a ciência ocidental como o único
conhecimento válido, universal que, por conseguinte domina, assimila, coloniza e aliena os
alunos da sua realidade cultural e da vida diária.
A abordagem cross-cultural learning ou cross-cultural border2 destaca que a cultura é pedagogicamente
crucial para o ensino-aprendizagem da ciência através da transição do mundo sociocultural dos
alunos e a ciência da escola (Cobern & Aikenhead 1999) ou de ambos. A abordagem “cross-
cultural” congrega dois ou mais sistemas de conhecimentos que no ensino podem opor-se,

2Cross-cultural learning, cross-cultural border e cultural border crossing são termos sinónimos (Aikenhead 1996; Aikenhead &
Jegede 1999; Aikenhead 2001). Nesta tese usaremos o termo cross-cultural border e cross-cultural learning.

63
complementar-se e separar-se como unidades independentes (Aikenhead & Jegede 1999). Esta
abordagem valoriza outras formas de ciência e ao mesmo tempo proporciona aos alunos a
oportunidade de constatar o que é semelhante entre duas epistemologias, a ciência ocidental e
os conhecimentos indígenas, o que cada epistemologia é ou não é capaz e como ambas podem
explicar determinados fenómenos naturais (Cobern 1996).
Costa (1995) deduz que o sucesso do ensino da ciência depende do grau de diferença cultural
entre o mundo sociocultural do aluno e o da ciência, da efectiva transição do aluno do seu
mundo ao da ciência e assistência e facilitação da transição dos alunos entre os dois mundos.
Cobern & Aikenhead (1999) corroborando da tese de Costa (1995) referem que o “cross-cultural”
entre a cultura da ciência e a cultura do aluno será pedagogicamente benéfico se ambas forem
congruentes e compatíveis. Caso sejam diferentes, opostas ou incompatíveis, o “cross-cultural“
torna-se perigoso. Logo, ocorre a marginalização da cultura do aluno e a sua alienação através
da reconceptualização e da assimilação forçada à cultura da ciência de forma passiva e
culturalmente desconectada da vida diária (Aikenhead & Jegede 1999).
Phelan et al. (1991) destaca quatro possíveis categorias de transições entre duas culturas no ensino
da ciência a abservar: as culturas congruentes conduzem à transição suave; as culturas diferentes
admitem a transição administrável; as culturas diversas conduzem a transição arriscada; e as
culturas altamente opostas e desconcordantes resistem a qualquer possibilidade de transição
(transição impossível). Costa (1995) inspirado em Phelan et al. (1991) apresenta cinco cenários de
viabilidade e inviabilidade do “cross-border” no ensino da ciência, a saber:

(i) Potenciais cientistas – a transição é suave e invisível;


(ii) “I Want to Know” Students – a transição é arriscada dado que as culturas são diversas
contudo, os alunos têminteresse em saber;
(iii) “Other Smart Kids” – transição é administrável, as culturas são congruentes mas há
inconsistências da cultura e ciência ocidental, há falta de compreensão dos conteúdos
pelos alunos, resultado no desinteresse da aprendizagem;
(iv) “I Don´t Know” Students – a transição tende a ser arriscada dada a diferença entre
ambas. Todavia, os alunos entendem superficialmente o conteúdo da ciência;

64
(v) “Outsiders” – a transição é impossível, ocorrem altas reprovações, evita-se o “stress” e
há a protecção da imagem dos alunos”;
(vi) “Inside Outsiders” – a transição revela-se frustrante e impossível de reconciliar as duas
culturas.

Cobern & Aikenhead (1999) assumem que o ensino da ciência é por si um evento de “cross-
cultural” que, na óptica de Pomeroy (1994), permite uma abordagem social e indígena do
conteúdo da ciência, comunicar em línguas minoritárias, aplicar os conteúdos indígenas para
explicar a ciência, comparar e criar uma ponte entre as cosmovisões socioculturais dos alunos e
a da ciência, explorar os conteúdos, as epistemologias ocidentais e conhecimento não-ocidentais:

(...) When pupils learn scientific explanations, they learn to contextualize those
explanations as belonging to a “tribe” of scientist, and at the same time, pupils are
invited to use their preconceptionsin appropriate everyday contexts (Jegede &
Aikenhead 1999:20).

Os materiais e métodos de ensino desta abordagem suscitam e facilitam aos alunos um cross-border
explícito, promovem o discurso dos alunos acerca da ciência, validam as formas de conhecimento
culturais e contextualizam culturalmente o ensino dos conhecimentos, habilidades e valores
científicos ocidentais (Cobern & Aikenhead 1999).
Diante do “cross-cultural”, os professores, tornam-se em “culture brokers”, conforme refere
Aikenhead (2006:122):

Teachers need to articulate and reflect on their own personal culture before they
can learn about their students´ cultures, and they need to immerse themselvesin
their students´ cultures cognitively, metacognitively, and emotionally before they
can develop their own unique classroom culture to support their role as an
effective culture broker.

O professor “culture broker“ apoia os alunos através da expansão dos seus repertórios e mecanismos
de aprendizagem (Aikenhead 2006), através da mediação, negociação, resolução de conflitos
causados pela diferença entre o mundo e da vida cultural dos alunos e a cultura da ciência e da
escola, com recurso a estratégias de ensino adequadas ao contexto (Jegede 1995), a destacar:

65
(i) Explorar os materiais e práticas próximos do meio sociocultural dos alunos;
(ii) Ensinar e aprender a ciência através de tecnologias locais;
(iii) Acomodar e assimilar outros conhecimentos sem destruir os locais.
De acordo com Aikenhead (2006), o currículo que paute pela integração dos conhecimentos
culturais e dos alunos no ensino da ciência e que aposte no “culture broker” apoia os alunos de
outros contextos não-ocidentais a aprenderem com base no “cross-cultural border/ border crossing”, a
expandirem a sua identidade e a prepará-los numa visão do mundo policêntrica, isto é, em duas
cosmovisões (sociocultural indígena e ocidental). Nestes moldes, o currículo e o ensino seriam
facilitados através da aprendizagem de culturas do mundo diário dos alunos em confrontação
crítica com a cultura da ciência ocidental, alternando as línguas, as conceptualizações, as
epistemologias e os valores explicitamente, garantindo que os alunos não adoptem ou não sofram
a assimilação do conhecimento científico (Aikenhead 1997). Não obstante a abordagem cross-
cultural learning/border promover, pedagógica e culturalmente a transição entre dois mundos no
ensino da ciência, Jegede (1993), Aikenhead & Jegede (1999), Jegede & Aikenhead (1999), Jegede
(1999) propõem a abordagem de collateral learning que se preocupa com os conflitos culturais,
cognitivos e as dificuldades de aprendizagem conceptual dos conhecimentos científicos por causa
das diferenças entre as visões dos conhecimentos indígenas ou socioculturais e as dos
conhecimentos universais/científicos. Tanto a abordagem de cross-cultural border como a de
collateral learning preconizam que o ensino-aprendizagem da ciência seja desenvolvido com base
numa visão policêntrica. Em outras palavras, o ensino-aprendizagem deve permitir que os alunos
relacionem, comparem e diferenciem as duas visões de conhecimentos, porém os professores
devem prevenir pedagogicamente a ocorrências de conflitos culturais e cognitivos pois podem
inviabilizar a construção, a compreensão e ou acomodação do conhecimento científico
(Aikenhead & Jegede 1999; Jegede & Aikenhead 1999). O ensino da ciência com base nas
pedogogias de collateral learning e cross-cultural border facilita a conceptualização tanto cultural como
cognitiva dos conhecimentos científicos. Portanto, as duas propostas pedagógicas inter-
relacionam-se e complementam-se pois, mostram as vantagens antropológicas e cognitivas nos
alunos no ensino da ciência baseada na incorporação dos fundos dos conhecimentos
socioculturais e locais.

66
CAPÍTULO 3. Revisão da literatura

Introdução

No capítulo revisito os estudos relacionados com a participação, a interacção dos alunos nos
ambientes de pedagogias bilingues e culturais voltados ao ensino da ciência. A maior parte dos
estudos revisitados neste capítulo não abordam explicitamente a participação e a interacção com
base nas práticas bilingues de translanguaging no ensino de ciências. Este campo é ainda incipiente.

3.1 Translanguaging como pedagogia prática bilingue

Nikula & Moore (2016) analisaram as abordagens de translanguaging e do Content and Language
Integrated Learning (CLIL) no contexto do multilinguismo e da educação bilingue. Os dados do
estudo ilustraram que, a integração da L1 num ensino baseado na língua estrangeira (LE) cria
oportunidades pedagógicas para a ocorrência de práticas linguísticas em ambas as línguas (LE e
L1) e em diferentes actividades da aula. A sala de aulas explora as línguas através do
translanguaging como do processo de ensino-aprendizagem (Cenoz & Gorter 2015). O uso dos
repertórios multilingues dos alunos como recursos na aprendizagem incrementa a consciência
sobre os seus valores pedagógicos (Cenoz & Gorter 2015). Nikula & Moore (2016) concluem que
o translanguaging reverte-se numa estratégia pedagógica que apoia não apenas os professores como
também os alunos em situações oportunas da aula. É uma ferramenta pedagógica útil para
desenvolver as línguas, a consciência metalinguística e expandir os repertórios linguísticos dos
alunos (Cenoz & Gorter 2015).

3.1.1 Práticas de translanguaging: participação e interacção dos alunos na


aula

Os estudos sobre as práticas linguísticas na aula mostram a relevância pedagógica da L1 e da L2


como recursos que promovem a criação de espaços e de oportunidades para a interacção dos

67
alunos na aula. A literatura identifica duas práticas linguísticas comuns em diferentes contextos
e programas educativos, a saber: o code-switching e o translanguaging. Estas práticas linguísticas
multilingues têm sido mencionadas como sendo opostas às práticas linguísticas monolingues
dado que as primeiras promovem e privilegiam as línguas a título de ferramentas e recursos da
L2 no processo de ensino-aprendizagem em L2 (code-switching) enquanto as segundas
transformam as línguas num único repertório linguístico e pedagógico aplicável na educação
multilingue e a favor de desenvolvimento académico dos alunos em todas as línguas. Nesta
secção, descrevo os resultados dos estudosinerentes à interacção multilingue dos alunos no
processo de ensino-aprendizagem.

3.1.1.1 O papel da L1 no ensino em L2

A baixa proficiência dos alunos em L2 tem suscitado problemas de aprendizagem (compreensão


e interacção) no contexto dos programas transicionais africanos (Cleghorn 1992; Prophet & Dow
1994; Rollnick & Rutherford 1996; Bunyi 1997). Clegg & Afitska (2011) ilustram que os alunos
não são capazes de responder às perguntas do professor no discurso da sala de aula porque por
lado, não compreendem a iniciação do professor e, por outro lado, são incapazes de responder
através da L2, no meio de instrução. Kyeyune (2003) constatou que os alunos ugandeses não
dominam o inglês, a língua oficial de ensino. Diante desta situação, os alunos defendiam que
caso lhes fosse permitido o uso da L1 nas aulas poderiam superar a baixa proficiência em L2,
participar e interagir na aula, maximizando e facilitando a aprendizagem dos conteúdos.
Contudo, os professores reprimiam-na e puniam-nos sempre que fossem surpreendidos a
interagir e ou dialogar em L1 no decurso da aula. Sem a L1, os alunos não interagiam e não
participavam na aula dada a baixa proficiência em L2.
Os estudos de Rubagumya (1994), Arthur (1994), Bunyi (1999) e Abd-Kadir & Hardman (2007)
ilustram que a interacção professor – alunos em diferentes contextos africanos nas classes pós-
transição em L2 está baseada no padrão IRF (Initiation - Response - Feedback). Neste padrão, os
alunos respondem passivamente através do coro, terminação de palavras e frasesiniciadas pelo
professor, respostas fechadas, frases com menos de três palavras, etc. Estas estratégias passivas de
interacção, excluem e marginalizam as experiências socioculturais e as línguas dos alunos que,

68
exploradas, seriam recursos para a construção de novos conhecimentos (Ngwaru 2011). Abd-
Kadir & Hardman (2007), estudando o discurso e a interacção IRF em inglês, L2 no contexto de
sala de aulas quenianas e nigerianas constataram que estes padrões têm implicações no que
concerne à criação de oportunidades de interacção e de participação dos alunos nos discursos da
aula. Por estes motivos, o professor é quem domina o discurso na aula e poucas vezes os alunos
contribuem verbalmente (Prophet & Rowell 1993). A L1 que nas classes anteriores garantia a
mediação, a interacção e a colaboração na aprendizagem jamais é encorajada nas classes pós-
transição.
Lisanza (2014) debruçando-se sobre a interacção nas práticas de literacia iniciais em kiswahili,
L1 no Quénia, observa que a L1 promove a participação dos alunos na leitura através das suas
vozes em diferentes diálogos dinâmicos e actividades de leitura e de interpretação do texto na
aula. A interacção flui, a aprendizagem é colaborativa e o professor torna-se num mediador da
aprendizagem. Msimanga & Lelliott (2014) concluem que os alunos não têm a proficiência
linguística académica na língua de instrução, logo, não têm oportunidades para discutir em L2
as ideias da aula com o professor e com os colegas. As poucas vezes que tentaminteragir,
expressam respostas linguisticamente limitadas a uma ou duas palavras e ou a pequenas frases
em L2. A participação voluntária dos alunos é baixa e o silêncio é uma prática dominante. Nestes
termos, o ensino transforma-se num produto ao invés de ser um processo (Arthur 1994).
Antón & DiCamilla (1999) num estudo sobre a aprendizagem da L2 destacam o valor
pedagógico da L1 como sendo fundamental para o desenvolvimento da interacção colaborativa.
Os autores entendem que esta é uma ferramenta semiótica relevante entre os alunos que
partilham a mesma L1 e que têm baixa proficiência em L2. A L1 medeia a aprendizagem através
da interacção, da colaboração e da inter-ajuda para resolver problemas linguísticos da L2 bem
como também, tem a função metalinguística - compreender e produzir formas linguísticas
complexas e particulares sobre e em L2.
Martin-Beltrán (2010a) aponta que as línguas são ferramentas de mediação, de expansão de
oportunidades de aprendizagem e de construção de significados. Para evidenciar as visões de
Rollnick & Rutherford (1996), Martin-Beltrán (2010a) e Martin (1999) evidenciaram que os
alunos interagem com entusiasmo e com altos níveis de participação em L1 em alternância com
a L2 na aula. As línguas são pedagogicamente geridas e exploradas com consciência, facilitando

69
a mediação e a compreensão dos conteúdos científicos. A título de exemplo, Andersson &
Rusanganwa (2011) numa investigação sobre o uso do inglês, francês e kinyarwanda nas aulas
de Ciências Naturais observaram que o professor as usava em espaços demarcados na sala de
aulas, visando enriquecer a aprendizagem. O inglês língua oficial de ensino era usado no quadro
(espaço oficial). Ao deslocar-se às filas dos alunos (espaço semi-oficial) alternava ao francês para
explicar e exemplificar os conceitos com recurso às realidades socioculturais dos alunos,
retornado bruscamente ao inglês sempre que retomasse ao quadro. Diante de grupos de alunos,
o professor usava o kinyarwanda, uma língua local não permitida no ensino para reforçar a aula.
Estas evidênciasilustram a visão de Cleghorn (1992) que sustenta que o estabelecimento de
significados na aula podem ser assistidos pelas habilidades do aluno em L1 e ligando ao
cruzamento de línguas e de culturas, um dos princípios adequados para o contexto de ensino
africano. Na realidade, os alunos usam as L1´s durante asinteracçõesintra-grupais na aula `por
detrás da porta´ (Arthur 1994, Hamid & Honan 2012, Msimanga & Lelliott 2014). Arthur (1994)
reconhece que a L2 impede a colaboração e interacção professor - aluno e sugere que se usem
os recursos linguísticos disponíveis na aula como forma de encorajar a comunicação. A L1 é um
meio fundamental para a exploração das ideias dos alunos e o uso de duas línguas (L1 e L2) é
benéfico para a aprendizagem (Rollnick & Rutherford 1996). Setati & Adler (2000), num estudo
sobre práticas linguísticas em contextos multilingues evidenciam ser imprescindível o uso da L1
no ensino-aprendizagem da Matemática pois suporta o desenvolvimento contínuo da
proficiência em L2, língua de instrução e, ao mesmo tempo, facilita a aprendizagem da
matemática. Aprender Matemática é similar a aprender uma língua com conceitos e formas
abstratas.

3.1.1.2 Code-switching e a interacção na aula

Os estudos sobre as práticas linguísticas em L2 reconhecem que a L1 tem um papel pedagógico


imprescindível na aula. Um desses papéis é a superação da interacção e da participação dos
alunos na aula em L2. O code-switching, uma prática linguística de separação dos códigos e
teoricamente oposta e anterior ao translanguaging incentiva o uso da L1 como um recurso paralelo
à L2 e fundamental para a aprendizagem dos conteúdos e de ambas as línguas. Nas situações em

70
que a L2 é proficientemente baixa, a L1 garante a interacção e a compreensão dos conteúdos
sobretudo nas classes pós-transição (Yi & Macaro 2012). Segundo os estudos de Rubagumya
(1994), Adler (1998), Setati (1998), Martin (1999) e Probyn (2015) o code-switching é uma prática
linguística proibida pelos currículos mas tem sido explorado pelos professores nas aulas em L2
para garantir a interacção, a participação e o alcance da compreensão e dos conteúdos.
Abd-Kadir & Hardman (2007) após observar os padrões de IRF nas aulas sugerem que estes
podem ser transformados em oportunidades de interacção e diálogo produtivos na aula desde
que se use o code-switching entre a L1 e a L2. Na visão destes autores, esta prática linguística
encoraja a interacção dos alunos na aula. Nesta linha, Setati (1998) mostra que no contexto sul-
africano, os professores recorrem ao code-switching da L2 à L1 sempre que constatam que os alunos
não respondem às perguntas formuladas em L2. A L1 activa a resposta dos alunos e a posterior
o professor orienta a respectiva tradução à L2. Desta forma, a autora conclui que a L1é um
recurso que o professor e os alunos usam para facilitar a aprendizagem e encorajar a participação
e a interacção na aula. Martin (1999) numa estudo sobre a descodificação os significados das
palavras eminglês, L2 e malay, L1 por alunos do 4º ano (pós-transição) observa como as práticas
de code-switching suscitam altos níveis de interacção e colaboração bilingue entre os alunos e o
professor. O professor alterna as línguas para facilitar a compreensão do texto e os alunos por
sua vez intervêm com entusiasmo e com altos níveis de participação em L1. A interpretação das
palavras do texto é realizada de forma bilingue e num ambiente de interacção.
Rubagumya (1994) verifica várias funções pedagógicas do code-switching no ensino primário
tanzianano diante das dificuldades de aprendizagem dos alunos devido à baixa proficiência
eminglês, L2. Com vista a garantir a interacção dos alunos na aula, o professor encoraja-os e
liberaliza-os a responderem em kiswahili, L1 sempre que constatarem limitações de expressão e
de participação em L2. O code-switching assume um significado interaccional válido para o
progresso da aula. Num contexto de três línguas, Andersson & Rusanganwa (2011) observaram
as práticas do code-switching num ambiente em que os alunos ruandeses bilingues (kinyarwanda,
L1 e francês, L2) têm pela primeira vez o inglês recebem a instrução eminglês (LE) como meio
de instrução. Com vista a facilitar a compreensão dos conteúdos e a desenvolver os momentos
da aula, o professor demarcava espaços de uso das três línguas, alternando da LE à L2 e da L2
à L1. Entretanto, a interacção e participação dos alunos na aula evidenciava-se apenas na

71
ocorrência do code-switching L2 à L1 e nunca no code-switching LE à L2. O code-switching supera
os dilemas no ensino-aprendizagem de Matemática segundo conclui o estudo de Adler (1998).
Para este autor, os alunos enfrentam dificuldades para falar e compreender o inglês, L2 e
aprender a língua e o pensamento matemático. A ausência do code-switching suscita a confusão e
a incompreensão de Matemática pelos alunos mas a sua exploração na aula através da
incorporação da L1 e das representações culturais dos alunos providencia oportunidades de
expressividade informal dos alunos sobre as suas compreensões e ideias matemáticas. A L1,
quando usada em code-switching com a L2 na aula reduz a incompreensão, discurso dominante
do professor na aula e encoraja a participação dos alunos na conceptualização matemática.
A troca de meio de instrução tem impacto na interacção dos alunos na aprendizagem. Sobre esta
matéria, Yi & Macaro (2012) constataram que a troca de meio de instrução após sete anos de
uso da L1 implicou a alteração dos padrões de interacção na aula em L2. Os alunos não têm a
proficiência linguística e académica em L2 ao ponto de negociar interactivamente com o
professor sobre os significados de conceitos científicos em L2. Os professores que usam
exclusivamente a L2 inibem a interacção do que os que exploram o code-switching. Ao nível do
ensino das ciências, a incorporação da L1 com base em vários padrões de code-switching permitem
ao professor e aos alunos aceder facilmente aos significados conceptuais da ciência, interligando-
os às experiências socioculturais (Cleghorn 1992). A observação de Cleghorn (1992) foi
comprovada por Prophet & Dow (1994) num estudo sobre o impacto da L1 na compreensão de
fenómenos básicos da astronomia. O estudo revela que a L1 facilita a interacção, a compreensão
dos conceitos científicos do que o ensino em apenas L2. Os alunos, segundo estes autores, são,
por um lado participativos, divertidos, expressivos, e por outro lado, questionam e explanam
com detalhes sobre os conteúdos da aula, contrariamente ao silêncio dos alunos que aprendem
exclusivamente em L2.
Não obstante os valiosos contributos relativos à interacção e participação dos alunos no processo
de ensino-aprendizagem condicionados pela prática do code-switching na aula, Bunyi (1997)
adverte que tanto o code-switching como a L1 na aula não são os únicos factores que ocasionam a
interacção na aprendizagem. Baseando-se na interacção sobre as operações matemáticas no
padrão IRF, os alunosintervêm passiva e mecanicamente, isto é, completando frases e palavras
iniciadas pelo professor, repetindo o seu discurso e respondendo a questões. Assim, Bunyi (1997)

72
conclui afirmando que, se o professor auto-centraliza e auto-domina o discurso na aula, a língua
não é um factor determinante para a participação e a interacção dos alunos na aula senão a
consciência do professor sobre a criação das oportunidades para o desenvolvimento das
habilidades linguísticas e dos conhecimentos. De facto, a observação de Bunyi (1997) é relevante
no âmbito da análise do contributo pedagógico das práticas linguísticas no ensino e sobretudo o
seu impacto na interacção e participação dos alunos na aula. Não são apenas as línguas que
dinamizam a interacção mas sim os ambientes criados para a interacção que se desenvolvem de
forma não-direccional e em estágios (Cekaite 2007). Num estudo longitudinal sobre a
competência interaccional em alunos emergentes, Cekaite (2007) constatou que a promoção de
interacção multipartidária na aula cria oportunidades situacionais para o fluxo da competência
interaccional e conversacional progressivamente.
O estudo de Chimbutane (2015) efectuado nas salas de educação bilingue em Moçambique parte
do argumento de que a alternância de códigos é uma estratégia comunicativa de extrema
relevância para melhorar a interacção professor/a – alunos no ensino de/em L2. Ainda que os
professores tenham apresentado posicionamentos a favor e outros contra a alternância de códigos
nas aulas de/em L2, Chimbutane (2015) conclui que o uso da L1 nas aulas de/em L2 supera o
fraco domínio da L2 e as dificuldades de participação dos alunos nas aulas. Com o uso da L1, os
alunos poderão participar nas aulas, transferindo os conhecimentos socioculturais dominados em
L1 para o contexto de aprendizagem de/em L2.

3.1.1.3 Translanguaging e a interacção na aula

Nas duas sub-secções acima, explorei os estudos relativos à incorporação da L1 no processo de


ensino no qual a L2 é meio de instrução. A incorporação pedagógica da L1 num ensino em L2
eleva dos níveis de participação e de interacção dos alunos com baixos níveis de proficiência em
L2 nas aulas. Nesta sub-secção, revisito os estudos sobre a interacção num ambiente em que as
duas línguas não códigos separados, mas sim um único repertório linguístico, discursivo e
pedagógico (García 2009, García & Wei 2014).
Poza (2016) constata que o translanguaging congrega práticas bilingues flexíveis e fomenta espaços
e oportunidades de interacção e de colaboração entre os alunos bilingues emergentes num ensino

73
sem fronteiras entre as línguas. Há um encorajamento pedagógico para o uso de repertórios
bilingues a partir dos quais, os alunos se arriscam linguística e livremente às práticas interactivas
em translanguaging sem medo de humilhação e de marginalização. Kampittayakul (2017), num
estudo centrado na competência interaccional na aula mostra que o translanguaging eleva a
qualidade de ensino do professor como também estabelece um discurso interactivo na aula,
melhora e promove as oportunidades de aprendizagem dos alunos.
Martin-Beltrán (2009) constata que o ambiente de aprendizagem da L2 é marcado pela
interacção e discussão bilingue no qual os alunos exploram os fundos de conhecimentos de ambas
as línguas, transferem os conhecimentos de uma língua para outra com o objectivo de analisar e
resolver actividades da L2. Os alunos interagem em duas línguas, usam-nas como recursos e
ferramentas académicas e desenvolvem uma consciência metalinguística através da análise e
comparação entre ambas as línguas. Esquinca, Blanca & de la Pedra (2014) mostram que
diferentes repertórios linguísticos dos alunos são explorados como estratégias e ferramentas para
o seu envolvimento na aula. O translanguaging flexibiliza, dinamiza as práticas discursivas bilingues
e medeia a aprendizagem dos alunos bilingues em todas as actividades da aula, suscitando
oportunidades de interacção, discussão, participação e inter-ajuda entre os alunos na aula. Sayer
(2013) examina a mediação de conteúdos académicos e dos padrões de duas línguas por alunos
e professores TexMex na aprendizagem. Os professores encorajam aos alunos a usar todos os
recursos linguísticos conscientes de que estes possuem uma limitada proficiência eminglês nas
classes pós-transição. O estudo mostra que os professores e alunos criam espaços discursivos e
interactivos usando o espanhol, o inglês e variedades de línguas vernaculares quando aprendem
os conteúdos académicos. Assim, as práticas de translanguaging são multilingues, constroem e
legitimam as identidades bilingues dos alunos e dos professores, promovem a aprendizagem de
padrões e formas das línguas e medeiam os conteúdos académicos.
Gutiérrez, et al. (1999) vêem o híbridismo e a diversidade como ferramentas de mediação. As
línguas e os fundos de conhecimento são explorados nas actividades práticas e híbridas e num
ambiente interactivo (Martin-Beltrán 2014). Os alunos participam e colaboram nestas
actividades, usam estratégias interpretativas socioculturais, experiências baseadas nas línguas e
nas culturas como recursos para a aprendizagem no contexto. Nestas práticas interactivas
híbridas intervêm vozes alternativas, saberes pessoais, crenças da comunidade e outras línguas

74
na aprendizagem. O ambiente da aula é aberto tal que os alunos questionam sobre o que não
sabem na língua que lhes convier (Gutiérrez et al. 1999). Similarmente, Martin-Beltrán (2014)
observa que o translanguaging e os fundos de conhecimentos são mobilizados para mediar as
actividades cognitivamente complexas sobre a língua, gerando altos níveis de participação e
interacção linguística dos alunos através dos seus diferentes fundos de conhecimentos e ponte
entre línguas visando construir a redacção de textos académicos.
Viniti & Subhan (2014) estudam o impacto pedagógico do translanguaging na actividade de leitura
na 2ª classe, língua inglesa na qual a língua malaia (L1) é usada como scaffold. Diante de baixos
níveis de proficiência dos alunos eminglês, o professor recorre ao translanguaging para mediar os
conteúdos académicos a destacar, ajudar a compreensão e a tradução do vocabulário durante a
leitura. A L1 é activada na interacção professor - alunos e inclusive para incentivar a participação
dos alunos nas respostas às perguntas sobre a língua inglesa, L2. Com o recurso ao translanguaging,
os alunos exploram os seus recursos linguísticos para interagir frontalmente com o professor e
para desenvolver as suas competências interpretativas, compreensão dos textos e do vocabulário
em L2. Mercuri & Ebe (2011) verificam que o ensino da língua, da literacia e do conteúdo em
duas línguas permite a criação de eventos de aprendizagem activa nos quais os bilingues
emergentes colaboram, discutem e interagem aos pares e em grupos durante as actividades e
participam na aula, apresentando academicamente habilidades académicas aprendidas em todos
os domínios das línguas. As línguas tornaram-se assim em ferramentas de mediação e objectos
de análise num espaço de interacção bilingue. Asinteracções dos alunos oferecem possibilidades
para a aprendizagem de duas ou mais línguas usadas nos diálogos relativos às actividades de
apenas uma língua (Martin-Beltrán 2010a). Os alunos comparam-nas, analisam-nas
paralelamente, criando oportunidades de interacção entre si (Martin-Beltrán 2010b). A
pedagogia bilingue e flexível, as práticas linguísticas híbridas (code-switching, vocabulário bilingue,
perguntas bilingues, repetição e tradução entre línguas) e a conexão dos alunos ao mundo extra-
escolar facilitam a comunicação e a participação dos alunos da pré-escola em qualquer língua
(Gort & Pontier 2013). O uso da pedagogia bilingue tem várias utilidades e funções linguísticas,
educacionais, afectivas e socioculturais necessárias para o desenvolvimento dos bilingues
emergentes (Gort & Pontier 2013).

75
Os estudos que revisitei acima têm em comum a liberalização das línguas e subsequente criação
de espaços de interacção dos alunos com recurso às práticas de translanguaging. A separação de
línguas não favorece a operacionalização do translanguaging dinâmico e flexível e dos bilinguismos
dinâmico (García 2009) e flexível (Creese & Blackledge 2010) e, consequentemente, não surgem
oportunidades de interacção e participação activa dos alunos na aprendizagem. A título de
exemplo, os alunos com domínio da L1 (inglês) não têm oportunidades para interagir com os
alunos de outra língua (espanhol) senão com os seus pares de L1, inglês e ou espanhol
respectivamente. Os autores sugerem a liberalização dos espaços de interacção para permitir que
haja o uso de ambas as línguas visando ampliar o bilinguismo (Lee et al. 2008). Andersson et al.
(2013) mostram que a liberalização de múltiplas línguas nas aulas (três línguas ruandesas: inglês,
francês e kinyarwanda) suscita, naturalmente, os eventos práticos de translanguaging e a
aprendizagem é realizada com base na discussão e na interacção. As três línguas são usadas como
meios de aprendizagem dos conhecimentos académicos e para elevar a proficiência linguística e
académica (literacia) em inglês, o principal meio de instrução oficial.

3.1.2 Translanguaging e a aprendizagem da ciência

Nesta sub-secção analiso os estudos que se debruçam sobre o translanguaging e o ensino dos
conteúdos científicos nos contextos multilingues. Mazak & Herbas-Donoso (2014) analisam os
tipos e as práticas de translanguaging nas aulas de ciências e observam que os textos da aula
apresentam-se em inglês, L2 contudo a explanação do professor é feita em espanhol, L1. Esta
prática torna a sala de aula, num espaço de legitimação da L1 como língua para a ciência e os
alunos desenvolvem repertórios e discursos académicos bilingues e acedem ao conhecimento
científico com base em duas línguas.
Ünsal et al. (2016) observa que o uso de outras variedades de repertórios (língua quotidiana)
facilita a compreensão dos conteúdos científicos. Os alunos, à semelhança do professor, recorrem
à língua minoritária e aos exemplos quotidianos como recurso para conceptualizar a língua da
ciência e conceder oportunidades de aprendizagem dos respectivos conteúdos na aula. Os
conceitos científicos são conceptualmente simplificados através da relação com as realidades
quotidianas, permitindo a compreensão e expressão de ideias e conhecimentos dos alunos

76
(Carstens 2016). Nestes termos, Carstens (2016) conclui que, o translanguaging é uma ferramenta
funcional para a intelectualização das línguas africanas pois este permite a construção de novos
termos que desafiam os dos especialistas.
Paxton (2009) mostra que os alunos entendem melhor os termos em L2 e em L1 se forem
discutidos nocionalmente em várias línguas e quando se propõem termos equivalentes em L1.
Da mesma forma, a diversidade de línguas evita a má compreensão e interpretação dos termos
tanto ao nível conceptual como lexical (Andersson, Kagwesage & Rusanganwa 2013).
Brown & Ryoo (2008) propõem uma pedagogia de ensino de ciência baseada no “disaggregate
approach” (ensino do conteúdo científico, usando a língua quotidiana (L1) e sem a densidade
terminológica) do que “aggregate approach” (ensino do conteúdo científico usando a língua científica
(L2) e quotidiana (científica e não a científica)). Os resultados de Brown & Ryoo (2008) ilustram
que os alunos compreendem e aprendem com maior facilidade a ciência e os conceitos científicos
em língua quotidiana (L1) antes da língua científica (L2). A partir da língua quotidiana os alunos
convertem tanto a ciência como os conceitos científicos na língua da ciência e expressam-nos em
ambas as línguas, evidenciando quão a língua quotidiana constrói significados pragmáticos da
ciência em língua da ciência (Brown & Ryoo 2008).
Probyn (2015) no contexto sul-africano constata a ocorrência de práticas de translanguaging
(tradução, code-switching) sempre que os professores verificam que os alunos compreendem
parcialmente o conteúdo da ciência. Os resultados destas práticas mostram que se ambas as
línguas são usadas de forma interligada, isto é, movendo-se da língua quotidiana (isiXhosa, L1)
para a da ciência (inglês, L2) ocorre a organização e a mediação dos processos mentais e a
promoção das oportunidades para a aprendizagem da ciência (Probyn 2015). As práticas
pedagógicas detranslanguaging permitem a transferência de conhecimentos e habilidades entre as
línguas (Ngcobo 2016). Estas práticas superam o impedimento à compreensão da ciência devido
às disparidades entre a proficiência dos alunos e a dos professores.

3.1.2.1 Construção dos significados

Os estudos sobre as práticas detranslanguaging têm evidenciado resultados pedagógicos que


optimizam o ensino-aprendizagem. O translanguaging é uma ferramenta pedagógica, um scaffold

77
(García 2009; Nikula & Moore 2016), parte do processo de ensino-aprendizagem (Cenoz &
Gorter 2015) e é uma estratégia pedagógica que apoia não apenas os professores mas também
os alunos em situações oportunas da aula (Nikula & Moore 2016). O translanguaging preconiza o
uso dos repertórios multilingues e o fomento de práticas bilingues flexíveis. Os estudos de
Gutiérrez et al. (1999), Wei (2014) mostram que o translanguaging abre novos espaços para a
integração e exploração dos fundos de conhecimentos dos alunos como recursos para a
aprendizagem em contextos multilingues.
Nesta sub-secção, descrevo os contributos do translanguaging como uma ferramenta pedagógica
que facilita a compreensão dos conteúdos pelos alunos durante o processo de ensino-
aprendizagem (Sayer 2013). As práticas do translanguaging permitem a reflexão metacognitiva,
concedem experiências de aprendizagem de conteúdos culturais e identitário, produzem o
conhecimento e tornam-se recursos simbólicos e materiais que melhoram a compreensão dos
alunos (Makalela 2015a). A título de exemplo, Brown & Ryoo (2008) concluem que a melhor
estratégia para que os alunos compreendam efectivamente a ciência é a introdução
imprescindível da L1 - língua quotidiana no ensino dos conteúdos antes da L2 - língua da ciência.
A L1 é usada pelos alunos para clarificar e construir sentidos dos conceitos em L2, surgem
interacções sócio-construtivistas entre os alunos nas quais há espaços para incorporação de
conhecimentos, costumes, línguas, atitudes e identidades dos alunos para facilitar e optimizar a
compreensão dos conteúdos (Stevenson 2013). Ngwaru (2011) a partir de práticas pedagógicas
assentes nos fundos de conhecimento (experiências socioculturais, raízes, identidades culturais e
nas línguas maternas) transformou o ensino de alienação em inglês, L2 nas escolas rurais do
Zimbabwe num ensino de pedagogia de desenvolvimento construtivo. Neste ensino, os alunos
eram mais interactivos, criativos, reflexivos na aula devido à inclusão da L1 e das suas
experiências socioculturais, construíam o conhecimento com a mediação do professor diferente
da transmissão passiva de informações (Ngwaru 2011). A L1 e os fundos de conhecimento são
recursos e scaffolds usados para negociar os significados dos conceitos científicos bem como propor
alternativas de conceitos em L2 e L1 (Paxton 2009).
Mazak & Herbas-Donoso (2014) centraram-se no estudo dos conceitos-chave em inglês, L2
discutidos em espanhol, L1, leitura do texto em L2 e interpretação em L1, exploração de pares
cognatos L1 - L2, acrónimos em L1e L2 na disciplina de ciências. Os resultados do estudo

78
ilustraram que, durante as aulas, desenvolveram-se habilidades metalinguísticas a partir das
conexões entre repertórios linguísticos L1 e L2, facilitando o acesso e a compreensão do conteúdo
da ciência. Esta conclusão assemelha-se ao estudo de Krause & Prisnloo (2016) que numa política
de separação das línguas no programa transicional sul-africano observa a ocorrência do
translanguaging complementar e reprodutivo entre o inglês, L2 e o isiXhosa, L1 no ensino em L2
(depois da transição). O translanguaging reprodutivo permitia a compreensão do significado com
base na leitura em L2 e seguida de tradução para a L1. Com o translanguaging complementar o
professor alternava da L2 à L1 em situações de aula nas quais considerava que os alunos não
compreenderiam em L2. Estas duas práticas serviam de recurso para preservar a compreensão
dos conteúdos pois, sem as quais não se garantiria a compreensão dos alunos com baixos níveis
de proficiência linguística em L2. A L1 neste estudo criava a oportunidades para a ocorrência
do translanguaging e facilitava a compreensão dos conceitos difíceis (Msimanga & Lelliott 2014).
No estudo etnográfico, Esquinca et al. (2014) observam práticas flexíveis, dinâmicas de
translanguaging dos alunos, a saber: tradução, multimodalidade, paráfrase, code-switching nas aulas,
visando mediar a aprendizagem, clarificar os significados dos conceitos e para construir fundos
de conhecimento. Todos os alunos participam, interagem na discussão sobre os conceitos num
ambiente de inter-ajuda no qual a participação é em qualquer língua (Gort & Pontier 2013).
Estas evidências ilustram o quão a liberalização das línguas na aula cativa aos alunos a aprender
mediante práticas de interacção, de colaboração associadas ao translanguaging e desenvolvem as
habilidades de conhecimento científico (Poza 2016). Motlhaka & Makalela (2016), partindo dum
estudo sobre a prática da escrita académica desenvolvida com base na pedagogia dialógica inglês,
L2 e sesotho, L1 concluem que os alunos se transformam em mentes multi-competentes que se
movem de uma língua para outra, de uma convenção retórica para outra, criticam e discutem
os seus géneros retóricos em ambas as línguas.
Ao longo desta secção revisitei os estudos que abordam os resultados da inclusão da L1 em
situações nas quais a L2 é um meio de instrução em que os alunos apresentam baixos níveis de
proficiência. Os estudos evidenciaram que, de facto, a inclusão de duas línguas no ensino-
aprendizagem traz um óptimo impacto pedagógico, uma vez que suscita a participação e a
interacção dos alunos na aula contrariamente ao que ocorreria no ensino em L2 menos
dominada. Na secção abaixo, debruçar-me-ei sobre os estudos voltados às pedagogias de ensino

79
de ciências com base na interculturalidade/transculturalidade entre dois sistemas de
conhecimentos a destacar: conhecimentos científicos e ou universais e os conhecimentos
socioculturais locais através de duas pedagogias, collateral learning e cross-cultural border.

3.2 Border crossing e collateral learning: pedagogia de ciências universais


e socioculturais

Os estudos sobre border crossing e collateral learning persistem em recomendar e sugerir que o ensino
das ciências não deve ignorar os conhecimentos socioculturais existentes nas realidades culturais
e locais dos alunos. Nesta óptica, no ensino das ciências no contexto africanos deve estabelecer-
se uma ponte que interliga por um lado, as culturas científicas e por outro lado as culturas
tradicionais (Ogunniyi 1988). As teorias collateral learning e de cross-cultural border são as que se
destacam como potenciais abordagens teóricas e pedagógicas aplicáveis ao ensino-aprendizagem
de ciências em diferentes contextos não-ocidentais.
Os alunos trazem visões do mundo aprendidas em casa e que entram em contacto com visão do
mundo da ciência ocidental exigindo do cross-cultural ou melhor, solicitando o balanço das duas
visões do mundo ou sub-culturas através do cross-cultural (Aikenhead 2001b). O sucesso do ensino
da ciência ocidental depende do nível de facilidade de cross-cultural border entre as visões do mundo
cultural ou quotidiano e o mundo da ciência ocidental. A harmonia entre as duas visões do
mundo facilita a aprendizagem da ciência, resultando na enculturação mas, a oposição ou
incompatibilidade entre ambas gera confusões e frustrações aos alunos na aprendizagem da
ciência, forçando-os a abandonar ou marginalizar as suas visões do mundo culturais, resultando
na assimilação da ciência (Aikenhead 1996, 1997, 2002). A redução desta incompatibilidade e
subsequente assimilação das visões da ciência ocidental exige a introdução explícita de estratégias
pedagógicas de border crossing nas aulas de ciências e de apoio aos alunos nos processos de
cruzamento das suas fronteiras culturais (Aikenhead 1996). Aikenhead & Jegede (1999)
sustentam que as fronteiras entre a ciência ocidental ou escolar e a ciência tradicional devem
encorajar os alunos classificados como Other Smart Kids, “I Don´t Know” Students e Out-siders a
negociarem as transições culturais nas aulas de ciência. Neste estudo, os autores propuseram a
teoria collateral learning (explicação cognitiva para compreender o que ocorre nas mentes e nos
corações de alguns alunos quando aprendem a ciência) e a teoria de border crossing (transições

80
entre as culturas e sub-culturas). Neste estudo, Aikenhead & Jegede (1999) concluem que é
necessário reduzir os obstáculos de aprendizagem da ciência, aplicando as perspectivas collateral
learning e de cross-cultural border que se substanciam num ensino que explora as realidades dos alunos
nas aulas.
Aikenhead (2002) debruçando-se sobre os resultados do projecto de pesquisa “Rekindling
Traditions” constata que os materiais locais concedem oportunidades para que os alunos celebrem
a co-existência de duas ciências no ensino dos conteúdos escolares. Os alunos aprendem a ciência
ocidental sem desacreditar a ciência aboriginal através da diferenciação das visões que explicam
os fenómenos da natureza. Com a exploração dos conhecimentos da comunidade aboriginal,
materiais locais, línguas locais e valores culturais na aula de ciência, o ensino tornou-se acessível,
dinâmico e significativamente compreensível. Os alunos aprendiam com facilidade,
movimentavam-se com acessibilidade entre as duas culturas, estabeleceram novas relações entre
o professor e os alunos, observou-se a substituição do professor transmissor dos conhecimentos
pelo professor facilitador, guia cultural, culture brokers, concedendo voz aos alunos e validando as
suas formas culturais de saber (Aikenhead 2001b, 2002).
De acordo com Jegede (1999), a cultura do meio do aluno tem um papel significativo na
aprendizagem da ciência que é hostil aos seus conhecimentos tradicionais e aos seus meios
ambientais e eco-culturais. Os esquemas de memórias dos alunos construídos pelos ambientes
eco-culturais e socioculturais (ciência tradicional) podeminteragir numa mínima interferência
com os conceitos da ciência ocidental. Nestes termos, Jegede (1999) conclui que o ensino da
ciência nas culturas africanas deve valorizar os backgrounds socioculturais dos alunos como centro
de aprendizagem pois a sua desvalorização poderá destruir as abordagens conceptuais usadas
pelos alunos para interpretar os fenómenos e criar dificuldades nos processos cognitivos dos
alunos africanos. Num estudo sobre o ensino da Matemática e da Ciência no contexto africano,
Jegede (1995) mostra que, mais do que “converter” as visões do mundo indígena e “primitiva”
dos alunos a favor das explicações “mais científicas”, a Ciência e a Matemática deviam
reconhecer que as visões “primitivas” acumuladas na memória dos alunos são fundamentais na
construção do saber e devem ser exploradas e acomodadas no ensino da ciência. O ensino deve
recorrer aos materiais, tecnologias e processos do ambiente eco-cultural no qual os alunos vivem,
a destacar: ambientes africanos para explicar os fenómenos naturais; princípios, teorias,

81
concepções, tecnologias indígenas e valores típicos africanos e sentimentos de relação, prática e
tecnologia como construções humanas. Jegede & Okebukola (1991b) mostram num estudo
empírico que os alunos enfrentam dificuldades de aprendizagem em situações nas quais têm
backgrounds socioculturais diferentes das explicações da ciência. A reversão desta barreira será
possível mediante a discussão sobre as experiências e informações socioculturais do meio dos
alunos por forma a influenciar as suas atitudes na aprendizagem da ciência. Os conhecimentos
socioculturais dos alunos servem de filtros que eliminam os equívocos entre as visões do mundo
cultural e tradicional (visão antropomórfica) e as da ciência. Os resultados do estudo mostram
que os alunos compreendem com eficiência a ciência e exteriorizam as suas atitudes positivas
sobre o valor instrucional dos seus meios socioculturais na aprendizagem sempre que for
leccionada com base em duas visões do mundo (Jegede & Okebukola 1991b).
No estudo sobre a influência da cosmologia, crenças e superstição africanas nas actividades de
observação de fenómenos, processos e conceitos de biologia, Jegede & Okebukola (1991a)
destacam que os alunos com altos níveis de domínio da cosmovisão tradicional africana,
superstição e tabus realizaram poucas observações científicas que os alunos com baixo domínio
da cosmovisão tradicional. Com esta constatação, os autores demonstram que a observação e a
interpretação dos fenómenos na aula de ciência é influenciada pelas experiências da cosmovisão
tradicional, crenças e superstição que os alunos trazem dos seus contextos socioculturais para as
aulas de ciência. A título de exemplo, os autores constataram que os alunos com alto nível de fé
sobre a superstição e tabu interpretavam a observação do coelho na aula de ciência como se
tivesse ocorrido na mesma aula a reencarnação do antepassado morto. Por esta razão, os autores
concluíram que os sistemas de pensamento e de cosmovisão tradicional nas aulas de ciência
devem ser capitalizados como abordagens conceptuais para a construção de significados dos
fenómenos e garantir que os alunos transitem com flexibilidade e facilidade dos seus mundos de
vida para o mundo da ciência, negociando-os através do border crossing e construindo a
aprendizagem através de dois ou mais esquemas em interacção harmoniosa e ou conflitos que
são colateralmente resolvidos (Aikenhead & Jegede 1999). O aluno é capaz de resolver os seus
conflitos mentais através da rejeição ou acomodação de novas experiências nas suas estruturas
cognitivas, recorrendo ao processo de reestruturação cognitiva, neutralizando criticamente os
elementos que conduzem à rejeição e reforçando os que se engrenam nos processos de

82
harmonização e adaptação (Ogunniyi 1988). Este autor sugere que o ensino da ciência não possa
denegrir, destruir asidentidades, tradições culturais dos alunos africanos senão instruí-los para
alcançar os desafios da modernidade (Ogunniyi 1988).

3.2.1 Crossing-cultural border na aula de ciência

Stanley & Brickhouse (2001) advogam que o ensino da ciência deve contemplar e ou incluir
outras visões culturais para que os alunos possam aceder a diferentes visões dos fenómenos. Esta
pluralidade de visões, a destacar conhecimentos indígenas, ecologia tradicional de
conhecimentos e a ciência ocidental moderna proporcionarão outras formas e princípios de
pensar e de compreender os fenómenos. Com esta abordagem, os alunos seriam preparados para
a vida a partir da diversidade cultural dos conhecimentos ensinados nas aulas de ciência (Snively
& Corsiglia 2001) e concedendo-lhes oportunidades de avaliação e análise de práticas, valores e
crenças tradicionais e os conhecimentos convencionais (George 1999a). O border crossing
possibilitará aos alunos explorar as diferenças ou similaridades entre os conceitos culturais e os
científicos. Para este efeito, o professor deve incorporar os saberes indígenas (visões, crenças,
valores), combinando-os com os saberes da ciência, proporcionando uma rica compreensão da
natureza dos fenómenos (Snively & Corsiglia 2001).
Num estudo sobre o ensino de Física com base na analogia entre os conceitos familiares
provenientes do contexto cultural dos alunos e os conceitos não familiares oriundos da ciência,
Nashon (2003) constata que os professores quenianos recorrem espontaneamente às experiências
e ambientes diários, práticas culturais, crenças e a humanização dos fenómenos para garantir a
compreensão dos conteúdos da ciência pelos alunos. A analogia humanizada eleva os níveis de
facilitação e de compreensão da ciência pelos alunos (Koosimile 2004). As conclusões do estudo
de Nashon (2003) sugerem que no contexto de sociedades multiculturais nas quais os alunos
portam diferentes “backgrounds” na sala de aulas, aprendem em L2 e encaram dificuldades de
compreender os conteúdos dos livros, os professores devem investigar os ambientes dos alunos e
identificar os objectos e os costumes que lhes são mais confortáveis e que sejam usados nas
explanações analógicas pois desta forma, os alunos poderão conjugar duas analogias sobre
conceitos e fenómenos da Física, escrevendo a conceptualização científica e confrontando com

83
a explanação cultural, suscitando a controversa que será discutida na aula.
Naidoo & Vithal (2014) mostram como os professores sul-africanos aplicam os sistemas de
conhecimentos indígenas e culturais dos alunos quando têm a oportunidade de o fazer na aula.
As autoras constataram que os sistemas de conhecimentos indígenas são incorporados a título de
hipóteses censuráveis depois da introdução dos conteúdos da ciência (abordagem
incorporacionista); são separados lado a lado da ciência e através de espaços na aula sem
interligação (abordagem separatista) e integrados como género de conhecimentos ligados aos
conteúdos da ciência e como ferramentas poderosas e imprescindíveis para o ensino flexível
(abordagem integracionista). Ora, a introdução dos sistemas de conhecimentos indígenas gerou
novos padrões de interacção e de participação dos alunos sobretudo na abordagem
integracionista com vista a construir o conhecimento através de duas visões opostas.
Harper (2017) num estudo sobre o ensino da ciência com recurso à abordagem de aprendizagem
comunitária e aplicando a pedagogia cross-cultural border mostra como os alunos elevaram a
legitimação dos seus conhecimentos, as suas línguas e culturas na aprendizagem da ciência. Os
alunos e o professor desenvolveram as aulas em duas epistemologias diferentes de conhecimentos
e enriquecidas com conhecimentos, experiências e valores socioculturais dos alunos. A pesquisa
abriu as portas para o conhecimento indígena enraizado nas narrativas do presente e do passado
de pessoas não-dominantes. Os alunos foram exigidos a valorar as suas culturas e ao mesmo
tempo conduzir investigações sobre as suas culturas e ciências. Esta pesquisa permitiu aos alunos
reconhecer o valor das suas culturas diante do discurso da ciência.
O ensino da ciência deve valorizar as perspectivas culturais dos alunos e ajudando-os a transitar
ou a realizar com sucesso o boundary crossing do mundo tradicional ao mundo convencional
(George 1999a). Esta sugestão pedagógica é sustentada pelas evidências e resultados dum estudo
no qual George (1999a) estudou as semelhanças e diferenças entre as práticas tradicionais e as
da ciência relacionadas com a saúde na vila de Seablast - Trinidade Tabago. Sob o ponto de vista
instrucional, a autora analisou o impacto das práticas tradicionais na aprendizagem da ciência e
como se medeiam os fundos de conhecimentos e outras formas de conhecimento na aula. À luz
da pedagogia cross-cultural border, o estudo conclui que os alunos usam suas experiências
tradicionais para explicar os fenómenos sobre a saúde que coincidem e se distinguem das
explicações e argumentações da ciência (George 1999a, Herbert 2008). Por esta razão, a autora

84
advoga que o ensino da ciência deve permitir que os alunos acedam facilmente ao conhecimento
da ciência através de comparações, analogias deste com os conhecimentos, visões, crenças,
valores e experiências tradicionais pois assim poderão avaliar as contribuições da ciência nas suas
vidas.
Herbert (2008) constata que os alunos entendem a ciência a partir do border crossing entre os
conhecimentos tradicionais e os conhecimentos da ciência. As duas abordagens são pedagogias
que facilitam aos alunos a construir pontes para acederem ao mundo da ciência convencional e
motivá-los a aprendê-la. Segundo Herbert (2008), os alunos referiram que o uso das pontes e das
abordagens cross-cultural e collateral learning no ensino da ciência expunha “a outra metade” do
conhecimento da ciência uma vez que dominam os conhecimentos tradicionais, “outra metade”,
discutindo as similaridades e as diferenças entre as duas visões de conhecimentos e construindo
relações entre ambas “outras metades”. A título de exemplo, os alunos explicavam o
aparecimento das espinhas nos adolescentes como resultado de sujidade no organismo (visão dos
conhecimentos tradicionais) todavia, com a aula de ciência os alunos explicaram que as espinhas
são causadas pelas hormonas e bactéria na puberdade (visão dos conhecimentos científicos).
Myhill (2004) avança com resultados de pesquisa segundo os quais, os conhecimentos prévios
dos alunos são scaffolding para a construção dos conceitos ou ideias usados nos conhecimentos da
ciência. Os professores agem como mediadores, guias que assistem aos alunos no processo de
construção de novos significados e novos conhecimentos, contudo, as evidências da sua pesquisa
mostram práticas de fraca exploração dos conhecimentos prévios, consequentemente, as aulas
tendem a ser espaços de transmissão de factos e de fenómenos que são memorizados pela maioria
dos alunos. Muitos alunos não entendem nem respondem positivamente ao ensino. Os alunos
entrevistados refeririam existir a desconexão ou falta de sincronia conceptual e epistemológica
entre os conteúdos científicos ensinados pelos professores e os conhecimentos prévios adquiridos
no contexto sociocultural. Em jeito de sugestão, Myhill (2004) propõe que o ensino de ciência
tenha que encorajar a máxima participação dos alunos e conceder oportunidades de acesso aos
conhecimentos prévios para que ocorra uma aprendizagem efectiva.
Corroborando com Myhill (2004), Moll et al. (1992) observaram que, de facto, os professores não
incluem os fundos de conhecimento e ou visões do mundo extra-escolares dominados pelos
alunos durante as aulas de ciências. Por esta razão, os alunos que nas famílias são activos, na aula

85
tornam-se passivos. A sugestão dos autores sublinha que o ensino-aprendizagem da ciência deve
partir dos interesses, das realidades, das famílias dos alunos e dos respectivos fundos de
conhecimento.
Wee (2012) mostra como os alunos de três contextos diferentes (EUA, China e Singapura)
desenvolvem ideias sobre o ambiente e constroem significados sobre os respectivos conceitos a
partir das suas experiências culturais. Na visão dos alunos dos três contextos, o ambiente
congrega seres vivos (incluindo humanos) e seres não vivos (não humanos) em consequências das
suas experiências nos meios urbanos e nas famílias. Nestes termos, Wee (2012) propõe que o
ensino da ciência deve contemplar todas as perspectivas de conhecimentos disponíveis,
valorizando as necessidades e as vozes dos alunos. Do mesmo modo Driver et al. (1994) entendem
que o ensino da ciência deve proporcionar oportunidades para apreciar, por um lado, os
conhecimentos dos alunos e por outro lado os conhecimentos científicos, reconhecendo que
ambos são naturalmente simbólicos e socialmente negociáveis. Assim, o ensino da ciência requer
que as ideias prévias dos alunos sejam desafiadas através de diferentes formas de pensamento
que também explicam os fenómenos. Neste género de ensino veiculado na pedagogia de collateral
learning devem construir-se novos conhecimentos a partir das ideias informais, senso comum e
dos conhecimentos prévios dos alunos sobre os fenómenos naturais (Driver et al.1994). De facto,
o estudo destes autores mostra que na aprendizagem da ciência os alunosintroduzem, validam
ou não as suas representações de conhecimentos culturais dependendo do nível de semelhança e
ou de diferença entre estes e os conhecimentos da ciência.
McKinley (2005) conclui que o ensino das ciências deve não somente valorizar e revitalizar os
conhecimentos tradicionais ou indígenas, mas também as respectivas línguas no processo de
ensino-aprendizagem. O autor mostra que a ciência ocidental moderna está sistematizada e é
ensinada em inglês. Nestes termos, os sistemas de conhecimentos indígenas ou conhecimentos
ecológicos tradicionais devem ser ensinados nas respectivas línguas indígenas. O autor
compreende que os conhecimentos, as experiências e as identidades indígenas inclusas no ensino
da ciência estão sistematizadas em línguas indígenas porque não se pode entender a visão do
mundo da língua separada da respectiva cultura. A cultura não pode prevalecer e vincar na
educação da ciência sem as línguas. Portanto, McKinley (2005) defende que o ensino que
desvaloriza as línguas está sujeito a conflitos culturais entre a casa e a sala de aulas, reduzindo a

86
eficácia e a expectativa dos alunos e dos professores. O uso das línguas indígenas no ensino da
ciência é essencial para o desenvolvimento da cultura, da língua e dos propósitos académicos.

3.2.2 Collateral learning na aula de ciência

De acordo com Fakudze (2004) as abordagens border crossing, collateral learning e contiguity não são
totalmente viáveis para descrever as reais transições de uma visão para outra no processo de
ensino-aprendizagem de ciências. Neste contexto, o autor sugere que o ensino da ciência deve
valorizar os processos de transições entre os conhecimentos dos alunos e os da ciência, ensinar
conteúdos da ciência que coincidem com a cultura, valores e crenças dos alunos. Ogunniyi (1988)
examina as visões tradicionais e científicas no ensino da ciência e constata que elas geram
conflitos cognitivos (rejeição ou acomodação) de novos conhecimentos devido ao contacto das
duas visões. Não obstante esta constatação, o autor sugere que se criem estratégias de
harmonização, adaptação das diferenças sem forçar a assimilação senão a acomodação todavia,
o ensino deve investir em aspectos da cultura dos alunos para que se desenvolvam novos
conhecimentos. A harmonização e acomodação das visões de conhecimentos estão
condicionadas ao reconhecimento, valorização e exploração das visões, conhecimentos, crenças,
práticas e valores dos contextos socioculturais dos alunos no ensino da visão científica (Jegede
1999). Adams (1999) enquadra o collateral learning como fenómeno do cultural border crossing que,
em sua análise crítica, defende que esta teoria não explica explicitamente as dinâmicas de
interacção entre a visão do mundo antropomórfica dos alunos e a visão mecanicista da ciência
escolar, não argumenta como os alunos reconciliam ou harmonizam duas visões do mundo
distintas. Esta observação de Adams (1999) não tomou em conta os tipos de collateral learning
apresentados por Jegede (1995), a destacar: parallel collateral learning (os esquemas na memória a
longo prazo não interagem e são incompatíveis com os conceitos ou conteúdos da ciência em
aprendizagem); simultaneous collateral learning (os conceitos da ciência e ideias indígenas são
aprendidos em paralelo); dependent collateral learning (os esquemas das visões do mundo são
diferentes, o processo de ensino substitui uma visão por outra através da acomodação e
assimilação) e secured collateral learning (os alunos resolvem prováveis conflitos cognitivos,
perturbação mental durante o ensino da ciência). Diante destes tipos de fenómenos de collateral

87
learning, Jegede (1995) advoga a adopção e a promoção de estratégias pedagógicas que garantam
a acomodação das visões do mundo tradicionais e as ocidentais no ensino da ciência
independentemente de qualquer que seja o tipo de collateral learning.
O estudo de Costa (1995) constata que a relação entre os mundos da família e dos amigos e os
mundos da escola e da ciência têm implicações pedagógicas no sucesso dos alunos na
aprendizagem da ciência. Os alunos podem ser Potential scientists (os dois mundos são
congruentes); “Other Smart Kids” (a congruência é inconsistente com o mundo da ciência); “I Don´t
Know” Students (inconsistência entre ambos os mundos); Outsider (os dois mundos discordam-se um
dos outro) e Inside Outsiders (os mundos são irreconciliáveis, mas compatíveis com o mundo da
ciência). A congruência entre os mundos da família, amigos, escola e ciência facilita a sua
compreensão pelos alunos e logo há maior interesse pela ciência. No entanto, os alunos cujos
mundos da família e dos amigos são incongruentes com o mundo da escola e da ciência registam
experiências negativas nas aulas da ciência e por esta via, a ciência aliena-os. A partir destes
resultados, Costa (1995) sugere que o ensino da ciência deve associar-se às concepções,
experiências, conhecimentos e culturas dos meios dos alunos, criando oportunidades para que
os alunos reflictam sobre o impacto da ciência nas suas vidas.
Anteriores a Costa (1995), Phelan et al. (1991) identificaram quatro tipos de estratégias de
movimentos manifestados pelos alunos quando negociam as fronteiras entre o mundo da família
e dos amigos e o mundo da escola, a saber: Congruent Worlds/ Smooth Transitions (o movimento
entre os mundos é harmonioso devido à congruência entre os mundos e o ensino é confortável e
positivo); Different Worlds/ Boundary Crossings Managed (o movimento entre os mundos depende do
reajustamento e adaptação das diferenças); Different Worlds/ Boundary Crossings Hazardous (o
movimento é difícil e perigoso devido ao contraste entre os mundos senão com base na
assimilação forçada); Border Impenetrable/ Boundary Crossings Insurmountable (os mundos opõem-se e
portanto, os alunos resistem às transições). Phelan et al. (1991) sugerem que a facilidade das
estratégias de Boundary crossing/ Crossing boundary requer que os alunos exponham as suas
experiências de vida para que possam adquirir habilidades e estratégias confortáveis e de sucesso
no ensino. George (1999b) propõe quatro categorias a partir das quais os conhecimentos
indígenas podem ser relacionados com o ensino da ciência: categoria 1 - as práticas indígenas
(experiências, saberes e tecnologias quotidianos) podem explicar os termos da ciência

88
convencional; categoria 2 - explicação dos conhecimentos indígenas pela ciência convencional;
categoria 3 - estabelecimento de relação entre a ciência convencional e os conhecimentos
indígenas e categoria 4 - os conhecimentos indígenas não devem ser explicados com base nos
termos da ciência convencional senão expondo ambos os sistemas de conhecimentos para que
os alunos tomem decisões sobre o sistema adequado para as suas vidas.
Pomeroy (1994) corrobora em uma parte com os estudos de Phelan et al. (1991), Jegede (1995),
Costa (1995), George (1999b) e Aikenhead (1996, 1997). Com base em agendas, Pomeroy (1994)
propõe que o ensino da ciência se inter-relacione com as realidades, recursos, experiências e os
conhecimentos do contexto sociocultural e local dos alunos; estabeleça pontes entre as visões do
mundo, as línguas que os alunos trazem à sala de aulas através de actividades; aproprie as
estratégias de ensino construtivistas centradas nos meios socioculturais, fundos de
conhecimentos, visões do mundo locais ignorados pelos livros; garanta a aprendizagem da língua
proficientemente limitada e o uso de outras línguas na discussão dos fenómenos naturais e
científicos e inclua as práticas folclóricas e tecnologias locais para explicar os princípios científicos
e validar os conhecimentos construído no mundo natural.

3.2.2.1 Fundos de conhecimentos e experiências extra-escolares

As experiências, práticas, valores, saberes que os alunos aprendem nos contextos socioculturais
e que trazem à escola são condicionantes à óptima aprendizagem e compreensão dos conteúdos
científicos nas aulas (George 1999a, Koosimile 2004, Herbert 2008). Gitari (2009) mostra as
implicações pedagógicas e de mentalidades dos alunos devido à separação dos conhecimentos
científicos dos conhecimentos quotidianos. Neste estudo, Gitari (2009) constata que os alunos
consideram que os conhecimentos quotidianos são estáticos e têm pouca utilidade do que os
conhecimentos científicos que são capazes de resolver problemas difíceis como é o caso das
doenças. Diante desta constatação, Gitari (2009) propõe que o ensino da ciência deve permitir a
construção do conhecimento a partir das experiências da vida quotidiana dos alunos com vista
a facilitar a compreensão das formas não académicas do discurso da ciência. Koosimile (2004)
num estudo sobre o ensino da ciência envolvendo as experiências extra-escolares dos alunos
adverte que, se os alunos tiverem fraco domínio de tais experiências, a compreensão dos

89
significados da ciência será baixa e difícil de alcançá-la na aula. Visando superar este problema,
Koosimile (2004) sugere que os professores de ciências devem identificar-se com os estilos de vida
dos alunos, as suas percepções e contribuições na aula, devem encorajar atitudes positivas para
interligar as experiências e ambientes extra-escolares nos conteúdos da ciência escolar pois sem
esta abordagem de contextualização cultural e pedagógica os professores limitar-se-ão às
conceptualizações da ciência e não no que os alunos sabem a partir das experiências da vida
quotidiana.
A integração dos conhecimentos culturais na aula suscita a conexão entre a ciência e as
experiências socioculturais dos alunos bem como promove o engajamento profundo dos alunos
na aprendizagem da ciência (Stears, Malcolm & Kowlas 2003). Num estudo relacionado com o
uso dos conhecimentos socioculturais e quotidianos dos alunos na aula de ciência, Stears,
Malcolm & Kowlas (2003) verificam que os alunos partilham as suas experiências de vida na
resolução de actividades, separando os conhecimentos culturais dos conhecimentos da ciência
através do “border crossing” e ou relacionando-os através do collateral learning. Os alunos divertiam-
se, engajavam-se e transitavam sem dificuldades dos conhecimentos quotidianos para os
conhecimentos estruturados pela ciência e vice-versa. A integração das experiências extra-
escolares cria, na óptica de Tran (2011), a melhoria na compreensão e na aprendizagem da
ciência, incentiva o interesse, perseverança, auto-eficiência, esforços na aprendizagem da ciência
desde que efectuem conexões, respeitando a L1, os conhecimentos culturais e recursos
disponíveis na comunidade. A exclusão de tais experiências pode dificultar a aprendizagem da
ciência, pode impedir a conexão entre os conteúdos da ciência e as experiências quotidianas e
consequentemente, pode bloquear as oportunidades de diálogo, de transferência da
aprendizagem entre as duas visões e de compreensão e construção do conhecimento científico
(Tran 2011). Contudo, algumas experiências extra-escolares podem aumentar positivamente os
resultados de aprendizagem da ciência (aprendizagem aditiva), podem baixá-los (aprendizagem
subtractiva) e outras podem não causar nenhum efeito na aprendizagem (Tran 2011). As
transições e conexões entre os conhecimentos quotidianos dos alunos e os conhecimentos da
ciência são condicionados pelo nível de congruência entre si (Phelan et al. 1991, Costa 1995,
Fakudze 2004).
Campbell & Lubben (2000) concluíram que a inclusão dos conhecimentos ou experiências

90
quotidianas no ensino da ciência não são a condição suficiente para que os alunos possam
compreendê-la e aplicá-la em situações concretas da vida quotidiana. A título de exemplo, num
estudo empírico sobre o ensino da energia com base em duas visões eminter-relação (explicação
científica e a não-científica), Solomon (1993) adverte que a confrontação entre as duas visões
dificultou o cruzamento entre ambos e desfavoreceu a compreensão dos alunos. O estudo de
Mayoh & Knutton (1997) observou que as experiências extra-escolares promovem as dimensões
afectivas e cognitivas na aula de ciência servem de analogias e de pontes para compreender a
ciência, suscitando ou não conflitos epistemológicos, cognitivos e conceptuais. Não obstante a
ocorrência de conflitos, Mayoh & Knutton (1997) advogam que o uso massivo das experiências
extra-escolares nas aulas de ciência abre oportunidades para que os alunos compreendam
facilmente a ciência.
Campbell & Lubben (2000), num estudo exploratório sobre a contextualização do ensino da
ciência com base nas situações e ou experiências quotidianas mostram que os alunos usam-nas
na resolução dos problemas da ciência, porém esta prática não é suficiente para que os alunos
reconheçam as suasimplicações sócio-económicas. Deste modo, Campbell & Lubben (2000)
sugerem que o ensino da ciência devia estabelecer ligações fortes e sólidas entre a comunidade
extra-escolar e a sala de aulas, seleccionar os conceitos relevantes do contexto extra-escolar como
dilemas e aplicá-los na resolução dos problemas de aprendizagem da ciência. George (1999b)
compreende que de facto, a incorporação dos conhecimentos provenientes das experiências reais
de vida dos alunos e dos conhecimentos prévios dos alunos concedem oportunidades para que o
ensino da ciência seja construtivista. Os alunos compreenderão a abstracção da ciência com base
nas experiências trazidas à sala de aulas e permitir-lhes-ão avaliar o valor dos conhecimentos
indígenas e os conhecimentos científicos nas suas vidas.
González et al. (2001) constatam que os fundos de conhecimentos comunitários estão distribuídos
entre os conhecimentos quotidianos e os conhecimentos científicos daí que, é preciso que haja
uma relação dialéctica entre ambos. Os conceitos da matemática quotidiana podem ser
transformados por forma a conectarem-se com os conceitos científicos e, da mesma forma, os
conceitos científicos podem ser transformados em conceitos quotidianos no domínio da prática.
Ao nível educacional, González et al. (2001) advogam práticas nas quais os alunos desenvolvem
actividades quotidianas e espontâneas em contacto com a ciência ensinada na escola, isto é,

91
aproximando as duas matemáticas, omitindo a dicotomia e transformando o conhecimento
matemático em actividades significativas. Hedges et al. (2011) reforçam as conclusões de
González et al. (2001) ao constatarem que o professor que não capitaliza a aprendizagem
adquirida pela criança no contexto informal ignora os conhecimentos prévios dos alunos,
experiências e interesses. Os fundos de conhecimento baseados nas vivências das crianças
desenvolvem as relações pedagógicas em que o professor deve tornar-se num ouvinte atencioso,
apoiá-las e desafiá-las nos seus pensamentos e ideias, reduzindo as disjunções entre a casa e os
centros infantis.
O estudo de Wei (2014) corrobora com as ideias dos demais autores acima citados ao constatar
que os fundos de conhecimentos e as práticas de multilingues de translanguaging criam cenários de
participação crítica dos alunos que recorrem às suas experiências culturais e identitárias para
negociá-las com os conhecimentos propostos pelos professores na aula. Em outras palavras são
os alunos que monitoram a aprendizagem tanto das línguas como dos conhecimentos da aula.
Os professores aprendem com base nas diferentes visões dos fundos de conhecimentos
apresentadas pelos multilingues e multiculturais.

92
CAPÍTULO 4. Desenho metodológico da pesquisa

Introdução

Neste capítulo metodológico debruço-me sobre a pesquisa-acção participativa, uma abordagem


sistemática de investigação que se interessa pela solução efectiva dos problemas específicos
(Stringer 2007) e pela promoção da racionalidade e da justiça através da reflexão e compreensão
de prática (Carr & Kemmis 1986). McNiff & Whitehead (2010) vêem a pesquisa-acção como
acção prática e reflexiva para solucionar um dado problema. Na visão de Stringer (2007), a
pesquisa-acção é uma investigação sistemática que coloca os sujeitos a solucionar os seus
problemas. Whitehead & McNiff (2002:5) distingue os significados das duas palavras: “acção
(fazer) e pesquisa (aprender com o que se faz)”. A acção é uma proposta que experimenta certas
acções a fim de observar, reflectir os respectivos efeitos práticos. A prática é o desenvolvimento
do conhecimento. Conforme Zuber-Skerritt (1996) na pesquisa-acção os sujeitos colaboram de
forma crítica em diferentes processos cíclicos. A pesquisa-acção participativa é um tipo de
pesquisa-acção idealizado pelo psicólogo Kurt Lewin em 1940, visando envolver os sujeitos na
mudança de problemas sociais no contexto situacional (Tomal 2010; McNiff & Whitehead 2002).
Sob ponto de vista metodológico, a pesquisa-acção participativa baseia-se na formulação de um
problema, na interpretação e solução através de ciclos, dados e permanente reflexão colectiva
(Sagor 1993; Stringer 2007). Esta pesquisa desenvolveu-se com base nos aportes metodológicos
da pesquisa-acção participativa, visando resolver o problema de participação, interacção dos
alunos e a flexibilidade e dinamismo do ensino-aprendizagem.

4.1 Local da pesquisa

A pesquisa realizou-se em 6 escolas primárias e completas (EPC´s) rurais que leccionam o


programa de educação bilingue nos distritos de Maxixe, Jangamo, Homoine e Inharrime
pertencentes à província de Inhambane em Moçambique, a destacar:

93
a) Distrito de Maxixe: EPC de Thekani;
b) Distrito de Jangamo: EPC de Wulombe;
c) Distrito de Homoine: EPC de Ruwani e EPC de Mikhokhweni;
d) Distrito de Inharrime: EPC de Citimela e EPC de N´tambani.

Com a excepção da EPC de Wulombe, localizada num posto administrativo semi-rural, as


restantes EPC´s localizam-se nas zonas rurais e estão inseridas nas comunidades campesinas. As
6 EPC´s localizam-se num raio territorial de cerca de 80km que abrange os 4 distritos da região
central da província de Inhambane.
As EPC´s identificadas para a pesquisa inseriam-se em três comunidades étnico-linguísticas
diferentes, interligadas geograficamente, mas culturalmente diferentes, a saber:

a) EPC´s de Thekani e de Wulombe - inserida na comunidade étnico-linguística Gitonga


(distrito de Maxixe e Jangamo);
b) EPC´s de Ruwani e de Mikhokhweni - inserida na comunidade étnico-linguística Citshwa
(distrito de Homoine);
c) EPC´s de Citimela e de N´tambani - inserida na comunidade étnico-linguística Cicopi
(distrito de Inharrime).

4.1.1 Participantes da pesquisa

Nesta pesquisa participaram professores e alunos de 6 EPC´s envolvidas ao longo das três fases
(pré-fase, I fase e II fase). Na pré-fase da pesquisa participaram 27 professores, 10 turmas de
diferentes classes de educação bilingue e cerca de 230 alunos de 10 a 12 anos de idade. Na I fase
da pesquisa seleccionei 3 EPC´s dentre as 6 identificadas, participaram 10 professores, 3 turmas
da 4ª classe e cerca de 80 alunos. Esta I fase decorreu no III trimestre de 2016 numa fase em que
os alunos tinham desenvolvido experiências de ensino-aprendizagem em L2, como o principal
meio de instrução. Na II fase deu-se a continuação da pesquisa nas mesmas 3 EPC´s
seleccionadas na I fase, mais uma EPC integrada nesta fase, totalizando 4 EPC´s envolvidas.
Nesta fase, participaram 3 novas turmas que iniciavam a 4ª classe no I trimestre de 2017 e cerca

94
de 90 novos alunos provenientes das 3 EPC´s seleccionadas na I fase. Aos anteriores 10
professores que participaram na I fase, integraram-se mais 5 novos professores provenientes da
nova EPC, totalizando 15 professores.
Os alunos abrangidos na I fase participaram na pesquisa durante um trimestre depois de dois
trimestres de aprendizagem em L2 do ano lectivo 2016 ao passo que os alunos da II fase
participaram na pesquisa no primeiro semestre do ano lectivo 2017.
Os professores de ambas as fases leccionavam numa das 5 classes do programa de educação
bilingue de forma progressiva a partir da 1ª à 5ª classe. Dentre os professores, alguns leccionavam
após participar de uma capacitação sobre a educação bilingue, contudo os outros leccionavam
sem nenhuma capacitação.

4.2 Desenho da pesquisa

O desenvolvimento desta pesquisa-acção obedeceu a três fases, a saber:

(i) Pré-fase - pesquisa da evidência e de validação do problema;


a) I fase - pesquisa preliminar; e
b) II fase - pesquisa de validação.

4.2.1 Pré-fase - Pesquisa da evidência e da validação do problema

Esta pesquisa-acção problematiza teoricamente a participação e a interacção dos alunos em L2


nas aulas das classes de pós-transição (4ª e 5ª classes) cujo meio de instrução é a L2. Nesta pré-
fase da pesquisa (de 20 de Junho a 08 de Julho de 2016) observei a 14 aulas em 6 EPC´s, 3
leccionadas em L1 nas classes antes da transição (2ª e 3ª classes), 10 leccionadas em L2 nas classes
de pós-transição (4ª e 5ª classes) e 1 aula de língua materna leccionada em L1 segundo ilustra a
tabela 1. Com base nesta observação objectivava evidenciar e validar o problema da minha
pesquisa.

95
Tabela 1: Observação de aulas na pré-fase da pesquisa
EPC´s Classe Disciplina Língua de instrução
Wulombe 4ª Ciências Sociais L2
5ª Português L2
3ª Ciências Naturais L1
Thekani 4ª Matemática L2
5ª Ciências Sociais L2
N´tambani 4ª Matemática L2
4ª Português L2
2ª Matemática L1
Ruwani 2ª Língua Citshwa L1
4ª Ofícios L2
4ª Língua Citshwa L1
Mikhokhweni 4ª Matemática L2
5ª Ciências Naturais L2
Citimela 4ª Ciências Naturais L2

A partir desta observação evidenciei as práticas pedagógicas e linguísticas dos professores e dos
alunos no processo de ensino-aprendizagem, os níveis de participação e de interacção dos alunos
bem como a flexibilidade e o dinamismo do ensino-aprendizagem condicionada à língua de
instrução antes da transição (ensino em L1) e pós-transição (ensino em L2). A par da observação
de aulas realizei entrevistas não-estruturadas aos professores e ao corpo directivo das EPC´s sobre
as suas percepções e desafios linguísticos, pedagógicos e curriculares que caracterizam os
professores, os alunos e o processo de ensino-aprendizagem do programa transicional. Os
entrevistados concordaram unanimemente que dentre os maiores problemas que afectavam
pedagogicamente o programa de educação nas classes de pós-transição destacavam-se os baixos
níveis de proficiência dos alunos em L2 e a rápida transição da L1 para a L2 na 4ª classe. Nestas
entrevistas, os professores e o corpo directivo das EPC´s posicionavam-se a favor dos objectivos
da pesquisa tal que a consideravam relevante e necessária dada a dimensão pedagógica do
problema da transição. Portanto, a observação de aulas e as entrevistas possibilitaram-me
evidenciar e validar o problema da pesquisa pois a língua de instrução nas classes antes e pós-
transição condiciona sobremaneira os níveis de participação e de interacção dos alunos nas aulas
e os níveis de dinâmica e flexibilidade do ensino-aprendizagem.

96
4.2.2.1 Selecção das EPC´s e formação dos grupos de pesquisa

A pré-fase da pesquisa possibilitou-me definir três critérios para a selecção das EPC´s que seriam
alvo da pesquisa, a destacar: aceitação voluntária dos professores em participar na pesquisa;
localização geográfica das EPC´s e as diferenças linguísticas e culturais entre as comunidades nas
quais se inseriam as EPC´s.
A participação dos professores seria voluntária desde que concordassem com a metodologia
participativa assumida nesta pesquisa. As diferenças linguísticas e culturais das comunidades nas
quais se localizam as EPC´s possibilitariam a realização da pesquisa em 3 contextos linguísticos
e culturalmente heterogéneos (Citshwa, Gitonga e Cicopi). A localização e a aproximação
geográfica entre as EPC´s permitiria a mobilidade diária de uma EPC para outra. Com base
nestes três critérios, seleccionei 4 EPC´s alvos da pesquisa (EPC de Ruwani; EPC de
Mikhokhweni; EPC de Wulombe e EPC de Citimela) e constitui 3 grupos de pesquisa,
nomeadamente:

a) Grupo 1: EPC´s de Acção Inovadora - EPC de Ruwani e de Citimela;


b) Grupo 2: EPC de Controle - EPC de Mikhokhweni, e
c) Grupo 3: EPC´s de Crítica e Validação - EPC de Wulombe e de Mikhokhweni.

Nas sub-secções que abaixo, descrevo detalhadamente as responsabilidades de cada EPC no


decurso da pesquisa.

4.2.1.1.1 EPC´s de Acção Inovadora

As EPC´s de Acção Inovadora de Ruwani e Citimela desenvolviam progressivamente ciclos de


pesquisa-acção relativas às práticas pedagógicas do translanguaging, collateral learning e cross-cultural
border nas I fase e II fase da pesquisa. Cada ciclo de pesquisa-acção continha quatro etapas
cíclicas: planificação (aulas inovadoras); acção (leccionação de aulas); observação (assistência de
aulasinovadoras) e reflexão (análise e avaliação crítica dos resultados da aula inovadora).

97
Etapa 1:
Planificação

Etapa 4: Etapa 2:
Reflexão Acção

Etapa 3:
Observação

Diagrama: Ciclo de pesquisa-acção adoptado na pesquisa (adaptado de Kemmins & McTaggart


2007)

O grupo de professores destas EPC´s participava activamente nas 5 etapas do ciclo de pesquisa-
acção a título de co-investigadores. Semanalmente, as EPC´s de Acção Inovadora desenvolviam
um a dois ciclos de pesquisa-acção (duas aulas semanais de 45 minutos). Nas sessões de
planificação de novos ciclos, o investigador principal partilhava as constatações observadas na
EPC de Controle e na outra EPC´s de Acção Inovadora, possibilitando assim o controle dos
desafios, avanços e perspectivas da pesquisa e acautelando-os na planificação. Durante as duas
fases da pesquisa de campo desenvolvi vários ciclos de pesquisa-acção que resultaram num total
de 33 aulas de Acção Inovadora segundo mostra a tabela 2.

Tabela 2: Aulas de Acção Inovadora e de Controle


Fases de EPC´s de Acção EPC de
pesquisa Inovadora Controle
de campo Ruwani Citimela Mikhokhweni
I fase 8 6 6
II fase 12 7 13
Total 20 13 18

98
4.2.1.1.2 EPC de Controle

A EPC de Mikhokhweni participou na pesquisa nas duas fases a título de EPC de Controle. Nesta
EPC realizava a observação etnográfica de aulas da disciplina de Ciências Naturais por forma a
avaliar e monitorar continuamente os resultados da pesquisa. As evidências que observava nesta
EPC induziam-me a reflectir sobre as evidências e os resultados desta com os das EPC´s de Acção
Inovadora. Ao longo das duas fases observei 19 aulas das quais 6 observei-as na I fase e as
restantes 13 observei-as na II fase da pesquisa.

4.2.1.1.3 EPC´s de Crítica e Validação

As EPC´s de Crítica e Validação eram constituídas por dois grupos de professores das EPC´s de
Mikhokhweni e de Wulombe que participaram somente no fim da II fase da pesquisa a título de
avaliadores críticos externos cujas responsabilidades se resumiam em: julgar as evidências
constatadas com base na pergunta do ciclo, critérios e padrões de julgamento definidos em cada
ciclo; analisar criticamente as estratégias aplicadas e as evidências que delas se observaram e
avaliar a validade pedagógica das evidências e dos resultados alcançados pela pesquisa.
Na etapa de submissão dos resultados e as evidências da pesquisa à crítica e validação, extraí
para cada um dos três períodos de progresso dos ciclos da pesquisa da II fase, três amostras de
aulas do mesmo conteúdo e submeti à avaliação e crítica aos grupos de professores das EPC´s de
Crítica e Validação de Wulombe e de Mikhokhweni, a saber:

a) I período: 3 vídeos e transcrições de aulas iniciais referentes ao conteúdo “Principais


partes do olho; Funções das partes do olho; Cuidados a ter com o olho” leccionado em
L2 nas três EPC´s da pesquisa cuja observação preconizava evidenciar a ocorrência do
problema da pesquisa no início da 4ª classe;
b) II período: 3 vídeos e transcrições de aulas relativos ao conteúdo “Cadeia alimentar;
Interdependência dos seres vivos; Roda de cadeia alimenta” dos quais, 2 eram
relacionados com as aulas leccionadas com base na pedagogia do translanguaging, collateral
learning e cross-cultural border nas EPC´s de Acção Inovadora e 1 pertencente à EPC de
Controle;

99
c) III período: 3 vídeos e transcrições de aulas sobre o conteúdo “Funções dos diferentes
tipos de alimentos; Dieta equilibrada; Conservação dos alimentos e Qualidade e validade
dos produtos” e outros 3 vídeos e transcrições de aulas sobre o conteúdo “Composição
dos solos; Tipos de solos da comunidade e Experiência com os solos” dos quais 2 extraídos
das EPC´s de Acção Inovadora e as 1 proveniente da EPC de Controle.

Inicialmente, os professores analisaram as evidências das aulas transcritas individualmente e


assistiram os respectivos vídeos em grupos. A seguir, organizei duas sessões de micro-workshops
de crítica e validação nas quais os professores analisariam reflexivamente as evidências e os
resultados da pesquisa mediante critérios e padrões de julgamento concebidos em cada ciclo de
aulas e consequentemente avaliar a validade dos resultados da pesquisa na solução do problema
da pesquisa mediante conversas críticas e entrevistas grupais não-estruturadas. Os professores
julgaram criticamente os resultados da pesquisa baseados nas evidências e nas suas experiências
como professores da educação bilingue preocupados em relação à dimensão pedagógica do
problema da pesquisa. Com base nestas conversas críticas e entrevistas grupais não-estruturadas
desenvolvidas nas sessões de micro-workshops pude obter a crítica e a validação externa da
pesquisa por dois grupos de professores de duas EPC´s diferentes e que têm uma larga
experiência pedagógica no programa em pesquisa.

4.2.2 I fase - pesquisa preliminar

A I fase da pesquisa decorreu de16 Setembro a 25 de Outubro de 2016, referente ao III trimestre
do mesmo ano. Neste trimestre, os alunos tinham experiências de ensino-aprendizagem em L2
desenvolvidas nos dois trimestres anteriores. Os conteúdos abordados nesta I fase não eram
similares nas três EPC´s de pesquisa. Por esta razão, o foco de análise cingia-se exclusivamente
às evidências constatadas unilateralmente em cada EPC e de ciclo em ciclo.
A I fase preconizava avaliar por um lado, o impacto pedagógico do translanguaging e, por outro
lado, o impacto do collateral learning e do cross-cultural border na criação de espaços de participação
e de interacção dos alunos na aula e as respectivas dinâmicas e flexibilidades do ensino-
aprendizagem. A aplicação das práticas pedagógicas do translanguaging, collateral learning e cross-
cultural border fi-lo de forma gradual e em duas etapas. A I etapa cingia-se à introdução
experimental das práticas de translanguaging e na II etapa acrescentei as práticas de collateral learning

100
e de cross-cultural border com o objectivo de avaliar a reacção e as atitudes dos alunos em cada
etapa e identificar as evidências de práticas pedagógicas que activam a interacção e participação
dos alunos e a dinâmica e flexibilidade do ensino-aprendizagem em cada uma das etapas.

4.2.2.1 Ciclos da I etapa: práticas de translanguaging

Na I etapa desta fase planifiquei duas escalas de introdução inicial e gradual da pedagogia de
translanguaging nas quais a L1 seria parte do repertório linguístico no ensino-aprendizagem
juntamente com a L2. Na primeira escala a L1 seria introduzida numa escala percentual de 20
a 25% e a posterior na escala mais avançada de 30 a 50% ambas sob monitoria do professor.
Na primeira escala desenvolvi dois ciclos de aulas práticas em cada EPC de Acção Inovadora.
Nestas aulas, ir-se-ia ensinar através da pedagogia de translanguaging e incentivar-se-iam os alunos
a usá-la de forma aberta, espontânea, voluntária e sem receios na aula diferentemente da
pedagogia de uma única língua usada nos dois trimestres anteriores. De ciclo em ciclo e de aula
em aula, colectava evidências e resultados do impacto do translanguaging nas aulas tendo passando
para a escala subsequente. Na segunda escala (30 a 50% de L1), o translanguaging enraizou-se
como repertório linguístico e pedagógico nas aulas de Ciências Naturais.
Em ambas as escalas, constatei evidências de novos cenários de sala de aula no que concerne à
participação e à interacção dos alunos na aula e à dinâmica e flexibilidade do ensino-
aprendizagem, motivando-me a passar para a II etapa referente à pedagogia do collateral learning
e cross-cultural border.

4.2.2.2 Ciclos da II etapa: práticas de translanguaging e de collateral


learning e cross-cultural border

Na II etapa da I fase planifiquei dois ciclos compostos por 3 aulas práticas que combinavam as
práticas de translanguaging e as práticas de collateral learning e de cross-cultural border numa escala de
30 a 50% de L1 e de integração dos fundos de conhecimentos (experiências socioculturais e ou
saberes locais). A combinação das duas práticas pedagógicas trouxe, em apenas 3 aulas, novos
resultados para além dos que se tinham observado na I etapa e dos ciclos de translanguaging.
Através do translanguaging e do collateral learning e cross-cultural learning evidenciei a reacção

101
participativa e interactiva dos alunos na aula que superava a inflexibilidade do ensino-
aprendizagem.
Os resultados das duas etapas forneceram-me resultados e evidências pedagógicas que me
permitiram planificar metodologicamente a II fase de pesquisa de campo restrita à pesquisa de
validação da proposta pedagógica translanguaging, collateral learning e cross-cultural border em alunos
que iniciam a 4ª classe após 3 classes de instrução em L1.

4.2.3 II fase - pesquisa de validação

A partir dos resultados da I fase de pesquisa de campo, programei a II fase que decorreu no I
semestre do ano lectivo de 2017, de 16 de Janeiro a 31 de Março. O objectivo desta fase visava
implementar a pedagógica do translanguaging, collateral learning e cross-cultural border como uma única
proposta pedagógica. Assim, as aulas planificadas para as duas EPC´s de Acção Inovadora
inspiravam-se das práticas pedagógicas experimentadas ciclicamente na I fase.
Nesta II fase, decidi elaborar, em colaboração com os professores das 3 EPC´s, um único
programa de conteúdos trimestrais de Ciências Naturais para que me permitisse analisar e
comparar criticamente as evidências de três EPC´s da pesquisa em cada conteúdo. Dentre os
diferentes conteúdos da disciplina de Ciências Naturais, apliquei ao critério de selecção dos
conteúdos que tivessem alguma representatividade cultural local tanto sob forma de experiências
como sob forma de materiais, usos e costumes relacionados directa ou indirectamente com os
conteúdos da disciplina.

Tabela 3: Programa de conteúdos seleccionados na II fase da pesquisa


Unidade Temática Lição Conteúdos do programa
Higiene e saúde 01 Principais partes do olho
02 Funções das partes do olho
03 Cuidados a ter com o olho
Cadeia alimentar 04 Cadeia alimentar
05 Interdependência dos seres vivos
06 Roda da cadeia alimentar
07 Construção da cadeia alimentar local
Higiene e Nutrição 09 Funções dos diferentes tipos de
alimentos
10 Dieta equilibrada

102
11 Conservação dos alimentos
12 Qualidade e validade dos produtos
Agricultura 15 Composição dos solos
16 Tipos de solos
17 Solos da comunidade
18 Experiência com os solos

4.2.3.1 Ciclos de aulas

A II fase da pesquisa distinguiu dois ciclos, a saber: ciclo de planificação e de acção e ciclo de
observação, análise e/ou reflexão. Com base nesta distinção previa observar o problema de
pesquisa e a seguir reflectir sobre as estratégias a adoptar para iniciar com os ciclos de aulas de
acção.

4.2.3.1.1 Ciclos de planificação e de acção

Distintivamente da I fase, nesta II fase da pesquisa concebi ciclos de aulas que contemplavam
um título do ciclo, uma pergunta de pesquisa do ciclo, critérios e padrões de julgamento e uma
ficha de observação, avaliação e análise das evidências da aula. A partir destes instrumentos
conseguia juntamente com os co-investigadores observar, analisar e reflectir sobre as evidências
constatadas nas aulas das EPC´s de Acção Inovadora que, pese embora abordassem o mesmo
conteúdo com a EPC de Controle, a leccionação nas duas primeiras efectuava-se com base nas
práticas pedagógicas de translanguaging e de collateral learning e cross-border cultural diferentemente da
leccionação em L2 desenvolvida na EPC de Controle.
Ao longo desta fase planifiquei 19 ciclos de aulas, 7 na EPC de Acção Inovadora de Citimela e
12 na EPC de Acção Inovadora Ruwani. A leccionação das aulas foi compartilhada e
alternadamente entre mim e os professores das turmas de pesquisa e sob observação dos restantes
co-investigação. As minhas práticas de leccionação visavam aliviar a sobrecarga do professor da
turma de pesquisa, vivenciar as experiências práticas de translanguaging e de collateral learning e cross-
border cultural sob observação dos restantes co-investigadores, desenvolver a pesquisa como um
investigador em processo de aprendizagem tal como aos restantes colegas.
De ciclo em ciclo os co-investigadores recorriam à ficha de observação e reflexão de aulas e
registavam as suas observações, reflexões e análises. As fichas variavam em função da pergunta

103
da pesquisa do ciclo e dos critérios e padrões de julgamento. A seguir à observação, orientava
sessões de conversas críticas nas quais cada co-investigador partilhava as suas evidências,
constatações e reflexões apontadas nositens da ficha de observação e reflexão de aulas.
Na EPC de Controle de Mikhokhweni as minhas actividades continuavam sendo as de
observação etnográfica de duas aulas semanais e de registo das notas de observação de campo.

4.2.3.1.2 Ciclos de observação e de análise e/ou reflexão

No âmbito deste ciclo, observei com os co-investigadores um total de 9 aulas paralelas, 3 por
cada EPC de pesquisa que abordavam sobre o conteúdo “Principais partes do olho; Funções das
partes do olho; Cuidados a ter com o olho” leccionadas em L2. A partir das evidências
observadas sobre o problema da pesquisa organizei sessões de conversas críticas com os grupos
de co-investigadores das duas EPC´s de Acção Inovadora para analisar criticamente a ocorrência
das evidências do problema da pesquisa nas aulas observadas. Em todas as 3 EPC´s de pesquisa
manifestava evidentemente o problema desta pesquisa.
Nos ciclos subsequentes, o meu objectivo restringia-se à planificação gradual de ciclos de
aulasinovadoras que me possibilitassem colher evidências sobre como as práticas de
translanguaging e de collateral learning e cross-cultural border, validando os resultados preliminares das
experiências da I fase contribuiriam para a solução efectiva do problema da pesquisa.

104
4.3 Colecta de dados

As evidências desta pesquisa resultaram dos métodos de colecta de dados qualitativos usados na
pesquisa-acção participativa, nomeadamente: observação etnográfica (notas de campo e fichas
de observação e reflexão de aulas); conversas críticas; entrevistas grupais não-estruturadas;
gravação áudio-visual e diários de pesquisa.

4.3.1 Observação

Em todas as fases da pesquisa apliquei permanentemente a técnica de observação etnográfica


como sendo a que melhor me permitia constatar o problema e evidenciar os avanços da pesquisa.
Durante a pesquisa criei 3 categorias de observação, a saber:

a) Observação do problema da pesquisa - na pré-fase da pesquisa de campo efectuei a


observação não-participativa de 14 aulas de classes antes e pós-transição em 6 EPC´s de
educação bilingue com o objectivo de averiguar, evidenciar e validar o problema da
pesquisa. No início da II fase da pesquisa de campo planifiquei sessões de observação
não-participativa de 9 aulas sobre o conteúdo “Principais partes do olho; Funções das
partes do olho; Cuidados a ter com o olho” leccionadas em L2 em 3 EPC´s de pesquisa
com o objectivo de evidenciar as atitudes linguísticas dos alunos nas primeiras aulas nas
quais aprendem em L2;
b) Observação e reflexão de aulas - em ambas as fases da pesquisa realizei várias sessões de
observação de aulas, a destacar: observação participativa de 33 aulas planificadas e
leccionadas nas EPC´s de Acção Inovadora (14 aulas na I fase e 19 aulas na II fase) e
observação não-participativa de 19 aulas na EPC de Controle (6 aulas na I fase e 13 aulas
na II fase).

A observação possibilitou-me evidenciar e reflectir sobre os resultados que a pesquisa gerava de


ciclo em ciclo e com esta, desenvolvíamos e planificávamos novas acções nos ciclos subsquentes
da pesquisa.

105
4.3.1.1 Notas de campos

Em todas as sessões de observação de aulas e nas de análise e reflexão, explorava a técnica de


registo das notas de campo. Com base nesta técnica, registei vários cenários observados bem
como as reflexões suscitadas ao longo da observação e em todo o decurso da pesquisa.

4.3.1.2 Diários de pesquisa

A pesquisa-acção participativa requer uma constante acção, observação e reflexão dos co-
investigadores por forma a solucionar os problemas para os quais realizámos os ciclos de pesquisa
(Stringer 2007). Ao longo da pesquisa incentivei a reflexão dos co-investigadores das EPC´s de
Acção Inovadora sobre as acções que íamos desenvolvendo de ciclo em ciclo e de aula em aula.
Na I fase e II fase adoptei os diários de aulas para registar reflexivamente as minhas observações,
evidências, resultados e reflexões sobre as aulas das EPC´s de pesquisa. Nos diários das EPC´s
de Acção Inovadora incluia as reflexões discutidas nas sessões de análise da aula e as ideias
acordadas para a planificação dos próximos ciclos de aula. Na I Fase, partilhava, semanalmente,
os meus diários de aulas com todos os co-investigadores das EPC´s de Acção Inovadora para que
avaliassem o registo dos aspectos relevantes do ciclo, apresentassem as suas reflexões e
contribuições e os validassem como evidências verídicas do ciclo de aula. Ao longo da II fase
optei por não partilhar os meus diários de aula com os co-investigadores e potenciei o uso das
fichas de observação e reflexão de aulas e as respectivas sessões de análise e reflexão.

4.3.1.3 Fichas de observação e reflexão de aulas

Ao longo das sessões de planificação de aulas nas EPC´s de Acção Inovadora definia o objectivo
do ciclo e os critérios e padrões de julgamento a partir dos quais observaríamos os resultados da
aula. Com estes contributos, elaborava a pergunta da pesquisa e os pontos a observar a partir do
objectivo, critério e padrão de julgamentos acordados pelo grupo. No decurso das sessões de
observação de aulas, os co-investigadores registavam as suas observações sobre os pontos da ficha
de observação e reflexão da aula.

106
4.3.2 Conversas críticas

Nesta pesquisa-acção participativa criei sessões de interacção entre os co-investigadores em


diferentes momentos da pesquisa. A interacção transformou-se numa técnica que me permitiu
abordar diversos temas relacionados com a pesquisa. Nas EPC´s de Acção Inovadora
planificávamos, observávamos e desenvolvíamos sessões de análise e discussão sobre os resultados
constatados nas aulas de cada ciclo. Para estas actividades, recorríamos às conversas críticas.
Todos os ciclos iniciavam com as sessões de planificação e terminavam com as de análise que
eram implementadas através de técnicas de conversas críticas. As conversas críticas permitiam-
nos discutir criticamente sobre os aspectos observados na pesquisa e destas, decidíamos por
unanimidade novas decisões e acções pedagógicas a seguir. Noutras sessões, partilhava junto aos
co-investigadores das EPC´s de Acção Inovadora, um relatório descritivo e comparativo sobre
os resultados observados nas das 3 EPC´s da pesquisa e referentes a um único ciclo de aulas
sobre o mesmo conteúdo. Por sua vez, os co-investigadores, recorriam às conversas críticas para
expor as suas reflexões, percepções, críticas, sugestões e constatações inseridas na aprendizagem
crítica e colaborativa, elevando a qualidade da pesquisa. Juntos discutíamos sobre a qualidade
dos resultados que alcançávamos a partir de perspectivas de cada co-investigador do grupo e
decidíamos sobre as estratégias a desenvolver no ciclo seguinte.

4.3.3 Gravação áudio-visual

Ao longo da pesquisa (I fase e II fase) usei a técnica de registo áudio-visual (vídeos, áudios e
fotografias) nas sessões de leccionação, observação e análise de aulas. A posterior, explorei-a nas
sessões de crítica e validação da pesquisa e nas de entrevistas não-estruturadas. Em termos
numéricos, registei 52 áudios e vídeos de aulas nas 3 EPC´s de pesquisa (20 na I fase e 32 na II
fase), 23 áudios de sessões de análise de ciclos de aulas, 5 sessões de entrevistas em grupos não-
estruturadas realizadas na II fase da pesquisa (3 dirigidas aos professores das EPC´s de Acção
Inovadora e 2 orientadas aos alunos respectivos alunos). Este registo constitui uma base de dados
que sistematizarei e analisarei nas fases subsequentes desta pesquisa.

107
4.3.4 Entrevistas grupais não-estruturadas

As entrevistas não-estruturadas fi-las aos professores no decurso das três fases da pesquisa, a
destacar:

a) Pré-fase - pesquisa da evidência e de validação do problema: entrevistei 6 grupos de


professores das 6 EPC´s de educação bilingue com o objectivo de validar o problema da
pesquisa;
b) I fase - pesquisa preliminar: entrevistei 2 grupos de professores co-investigadores das 2
EPC´s de Acção Inovadora com o objectivo de avaliar os resultados alcançados na I fase
por forma a reflectirmos sobre a planificação da II fase;
c) II fase - pesquisa de validação: entrevistei aos professores co-investigadores das 4 EPC´s
de pesquisa (2 de EPC´s de Crítica e Validação, 1 de EPC de Controle e 2 de EPC´s de
Acção Inovadora) para avaliar a validade e viabilidade pedagógica da proposta em
pesquisa para o ensino-aprendizagem nas classes de pós-transição (4ª e 5ª).

4.4 Análise de dados

A análise de dados no contexto da pesquisa-acção participativa propõe a sistematização de


quantidade de informações contidas nos dados com o objectivo de descobrir elementos de
significados neles incorporados (Stringer 2007, Creswell 2009). A análise e a interpretação são
dois procedimentos inter-relacionados e que ambos permitem estudar os dados colectados. De
acordo com McNiff & Whitehead (2010), a análise permite olhar sobre os dados, identificar e
descrever os padrões que se destacam dentro da categoria de análise enquanto a interpretação
procura apurar os significados dos padrões identificados dentro do critério e padrão de
julgamento. Sagor (2000, 2005) concebe que a análise de dados permite-nos compreender em
profundidade os infinitos fenómenos variáveis independentes que influenciam na mudança de
variáveis dependentes.

108
4.4.1 Sistematização e codificação dos dados

Os dados que colectei nesta pesquisa transcrevi-os e submeti ao processo de sistematização e


codificação que consistiu na filtração, na catalogação e na identificação das evidências
relacionadas com o problema e os objectivos da pesquisa e que garantissem a validade e a
credibilidade da análise e da interpretação dos resultados da pesquisa (Sagor 1993). A
sistematização e a codificação dos dados foi possível mediante a definição de critérios e padrões
de julgamento que me permitiram identificar os dados que apresentavam padrões significativos
(Stringer 2007). Neste processo os dados identificados com base nos critérios e padrões de
julgamento transformei-os em evidências da pesquisa que a posterior, analisei e interpretei nesta
pesquisa (McNiff & Whitehead 2010).

4.4.2 Triangulação de dados

A triangulação de diferentes dados permitiu uma análise holística sobre a pesquisa e garantir a
precisão da validade (Jick 1979, McTaggart 1997, Sagor 2000). Segundo Denzin (1978), a
triangulação é o uso de múltiplos métodos no estudo do mesmo fenómeno. Os dados, os
investidagores, as teorias e as metodologias são trianguláveis para aprimorar a validade dos
resultados da pesquisa (Denzin 1978). A triangulação de dados visa melhorar a precisão do
julgamento (Jick 1979) e é aplicável na pesquisa-acção (McTaggart 1997, Sagor 2000).
Entretanto, os dados colectados sistematizámo-los para fins de análise, interpretação através da
triangulação e dum único critério padrão de julgamento baseado nos valores e nas evidências
(McNiff & Whitehead 2010).
Nesta pesquisa concebi uma estratégia de triangulação dos dados a 3 níveis:

a) Triangulação entre os dados das EPC´s de Acção Inovadora (Ruwani e Citimela) e os da


EPC de Controle Mikhokhweni;
b) Triangulação entre dos dados das EPC´s de Acção Inovadora (Ruwani e Citimela), EPC
de Controle (Mikhokhweni) e os dados das EPC´s de Crítica e Validação;
c) Triangulação entre os dados da validação interna e externa colhidos na II fase da
pesquisa (entrevistas aos co-investigadores, professores das 4 EPC´s abrangidas pela

109
pesquisa e as respectivas fichas de avaliação crítica das aulas submetidas à crítiva e
validação).

Com base nesta estratégia analisei tridimensionalmente os dados gerados pela pesquisa com
recurso aos critérios e padrões de julgamento e às evidências (Creswell & Miller 2000) observadas
em múltiplas “janelas” (Sagor 2000) sem perder de vista a coerência, consistência e a validade
(McTaggart 1997). A triangulação nos moldes que acima propus proporcionou valor e validade
à pesquisa pois ofereceu-me visões trianguladas de compreensão dos fenómenos da pesquisa
(Stringer 2007) e proporcionou-me evidências de validade e credibilidade da pesquisa (Tomal
2010, Sagor 2005).

4.4.3 Processo de validação da pesquisa

A pesquisa-acção gera um novo conhecimento através das acções práticas desenvolvidas na


melhoria de um problema. Este deve ser validado através de critérios, padrões de julgamento e
de processos de legitimação para que seja um contributo válido à nova teoria baseada na prática
e não numa opinião (McNiff & Whitehead 2002, 2006, 2010). A afirmação do novo
conhecimento gerado pela pesquisa-acção deve conter evidências autênticas avaliadas,
criticadas, aprovadas e legitimadas por outras pessoas dentro dos critérios e padrões de
julgamento definidos (Whitehead & McNiff 2006). A validação é o estabelecimento dos valores
da verdade e da autenticidade da afirmação do novo conhecimento criado. Este consegue-se com
base na submissão do novo conhecimento e das respectivas evidências à apreciação das pessoas
nos critérios e padrões de julgamento da pesquisa (McNiff & Whitehead 2006). Nas sessões de
validação nas quais há uma reflexão crítica sobre a qualidade, vêem-se os pontos débeis e
sugerem-se modificações, apostam-se novas ideias, avalia-se a qualidade dos dados e das
evidências para impulsionar a qualidade e a validade da pesquisa (McNiff & Whitehead 2002).
Nesta pesquisa-acção concebi dois níveis de processos de validação com vista a confrontar os
resultados: validação interna (com grupo de professores co-investigadores das EPC´s de Acção
Inovadora) e validação externa (com grupo de professores das EPC´s de Crítica e Validação).

110
O processo de validação interna decorria de forma contínua e no fim da pesquisa. No término
de cada conteúdo planificado e leccionado em diferentes ciclos recorria à triangulação dos
resultados das aulas paralelas leccionadas e observadas nas 3 EPC´s de pesquisa (EPC´s de Acção
Inovadora e EPC de Controle) e organizava encontros bi-semanais com os co-investigadores das
EPC´s de Acção Inovadora para expor os avanços, os resultados preliminares alcançados bem
como apreciar as evidências de novos conhecimentos constatados dentro dos critérios e padrões
de julgamento definidos em cada ciclo de aula.
Nas fases finais da pesquisa, compilei parte dos resultados (transcrições e vídeos) das aulas iniciais,
intermédias e finais, defini os critérios e padrões de julgamento final e pedagógico da pesquisa, a
destacar: viabilidade, relevância, validade e funcionalidade dos resultados da pesquisa e propus
à validação interna final e à validação externa com vista a receber e confrontar o feedback crítico
a dois níveis de processos (validação por parte do grupo dos professores co-investigadores das
EPC´s de Acção Inovadora Ruwani e Citimela e a validação por parte do grupo de professores
das EPCs de Crítica e Validação Wulombe e Mikhokhweni). No acto da validação externa,
partilhei com os professores os extractos de resultados das aulas compiladas e transcritas, Fichas
de Avaliação Crítica dos Resultados Alcançados nas quais apresentaram avaliações sobre a
interacção e a participação dos alunos, facilitação do ensino-aprendizagem e reflexões críticas
sobre a pesquisa. A seguir, projectei os vídeos correspondentes às aulas compiladas para que os
professores pudessem observar o cenário de sala aula e do ensino-aprendizagem nos ciclos de
aulas iniciais, intermédias e finais e por fim, desenvolvemos conversas críticas e administrei uma
entrevista em grupo não-estruturada.

4.5 Aspectos éticos

Em todas as três fases da pesquisa (pré-fase, I fase e II fase) apliquei os termos de consentimento
ético tanto sob forma oral como sob forma escrita. Na pré-fase da pesquisa de campo solicitei a
permissão do corpo directivo das 6 EPC´s e aos respectivos professoes para observar algumas
aulas e realizar entrevistas grupais não-estruturadas, garantindo que iria usar apenas o bloco de
notas e preservar as identidades dos professores e das respectivas EPC´s com recurso aos
pseudónimos. Consensualmente, tanto o corpo directivo das EPC´s como os professores

111
concordaram com os termos de consentimento proposto e permitarm-me a observar as aulas e a
efectuar as entrevistas. Nestas actividades, não usei nenhum instrumento de registo áudio-visual
senão o bloco de notas uma vez que, o meu objectivo cingia-se apenas em confrontar e validar o
problema da pesquisa.
Nas restantes duas fases, partilhei as fichas de consentimento ético a todos os professores que co-
participaram da pesquisa. Após a sessão de leitura, esclarecimento e revisão, os professores
assinaram-nas. Relativamente à participação dos alunos na pesquisa, na I fase recebi a aprovação
do corpo directivo das EPC´s e dos professores para realizar a pesquisa, salvaguardando os
aspectos éticos segundo constava do termo assinada pelos professores. Na II fase os alunos
participaram na pesquisa nos moldes da I fase, mas desta vez com o consentimento dos pais
convocados na reunião de abertura do ano lectivo.

4.6 Limitações da pesquisa

Nesta pesquisa deparei-me com algumas limitações que de alguma forma não as consegui
contornar. Na plano desta pesquisa previa o envolvimento activo das comunidades das EPC´s
de Acção Inovadora de Ruwani e de Citimela tanto na pesquisa e sistematização dos fundos de
conhecimentos socioculturais locais em cada conteúdo do programa de Ciências Naturais, como
na leccionação das aulas (exposição dos fundos de conhecimentos socioculturais locais nas L1´s).
Contrariamente a minha perspectiva, as comunidades locais predispuseram-se a participar da
pesquisa, mas não compareceram nas reuniões agendadas por razões não justificadas. Diante
deste impasse, os eu e os co-investigadores das duas EPC´s de Acção Inovadora decidimos
potenciar as sessões de planificação das aulas através da sistematização e a incorporação
pedagógica de alguns fundos de conhecimentos socioculturais que estivessem ao alcance de cada
co-investigador a partir do tema da aula. Nestes termos, a pesquisa não integrou na íntegra a
diversidade de fundos de conhecimentos conhecidas pelos diferentes membros da comunidade.
Os professores das EPC de Acção Inovadora não foram formados ou capacitados
antecipadamente sobre as práticas pedagógicas de translanguaging e as de collateral learning e cross-
cultural border a fim de implementá-las nas aulas, mas sim sessões de explicação detalhada sobre
das teorias de translanguaging, collateral learning e cross-cultural border. Assim, os professores

112
desenvolviam as práticas inovadoras guiando-se com o plano de aula planificado em conjunto.
Portanto, as práticas de sala de aulas foram desenvolvidas de acordo com percepções, esforços e
estilos de ensinar de cada professor/a.
As práticas pedagógicas desenvolvidas nos ciclos de aulas geraram resultados qualitativos
descritos nesta tese e que induziram às conclusões finais desta pesquisa. Certamente que, os
resultados e as conclusões desta pesquisa não são suficientemente finais. Espero que outras
pesquisas desenvolvam outros passos na pesquisa dos problemas de participação e de interacção
dos alunos e a viabilidade das práticas de translanguaging e de collateral learning e cross-cultural border,
recorrendo a outros métodos qualitativos e ou quantitativos.

113
SEGUNDA PARTE. Resultados da
Investigação
CAPÍTULO 5. Iniciação às práticas de translanguaging e seu impacto na
participação e interacção na aula

Introdução

Nesta segunda parte da tese apresento 4 capítulos (5, 6, 7 e 8) de evidências e resultados da pesquisa
que observei ao longo das duas fases do decurso da pesquisa-acção participativa. No capítulo 5
referente à I fase da pesquisa abordarei as práticas linguísticas e pedagógicas desenvolvidas em L2
e os resultados das experiências iniciais de práticas de translanguaging nas aulas. Nesta descrição
efectuarei uma análise comparativa entre as principais evidências que observei nas turmas das
EPC´s de Acção Inovadora (TAI) e as que evidenciei na turma da EPC de Controle (TC) durante
a I fase da pesquisa e algumas evidências referentes às etapas iniciais da II fase da pesquisa.

5.1 Práticas linguísticas e pedagógicas em L2

Nesta secção apresento as evidências de sala de aula relacionadas com o uso da L2 como meio de
instrução e os resultados que advêm de tais práticas linguísticas e pedagógicas no que concernente
à participação e à interacção dos alunos, a flexibilidade e o dinamismo do respectivo ensino-
aprendizagem. Com estas evidências, pretendo mostrar antecipadamente as características de
participação e de interacção dos alunos na aula e os níveis flexibilidade e do dinamismo do ensino-
aprendizagem que observei na TC (Turma de EPC de Controle) e nas TAI´s (Turmas das EPC´s
DE Acção Inovadora) tanto no decurso na I fase da pesquisa como nos ciclos de aulas iniciais da
II fase.

5.1.1 Persistência linguística e pedagógica do professor e as estratégias de


participação e interacção dos alunos

O cenário de sala de aula é caracterizado linguisticamente por um ensino baseado em L2, o único
meio de instrução na 4ª classe em Moçambique. Os níveis de interacção e de participação dos
alunos na aula são extremamente baixos, o ensino-aprendizagem regista uma inflexibilidade e um
dinamismo lento, monótono e estático. As atitudes e os comportamentos linguísticos dos alunos
são caracterizados por baixos níveis de interacção na aula. Os alunos não respondem livre, aberta

117
e flexivelmente às perguntas de interacção IRF (Initiation – Response – Feedback) efectuadas pelos
professores em L2 senão com base nas respostas passivas e fechadas “sim/não”, murmúrio, voz
baixa e repetição em coro e em casos mais extremos com o silêncio. Nestes moldes, as aulas são,
consequentemente, inflexíveis e demoradas uma vez que os alunos gastam muito tempo para
responder em L2 a cada pergunta formulada pelos professoresu. O extracto 1 ilustra cenas de sala
de aulas linguística e pedagogicamente insatisfatórias para um óptimo ambiente de ensino-
aprendizagem dos alunos.

Extracto 1: Ruw.DC1.1901173
1. Prof4. o olho tem quantas partes?
2. Tur5. ((silêncio))
3. Prof. hum:: tem quantas partes?
4. Tur . ((silêncio)) os alunos baixam as caras sobre o livro))
5. Prof. hum:: tem quantas partes? não estão ver a nesse livro ai, tem quantas partes? tem? tem?
6. Alu.61 ((em voz baixa)) °seis°
7. Prof. tem seis partes principais. quais são?
8. Tur. ((permaneceu com o livro aberto mas nenhum alu. voluntariou-se))
9. Prof. quais são as partes do olho?
10. Tur . ((silêncio longo))
11. Prof. ((desenhou o olho e as respectivas partes no quadro))
12. Prof. as principais partes do olho são (0.4). quais são? hum::
13. Tur. ((silêncio))
14. Prof. vamos lá falar em voz alta. estou a ouvir si:::(3x) não sabem ler. não sabem. he::: hu::: Tiyafu7 quais são?
não estão a ver? temos sobrancelha (0.4) não é? hu::: é ou não é?
15. Tur. ((hesitante)) é
16. Prof. o quê mais?
17. Tur. ((alguns alu.s em voz baixa)) °pestana°
18. Prof. VAMOS FALAR EM VOZ ALTA
19. Tur. PESTANA
20. Prof. pestana muito bem ((regista na figura do olho desenhado no quadro)). o quê mais?
21. Tur. ((leu com hesitação e em coro não audível)) “popila”
22. Prof. he:::?
23. Tur. pupila
24. Prof. o quê mais? he:

Anteriormente a este extracto, os alunos tinham os livros abertos. Em resposta à pergunta do


professor “o que é que estão a ver aí em baixo”, alguns alunos responderam em coro “olho”. A

3 Este código é referente ao extracto da aula ocorrida na TAI de Ruwani (código Ruw.), do Diário de Campo n°1

(código DC1) do dia 19 de Janeiro de 2017 (código 190117).


4 Prof. é abreviatura de “Professor”.
5 Tur. é abreviatura de “Turma”.
6 Alu. abrevia a palavra aluno ou aluna.
7 Todos os nomes próprios que constam desta tese são pseudónimos.

118
seguir, referiram a sua função, “para ver”, e uma aluna indicada pelo professor disse o que era
possível ver com o olho “para ver coisas”. Depois desta introdução, na qual os alunos participaram
em coro não foram capazes de ler os nomes das partes do olho na legenda mesmo com a
persistência do professor (3, 5). Somente a alu.1 foi capaz de contar as partes do olho e de responder
“seis” em (6). Noutra pergunta, “quais são essas partes do olho” (9), os alunos eram solicitados a
nomeá-las lendo na figura legendada. Os alunos, mais uma vez, não mencionaram nenhuma parte
do olho, não obstante terem o livro aberto (13). Após tanta insistência e a pergunta “não sabem
ler, não sabem, he:: hu::: (…)?” os alunos não liam as partes da legenda. Diante disto, o professor
leu, “sobrancelha” (14) e a seguir alguns alunos leram em voz baixa “pestana” (17), e depois em
coro audível e com hesitação “popila” (21). A leitura das partes do olho só foi possível mediante a
insistência do professor e mesmo assim os alunos eram tímidos e usavam a voz baixa, insegura e
hesitantes. No seguimento da aula, o professor orientou a leitura em coro professor - alunos das
partes do olho legendadas no quadro pelo facto dos alunos terem murmurado para as mencionar.
Mesmo após a leitura em coro, os alunos não foram capazes de mencionar as partes do olho
voluntariamente e em L2. Diante deste fenómeno, o professor recorreu à solicitação obrigatória
de alunos que forçosamente deviam mencioná-las. A única aluna solicitada pelo professor para
dizer as partes do olho, levantou-se envergonhada, tapou a cara com as duas mãos e leu-as em voz
baixa e com as mãos, tapando a boca, o nariz e o queixo. À solicitação de voluntários, os alunos
demonstravam interesse em participar mas a L2 não lhes permitia participar livre e abertamente
na aula. Uma das evidências que me ressaltou à vista foi a dificuldade que os alunos demonstraram
para ler a legenda do olho. Não houve nenhum aluno que tivesse lido correctamente os nomes das
partes do olho sem a correcção e apoio do professor, sobretudo nas palavras “esclerótica com
córnea, sobrancelha” e na palavra acentuada “íris”.
Relativamente à problemática da L2, evidenciei uma cena de sala de aulas na qual os alunos não
conseguiam mencionar as cores que teriam visto no olho do colega após experiência de observação
olho a olho. Os alunos não responderam a nenhuma insistência e persistência do professor senão
com o silêncio conforme ilustra o extracto 2.

Extracto 2: Citi.DC1.260117
1. Prof. vocês já viram olho?
2. Alu.1 ((em voz tímida e baixa))°sim°
3. Prof. ((vamos lá olhar dois a dois)) (...) cada menino deve olhar os olhos do seu amigo (...) depois eu vou fazer
perguntas ne:::?
4. Tur. ((aos pares, os alu.s observavam-se nos olhos))

119
5. Prof. viram?
6. Tur. ((silêncio))
7. Prof. ok. muito bem (2x). quem pode me dizer o que viu no olho do seu amigo (...) (2x). quais são as cores que
lá existem?
8. Tur. ((silêncio))
9. Prof. o que viu, o que tem? quem pode dizer? voluntários (2x)?
10. Tur. ((silêncio))
11. Prof. hi::: não viram nada (2x). he::: não viram nada? (...)
12. Tur. ((silêncio))
13. Prof. de verdade (3x)?
14. Tur. ((quieta))
15. Prof. nenhum alu. quer dizer o que viu no olho do seu amigo.
16. Prof. ((com a figura na mão e dirigindo-se ao quadro)) eu olhei para o olho de alguém
17. Tur. ((vendo a figura, os alu.s8 reagiram admirados e surpresos)) ye:::
18. Prof. ((cola a figura no quadro e comenta)) está assim o olho que eu vi
19. Tur. ((os alu. fixaram os olhos atentamente à figura sem dizer nenhuma palavra)

Ainda que os alunos tivessem observado algo nos olhos dos colegas, chamou-me atenção o silêncio
total dos alunos a diversas persistências do professor nos registos (7, 9, 11, 13 e 15). Os alunos
mostravam-se inseguros, tímidos e silenciosos sem reportar o que teriam visto no olho do colega
(8, 10, 12 e 14). A prior, a causa deste fenómeno justificava-se pelo uso ininterrupto da L2 pelo
professor sem oportunidades de persistência em L1, uma vez que na mesma aula constatei
evidências de participação e interacção voluntária de alunos e um nível acelerado de flexibilidade
da aula aquando da recapitulação em L1 de “siru sa kuengisa” (órgãos de sentido) aprendidos em
L1 na classe anterior. Neste pequeno exercício, os alunos teriam visto algo nos olhos dos colegas
mas a L2 não os liberava para expor as suas ideias senão em L1 que foi oportunamente usada.
De facto, os alunos mostram-se dispostos a participar e interagir em L1 na aula, mas só o fazem
sempre que os professores usam oportunamente a L1 na aula. Concluindo, os alunos participam
da aula com estratégias de participação e interacção passiva (coro, voz baixa, inaudível e tímida;
murmúrio, silêncio, repetição, respostas fechadas “sim/não”). Não evidenciei nenhum discurso
aberto em L2 a não ser por via de uma ou duas palavras consequentemente, as aulas centraam-se
na figura do professor que expõe incansavelmente em L2, reformula as perguntas mas mesmo
assim os alunos mantêm-se em silêncio e murmuram. A L2 transforma as aulas em momentos de
desmotivação, segundo transparecia o clima psico-emocional e físico dos alunos. Por esta razão,
não colaboram activamente na construção da aprendizagem. As suas estratégias de participação e
interacção passiva não são suficientes para a compreensão colaborativa e activa dos conteúdos.

8 alunos.

120
5.1.2.1 Murmúrio e o silêncio

Dentre as estratégias de participação e interacção passiva, o murmúrio e o silêncio eram as que


mais se notabilizam na inviabilização da flexibilidade e dodinamismo do ensino-aprendizagem.
Perante estes fenómenos, os professores eram obrigados a recorrer a outras estratégias espontâneas
e não planificadas para garantir a participação e a interacção dos alunos bem como o progresso
da aula, mas mesmo assim, os alunos não participavam. A aula estagnava-se completamente. Os
professores recorriam à persistência e à reformulação das perguntas com vista a relançar o decurso
da aula e a participação dos alunos, contudo alguns alunos passavam do silêncio para o murmúrio
incompreensível, segundo mostra o extracto 3.

Extracto 3: Mikho.DC8.080317
1. Prof. isto aqui, o que é isto aqui (2x)?
2. Tur. ((alguns alu.s)) ovo (2x)
3. Prof. ovo. é alimento ou não é alimento?
4. Tur. é alimento
5. Prof. é alimento. metemos aonde isto aqui, no carril não é?
6. Tur. não
7. Prof. quando preparamos mathapa metemos lá o ovo não é?
8. Tur. não
9. Prof. metemos aonde?
10. Tur. ((murmúrio))
11. Prof. utiliziamos para fazermos o quê este alimento aqui?
12. Tur. ((murmúrio))
13. Prof. utilizamos para fazer o quê?
14. Tur . ((murmúrio))
15. Prof. não estou a ouvir
16. Tur. ((murmúrio))
17. Prof. para fazer o quê?
18. Tur. ((murmúrio))
19. Prof. então nunca comeramisto aqui? quem já comeu isto aqui?
20. Tur. ((os alu.s levantaram as mãos))
21. Prof. ((persisteu preocupada)) comem e aonde, no carril?
22. Tur. não
23. Prof. no arroz?
24. Tur. não
25. Prof. aonde?
26. Tur. ((murmúrio))
27. Alu.1 ((em voz baixa insegura e tímida))°no pão°
28. Prof.a onde?
29. Tur. ((repetiu disfarçadamente a resposta do alu.1)) no pão
30. Prof. aonde?
31. Tur. NO PÃO

121
Em (1) a professora perguntou “o que é isto aqui” e apenas alguns alunos responderam em coro
baixo “ovo” (2). Novamente, a professora insistiu pela segunda vez por ter constatado que alguns
alunos responderam-lhe inseguros e em voz baixa (3). A insistência da pergunta visava forçar a
resposta segura de todos em coro e em voz alta. Em continuação, a professora em (5) solicitou
alunos voluntários para que dissessem como se prepara e se come o ovo contudo, os alunos não se
atreveram a responder mesmo após a insistência e a reformulação da pergunta realizada pela
professora nos registos (9, 11, 13, 15, 17, 21, 25 e 28). Os alunos murmuraram em coro em 6
ocasiões (10, 12, 14, 16, 18 e 26) nas quaisa professora insistia os alunos para os pôr a participar e
a interagir na aula, respondendo às várias perguntas e respectivas reformulações. A aula registou
alguma inflexibilidade e gastou-se muito tempo para responder à mesma pergunta, reformulada
diversas vezes. Após 8 persistências e insistências da professora, apareceu, no registo (27), a
primeira aluna voluntária que respondeu acertadamente à pergunta mas em voz baixa, insegura e
tímida “no pão”. A resposta não foi audível, e por isso, a professora, mais uma vez, persistiu
“aonde?” (28). A turma ouviu a resposta da alu.27, apropriou-a e respondeu em coro baixo e
inseguro (29) e depois em coro audível e alto “no pão” (31) após insistência da professora em (30).
No extracto 3 ilustrei os níveis de interacção e de participação dos alunos na aula leccionada em
L2. A professora recorreu à persistência e à insistência como estratégias que esforçam os alunos
não apenas a interagir como também a participar coercivamente na aula. O murmúrio dos alunos
era, em muitos casos, incompreensível dado que era emitido com medo e insegurança e apenas
para responder à persistência e ou insistência dos professores. Neste tipo de situações surgiam
alguns alunos e/ou voluntários que de forma corajosa apresentavam as suas respostas, mas sempre
em voz baixa, discreta e tímida. Quando o/a professor/a insistia pela segunda vez, a turma passava
do murmúrio para a verbalização colectiva, repetindo a resposta do aluno em voz baixa e ou voz
alta.
Em outras situações, os alunos pautavam pelo silêncio, não respondem às perguntas sob insistência
e persistência dos professores. O silêncio dos alunos tinha três possíveis motivos. Às vezes ocorria
quando os alunos não tinham nenhuma ideia ou proposta de resposta às perguntas formuladas,
noutras vezes manifesta-se quando os alunos estavam a reflectir ou pensar sobre as respostas e
quando não tinham competência discursiva para expressar a resposta em L2. O extracto 4 mostra,
mais uma vez, um cenário de silêncio mais complexo e que após várias insistências insatisfatórias,

122
a professora decidiu “não queimar mais tempo”, passando para outras perguntas que
possivelmente incentivariam a participação dos alunos e dinamizariam o progresso da aula.

Extracto 4: Mikho.DC6.141016
1. Prof.a há quem pode nos le:::mbrar (0.4), aquilo que vi:::mos (0.3) na aula (2x) na aula passada (0.4) ou
antepassada só para termos um pouco de noção
2. Tur. ((os alu.s falam entre si e não prestam atenção))
3. Prof.a he::: há alguém que faz ideia? (0.4) daquilo que nós vimos na aula passada, no último tema. o que é
que vimos?
4. Tur. ((silêncio))
5. Prof.a he:::?
6. Tur. ((silêncio))
7. Prof.a portanto, para não queimarmos muito tempo eee nós aqui falamos (2s) dos três tipos de quê –?
8. Tur. ((silêncio))
9. Prof.a ((induz a terminação)) dos estados físicos das –
10. Tur. ((não completa))
11. Prof.a ((completa sozinha)) da água, não é isso ai?
12. Tur. ((silêncio))
13. Prof.a quais são esses eee os três estados fisicos da água?
14. Tur. ((alguns alu.s murmuraram))
15. Prof.a primeiro temos o estado –
16. Tur. ((alguns alu.sinseguros e em voz baixa)) °líquido°
17. Prof.a ((insiste)) estado?
18. Tur. ((em voz mais segura e alta)) LÍQUIDO
19. Prof.a estado líquido e depois? i::: ihi:::?
20. Alu.1 sólido
21. Prof.a estado?
22. Tur. ((alguns alu.s em coro)) sólido
23. Prof.a estado sólido

A aula iniciou com a solicitação de voluntários para recapitular a aula anterior, segundo ilustra o
registo (1). A turma não se manifestou. A professora insistiu e persistiu em 2 ocasiões (3, 5) com
duas perguntas que são na realidade, oportunidades para a participação dos alunos na aula,
referindo simplesmente o que teriam aprendido na aula anterior. Os alunos não reagiram (2, 4). A
professora preocupada em conseguir a iniciação da aula através da participação dos alunos
continuou a insistir e a persistir, mas desta vez recorrendo a uma nova estratégia diferente de
perguntas que exigissem respostas mais elaboradas em L2. Em (7, 9), a professora recorreu à
estratégia de iniciação das frases respostas sobre o tema da aula anterior cujas terminações seriam
providenciadas pela turma em coro ou individualmente, no entanto a turma registou o silêncio (8,
10) obrigando-a a completar sozinha em (9, 11). A partir desta estratégia usada para anunciar o
tema da aula anterior “estados físicos” (9) e “estados físicos da água” (13), alguns alunos murmuram
em (14) na tentativa de mencionar os estados físicos da água e após a nova persistência da

123
professora, alguns alunos apontaram “líquido” em voz baixa e insegura (16), e depois em voz mais
alta, em (18). A seguir, o alu.1 mencionou mais um estado da água “sólido”, em (20), e a turma
repetiu em (22).
O murmúrio tem sido um indicador de que existem no seio dos alunos, alguns que têm algo por
expor, mas que lhes falta a coragem para responder abertamente em L2. Nesta ordem de análise,
a persistência da professora gerou a primeira participação aberta de alguns alunos em (16). Desde
esta parte, a professora vê a compensação da sua persistência e insistência contra o silêncio dos
alunos. As respostas que se seguiram ilustravam a repetição em coro da resposta apresentada por
alguns alunos em voz baixa e insegura. Tratando-se de recapitulação de uma aula anterior era
suposto que, no mínimo, alguns alunos fossem mais interactivos e participativos, respondendo
activamente as perguntas e ou completando às frases anunciadas pela professora.
Os desafios pedagógicos que os professores enfrentam no ensino em L2, segundo a análise às
evidências desta pesquisa são o silêncio persistente e o murmúrio colectivo dos alunos. Estes dois
desafios têm-os obrigado a recorrer às estratégias de persistência e insistência linguística com tanto
esforço, muita paciência e esperança de garantir, no mínimo, a participação e a interacção dos
alunos e o progresso da aula.
Quando os alunos se mantêm em silêncio, alguns professores decidiam expor os conteúdos e outros
apelavam-nos para que usassem a L1, segundo ilustra o extracto 5.

Extracto 5: Mikho.DC9.100317

1. Prof. então na aula passada eu disse que temos 3 grupos de alimentos. alimentos que fazem o quê?
2. Tur. ((murmurou em voz baixa))
3. Prof. que fazem o quê?
4. Tur. ((alguns alu.s murmuraramincompreensivelmente))
5. Prof. que faz o quê?
6. Tur. ((alguns alu.s em coro baixo e tímido))°que nos faz crescer°
7. Prof. quem está a falar? uma pessoa
8. Tur. ((ficou quieta (0.5))
9. Prof. vamos falar, alimentos que fazem o quê?
10. Alu.1 ((respondeu de pé mas em voz baixa)) °crescer°
11. Prof. alimentos que fazem a pessoa crescer. outros alimentos? (0.4) já vimos aqueles que fazem a pessoa
crescer, sim outros?
12. Tur. ((ficou em silêncio e alguns alu.s baixaram as caras))
13. Prof. são esses só?
14. Tur. ((alguns alu.s murmuraram)) não
15. Prof. não é? (0.3) que fazem o quê mais? só temos alimentos que nós fazem crescer só?
16. Tur. ((silêncio))
17. Prof. para estudar precisa ter o quê?
18. Tur. ((silêncio (0.3))

124
19. Prof. ((persiste)) para estudar, trabalhar, correr, fazer exercício, brincar precisa ter o quê?
20. Tur. ((murmura em voz baixa))
21. Prof. precisa ter o quê?
22. Tur. ((alguns alu.s em coro baixo)) °energia°
23. Prof. não estou a perceber (0.3) precisa ter o quê?
24. Tur. ((ficou em silêncio e depois murmura))
25. Prof. ter xixi?
26. Tur. ((alguns alu.s riam discretamente))
27. Prof. ((desabafou furiosa sobre o silêncio dos alunos)) é que vocês, não conseguem, eu não sei se mahadhana
kota mingawula ku modhana (estão envergonhados conforme dizeram) mas é bom dizer nem que fala em citshwa
pode falar eu hei-de perceber, não está proibido de falar citshwa huku hilezvi zvimahaku zvohi, hi lezvi zvimahaku
zvohi (explicando que é isto que faz aquilo, o que faz isto é isto) o que eu quero é que vocês falem

O extracto acima não ilustra nenhum episódio em que os alunos respondiam prontamente e de
forma voluntária às perguntas formuladas pela professora com a excepção do murmúrio e do
silêncio. A aula não se desenvolvia. Os alunos retardavam a flexibilidade e o dinamismo da aula
Diante deste caso, a professora reclamou contra o silêncio dos alunos e a seguir advertiu-lhes para
que falassem em L1 (27) como recurso para superar o silêncio, o murmúrio, a vergonha, a
insegurança e o comodismo dos alunos nas aulas em L2. A professora reconheceu que, de facto,
os alunos não participavam nas aulas devido à sua baixa proficiência e competência linguística em
L2 a partir da qual, participariam nos eventos discursivos e interactivos de sala de aulas.

5.1.2.2 Coro e repetição

O coro e a repetição ocorriam como estratégias dominantes de participação e de interacção dos


alunos na aula. Ao longo da observação constatei quatro categorias de estratégias de repetição e
de coro, a destacar: coro e repetição por iniciativa dos alunos; coro e repetição em resposta às
persistências dos professores que forçavam a participação dos alunos sempre que se mantinham
em silêncio ou murmuram diante de perguntas em L2; respostas em coro iniciadas por um/a
aluno/a e/ou alguns aluno/as e repetidas por todos os alunos e por fim, coro e repetição
promovidos pelos professores com vista a exigir a participação de todos os alunos. O extracto 5
evidencia o coro e repetição promovido explicitamente pelo professor com vista a superar o silêncio
dos alunos e obrigá-los a participar passivamente.

Extracto 6: Ruw.DC2.270117
1. Prof. é esta parte da pestana que se fecha? estão a perceber?
2. Tur. ((silêncio))
3. Prof. a pálpebra, a pestana e a sobrencelha protegem o olho das poeiras. estão a perceber?
4. Tur. ((silêncio))

125
5. Prof. o que fazem as pestanas, as pálpebra e as sobrencelhas? (.) fazem o quê.
6. Tur. ((silêncio))
7. Prof. he::: fazem o quê? protegem o olho das poeiras. fazem o quê?
8. Tur. ((coro pouco audível)) (proteja o olho das) ((ruído))
9. Prof. protegem o olho das poeiras
10. Tur. ((coro)) protegem o olho das poeiras
11. Prof. as pálpebra e as sobrencelhas protegem o olho das poeiras (2x) ((induz a tur. a repetir em coro )
12. Tur. ((repetiu em coro)) as pálpebra e as sobrencelhas protegem o olho das poeiras (2x)
13. Prof. ((registou a frase no quadro e leu de novo)) as pestanas, as pálpebras e as sobrencelhas protegem o olho
das poeiras e do suor

Em (1) e (3) o professor explicava a função das pálpebras, pestanas e sobrancelhas, mas a turma
não respondia às perguntas de acompanhamento “estão a perceber” formuladas no fim de cada
explicação (2, 4) bem como não responderam em (6), à pergunta de avaliação da compreensão
formulada em (5). Esta situação motivou o professor, em (7), a perguntar, a reafirmar mais uma
vez, a função das três partes do olho “protegem o olho das poeiras” e novamente a perguntar outra
vez “fazem o quê?”. Em (8), os alunos iniciaram a resposta em coro mas não a completaram.
Diante desta situação, o professor estimulou forçosamente os alunos a participarem em coro
repetindo as funções das pestanas, pálpebras e sobrancelhas, em (10, 12), anunciadas pelo professor
em (9, 11).
No extracto 7, o coro e a repetição da turma surgiam seguindo respostas de alguns alunos que
respondiam individual e discretamente em voz baixa.

Extracto 7: Mikho.DC7.280916
1. Prof.a as plantas por exemplo para poder sobreviver depende de o quê?
2. Tur. ((silêncio))
3. Alu.1 pôr - ((desistiu))
4. Prof.a he:::? depende de o quê?
5. Alu.2 água
6. Prof.a quando os papás, as mamãs vão para machamba lançar sementes lá, aquelas plantas para poder
sobreviver depende do quê?
7. Tur. PÔR ÁGUA
8. Prof.a depende de água. água de quê?
9. Tur. ((murmurou e depois ouviu-se)) chuva
10. Prof.a água da -
11. Tur. ((alguns alu.s)) chuva
12. Prof.a água da -
13. Tur. ((alguns alu.s e Prof.a completaram simultaneamente)) [chuva

Os alunos registaram o silêncio em (2) à pergunta (1). O alu.1 aventurou-se a iniciar a resposta
dizendo “pôr” mas não a completou em (3). Na insistência da professora em (4) outra alu.2
completou em (5) a resposta iniciada pelo alu.1 adicionando a palavra “água”. Em (6) a professora

126
reformulou e enriqueceu a pergunta motivando a turma a juntar as duas palavras respondidas
pelos alu.1 e alu.2 e em coro interveio “pôr água” (7). Nos restantes registos a aula seguiu com
respostas em coro de toda a turma (9, 11, 13).
Os extractos 6 e 7 mostram os cenários de participação e interacção baseados no coro e repetição
nos quais os alunos posicionavam-se como reprodutores do que diziam os professores e alguns
colegas na aula. Não tem havido cenários de livre participação e interacção em L2 nos quais o
aluno dispensaria o coro e a repetição. A única resposta que se repete tem sido a única que se
aprova na aula. Em nenhum dos casos os alunos apresentavam outras propostas de respostas
contrárias ou opostas e ou complementares às anunciadas em coro. É nestes moldes que os alunos
aprendiam. Os alunos repetiam o coro com caras tristes, desmotivadas e tímidas nas aulas em L2.
Outros ainda repetiam porque os outros repetiam e mais, há outros alunos que não participavam
neste coro senão, balbuciando fingidamente os lábios e ou mantendo-se em silêncio.

5.1.1.2 Voluntários a dedos

A ausência de alunos que se voluntariam livremente para participar e interagir na aula em L2 tem
obrigado os professores a indicarem, forçosamente, alguns alunos para que possam participar na
aula. De entre eles, alguns intervêm em voz baixa, tímidos e cabisbaixa, e outros ainda ficam em
silêncio, envergonhados e tímidos.
O extracto 8 a seguir, mostra evidências numa actividade de recapitulação da aula anterior na
qual os alunosintervêm com muitas dificuldades de expressividade em L2. Não demonstram
segurança no que tentam dizer em L2 ainda que as ideias estejam aparentemente na cabeça. O
clima de sala de aula é muito monótono e a aula enfrenta inflexibilidade e fraco nível de dinamismo
porque os alunos não respondem prontamente às perguntas do professor na recapitulação da aula
passada. Quanto mais o professor força a participação dos alunos, escolhendo-os a dedo, os alunos
mostram-se psico-emocionalmente desconfortáveis, acanhados, inseguros, tímidos, anti-pático e
indispostos para responderem às perguntas feitas pelo professor.

Extracto 8: Citi.DC2.300117
1. Prof. o que estudámos na aula de Ciências Naturais? vamos fechar os livros e cadernos e vamos falar
2. Tur. ((silêncio))
3. Prof. he:::?
4. Tur. ((silêncio))

127
5. Prof. voluntários
6. Tur. ((os alu.s não intervieram))
7. Prof. é para eu indicar? o que estudámos na quinta-feira?
8. Tur. ((não reagiu))
9. Prof. Biza, o que estudámos na aula passada?
10. Biza ((levantou-se e interveio em voz baixa))<°na aula pa -°>
11. Prof. fale em voz alta
12. Biza: <°na aula passada (.) estudei -°>
13. Prof. ((corrijiu-lhe)) estudámos
14. Biza: <estudámos (0.7) °íris°>
15. Prof. estudámos?
16. Biza °íris°
17. Prof. menino, o que estudámos na aula passada?
18. Alu.2 °na aula passada -°
19. Prof. fale em voz alta.
20. Alu.2 <na aula (.) passada (.) estudámos ((baixa o tom de voz e mostra-se inseguro e hesitante)) (.) °popila°>
21. Prof. estão ouvir Giku? Giku não ouviu.
22. Alu.2 ((repetiu)) na aula (.) passada (.) estudámos (0.4) pa- palpal- palpe-
23. Prof. he:::?
24. Alu.2 pal-
25. Prof. ihi::: Luzani, o que estudámos na aula passada?
26. Alu. Luzani silêncio (0.6)
27. Prof. Aniko
28. Alu. ((silêncio (0.4))

Neste extracto, o professor orientou os alunos a recapitularem a aula sobre “principais partes do
olho” sem abrir os cadernos e os livros (1). Os alunos calaram-se (2). O professor persistiu três vezes
(3, 5, 7), contudo os alunos mativeram-se calados (4, 6, 8). Em (9), o professor decidiu indicar a
aluna Biza que iniciou a resposta em voz baixa mas não a completou em (10, 12). Em (13) a
professora corrigiu-a e em (14), a Biza, finalmente, corrigiu-se e, após alguma pausa, respondeu
dizendo uma parte do olho estudada na aula passada “íris”. O segundo aluno (alu.2) interveio
também numa voz pausada, baixa e com algum desconforto e hesitação respondeu “popila” ao
invés de “pupila” (18, 20) e “palpal… palpe…” em (22), “pal…” (24), na tentativa de anunciar
“pálpebras”. Os restantes alunos Luzani, em (26), e Aniko em (28), não foram capazes de se
referirem a nada do que se aprendeu na aula anterior, mantendo-se em silêncio.
As vozes dos alunos são normalmente baixas (10, 18 e 20), tal que requerem alguma atenção
auditiva para as ouvir. Nisto, o professor exigiu-os que repitissem as suas intervenções em voz alta
(11, 19 e 21). A maioria dos alunos respondia com uma ou duas palavras separadas por longas
pausas ao invés de uma frase completa.
Diante do silêncio dos voluntários indicados a dedo, o professor incentivava a participação de
outros alunos voluntários cujas respostas eram, a posterior, repetidas pela turma em coro e sob
orientação do professor segundo evidencia o extracto 9.

128
Extracto 9: Citi.DC2.300117
1. Prof. muito bem. já ouvi falar de íris, pestana, pupila hiii (0.4). em que parte do nosso corpo (2x) vamos
encontrar pestanas, íris, pupila estão aonde essas coisas (3x)?
2. Tur. (alguns alu.s murmuravam apontando o olho))
3. Prof. um voluntário (2x). estão aonde essas coisas?
4. Tur. ((silêncio))
5. Prof. ((incentiva))↓vamos lá falar
6. Tur. ((silêncio))
7. Alu.3 ((levantou a mão e respondeu)) íris
8. Prof. estão aonde?
9. Alu.3 ((voz baixa e tímida))°nos olhos°
10. Prof. ((persistiu para que a alun.3 falasse mais alto)) NO-?
11. Alu.3 olhos
12. Prof. olho? vamos repetir
13. Tur. ((coro)) olho

Os alunos evitam a participação voluntária na aula. Neste extracto, o professor persuadiu-os para
que falassem (5). A turma ficou em silêncio e apenas a alu.3 (7) respondeu insegura, tímida e em
voz baixa. A resposta foi repetida propositadamente pelos restantes alunos sob forma de coro.
Noutra evidência, os alunos indicados recapitulavam a aula anterior lendo o livro e ou os
apontamentos.
Extracto 10: Mikho.DC2.160816
1. Prof.a o que é que vimos na aula passada?
2. Tur. ((silêncio))
3. Prof.a ((apontou para o alu.1))
4. Alu.1 ( )
5. Prof.a falar em voz alta
6. Alu.1 na aula passada falamos dos tipos de pesca
7. Prof. é verdade mesmo, falamos dos tipos de pesca?
8. Alu.2 ((apontada pelaProf.a abriu o caderno e interveio)) falamos do papel da pesca no desenvolvimento do
país
9. Prof.a quais são os tipos de pesca que a professora deixou como trabalho de casa
10. Alu.3 ((apontado pelaProf.a)) pesca artesanal –
11. Prof.a pesca artesanal
12. Alu.3 pesca industrial –
13. Prof.a pesca semi-industrial
14. Alu.3 ((não mais avançou)) (.)
15. Prof.a ((apontou novamente para a alu.2))
16. Alu.2 ((lendo)) “pesca industrial e pesca desportiva”
17. Prof. onde se pratica a pesca artesanal?
18. Tur. ((silêncio))
19. Prof. ((apontou para a alu.1))
20. Alu.1 ((silêncio))
21. Prof.a onde se pratica a pesca artesanal?
22. Alu.2 ((lendo no livro))“pratica, a praticada perto da costa matima, ma mar –”
23. Prof.a. ((corrigiu)) marítima
24. Alu.2 marítima nas baías mas também nas margens dos rios, lagos e lagoas

129
Os três alunos que participaram na recapitulação da aula anterior recorreram à leitura e
curiosamente são os mais participativos na aula. Os demais acompanhavam a aula em silêncio e
os outros interagiam em grupos sem prestar atenção à aula. Neste caso, a professora garantia o
dinamismo da aula, excluindo a maioria que não era indicada para intervir.
Em suma, há uma série de dificuldades que marcavam os alunos e os professores para
desenvolverem uma aula participativa em L2. A paciência, a persistência e a insistência do
professor têm sido os elementos que pelo menos garantem a condução da aula embora sem a
devida flexibilidade, dinamismo e níveis de interacção e participação que outrora caracterizam o
ensino em L1.

5.1.3 Práticas ocasionais de translanguaging e a participação e interacção


dos alunos em L1

No decurso das práticas de ensino em L2 observei cenários nos quais a L1 dos alunos era
ligeiramente usada na aula de forma não planificada. Ela posicionava-se como uma ferramenta
linguística que de forma recorrente, estratégica e pedagógica visava, intencionalmente,
impulsionar as oportunidades de participação e de interacção dos alunos no decurso da aula. Ainda
que este uso da L1 fora não planificado e senão ocasional, em algumas cenas e ou episódios da
aula, motivava alguma participação e interacção dos alunos na aula.
Nesta sub-secção debruço-me sobre o translanguaging ocasional desenvolvido mediante a
mobilização da L1 na aula nos moldes de interacção IRF e descrevo os respectivos resultados ao
nível da reacção participativa e interactiva dos alunos e ao nível de flexibilidade e do dinamismo
do ensino-aprendizagem.

5.1.3.1 Reformulação, transição à L1 e a participação dos alunos

Nas poucas ocasiões nas quais os professores usavam ocasionalmente a L1, os níveis de participação
dos alunos foram qualitativamente activos se comparados com os níveis da participação dos alunos
em aulas leccionadas exclusivamente em L2. As evidências das aulas ilustravam que os alunos
voluntariavam-se com mais frequência nestas ocasiões, expunham as suas ideias e respostas em L1
e outras vezes em L2. O silêncio nestas ocasiões era uma clara evidência de ausência de resposta
ou momento de reflexão da turma. Os alunos não desperdiçavam as oportunidades criadas pela

130
L1 de tal forma que respondiam a todas as perguntas que abordavam conhecimentos por si
conhecidos. Participavam expondo o que sabiam visando contribuir na construção dos
conhecimentos do conteúdo da aula.
O extracto 11 reflecte a activação da participação e da interacção dos alunos após reformulação
da pergunta em L1 pelo facto de os alunos não a terem respondido em L2.

Extracto 11: Mikho.DC3.010317


1. Prof.a então protege o olho contra o suor e contra a poeira para não puder entrar aqui no nosso olho aqui.
se for a entrar, por ex. poeira no nosso olho, o que poderá acontecer?
2. Tur. ((silêncio))
3. Prof.a se entrar pode ser areia ou suor no nosso olho, o que pode acontecer?
4. Tur. ((silêncio))
5. Prof.a loko wungena nyuku ka tihlo, zvini zvimahekaku? he:::? (quando entra o suor nos olhos o que acontece?)
6. Alu.s: gofehla (faz comichão)
7. Prof.a he:::e
8. Tur . gofehla (faz comichão)
9. Prof.a então kulaveka wungena niku kulaveka wungageni? (então deve entrar o suor ou não?)
10. Tur. wungangeni (não deve entrar)
11. (...)
12. Prof. awungangeni. makunu lezviya zvivhikelaku ku a nyuku wungangeni as pestanas, sobrancelhas e pálpebras. hizvona
zvivhikelaku. loko zviwona aku a nyuku wulava kungena, zvomaha hini wena? (não deve entrar. então o que nós protege
contra o suor nos olhos são as pestanas, sobrancelhas e pálpebras. são os nossos protectores. quando o suor
desce aos olhos, o que fazem?)
13. Tur. [hotsonya (pastanejamos)
[hotsimba (fechamos os olhos)

Em (1), a professora perguntou sobre os problemas que a poeira causa no olho em L2, todavia os
alunos não os mencionaram, tendo-se mantido em silêncio (2). Com recurso à estratégia de
persistência e insistência em L2, a professora perguntou mais uma vez em L2 (3) mas o silêncio
continua a manifestar-se entre os alunos. Entretanto, a reformulação da pergunta com recurso a
L1, em (5), suscitou espontaneamente a resposta colectiva e em coro audível de todos os alunos
“gofehla” (faz comichão) (5, 8). A participação dos alunos manifestou-se a partir deste momento.
Os alunos jamais ficavam em silêncio nas restantes perguntas formuladas pela professora em L1.
A título de exemplo, em (12) questionou sobre a acção das pestanas, sobrancelhas e pálpebras
quando o suor tende a penetrar no olho, os alunos apresentaram simultaneamente duas respostas
sinónimas. Um grupo de alunos respondeu em coro “hotsonya” (pastanejamos) e outros
“hotsimba” (fechamos os olhos). Com base nesta evidência constatei que o translanguaging ocasional
a partir da L1 nas aulas suscita uma flexibilidade e dinamismo na aula co-participada
interactivamente pelos alunos. Nestes termos, a L1 tornava-se, assim, um recurso que ajudava a
desbloquear os problemas e os impasses de motivação, timidez, voz baixa, silêncio, murmúrio entre

131
outros que colocavam em causa a participação e interacção dos alunos em L2. Tratando-se de
alunos bilingues emergentes que estavam ainda a desenvolver a proficiência linguística em L2
tinham, por isso, algumas insuficiências do vocabulário em L2 para expressar as suas ideias. Um
exemplo ilustrativo consiste na insistência da professora em (1 e 3), que resultaram em silêncio da
turma (2 e 4) mas ao reformular ou traduzir a pergunta da L2 para a L1, em (5), suscitou
rapidamente uma pronta disponibilidade, segurança, motivação de todos os alunos que
intervieram em (6). Analisando esta parte, poder-se-ia supor, por hipótese que, possivelmente os
alunos tinham a resposta “gofehla” em L1 e não em L2, contudo o seu nível de proficiência
linguística em L2 não lhes permitia responder “faz comichão”. Nos casos em que os alunos não
tinham uma resposta exaustiva em L1, os níveis de participação decresciam, isto é, eram mais
lentos mesmo nas circunstâncias em que a professora reformulava e ou traduzia a pergunta da L2
à L1, segundo ilustra o extracto 12.

Extracto 12: Mikho.DC7.280916


1. Prof.a por exemplo, temos o exemplo do peixe. o peixe vive aonde o peixe?
2. Tur. ((coro)) na água
3. Prof.a vive na –
4. Tur. ((coro)) ÁGUA
5. Prof.a vive na água. lá na água o quê que come lá?
6. Tur. ((silêncio (0.5))
7. Prof.a na água o quê é que come o peixe?
8. Tur. ((silêncio (0.4))
9. Prof. atihanya hi yini a tinjanji le matini? (o que os peixes comem na água)
10. Tur. ((silêncio))
11. Prof. ahotlheni hazvitiva tinjanji para ku tihanya tidependeriwa hi mati, ahizvo? (todos sabemos que a sobrevivência
dos peixes depende da água, não é?)
12. Tur. hizvona (é verdade)
13. Prof.a mas lomuyani ahikwatsikanyani tohanya basi hikunwa mati zvikona zvin´wanyani tigaku. tinga yini? (não lá não
sobrevivem bebendo água, há outros alimentos que comem. o que comem?)
14. Tur. ((silêncio (0.6))
15. Prof.a he:::? (0.5)
16. Prof.a um voluntário para responder
17. Tur. ((ninguém se voluntaria))
18. Prof. atihanya hi maphanji? (sobrevivem na base de camarão)
19. Tur. ((murmúrio))
20. Prof.a é verdade mesmo?
21. Tur. ((coro)) não:::
22. Prof.a u::: um voluntário como vocês estão a tentar
23. Tur. ((silêncio (0.3))
24. Prof.a levanta lá Gizani
25. Gizani °cocó°
26. Tur. ((risos))
27. Prof.a come o quê?
28. Tur. ((coro)) cocó

132
Os alunos participavam em coro e em L2, respondendo às perguntas da professora (1 e 2)
entretanto, o silêncio surge quando a professora perguntava sobre o que o peixe comia no fundo
da água (5). A professora activou a estratégia de persistência e insistência (7) e ao constatar o silêncio
dos alunos em (8), reformulou-a em L1 (9) na expectativa de promover a participação. Os alunos
participaram passivamente em (12), mas quando a professora perguntou mais uma vez pelos
alimentos consumidos pelo peixe em (13) retornaram ao silêncio em (14). A professora persistiu
(15) solicitando a intervenção de um voluntário que não surgiu. De seguida, instalou-se na aula um
clima de insegurança, timidez e incerteza entre os alunos que murmuravam em (19) em resposta à
pergunta da professora em (18). Diante deste cenário, ela solicitou um voluntário que não aparece
de imediato, indicou a aluna Gizani que interveio discretamente em voz muito baixa “cocó” (25).
Esta resposta gerou um cenário de emoção (risos e gargalhadas) entre os alunos e da professora e
na solicitação de voz alta, a turma repetiu-a em coro “cocó” (fezes) (28).
Os alunos enfrentaram dificuldades para se referirem aos alimentos do peixe não obstante a
persistência da professora em L2 e em L1. As duas línguas não foram capazes de contribuir para
a participação flexível e dinâmica dos alunos na aula. A proposta de resposta exposta tardiamente
em (25) adveio do resultado da persistência da professora e não por causa da transição à L1, visto
que os alunos não responderam às três perguntas feitas em L1 (9, 11, 13).
No extracto 13, mais uma vez, evidenciei a reformulação das perguntas em L1 mas os alunos
ficaram em silêncio.

Extracto 13: Mikho.DC5.100217


1. Prof. então, aqui temos gato, temos aqui o nosso gato
2. Tur. ((agitou-se emocionada ao ver os desenhos do gato e do rato no quadro))
3. Prof. este gato come rato, não é?
4. Tur. ((risos)) sim
5. Prof. (...) o que come amendoim dissemos que é rato. rato come o quê? amendoim. o que vem comer o rato,
é o quê?
6. Tur. é o gato
7. Prof. É?
8. Tur. É O GATO
9. Prof. então, qual é outro animal que come gato, a cimanga? cimanga cigiwa hi yini? (o gato? o gato é comido
pelo/a?)
10. Tur. ((não responde))
11. Prof. cimanga cigiva hi yini? cikona cin´wani cihari cigaku cimanga (o que come o gato? há outro animal que come o
gato?) vamos pensar, vamos. acigiwi cimanga? (o gato não é comido?)
12. Tur. ((coro lento de alguns alu.s)) <cagiwa> (é comido)
13. Prof. hambi munhu waga cimanga phela (mesmo o sere humano come o gato)
14. Tur. ((risos))
15. (...)
16. Prof. para além do homem existe outro animal que come gato. vamos lá pensar. qual é o animal que come
gato?

133
17. Tur. ((silêncio))
18. Prof. ((persiste)) ou acigiwi cimanga? (o gato não é comido?)
19. Tur. cagiwa (é comido)
20. Prof. cigiwa hi yini? (que animal o come?)
21. Tur. ((murmúrio))
22. Prof. cigiwa hi yini? (que animal o come?) não estou a perceber eu
23. Tur. ((murmurou)) leão

A participação dos alunos é notória em (6 e 8) quando em coro respondiam às perguntas (5 e 7),


mas o silêncio surgiu diante da pergunta (9) que questionava o animal que come o gato. A
professora usou as duas línguas para formular (L2) e reformular (L1) a mesma pergunta. À partida,
os alunos não responderam. A professora persistiu e insistiu mais uma vez em L1 (11), em L2 (16)
e novamente em L1 (18). A turma admitia a existência de tal animal mas não o mencionava (19,
21) até que no registo (23) murmurou dizendo “leão”.
As evidências dos extractos 11, 12 e 13 ilustraram que a L1 e a L2 são ferramentas linguísticas e
pedagógicas que os professores usam para motivar a participação dos alunos. Entretanto, se a
participação dos alunos for inflexível, os professores activam a estratégia de persistência e
insistência. Diante destas duas estratégias, os alunos demonstraram níveis de participação e de
interacção passivos e a aula registou uma inflexibilidade. As respostas, segundo as evidências
acima, surgiram em última instância e após vários registos de persistência dos professores. Em
outras palavras, os alunos têm uma participação lenta para responderem às perguntas efectuadas
independentemente da língua ou línguas que forem utilizadas pelos professores e da aproximação
ou não do tema da aula com as realidades e experiências socioculturais locais.

5.1.3.2 Participação e interacção dos alunos em L1 diante dos conhecimentos


socioculturais

Em certos temas de aulas evidenciei que os alunos mostravam-se mais dinâmicos e flexíveis que
nos outros. Os seus níveis de participação e de interacção eram ocasionalmente elevados sempre
que os professores usavam a L1. As estratégias de persistência e de insistência usadas pelos
professores eram menos ocorrentes. Os alunos tinham a liberdade de expor as suas ideias em L1 e
de forma dinâmica e flexível. O ensino-aprendizagem apresentam altos níveis de participação e de
interacção dos alunos. As suas vozes que maioritariamente eram baixas em L2, nestas aulas eram
médias e audíveis. Alguns alunos voluntariam-se de forma aberta, segura e sem vergonha para
participar e interagir sobre experiências socioculturais em L1 conforme ilustra o extracto 14.

134
Extracto 14: Mikho.DC7.280916
1. Prof.a na figura 5 quem pode me dizer o que está a ver aí na figura 5, um voluntário só
2. Gizani, alu.3 ((levantou-se e interveio em voz baixa)) °estamos a ver cobra°
3. Prof.a mais o quê?
4. Tur. ((coro)) mais rato
5. Prof.a mais rato, sim, mais o quê?
6. Alu.4 mais –
7. Prof.a hi::: a cobra kambe i cini? (o que é?)
8. Tur. ((coro)) I NYOKA (É COBRA)
9. Prof.a a kona akalaku kuyitiva nyoka lomu? (há quem não conheça a cobra aqui?)
10. Tur. ((coro)) AHIHI (NÃO)
11. Prof.a a nyoka hitira hi, hiyanya hi yini? (a cobra, de quê sobrevive?)
12. Tur. ((coro)) yi hanya hi nyama (sobrevive à base da carne)
13. Prof. ahi hanya hi yini? (de quê sobrevive?)
14. Tur. ((murmura))
15. Prof.a ina pfusi hinanya hiku siku ni siku higetetela vanhu? (é verdade que sobrevive comendo pessoas todos os dias?)
16. Tur. ahihi (não)
17. Prof.a já a nyoka hi hanya hi yini? (de quê sobrevive a cobra?)
18. Alu.2 ((em voz baixa e inseguro)) °hi macimba° (de fezes)
19. Prof.a hi hanya hi yini? (de quê sobrevive?)
20. Tur. ((murmura, um Alu.4 interveio)) hi zvihukwana (comendo frangos)
21. Prof.a hi zvihukwana (comendo frangos?)
22. Tur. i:::(si::m)
23. Prof.a além ya zvihukwana zvini zvin´wanyani? (de frangos e mais o quê?)
24. Tur. em coro: makodlo. (ratos)
25. Prof. ani yini? (mais o quê?)
26. Tur. makodlo (ratos)
27. Prof.a a makodlo kambe yaga? (come também os ratos?)
28. Tur. hi::: (sim)
29. Prof. ani yini kambe? (mais o quê?)
30. Alu.5 makodlo ni zvimunyamunyani9 (ratos e frutos de zvimunyamunyani)
31. Prof. ani zvimunyamunyani (e zvimunyamunyani)
32. Prof. aphela leci nacona cihari, maciwona? (0.4) cihefemula hi yini? (este é também um animal, conseguem ver? (0.4)
por onde respira?)
33. Alu.6 ((interveio inseguro)) hi nomu (pela boca)
34. Prof.a hi yini? (donde?)
35. Alu.6 hi nomu (pela a boca)

O extracto 14 faz parte de uma aula na qual, a professora orientava a interpretação das imagens
do livro sobre a “cadeia alimentar – interdependência dos seres vivos”. A interpretação da imagem
foi participada inicialmente por uma voluntária e depois pela turma em coro. Em (4) os alunos
respondem em coro a pergunta (3). Os níveis de participação ainda que em coro e em L2 tornavam
a aula ligeiramente flexível. Em (7), notei a transição da turma da L2 para a L1 com o objectivo
de efectuar a equivalência da palavra “cobra” em L1. A professora assumia o papel de mediadora,
formulando perguntas e os alunos respondiam-nas de forma activa, flexível, motivador,
comovente, dinâmica e colaborativa (8, 10, 12, 18, 20 e 24). Nos registos (22 e 30) destacaram-se

9 É um tipo de arbustro.

135
dois alunos (alu.4 e alu.5) que voluntariamente apresentaram respostas individuais. Com a
excepção do registo da primeira aluna voluntária em (2) e do murmúrio em (14), os restantes
registos ilustraram uma aula desenvolvida em ambas as línguas. De pergunta em pergunta, a
professora conduzia a aula sem esforçar a participação e interacção dos alunos, confortavelmente
mediava os altos níveis de motivação dos alunos e potenciava-os para garantir o progresso
colaborativo e dinâmico da aula na qual os alunos expunham as suas experiências e saberes
socioculturais em L1.
Em reflexão sobre as evidências supracitadas, a professora, mais uma vez, fazia o uso do
translanguaging de forma ocasional, o que permitiria a participação e a interacção dos alunos na aula
porém, faltavam estratégias de interacção e de negociação dos significados das suas experiências e
saberes socioculturais em duas línguas. O extracto 15 a seguir, mostra, efectivamente, quão a aula
se desenvolveu em L1 sem a negociação com a L2.

Extracto 15: Mikho.DC7.280916


1. Prof.a giga yini a khowo? (o que come o morcego?)
2. Alu.18 a- amarovha (a- atas)
3. Alu.19 ((discordando do Alu.18)) AROVHA ? (ATA)
4. Alu.18 arovha gaga (come ata)
5. Tur. ((alguns alu.s)) a rovha ni mikovha (ata e bananas)
6. Alu.20 a rovha ni mikovha (ata e bananas)
7. Alu.21 ni manga ni kovha (e mangas e banana)
8. Prof.a mutshuka mumakuma makhowo, semakhowo mahuma hi wusiku? (como é que alguma vez teriam visto os
morcegos se eles saem a noite?)
9. Alu.22 papakayi (papaias)
10. Tur. ((alguns alu.s)) hi:::(si::m)
11. (...)
12. Prof.a se maga ni kama mu? (que horas comem?)
13. Tur. ((muitas vozes)) ( ):
14. Prof.a he:::? (o quê:::?)
15. Alu.23 °ni wusiku°(a noite)

Em todo o extracto, os alunos interagiram em L1. Em (1), a professora perguntou o que comia o
“makhowo” (morcegos). Quatro voluntários intervieram para responder à pergunta segundo
mostram os registos (2, 6, 7, 9). Neste ambiente participativo e altamente interactivo, o alu.19
discordava da resposta do alu.18, gerando uma rápida discussão (2, 3, 4). O alu.19 não concordava
que as “marovha” (atas) seriam o alimento dos “makhowo” (morcegos). Contudo, os outros alunos
reafirmaram em (5) que, efectivamente, a “rovha” (ata) e “mikhovha” (bananas) eram alimentos
de “makhowo”.

136
Esta interacção sobre os morcegos não foi acompanhada pela negociação entre as línguas que
permitiria a aprendizagem, por exemplo, de novos vocabulários em duas línguas dado que a aula
se desenvolvia exclusivamente em L1, no entanto, evidenciei ligeiramente o contributo dos
conhecimentos socioculturais no que concerne à promoção da participação e da interacção dos
alunos em L1, mesmo que os professores usem discursos em L1, em L2 ou em ambas as línguas
como um único repertório discursivo.

5.1.3.3 Coro e interacção em L1

O translanguaging ocasional atiçava os alunos que discretamente erguiam as caras cabisbaixas,


mostravam-se algum desejo de participar e de interagir na aula, porém estes fenómenos eram
inviabilizados pelas estratégias de ensino passivo centralizado na figura do professor. Nestas
circunstâncias, os alunos não participavam abertamente, mas sim, ligeiramente retraídos e de
acordo com os moldes das perguntas formuladas pelos professores. O extracto 16 retrata a
recapitulação do conteúdo “zvivangwa zva wutomi” (seres vivos) abordado em L1 na 3ª classe e
que nesta aula servia de pré-requisito ou conhecimento prévio para a introdução do novo conteúdo
“cadeia alimentar” em L2, no entanto, as estratégias de ensino passivo forçam os alunos a
participarem e a interagirem passivamente e sob o controle da professora.

Extracto 16: Mikho.DC5.100217


1. Prof.a lezvi zvikumekaku ka cadeia alimentar, todos zvivangwa zvinga ni wutomi. hazvana? zvivangwa lezvi zvinga ni
yini? (o que temos na cadeia alimentar são todos os seres vivos. estamos juntos? são seres que têm o quê?)
2. Tur. ((coro)) ni wutomi (vida)
3. Prof.a zvivangwa lezvi zvinga ni yini? (são seres que têm o quê?)
4. Tur. ((coro alto)) NI WUTOMI (VIDA)
5. Prof.a zvivangwa lezvi zvinga ni wutomi -- por exemplo, nós podemos ter aqui, isto aqui é capim. hotlheni hagitiva
a bzwanyi ahizvo? (os são seres vivos -- por exemplo, nós podemos ter aqui, isto aqui é capim. todos conhecemos
o capim, não é verdade?)
6. Tur. sim
7. Prof.a hotsheni hagitiva a bzwanyi niku ahigitivi? (conhecemos ou não conhecemos o capim?)
8. Tur. ((coro alto)) HAGITIVA (CONHECEMOS)
9. Prof.a isto aqui é capim. é um ser vivo ou não é? gafa niku agifi? (morre ou não morre?)
10. Tur . gafa (morre)
11. Prof.a gafa,então cikona citoga leci. citoga ayini? (morre, então há um que comerá isto. há um que comerá o quê?)
12. Prof.a [a bzwanyi (capim)
Tur. ((aluns alu.s)) [a bzwanyi (capim)
13. Prof.a cini mucitivaku cigaku a bzwanyi? (o que vocês conhecem que come capim?)
14. Tur. ((agitou-se, porém apenas três alu.s levantaram-se))
15. Alu.15 cabrito
16. Tur. ((no fundo da tur. ouviu-se uma voz discreta e muito baixa)) ( ): °boi°
17. Prof.a podemos ter este cabrito, cabrito vai comer o quê, capim

137
Em cada afirmação exposta pela professora, seguia uma pergunta em L1 cuja resposta extrair-se-
ia na afirmação. A este tipo de perguntas denominei por “afirmação-pergunta”, as respectivas
respostas nomeei por “resposta-afirmação”. A título de exemplo, em (1) a professora apresentou
uma afirmação e a seguir fez uma pergunta que visava controlar a atenção dos alunos, obrigando-
os a repetir em coro uma parte da afirmação anterior (resposta-afirmação) em jeito de resposta à
pergunta (afirmação-pergunta) em (2). Em (3), a professora perguntou, mais uma vez, e a turma
repetiu novamente a resposta-afirmação em coro alto (4). A estratégia interacção baseada na
afirmação-pergunta sucedeu nos registos (7 a 12) nos quais passivamente os alunos responderam
dentro dos moldes da pergunta colocada e sem espaços para enriquecer interactivamente a aula.
A posterior, a aula prosseguiu com uma pergunta em L1 “cini mucitivaku cigaku a bzwanyi?” (o
que vocês conhecem que come o capim?). Esta pergunta liberalizou o voluntarismo espontâneo
dos alunos. A turma agitou-se e dos três voluntários, o alu.15 interveio expondo “cabrito”, em (15),
e um aluno discreto disse “boi”.
As estratégias de participação e interacção adoptadas no extracto 16 ilustram a ausência de
flexibilidade e do dinamismo da aula, pois os alunos só intervêm apenas para repetir e completar
as afirmações-perguntas feitas pela professora nos moldes passivos. Este cenário só mudou quando
em (13), a professora faz uma pergunta aberta que cedia oportunidade à turma para a responder
voluntariamente. A turma predispôs-se a participar em L2, respondendo à pergunta formulada em
L1. Com esta evidência constatei que, de facto, as práticas de translanguaging ocasional aliadas com
à aproximação do conteúdo da aula às vivências e experiências socioculturais dos alunos criam
oportunidades para a participação voluntária dos alunos, porém a centralização da aula na figura
da professora inibia-os de interagir flexível e colaborativamente, expondo os seus saberes e ou as
suas experiências ao invés de respostas em coro orquestradas através da estratégia afirmação-
pergunta.
No ambiente de práticas de translanguaging ocasional, os alunos participavam e interagiam
activamente sempre que tivessem oportunidades para expor os seus saberes e ou conhecimentos,
experiências próximas do seu meio sociocultural. Os alunos não hesitavam, respondiam em coro
e em L1, segundo mostra a seguir o extracto 17. Neste, a professora auscultava os grupos de
alimentos aprendidos na 3ª classe em L1 com vista a introduzi-los em L2.

138
Extracto 17: Mikho.DC8.080317
1. Prof.a hini mitlawa ya zvakuga zvimahaku lezv i (...) aquilo que vimos na 3ª classe. le ka 3ª classe hite kuni zvakuga
zva kumaha yini? (temos tipos de alimentos que fazemisto (...) aquilo que vimos na 3ª classe. lá na 3ª classe
dissemos que existem alimentos que fazem o quê?)
2. Tur. ((murmúrio))
3. Prof.a andzizvizvi (não compreendi)
4. Tur. ((coro)) zvonyika wutomi (alimentos que dão-nos a vida)
5. Prof.a zvomaha yini? (que fazem o quê?)
6. Tur. zvonyikela wutomi (que nos dão vida)
7. Prof.a kunani kuga kasi zvihimaha yini? (comemos para que nos façam o quê?)
8. Tur. ((os alu.s respondem murmurando))
9. Prof.a zvigi zva wutomi? (são alimentos da vida?)
10. (...)
11. Prof.a (...) kuni lezvi higaku para zvihimaha yini? (temos alimentos que comemos para quê?)
12. Tur. ((murmurou e alguns alu.s intervieram)) zvihivhikela mababzi (para nos proteger das doenças)
13. Prof.a zvihimaha yini? (fazem-nos o quê?)
14. Tur. ((coro forte)) ZVIHIVHIKELA MABABZI (PROTEGEM-NOS CONTRA AS DOENÇAS)
15. Prof.a agora em português são alimentos protectores, estamos juntos?
16. Tur. ((alguns alu.s)) sim
17. Prof.a em português são alimentos protectores –
18. Tur. ((repetiram)) protectores
19. Prof.a protectores que nos protegem das doenças. hazvana? (estamos juntos?)
20. Tur. sim
21. Prof.a mingazvirivakeni temos alimentos protectores. ni lezvi zvimahaku yini? (não se esqueçam temos alimentos
protectores os outros fazem-nos o quê?)
22. Tur. ((coro fraco)) <hikula> (fazem-nos crescer)
23. Prof.a zvihimaha yini? (fazem-nos o quê?)
24. Tur. coro alto: hikula (fazem-nos crescer)
25. Prof.a hikula (crescer), alimentos que comemos para crescer. estamos juntos
26. Tur. sim
27. Prof.a são alimentos que comemos para fazer o quê?
28. Tur. para crescer
29. Prof.a crescer zvilava kuwula kuyini? (crescer significa o quê?)
30. Tur. akukula (crescer)
31. Prof.a hilezvi higaku para hi maha yini? (são os que comemos para quê?)
32. Tur. ((alguns alu.s)) hikula (crescermos)
33. Alu.9 zvihimaha hikuma ntamu (dão-nos força)
34. Prof.a hikuma – (termos –)
35. Tur. a ntamu (força)
36. Prof.a então em português são alimentos protectores, alimentos construtores e alimentos energéticos.

Nos registos (1 a 14), os alunos recapitularam sob orientação da professora os grupos de alimentos
aprendidos na classe anterior em L1. A seguir, a professora relacionou-os com os conceitos dos
grupos dos alimentos em L1 e os respectivos equivalentes em L2 segundo ilustram os registos (15
a 36). Os alunos passaram a aprendê-los com base numa prática de translanguaging, mas em coro. A
L1 e a L2 permitiram a participação dinâmica e flexível dos alunos na equivalência lexical e
nocional dos conceitos sobre os grupos de alimentos de L1 para a L2 através de uma prática de
translanguaging passiva e centrada na professora.

139
5.2 Experiências práticas e pedagógicas de translanguaging planificado

Os resultados descritos nesta secção resultaram de práticas de translanguaging que desenvolvi a título
de pesquisa preliminar e experimental em diferentes ciclos de pesquisa-acção ao longo da I fase da
pesquisa de campo co-participada pelos professores co-investigadores. Nesta I fase, o meu foco
restringia-se a revitalizar os ambientes de participação e de interacção dos alunos e analisar as
respectivas consequências ao nível da flexibilidade e do dinamismo do ensino-aprendizagem com
a implementação experimental e preliminar das práticas de translanguaging e, a posterior, a
combinação pedagógica entre o translanguaging e as estratégias de collateral learning e de cross-cultural
border.

5.2.1 Reacção linguística e pedagógica dos alunos

Os alunos e os professores tinham algumas experiências de práticas de translanguaging ocasionais


diferentemente das planificadas e sistematizadas na I fase. Inicialmente, decidi quebrar o princípio
de aulas leccionadas exclusivamente em L2 e anular a separação de línguas que definia o uso da
L2 como único meio de instrução e de aprendizagem e o uso restrito e exclusivo da L1 para explicar
os conceitos difíceis (INDE/MINED 2003a). Com efeito, adoptei a estratégia de liberalização,
promoção, fomento de uso das línguas L1 e L2 como um único repertório linguístico e pedagógico,
uma prática discursiva e interactiva de sala de aula disponível tanto para os professores como para
os alunos a partir da qual se podia desenvolver o ensino-apremdizagem.
O extracto 18 é referente à segunda aula na qual, nos primeiros minutos, o professor orientou a
recapitulação da aula anterior, por sinal a primeira desta etapa. Alguns alunos recorreram ao livro
e ao caderno de apontamentos para recordar e assegurar o que iam expor.

Extracto 18: Ruw.DC2.210916

1. Prof. alguém para nos dizer do que falamos na última aula de Ciências Naturais
2. Tur. ((3 alunos levantam as mãos))
3. Alu.1 ((levantou-se imediantamente e respondeu)) na última aula de Ciências Naturais falámos de pesca
4. Prof. falamos da –
5. Tur. ((em coro)) da pesca
6. Prof. falamos da pesca. o que é que nós dissemos acerca da pesca? hiteyini xungetani hi pesca? (o que é que
dissemos sobre a pesca?)
7. Tur. ((silêncio))
8. Prof. podemos falar (.) podem falar em português e citshwa (.) vamos falar, está bom?
9. Tur. sim
10. Tur. ((Alguns alu.s observavam para os livros e para os cadernos))

140
11. Prof. hiteyini xungetani hi pesca? hite a pesca cini? alguém quer falar (o que dissemos sobre a pesca? dissemos
que a pesca é? alguém para falar)
12. Tur. ((dois alunos levantaram as mãos))
13. Alu.2 ((pôs-se de pé)) a pesca hite ntiru woringela (a pesca é uma actividade pesqueira)
14. Prof. a pesca i yini? (a pesca é o quê?)
15. Tur. ntiru woringela (é uma actividade pesqueira)
16. Prof. ntiru woringela. ntiru woringela yini? mun´wanyane wopara achamusela kwhatsi. ntiru woringela yini? (é uma
actividade pesqueira de quê? outro para esclarecer. é uma actividade de pescar o quê?)
17. Tur. ((muitos alunos levantaram as mãos suplicando)) sou::: eu::: sou::: eu:::
18. Prof. ((elegeu a Alu.3))
19. Alu.3ntiru woringela zvinjanjani nazvihanya kumbe nazvifile (é uma actividade de pescar peixinhos vivos ou
mortos)
20. Prof. ntiru woringela zvinjanjani nazvihanya kumbe nazvifile. zvinjanjana basi? (é uma actividade de pescar peixinhos
mortos ou vivos. é só peixinhos?)
21. Tur. não
22. Prof. ahichamuselene kwhatsi (vamos esclarecer)
23. Tur. ((os alu.s suplicavam euforicamente)) sou::: eu::: sou::: eu:::
24. Prof. ((elegeu mais uma alu.a entre vários voluntários))
25. Alu.3 ni maphanji (é camarão)
26. Prof. ihhh o quê mais, só?
27. Tur. ((toda turma levantou as mãos para o areufórica, disposta a intervir, alguns alunos estavam de pé e
gritavam)) sou::: eu::: sou::: eu:::
28. Prof. ((escolheu a alu.4))
29. Alu.4 camarão
30. Prof. camarão ni maphanji (e camarão) há diferença?
31. Tur. ((coro alto)) NÃO:::
32. Alu.5 ((levantou-se e disse)) ni tindzolo (e caranguejo)
33. Prof. ((traduziu para a l2)) caranguejo, não é.
34. Alu.6 mapalu (ostras)

O extracto ilustra um interessante evento de translanguaging na aula. Os alunos consultavam os livros


de Ciências Naturais em L2, participavam e interagiam activamente em L1 numa aula mediada
pelo professor num discurso de translanguaging. No início da recapitulação da aula, três alunos
voluntariaram-se para referir o tema da aula anterior, de entre os quais, a alu.1 foi rápida ao
levantar-se e respondeu em L2 (3). Em (6), o professor solicitou que os alunos detalhassem a aula
anterior, contudo os alunos calaram-se, em (7). Nestas circunstâncias, o professor motivou-os a
intervirem em qualquer uma das línguas (8) e reformulou a mesma pergunta em L1 (11). De
imediato, dois alunos voluntariam-se tendo o alu.2 respondido em L1 (13). A partir deste aluno, a
predisposição dos alunos elevou-se e quase todos queriam participar segundo mostra a expressão
de súplica ao professor “sou::: eu::: sou::: eu:::” em (17). O professor tinha tantos voluntários que
não sabia a quem escolher para participar na aula, para mencionaros produtos da pesca. A aula
ganhava um óptimo dinamismo e flexibilidade. Os alunos, incansavelmente, gritavam eufóricos
“sou::: eu::: sou::: eu:::” e com as mãos no ar (23, 27) após o fim da intervenção dos voluntários
escolhidos pelo professor. Alguns alunos intervinham sem a devida indicação do professor, segundo

141
ilustra o registo (32, 34). Os alunos alu.5 e alu.6 levantaram-se e apresentaram “tindzolo”
(caranguejo) e “mapalu” (ostras) respectivamente após constatarem que o alu.4 teria mencionado
“camarão” anteriormente referido pelo alu.3 em L1 “maphanji” (camarão), segundo ilustra o
registo (25). As duas línguas eram promovidas de forma pedagógica pelo professor e como um
único recurso linguístico que motivava euforicamente a interacção espontânea, aberta e livre no
ambiente de sala de aulas e elevava simultaneamente os níveis de flexibilidade e dinamismo da
aula. Constatei nesta aula o encorajamento linguístico e didáctico do professor, a participação
surpreendente de todos os alunos e um ensino-aprendizagem flexível e dinâmica na recapitulação
da aula anterior e contextualizando-a às suas realidades.
Com o translanguaging promovido na aula, os alunos tinham a liberdade de pensar, expor
antecipadamente as suas ideias sobre o tema da aula. O extracto 19 ilustra reflexões dos alunos em
L1 suscitadas pelo tema da aula em L2.

Extracto 19: Ruw.DC1.210916


1. Prof. hilava kuwulawula hi yini? (de quê é que falaremos?)
2. Tur. tipos de pesca
3. Prof. hilava kuwulawula hi (falamos sobre os) tipos de pesca. loko hiwulawula hi (ao abordarmos sobre os) tipos de
pesca, o que é que vem nas vossas cabeças?
4. Tur. ((silêncio reflexivo))
5. Prof. loko vaku (quando dizem) tipos de pesca, vawula yini? (de quê se referem?)
6. Alu.1 matshamela ya pesca (formas de pesca)
7. Prof. matshamela ya pesca (formas de pesca) outra ideia
8. Alu.2 matshamela ya ntiru wa kuringela (são formas da actividade pesqueira)
9. Prof. outro aluno?
10. Alu.3 matshamela yohlota (formas da caça)
11. Prof. matshamela yohlota. hiwulawula hi kuhlota hina? (tipos de caça. falamos da caça aqui?)
12. Tur. não
13. Prof. outra ideia diferente daquela
14. Alu.4 matshamela ya zvihari (vida dos animais)
15. Prof. nyamutla higondza zvihari zva matini ahi zvihari zva kuhlota (hoje aprenderemos sobre os animais aquáticos e
não sobre os animais da caça)

Os alunos e o professor acordaram que iriam abordar o tema “tipos de pesca” (1 e 2). No registo
(3) o professor solicitou a turma para reflectir e interpretar o que seriam “tipos de pesca”. Os alunos
leram o tema da aula tanto no quadro como no livro e com o seu esforços predispuseram-se a
interpretá-lo e a traduzí-lo da L2 à L1 de forma voluntária. No registo (4), a turma reflectiu em
silêncio e após a reformulação da pergunta com base num discurso de translanguaging (5), o alu.1
respondeu em L1 (6) “matshamela ya pesca” (formas de pesca). A seguir, mais três alunos

142
propuseram outras ideias segundo ilustram os registos (8, 10, 14), a destacar, “matshamela ya ntiru
wa kuringela” (formas da actividade pesqueira) proposto pelo alu.2 em (8). Nestes registos, os
alunos buscavam equivalências ou interpretações em L1 do tema da aula apresentado em L2.
Com base nestas evidências conclui que a pedagogia de translanguaging permitia a participação dos
alunos na reflexão de uma língua para outra. Os alunos familiarizavam-se e adaptavam-se com
muita facilidade às novas práticas de translanguaging planificado que se transformavam em
oportunidades pedagógicas que os motivavam a participar voluntariamente, elevando os seus
níveis de participação e de interacção na aula e melhorando os níveis de flexibilidade e de
dinamismo do ensino-aprendizagem.

5.2.1.1 Revitalização dos ambientes participativos e interactivos

As práticas de translanguaging suscitavam novas oportunidades nas quais os alunos tinham a


liberdade de expor as suas ideias com alto grau de espontaneidade, voluntarismo e motivação. A
sala de aula tornava-se num ambiente de ensino-aprendizagem em que as duas línguas eram
exploradas como um único repertório linguístico e discursivo. Nestes moldes, os cenários de sala
de aulas criavam uma espécie de revitalização de altos níveis de participação e interacção cujos
padrões se aproximavam dos ambientes que caracterizavam as classes anteriores nas quais o meio
de instrução fora a L1, segundo mostram os extractos 20 e 21.

Extracto 20: Ruw.DC5.051016

1. Prof. hoje vamos estudar sobre a relação que existe entre os seres vivos. vamos dizer seres vivos
2. Tur. ((coro)) seres vivos
3. Prof. seres vivos, seres vivos hi citshwa vali zvini kambe? amaseres vivos vali zvini? (seres vivos em citshwa como se
chamam? o que são seres vivos?)
4. Alu.2 zvihari zvohanya (são animais que têm vida)
5. Prof. a:::
6. Tur. ((outros voluntários levantaram as mãos))
7. Alu.3 zvihari zva wutomi (são animais com vida)
8. Prof. essa resposta, falta pouco só. quem vai completar, quem tem
9. Tur. ((alu.s com mãos no ar, suplicaram)) sou::: eu::: sou::: eu:::
10. Alu.4 zvihari zvokala wutomi (são animais que não têm vida)
11. Prof. seres vivos? ehe::: outra pessoa
12. Alu.5 zvihari zva lomu handle (são animais do meio ambiente)
13. Prof. mas loko hiku (quando dissemos) seres vivos (0.5) hiwulawula hi zvihari laha? (falamos dos animais aqui?)
14. Tur. ((uma parte responde)) não
15. Alu.6 zvilo zvohanya (são coisas vivas)
16. Prof. i yini? (o que são?)
17. Alu.6 zvilo zvohanya (são coisas vivas)
18. Prof. zvilo zvohanya. azvilo zvohanya zva kuyini? (são coisas com vida. que coisas?)

143
19. Tur. ((silêncio))
20. Alu.7 hitaku i (diremos são) seres vivos
21. Prof. ((risos)) hitaku i (diremos que são) seres vivos, ok, está bom. mas ka (na) 3ª classe higondzizile kuyin i (como
estudámos), o que nós dissemos sobre (.) seres vivos. ka (na)3ª classe hite yini kasi? (dissemos o quê?)
22. Tur. ((silêncio))
23. Prof. zvivangwa, amugondzagi zvivangwa n´wina? (são seres, vocês não estudaram os seres?)
24. Tur. ((coro)) higondzile (estudámos)
25. Prof. kuni zvivangwa zva yini ni zvivangwa zva yini? (temos seres o quê mais o quê?)
26. Tur. ((coro)) kuni zvivangwa zva wutomi ni zvivangwa zvokala wutomi (temos os seres vivos e seres não vivos)

Na classe anterior, os alunos aprenderam a distinção entre os “zvivangwa zva wutomi” (seres vivos)
e “zvivangwa zvokala wutomi” (seres não vivos), em L1. Nesta aula, o professor preconizava
relacionar os conceitos “seres vivos” e “zvivangwa zva wutomi”. Sem prévio aviso, o professor
solicitou propostas de conceitos de “seres vivos” em L1. Os alunos arriscaram-se a apresentar várias
propostas de equivalentes de “seres vivos” em L1, baseando-se na sua percepção sobre o tema da
aula “interdependência dos seres vivos”. A cena iniciou com a enunciação do tema da aula pelo
professor em (1) e a orientação da repetição pela primeira vez do termo “seres vivos” pelos alunos
e a seguir, questionou o equivalente em L1 (3). O alu.2 propôs um equivalente através da tradução
literal “zvihari zvohanya” (animais vivos), contudo o professor exclamou “ahhh”, em (5). Muitos
alunos levantaram as mãos e deste grupo, o alu.3 apresentou outra proposta de equivalente
“zvihari zva wutomi” (animais com vida) em (7) que é sinónimo à proposta do alu.2 sem que tivesse
sido escolhido pelo professor. O comentário do professor em (8) suscitou euforicamente gritos de
vários alunos que suplicavam “sou::: eu::: sou::: eu:::”, levando as mãos, pedindo a sua escolha. O
alu.4 propôs “zvihari zvokala wutomi” (animais sem vida), um antónimo das duas propostas
apresentadas anteriormente. A seguir, interveio o alu.5, em (12); alu.6, em (15) e o alu.7, em (20).
Por um lado, o professor criava espaços e oportunidades para a participação dos alunos que de
forma voluntária, livre e dinâmica expunham as suas propostas e, por outro lado, mediava e
apoiava os alunos a reflectirem com foco. Após a apresentação de diferentes propostas dos alunos,
a turma com o apoio do professor expôs em coro os dois tipos de seres vivos em L2 “zvivangwa
zva wutomi” (seres vivos) e “zvivangwa zvokala wutomi” (seres não vivos) em (26).
Da mesma forma, a revitalização da participação e da interacção dos alunos evidenciou-se também
na TC sempre que o professor recorria às práticas discursivas de translanguaging ocasionais. O
extracto que segue abaixo, ilustra como os alunos se apropriavam das oportunidades expostas pelo
translanguaging para exporem os seus conhecimentos em níveis de participação e de interacção
jamais constatados nas aulas em L2.

144
Extracto 21: Mikho.DC7.280916
1. Prof.a então temos o exemplo do rato, o rato ehhh para sobreviver o rato depende de quê?
2. Tur. ((silêncio))
3. Alu.9 °amendoim°
4. Prof.a come o quê?
5. Tur. ((coro de alguns alu.s)) AMENDOIM
6. Prof.a i::: amendoim, só?
7. Tur. ((coro)) comida
8. Prof.a comida, sim
9. Tur. ((alguns alu.s)) coco
10. Prof.a he:::?
11. Tur. ((coro)) coco
12. Alu.10 tomate
13. Prof.a quase - rato parece uma pessoa
14. Tur. ((risos de alguns alu.s))
15. Prof.a pode higikomparara na hina vanhu ahizvo? (compará-lo connosco seres humanos, não é?)
16. Tur. ahihi:::(não)
17. Prof.a giga zvotlhe hina vanhu higaku. mas para gihanya nagonawo gidependeri hi yini, hi moya. mas gihanya kwihi?onde
é que vive o rato? (come tudo quando nós os seres humanos comemos. mas para sobreviver também depende
de quê, de ar. onde vive? onde é que vive o rato?)
18. Tur. ((muitas vozes))
19. Alu.11 lomu bzwini (dentro da casa)
20. Prof.a gitshama lomu bzwini basi? (só dentro da casa?)
21. Tur. ((em coro forte)) AHIHI:::(não)
22. Prof.a ni kwihi kambe? (e aonde?)
23. Alu.12 ((rápidamente respondeu)) ni lomu ka mikhehe (nas tocas)
24. Prof.a ni lomu ka yini? (e dentro de quê?)
25. Alu.13 ((entre vozes)) °ni lomu ka hlanga°(e no caniço)
26. Prof.a ni lomu kwihi? (aonde?)
27. Tur. ((muitas vozes))
28. Alu.14ni lomu, ni lomu ka mikhehe (e dentro das tocas)
29. Prof.a lomu ka yini? (e aonde?)
30. Tur. ((coro)) ka mikhehe (nas tocas)
31. Prof.a basi? (só?)
32. Alu.15no lomu ka hlanga (e no caniço)
33. Prof.a ni lomu ka hlanga, ahizvo? (e no caniço, não é verdade?)

O extracto anterior retrata uma parte da aula relativa a “Interdependência dos seres vivos” na TC
na qual a professora decidiu, improvisadamente, aplicar as práticas de translanguaging com vista a
activar e a criar oportunidades de participação dos alunos e relançar a flexibilidade e o dinamismo
da aula. A participação e a interacção dos alunos neste extracto foram realizadas em duas partes,
inicialmente em L2 (1 a 13) e depois em L1 (15 a 32). Em ambas as partes, a professora incentivava
a participação dos alunos através das práticas de translanguaging e as de collateral learning e cross-cultural
border ao efectuar perguntas relacionadas com o meio local e os conhecimentos socioculturais dos
alunos. Nestas práticas, os alunos motivavam-se voluntária e flexivelmente a expor as suas ideias
fundamentalmente baseadas nos seus fundos de conhecimentos socioculturais. A título de exemplo,

145
a pergunta relacionada com os alimentos do rato em (1) suscitou o voluntarismo de dois alunos
(alu.9 e alu.10) que responderam activamente em L2 nos registos (3 e 12) respectivamente, ao passo
que nos registos (7 e 9) as respostas foram apresentadas em coro. Noutros registos (19, 23, 25, 28 e
32) participam flexivelmente 5 alunos (alu.11, alu, 12, alu.13, alu.14 e alu.15) que expunham
diferentes espaços nos quais vive o rato em L1 em resposta a uma pergunta efectuada em L2 (17).

5.2.1.2 Participação espontânea e competitiva

Os alunos capitalizavam as oportunidades concedidas pelas práticas de translanguaging de tal forma


que espontaneamente participavam na aula, levantando flexível e simultaneamente as mãos para
o ar, gritando a expressão “sou::: eu::: sou::: eu:::”, ficando de pé, predispondo-se a ajudar o colega
voluntário e intervindo continuamente um atrás do outro. Os alunos tinham a liberdade de
participar em qualquer uma das línguas na aula.
Na TAI de Ruwani, evidenciei que os alunos suplicavam incansavelmente a escolha pelo professor
para participar na aula. Em cada pergunta, os alunos gritavam “sou::: eu::: sou::: eu:::”, levantavam
as mãos e alguns ficavam de pé segundo ilustra o extracto 22.

Extracto 22: Ruw.DC5.100217


1. Prof. cabrito i yini? (o que é cabrito?)
2. Tur. mbuti (cabrito)
3. Prof. mbuti (cabrito). vamos, vamos muito rapidamente
4. Tur. ((mais uma vez os alu.s levantaram as mãos para o ar e suplicavam)) sou::: eu::: sou::: eu:::
5. Prof. ohhh vou escolher a quem?
6. Tur. sou::: eu::: sou::: eu:::
7. Prof. ((escolheu aAlu.10)) rápido (3x)
8. Alu.10 boi
9. (...)
10. Prof. está aonde?
11. Alu.10 está ali
12. Prof. boi em português, em citshwa i yini? (o que é?)
13. Tur. i homu (é boi)
14. Prof. ((escrevia no quadro e a tur. não cessava as mãos muito menos parava de suplicar)) sou::: eu::: sou eu:::
15. Prof. diga lá menina
16. Alu.11 mocho
17. (...)
18. Prof. está aonde?
19. Alu.11 ((apontou))
20. (...)
21. Prof. mocho ((escreveu no quadro)) mocho o que é em citshwa?
22. Tur. cikhovha (mocho)
23. Prof. cikhovha (mocho)
24. Tur. sou::: eu::: sou::: eu:::

146
25. Tur. ((os alu.s não paravam de manifestar a sua disposição para voluntariar-se massivamente))
26. Prof. vou escolher a alu. mais pequena ou mais pequeno. Disoni
27. Disoni, Alu.12 sapo
28. (...)
29. Prof. sapo em portuguêsi yini? (o que é sapo em português?)
30. Alguns alu. khele (sapo)
31. Prof. hele. khele (barata, sapo) ou hele (barata)?
32. Tur. khele (sapo)
33. Prof. he::: uma pessoa só
34. Tur. ((os alu.s levantaram as mãos e alguns ficam de pé aos gritos)) sou::: eu::: sou::: eu:::
35. Prof. não, diz uma pessoa, diga lá menina
36. Alu.13 khele (sapo)
37. Prof. khele, khele (sapo, barata)
38. Alu.14 sou::: eu:::
39. Prof. agora eu só vou indicar e vocês vão dizer. aqui o que temos
40. Tur. flor
41. Prof. ((escreveu no quadro)) flor
42. Alu.15 ((espontaneamente)) cifilori (flor)

Os alunos levantavam as mãos e suplicavam repetidamente “sou::: eu::: sou::: eu:::” e alguns ficam
de pé empolgados, motivados e alegres, e outros rogando a sua escolha com cara de pena. Todas
estas estratégias dos alunos visavam atrair a atenção do professor e garantirem a escolha. Em (4),
os alunos levantaram as mãos e pediram “sou::: eu::: sou::: eu:::”. O professor mostrava-se
perplexo, sem saber a quem escolher uma vez que todos voluntariavam-se simultânea e
espontaneamente (5). A tensão dos alunos baixou quando o professor em (7), escolhe o alu.10 que
interveio em (11), entretanto os alunos levantaram as mãos e suplicaram novamente “sou::: eu:::
sou::: eu:::” antes de o professor terminar o registo do par lexical “homu” (boi) no quadro (14). A
escolha da alu.11 (16) silenciou os voluntários, contudo após a intervenção desta, novamente
reactivou-se a súplica “sou::: eu::: sou::: eu:::” (24). Em (34) os alunos levantaram as mãos, gritaram
“sou::: eu::: sou::: eu:::” e ficaram de pé para referirem, com firmeza, o equivalente de sapo entre
“hele” (barata) e “khele” (sapo) a pedido do professor. Diante deste clima na aula, evidenciei um
aluno que após a turma ter nomeado em coro alto “cifilori” (flor) (40), não quis esperar a solicitação
de voluntário para traduzir “cifilori” para a L2. Enquanto o professor registava a resposta da turma
no quadro, o alu.15 espontaneamente apresentou o respectivo equivalente “flor” sem nenhuma
orientação do professor (41).
Os alunos voluntariavam-se massivamente e com altos níveis de flexibilidade, usavam as duas
línguas para nomear as imagens de seres vivos do seu meio sociocultural, porém em algumas
ocasiões nomeavam apenas em L1 sempre que desconhecessem o equivalente em L2. Nestas
situações, a aula baixava dos altos níveis de participação e de flexibilidade e os alunos ficavam

147
atentos para ouvir e repetir o novo léxico equivalente em L2 tanto da parte de alguns colegas como
da parte do professor.
Perante a participação espontânea dos alunos, os professores tentavam garantir a igualdade de
oportunidades de participação e intervenção de todos os alunos nas práticas de translanguaging que,
por um lado, permitiam a ponte e aprendizagem em duas línguas e, por outro lado, a negociação
e interligação dos significados e dos saberes na aula.
A participação espontânea nas aulas de TAI suscitava, discretamente, o fenómeno da competição
entre os alunos para participar na aula. Os alunos levantavam rapidamente as mãos e mantinham-
as levantadas por longo tempo e destes, alguns alunos ficavam em pé e gritavam repetidas vezes
em voz alto “sou::: eu::: sou::: eu:::”, suplicando ininterruptamente a escolha pelo professor. Os
alunos competiam e disputavam uns com os outros responder às perguntas feitas pelos professores.
Eram momentos muito tensos nos quais os professores deparavam com sérias dificuldades para a
escolha dos alunos voluntários dentre vários que se predispunham levantando as mãos, ficam de
pé e suplicando incansavelmente “sou::: eu::: sou::: eu:::”.
O extracto 23 evidencia a competição entre os alunos voluntários da TAI de Ruwani e uma
situação de um aluno que, espontaneamente interveio sem que tivesse sido escolhido pelo
professor, superando os colegas que levantavam as mãos e suplicavam persistentemente a escolha
pelo professor.

Extracto 24: Ruw.DC8.211016


1. Prof. de quê falamos na última aula de Ciências Naturais?
2. Saulani, alu.1 ((rapidamente levantou a mão))
3. Prof. não devia ser mesma pessoa. outra pessoa. não devia ser Saulani
4. Tur. ((4 alu.s levantaram simultaneamente as mãos e suplicavam)) sou::: eu::: sou::: eu:::
5. Bitwani, alu.2 ((levanta-se sem a autorização do prof.)) na última aula –
6. Prof. Bitwani, (...) desculpa te cortar. levanta a mão, não é isso? tá bom, fala lá
7. Alu.1 ((folheando o livro respondeu)) na última aula de Ciências Naturais falamos de – ((folheava o livro para
ver o tema da aula anterior))
8. Tur. ((os outros alu.s folheavam rapidamente as páginas do livro. 7 alu.s levantaram as mãos e predispuseram-
se)) sou::: eu::: sou::: eu:::
9. Prof. falamos de quê, falamos de quê Bitwani?
10. Alu.2 Bitwani ((folheava atrapalhado as páginas do livro))
11. Prof. a::: está ver senão tivesse levantado logo agora estaria a folhear o livro
12. Tur. ((muitos alu.s levantaram as mãos para o ar, suplicando))>sou::: eu::: sou::: eu:::<

À primeira pergunta do professor, Saulani levantou espontaneamente a mão superando os demais


colegas que ainda abriam os livros para certificar o tema da aula anterior, consultando o livro

148
escrito em L2. A advertência anunciada pelo professor, em (3), concedeu uma oportunidade a 4
alunos que, simultaneamente, levantaram as mãos e suplicaram repetidas vezes “sou::: eu::: sou:::
eu:::” (4). Inesperadamente, Bitwani alu.2 (em 5) pôs-se de pé sem que tivesse sido escolhido pelo
professor e iniciou a resposta contudo, o professor interrompeu-lhe em (6), aconselhando-lhe a
levantar a mão sempre que tiver o interesse em participar na aula. Pese embora o professor o tenha
autorizado a participar, Bitwani não completou a sua resposta, tendo recorrido ao livro que o
folheava às pressas e atrapalhado segundo ilustram os registos (7 e 10). Espontaneamente, 7 alunos
voluntariaram-se com os livros abertos, mãos no ar e expressando a sua disponibilidade
persistentemente em voz alta “sou::: eu::: sou::: eu:::” (8). O professor persistia para que Bitwani
anunciasse o tema da aula passada (9), no entanto Bitwani continuava a folhear o livro
descontrolado, segundo ilustra o registo em (10). Diante desta demora do Bitwani, diferentes alunos
suplicavam repetidas várias vezes, com as mãos no ar “sou::: eu::: sou::: eu:::”, gerando alguma
agitação e algum barulho na turma (12).
Ora, este fenómeno manifestou-se também na TAI de Citimela, envolvendo dois alunos que,
segundo ilustra o extracto 24, voluntariavam-se para responder à pergunta formulada pelo
professor ao invés de discutirem a resposta com os colegas.

Extracto 24: Citi.DC10.200317


1. Prof. por que é que esses alimentos aqui apodreceram?
2. Alu.1 ((levantou a mão))
3. Prof. ((orientou a tur. para discutir e alcançar consensos aos pares ou tríplas))
4. Alu.2 ((levantou a mão))
5. Tur. ((os alu. discutiam aos pares e tríplas))
6. Prof. porquê é que esses alimentos aqui apodreceram?
7. Alu.1 e alu.2 ((continuavam com as mãos levantadas))
8. Prof. não, conversem entre vocês. (0.7) hasikota kubwabwata ngu cilungu, hasikota kubwabwata ngu cicopi (podemos
intervir em português ou em cicopi), ok?
9. Tur. sim
10. Prof. podemos começar (2x)?
11. Tur. SIM (2x)
12. Prof. ok. voluntarios?
13. Tur. ((11 alu.s levantaram as mãos e destes 4 ficaram de pé com as mãos no ar))
14. Prof. primeiro voluntário?
15. Prof. menina diz lá, porquê é que os alimentos apodreceram?
16. Alu.1 ((envergonhada)) sidosina, khungu, sikhalidi quinta-feira até m´mhunu (apodreceram porque permaneceram
de quinta-fera até hoje)

No extracto acima, o professor perguntou por que os alimentos expostos na aula estavam podres.
Rapidamente, o alu.1 levantou a mão (2). O professor orienta os alunos a discutirem em grupos de
carteiras. De imediato, mais um aluno, o alu.2 levantou a mão desacatando a orientação do

149
professor (4) e mantendo-a no ar (7), enquanto os demais alunos discutiam entre si. A iniciação da
sessão de respostas suscitou o levantamento simultâneo, rápido e silencioso de 11 mãos de alunos
voluntários dos quais 4 estavam de pé (13), demonstrando uma clara evidência de competição entre
os alunos ainda que a pergunta tivesse sido feita em L2. Em (16) a alu.1 escolhida pelo professor
interveio acertadamente usando a L1 “sidosina, khungu, sikhalidi quinta-feira até m´mhunu”
(apodreceram porque permaneceram de quinta-feira até hoje), demonstrando a aplicação das
experiências e vivências socioculturais para explicar as causas da putrefacção dos alimentos numa
clara evidência da pedagogia de cross-cultural border e collateral learning.
As minhas constatações nas aulas da TC evidenciavam cenários totalmente contrários aos que
observara nas TAI. Em todos os cenários de aulas (p.e cenários de voluntarismo moderado e
participado por alguns alunos da TC nos momentos em que o professor usava a L1 e abordava
elementos relacionados com as vivências, experiências e realidades do meio sociocultural) observei
que o voluntarismo dos alunos nunca era espontâneo e competitivo segundo ilustra o extracto 25.

Extracto 25: Mikho.DC5.050816


1. Prof.a o que é que vimos na aula passada?
2. Rukanyani, alu.1 ((a voluntária de sempre, leu no livro)) “aula passada vimos estados físicos das substâncias”
3. Prof.a falamos dos estados físicos das subs - tâncias. quais são esses estados físicos das substâncias?
4. Alu.1 ((lendo)) “os es– estados físicos das substâncias, encontra-se três estados a saber, esta- do, estado sólido
e apresenta formas variável e volume constante, estado líquido que mante o mesmo volume e tem forma
variável, variável, estado gasoso onde o objecto (0.5) não tem forma (0.3) própria nem volume indeterminado”
5. Prof.a ihi::: outro voluntário
6. Tur. ((silêncio))
7. Prof.a outro voluntário (0.4)
8. Alu.2 ((lendo)) “na aula passada falamos dos (.) esta- (0.15)”
9. Prof.a hi::: fala
10. Alu.2 =físico, os substâncias encontram-se - (0.10)
11. Prof.a não consegue ler o que você escreveu. hi:::?
12. Alu.2 ((silêncio))
13. Tur. ((Silencio))
14. (...)
15. Prof.a então fala lá oralmente, o que é que vimos na aula passada, sem ver no caderno? (...) primeiro temos
o estado -
16. Alu.2 ((tímida e insegura)) ↓<líquido>
17. Prof.a líquido, sim
18. Alu.2 (0.5)
19. Prof.a depois outro estado
20. Alu.2 ((silêncio))
21. Prof.a hi:::? HE:::? estado?
22. Alu.2 <gasoso>
23. Prof.a gasoso, sim
24. (...)
25. Alu.2 ((silêncio))
26. Prof.a só

150
27. Alu.2 ((silêncio))
28. Prof.a é::: Xitilu, quais são os estados físicos das substâncias que aprendemos na aula passada
29. Xitulu alu.3 ((com caderno nas mãos, tentou ler mas ficou em silêncio durante (0.13))
30. Prof.a hi:::
31. Alu.3 ((silêncio))
32. Prof.a Wuyani
33. Wuyani, alu.4 ((com caderno nas mãos respondeu em voz inaudível)) ( )
34. Prof.a estado↑
35. Alu.4 <°sólido°>

A participação dos alunos da TC não foi espontânea muito menos competitiva. Os alunos
recorriam inseguramente à leitura e ou consulta dos apontamentos da aula anterior registados nos
cadernos, conforme mostram os registos (4, 8 e 10). Após a advertência da professora em (15), o
alu.2 mencionou os estados físicos das substâncias com compassos de silêncios e de pausas (18, 25
e 27). O alu.3, não obstante a advertência da professora, recorreu ao caderno para apresentar o
estado sólido em voz baixa (33) e alta em (35).
No prosseguimento da aula, os alunos não manifestaram nenhuma disponibilidade voluntária e
espontânea para apoiar o Roni, alu.5, que não respondia a uma pergunta formulada pela
professora em (36) conforme ilustra o extracto 26.

Extracto 26: Mikho.DC5.050816


36. Prof.a Roni, quando é que é::: (0.3) como é que é (0.20) – ((Prof.a pausou 0.20 para reformular a pergunta)
= Roni o que apresenta o estado sólido?
37. Roni, alu.5 ((não se levantou nem disse nenhuma palavra))
38. Prof.a hi:::?
39. Alu.5 ((silêncio))
40. Prof.a porquê apresenta o estado sólido?
41. Alu.5 ((não se levantou, ficou emsilêncio 0.6))
42. Prof.a >seja rápido, seja rápido, levanta-te<
43. Alu.5 ((não se levantou))
44. Tur. ((silêncio))
45. Prof.a ((perto da Roni)) o estado sólido das substâncias, apresenta o quê?
46. Alu.5 ((silêncio))
47. Prof.a hi:::? o que apresenta?
48. Alu.5 ((silêncio 0.15))
49. Alu.5 ((respondeu sentado e incompreensivelmente))
50. Prof.a >levanta, levanta. não é para falar sentado<
51. Alu.5 ((de pé e lendo)) °“representa invariável (.) e o volume (.) corres - (...) o -°
52. Prof.a senta lá

Conforme mostram os registos acima, Roni mantinha-se em silêncio tal que não se levantou (37,
39, 41) mesmo insistido pela professora (38, 40, 42, 45, 47). A turma, por sua vez mantinha-se num

151
profundo silêncio até que Roni recorreu ao caderno, leu incorrentamente (51) e sentou-se sob a
orientação da professora (52).

5.2.1.3 Discurso dominante em L2 e o impasse à participação

Os alunos registavam baixos níveis de participação e de interacção sempre que os professores


discursavam excessiva e exclusivamente em L2 sem a inclusão da L1 e ou sem o discurso de
translanguaging. Neste ambiente, os professores forçavam a participação e interacção dos alunos. Os
poucos que se voluntariavam e participavam eram nomeados pelos professores e respondiam em
voz baixa, inseguros e tímidos. Este cenário superava-se com o uso da L1 e/ou com a exploração
de ambas as línguas na aula.
O extracto 28 reflecte uma evidência de uma aula da TAI de Ruwani na qual, os alunos
interpretavam um texto bilingue sobre a pesca10. A aula desenvolveu-se num discurso em L2
durante 28 minutos. O professor formulava perguntas de interpretação do texto apenas em L2. A
participação dos alunos não era espontânea, aberta e livre e, consequentemente, poucos alunos
predispunham-se para participar na interpretação do texto bilingue.

Extracto 27: Ruw.DC4.300816


1. Prof. de que fala o primeiro texto?
2. Alu.1o primeiro texto fala de pescar
3. Alu.2 o texto fala de animais da água
4. Prof. outra pessoa
5. Tur. ((não reage))
6. Prof. fala dos animais da água. certo mas o que é que acontece com esses animais da água nesse texto aqui.
alguém vai levantar? têm alguma ideia?
7. Tur. ((não reage, fica em silêncio incomum nesta turma))
8. Prof.a hiwulawuleni. hambi hi citshwa ahihlamuseleni. muzvizwile? (vamos participar. podem usar citshwa.
entenderam?)
9. Tur. sim
10. Prof.a ndzimibzwelangi zvaku pode miwulawula hambi hi citshwa? ahihlamuseleni, usuka unyima uhlamusela. ahizvona?
(já adverti que podem falar mesmo em citshwa? vamos esclarecer, levantar e explanar, não é isso?)
11. Tur. sim
12. Prof. himani anga ni gezu. atexto leyi yiwulawula hi yini? (quem tem algo a dizer. de quê é que fala este texto?)
13. Tur. ((9 alu.s levantaram as mãos))
14. Alu.3 ((levantou-se e iniciou a resposta)) a texto – (o)
15. Prof. ((mandou-lhe esperar para intervir o outro colega que levantou a mão))
16. Alu.4 a texto leyi yiwulawula hi zvihari zva lomu matini (este texto fala sobre os animais aquáticos)
17. Prof. yiwulawula hi zvihari zva lomu matini (fala dos animais aquáticos). muito bem, pode sentar. este texto fala
dos animais a:quá:ticos. está bom. fala dos?

10 Nesta aula, os alunos tiveram acesso a um texto bilingue que traduzimos com o objectivo de incentivar a leitura
bilingue e analisar a participação dos alunos nas actividades de interpretação textual.

152
18. Tur. ((completa em coro)) >animais aquáticos<

A interpretação do texto bilingue não era dinâmica e muito menos flexível em L2. Apenas dois
alunos (2, 3) intervieram em resposta a uma pergunta do professor formulada em (1). Nos registos
(5 e 7) os alunos não mais intervieram, não obstante a persistência do professor em (4 e 6).
Entretanto, quando o professor advertiu a turma para usar a L1 na aula (8 e 10), 9 alunos
levantaram simultaneamente as mãos, predispondo-se a participarem na interpretação do texto
em L1 (13). Sem a escolha do professor, o alu.3 levantou-se espontaneamente para intervir,
contudo o professor tinha escolhido o alu.4 que em L1 respondeu “a texto leyi yiwulawula hi
zvihari zva lomu matini” (este texto fala sobre os animais aquáticos) (16). Sempre que os professores
desenvolviam a aula num discurso excessivamente baseado em L2, os níveis de participação e a
interacção dos alunos baixavam, porém o uso da L1 e ou do translanguaging reactivavam-nos
espontânea e voluntariamente. Desta forma, os alunos que outrora não participavam e não
interagiam em resposta às perguntas dos professores viam a prática de translanguaging como uma
ferramenta pedagógica de extrema relevância no que concerne à facilitação da participação
interactiva e ou discursiva nas aulas.

153
CAPÍTULO 6. Translanguaging, conhecimentos socioculturais, participação
e interacção no ensino-aprendizagem

Introdução

Na I fase da pesquisa, desenvolvi experiências de práticas de translanguaging com alunos do III


trimestre que tinham experiências de dois trimestres de ensino-aprendizagem em L2, cujos
resultados contribuíram para a planificação da II fase da pesquisa de práticas pedagógicas baseadas
no translanguaging, collateral learning e cross-cultural border. Neste capítulo descrevo os resultados que
observei ao longo do decurso dos ciclos de pesquisa-acção referentes à II fase de pesquisa
desenvolvida com base em ciclos de pesquisa-acção e de práticas pedagógicas de translanguaging,
collateral learning e cross-cultural border com alunos bilingues emergentes que iniciavam o I semestre da
4ª classe após 3 classes de experiências de instrução em L1 e aprendizagem da oralidade da L2
mais um ano (3ª classe) de iniciação da escrita em L2 a partir de habilidades desenvolvidas em L1.
Nesta fase, recorri à definição dos critérios e dos padrões de julgamento em cada planificação do
ciclo de pesquisa-acção (McNiff & Whitehead 2006, 2010) que, a posterior, me permitiam reflectir
sobre os resultados que observava tanto nas aulas das TAI´s como nas aulas da TC.

6.1 Ciclos I e II: Despertar a participação aberta e flexível dos alunos

No início da II fase observei 7 aulas relativas ao tema “Principais partes do olho” leccionadas
exclusivamente em L2 nas três EPC´s da pesquisa (4 aulas nas TAI´s e 3 aulas na TC) com o
objectivo de, por um lado, avaliar as atitudes dos alunos bilingues emergentes no que concerne a
participação e interacção nas aulas, níveis de flexibilidade e de dinamismo do ensino-
aprendizagem e, por outro lado, validar mais uma vez o problema de pesquisa com alunos que
iniciavam a transição de L1 para L2 justamente no início do I semestre da 4ª classe. As conclusões
a que cheguei evidenciavam que as aulas eram muito pobres sob o ponto de vista de promoção de
oportunidades de participação e da interacção professor – alunos na aula bem como inflexíveis e
monótonas. Os alunos enfrentavam sérias dificuldades para participar da aula, respondendo as
perguntas dos professores em L2, apresentavam um clima de medo, baixavam as caras,
mostravam-se desconfortáveis, apreensivos, desmotivados, inseguros, hesitantes e horrorizados

155
sempre que os professores efectuavam persistentemente perguntas abertas em L2. Diante deste
cenário, os professores centralizam a aula, adoptam estratégias discursivas e expositivas em L2 e
algumas vezes em L1, dirigiam perguntas fechadas de respostas do tipo “sim/ não”, orientavam a
repetição e o coro para garantir o progresso da aula, colocando os alunos participar de forma
passiva e disfarçada. Numa média de 30 alunos por turma, somente 2 a 3 se voluntariavam
constantemente para participar na aula, respondendo às perguntas dos professores em L2 ao passo
que os restantes mostravam-se indispostos. Perante este cenário, os professores eram obrigados a
nomear ou a indicar alguns alunos para se voluntariarem, contudo uns levantavam-se, mas os
outros mantinham-se sentados. Dentre os alunos que se levantavam, uns calavam-se e outros
murmuravam em voz baixa, tímidos, inseguros e hesitantes. No entanto, quando os professores
usavam ligeiramente a L1 na aula, todos os alunos reagiam predispondo-se a participar e a
interagir voluntariamente, dinamizando e flexibilizando a aula. Este cenário durava até no
momento em que os professores retornavam ao discurso de aula em L2, pois retomavam
novamente as estratégias de participação passiva e mostravam-se indispostos a participar na aula.
Estas constatações e evidências propus-as à análise e à reflexão dos co-investigadores das duas
EPC´s de Acção Inovadora e planificámos o I ciclo de aulas referente ao conteúdo “Cadeia
alimentar - Interdependência entre os seres vivos” cuja leccionação, observação e reflexão seria
com base nos critérios e padrões de julgamento patentes na tabela 4. O ciclo previa promover as
práticas discursivas baseadas no translanguaging e criar um ambiente, um clima de sala de aula que
despertasse a participação aberta, livre, espontânea, activa e colaborativa dos alunos na aula.

Tabela 4: Critérios e padrões de julgamento de aulas dos ciclos I e II


Ciclo: I e II
Conteúdo: Cadeia alimentar - Interdependência entre os seres vivos
Título do ciclo: Despertar a participação aberta dos alunos na aula
Pergunta de pesquisa do ciclo: Como a L1 e a L2 impulsionados pelos prof. activam a participação
flexível, aberta e activa dos alunos?
Critérios Padrão de julgamento

1. Participação espontânea, aberta e activa 1. Nível de participação voluntário dos alunos


voluntários
2. Disposição e motivação dos alunos emintervir
na aula 2. Livre expressão dos alunos

156
3. Interacção conversacional prof. - alunos e 3. Participação segura e activa dos alunos
alunos - prof.
4. Colaboração dos alunos na aprendizagem
4. Aprendizagem colaborativa baseada em duas
línguas 5. Facilitação da aprendizagem em duas línguas

5. Livre participação dos alunos 6. Tom de voz usado (baixo, médio e alto)

A análise dos resultados deste ciclo aplicado nas duas TAI partia da pergunta da pesquisa e
estendia-se aos critérios e aos padrões de julgamento em confrontação com os resultados da TC.
O conteúdo do ciclo era próximo das realidades socioculturais e quotidianas dos alunos de ambas
TAI´s e de TC. A sua leccionação integrou, sob forma de recapitulação, os seres vivos e os seres
não vivos abordados em L1 na 3ª classe.

6.1.1 Reacção dos alunos às primeiras práticas do translanguaging na aula

A planificação das primeiras aulas para as TAI´s previa a exploração pedagógica das práticas
discursivas baseadas em translanguaging e a aproximação da aula às realidades, aos conhecimentos
e aos recursos socioculturais locais. Os alunos exibiram, pela primeira vez, atitudes de participação
e de interacção na aula. Em ambas TAI´s os alunos demonstraram que são capazes de participar
e interagir na aula de forma construtiva e flexível na aula desde que se promovessem as práticas
discursivas de translanguaging e se explorassem as realidades e os conhecimentos socioculturais locais
através das práticas pedagógicas de collateral learning e cross-cultural border.

6.1.1.1 Silêncio e voz baixa

Os primeiros momentos das aulas iniciais nas duas TAI´s foram marcados por atitudes de receio,
estranhamento e hesitação dos alunos diante das oportunidades promovidos pelos professores para
que participassem na aula, respondendo as perguntas relacionadas com as realidades socioculturais
locais num discurso baseado no translanguaging. Os alunos activaram o silêncio tanto nas perguntas
de recapitulação feitas num discurso em L2 como nas formuladas num discurso em L1.
Os extractos 28 e 29 ilustram os cenários de silêncio dos alunos das TAI´s de Citimela e de Ruwani
no acto da recapitulação dos conhecimentos sobre os “seres vivos” aprendidos na 3ª classe em L1.
Não obstante os professores efectuarem perguntas em L1, os alunos mantiveram-se em silêncio

157
contínuo diante de várias perguntas diferentemente dos alunos da TC de Mikhokhweni. A título
de exemplo, o extracto 28 ilustra um contínuo silêncio dos alunos da TAI de Citimela a diversas
perguntas do professor feitas em L1 e em L2 sobre a recapitulação de “siwumbwa sa wutomi”
(seres vivos) aprendidos na classe anterior em L1.

Extracto 28: Citi.DC3.060217


1. Prof. então hoje, vamos lembrar antes da nossa aula, aquilo que estudámos na 3ª classe sobre os seres –
((interrompe para os alu.s em coro, o fazem)) = vivos estamos juntos?
2. Tur. ((silêncio))
3. Prof. estamos juntos?
4. Tur. ((alguns alu.s) sim
5. Prof. todos sabemos o que são seres vivos?
6. Tur. ((silêncio))
7. Prof. sabemos o que são seres vivos? heee quem sabe o que são seres vivos?
8. Tur. ((silêncio))
9. Prof. o que são seres vivos?
10. Tur. ((silêncio))
11. Prof. não estudaramisso na 3ª classe isso?
12. Tur. ((silêncio))
13. Prof. estudaram na 3ª classe ou não?
14. Tur. ((silêncio))
15. Prof. quem sabe?
16. Tur. ((silêncio))
17. Prof. siwumbwa sa wutomi, masiziva (3x)? (conhecem os seres vivos?)
18. Tur . ((silêncio))
19. Prof. he:::: migondidi siwumbwa sa wutomi?he::: ? (he::: aprenderam os seres vivos? he:::?)
20. Tur. ((silêncio))
21. Prof. i cani siwumbwa sa wutomi? (o que são seres vivos?)
22. Tur. ((silêncio))
23. Prof. he:::? i cani siwumbwa sa wutomi? ou um menino para dar um exemplo wa siwumbwa sa wutomi asizivaku
(he:::? o que são seres vivos? ou um menino para dar um exemplo de seres vivos que conhece)
24. Tur. ((silêncio))
25. Prof. he::: ciwumbwa cokari ciku ni wutomi, acizivaku kasi hingagonda ka 3ª (he::: um sere que tem vida dentre os que
conhece e ou que aprendemos na 3ª classe)
26. Tur. ((silêncio muito forte))
27. Prof. vamos falar
28. Tur. ((silêncio))
29. Prof. siwumbwa siku ni wutomi misizivaku (conhecem os seres que têm vida)
30. Tur. ((silêncio))
31. Prof. khamisizivi siwumbwa sa wutomi? heee bhonyani por exemplo, mayiziva bhonyani? (não conhecem seres vivos?
heee… ratazana por exemplo, conhecem a ratazana?)
32. Tur. ((silêncio))
33. Prof. mayiziva bhonyani? (conhecem a ratazana?)
34. Tur. ((alguns alu.s)) hi::: (si::m)
35. Prof. i cani bhonyani? (o que é ratazana?)
36. Tur. ((silêncio?))
37. Prof. he::: i cani bhonyani? he:::(he::: o que é ratazana? he:::)

158
Os alunos activaram um silêncio contínuo. Não interagiam e não participavam nem em L1 muito
menos em L2. Entre os registos (1 a 16), o professor persistia, mas os alunos não participavam
porque não sabem o que significam os “seres vivos”. Dentre os registos (17 a 37) o professor
transitou para a L1, anunciou o conceito “siwumbwa sa wutomi” (seres vivos) para recordar aos
alunos uma vez terem aprendido em L1 na 3ª classe, porém calaram continuamente. Nenhum
aluno se predispunha a participar em qualquer que fosse a língua, contrariando a planificação da
qual se esperava que os alunos participassem activamente, interligando através de uma ponte
nocional ou lexical entre o conceito “siwumbwa sa wutomi” em L1 e o conceito “seres vivos” em
L2.
Na TAI de Ruwani, o professor sensibilizou os alunos para que participassem interagindo e ou
discursando através da língua que lhes conviesse, isto é, usando práticas de translanguaging na aula.
Na primeira reacção dos alunos, evidenciei que participavam, mas com algum receio, hesitação,
em voz baixa e depois calavam-se segundo ilustra o extracto 29.

Extracto 29: Ruw.DC3.080117


1. Prof. ok, se laha ahi ahipimiseni kwhatsi. ndzativa zvaku a::: lembe gingahundza (vamos pensar cuidadosamente. sei
que no ano passado) quando vocês estavam na 3ª classe, vocês aprenderam umas coisas que se chamam
zviwangwa zva – (seres)
2. Alu.1 °zva wutomi° (vivos)
3. Prof. he::: zviwangwa zva – (he::: são seres?)
4. Tur. wutomi (vivos)
5. Alu.2 = zva wutomi (vivos)
6. Prof.a hiwulawuleni zvizvala kwatsi. loko muwulawula hasi na mina ndziwulawula hasi. zvivangwa zva yini -? (falem em
alto. se falarem baixo também vou falar baixo. são seres?)
7. Tur. ZVA WUTOMI (VIVOS)
8. Prof. zivangwa zva wutomi. i yini zviwangwazva wutomi? (são seres vivos. o que são seres vivos?)
9. Tur. ((silêncio reflexivo 0.5))
10. Prof. loko ulava kuwulawula tlakusa a woko uwulawula (se deseja falar deve levanta a mão) ok. quem quer falar?
11. Tur. ((alguns alu.s hesitavam))
12. Prof. ((convidou uma alu. que hesitava)) parece que quer falar, fala lá. i yini zvivangwa zva wutomi? (o que são
seres vivos?)
13. Alu.3 ((silêncio))
14. Tur . ((risos de alguns alu.s))
15. Prof. ahhh mais outro voluntário, quem quer falar? zvivangwa zva wutomi (seres vivos) pode falar em português,
pode falar em citshwa
16. Tur . ((silêncio))

Em (1) o professor orientava a recapitulação sobre os “zvivangwa zva wutomi” (seres vivos)
aprendidos na classe anterior em L1, recorrendo à estratégia de terminação “zvivangwa zva –“

159
(seres – ) em coro contudo, apenas o alu.1 em (2) completou em voz baixa “zva wutomi” (vivos).
Na insistência do professor (3), a turma repetiu em coro baixo “wutomi” (vivos) em (4). A
participação dos alunos era tão fraca que o professor advertiu-lhes para que falassem em voz alta
em (6). No seguimento da aula, os alunos activaram o silêncio perante a pergunta “i yini zvivangwa
zva wutomi?” (o que são seres) formulada em L1 segundo mostra o registo (8). Desde esta pergunta,
os alunos activaram o silêncio e quando o professor os motivava a respondê-la (10), alguns alunos
hesitavam em voluntariar-se (11). O alu.3, convidado a responder, ficou em silêncio (13) e a turma
riu-se numa clara demonstração de medo e insegurança (14). Os alunos não mais participaram
mesmo após o professor ter-lhes dado a liberdade e a oportunidade de usar a L1 (15).
A dificuldade enfrentada pelos professores das duas TAI´s para activar a participação e a
interacção activa, colaborativa e liberal dos alunos com base nas práticas discursivas de
translanguaging não se evidenciou de igual forma na TC. A professora nesta turma desenvolvia a
aula discursando em translanguaging ocasional, uma prática comum nesta turma. Os alunos
participavam passivamente respondendo em coro tanto em L1 como em L2, conforme ilustra o
extracto 30.

Extracto 30: Mikho.DC5.100217


1. Prof. na 3ª classe, falamos de seres vivos, azvivangwa lezvi zvinga ni yini? (são seres que têm o quê?)
2. Tur. ((coro de alguns alu.s)) ni wutomi (vida)
3. Prof. vamos falar todos ha:::
4. Tur. ((coro forte)) [zvinga (que têm)
[ni wutomi (vida)
5. Prof. zvivangwa lezvi zvinga ni wutomi hi cilungu lezvi vange seres vivos. estamos juntos? (os seres que têm vida em
português são chamados por seres vivos. estamos juntos?)
6. Tur. sim
7. Prof. hi cilungu vale i yini? (como se chamam em português?)
8. Tur. ((coro)) são seres vivos
9. Prof. ((induzindo a tur. para repetir em coro)) são seres vivos
10. Tur . ((coro)) são seres vivos
11. Prof. então os meninos conhecem seres, alguns exempos de seres vivos, dizer isto aqui é um sere vivo (...)
himani andzibzwela civangwa cin´wi acitivaku cinga ni wutomi (quem pode me dizer um sere vivo), que é exemplo
de um sere vivo
12. Alu.1 °porco°
13. Prof. animais, vamos dizer animais, vamos dizer porco, galinha isso aí é muito (...) então dizemos que, os
animais (.) são seres vivos (.) porquê?
14. Tur. ((quieta))
15. Prof. hile (dissemos que) é um sere vivo porquê?
16. Tur. [((murmurou em voz baixa))
[((alguns alu.s responderam)) hi leci cinga ni wutomi (é aquele que tem vida)

160
Durante a recapitulação do conteúdo da classe anterior em (1), a professora anunciou o conceito
“seres vivos” em L2 e expôs parcialmente a definição “zvivangwa lezvi zvinga ni yini?” (são seres
que têm o quê?) exigindo que os alunos a completassem com base na terminação “ni wutomi”
(vida) segundo ilustra o registo (2). Em (3) a professora adverte que todos falassem contudo, alguns
alunos responderam em coro “zvinga” (que têm) outros “ni wutomi” (vida) (4). De seguida, em (5),
a professora estabeleceu a equivalência entre a definição “zvivangwa lezvi zvinga ni wutomi” (seres
que têm vida) e o conceito em L2 “seres vivos” e perguntou a turma com o objectivo de que
repetisse em coro “seres vivos” (8, 9, 10). Relativamente à pergunta que exigia a justificação da
razão dos animais serem seres vivos em (13), os alunos calaram-se (14). A insistência da professora
em (15) resultou no murmúrio da turma em voz baixa e a seguir, alguns alunos responderam em
L1 “hi leci cinga ni wutomi” (é aquele que tem vida) em (16).

6.1.1.2 Participação discreta e às escondidas

No seguimento da primeira aula nas TAI´s, a participação dos alunos observou uma tendência
potencialmente crescente. Após um momento inicial pedagogicamente marcado pela difícil
adaptabilidade dos alunos aos ambientes de práticas de translanguaging evidenciei nos momentos
subsequentes desta aula, os primeiros sinais de alguma abertura dos alunos aos ambientes de
diálogo e de participação activa na aula. Os alunos participavam discretamente e com algum
medo, havendo inclusive alguns que participam às escondidas, isto é, sem dar a cara. Os alunos
sentiam-se cada vez mais confiantes, superavam o medo e sentiam-se mais confortáveis e
motivados para participar activa e livremente na aula e em qualquer língua.
Na aula da TAI de Ruwani o professor liberalizou o uso de duas línguas e incluiu 3 materiais da
realidade sociocultural local (boi, milho e pedra) com o objectivo de classificar os seres vivos e os
seres não vivos. Conforme evidencia o extracto 31, os alunos predispunham-se a participar, mas o
faziam às escondidas, em voz baixa e num ambiente de medo.

Extracto 31: Ruw.DC4.080217


1. Prof . ((com as pedras nas mãos)) ok. hitasangula hi kuwula (comecemos por dizer) o que vocês estão a ver no --
o que é isto aqui primeiro? lezvi (isto) ((referia-se aos diferentes seres vivos e não seres vivos expostos no fundo
do quadro))
2. Alu.3 ((em voz baixa))°i maribzwi° (são pedras)
3. Prof. he:::?
4. Tur. ((interveio incompreensivelmente em coro))

161
5. Prof. ((insistiu)) o que é isto?
6. Alu.1 ((tímida e em voz baixa))°pedra°
7. Prof. a::lto he:::
8. Alu.1 ↑pedra
9. Prof. hi mani angawula ku pedra (quem disse pedra)
10. Alu.2 ((vergonhada e tímida fecha a cara com as duas mãos))
11. Prof. ahhh já mafihlala. ufihlalela yini?wocava kuwula ipedra leyi. i pedra ayizvona? (ahhh agora escondem-se. por
quê se esconde? tens medo de dizer que é isto é pedra não é?)
12. Tur. ((voz baixa)) °sim°
13. Prof. seno mun´wanyani awulile hi citshwa ? (deste lado alguém disse em citshwa?)
14. Tur. ((os alu.s suspeitavam-se um com os outros com medo de responsabilizar-se pelo que diziam as
escondidas))
15. Prof. prontos, mina ndzitatsala laha. pedra wena uku yini? (prontos, vou escrever aqui. e tu o que dizeste?)
16. Alu.3 ((riu e depois disse)) maribzwi (pedras)
17. Prof. pedra maribzwi. seno kun´wanyani muwona yini? (pedras deste lado o que viram?)
18. Tur. ((coro)) homu (boi)
19. Prof. homu. a homu hi cilungu i yini? (boi. como se chama boi em português?)
20. Tur. ((coro alto)) BOI
21. Prof. boi. homu i yini? (o que é boi?)
22. Tur. boi
23. Prof. e depois o que tem lá fundo
24. Tur. maçaroca
25. Alu.4 ((em voz baixa))°milho°
26. Prof. ((escrevendo no quadro)) maçaroca. kuni lweyi angagu (alguém disse) milho, quem disse milho por aqui
27. Alu.5 hi Luwani (é a Luwani)
28. Luwani, alu.4 recusa-se: ehi:::(não:: fui eu::)
29. Prof. maçaroca. maçaroca, como se chama em citshwa?
30. Tur. cipfhak i (maçaroca)
31. Prof . ((escreveu no quadro)) cipfhaki, cipfhaki (milho, milho)

Os alunos participam voluntariamente em ambas as línguas, contudo usavam a voz baixa,


mostravam-se tímidos e envergonhados tal que em algumas ocasiões não assumiam a autoria das
suas respostas. Em (2) interveio a alu.1 em L1 e em voz baixa nomeando um dos materiais
didácticos que o professor detinha na mão “maribzwi” (pedras). O professor solicitou
implicitamente a repetição em voz alta (3), mas a alu.1 calou-se e a turma respondeu
incompreensivelmente em coro (4). O professor questionou persistentemente (5), a turma calou-se
e depois reapareceu novamente a alu.1 que, em (6) respondeu em L2 “pedras”. Anteriormente, o
professor teria ouvido uma voz que respondera “pedra” mas, esta não se identificou abertamente
senão fechando a cara com as mãos evidenciando a envergonha e insegurança (10).
Em continuação, o professor deparou mais uma vez, com uma situação em que o aluno não se
identificava com uma resposta exposta em L1 (13). Os alunos suspeitaram-se uns com os outros
numa clara evidência de medo de responsabilidade segundo mostra o registo (14). Diante desta
situação, o professor liberou o alu.3 que expos em L1 e aos risos, registando-se a equivalência entre
“pedra” e “maribzwi” no quadro. Nos momentos que se seguiram, os alunos participaram

162
activamente na nomeação bilingue dos diferentes seres vivos locais que o professor os tinha colado
no quadro numa clara prática de exploração bilingue das realidades socioculturais na aula segundo
mostram os registos (18, 20, 22, 24 e 30). Em (25), a alu.4 apresentou discretamente e em voz baixa
“milho”. Quando o professor perguntou quem teria dito “milho” em (26), a alu.5 acusou a colega
Luwani, alu.4 no registo (27), todavia esta não assumiu a autoria, segundo mostra a refutação em
(28). Estas evidências ilustravam a fase embrionária na qual os alunos e motivavam-se a explorar
ainda que de forma menos firme e menos dinâmica, as oportunidades oferecidas pelo práticas
discursivas bilingues à luz da pedagogia de translanguaging e pelos materiais das suas realidades
socioculturais e locais na aula em conformidade com a pedagogia de collateral learning e cross-cultural
border.
A situação dos alunos da TAI de Ruwani era completamente distinta da que ocorria na TC. Ao
longo da aula, evidenciei vários momentos de participação dos alunos em L2, expondo respostas
individuais e em coro, porém em voz baixa, psico-emocionalmente tímidos e cabisbaixos conforme
mostra o extracto 32. De referir que na TC, a inclusão das experiências socioculturais locais
efectuou-se de forma oral, isto é, sem materiais provenientes das sua realidades socioculturais.

Extracto 32: Mikho.DC5.100217


1. Prof. conhecem peixe?
2. Tur. sim
3. Prof. onde é que o peixe vive?
4. Tur. ((alguns alu.s em voz baixa e tímida)) °na água°
5. Prof. falem alto
6. Tur. na água
7. (...)
8. Prof. na água, porquê é que não vive cá na terra?
9. Al.7 °há-de morrer°
10. Prof. porquê?
11. Tur. ((alguns alu.s repetiram em coro a resposta do al.7) há-de morrer
12. (...)
13. Prof. e::: boi, quem conhece boi
14. Tur. ((todos levantaram as mãos))
15. (...)
16. Prof. Bingwanyani conhece boi, não é?
17. Bingwanyani ((tímido))°sim°
18. Prof. conhece não é.
19. Bingwanyani °sim°
20. Prof. come ou não come?
21. Bingwanyani °come°
22. Prof. o que é que come o boi?
23. Bingwanyani °capim°
24. Prof. ((induziu-lhe a repetir uma frase)) diz o boi come capim
25. Bingwanyani ((repetiu)) o boi come capim.
26. (...)

163
27. Prof. quem tem gato lá em casa?
28. Tur. ((Alguns alu. levantaram as mãos))
29. Prof. o que o gato come, quem quer dizer, voluntários.
30. Alu.10 ((espontaneamente levantou-se e respondeu em voz baixa, acanhado, cabisbaixo e tímido)) °come
comida°
31. Prof. gato come?
32. Tur. ((coro)) comida
33. Prof. o que é que come mais
34. Alu.11 rata
35. Prof. come?
36. Tur. ((corrigiu a resposta do alu.11)) rato
37. Prof. quem come rato aqui? hi::: estão a esconder-se enquanto todos vocês comem
38. Tur. ((nega rindo)) ehe::: (eu não:::)

O extracto ilustra parte da aula na qual a professora efectuava perguntas fechadas à turma
maioritariamente em L2. Alguns alunos respondiam voluntariamente em voz baixa (alu. 7 em 9,
alu. 10 em 30 e alu.11 em 34) e outros em coro promovido pela professora. O aluno Bingwanyani
participou forçosamente indicado a dedo em (16) interveio tímido, inseguro e em voz baixa.

6.1.1.3 Participação incrementada pelos materiais didácticos

A exposição e exploração pedagógica dos materiais didácticos locais e o fomento de práticas de


discurso de translanguaging determinaram sobremaneira para a participação crescente dos alunos ao
longo da aula. Em ambas as TAI´s constatei que os alunos não participavam no início da aula
embora os professores fomentassem um discurso de translanguaging senão quando a aula seguiu para
a actividade de interpretação e nomeação das imagens de seres vivos expostos na sala de aulas. Os
alunos sentiam-se mais confiantes e motivados para colaborar com base no discurso em duas
línguas. A partir deste momento, a aula foi-se desenvolvendo num ambiente de participação e
interacção cada vez mais crescente e num discurso e práticas pedagógicas de translanguaging. A título
de exemplo, na TAI de Citimela o professor conseguiu impulsionar a participação dos alunos na
recapitulação do conteúdo “siwumbwa sa wutomi” (seres vivos) e “siwumbwa sombina wutomi”
(seres não vivos) com base no improviso de uma planta e uma pedra dado que os alunos não
respondiam a nenhuma das perguntas sobre este conteúdo não obstante terem aprendido na classe
anterior. A partir dos materiais locais improvisados pelo professor, constatei-se que os alunos
recapitularam o conteúdo em altos níveis de participação de vários alunos voluntários conforme
ilustra o extracto 33.

164
Extracto 33: Citi.DC3.060217
1. Prof. ((mostrando uma pedra e uma planta à tur.)) i cani asi? aci i cani aci? (o que é isto? isto o que é isto?)
2. Tur. difilori (flor)
3. Prof. aci? (isto?)
4. Tur. dirigwi (pedra)
5. Prof. ngu cihi ciku ni wutomi aha? (qual é que tem vida dentre os dois?)
6. Tur. ((silêncio reflexivo))
7. Prof. ngu cihi ciku ni wutomi? (qual é que tem vida?)
8. Tur. ((alguns alu.s murmuram)) cifilori (flor)
9. Prof. he:::
10. Tur. ((alguns alu.s)) cifilori (flor)
11. Prof. i cani? (o que é?)
12. Tur. ((alguns alu.s)) cifilori (flor)
13. Prof. m´mweyo basi aciwomba, ngu cihi ciku ni wutomi (um voluntário que nos diga qual destes seres tem vida)
14. Alu.2 cifilor i (flor)
15. (...)
16. Prof. dirigwi dini wutomi? (a pedra tem vida?)
17. Alu.2 [ahihi:: (não:::)
Tur. [ahihi:: (não:::)
18. Prof. então, siwumbwa sa wutomi ngu sihi? (então quais são os seres vivos?)
19. Tur. ((silêncio))
20. Prof. ngu sotshe sihari siku ni cani? (são todos os seres que têm o quê?)
21. Tur. ((coro baixo)) °siku ni wutomi° (que têm vida)
22. (...)
23. Prof. siku ni wutomi (que têm vida) estamos juntos?
24. Tur. sim
25. Prof. então ka sotshe simaha si siku ni wutomi, hingamixawutelani siwumba ou qualquer cihari kani i cani micizivaku cidi
ni wutomi-- por exemplo nawomba ku khani dirigwi, dirigwi tem vida? é um sere vivo? (então dentre estes seres
vivos, indiquem os seres ou qualquer animal ou algum sere que vocês sabem que tem vida -- por exemplo
direi que a pedra, a pedra tem vida? é um sere vivo?)
26. Tur. ((coro fraco)) °<não>º

O uso simultâneo de ambas as línguas (práticas discursivas de translanguaging) e dos materiais


didácticos locais (pedagogia de collateral learning e cross-cultural border) nas aulas contribuíram para a
reactivação da participação activa e dinâmica dos alunos na aula segundo ilustram as evidências
no extracto 33 acima e a seguir o extracto 34 abaixo referente à TAI de Ruwani. Em ambas TAI´s,
a reactivação da participação dos alunos na aula foi possível em L1 que em L2. Os alunos
nomeavam surpreendentemente os diferentes “seres vivos” de forma dinâmica e num evento
práticas pedagógicas de translanguaging no qual uns nomeavam numa língua, os outros forneciam o
respectivo equivalente na outra língua por via da tradução e o professor registava-os no quadro
em ambas as línguas.

165
Extracto 34: Citi.DC3.060217
1. Alu.3 ((levantou-se e interveio)) mati (água)
2. Prof. ((escrevendo no quadro)) mati, ihu:::mati (água, ihu::: água)
3. Alu.4 n´thu (pessoa)
4. Prof. n´thu, n´thu, ok. Dhumani adikhene n´thu, ngu cilungu n´thu i ca ? (pessoa, pessoa. ok. Dhumani disse pessoa,
como se diz pessoa em português?)
5. Tur. ((em coro murmurado)) pessoa
6. Prof. he::: um minuto, um minuto, um menino para falar
7. Tur. ((dois voluntários levantam as mãos))
8. Alu.5 °pessoa°
9. Prof. em voz alta?
10. Alu.5 pessoa
11. Prof. pessoa ((repetiu o prof. escrevendo no quadro)) hu::: cimwani ciwumbwa ca wutomi? (hu::: outro sere vivo?)
outro sere vivo, outro menino para dizer
12. Alu.6 ciwonga (gato)
13. Prof. hi:::? (o quê?)
14. Alu.6 cimanga (gato)
15. (...)
16. Prof. ahe::: temos que falar em voz alta. outro menino para dizer cimanga (gato) em português. o que é cimanga
(gato) em português?
17. Tulani alu.7 ((levantou-se))
18. Prof. ((advertiu-lhe)) ehhh primeiro é levantar a mão, quem quer falar levanta a mão
19. Alu.8 ((levantou a mão))
20. Tur. ((mais alu.s com mãos semi-levantadas))
21. Prof. ok. Layani
22. Layani, Alu.9 gato
23. Prof. em voz alta
24. Alu.9 gato
25. Prof. ok, outro voluntário. aciwomba (que possa dizer o) outrosere vivo que conhece. levanta a mão que quer
falar
26. Tur. ((duas mãos estavam no ar))
27. Prof. ok, só estão a falar os meninos. gosto de ver também as meninas a falar
28. Tur. ((de repente a alu.8 pôs-se de pé))
29. Prof. ok, vamos deixar Lipisu falar depois vai falar Zelani
30. Lipisu Alu.9 phongo (cabrito)
31. Prof. he:::
32. Lipisu: phongo (cabrito)
33. Prof. temos que falar em voz alta (...)

Nos registos (3), o alu.4 nomeou uma das imagens “n´thu” (pessoa) em L1 e voluntariamente o
alu.5 expôs o respectivo equivalente lexical em L2 “pessoa” (5). A advertência do professor contra
as respostas em coro em (6) suscitou o surgimento de dois voluntários que se prontificaram a expor
individualmente “pessoa” segundo mostram o registos (8 e 10). No decurso da aula, outros alunos
nomeavam voluntariamente as imagens dos seres vivos segundo mostram os registos (12 e 30).
Nesta actividade, constatei que alguns alunos não mais esperavam a indicação pelo professor para
providenciarem o equivalente em L2 sobre os seres vivos apresentados em L1. Segundo ilustram
os registos (17, 28) alguns alunos levantavam-se espontaneamente sem que fossem indicados pelo
professor diante de outros colegas que mantinham as mãos no ar.

166
A estratégia de equivalência lexical contribuiu significativamente para a participação, o dinamismo
e a flexibilidade da aula. Houve uma interacção e participação livre e espontânea nunca vista em
ambas as línguas. Todos os alunos estavam motivados e dispostos para participar da aula através
de chuva de ideias, havendo inclusive disputa entre os alunos. Os alunos entusiasmavam-se a
participar também em L2. Este clima activo estendeu-se até a parte final da aula na qual os alunos
tinham que estabelecer as relações de interdependência entre os seres vivos nomeados em duas
línguas através da construção de frases numa ou noutra língua e providenciar a respectiva tradução
conforme ilustra o extracto 35 referente a TAI de Ruwani.

Extracto 35: Ruw.DC4.080217


1. Prof. aqui, hingawulani lezvi mingazvikuma (aqui diga-me o que acharam)
2. Alu.20 ((tímida mas em voz audível)) cão come galinha
3. Prof. cão come?
4. Alu.17 ((tapou a cara com o caderno, baixou-se sobre a carteira e respondeu tímida)) come galinha
5. Prof. ((registou no quadro enquanto repetia)) cão come a galinha. hi citshwa hingazviwulisa kuyini lezvi? (como
diriamos em citshwa?)
6. Tur. ((coro)): a mbzwana yaga tihuk u (o cão come a galinha)
7. Prof. hile yini? (como o quê?)
8. Tur. ((coro alto)) A MBZWANA YAGA TIHUKU (O CÃO COME AS GALINHAS)
9. Prof. ((solicitou mais uma dupla contando)) 1 2 3?
10. Tur. ((todos os alu.s levantaram as mãos))
11. Prof. quem foi o primeiro?
12. Alu.18 hi mina, hi mina (fui eu, fui eu)
13. Prof. aqui, vossa frase
14. Alu.19 ((levantou-se tímida e falou em voz baixa)) °o boi come o passarinho°
15. Prof. o boi come o passarinho
16. Tur. ((agitou-se, uns riem-se discordando com a resposta da Alu.19)) ye:::
17. Alu.20 ((entre outras vozes)) acinyanyani ehhh hu::: (o passarinho ehhh hu:::)
18. Alu.21i ya wawulawula (ah sim, você fala)
19. Prof. quem pode nos dizer o que escrevemos nesta frase aqui? primeiro vamos ler.
20. Tur. “o boi come passarinho” (2x)
21. Prof. um voluntário para nos dizer em citshwa
22. Tur. ((todos levantam as mãos eufóricos)) sou::: eu::: sou::: eu:::
23. Prof. vamos embora ((indicou a alu.22))
24. Alu.22 ((levantou-se, tapou a cara com as duas mãos e respondeu tímida)) a homu – (o boi-)
25. Tur. ((vendo a interrupção da alu.22 os alu.s predispuseram-se a ajudar)) sou::: eu::: sou::: eu:::
26. Prof. nyimani wahawulawula (esperem, ela ainda está a falar)
27. Alu.22 ((com cara cabisbaixa)) a homu yaga cinyanyani (o boi come o passarinho)
28. Prof. a homu yiga cinyanyani. hi mani angatshama a wona homu yiga cinyanyani? (o boi come o passarinho. que já viu
o boi a comer o passarinho?)
29. Tur. ((agitou-se euforicamente aos risos e gargalhadas))
30. Prof. i yini cingalaha caku cingaga cinyanyani? (o que é que pode comer o passarinho aqui?)
31. Alu.23i mbzwana (é o cão)
32. Prof. he:::?
33. Alu.23 mbzwana (é o cão)
34. Prof. mbzwana (cão) mais
35. Alu.24 ((tapou a cara com as mãos)) o cabrito come mbzwanyi (o cabrito come o capim)
36. Prof. ((solicitou a repetição)) o cabrito come o quê? ate o quê? (o que ela disse)

167
37. Alu.24 ((e outros alu.s)) mbzwanyi (capim)
38. Prof. ((registou no quadro)) o cabrito come o, kambe a bzwanyi hi cilungu (o que é capim em português?) como
nós chamamos? he:::?
39. Alu.25 capim
40. Prof. ((completou a frase, escrevendo no quadro)) come capim

O extracto 35 mostra cenários de alta participação dos alunos numa das mais exigentes actividades
da aula e que mesmo assim, manifestavam a sua disponibilidade para participar de forma activa
na aula, levantando simultaneamente as mãos e gritando “sou::: eu:::, sou::: eu:::” (22, 25). Os
alunos estabeleciam a relação de interdependência entre os seres vivos expostos, nomeados em
duas línguas, construindo frases em L1 e ou em L2 e traduzindo-as para uma ou outra língua
segundo mostra o registo (2) “cão come galinha” e a respectiva tradução providenciada pela turma
em (8) “a mbzwana yaga tihuku”, “o boi come o passarinho” em (14) e a tradução da turma “a
homu yaga cinyanyani” em (27) e “o cabrito come bzwanyi” em (35). Os alunos observavam para
os diferentes seres vivos expostos e nomeados em duas línguas no quadro e com recurso aos seus
fundos de conhecimentos foram capazes de reflectir e estabelecer relações de interdependência
entre os seres vivos através de frases bilingues, numa clara evidência operacionalização de
pedagogia de collateral learning e cross-cultural border e práticas discursivas e interactivas bilingues
inspiradas no translanguaging na construção de conhecimentos de Ciências Naturais, cognitiva e
academicamente complexos.
As evidências das TAI´s eram opostas das que constatava na TC. Ainda que a professora
desenvolvesse a aula numa prática discursiva de translanguaging, constatei que a ausência de
materiais didácticos locais, o fomento de um ensino centrado na professora e das práticas
discursivas e interactivas passivas não permitiam que os alunos reflectissem sobre as relações de
interdependência entre os seres vivos do seu meio sociocultural. Por conseguinte, os alunos eram
forçados a repetir as relações que se estabeleciam entre os seres vivos segundo mostra o extracto
36.

Extracto 36: Mikho.DC5.100217


1. Prof. eu dizia que existe animais que simplesmente alimenta-se de capim, existem outros que comem capim
com o quê?
2. Tur. ((alguns alu.s)) com carne
3. Prof. que come capim com o quê?
4. Tur. com carne
5. Prof. com carne. existe outro ainda que não comem capim. só comem o quê?
6. Tur. ((duas vozes baixas))( ) °carne°
7. Prof. senão comem carne, só comem o quê?

168
8. Tur. ((captou a resposta das duas vozes e repetiu)) carne
9. Prof. vamos falar todos
10. Tur. ((coro)) carne
11. Prof. só comem carne. azvihlakani hikuga bzwanyi lezvo. zvinga yini? (esses não se atrevem a comer o capim. o que
comem?)
12. Tur. a nyama (carne)
13. Prof. basi (só). estamos juntos
14. Tur. sim
15. Prof. zvinga a nyama basi, ka wutomi ga zvona. azvingi a yini (2x )? (comem somente carne. não come o quê (2x)?)
16. Tur. a bzwanyi (2x) (capim (2x))
17. Prof. então, existem animais que comem capim só e só capim. azvingi a nyama. zvikona zvin´wanyani zvigaku a
nyama ni yini? (não comem carne. há outros que comem carne e o quê?)
18. Tur. ni bzwanyi (e capim)
19. Prof. zvigaku a nyama ni yini? (comem carne e o quê?)
20. Tur. NI BZWANYI (E CAPIM)
21. Prof. já azvin´wanyani hi lezvi zvigagu a yini? (já há os outros o que comem?)
22. Tur. a nyama (carne)
23. Prof. que come carne só e só carne. estamos juntos?
24. Tur. sim

Neste extracto, os alunos completavam em coro e repetição as frases iniciadas pela professora. A
título de exemplo, em (1), a professora iniciou uma frase que os alunos completaram em (2) e em
(4). Em (8), a turma repeteu erradamente a resposta da pergunta formulada em (7), com base na
reprodução da resposta apresentada por dois alunos em (6) aquando da pergunta feita em (5). Os
alunos apenas completaram em coro, repetindo passivamente a parte da afirmação pergunta da
professora conforme ilustram os registos (11 e 12), (15 e 16), (17 e 18), (19 e 20) e (21 e 22) do
extracto acima. Como se pode depreender no extracto acima, os alunos participavam de forma
passiva diferentemente dos alunos da TAI de Ruwani e de Citimela. Os materiais didácticos locais
à luz do collateral learning e crosss-cultural border, as perguntas abertas e a liberalização das práticas
discursivas de translanguaging centravam o ensino-aprendizagem nos alunos e encorajava-os a
participar activamente na construção de conhecimentos académicos e na aprendizagem de ambas
as línguas.

6.1.1.4 Discussão dos alunos na aula

A discussão dos alunos no decurso da aula participativa e interactiva marcou-me como uma das
evidências de elevadíssimo valor neste primeiro ciclo de aulas reservado à activação de cenários de
ensino-aprendizagem que despertem a participação aberta e flexível dos alunos através de de
promoção de práticas discursivas baseadas no translanguaging e a aproximação do conteúdo da aula

169
às realidades socioculturais locais prevista pelas pedagogias collateral learning e cross-cultural border. Ao
longo da aula, os alunos tiveram a oportunidade de observar pela janela da sala de aulas, os
diferentes “zvivangwa zva wutomi” (seres vivos) que tivessem a mesma característica biológica a
fim de nomeá-los na aula como exemplos de seres vivos tanto em L1 como em L2. O recurso à
observação do ambiente fora da sala de aulas reactivou a participação espontânea, livre, aberta,
segura, activa e colaborativa de muitos alunos que se voluntariavam progressivamente para
mencionar os seres vivos observados e as respectivas equivalências lexicais numa ou noutra língua.
A discussão surgiu aquando da tradução do sere vivo “manga” da L1 para L2. Em (13), o professor
solicitou o equivalente da “mangueira” em L1 e imediatamente a turma propôs “manga”, uma
palavra polissémica em L1 pois significa “fruta e árvore” e monossémica em L2 “manga” conforme
mostra o extracto 37.

Extracto 37: Ruw.DC4.080217


1. Prof. o que vocês conseguiram ver? voluntários
2. Tur. ((alguns alu.s levantaram as mãos))
3. Prof. tem um voluntário aí. i yini ungawona handle? (o que viu lá fora?)
4. Alu.3 ( )
5. Prof. viu, disse o quê?
6. Alu.3 ((repetiu em voz audível)) mafureira
7. Prof. ((erradamente o prof. escreveu cajueiro ao invés de mafureira no quadro)) cajueiro
8. Tur. ((alguns alu.s em coro corrigiram ao prof.)) mangueira (3x)
9. Prof. ((o prof. não se apercebeu do erro e continuou)) cajueiro i yini hi citshwa (o que é em citshwa?)
10. Tur. i kanju (é cajueiro)
11. Prof. i kanju (cajueiro). alguém disse –
12. Tur. mangueira
13. Prof. como se chama mangueira em –
14. Tur. ((espontaneamente os alu.s responderam)) MANGA
15. Prof. em citshwa
16. Tur. manga (mangueira)
17. Prof. a fruta, a fruta da mangueira i yini hi citshwa? (o que é em citshwa?)
18. Alu.4 mamanga (são mangas)
19. Prof. loko uhi gin´we ke? (e se for uma só?)
20. Tur. ((várias vozes)) i manga (é manga)
21. Prof. já a sinya wa kona i manga kambe, hizvona? (e a respectiva árvore é também manga?)
22. Alu.5 NÃO
23. Prof. o que é?
24. Alu.5i sinya wa manga (é árvore de mangueira)
25. Alu.6 ((próximo do alu.5 discorda)) he::: hesawu i manga (he::: colega é manga)
26. Alu.7 ((risos))

Em (14), os alunos foram espontâneos na providência, em L1, do equivalente de mangueira antes


de professor terminar a formulação da pergunta em (13). Em outras palavras, os alunos

170
anteciparam a resposta espontaneamente. Ora, o professor propôs a reflexão dos alunos quando
questionou a distinção nocional entre as palavras “manga” (árvore) e “manga” (fruta) em (17). O
alu.4, em (18), propõe “mamanga” (mangas) o plural de “manga” mas o professor exigiu o
respectivo o singular (19). A turma, em vozes soltas respondeu “i manga” (é manga) em (20). A
intervenção do professor em (21) suscitou a discussão. Em (22) o alu.5 discordou que não se podia
nomear a mangueira como “manga” em L1 senão como “sinya wa manga” (árvore de manga) em
(24). Com esta intervenção colaborativa à construção do conhecimento na aula, o alu.5 recorreu
à L1 para desambiguar as palavras “manga” (árvore) e “manga” (fruta). Entretanto, surgiu
espontaneamente o alu.6 que, discordou firmemente do alu.5 que a árvore de mangueira é
“manga” segundo mostra o registo (25). A discussão emocionou o alu.7 que, em (26), riu sem, no
entanto, propor a sua opinião.
Este episódio evidenciou não só o valor pedagógico das práticas discursivas e pedagógicas do
translanguaging como também o valor dos conhecimentos prévios e socioculturais dos alunos na aula.
Nesta combinação pedagógica, os alunos não só participarem, espontaneamente, na aula como
desenvolveram uma discussão interactiva, construtiva e colaborativa sobre o conteúdo e a
ambiguidade entre as duas línguas, proporcionando uma dupla aprendizagem do conteúdo e das
línguas simultaneamente e elevando a qualidade da aula.

6.1.2 Padrões de participação e interacção dos alunos

A criação dos ambientes de translanguaging aliados à aproximação dos conteúdos à realidade


sociocultural dos alunos reactivou a participação dos alunos no desenvolvimento da aula. Os
alunos recorriam constantemente às suas realidades socioculturais para conceptualizar e construir
a compreensão dos fenómenos naturais propostos pelos contéudos da aula. Neste ambientes,
evidenciei o processo de revitalização e ou promoção pedagógica de novos padrões activos de
participação dos alunos em diferentes fases das aulas das TAI´s do que nas aulas da TC. Os alunos
das TAI´s predispunham-se a participar e interagir no decurso da aula contrariamente aos padrões
de participação passiva que observava nas aulas de TC. Com estes fenómenos, registei uma grande
mudança pedagógica dos papéis do professor e dos alunos nas aulas das TAI´s. Os professores
jamais envidavam esforços para persuadir, apelar e forçar a participação dos alunos na aula muito

171
menos se mostravam impacientes e frustrados como fora nas primeiras aulas leccionadas em L2.
Os alunos substituíram as estratégias de participação passivas pelo voluntarismo espontâneo.

6.1.2.1 Voluntarismo participativo

A liberalização do uso de ambas as línguas na aula foi assumida pelos alunos das TAI´s como uma
nova oportunidade para participar na aula de forma aberta, livre e segura, respondendo às várias
perguntas dos professores. Gradualmente, os alunos mostravam indicadores de familiarização com
as novas práticas pedagógicas impulsionadas pelo translanguaging, collateral learning e cross-cultural
border. Um dos indicadores que sublinhei neste ciclo inicial foi a eliminação gradual do medo, da
hesitação e a fortificação crescente da segurança, confiança, auto-estima e do voluntarismo
participativo e espontâneo dos alunos.
O extracto 38 representa uma fase da aula em que o professor e os alunos da TAI de Ruwani
recapitulavam a aula. Os alunos participavam de forma colaborativa e voluntária na aula, um atrás
do outro, sob a mediação do professor.

Extracto 38: Ruw.DC4.080217


1. Prof. hite (dissemos) a pedra é?
2. Al.14 ((voz baixa, balbuçando a cabeça e envergonhada)) não tem vida
3. (...)
4. Prof.a sere não vivo hi citshwa hite i yini? (o sere vivo em citshwa como o nomeamos?)
5. Tur. zvivangwa (seres)- ((interromperam por ordem do prof.))
6. Prof. ndzilava munhu mun´we basi (um voluntário)
7. Tur. ((continuamente levantaram as mãos 3, 4 voluntários))
8. (...)
9. Alu.16 zvivangwa zvokala wutomi (são seres não vivos)
10. (...)
11. Prof. loko hiwulawule hi pedra higamile hiwulawula hi homu ni yini kambe? (depois termos falado sobre a pedra de quê
é falamos a seguir?)
12. Tur. ni cipfhaki (de milho)
13. Prof. cipfhaki (milho) mais o quê?
14. Alu.17 kanju (cajueiro)
15. Tur. cajueiro
16. Prof. cajueiro e?
17. Tur. mangueira
18. Prof. higama hiku lezvi zvoyini? (e concluímos que?)
19. Alu.18 ((espontaneamente)) >zvabzwala< (nascem)
20. Prof. recordam-se, o que fazem aqueles seres vivos?
21. Tur. ((3 alu.s levantaram as mãos))
22. Prof. vamos, aquela menina já falou
23. Alu.19 nascer
24. (...)
25. Prof. há::: nascer, certo. outro voluntário

172
26. Tur. ((3 alu.s levantaram as mãos))
27. Alu.20 crescer
28. Prof. outro voluntário
29. (...)
30. Alu.21 reproduzir
31. Prof. reproduzir, kureproduzir kuyini? (o que é reproduzir?)
32. Alu.22 ((espontaneamente)) kupswala (é nascer)
33. Prof. kupswala ok. higama hikuyini? (é nascer. ok. e a seguir o que dissemos?)
34. Tur. ((mais 3 alu.s levantaram as mãos))
35. Alu.23 ((tímida com duas mãos nas bochechas)) depois morrer
36. Prof. depois morrer (...) azvivangwa lezvi zvinga ni matshamela lawa (os seres que têm estas características) como
nós chamamos em português?
37. Tur. seres, seres vi - ((interrupidos pelo prof.))
38. Prof. seres (2x)?
39. Tur. vivos (2x)
40. Prof. seres vivos. a seres vivos hi cilandi, hi citshwa hite i yini? (na nossa língua materna, em citshwa dissemos que
eram o quê?)
41. Tur. zvivangwa zva wutomi (seres vivos)

A recapitulação da aula é caracterizada pela participação rápida dos alunos. Para cada pergunta
havia em média 3 voluntários que levantavam as mãos (vide os registos 7, 21, 26 e 34) e respondiam
espontaneamente (vide os registos 2, 9, 14, 18, 19, 27, 30, 32 e 33) e outra vezes respondiam em
coro (vide os registos 5, 12, 15, 17, 37 e 41). Não houve nenhum momento de baixa participação
dos alunos ao longo desta actividade de recapitulação da aula anterior. Os alunos intervieram
livremente com base no discurso de translanguaging no qual, a L1 e a L2 eram usadas na menção
dos seres vivos (12, 14, 15, 17), relação dos conceitos “sere não vivo” (zvivangwa zvokala wutomi)
(4, 5, 9) e “seres vivos” (zvivangwa zva wutomi) (40, 41) e a caracterização biológica dos seres vivos
(19, 23, 27, 30, 32 e 35).
Na TAI de Citimela constatei também vários cenários de sala de aula caracterizados pela
disposição e motivação dos alunos ao voluntarismo e à participação livre e activa na aula após a
crise do silêncio que abalou os primeiros dois minutos de início da aula. À semelhança dos alunos
da TAI de Ruwani, os alunos da TAI de Citimela participavam activamente nas restantes fases da
aula. O extracto 40 abaixo é uma evidência do voluntarismo dos alunos numa actividade na qual
deviam classificar os seres vivos animais em três categorias (carnívoros, herbívoros e omnívoros)
nomeando-os em L1 e L2. Antes da exposição das respostas dos alunos, os alunos prepararam as
suas respostas, discutindo aos pares na aula. A sessão de apresentação dos resultados foi marcada
pelo voluntarismo espontâneo e dinâmico dos alunos conforme mostra o extracto 39.

173
Extracto 39. Citi.DC3.060217
1. Prof. hi::: vamo lá começar daqui
2. Alu.10 ((em voz baixa e tímida)) °phongo° (cabrito)
3. (...)
4. Prof. phongo (cabrito) em português Canani phongo (cabrito) é o quê?
5. Canani Alu.11 cabrito
6. Prof. a seguir?
7. Alu.11 homu (boi)
8. Prof. fale alto. Chekani, hom u (boi) em português o que é?
9. Chekani, alu. 12 °boi°
10. Prof. boi. ahi::: a seguir
11. Tur. ((duas alu.s levantaram as mãos em simultâneo))
12. Alu. 13 burro
13. Prof. em português, ahhh disse em português, em cicopi?
14. Alu.14 burro
15. Prof. he::: em cicopi
16. Alu.14 burro
17. Prof. em cicopi burro o que é afinal?
18. Tur. mbonMikhokhwenia (burro)
19. (...)
20. Prof. sihari sakudya nyama basi (animais que comem só carne)
21. Alu.23 ((espontaneamente)) coelho
22. Prof. i cani kambe (o que é) coelho?
23. Alu.23 ((silêncio))
24. Prof. quem pode dizer, coelho?
25. Tur. ((7 voluntários levantaram as mãos))
26. Prof. coelho, coelho, coelho. sim Hathani
27. Hathani, Alu.24 civhundza (coelho)
28. Prof. civhundza cihanya ngu nyama? (o coelho consome carne?)
29. Tur. <ahihi> (não)
30. Prof. cihanya ngu nyama civhundza? (o coelho come carne?)
31. Tur. °ahihi° (não)
32. Prof. hingaciveka hayi civhundza aha? cikhala hayi (em que tipo de animais pertence o coelho aqui?)
33. (...)
34. Tur. ka mwasi (nos animais herbíveros)
35. Prof. ka mwasi (nos herbíveros)(...) então por fim temos animais que -- comem (.) plantas (.) e carnes
36. Alu.25 ((levantou-se imediatamente e interveio)) pato
37. Prof. he:::
38. Alu.25 pato
39. (...)
40. Prof. ka nyama dingadya ca? dingadya ca ? (o que o pato comeria na carne?)
41. Alu.25 sirambu (ossos)
42. Prof. sirambu só? dinamana sirambu n´thembweni? (só ossos? encontrará ossos na machamba?)
43. Tur. ahihi (não)
44. Prof. he::: ahivhuneni, i cani caku dingadya dipatu. i cani? (ajudemo-lo, o que comeria o pato? o quê?)
45. Tur. ((alguns alu.s hesitam))
46. Alu.26 mafaka (maçaroca)
47. Prof. ni cani kambe (mais o quê?)
48. Alu.27 dizongonono (maria-café)
49. Prof. dizongonono, uhuuu ni cani kambe (maria-café e mais o quê?)
50. Alu.28 tinyemba (feijão)
51. Prof. tinyemba, ni cani kambe (o que é feijão?)
52. Alu.29 nyakhele (sapo)
53. Prof. nyakhele (sapo)
54. Alu.30 sidhodho (insectos)

174
A resolução da actividade foi co-participada activamente por todos os alunos que se voluntariavam
livremente para nomear e classificar os animais em três categorias, usando um discurso bilingue e
ou baseado num repertório bilingue. Adicionalmente às línguas, evidenciei, mais uma vez, que os
alunos exploram os conhecimentos socioculturais em toda a resolução, elevando os níveis de
participação e interacção na aula em voz alta, segura e sem medo. Os alunos que tivessem alguma
dificuldade eram imediatamente apoiados pelos outros que se predispunham a ajudar
voluntariamente. A título de exemplo, o alu.23 levantou-se espontaneamente em (21) e propôs em
L2 “coelho” como animal carnívoro todavia, em (23) não foi capaz de providenciar o respectivo
equivalente em L1. Imediatamente 7 voluntários levantaram as mãos, predispondo-se a ajudá-lo
segundo ilustra o registo (25). O professor indicou a voluntária Hathani, alu.24 que interveio em
(27) propondo o equivalente “civhundza” (coelho). A seguir, a turma e o professor avaliaram a
resposta apresentada pelo alu.23 e construtivamente corrigiram-na em coro, apontando que
“civhundza” não come “nyama” (carne) e por esta razão, devia alistar-se na categoria dos animais
que comem “mwasi” (capim) (animais herbíveros) (30, 31 e 33).
Nos restantes registos (37 a 54), os alunos participavam flexivelmente um atrás do outro para
provar ao professor que o “pato” anunciado espontaneamente pelo alu.25, em (36) faz parte da
categoria dos animais omnívoros. O alu.25 mencionou que o pato come “sirambu” (ossos) e
perante a insatisfação do professor, mais 5 alunos intervieram para ajudar o alu.25, mencionando
outros alimentos do pato dentre eles “mafaka” (maçaroca) (alu.26 em 46); “dizongonono” (maria-
café) (alu.27 em 48); “tinyemba” (feijão) (alu.28 em 50); “nyakhele” (sapo) (alu.29 em 52) e
“sidhodho” (insectos) (alu.30 em 54).
As evidências da TC contrariavam-se com as das TAI´s. Enquanto nas duas últimas aulas os
professores liberalizavam e incentivavam os alunos a participarem e a interagirem livremente na
aula, a professora da TC garantia o progresso da aula com base na exposição, auto-centralização
da aula e nas estratégias de participação e de interacção passiva dos alunos. O ambiente de sala de
aula ilustrava alunos tímidos, acanhados e desmotivados. Não havia nenhum aluno que se atrevia
a voluntariar-se. O extracto 40 ilustra parte das evidências nas quais a professora da TC distinguia
as categorias de animais sem a co-participação dos alunos, isto é, transmitindo aos alunos.

175
Extracto 40: Mikho.DC5.100217
1. Prof. existem aqueles seres vivos que só e só comem capim, lezvi zvigagu bzwanyi basi, hazvana? (aqueles que só
comem capim, estamos juntos?)
2. Tur. ((alguns alu.s)) i::: (si::m)
3. Prof. lezvi zvigaku a yini? (aqueles que comem o quê?)
4. Tur. ((coro forte e contagiante)) A BZWANYI BASI (SOMENTE O CAPIM)
5. Prof. aqueles seres vivos que alimentam-se de capim. vamos dizer seres vivos que alimentam-se de capim
6. Tur. ((em coro não uniforme os alu.s repetem induzidos)) seres vivos que alimentam-se de capim
7. Prof. seres vivos (.)
8. Tur. ((repetição induzida)) SERES VIVOS
9. Prof. que alimentam-se de capim
10. Tur. ((repetição induzida)) QUE ALIMENTAM-SE DE CAPIM.
11. Prof. hi lezvi zvigaku yini lezvo? (o que esses comem?)
12. Tur. a bzwanyi (capim)
13. Prof. hi lezvi zvigaku yini? (são os que comem o quê?)
14. Tur . ((repetição induzida)) a bzwanyi (capim)
15. (...)
16. Prof. agora existem outros que se alimentam de capim e com carne, zvopatela zvilo lezvi zva zvimbiri. zviga yini ni
yini? (comem os dois alimentos. comem o quê?)
17. Tur . ((murmura))
18. Prof. come capim com carne, estamos juntos?
19. Tur. sim
20. Prof. comem o quê?
21. Tur. ((coro induzido)) CAPIM COM CARNE
22. Prof. CAPIM COM O QUÊ
23. Tur. CARNE, COM CARNE
24. Prof. CAPIM COM QUÊ?
25. Tur. CARNE

A professora expunha os conteúdos da aula passivamente e os alunos tinham a missão de


acompanhá-la atentamente pois, por detrás das suas frases expositivas e declarativas retornava aos
alunos para os pôr a participar através da estratégia de “afirmação-pergunta” ou de terminação
de frases. Por esta razão, os alunos tinham a obrigação de ouvir a última parte de cada exposição
declarativa a fim de repeti-la em coro segundo ilustram as evidências registadas em (1, 3 e 4). Neste
caso, a professora perguntava aos alunos “lezvi zvigaku yini” (aqueles comem o quê) (3) e os alunos
responderam “a bzwanyi basi” (somente o capim) (4) tal como expusera a professora em (1). Em
(5), a professora orientou a turma a repetir em coro “seres vivos que alimentam-se de capim”,
contudo a repetição da turma não foi consonântica (6). Diante desta constatação, a professora
dividiu a frase em duas partes e orientou a respectiva repetição em coro (7, 8, 9). Em (16), anunciou
outra categoria de animais em L2 e depois em L1, seguido de uma pergunta-afirmação “zviga yini
ni yini?” (comem o quê?). A turma respondeu com um murmúrio (17). A professora repetiu em L2
(18) e novamente perguntou 3 vezes (20, 22, 24). Desta vez, a turma respondeu em coro alto 3
vezes (21, 23, 25).

176
O discurso de sala de aulas manifestava práticas de translanguaging sem, contudo, promover o
voluntarismo dos alunos. A professora envidava esforço para pôr os alunos a ouvir atenciosamente
o seu discurso expositivo, obrigando-os a decorá-lo e a memorizá-lo através do fomento de práticas
de repetição e do coro inclusive na revisão da aula segundo ilustra o extracto 41 a seguir.

Extracto 41: Mikho.DC5.100217


1. Prof. eu dizia que existe animais que simplesmente alimenta-se de capim, existem outros que comem capim
com o quê?
2. Tur. ((alguns alu.s)) com carne
3. Prof. que come capim com o quê?
4. Tur. com carne
5. Prof. com carne. existe outro ainda que não comem capim. só comem o quê?
6. Tur. ((duas vozes baixas))( ) °carne°
7. Prof. senão comem carne, só comem o quê?
8. Tur. ((captou a resposta das duas vozes e repetiu)) carne
9. Prof. vamos falar todos
10. Tur. ((coro)) carne
11. Prof. só comem carne. azvihlakani hikuga bzwanyi lezvo. zvinga yini? (esses não se atrevem a comer o capim. o que
comem?)
12. Tur. a nyama (carne)
13. Prof. basi (só). estamos juntos
14. Tur. sim
15. Prof. zvinga a nyama basi, ka wutomi ga zvona. azvingi a yini (2x )? (comem somente carne. não come o quê (2x)?)
16. Tur. a bzwanyi (2x) (capim (2x))
17. Prof. então, existem animais que comem capim só e só capim. azvingi a nyama. zvikona zvin´wanyani zvigaku a
nyama ni yini? (não comem carne. há outros que comem carne e o quê?)
18. Tur. ni bzwanyi (e capim)
19. Prof. zvigaku a nyama ni yini? (comem carne e o quê?)
20. Tur. NI BZWANYI (E CAPIM)
21. Prof. já azvin´wanyani hi lezvi zvigagu a yini? (já há os outros o que comem?)
22. Tur. a nyama (carne)
23. Prof. que come carne só e só carne. estamos juntos?
24. Tur. sim

Nesta revisão da aula, registei a participação em coro de alguns alunos (2, 6). A turma só
participava repetindo em coro após captar a resposta apresentada por alguns alunos segundo
ilustram os registos (4, 8) e sob a persistência da professora (3, 7). Por este motivo, a professora
apelou para que todos falassem “vamos falar todos” segundo mostra o registo (9). A partir do registo
(11 a 22) a professora orientou a revisão da aula em L1, mas sem mudar de estratégia acima
descrita.
Portanto, a análise das evidências acima ilustra cenários de disparidade e ou oposições de níveis de
participação e interacção construtiva e dinâmica dos alunos nos ambientes de ensino-
aprendizagem não obstante os professores explorarem as práticas discursivas bilingue e
pedagogicamente assentes no translanguaging. A professora de TC auto-centrava a aula e fomentava

177
as práticas de repetição aos alunos para que pudessem assimilar e memorizar forçosamente os
conteúdos através da exposição, do incentivo à repetição e ao coro ao passo que os professores das
TAI´s descentralizam as aulas com base no recurso aos conhecimentos e recursos didácticos locais
e às perguntas abertas.

6.1.2.2 Voluntarismo espontâneo e competitivo

No decurso do ciclo, os alunos elevavam os seus níveis de participação e de interacção nas aulas
através do voluntarismo flexível, espontâneo e caracterizado pela competição entre os alunos
obrigando os professores a adoptarem critérios que lhes permitissem escolher alguns voluntários
dentre vários que se predispunham a participar na aula.
Nas evidências que apresento nos extractos 42 e 43 destaco uma actividade na qual os alunos das
TAI´s deviam estabelecer as relações de interdependência entre dois seres vivos expostos e
nomeados no quadro. Os alunos voluntariavam-se, levantando flexível e simultaneamente as mãos,
uns ficavam de pé, outros suplicavam com a expressão “sou eu…” e alguns mantendo as mãos
levantadas mesmo depois de professor ter escolhido o voluntário que iria intervir.

Extracto 42: Ruw.DC4.080217


1. Prof. voluntários
2. Tur. ((8 alu.s levantaram as mãos))
3. Prof. abaixem as mãos. 1 2 3 ((conta 3 vezes para escolher o alu. que for primeira a levantar a mão))
4. Tur. ((todos os alu.s levantaram as mãos))
5. Alu.23 ((exclama)) ahi:::
6. Prof. quem foi o primeiro?
7. Tur. ((2 alu.s competiam entre si) [sou::: eu:::
[sou::: eu:::
8. Prof. ok. ali diz lá ((escolheu um dentre os dois))
9. Alu.24 boi
10. Prof. ((escreveu no quadro)) boi. boi i yini hi citshwa ? (o que é em citshwa?)
11. Tur. ((alguns alu.s)) i homu (é boi)
12. Tur. ((alguns alu.s mantinham as mãos no ar enquanto respondiam em coro))
13. Prof. todos
14. Tur. i homu. (é boi)
15. Prof. ali
16. Alu.25 °burro°
17. (...)
18. Alu.27 cão
19. Prof. cão
20. Tur. ((alguns alu.s)) bzwana (...)
21. Prof. a bzwana yi maha yini loko yilava kukomba zvaku yahanya ? (como o cão demonstra que está vivo?)
22. Alu.2 hu, hu, hu:::((de ladrar))
23. Prof. ok, outro voluntário

178
24. Tur. ((12 alu.s levantaram as mãos))
25. Prof. aqui
26. Alu.28 mandioca

Os alunos competem voluntariamente para que fossem escolhidos pelo professor. À primeira
solicitação de voluntários, o professor foi surpreendido por 8 mãos de alunos que estavam
levantadas no ar sem saber a quem escolher (2). Na tentativa de escolher o primeiro que levantasse
a mão, o professor orientou-os para que baixassem as mãos (3) e reiniciou contando 1, 2, 3 (4). A
reacção dos alunos foi manifestada pelo levantamento de mãos de toda a turma (4), exclamando a
alu. 23 “ahi:::” (5). O professor perguntou quem teria sido o primeiro a levantar a mão (6) e, de
imediato, dois alunos disputavam-se um com o outro, respondendo “sou::: eu:::” (7). Todos
queriam voluntariar-se. Diante desta situação, o professor decidiu escolher apenas os alunos que
não tinham participado da aula. Com efeito, indicou o alu.24 (9), mas mesmo assim, enquanto
alguns alunos pronunciavam “homu” como equivalente de “boi” em (11) e antes de o professor
registá-lo no quadro, certos alunos já tinham, no mesmo instante, as mãos no ar para participar
na próxima solicitação de voluntários. No seguimento da aula, o professor indicou a alu.25 em (16)
e a alu.27 em (18). A espontaneidade e a competição entre os alunos manifestava-se de forma
constante na aula e sempre que alguns alunos registavam alguma inflexibilidade para intervir na
aula. Ainda assim, durante todo o período da resolução da actividade evidenciei muitos alunos que
mantinham as mãos no ar enquanto o colega escolhido apresentava a sua resposta.
Os alunos da TAI de Citimela manifestavam o voluntarismo espontâneo e competitivo através do
levantamento espontâneo e colectivo das mãos segundo evidencia o extracto 43.

Extracto 43: Citi.DC4.090217


1. Prof. oh. vou pedir voluntários agora, estamos juntos?
2. Alu.1 sim
3. Prof. para ir no quadro, ir apontar, uma coisa e dizer o nome. estamos juntos?
4. Tur. ((alguns alu.s)) sim
5. Prof. estamos juntos?
6. Tur. SIM
7. Prof. voluntários?
8. Tur. ((todos os alu.s levantaram as mãos))
9. Prof. ((vendo a disposição dos alu. em participar exclamou)) eya::: ((risos)) Dengu, vamo lá ao quadro
10. Dengu, alu2 ((apontou para a figura de sere humano e o prof. perguntou)) n´cani eco?
11. Dengu: pessoa
12. Prof. isso, muito bom. outro voluntário
13. Tur. ((levantou as mãos))
14. Prof. ((exclamou mais uma vez)) eya::: ((surpreso e alegre))
15. Prof. Liyani

179
16. Prof. muito bem. outro voluntário
17. Prof. outro voluntário?
18. Tur. ((6 alu.s predispuseram-se))
19. Prof. quer alu.s que ainda não foram ao quadro e selecciona dois dentre as mãos dos que não foram ao
quadro
20. Tur. ((Alu.s 5 foram para o quadro))
21. Prof. ((vendo a dificuldade do alu. 4, o prof. incentivou-lhe)) falar em qualquer língua, osicizivi ngu cilungu (se
não sabe em português) pode kuwomba ngu cicopi, hinakuvhuna (pode nomear em cicopi, ajudar-te-emos)
estamos juntos?
22. Alu.4 [dipirwa (é perú)
23. Alu.5 [cinyanyani (é passarinho)
24. Prof. ihi::: dipirwa (não é peru)
25. A tur. fica em ((silêncio))
26. Prof. i mani acizivaku? (quem conhece?)
27. Alu.2 diganxu (é ganso)
28. Prof. ok. masiziva sinyana sile solandisela tihomu? (conhecem os pássaros que seguem os bois) conhecem aqueles
pássaros? qual é a cor que eles têm?
29. Tur.[branca
[minyangani (garça-boeira)
30. Prof. n´cani si? (o que é?)
31. Tur. ((alguns alu.s)) minyangani (é garça-boeira)

Os alunos surpreenderam o professor quando levantaram as mãos para indicar e nomear os seres
vivos expostos no quadro segundo mostram os registos (9 e 14). Inesperadamente, o professor
deparou com tantos alunos voluntários que se predispunham a participar na actividade. Os alunos
competiam uns com os outros de tal forma que o professor decidiu escolher exclusivamente os
alunos menos participativos que tinham as mãos no ar (19) e incentivou-os a intervirem em L1 ou
em L2 (21). Os alunos intervieram simultaneamente “dipirwa” (perú) (alu.4 em 22) e “cinyanyani”
(passarinho) (alu.5 em 23). O professor não concordando com ambas respostas, caracterizou o
habitat do pássaro e ao questionar sobre a sua cor, alguns alunos responderam espontaneamente
“branca” enquanto os outros nomeavam-no em coro “minyangani” (garça-boeira) em (29). Os
alunos voluntariavam-se e competiam num clima de alta motivação e num ambiente de alto
dinamismo no qual, as experiências socioculturais trazidas pelos alunos eram exploradas na
aprendizagem do conteúdo da aula mediado por um repertório linguístico de duas línguas.

6.1.2.3 Aprendizagem participativa e colaborativa

O ensino da aprendizagem desenvolvia-se de forma participativa e colaborativa num ambiente de


altos níveis de voluntarismo e de competição. Os alunos demonstravam altos níveis de motivação
e de ansiedade para responder a cada pergunta formulada progressivamente pelos professores. O

180
extracto 44 apresenta evidências de altos níveis de participação e colaboração dos alunos na aula
na qual as duas línguas são exploradas não só para a aprendizagem dos conteúdos como também
para a aprendizagem da L2.

Extracto 44: Ruw.DC5.100217


1. Prof. prontos. podemos começar. primeiro voluntário quem é que quer dizer.
2. Tur. ((os alu.s estavam alegres e entusiasmadas, muitos voluntários levantaram as mãos))
3. Prof. ((não sabia a quem escolher))
4. Alu.7 pessoa
5. (...)
6. Prof. pessoa em citshwa (...)
7. Tur. MUNHU (É PESSOA)
8. Prof. munhu
9. Tur. ((os alu,s levantaram as mãos) sou::: eu::: sou::: eu:::
10. Al.8: cão
11. (...)
12. Prof. cão em português como se chama? he:::
13. Tur. ((alu.8 e alguns alu.s)) i bzwana (é o cão)
14. (...)
15. Tur. ((mais todos os alu.s levantaram as mãos, suplicando)) sou::: eu::: sou::: eu:::
16. Prof. ohhh vou escolher a quem?
17. Tur. sou::: eu::: sou::: eu:::
18. Prof. ((escolheu a Alu.10)) rápido (3x)
19. Alu.10 boi
20. (...)
21. Prof. boi em português, em citshwa i yini? (o que é?)
22. Tur. i hom u (é o boi)
23. Tur. sou::: eu::: sou::: eu:::
24. Alu.11 mocho
25. (...)
26. Prof. mocho o que é em citshwa?
27. Tur. cikhovha
28. Prof. cikhovha
29. Tur. ((todos eufóricos)) sou::: eu::: sou::: eu:::
30. (...)
31. Prof. agora eu só vou indicar e vocês vão dizer. aqui o que temos.
32. Tur. flor
33. Alu.14 cifilori (flor)
34. Prof. aqui
35. Tur. ((alguns alu.s)) cifufununu (escaravelho)
36. Prof. cifufununu, cifufununu (escaravelho, escaravelho)
37. Tur. ((risos))
38. Prof. não ahi cifufununu. mugana wa cihari cin´wi laha (é escaravelho. é amigo do outro animal aqui). gosta
muito de brincar com este aqui e este aqui ((apontou para a figura do boi)). gosta de chupar sangue. ciluma
lomu citshama. (penetra e lá permanence)
39. Alu.15 cidzadza (escorpião)
40. Prof. i yini? (o que é?)
41. Tur. cidzadza (escorpião)
42. Prof. cidzadza hizvona? ciga tihomu. hambi ka timbzwana vacikuma nacitshamile kolumuya (escorpião? penetra nos
bois e pode encontrar nos pêlos dos cães)
43. Tur. ((adivinha)) cigalan i (caraça)
44. Prof. cigalani. cigalani i yini hi cilungu? (o que é caraça em português?)

181
45. Tur. ((risos))
46. Prof. he::: he::: cigalani hi cilungu i caraça (caraça em português é caraça). wulani n´wetlhe carraça (digam todos
caraça) (4x)
47. Tur. caraça (4x)

A aula era flexível e dinâmica por conta dos altos níveis de participação massiva e voluntarismo
competitivo dos alunos. Os voluntários eram escolhidos dentre tantos que levantavam as mãos e
suplicavam incansavelmente “sou::: eu::: sou::: e:::”. (9, 15 e 23), colocando o professor na dura
tarefa de escolher um voluntário de cada vez “ohhh… vou escolher a quem?” (16). Os alunos
persistiam cada vez mais “sou::: eu::: sou::: e:::” (17).
Os alunos voluntários nomeavam os seres vivos e a turma providenciava rapidamente a tradução
em coro firme e alto (7, 13, 22, 24 e 27), aliviando parcialmente a ansiedade e a motivação dos
alunos. Nos registos (35 a 47) constatei um momento em que a turma e o professor colaboraram
para nomear adequadamente a imagem de “cigalani” (carraça). Os alunos propunham
“cifufununu” (escaravelho) em (35), contudo, o professor caracterizou o sere vivo em causa, num
discurso marcado pelo translanguaging (38). De repente, a alu.15 propôs “cidzadza” (escorpião) em
(9), contudo, não está correcto. Novamente, o professor apoiou a turma, referindo os animais que
servem do seu habitat (42). Finalmente, a turma adivinhou e anunciou em coro forte “cigalani”
(caraça) (43), mas não conhecia a palavra equivalente em L2, segundo ilustra o registo (44). Os
alunos envolviam-se colaborativamente na aula mesmo nos momentos críticos.
Neste ciclo constatei evidências de colaboração e inter-ajuda entre os alunos na aula. Numa das
cenas da aula, os alunos deviam analisar as relações de interdependência entre dois seres vivos
relevantes para a formação da cadeia alimentar, identificando-os no quadro, anunciando uma
frase ou em L1 ou em L2 e providenciando a respectiva tradução. Esta tarefa desafiou os alunos a
participarem na construção do conhecimento e da conceptualização da noção de cadeia alimentar.

Extracto 45: Citi.DC4.090217


1. (...)
2. Prof. então vamos agora olhar bem. (...) vamos olhar, pensar depois vou pedir voluntários. eu vou dar (.) dois
minutos só (.) vamos pensar
3. (...)
4. Prof. voluntários
5. Tur. ((a priori, 10 mãos estaram no ar))
6. Prof. Valangi
7. Valangi, alu.16 ((foi ao quadro e fez a primeira relação ligando)) “cigalani - carraça” → “homu - boi”
8. Prof. ((orientou)) então, depois falar, uhichamusela kukhawe njicani umahaku (explique-nos o que está a fazer)
podemos falar
9. Valangi, alu.16 cigalani yidiwalu homu khacihanyi (a caraça não sobrevive na ausência do boi)
10. (...)

182
11. Prof. cigalani hidiwalu homu khacina wutomi, khacina sakudya (a caraça não sobrevive na falta do boi pois não teria
alimento)(.) quem pode dizer isso em português? (1x)(.)(1x)
12. Tur. ((reflectiu e depois dois alu.s levantaram as mãos))
13. Prof. ok, temos aí o Koxiyani sim
14. Koxiyani, Alu.17 ((falou em voz baixa))
15. Prof. fale em voz alto
16. Koxiyani: quando o boi - ((ficou com a cara cabisbaixo))
17. (...)
18. Prof. quem quer ajudar? (2x)
19. Alu.18 ((levantou a mão discretamente))
20. (...)
21. Alu.18 ((acanhada e envergonhada)) adikhene – (disse que)
22. Prof. em português (...) ele falou em cicopi. ngu cilungu? (em cicopi)
23. Alu.18 dizia, quando (.) quando na- não está, não estão boi o- o car- o carraça, não vou, não vou (0.3) ((abriu
o caderno))
24. (...)
25. Prof. i::: outro voluntário
26. Tur. ((3 4 e 7 mãos dos alu.s voluntários estavam no ar))
27. Prof. ((escolheu o Minalo, alu.19))
28. Minalo ((foi para o quadro)) homu wudiwalu mwasi, hinafa (o boi morrerá na falta do capim)
29. Prof. ok, homu wudiwalu mwasi, hinafa. quem quer me dizer em português?
30. Tur. ((silêncio reflexivo))
31. Prof. hipimiseni mawombelo ngu cilungu (vamos pensar como traduzir para português) já
32. Tur. ((um voluntário levantou a mão))
33. Prof. ((advertiu-lhe a sentar porque tinha falado várias vezes na aula))
34. Tur. ((3 alu.s voluntariaram-se))
35. Prof. Othiyani
36. Othiyani, alu.20 °o boi-°
37. Prof. voz alta
38. Othiyani ((tímida e tur. atenta)) o boi quando não tem capim, há-de morrer.
39. Prof. ((surpreso)) ihi::: entenderam o que ela disse?

Não obstante a tarefa ser linguística e cognitivamente exigente, os alunos reflectiam observando
para as imagens dos seres vivos e voluntariavam-se activamente para indicarem e apresentarem
possíveis relações de interdependência baseadas nas suas experiências socioculturais. À solicitação
de voluntários, 10 alunos levantaram simultaneamente as mãos (5). A alu.16, Valangi, identificou
os seres “cigalani” (carraça) e “homu” (boi) em (7) e apresentou a respectiva frase “cigalani yidiwalu
homu khacihanyi” (a caraça não sobrevive na ausência do boi) em (9). Em continuação, o professor
solicitou outros voluntários para traduzir para o português, L2 a frase de Valangi (11). A turma
prontificou-se com 2 voluntários. O primeiro, Koxiyani alu.17 traduziu em voz baixa “quando o
boi…” mas não a concluiu. A alu.18 predispôs-se a ajudar inicialmente em L1 e depois em L2
após o apelo do professor (21) e (23). A alu.18 desafiou-se e traduziu forçosamente a frase “dizia,
quando (.), quando na, não está, não estão boi o- o car- o carraça, não vou, não vou – ” (23). Nesta
cena, os alunos foram capazes de construir as relações de interdependência, anunciaram as frases
em L1 e voluntariaram-se inseguros, acanhados e tímidos para expor as suas ideias em L2 num

183
ambiente de inter-ajuda. Os alunos esforçavam-se incansavelmente para participar e para
construir o conhecimento na aula mesmo incertos, inseguros e falando em voz baixa segundo
ilustram as participações das alunas Koxiyani, alu.17, em (16), e a alu.18. Apesar dos restantes
alunos terem constatado as dificuldades enfrentadas anteriormente (traduzir a frase de L1 para a
L2), continuavam a manifestar o interesse em participar na aula.
Na segunda cena, 7 alunos voluntariavam-se para participar da actividade. O Minalo, alu.19,
apresentou a frase “homu wudiwalu mwasi hinafa” (o boi morrerá na falta do capim) em (28) cuja
tradução não foi espontaneamente apresentada pelos alunos. Houve um momento de silêncio e de
reflexão da turma (30, 31), e depois, três voluntários predispuseram-se a traduzi-la em L2 (34). A
Othiyani, alu.20 iniciou a tradução tímida e em voz baixa contudo, a sua persistência resultou na
tradução correcta da frase do Minalo, alu.19, surpreendendo a todos (38). Estes cenários não se
evidenciaram na TC segundo ilustra o extracto 46. Os alunos não participavam muito menos
tinham oportunidade para construir os conhecimentos através de relações de interdependências
entres os seres vivos e anunciá-las com base em frases bilingues como actividade de aula.

Extracto 46: Mikho.DC5.100217


1. Prof. temos este nosso cabrito aqui vai comer capim
2. Tur. ((agitou-se, riu, muitos alu.s murmuravam ao ver o desenho do cabrito desenhado no quadropela prof.))
3. Prof. heyi::: estão a rir o quê? é cabrito isto aqui
4. Tur. e a prof ((risos))
5. Prof. então aqui, há uma animal que vai comer o cabrito, por exemplo, temos o leão. este leão aqui vai comer
o quê, vai comer o cabrito aqui
6. (...)
7. Prof. agora isto aqui, isto que formámos aqui chama-se de cadeia alimentar. estamos juntos?
8. Tur. sim.
9. Prof. chama-se de cadeia -
10. Tur. ALIMENTAR
11. Prof. temos primeiro o capim e depois do capim, cikumeka cin´wani civangwa ca wutomi cigaku a bzwanyi leg i (há
um outro sere vivo que se alimentará com o capim) que é o cabrito neste caso
12. (...)
13. Prof. o que come capim é o quê?
14. Tur. ((alguns alu.s)) cabrito
15. Prof. o que come capim?
16. Tur. CABRITO
17. Prof. cabrito este, é que vai comer este capim aqui. então, este leão aqui vai comer o quê?
18. Tur. CABRITO
19. Prof. vai comer cabrito. vai comer o quê?
20. Tur. CABRITO
21. Prof. vai comer o cabrito. isto aqui que nós formámos chama-se de cadeia alimentar. chama-se?
22. Tur. cadeia alimentar

184
Nesta evidência, a participação dos alunos é garantida pela exposição da professora que nos
registos (1, 5) estabelecia a relação de interdependência entre os seres vivos “cabrito → capim” (1)
e “cabrito → leão” (5) e denominando-a por “cadeia alimentar” (7). Os alunos neste extracto eram
simples ouvintes e receptores da informação diferentemente das evidências das TAI´s. A
participação dos alunos não foi voluntária e nem sequer foi individualizada. Após a exposição da
professora (1 a 7), a única estratégia na qual os alunos participavam era por via da terminação em
coro das frases iniciadas pela professora (11 a 20). Os alunos eram forçados a participar dentro dos
padrões de participação passiva promovidos pela professora.

6.2 Ciclo III: Interacção e participação e a ponte entre os conhecimentos


socioculturais e os universais

Nos ciclos de aulas I e II, os alunos demonstraram evidências de revitalização dos níveis aceitáveis
de participação e de interacção na aula que me permitiram planificar o ciclo III reservado ao tema
“Dieta Equilibrada - Funções dos diferentes tipos de alimentos”. Neste ciclo preconizava analisar
os níveis de participação e de interacção dos alunos a partir da leitura e da interpretação do texto
bilingue sobre os alimentos com base nos critérios e padrões de julgamento seguem na tabela 5.

Tabela 5: Critérios e padrões de julgamento de aulas do ciclo III


Ciclo: III
Conteúdo: Dieta Equilibrada - Funções dos diferentes tipos de alimentos
Título do ciclo: Interacção e participação na aula a partir da leitura, interpretação e comentário do texto
bilingue através de um discurso bilingue.
Pergunta de pesquisa do ciclo: Como a interpretação e ou comentário sobre o texto bilingue motiva
a livre participação e interacção dos alunos na aula?
Critérios: Padrão de julgamento:
1. Participação activa a partir do texto bilingue 1. Nível de participação dos alunos suscitado pelo texto
bilingue
2. Interacção conversacional suscitada pelo
texto e pelo contexto local 2. Expressividade dos alunos na interpretação do texto
bilingue e do contexto local
3. Aprendizagem colaborativa baseada em
duas línguas e dois conhecimentos 3. Participação segura e activa na interpretação do
texto bilingue
4. Livre participação dos alunos

185
4. Nível de facilitação da aprendizagem suscitado pelas
duas línguas e dois conhecimentos
5. Tom de voz usado (baixo, médio e alto)

6.2.1 Negociação interactiva dos conhecimentos e das línguas

Com base nas práticas de translanguaging, os alunos desenvolviam a aprendizagem não somente dos
conteúdos, mas também as das línguas de forma dinâmica e simultânea. A aprendizagem dos
conteúdos efectivava-se através das relações entre as duas línguas, garantindo a rápida
compreensão dos conteúdos.
Nas TAI´s, as aulas iniciaram com a leitura e a interpretação do texto bilingue (vide o extracto 47).
Estrategicamente, a professora da TAI de Ruwani orientou, primeiramente, a leitura do texto em
L2 e a seguir mediou a recapitulação dos tipos de alimentos aprendidos na 3ª classe, usando o
discurso de translanguaging.

Extracto 47: Ruw.DC8.080317


1. Prof. hi yihi amitiru ya tixaka ta zvakuga lezvi hina higaku hiii? (quais são as funções dos tipos de alimentos que
comemos?) nós na 3ª classe os grupos de alimentos. são quantos grupos?
2. Tur. 3
3. Prof. são?
4. Tur.3
5. Prof. são 3 grupos. qual foi o primeiro grupo que nós estudámos?
6. Tur. zvakuga – (alimentos – )
7. Prof. em – em dialecto = hi (em) citshwa
8. Tur. ((num coro médio e inseguro)) zvakuga zva kuhinyika ntamu (alimentos energéticos)
9. Prof. zvakuga zva ku? (alimentos?)
10. Tur. hinyika ntamu (energéticos)
11. Prof. zvakuga zva kuhinyika ntamu (alimentos energéticos). como é que nós podemos dizer em português?
12. Tur. ((alguns alu. observaram para o texto bilingue))
13. Prof. (...) Tiyani?
14. Tiyani, alu.8 energéticos
15. Prof. são?
16. Tiyani energiticos
17. Prof. são alimentos e-ner-gé-ti-cos
18. Prof. são alimentos energéticos
19. Prof. o outro grupo
20. Tur. [zvakuga zva kuhinyika ntamu (alimentos energéticos)
[zvakuga zva kuhivhikela mababzwi (alimentos protectores)
21. Prof. zvakuga zva kuhi – (alimentos –)
22. Tur. vhikela mababzwi (protectores)
23. Prof. zvakuga zva kuhivhikela mababzwi. ehhh (alimentos protectores) como é que nós vamos dizer emmm
dialecto?
24. Tur. ((3 alu.s levantaram as mãos))

186
25. Prof. sim, é Bilani que quer nós dizer zvakuga zva kuhivhikela mababzwi (sobre os alimentos protectores)
26. Biloni, Alu.9 preteteres
27. Prof. he:::
28. Biloni preteteres
29. Prof. entenderam o que disse o – o Biloni?
30. Tur. SIM
31. Prof. he:::
32. Tur. ((alguns alu.s opostamente)) [sim
[não
33. Prof. está certo de como falou?
34. Tur. NÃO
35. Tur. ((2 alu.s levantaram as mãos))
36. Prof. quem pode dizer o certo. Gikani
37. Gikani, Alu.10 protentores

O extracto acima ilustra um inédito evento de translanguaging na aula. Há que recordar que os
alunos efectuaram a leitura do texto bilingue exclusivamente na parte em L2, recapitularam os
tipos de alimentos aprendidos na classe anterior “zvakuga zva kuhinyika ntamu” (alimentos
energéticos) em (8) e “zvakuga zva kuhivhikela mababzwi” (alimentos protectores) em (20) e
voluntariavam-se para fornecer os respectivos equivalentes em L2 (25, 36). Os alunos liam
rapidamente o texto bilingue (12) e a seguir, predispunham-se voluntariamente a participar na
aula, expondo os equivalentes em L2. Por outras palavras, os alunos estabeleciam pontes entre os
conceitos dos tipos de alimentos em L1 e os em L2 sem que tivessem efectuado a leitura bilingue
das duas partes do texto, mas sim a leitura monolingue em L2.
Os alunos da TAI de Citimela leram o texto bilingue na sua íntegra e usaram-no como ferramenta
de consulta que garantia as suas participações sistemáticas bem como garantia a negociação de
conhecimentos na aula segundo evidencia o extracto 48.

Extracto 48: Citi.DC8.130317


1. Prof. quantos tipos de alimentos devemos comer para nosso corpo ficar saudável?
2. Alu.7 três
3. (...)
4. Prof. quem pode dizer um tipo de alimento que aprendeu aqui no texto
5. Tur. ((os alu.s consultaram o texto bilingue))
6. Alu.10 ((levantou a mão)) três
7. Prof. ehi::: são três, então diz lá só um tipo de alimento nesses três, ka tixaka ta tiraru hingawomba lixaka limwelo
ungagonda (diga um tipo de alimentos dentre os três que estudaste)
8. Alu.10 ((baixou-se para consultar o texto bilingue))
9. Prof. i mani angamana ou angatumbula? hi::: ? (quem achou ou descobruiu?)
10. Alu.11 tixaka sakudya, sakudya soni -- (.) = sovhikela malwati (os tipos de alimentos, alimentos que dão – (.) =
protectores)
11. Prof.a hi:::
12. Alu. 11 ni sakudya soninga mutamu (e alimentos energéticos)

187
13. Prof. adikhene sakudya socani? (que alimentos mencionou?)
14. Tur. ((coro)) sakudya sovhikela malwati ni sakudya sohiha mutamu (alimentos protectores e alimentos energéticos)
15. (...)
16. Prof . (...) mas ngu cilungu tona tiya tokhatu sakudya sovhikela malwati hingatiwomba kambi, tikhalisa kucani ngu cilungu?
(mas como podemos dizer alimentos protectores em português?)
17. Tur. ((em coro)) alimentos portitores
18. Prof. he:::
19. Tur. alimentos protitures
20. Prof. protectores. alimentos protectores. ahiwombeni hotshe (digamos todos)
21. Tur. alimentos protectores
22. (...)
23. Prof. ngu cicopi tikhene cani? (o que quer dizer em cicopi?)
24. Tur. ((alguns alu.s consultavam o texto)) sakudya sovhikela malwati (alimentos protectores)
25. Prof. ihi::: depois ele falou de um outro tipo de alimento. falou de tipo de alimentos, adikhene cani ngu cicopi,
sakudya socani? (o que ele disse em cicopi, são alimentos?)
26. Tur. soninga mutamu (energéticos)
27. Prof. he:::
28. Tur. sakudya soninga mutamu (alimentos energéticos)
29. Prof. i::: sakudya soninga n´tamu. hicisiwomba ngu ciputukezi hikhathu cani? (ah, alimentos energéticos. como diríamos
em português?)
30. Tur. ((lendo no quadro)) “alimentos energéticos”
31. (...)
32. Prof. ((corrigiu)) alimentos energéticos
33. Tur. alimentos energéticos
34. Prof. ihi::: lakelela lixaka limwedo (atenção, falta um tipo de alimentos), mas laho la limwelo (há outro) são três
tipos, não é? (...) quem se recorda desse tipo?
35. Alu.12 ((levantou a mão)) tixaka tohambanahambana ndokulisa (0.2) (os diferentes tipos fazem crescer)
36. Prof. ihi, ehhh obrigado. outro
37. Tur. ((duas mãos no ar))
38. Prof. deixa lá a menina também
39. Alu.13 sakudya – (alimentos – )
40. Prof. womba ngutu, womba ngutu (fale alto)
41. Alu.13 sakudya sokulisa mumidi (alimentos construtores)
42. (...)
43. Prof. eh, hingasiwombisa ku cani ngu cilungu? (como designaremos em português?)
44. Tur. alimentos consturuto
45. Prof. he:::
46. Tur. alimentos construtores
47. Prof. alimentos cons-tru-to-res. vamos falar todos
48. Tur. alimentos construtores

Os alunos da turma de Dongani leram o texto bilingue e efectuaram a recapitulação dos


conhecimentos em L1 suscitando a participação voluntária e individual dos alunos que nos registos
(10, 35, 41) apresentaram inicialmente os tipos de alimentos em L1 após consultar o texto lido e e
providenciaram os respectivos equivalentes em L2 (17, 30, 44).
Os extractos 47 e 48 evidenciam a exploração de um único repertório linguístico e discursivo na
aula e o esforço que os alunos envidam para relacionar linguisticamente os conceitos sobre os tipos
de alimentos em duas línguas e desta forma, compreender as respectivas noções e os conteúdos da

188
aula. Em outras palavras, os professores medeiam as aulas e motivam aos alunos a estabelecerem
equivalências entre os conceitos a partir das duas línguas.
As evidências dos alunos da TC de Mikhokhweni foram distintas das que constatei nas TAI´s de
Ruwani e de Citimela. Os alunos leram o único texto em L2 e quando tentavam responder as
perguntas de interpretação recorriam às estratégias de participação passiva baseadas no coro e no
murmúrio em L1 e outras vezes em L2 tal como ilustra o extracto 49.

Extracto 49: Mikho.DC8.080217


1. Prof. nestes alimentos, temos grupos de alimentos (...)
2. Prof. nestes alimentos temos o quê?
3. Tur. °grupos°
4. Prof. falem alto:::
5. Tur. grupos de alimentos
6. Prof. hini mitlawa ya zvakuga zvimahaku lezvi, zvimahaku lezvi, ni zvakuga zvimahaku lezvi (temos tipos de alimentos
que fazemisto e aquilo). aquilo que vimos na 3ª classe. ka (na) 3ª classe hite kuni zvakuga zva kumaha yini? (vimos
alimentos que fazem o quê?)
7. Tur. ((murmúrio))
8. Prof.a ndzizvizvi (não estou a ouvir)
9. Tur. ((em coro murmurado e baixo)) °zvonyika wutomi° (dão-nos a vida)
10. Prof. zvomaha yini? (que fazem o quê?)
11. Tur. zvonyikela wutomi (que dão a vida)
12. Prof. kunani kuga kasi zvihimaha yini? (comemos para quê?)
13. Tur. ((respondeu murmurando com ideias individuais))
14. Prof. zvigi zva wutomi? (são consumidores da vida?)
15. Tur. ((murmúrio, risos))
16. Prof. para hingafi? (não morrermos?)
17. Tur. ((risos, murmúrio))
18. Prof. e::: ndzolava kuzvitiva. kuni zvakuga higagu kasi zvihimaha yini, ni lezvi higaku kasi zvihimaha yini, zvihimaha yini.
mitlawa minharu hingagondza ka (quero saber. há alimentos que comemos para isto e aquilo. são três tipos de
alimentos que estudamos na) 3ª classe. kuni lezvi higaku para zvihimaha yini? (há alimentos que comemos para
quê?)
19. Tur. [((alguns alu.s murmuraram))
[((outros respondiam)) zvihivhikela mababzi (protegem-nos contra as doenças)
20. Prof. zvihimaha yini? (para quê)
21. Tur. ((coro forte)) ZVIHIVHIKELA MABABZI (PROTEGEM-NOS CONTRA AS DOENÇAS)
22. Prof. agora em português são alimentos protectores, estamos juntos?
23. Tur. ((alguns alu.s)) sim
24. Prof. em português são alimentos protectores -
25. Tur. ((repetiram)) protectores
26. Prof. protectores que nós protegem das doenças. hazvana (estamos juntos)
27. Tur. sim
28. Prof. mingazvirivakeni (não se esqueçam), temos alimentos protectores. ni lezvi zvimahaku yini? (e alimentos que
nos fazem o quê?)
29. Tur. ((coro fraco)) <hikula> (crescer)
30. Prof. zvihimaha yini?
31. Tur. ((coro alto)) HIKULA
32. Prof. hikula, alimentos que comemos para crescer
33. (...)
34. Prof. crescer zvilava kuwula kuyini (o que significa)
35. Tur. akukula (crescer)

189
36. Prof. hilezvi higaku para hi maha yini (é o que comemos para nos fazer o quê)
37. Tur. ((alguns alu.s)) hikula (crescer)
38. Alu.9 zvihimaha hikuma ntamu (dão-nos energia)
39. Prof. hikuma – (ter –)
40. Tur. a ntamu (força)
41. Prof. então em português são alimentos protectores, alimentos construtores e alimentos energético

Em (1), a professora introduziu o tema da aula e, em (2), exigiu que os alunos repetissem a
terminação da sua última frase. A turma repetiu em coro baixo (3) e, após apelo da professora para
falarem em voz alta (4), os alunos repetiram “grupos de alimentos” (5). A seguir, os alunos
murmuram (7) na tentativa de recapitular “mitlawa ya zvakuga” (tipos de alimentos), em resposta
à solicitação da professora em (6). Após a insistência da professora em (8), a turma definiu uma das
funções dos alimentos “zvonyika wutomi” (dão-nos a vida) (9) ao invés de anunciar os tipos de
alimentos. A professora insatisfeita com a resposta em (9 e 11) e o murmúrio de vários alunos, em
(13) persistiu propositadamente com duas afirmações erradas (14, 16), mas mesmo assim, a turma
não melhorou a resposta apresentada em (9 e 11). Após a reformulação da pergunta em (18), alguns
alunos murmuraram para anunciar mais uma vez a definição de mais um tipo de alimento
“zvihivhikela mababzi” (protegem-nos contra as doenças) em (19) e a turma repetiu em (21).
Diferentemente das evidências das TAI´s, a equivalência dos conceitos sobre os tipos de alimentos
foi efectuada pela professora e repetida pelos alunos segundo ilustram os registos (22, 24, 25). Nos
restantes registos, os alunos mencionaram com ajuda da professora, a segunda definição da função
dos alimentos “hikula” (crescer) (29, 31 e 37) e em (38), o alu.9 apresentou voluntariamente a última
função dos alimentos “zvihimaha hikuma ntamu” (dão-nos energia). Em (40) a turma captou a
definição do alu.9 e repetiu em coro. Sem a devida negociação com os alunos, a professora expôs
os três tipos de alimentos em L2 “alimentos protectores, alimentos construtores e alimentos
energéticos” segundo mostra o registo (41).
Em ambas turmas, os alunos recapitulavam os conhecimentos anteriores em L1 mas apresentavam
níveis desiguais de participação e de interacção. Os alunos das TAI´s mostravam-se mais dinâmicos
neste ciclo que os alunos da TC que expuseram forçosamente as funções dos alimentos. A
disponibilidade do texto bilingue nas TAI´s facilitou a aprendizagem activa, tornou-se numa
ferramenta não apenas essencial para a aprendizagem dos conteúdos da ciência como também
numa estratégia de aprendizagem das línguas através da negociação entre elas. A partir do texto

190
bilingue, os alunos motivados e entusiasmados construíram pontes entre as duas línguas e entre os
conhecimentos do texto e as suas experiências socioculturais.

6.2.1.1 Interacção dinâmica e eufórica dos alunos diante de recursos locais

No decurso das aulas deste ciclo e após constatar as evidências suscitadas pela leitura e
interpretação do texto bilingue, observei a aula relativa à classificação dos diferentes alimentos
locais em três tipos de alimentos (energéticos, protectores e construtores). Interessava-me avaliar
os níveis de participação e de interacção dos alunos na aula a partir dos diferentes alimentos locais
reais. À primeira vista, os alunos ficaram entusiasmados, alegres, ansiosos e motivados em
participar na aula ao verem os diferentes alimentos locais e manufacturados expostos na sala de
aula tal que, os alunos da TAI de Citimela predispuseram-se a adivinhar o tema da aula segundo
mostra o extracto 50.

Extracto 50: Citi.DC9.160317


1. Prof. voluntários, qual é o tema da aula de hoje?
2. Tur. ((9 alu.s levantaram as mãos))
3. Prof. aqui, mibhudi já mipwanidi (concertaram)
4. Alu.12 hi:::
5. Prof. qual é o tema?
6. Alu.12 ((murmurou e depois não disse nada))
7. Prof. ohhh vocês não querem falar. vamos para outros. aqui?
8. Alu.13 hiwombawomba ngu tixaka ta sakudya (falaremos sobre os tipos de alimentos)
9. Prof. ((entusiasmado)) ok, tixaka ta – (tipos de)
10. Tur. sakudya (alimentos)

A disposição voluntária dos alunos foi evidente segundo ilustra o registo (2). Ainda que o primeiro
voluntário (alu.12) não tenha exposto a sua adivinha (4, 6), os outros alunos mantinham as mãos
no ar. Destes, o professor indicou o alu.13 que em (8), apresentou a sua certíssima resposta em L1
“hiwombawomba ngu tixaka ta sakudya” (falaremos sobre os tipos de alimentos), espantando e
entusiasmando o professor em (9).
No decurso da aula, evidenciei cenas de sala de aulas nas quais, mais uma vez, os alunos
disputavam-se para se voluntariar e nomear, em duas línguas os alimentos locais expostos tal como
o teria feito aquando da aula sobre os “seres vivos”. Eis o extracto 51.

191
Extracto 51: Citi.DC9.160317
1. Prof. muwona cani hawa (o que estão a ver aqui)
2. Tur. ((muitos alu.s levantaram as mãos))
3. Prof. i mani akuni ni dina diphelaku ngu “B” (quem tem o nome que começa com a letra “B”)
4. Tur. ((4 alu.s levantaram as mãos))
5. Prof. ok, vamos. uwona cani. muchachekidi (o que vês aqui. estejam à vontade) o que você consegue ver na mesa?
6. Alu.1 ((motivada)) cebola
7. Prof. cebola, pode sentar mais outro voluntário
8. Tur. ((5 mãos))
9. Alu.2 pão
10. Prof. pão. vamos vamos
11. Alu.3 °tapioca°
12. Prof. em voz alta
13. Alu.3 tapioca
14. Prof. tapioca
15. Alu.4 ovo
16. Prof. ovo
17. Alu.5 alface
18. Prof. alface. aqui ((referindo a um grupo que não se voluntariava))
19. Alu.6 °cebola°
20. Prof. cebola
21. Alu.7 pera
22. Prof. pera aqui. womba (diga)
23. Alu.8 banana
24. Prof. banana
25. Alu.9 batata-doce
26. Prof. batata-doce em cicopi como nós chamamos?
27. Tur. ((em coro audível)) mihamb u (batata doce).
28. Prof. mihambu. aqui assim, mais vamos
29. Alu.10 peixe
30. Prof. peixe, peixe em port -- em cicopi?
31. Tur. SIHAKA (PEIXE)
32. Prof. ((dirigiu-se a uma alu. que estava de pé)) quer falar menina? diz lá
33. Alu.11 sihaka

Todos os alunos, com a excepção da alu. 11 em 33, intervieram voluntariamente em L2 para


nomear os alimentos locais expostos na aula contrariamente ao discurso translanguaging usado pelo
professor. As únicas oportunidades nas quais se usou a L1 visavam providenciar a tradução em
coro audível dos alimentos “batata-doce” (mihambu) (27) e “peixe” (sihaka) (31). De qualquer das
formas, assinalou-se nesta actividade, a competição dos alunos que, de forma flexível e em altos
níveis de dinamismo, nomearam os alimentos expostos na aula entusiasmados e motivados.
A TAI de Ruwani demonstrou um cenário de sala de aula no qual os alunos estavam mais agitados,
espantados e emocionados ao depararem com os alimentos expostos na aula. Os alunos divertiam-
se alegres, riam e interagiam abertamente uns com os outros, segundo mostra o extracto 52.

192
Extracto 52: Ruw.DC9.100317
1. Alu.6 Rixani onavela pawa i::: tshumbula (Rixoni está a cobiçar o pão é mandioca)
2. Tur. ((outros alu.s punham-se de pé para ver o que estava na mesa))
3. Alu.7 ((espantado)) i nyama (carne)
4. Alu.8: Ginela odembetela (Ginela está a apropriar-se da mesa)
5. (...)
6. Tur. hi:::
7. Prof. cuwukisa kwhatsi (observe com atenção)
8. Alu.9 amubavi (canana)
9. Tur. ((risos))
10. (...)
11. Prof. o quê que nós vimos aqui na mesa?
12. Tur. ((em coro audível)) >alimen –
13. Prof. ehehe:: uma pessoa por cada vez
14. Tur. ((todos os alu.s levantaram as mãos e ficaram em pé)) sou::: eu::: sou::: eu:::
15. Prof. u::: Milani, até que enfim hoje
16. Milani, alu.10 pão
17. Tur. ((risos))
18. Prof. he::: Milani?
19. Alu.10 pão
20. Prof. uwonili a pawa (viu o pão)
21. Alu.10 din´wa (laranja)
22. Prof. din´wa
23. Alu.10 ((silêncio))
24. Alu.11 ((incentivou o colega alu.10 em voz baixa)) °wula zvin´wanyani. hi lezviyani basi° (diga outros alimentos.
só são esses)
25. Tur. ((outros 2 alu.s (Alu.12 e 13) davam-lhe força)) wula, wula (diga, diga)
26. Tur. ((2 alu.s levantaram-se voluntariamente para ajudar ao colega Alu.10))
27. Prof. hi lezvi angazviwona mani Milani (foi o que viu o Milani)
28. Tur. ((rapidamente todos os alu.s levantaram-se as mãos de uma só vez))
29. Prof. viu uma laranja e um –
30. Tur. pão
31. Tur. ((suplicou)) sou::: eu::: sou::: eu:::
32. Prof. Kitanyani o quê que viu aqui na mesa, vamos
33. Kitanyani alu.14 ((levantou-se sorridente e ficou (0.3) em silêncio))
34. Alu.15 ((espantou-se ao constatar o silêncio da alu.14)) i:::::
35. (...)
36. Tur. ((ficou de pé entusiasmada, super-disposta e gritando com as mãos no ar)) sou::: yewo::: sou::: yewo:::
37. Prof. deixem a Kitanyani falar, ainda é vez da Kitanyani

Os alimentos expostos na mesa da sala de aulas originaram espanto e diálogo entre os alunos
segundo ilustram os registos (1, 3, 4, 8). A motivação era tão alta tal que, em resposta à primeira
pergunta formulada pela professora em (11) todos os alunos iniciaram a resposta em coro audível
(12) assim como todos se voluntariaram levantando as mãos, ficando de pé a suplicando
persistentemente “sou::: eu::: sou::: eu:::” (14). Dentre os alunos voluntários, a professora exclamou ao
ver a disposição voluntária do aluno Milani, um aluno menos participativo (15). A seguir, Milani
alu.10, nomeou alguns alimentos (pão, “din´wa” (laranja)) dentre os expostos na mesa segundo
mostram os registos (19, 21), entretanto, Milani não mais prosseguiu com a nomeação de outros

193
alimentos segundo ilustra o seu silêncio em (23). Colaborativamente três alunos incentivavam-lhe,
dando-lhe força para mencionar outros alimentos “wula zvin´wanyani. hi lezviyani basi” (diga
outros alimentos. só são esses) (alu.11 no registo 24), “wula, wula” (diga, diga) (2 alu.s no registo
25) enquanto no fundo da sala, dois alunos levantavam-se uma vez que Milani não prosseguia (26).
Ora, quando a professora encerrava a oportunidade concedida ao Milani em (27), a turma
levantou-se empolgada e disposta a participar na aula voluntariamente. A professora escolheu a
Kitanyani, alu.14 (32), contudo o seu silêncio não sossegou o alu.15 que, em (34) espantou-se “i:::”
ao constatar que a sua colega desperdiçava a oportunidade de intervir ao não nomear nenhum
alimento dentre tantos expostos na mesa. Os restantes alunos pressionavam e suplicavam a escolha
uma vez que a alu.14 não se pronunciava (36). Diante da pressão voluntária dos alunos, a
professora nada mais fez senão liberalizar a participação voluntária e flexível de vários alunos que
intervieram um atrás do outro segundo ilustra o extracto 53.

Extracto 54: Ruw.DC9.100317


1. Prof. o quê que viu?
2. Alu.16 kovha (banana)
3. Prof. he::: (o quê?)
4. Alu.16 kovha (banana)
5. Tur. ((risos))
6. Alu.17 a kovha wulahaya (a banana está ali)
7. Prof. aha::: viu?
8. Alu.18 banana
9. (...)
10. Prof. mais
11. Alu.19 nyama (carne)
12. Prof. ((rindo)) nyama (carne) viu também nyama (carne)
13. Tur. carne
14. (...)
15. Prof. é o que nós só vimos ai?
16. Tur. ((alu.s levantaram as mãos, ficaram pé e suplicavam)) sou::: yewo::: sou::: yewo:::
17. Prof. aqui Dizani
18. Dizani, Alu.21 pão
19. Alu.22 vawulile (já foi nomeado)
20. Prof. he:::
21. Alu.22 matsawu (hortaliça de abóbora)
22. Tur. ((alguns alu.s)) hortaliça
23. Alu.23 timanga (amendiom)
24. Alu.24 ((traduziu espontaneamente em voz baixa)) amendoim
25. Prof. amendoim
26. Alu.26 mitsumbula ohhh, mihambu (mandioca ohhh, batata doce)
27. Prof. ihi:::
28. Alu.27 tarajalina (tangerina)
29. Prof. ihi::: mun´wani, mun´wani (outra/o voluntária/o, outra/o)
30. Tur. ((todos, levantaram as mãos e ficaram de pé)) sou::: yewo::: sou::: yewo:::
31. Prof. aqui

194
32. Alu.28 gugumelo
33. Prof. he:::
34. Tur. ((alguns alu.s corrigindo o alu.28)) cogumelo
35. Alu.28 ((corrigindo-se)) cogumelo
36. Prof. cogumelo ihi::: cogumelo em dialecto
37. Tur. ci – cib´owa (cogumelo)
38. Alu.29 farinha
39. Prof. farinha. ali tem dois tipos de farinha. viram?
40. Tur. ((alguns alu.s levantaram-se para ver os dois tipos de farinha))
41. Prof. viram?
42. Tur. sim
43. Alu.30 arroz
44. Prof. kuni muhlowo mimbiri (há dois tipos de farinha)
45. Alu. 30 = farinha de tapioca
46. Prof. aha::: tem tapioca kunga (que é)?
47. Tur. rali (farinha tapioca)
48. Prof. rali. tem farinha de milho kunga (que é)?
49. Tur. pupu (farinha de milho)
50. Prof. aha::: está bom
51. Alu.31 cenoura
52. Prof. depois
53. Alu.32 Dinyazi ali khayena é para higama higa hina (Dinyazi disse que depois vamos comer)
54. Prof. eh deixar de brincadeiras aí
55. Alu.33 arroz
56. Prof. arroz

Com a liberalização da participação dos alunos, a aula passou a evidenciar uma participação
qualitativa e activa de todos os alunos. O ambiente da sala de aulas evidenciava altos níveis de
motivação e de super-disposição dos alunos para se expressar de forma voluntária, activa e livre,
flexibilizando e dinamizando colaborativa e construtivamente a aula (16, 30). Os alunos divertiam-
se e riam dispostos para exporem o que observavam sobre a mesa segundo ilustram os registos (2,
11, 18, 21, 24, 28, 32, 38, 51, 55). Alguns alunos falavam a sós “a khovha wulahaya” (a banana
está ali) (6), advertiam os colegas que repetiam os alimentos já nomeados na aula “vawulile” (já foi
nomeado) (19), corrigiam alguns erros constatados em L2 “gugumelo (cogumelo)” (32, 34, 35) e
apresentavam piadas no decurso da aula “Dinyazi ali khayena é para higama higa hina” (Dinyazi
disse que depois comeremos) (53, 54).
Os alunos nomeavam os alimentos em ambas as línguas através da tradução espontânea “khova”
banana) patente no registo (4, 8); “nyama” (carne) (11, 13); ”matsawu” (hortaliça de abóbora)” (21,
22); “timanga” (amendoim) (23, 24) e da tradução orientada pelo professor “cogumelo” (cib´owa)
(35, 37); “farinha de tapioca” (rali) (46, 47); “farinha de milho” (pupu) (48, 49). Estas cenas
evidenciavam a normalização de uma nova prática discursiva que se enraizava na aula. Nestes
termos, os alunos adquiriam a habilidade de pensar e expressar flexivelmente em duas línguas.

195
No início da aula da TC, os alunos reflectiam e voluntariavam-se motivados para participar na
aula, mencionando em L2 os alimentos que consumiam conforme mostra o extracto 54.

Extracto 54: Mikho.DC8.080317


1. Prof. todos nós comemos. comemos ou não comemos?
2. Tur. comemos
3. Prof. quem come?
4. Tur. ((todos os alu.s levantaram as mãos em resposta à pergunta do prof.))
5. Prof. aha::: então dizer o que nós comemos (0.3). Zulani, o que você come? (0.2). levanta lá me dizer o que
você come. para poder crescer, come -?
6. Zulani, alu.1 °mathapa° (matapa11)
7. Prof. come mathapa. Rilani
8. Rilani, alu.2 ((levantou-se com a cara cabisbaixa))
9. Prof. come?
10. Rilani, alu.2 °feijão°
11. Prof. come feijão, e::: Xikani
12. Xikani, Alu.3 °come peixe°
13. Prof. peixe. outra pessoa que quer dizer o quê que come, hi:::
14. Tur. ((os alu.s mostraram-se dispostos a voluntariar sem as mãos no ar))
15. Alu.4 °come hortaliça°
16. Prof. come hortaliça. outra pessoa
17. Tur. ((2 alu.s levantaram-se simultaneamente e uma disse)) come banana
18. Tur. ((mais 2 alu.s levantaram-se))
19. Alu.3 come laranja
20. Prof. eu acredito que todos nós comemos, vale a pena falarmos daquilo que comemos, cada um dizer eu
como isto (...)
21. Alu.3 °cacana°
22. Prof. comemos cacana, a seguir
23. Tur. ((alu.s não se levantaram))
24. Prof. comemos galinha, obrigado. outra pessoa
25. Tur. ((silêncio))
26. Prof. Dinalunga, você não come? come mas não sabe o que come? levanta lá pelo menos hoje primeiro
minuto nós dizer o que você come
27. Alu.5 Dinalunga ((de pé respondeu)) hortaliça
28. Prof. hortaliça, custava dizer isso ai? mais
29. Tur. ((os alu.s mostravam-se indecisos para se levantarem e dizer em voz alta o que comiam. alguns alu.s
simulavam levantar-se e depois sentavam-se discretamente sem dizer nada))
30. Alu.6 xima12
31. Prof. come xima. outra pessoa
32. Alu.7 e 8 ((levantaram-se duma vez))
[Alu.7 come mathapa (um prato tradicional à base de folhas de mandioqueira, leite de coco, farinha de
amendiom e por vezes com maríscos)
[alu.8 amendoim
33. Prof. ((dirigiu-se ao Alu.9 Rifu)) você não come?
34. Alu.8 Rifu ((silêncio))
35. Tur. ((Risos))
36. Prof. = mas vive. como você vive? o que você come?
37. Rifu (tímido e cabisbaixo) mathapa

11 Mathapa é um prato tradicional moçambicano à base de folhas de mandioqueira, leite de coco, farinha de

amendiom e condimentado com mariscos.


12 Prato moçambicano à base de farinha de milho.

196
Em reação à primeira pergunta feita pela professora em (3), todos os alunos levantaram as mãos
para confirmar que comiam entretanto, os primeiros alunos que intervieram em (6, 10 e 12) o
fizeram sob a solicitação da professora. À solicitação de voluntários feita em (13), os alunos
mostraram-se dispostos contudo somente o alu.4 voluntariou-se e interveio em voz baixa (15). Nos
registos (17 e 18), duas duplas de alunos levantaram-se simultaneamente e a seguir, outros alunos
voluntariavam-se com alguma hesitação e insegurança após o apelo da professora em (20). Outros
ainda (Dinalunga, alu5 em 27 e Rifu, alu.8 em 38) intervieram sob uma solicitação forçada.
No seguimento da aula, os alunos nomeavam em coro os alimentos que a professora os expunha-
no ar e indicavam a respectiva função. Os alunos da TC participavam na aula alegres e motivados
em L2 mas murmuravam diante de algumas perguntas linguisticamente inacessíveis em L2,
conforme evidenciam os registos (18 e 25) do extracto 55 a seguir.

Extracto 55: Mikho.DC8.080317


1. Prof. o que é isto aqui?
2. Tur. ((em coro)) óleo
3. (...)
4. Prof. utilizamos para fazer o quê?
5. Tur. cozinhar
6. Prof. cozinhar o quê mais ou menos?
7. Tur. ((alguns alu.s responderam discretamente)) carne, peixe
8. (...)
9. Prof. (dirigindo a um alu.) o que é isto aqui?
10. Tur. tomate
11. Prof. eu queria esse menino que não gosta de falar
12. Prof. o que é isto aqui Rolanyani?
13. Rolanyani, alu.9 ((tímido)) tomate
14. Prof. serve para quê?
15. Rolanyani, Alu.9 comida
16. Tur. ((risos))
17. Prof. ((virou-se para a tur.)) para que serve o tomate?
18. Tur. ((murmurou e em voz baixa ouviam-se algumas vozes) °cozinhar°
19. (...)
20. Prof. quem já viu isto aqui?
21. Tur. ((os alu.s levantaram as mãos))
22. Prof. o que é isto aqui?
23. Tur. ((com as mãos no ar, os alu.s responderam empulgados)) [batata
[é batata
24. Prof. para que serve a batata?
25. Tur. ((silêncio e murmúrio))
26. Prof. o que é isto aqui?
27. Tur. ((alguns alu.s)) é leite
28. (...)
29. Prof. o que é isto aqui?
30. Tur. é sumo
31. Prof. serve para quê?
32. Tur. ((alguns alu.s)) beber

197
Os alimentos trazidos à aula elevaram a motivação e o clima de sala de aulas. Os alunos
mostravam-se dispostos a participar na aula com base no coro nos registos (2, 5 e 7). Houve, pelo
menos, algum despertar da participação dos alunos diferentemente das aulas anteriores. Neste
ambiente de aula, os alunos mostravam-se mais alegres, confortáveis e à vontade contudo, quanto
mais a aula se desenvolvia exclusivamente em L2 e sem a exploração dos alimentos trazidos à aula,
os alunos participavam desmotivados, num clima inflexível e com recurso às estratégias passivas
em L2. Nestas situações, era evidente o esforço pedagógico que a professora envidava para obter
a participação e a interacção dos alunos e, sobretudo, usando a voz alta. Raramente os alunos
atreviam-se a falar voluntária e espontaneamente.

6.2.1.2 Construção participativa e interactiva de novos conhecimentos

A aprendizagem do conteúdo sobre a “dieta alimentar” afigurava-se como um novo conteúdo após
a aprendizagem bilingue dos diferentes alimentos aprendidos interactivamente nas aulas anteriores
(os alunos nomearam os alimentos expostos na aula anterior). Neste conteúdo, houve a exposição
de cartazes bilingues contendo os conceitos-chave da aula nas TAI´s, nomeadamente: frutos,
verduras, carnes, tubérculos e cereais, alimentos construtores, alimentos protectores, alimentos
energéticos, dieta equilibrada e variar. Os professores de ambas as TAI´s orientaram a primeira
actividade que consistia na leitura dos cartazes bilingues colados na parede frontal da sala de aulas
e a seguir, realizaram a actividade de classificação dos diferentes alimentos expostos na mesa de
acordo com as categorias: (i) frutos, verduras, carnes, tubérculos e cereais; e (ii) tipos (energéticos,
construtores e protectores). Em outras palavras, os alunos juntaram os alimentos que pertenciam
a mesma categoria, guiando da equivalência lexical L1 – L2 patente nos cartazes bilingues.
No decurso da actividade, o professor da TAI de Citimela recorreu a três papéis e escreveu em
cada um, o nome de cada tipo de alimento em L1 e L2 (alimentos energéticos, alimentos
protectores e alimentos construtores) seguido pela respectiva função no organismo humano em
L2 . Aos alunos cabia-lhes a actividade de receber um papel, lê-lo à turma e depois, indicar as
respectivas categorias de alimentos classificados na mesa que são correspondentes a um dos três
tipos de alimentos. No decurso desta actividade, os alunos participavam de forma activa, divertida
e voluntária, ajudavam-se colaborativa e construtivamente sempre que os colegas enfrentassem

198
alguma dúvida ou dificuldade para classificar os alimentos nas respectivas categorias. Neste
contexto, os alunos interagiam de forma dinâmica e as línguas fluíam como um único repertório
linguístico e discursivo de sala de aulas conforme ilustra o extracto 56.

Extracto 56: Citi.DC9.160317


1. Prof. ((ilustrou o papel e pediu voluntários))
2. Alu.17 ((levantou-se, recebeu o papel e leu)) “alimentos cons – com- construímos”
3. Prof. ((corrigiu)) construtores
4. Alu.17 construtores, ajudam-nos a cre- crexiser
5. Prof. ((corrigiu)) crescer
6. Alu.17 crescer
7. Prof. quais são?
8. Alu.17 ((silêncio))
9. Prof. ((risos)) wopimisa m´fo? (estás a pensar amigo)
10. Alu.17 ((mostrou-se insegura e indecisa))
11. Prof. quem pode ajudar?
12. Tur. ((6 voluntários levantaram as mãos))
13. Alu.18 ((indicou os alimentos construtores))
14. Tur. ((leu)) “sakudya soninga n´tamu - alimentos energéticos”
15. Prof. alimentos energéticos sihininga n´tamu. ka si singasala sa simbidi, (dão-nos força) (...) quais são os alimentos
que vocês acham que nós dão força para nós brincarmos, comemos todos os dias esses alimentos. está aqui o
papel
16. Tur. ((9 voluntários))
17. Alu.19 ((recebeu o papel))
18. Prof. são alimentos que comemos todos os dias para irmos a escola, trabalhar, brincar
19. Alu.19 alimento ener –
20. Prof. ((ajuda-lhe a completar)) gético
21. Alu.19 energético (0.3) dão-nos energia
22. Prof. energia, mahiziva (conhecem-a) energia, n´tamu (força) hu::: ((gesticula força corporal)) (...) quais são os
alimentos energéticos menina? comemos todos o dias.
23. Alu.19 ((dirigiu-se à mesa com muita calma))
24. Tur. ((agitou-se, uns levantavam as mãos e outros ficavam de pé))
25. Prof. quem quer ajudar?
26. Tur. ((12 alu.s levantaram as mãos, 9 ficaram de pé e destes 6 correram para a mesa com o objectivo de
ajudar a alu.19 a identificar os alimentos energéticos))
27. Alu.20 ((obteve o papel da alu.19 e leu)) “alimentos energéticos, dão-nos força”
28. Alu.20 ((indicou o respectivo grupo de alimentos))
29. Tur. sakudya sohivhikela m´midi - alimentos protectores
30. Alu.21 ((leu)) “alimentos protonto” – protectores
31. Prof. ehhh
32. Alu.21 prototores
33. Prof. protegem
34. Alu.21 protegem nos de -
35. Prof. doenças
36. Alu.21 doenças
37. Prof. quais são?
38. Alu.21 ((indicou-os com a mão))
39. Prof. ndakawe (diga que) são estes
40. Alu.21 são estes
41. Prof. pronto, m´pekeleni mandza (uma salva de palmas). agora ngonani motshe mitawona. mingadweneee. ningadweni
(venham todos ver. não lutem. não lutem).
42. Tur. ((os alu. correram para a mesa a fim de observar os tipos de alimentos classificados))

199
Os materiais locais e a disponibilidade de dois recursos linguísticos contribuíram significativamente
para activar a participação consciente, qualitativa dos alunos na aprendizagem colaborativa,
interactiva de novos conhecimentos. A alu.17, por exemplo, mostrou-se indecisa e insegura para
demonstrar os alimentos construtores (10), no entanto, em (12), 9 alunos prontificaram-se para
ajudá-la, dos quais, o alu.18, em (13) voluntariou-se e indicou-os. A seguir, mais 9 alunos
voluntariaram-se (16) dentre os quais, a alu.19 recebeu e leu o papel da actividade com ajuda do
professor (19 e 20), mas ela foi lenta, o que motivou a predisposição espontânea e voluntária da
turma segundo ilustra o registo (23). Uns levantavam as mãos e outros ficaram de pé, manifestando
a sua disponibilidade para ajudá-la (24) e outros ainda, correram em direcção ao alu.19 (26). O
professor autorizou o alu.20 para que a ajudasse, conforme mostram os registos (27 e 28). Por fim,
o alu.21 realizou, com sucesso, a última actividade sob olhar atento dos restantes alunos e do
professor.
As evidências desta aula demonstraram-me que a mediação dos recursos didácticos locais e a
permanente promoção e liberalização de ambas as línguas, nas actividades têm elevado o nível de
participação e interacção colaborativa dos alunos para construir novos conhecimentos na aula. Em
contrapartida, os alunos da TC registaram sérias dificuldades para recapitular a aula anterior
relativa à “dieta alimentar” e aos “tipos de alimentos” leccionada com base na estratégia de
aprendizagem passiva (exposição e repetição) e exclusivamente em L2. Os alunos murmuravam
incompreensivelmente, activavam o silêncio, alguns falavam em voz baixa e tímida e outros em
coro segundo mostram os registos (1 a 6) do extracto 57.

Extracto 57: Mikho.DC9.100317


1. Prof. ((persistiu)) para estudar, trabalhar, correr, fazer exercício, brincar precisa ter o quê?
2. Tur. ((em voz baixa, murmurou))
3. Prof. precisa ter o quê?
4. Tur. ((alguns alu.s em voz baixa)) °energia°
5. Prof. não estou a perceber. precisa ter o quê?
6. Tur. ((ficou em silêncio e depois murmurou))
7. Prof. ter xixi?
8. Tur. ((alguns alu.s riram))
9. Prof. ((desabafou)) é que vocês, não conseguem, eu não sei se mahadana kota mingawula ku modhana (ainda estão
envergonhados como disseram), mas é bom dizer nem que fala em citshwa pode falar eu hei-de perceber,
não está proibido de falar citshwa muku hilezvi zvimahaku zvohi::: hi lezvi zvimahaku zvohi::: (citshwa explicando que
é isto que faz isto, é aquilo que faz aquilo). o que eu quero é que vocês falem
10. Prof. temos alimentos que fazem o quê?
11. Tur. ((ficou cabisbaixo e em silêncio))
12. Alu.1 ((interveio em voz inaudível)) ( )
13. Prof. zvimahaku hikula (que nos fazem crescer) é o que Marandhule (Alu.1) disse, fazem-nos crescermos, ni lezvi
zvihimahaku yini kambe? (e os que nos fazem o quê?)

200
14. Tur. ((murmurou))
15. Prof. he::: ((indicou um alu.))
16. Alu.2 ((em voz baixa)) °zvihimahaku hikuma ntamu° (dão-nos a força)
17. Prof. hingawulawula nguvhu, ahizvizwi (fale alto, não estou a ouvir)
18. Alu.2 ((tímida e em voz média)) ni lezvi higaku kuva hikuma ntamu (e aqueles que comemos para ter força)
19. Prof. ((repetiu para tur.)) ni lezvi zvaku higa kasi hikuma hinyi? (e aqueles que comemos para quê?)
20. Tur. ((os alu.s aparentavam o cansaco, clima de desmotivação, desinteresse e timidez)) ntamu (força)

A interacção dos alunos só se registou após o desabafo manifestado pela professora e a liberalização
do uso da L1 na aula em (9). A partir deste momento, constatei uma ligeira participação de somente
2 alunos (alu.1 e alu.2) que, em voz inaudível, baixa, insegura e num clima de timidez
recapitularam as duas funções dos alimentos em (12 e 16). A resposta da alu.1 foi, exclusivamente,
ouvida pela professora que se encontrava próximo do alu.1. A resposta do alu.2 foi anunciada em
voz baixa e com algum clima de insegurança e medo tal que a professora apelou que anunciasse
em voz alta (17). O alu.2 repetiu, mais uma vez, em voz baixa. A professora repetiu-a em voz alta,
contudo interrompeu para obrigar a terminação da turma em coro audível (19), mas infelizmente,
todos os alunos completaram num clima de cansaço, de desmotivação e de desinteresse “ntamu”
(força) em (20). A partir deste momento, os alunos mostravam-se mais passivos tal que aprendiam
repetindo forçosamente o discurso da professora conforme mostra o extracto 58 em continuação
do cenário de sala de aulas iniciado no extracto 57.

Extracto 58: Mikho.DC9.100317


21. Prof. lezvi zvimahaku hikuma ntamu (alimentos que nos dão força) são alimentos (0.2) energéticos. estamos juntos?
22. Tur. sim
23. Prof. são alimentos –
24. Tur. ((repetiu em coro)) energéticos
25. Prof. são alimentos?
26. Tur. energéticos
27. Prof. energéticos
28. Tur. energéticos
29. Prof. vocês não falam por isso mukalaku mingazvitivi zvilu (não aprendem as coisas). primeiro tempo logo estão
hu::: mova ni zvigayi lomu nomwini? (cabisbaixo, será que têm frungos na boca?)
30. Tur. ((os alu.s ficaram em silêncio, envergonhados e tímidos))
31. Prof. são alimentos energéticos
32. Tur. ((repetiu em coro)) são alimentos energéticos
33. Prof. alimentos
34. Tur. ((em coro)) alimentos
35. Prof. energéticos
36. Prof. alimentos energéticos (...) nos fornecem energia para podermos trabalhar, para poder estudar, para
poder brincar (...) não é?
37. Tur. ((um alu. Respondeu)) sim
38. Prof. para além dos alimentos que nos ajudam a crescer, que são alimentos construtores, estamos juntos
39. Tur. ((alguns em voz baixa)) °sim°
40. Prof. aqueles que nos ajudam a crescer são alimentos –

201
41. Tur. construtores
42. Prof. construtores (2x)
43. Tur. construtores (2x)
44. Prof. então temos alimentos energéticos, aqueles que nos dão energia
45. (...)
46. Prof. então para além desse temos energéticos, construtores, temos aqueles alimentos que chamam -- que nos
protegem das doenças, veli vazvivitanisa kuyini zvezve kasi hingababzi? (como são chamados esses alimentos que
nós protegem contras as doenças?)
47. Tur. ((silêncio))
48. Prof. veli hilezvoyini? (são alimentos?)
49. Tur. ((silêncio))

No registo (21), a professora expõe e obriga os alunos a repetirem através da estratégia de


terminação de palavras (21 a 28). Em (29), ela enfureceu-se ao constatar que os alunos não
participavam nem interagiam na aula “vocês não falam por isso mukalaku mingazvitivi zvilu. primeiro
tempo logo estão huuu, mova ni zvigayi lomu nomwini?” (vocês não falam por isso não aprendem as coisas.
primeiro tempo logo estão cabisbaixos, será que têm frungos na boca?”).
Nos momentos seguintes, a professora continuou a orientar a repetição dos conceitos da aula
aprendidos na aula anterior segundo ilustram os registos (31 a 34) e (38 a 44). No fim desta etapa,
a professora deixou na responsabilidade da turma a nomeação do terceiro e último tipo de
alimentos em L1 e/ou em L2, conforme mostra o registo (46). Surpreendentemente, os alunos
manifestaram o silêncio (48 e 49). As únicas cenas nas quais os alunos participavam
voluntariamente, embora com alguma insegurança e voz baixa, evidenciaram-se quando a
professora perguntou aos alunos em L1 (50) sobre quais eram os alimentos que preveniam as
doenças no organismo humano. A reacção dos alunos foi rápida segundo mostra o extracto 59 em
continuação do extracto 58.

Extracto 59: Mikho.DC9.100317


50. Prof. ou hicihi mucitivaku mugaku n´wina kasi mingababzwi, zvihivhikelaku ka mababzwi? (ou que alimento vocês
comem para não adoencer, que nos protege contra as doenças?)
51. Alu.1 ((Marandule, a alu. voluntária de sempre levantou-se e disse)) papaia
52. Prof. papaia
53. Alu.4 ((levantou e falou em voz baixíssima e inaudível)) ( )
54. Prof. não ouvi
55. Alu.4 ((falou inaudivelmente)) ( )
56. Prof. ouviu aí?
57. Tur. não
58. Prof. fala para ouvir alí
59. Alu.4 ((falou baixo))
60. Prof. ((repetiu para a tur.)) banana
61. Alu.5 ((em voz baixa)) °laranja°
62. Prof. laranja (0.5)

202
63. Tur. ((silêncio))
64. Prof. banana, papaia, laranja mais
65. Alu.6 maçã
66. Prof. maçã
67. Alu.7 papayi (papaia)
68. Prof. ((corrigiu)) papaia. diz lá papaia
69. Alu.7 ((levantou-se e repetiu)) papaia
70. Prof. então esses alimentos nós comemos e eles protegem-nos das doenças. lezvi zvinga mihandzu, yotlhe yihivhikela
ka yini? (todas as frutas protegem-nos de quê)
71. Tur. KA MABABZWI (CONTRA AS DOENÇAS)
72. Prof. yotlhe mihandzu yihivhikela ka yini? (todas as frutas protegem-nos de quê?)
73. Tur. >KA MABABZWI< (contra as doenças)
74. Prof. ka mababzwi (contra as doenças). então loko vaku e::: a amihandzu yihivhikelaku ka mababzwi vawula hi cilungu
vaku (quando se quer dizer as frutas protegem-nos contra as doenças em português diz-se) são alimentos pro-
te-cto-res. são protectores porque protegem, protegem-nos das doenças

Os alunos nomearam somente os frutos como parte dos alimentos protectores. Não houve nenhum
cenário na aula que demonstrasse a construção de conhecimentos uma vez tratar-se de
recapitulação da aula anterior próxima das realidades socioculturais dos alunos. O baixo nível de
participação dos alunos registado no decurso da aula motivou a professora a adoptar as estratégias
de repetição e coro. As práticas de translanguaging ainda que se tenham manifestado no discurso da
professora, não foram usadas para dinamizar a recapitulação dinâmica, colaborativa e interactiva
nos moldes que evidenciei nas TAI´s. A compatibilidade entre o conteúdo da aula e os fundos de
conhecimentos socioculturais à luz da pedagogia de collateral learning e cross-cultural border não
contribuiu para a participação e a interacção dos alunos na construção de conhecimentos tal como
se evidenciou nas TAI´s porque as aulas da TC não continham os materiais didácticos locais,
estavam centradas na professora que promovia um clima psico-emocional e discursivo que
amedrontava os alunos.

203
CAPÍTULO 7. Normalização pedagógica das práticas de translanguaging,
collateral learning e cross-cultural border nas aulas

Introdução

No presente capítulo 7 debruço-me sobre as evidências relativas aos ciclos de aplicação progressiva
das práticas pedagógicas iniciadas no capítulo 6 com o objectivo de evidenciar a normalização dos
níveis de participação e de interacção dos alunos na construção dos conhecimentos na aula e dos
níveis de flexibilidade e dinamismo do ensino-aprendizagem baseado na promoção das práticas
discursivas dum único repertório linguístico bilingue (pedagogia de translanguaging) e na integração,
exposição e exploração dos fundos de conhecimentos socioculturais locais nas aulas de conteúdos
de Ciências Naturais (pedagogia de collateral learning e cross-cultural border).

7.1 Ciclo IV e V: Participação e interacção a partir de materiais didácticos


locais

Nos ciclos IV e V preconizava evidenciar as atitudes participativas e interactivas dos alunos nas
aulas após a familiarização e a normalização das práticas de translanguaging e as de collateral learning
e de cross-cultural border que gradualmente se estabeleciam como proposta pedagógica nos ciclos de
aulas anteriores. Interessava-me observar como decorria a participação e interacção dos alunos a
partir de dois recursos linguísticos e de materiais didácticos locais nas aulas. Por esta razão,
planifiquei duas aulas visando responder a pergunta “Como os materiais didácticos locais e o uso
de dois recursos linguísticos condicionam a interacção e participação qualitativa dos alunos na
aula?” e defini os critérios e padrões de julgamento que se apresentam na tabela 6.

Tabela 6: Critérios e padrões de julgamento de aulas dos ciclos IV e V


Ciclo: IV e V
Conteúdo: Conservação dos alimentos
Título do ciclo: Interacção e participação a partir de materiais didácticos locais e de dois recursos
linguísticos (L1 e L2)
Pergunta de pesquisa do ciclo: Como os materiais didácticos locais e o uso de dois recursos
linguísticos condicionam a interacção e participação qualitativa dos alunos na aula?

205
Critérios: Padrão de julgamento:

• Participação consciente, qualitativa e • Nível de participação consciente, qualitativa e


activa dos alunos condicionado pelo activa dos alunos
material local e disposição de dois • Disposição dos alunos para participar na aula
recursos linguísticos • Interacção qualitativa na construção do
• Qualidade de interacção em duas conhecimento
línguas • Qualidade da aprendizagem dinamizada pelos
• Aprendizagem colaborativa suscitado recursos linguísticos e materiais locais
pelos dois recursos linguísticos e os • Facilitação do ensino-aprendizagem pela parte
materiais locais do prof. e dos alunos
• Flexibilidade e dinâmica qualitativa
da aula

7.1.1 Enraizamento dos ambientes participativos e interactivos, flexíveis e


dinâmicos

De ciclo em ciclo e de aula em aula, os alunos das TAI´s demonstravam-se progressivamente


familiarizados com as novas práticas discursivas baseadas no translanguaging e na integração dos
fundos de conhecimentos no ensino-aprendizagem dos conteúdos de Ciências Naturais tal que os
seus níveis de participação e de interacção e os respectivos níveis de flexibilidade e dinamismo na
aula elevavam-se interruptamente. Em outras palavras, os alunos estavam acostumados com as
novas práticas pedagógicas promovidas nas aulas que passavam a ser uma norma. Em
contrapartida, os níveis de participação e de interacção dos alunos da TC registavam variações,
isto é, os alunos participavam umas e outras vezes sob insistência e apoio forçado da professora em
voz baixa, em coro e num clima de insegurança e hesitação e noutras vezes o faziam com alguma
flexibilidade e dinamismo.
Os extractos abaixo evidenciam distintivamente as diferenças que acima referi. Em primeiro lugar
ilustro os extractos 60 e 61 referentes à TC e em segundo lugar comparo-os com o extracto 62
referente a uma TAI.

206
Extracto 60: Mikho.DC10.170317
1. Prof. então nesses alimentos vimos também três grupos. lezvi zvimahaku leci zvaku hiii, lezvi zvimahaku zvaku iii,
lezvi higaku zvimaha lezvi (2x) (alimentos que fazemisto e aquilo, quando comemos fazemisto) falamos ou não
falamos
2. Tur. ((em coro)) falamos
3. Prof.a são alimentos quê? vimos alimentos quê?
4. Tur. ((silêncio))
5. Prof.a vamos falar. alimentos são três (...) alimentos que comemos para fazer o quê? ((a Prof.a gesticulou o
crescimento))
6. Tur. ((auxiliado pela Prof.a a tur. respondeu em coro)) crescer
7. (...)
8. Prof.a para?
9. Tur. ((repetiu)) crescer
10. Prof.a (...) quem pode me dizer, um alimento, que nós comemos, para poder crescer. aku leci higela para
hikula. acin´wi cakona basi (que diga isto comemos para crescer, apenas um exemplo)
11. Alu.5 ((em voz baixo)) °xima°
12. Prof.a verdade?
13. Tur. não
14. Prof.a xima comemos para quê?
15. Tur. [para ter energia
[força
16. Prof.a para ter?
17. Tur. [energia
[força
18. Prof.a para termos energia ou força (...)
19. Prof.a sim. o que eu preciso de um alimento que comemos para crescer. o que é?
20. Alu.6 ((falou baixo)) ( )
21. Prof.a fala para todos ouvir. aquele não ouviu
22. Alu.6 ((voz baixo e insegura)) °carne°
23. Prof.a ouviu? aquele não ouviu
24. Alu.6 ((repetiu em voz média)) carne
25. Prof.a vamos dizer todos
26. Tur. CARNE
27. Prof.a carne. comemos carne nós?
28. Tur. sim
29. (...)
30. Prof.a (...) um só. outro que comemos para crescer. é carne só?
31. Tur. não
32. Prof.a mais o quê?
33. Tur. ((silêncio))
34. Prof.a mais?
35. Tur. ((silêncio))
36. Prof.a só isso?
37. Tur. não
38. Prof.a há uma coisa que galinhas põem lá em casa também não sei o que é. o que é aquilo ali?
39. Tur. ((murmurou ao responder)) [ovo
[frango
40. Prof.a o que é?
41. Tur. ((alguns alu.s)) frango
42. Prof.a frango é carne. aquilo que frango põe, o que é?
43. Tur. ((silêncio))
44. Prof.a o que é?
45. Tur. ((alguns alu.s)) ovo

207
No início do extracto, os alunos não responderam com flexibilidade as pergunta (1 e 3) sobre os
tipos de alimentos que aprenderam na aula anterior. A primeira resposta dos alunos em (6) surgiu
quando a professora perguntou e gesticulou o crescimento em (5). Ora, os alunos deparavam-se
com dificuldades para nomear um alimento construtor. O primeiro aluno (alu.5) que se
voluntariou para responder a pergunta em (10) usou a voz baixa e insegura (11). O segundo aluno
(alu.6) respondeu usando três níveis de voz: voz baixa em (20), voz não abrangente em (22) e média
em (23) após duas chamadas de atenção da professora (21 e 23). Em (30), a professora incentivou
a turma a nomear mais um alimento, contudo esta não respondeu prontamente senão após a
insistência da professora segundo ilustram os registos de silêncio (33 e 35). Diante desta
inflexibilidade e da ausência da resposta por parte dos alunos, a professora recorreu a uma adivinha
em (38) que activou a resposta murmurada e indecisa “ovo” e “frango” em (39). Os poucos alunos
que intervieram neste episódio apresentaram respostas incorrectas e em voz baixa segundo
ilustram os registos “xima” em (11) e “frango” (41).
A professora deu conta de que apenas uma coluna dos alunos participava da aula. Por esse motivo,
decidiu incentivar a participação de alunos da outra coluna conforme mostra o extracto 61 em
continuação do extracto 60.

Extracto 61: Mikho.DC10.170317


48. Prof.a (...) para além de xima
49. Alu.7 batata-doce
50. Prof.a batata-doce. mais. aí assim, kuni vanhu kwaseyo? hingavhukani, hichikele cikoleni para higondza (há gente por
ai? acordem, já estamos na escola para estudarmos)
51. Alu.7 mandioca
52. Prof.a mandioca. laha já andzahamulavi muwulawula. ndzilava n´wina va seno (aqui já basta, não vos quero ouvir a
falar. quero ouvir a vós desse lado). quais são os alimentos que comemos para ter, aliás que nós protegem das
doenças, zvihivhikelaku ka mababzwi (que nos protegem contra as doenças) são alimentos protectores
53. Alu.8 ((em voz baixa)) °laranja°
54. Prof.a fala para aqueles ali vazvizva (ouçam)
55. Alu.8 ((em voz baixa)) °laranja°
56. Prof.a ouviu Noyemi. disse o quê?
57. Noyemi, Alu.9 ((repetiu)) laranja
58. Prof.a verdade ou falso?
59. Tur. ((murmurou))
60. Prof.a verdade ou falso.
61. Tur. ((alguns alu.s responderam inseguros)) verdade
62. Prof.a então temos laranja. outra coisa?
63. Alu.10 ((em voz baixa)) °banana°
64. Prof.a fala para Noyemi ouvir
65. Alu.10 banana
66. Prof.a verdade ou falso?
67. Tur. VERDADE
68. Prof.a já falamos de laranja, banana mais?

208
69. Alu.11 maçã
70. Prof.a maçã. mais? laranja, banana, maçã. outro alimento que nós protege das doenças. já temos laranja,
banana, maça. estou a pedir um outro alimento.
71. Tur. ((silêncio))
72. Prof.a pelo menos um só
73. Alu.12 papaia
74. Alu.13 tangerina

Em (50) a professora acautelou parte dos alunos que participava na aula com vista a envolver a
outra parte que se mantinha em silêncio “laha já andzahamulavi muwulawula. ndzilava n´wina va
seno” (aqui já basta, não vos quero ouvir a falar. quero ouvir a vós desse lado). Os alunos (alu.8,
alu.9, alu.10, alu.11, alu.12 e alu.13) da coluna menos participativa apresentavam as suas propostas
de respostas marcadas pela enunciação tímida, voz baixa e insegurança (55, 57, 63, 69, 73 e 74).
Conforme evidenciam os extractos 60 e 61, a participação e interacção foi possível mediante o
esforço da professora que incansavelmente persistia para motivar forçosamente a participação dos
alunos na actividade de recapitulação da aula anterior. Estas evidências eram contrastadas pelos
alunos das TAI´s que se demonstravam familiarizados, acostumados e a vontade com as práticas
de participação e interacção livre, aberta e dinâmica na aula baseadas nas práticas discursivas e
pedagógicas de translanguaging e nas de incorporação dos fundos de conhecimentos no ensino-
aprendizagem dos conteúdos das ciências e enraizados nas aulas. A esta altura da pesquisa, os
alunos das TAI´s eram mais dinâmicos e flexíveis, participativos, interactivos e competitivos em
quase todas as aulas que os da TC. O extracto 62 evidencia as atitudes dos alunos na resolução do
trabalho de casa que ao mesmo tempo servia de actividade de recapitulação da aula anterior.

Extracto 62: Ruw.DC11.170317


1. Prof. ayikuyini tpc ya hina (o que é que exigia o nosso trabalho de casa)?
2. Alu.3 é para hi–
3. Alu.4 hitsala mavitu (devíamos escrever os nomes)
4. Prof. he:::
5. Tur. ((em coro)) i para hitsala mavitu ya lezvi hizvi – (era para escrevermos os nomes dos alimentos que – )
6. Alu.5 ((completou sozinha)) higaku (comemos)
7. Prof. higaku (que comemos), ok mas quais eram os tipos de alimentos
8. Tur. ((murmúrio)
9. Prof. vamos, vamos sim
10. Alu.6 alimentos protectores
11. Prof. alimentos protectores. alimentos protectores em citshwa como chamamos?
12. Tur. ((em coro)) zvakuga zva kuhimaha hi (alimentos) ((alguns alu.s hesitaram e pararam. a frase foi terminada
por alguns alu.s)) kula (construtores)
13. Alu.7 ((corrigiu)) zvakuga (alimentos)((depois os outros alu.s acompanharam-lhe em coro)) zva kuhivhikela
mababzwi (protectores)
14. Prof. perfeito, zvakuga zva kuhivhikela mababzwi (alimentos protectores) são alimentos prote– ((alguns alu.
completaram em coro com o prof.))

209
[-ctores ((completaram em coro alguns alu. com o prof.))
[alimentos? ((completaram alguns alu.s))
15. Tur. ((outro grupo de alu.s respondeu)) energéticos
16. Prof. alimentos energéticos ((escreveu no quadro)). sim. aqui ((indicando a uma alu.))
17. Alu.8 alimentos contrutores
18. (...)
19. Prof. ya::: alimentos construtores. alimentos construtores hi citshwa i yini? (como se chamam em citshwa)
20. Tur. ((em coro)) zvakuga zva zvakuhimaha (alimentos) ((alguns alu.s hesitaram e calaram enquanto poucas
continuaram)) hikula (construtores)
21. Prof. zvakuga zva zvakuhimaha hikula (alimentos construtores), ok? (...) muito bem, então quem é que quer dizer
um nome dum alimento e eeenergético. Hi::: energético. quem ainda não falou? energético, um nome só. diz
lá menina
22. Alu.10 ((em voz baixa)) °batata°
23. Prof. batata sim, mais. ali
24. Alu.11 batata-doce
25. Prof. batata-doce. aqui
26. Alu.11 óleo
27. Prof. óleo, sim
28. Tur. ((os alu.s voluntariavam-se com as mãos no ar e suplicavam)) sou::: yewo::: sou::: yewo:::
29. Alu.12 farinha
30. Prof. farinha ((os alu.s ainda estavam motivados e interessados em voluntariarem-se, mas o prof. disse)) chega,
chega. agora alimentos e::: protectores
31. Tur. ((mesmo assim, os alu.s levantaram as mãos dizendo)) sou::: yewo::: sou::: yewo::: sou::: yewo:::
32. O prof. ((escolhendo o alu.13)) aqui
33. Alu.13 ananás

Com recurso ao discurso bilingue, os alunos mencionaram os tipos de alimentos em L2 (10 e 17)
enquanto os restantes alunos providenciavam rapidamente os equivalentes em L1 de forma
colectiva (12 e 20). A dinâmica e o voluntarismo individual relançou-se a partir do registo (22 a 29)
quando constatei que vários alunos voluntariavam-se espontaneamente, uns suplicando “sou:::
yewo::: sou::: yewo:::” em (28 e 31) para mencionar os alimentos energéticos em L2. Estas formas
de participação, interacção e de flexibilidade dos alunos na aula enraizaram-se e estabelecaram-se
definitivamente nas TAI´s como uma norma e uma atitude usada pelos alunos para demonstrar a
sua predisposição e motivação para contribuir construtivamente no processo de ensino-
aprendizagem.
O papel do/a professor/a nas tuas turmas é pedagogicamente oposto. Na TC, a professora persiste
e insiste a participação dos alunos ao passo que nas TAI´s, os professores têm a predisposição
espontânea e voluntária dos alunos que competem uns com os outros para participar da aula. Neste
contexto, os professores das TAI´s mediavam o processo de ensino-aprendizagem através da
participação dos alunos, enquanto a professora da TC envidava esforços para motivar a
participação dos alunos nas aulas. Com base nestas constatações, evidenciava que os alunos das
TAI´s estavam acostumados e familiarizados com as novas práticas pedagógicas de translanguaging,

210
collateral learning e cross-cultural border porque facilitavam o processo de ensino-aprendizagem
participativo, interactivo, construtivo, flexível e dinâmico.

7.1.1.1 Interacção espontânea e emocional dos alunos no ambiente de aula

Em todos os ciclos de aulas nas quais houve a incorporação, a exposição e a exploração dos
materiais didácticos socioculturais locais, os alunos ficavam emocionados, motivados durante todo
o processo de ensino-aprendizagem concretizado através da aula. A título de exemplo, no decurso
da aula relativa à conservação dos alimentos deparei-me com um fenómeno de participação e
interacção dos alunos exclusivamente caracterizado por altos níveis de emoção, admiração e de
diversão na aula. Os alunos acompanhavam através da observação a experiência prática sobre o
estado de conservação e de putrefacção dos alimentos que após terem sido classificados em tipos
de alimentos numa das aulas anteriores (energéticos, protectores e construtores) foram guardados
em quarentena durante 7 dias num saco plástico. Com esta experiência, os alunos iriam discutir
sobre os factores que contribuíram para a má conservação dos alimentos e a partir desta discussão,
aprenderiam as técnicas de conservação dos alimentos usados nos seus meios socioculturais e locais
e as técnicas de conservação dos alimentos universais e/ou científicos descritos no livro de Ciências
Naturais. O extracto 63 ilustra a descontracção e as várias atitudes emocionais dos alunos ao longo
da experiência prática.

Extracto 63: Ruw.DC11.170317


1. Prof. o pão estão a ver como ficou
2. Tur. ((exclamou em coro)) ye::: ((risos e gargalhadas))
3. (...)
4. Prof. o que aconteceu com o pão?
5. Tur. ((murmúrio))
6. Alu.22 gifurile (apodreceu)
7. Prof. gifurile, hi cilungu (apodreceu em português)
8. Alu.23 e 24 [podre
9. Prof. apodreceu, ok
10. Tur. ((alguns alu.s fecharam os narizes)) ye::: e::: ((admiração))
11. Prof. e::: ya está mal
12. Tur. ye::: (admiração))
13. (...)
14. Alu.25 kuni zvipungwani (tem larvas)
15. Prof. kuni zvipungwani (tem larvas)
16. Alu.25 ((risos)) ina, hilezviyani (sim, estão ali)
17. Tur. ina (é verdade)
18. Tur. ((os alu.s admiravam, divertiam-se, riam às gargalhadas e lamentavam o cheiro nauseabundo dos
alimentos)) ye::: uhu:::

211
19. Alu.25 i mhaka ya nyama (é por causa da carne)
20. Prof. i mhaka ya yini? (é por causa de quê?)
21. Alu.25 ya nyama (carne)
22. Alu.26 kuni nyama kwalumu? (tem carne aqui?)
23. Alu.25 awuyiwoni nyama liya? (não vês aquela carne ali?)
24. Prof. estão a ver como ficou
25. Tur. ((murmura admirada))
26. Alu.27 hi yihi nyama? (qual é a carne?)
27. Prof. estão a ver como ficou? he:::
28. Tur. ye:::
29. Prof. mazviwona lezvi zvingatshamisa zvona? (estão o estado em que ficaram?)
30. Alu.28 akunuha (cheira muito mal)
31. Prof. kanuha (cheiram muito mal) nem? hitachulula kwalaha, mitazviwona n´wetlheni (vamos despejar aqui para
que todos possam ver)
32. Tur. ((os alu.s continuavam a admirar)) ye:::
33. Alu.29 ((chama a atenção a todos)) tindziva (vejam a tindziva13)
34. Tur. ((os alu.s agitaram-se emocionados))
35. Prof. atimanga, matikhumbuka timanga leti. tahi tinene kwhatsi (recordam-se deste amendoim. está conservado)
36. Tur. ye:::
37. Prof. isto era, era milho e farinha
38. Tur. ye:::
39. Alu.29 a peixe (o peixe)
40. Alu.30 e alu.31 ((reagiram ao mau cheiro)) hu::: hu::: zvanuha (cheiram mal)
41. Prof. mais há coisa que não apodreceu, por exemplo, arroz
42. Tur. eya::: (de facto)
43. Alu.32 ya wukona (sim, está em dia)
44. Prof. chukwana nem (está mais ou menos)
45. Tur. ((em coro alto)) I:::
46. Prof. azvibowa lezviyano (aqui estão os cogumelos), vejam lá como ficaram
47. Tur. ye:::
48. Prof. he:::
49. Aul.33 awusokoti (formigas)
50. Prof. ((vendo um embrulho comentou)) aqui não tem nada. isto o que é
51. Alu.34 é carne
52. Prof. a carne deitamos fora porque podia cheirar mal. isto era farinha de milho, a pupu
53. Alu.35i chukwana (está mais ou menos conservado)
54. Prof. i chukwana nem (está mais ou menos). mas podemos comer estes alimentos assim como estão
55. Tur. ((em coro audível)) NÃO
56. Prof. vão sentar, vão sentar
57. Alu.36 ((dirigindo-se a uma colega)) apapakayi, apapakayi (papaia, papaia)

A experiência prática de sala de aula suscitou um cenário de participação e interacção livre,


contínua e aberta dos alunos. Durante a observação do estado de conservação e putrefacção dos
alimentos, os alunos manifestavam os seus espantos e emoções através de expressões discursivas e
através de múltiplas eventos de interacção uns com os outros. Em (6), a alu.22 referiu que o pão
“gifurile” (apodreceu). A seguir, os alu.23 e alu.24 em (8) traduziram “gifurile” para “pobre”. O
cheiro era tão nauseabundo que os alunos fechavam os narizes e lamentavam “ye::: e:::” (10) em

13 Um género de fruto silvestre que se consome seco.

212
reacção ao mau cheiro, “hu::: hu::: zvanuha” (hu::: hu::: cheiram muito mal) em (40) mas, mesmo
assim, aprendiam e divertiam-se com a experiência (18). Os alunos espantavam-se abertamente
sobre os fenómenos que observavam e chamavam a atenção dos outros colegas “kuni
zvipungwani” (tem larvas), “ina hilezviyani” (sim estão ali) (alu.25 nos registos 14 e 16), “tindziva”
(um tipo de fruto silvestre) (alu.29 em 33) e “awusokoti” (formigas) (alu.33 em (49)).
O alu.25 no registo (19) tentou explicar aos colegas a causa do mau cheiro “i mhaka ya nyama” (é
por causa da carne) contudo, gerou uma ligeira discussão. Em (20) o professor questionou “i mhaka
ya yini” (é por causa de quê?). A alu.25 respondeu “ya nyama” (por causa da carne). O alu.26 ficou
curioso e perguntou propositadamente em tom de desmentir conforme mostra o registo (22) “kuni
nyama kwalumu?” (tem carne aqui?). Prontamente a alu.25 replicou “awuyiwoni nyama liya?”
(não vês aquela carne ali?) em (23). Diante desta resposta, mais um alu. (alu.27) intrometeu-se na
discussão, perguntando em (26) “hi yihi nyama?” (onde está a carne?) numa altura em que o
professor abordava outros alimentos (27 e 28).
De alimento a alimento, o professor e os alunos analisavam o estado de conservação e de
putrefacção dos alimentos. Durante esta actividade, mais uma vez os alunos espantavam-se tanto
em alimentos pobres como em alimentos em bom estado de conservação. A título de exemplo, os
alunos espantaram-se com o estado de putrefacção do amendoim (36) e do milho e farinha “ye:::”
em (38), como também com a conservação do arroz “e yaaa” em (42), “ya wukona” (sim, está em
dia) (alu.32 em 43) e “i chukwana” (está mais ou menos conservado) (alu.35 em 53).
Os alunos sentiam-se abertos, a vontade e motivados para aprender num clima de diversão e de
descontracção. A partir destas experiências, evidenciei que os alunos não só interagiam entre si
como também aprendiam com base nas emoções suscitadas pelos fenómenos da experiência em
observação. O extracto 64 ilustra uma cena de diversão dos alunos que facilita a aprendizagem.

Extracto 64: Ruw.DC11.170317


58. Prof. conservação dos alimentos é o mesmo que dizer wuhlayisi wa zvakuga. ina hihlayisile zvakuga lezvi
(conservação dos alimentos é o mesmo que dizer conservação dos alimentos. será que conservámos os
alimentos assim?)
59. Tur. ((alguns alu.s)) ihi: (não)
60. Tur. ((risos))
61. (...)
62. Prof. ahihlayisangi ahizvo (não conservámos pois não)?
63. Alu.37 ((riu))
64. Prof. significa que nyamutla hilava kugondza (hoje vamos estudar) como é que nós podemos conservar os
alimentos hihlayisa zvakuga para zvingatshamisi lezvi (conservar os alimentos para que não fiquem assim). tudo

213
isto vai para o lixo. é lixo, já não se pode comer mais ou akona anavelaku kuga pawa leyi (quem cobiça comer este
pão)?
65. Alu.38 hu:::
66. Alu.39 yihi:::
67. Tur. ((murmúrio))
68. Alu.40 ((em jeito de diversão)) hi (é) Biloni
69. Prof. amilavi kuga hi kuyini? (por que não se pode comer?)
70. Alu.41 hingakuma mababzwi (senão teremos doenças)
71. Prof. mungakuma mababzwi (terão doenças)
72. Alu.41 hi Biloni, ulava kuga Biloni (o Biloni quer comer)
73. Biloni, alu.42 ((defendeu-se)) hi:::
74. Alu.38 ehe::: alava kuga (ehe::: quer comer)
75. Biloni, alu.42 ((negou a acusação)) ehe:::

Alguns alunos riam-se e os outros espantavam-se “hu:::” e “yihi::” (65 e 66) quando em (64) o
professor perguntava se havia alguém que tencionasse comer o pão. Entretanto, o alu.40 acusou
abertamente seu colega Biloni como quem tivesse interesse em comê-lo (68). Em (70), o alu.41
justificou que o consumo dos alimentos putrificados causariam doenças “hingakuma mababzwi”
(teríamos doenças), mas logo a seguir, o mesmo aluno divertiu-se com seu colega Biloni “hi Biloni
ulava kuga Biloni” (Biloni queres comer, Biloni” em (72). O alu.38, espantada intrometeu-se na
diversão propositada pelo alu.41, “ehe, alava kuga” (ele quer comer) em (74). Biloni defendeu-se
contra as duas acusações de brincadeiras impostas pelos seus dois colegas “hi:::” (73) e “ehe:::” (75).
Opostamente aos alunos das TAI´s, os alunos da TC aprendiam tristes, apreensivos, acanhados,
tímidos e cabisbaixo. A título de exemplo, no extracto 65, os alunos foram forçados a participar da
actividade de recapitulação da aula anterior que supostamente devia ser realizada de forma
voluntária, flexível, divertida e descontraída uma vez ser uma aula anterior, contudo as evidências
da aula mostravam cenários nos que os alunos aprendiam sob pressão da professora em L2.

Extracto 65: Mikho.DC11.170317


1. Prof. (...) como é que são conservados os alimentos. não é o que vimos na quarta-feira?
2. Tur. ((silêncio))
3. Prof.a como é que nós conservámos os alimentos (...) quais são as formas de conservação dos alimentos que
nós vimos?
4. Tur. ((silêncio))
5. Prof.a formas de conservação dos alimentos quais são, (...) peixe por exemplo, o que fazemos, onde é que
deixamos para conservar o peixe?
6. Tur. ((silêncio))
7. Alu.3 ((respondeu em voz muito baixa)) ( )
8. Prof.a he:::?
9. Tur. ((murmúrio))
10. Prof.a não estou a perceber
11. Tur. ((alguns alu.s)) congelar
12. Prof.a falem alto
13. Tur. ((tur. completa)) congelar

214
14. Prof.a então, congelar o peixe (...) para além podemos fazer o quê mais?
15. Tur. ((silêncio))
16. Prof. será que tudo metemos no congelador?
17. Tur. NÃO
18. Prof.a então outra forma de conservar os alimentos para além de congelar, fazemos o quê mais?
19. Alu.4 ((em voz muito baixa)) °secar°
20. Prof.a fazemos o quê mais?
21. Tur. ((em coro)) secar
22. Prof.a eu disse para levantar, quem quer falar é só levantar e dizer secar (...) quem quer falar?
23. Alu.4 secar
24. Prof.a secar. deixar o alimento no sol a secar (...) assim como secar de lume. aquilo que se chama de fumagem
(...) falamos daquele processo que põe uma coisa, sei lá deixar no sol, como é que se chama?
25. Tur. ((sussurou em voz baixa)) ( )
26. Prof.a he:::
27. Tur. ((desta vez sussurou)) sss:::
28. Prof.a não percebi
29. Tur. ((em coro)) [sss:::
((entre as vozes que repetia “sss:::” um alu. não identificado interveio discretamente e em voz baixíssima))
[<°sal°> ( ):
30. Prof.a fala alto menino não estou a perceber (...) para ser bacalhau metemos o quê?
31. Tur. ((a tur. ouviu a palavra “sal” do alu. não identificado e repetiu)) sal

Os alunos não responderam nenhuma das três perguntas de persistência da professora em (1, 3 e
5) senão com base no silêncio (2, 4 e 6). Os alunos mostravam-se tímidos e cabisbaixos cada vez
que a professora repetia persistentemente a mesma pergunta. Os poucos alunos corajosos que
intervieram na aula falavam em L2 e em voz muito baixa (alu.3 em 7 e alu.4 em 19), forçando a
professora a solicitar a voz alta (8, 10, 12 e 28). Estes cenários de sala de aula eram desconfortáveis
e desmotivadores. As respostas eram apresentadas por alguns alunos em coro (11 e 21). Dentre as
vozes em o coro, registavam-se cenas nas quais os alunos murmuravam incompreensivelmente (9
e 25) e sussurravam inseguros “sss:::” segundo ilustram os registos (27 e 29). Diante da pressão
didáctica e linguística da professora, os alunos disfarçavam a sua participação repetindo a
consoante inicial “s” referente a palavra “sal”. O sussurro “sss:::” dos primeiros alunos em (27) foi
repetido por toda a turma em forma de coro em (29) uma vez que a professora disse “não percebi”.
A turma repetia disfarçadamente razão pela qual, apenas um aluno pronunciou a palavra “sal”
que era a que realmente correspondia à inicial “s”. A intervenção em coro da turma em 31 “sal”
era em resultado da repetição disfarçada da resposta apresentada por um aluno não identificado
aquando do coro da turma em 29.

215
7.1.1.2 Reflexão e explicação dos fenómenos naturais em L1 e em L2

A experiência de observação dos alimentos putrificados ocasionou momentos de reflexão, de


discussão e de interacção dos alunos com o objectivo de explicar as respectivas causas em resposta
à pergunta “porquê é que os alimentos apodreceram?”. Os alunos reflectiam a partir de
experiências quotidianas e socioculturais e expunham as causas que condicionaram a putrefacção
dos alimentos numa clara exploração as práticas de collateral learning e cross-cultural border. Em outras
palavras, os alunos transitavam da ciência para os seus fundos de conhecimentos socioculturais
para responder as questões relacionadas com os conteúdos científicos.
O extracto 66 ilustra a discussão desenvolvida pelos alunos ao nível dos pequenos grupos de estudo.
Os alunos discutiram interactivamente e quando o professor reapresentou a pergunta acima
apresentada “porquê é que os alimentos apodreceram?” vários alunos predispuseram-se
voluntariamente para expor as causas da putrefacção dos alimentos num clima segurança e auto-
confiança.

Extracto 66: Citi.DC10.200317


1. Prof. por que é que esses alimentos aqui apodreceram? ok. voluntários?
2. (...)
3. Tur. ((11 alu.s levantaram as mãos dos quais 4 ficaram de pé))
4. Prof. primeiro voluntário? menina diz lá, por que é que os alimentos apodreceram?
5. Alu.3 sidosina, nguku, sikhalidi quinta-feira até m´mhunu (apodreceram porque ficaram de quinta-feira até hoje)
6. (...).
7. Prof. ((escrevendo no quadro)) sisinide nguku sikhade, sikhalide – (apodreceu porque fi, ficou –)
8. Alu.4 ((completou e ditou ao prof. que escrevia no quadro)) n´kama wolapha (longo tempo)
9. Prof. n´kama wolapha (longo tempo) primeira ideia, ahigondeni (vamos ler)
10. Tur. ((lendo)) “sisinide nguku sikhalide n´kama wolapha” (apodreceram porque permaneceram longo tempo)

A alu.3 foi eleita no meio de 11 voluntários que espontaneamente tinham as mãos no ar e de 4


alunos estavam de pé e com as mãos levantadas (3). Ela referiu em L1 que “sidosina, nguku,
sikhalidi quinta-feira até m´mhunu” (apodreceram porque ficaram de quinta-feira até hoje). O
professor registou a ideia no quadro como resultado da discussão do grupo. No extracto 67 abaixo,
ilustro como os alunos apresentavam as suas ideias e as traduziam de uma língua para outra no
seguimento da interacção iniciada no extracto 66.

216
Extracto 67: Citi.DC10.200317
22. Tur. sisinide nguku sikhalide n´kama wolapha (apodreceram porque permaneceram longo tempo)
23. Prof. ngu cilungu hingatiwombisa kucani tonti? (como podemos dizer isto em português) quem pode dizer em
português? (...) voluntários vamos
24. Tur. ((silêncio))
25. Prof. ahizameni, ahizameni. tilava kukhene cani tile ngu cilungu (tentemos, tentemos. o que é que isto quer dizer em
português)?
26. Tur. ((silêncio))
27. (...)
28. Tur. ((os alu. interagiam entre si))
29. Prof. menina que disse isto aqui, quer dizer em português
30. Alu.3 ((silêncio, baixa a cara sobre a carteira))
31. Prof. quem quer dizer em português?
32. Alu.5 ((iniciou a resposta em voz baixa e cabisbaixa))
33. Prof. fala alto
34. Alu.5 podreceu porque ficou muito tempo
35. Prof. muito bem. certou. hipekeleni mandza (uma salva de palmas)
36. Tur. ((alegre cantou e bateu as palmas)) acertou, acertou, muito bem (3x)
37. (...)
38. Prof. (...) por que é que o coco não apodreceu, a laranja, o coco, a batata-doce entre outros produtos aqui
khasingasina ngucani (porquê não apodreceram)? será que é só ficar muito tempo que a comida apodrece? (...).
ahipimiseni (vamos pensar)
39. Tur. ((os alu. discutiam aos pares))
40. Alu.1 apodreceu porque ficou no plástico
41. (...)
42. Prof. ngu cicopi hingatiwombisa ku cani ati (como diríamos em cicopi)?
43. Tur. ((os alu.s agitaram-se))
44. Alu.6 sisinide – (apodreceram –) ((desistiu e sentou-se))
45. Prof. ali, vamos sisinide (apodreceram)
46. Alu.7 khasingasina nguku sidi ka diphepha (não apodreceram porque estavam no plástico)
47. Tur. ((reagiu discordando)) he::: ye:::
48. Tur. ((os alu.s discutiram sobre a resposta do alu.7))
49. Alu.8 akhene khasingasina nguko sikhade ka diphepha (ele disse que não apodreceram porque estavam no plástico)
50. Tur. ((alguns alu.s discutem intensivamente enquanto o prof. regista a ideia do alu.7 no quadro))
51. Alu.8 khasingasina (não apodreceram)?
52. Prof. higondeni (vamos ler)
53. Tur. “khasingasina nguku sikhade ka diphepha” (não apodreceram porque estavam no plástico)
54. Prof. ina ngu tona (é verdade)? hi:::?
55. Tur. ehe: (não)
56. Prof. hingatiwombisa kuca (como devíamos dizer)
57. Alu.5 sisinide nguku sikhadi ngutu ka diphepha (apodreceram porque permaneceram longo tempo no plástico)

Em continuidade da aula, o professor solicitou a tradução da resposta registada no quadro “sisinide


nguku sikhade, sikhalide n´kama wolapha” de L1 para a L2. Os alunos reflectiam em silêncio (24
e 26). O professor motivava-os (25) e consequentemente, iniciaram a interagir em pequenos grupos
(28). A alu.3 que respondera em L1 não foi capaz de traduzir à L2 (30) senão a alu.5 que insegura
e em voz baixa e depois em voz alta respondeu acertadamente “podreceu porque ficou muito
tempo” conforme ilustra o registo (34). Na tentativa de responder a outra pergunta do professor

217
em (38), os alunos consertavam entre si e voluntariamente, o alu.1 respondeu espontaneamente
em (40) “apodreceu porque ficou no plástico”. A tradução apresentada pelo alu.7 em (46)
“khasingasina nguku sidi ka diphepha” (não apodreceram porque ficaram no plástico) agitou aos
colegas que a achavam correcta. Os alunos espantaram-se “he::: ye:::” (47), discutiram tal que, o
alu.8 em (49) requestionou em voz alta “akhene khasingasina nguko sikhade ka diphepha?” (ele
disse que não apodreceram porque estavam no plástico?”. A discussão acalmou-se quando o
professor orientou a leitura da tradução do alu.7. De facto, os alunos concordaram que a tradução
não estava correcta (55) e a seguir, o alu.5 voluntariou-se novamente e reviu a tradução do alu.7
apresentando a tradução correcta “sisinide nguku sikhadi ngutu ka diphepha” (apodreceram
porque permaneceram muito tempo no plástico) em L1.
As evidências do extracto 67 ilustraram cenas de sala de aula nas quais mais do que a exploração
das experiências quotidianas e socioculturais dominados pelos alunos registou-se também a
mediação e interacção com base nas práticas discursivas e pedagógicas de translanguaging. A aula
abria espaços para que as línguas fossem aprendidas a partir da tradução no contexto de
aprendizagem de conteúdos académicos. Os alunos por esforços próprios, participavam da aula
discutindo, reflectindo e traduzindo de uma língua para outra.
Em jeito de resposta à “porquê é que os alimentos apodreceram?”, os alunos da TAI de Ruwani
referiram colaborativamente as causas que teriam suscitado a putrefacção dos alimentos nos
termos do extracto 68.

Extracto 68: Ruw.DC11.170317

1. Prof. porquê é que esses alimentos aqui apodreceram? porquê


2. Tur. [((entre outras vozes)) ( )
[Alu.39 porque azvitshamile ka phepha (permaneceram no plástico)
3. Tur. ((muitas vozes))
4. Prof. vamos lá ouvir. primeira ideia. porquê apodreceram? diz lá menino
5. Alu.40 ((pausadamente)) <porque sentava muito tempo no plástico>
6. Prof. ok, não vamos dizer porque sentavam, vamos dizer ficavam, ok? akusentara kuhiii (sentar é ((gesticula)))
7. (...)
8. Prof. outros voluntários. porquê é que os alimentos apodreceram (...) min´wanyani mihlamulu hi yihi (quais são
as outras respostas) (...)
9. Tur. ((reflectiu e depois 3 voluntários levantaram as mãos))
10. Prof. diga lá amigo depois a menina. porquê apodreceram? zvibolili hi mhaka muni lezvi (porquê estes alimentos
apodreceram)
11. Alu.41 ((voz baixo)) °hiyozviveka ka phepha zvigama zvibola° (deixamos no plástico e logo apodreceram)
12. Prof. ahizvizvi kwhatsi, ahizvizvi kwhatsi (não estamos a ouvir)
13. Alu.41 zvitshamile ka phepha (permaneceram no plástico)
14. Prof. zvitshamile ka yini (permaneceram aonde)
15. Alu.41 ka phepha (no plástico)

218
16. Prof. ((registava a ideia do alu.41 no quadro)) zvitshamile ka phepha (permaneceram no plástico)
17. (...)
18. Prof. zvitshamile ka phepha. azvakuga loko zvitshama ka phepha zvabola (permaneceram no plástico. os alimentos
apodrecem no plástico)
19. Alu.42 zvizva kuhisa (estavam num ambiente de colar)
20. Prof. ahhh ok, ok ((escrevendo no quadro pergunta)) zvizva (estavam num) (0.3)
21. Alu.43 ((voz baixa)) °kuhisa° (havia calor)
22. Prof. ((escrevendo)) kuhisa. mun´wanyani ate yini, ate zvodzunuka (calor. alguém disse o quê, transpiram)
23. Tur [((entre outras vozes)) ( )
[Alu.44 zvodzunuka hi kuhisa (transpiram por causa do calor)
24. Prof. ((escreveu)) zvi-dzunuka (trans-piram). alguém disse zvohisa (aquecem). quem disse zvohisa (aquecem)
25. Alu.45 é Biloni
26. Biloni, alu.46 ((recusa-se)) ahe:::
27. Prof. Biloni ate, zvizva kuhisa. kuli lweyi angaku zvodzunuka, hi ma (Biloni disse que há calor. há quem disse
transpiram, quem é)
28. Tur. ((alguns alu.s suspeitam em coro)) hi (é a) Ginola Ginola
29. (...)
30. Alu.45 ((reafirmou)) hi (é a) Ginola

À semelhança dos episódios constatados entre os alunos da TAI de Citimela, as evidências que
acima ilustro mostram que os alunos recorriam às experiências quotidianas e usavam-nas com
segurança, confiança e certeza para justificar as causas que contribuíram para o apodrecimento
dos alimentos. O ambiente de sala de aula foi caracterizado por várias vozes de alunos que
interagiam em pequenos grupos e por altos níveis de participação dinâmica e flexível dos alunos.
No registo (2), o alu.39 respondeu rapidamente à pergunta do professor em (1) “porque
azvitshamile ka phepha” (porque permaneceram no plástico) e a seguir, os alunos interagiram uns
com os outros (3). Quando se esperava que o alu.39 repetisse a sua resposta, interveio o alu.40 que
cautelosamente expôs em L2 a resposta do alu.39 “porque sentava muito tempo no plástico” em
(5). Nos registos (11, 13, 15), o alu.41 referiu que “hiyozviveka ka phepha zvigama zvibola”
(deixámos no plástico e logo apodreceram). Quando o professor interrogou se teria sido apenas o
plástico o único factor principal que favorecia o apodrecimento dos alimentos, 5 alunos
mencionaram outros factores, nomeadamente: “zvizva kuhisa” (estavam num ambiente de calor)
(alu.42 em 19), “kuhisa” (havia calor) (alu.43 em 21) e “zvodzunuka” (transpiram) (alu.44 em 23).
Com esforço próprio, os últimos três alunos anteciparam alguns dos factores causadores do
apodrecimento dos alimentos “zvibolisi zva zvakuka” e facilitaram a compreensão do conteúdo da
aula. Os factores apresentados pelos alunos eram resultados das suas análises em resultado da
observação da experiência prática e da validação das suas experiências quotidianas e socioculturais
locais à luz das práticas pedagógicas de collateral learning e cross-cultural border. Desta forma, os factores

219
apresentados pelos alunos coincidiam com alguns dos factores avançados pelos conhecimentos
universais e descritos no livro de Ciências Naturais.

7.1.1.3 Explicação dos fenómenos naturais a partir das experiências locais

Durante a leccionação do conteúdo relativo a “conservação dos alimentos” houve a exploração


das experiências e das técnicas culturais e locais de conservação dos alimentos conhecidos pelos
alunos com o objectivo de relacioná-los interculturalmente com os conhecimentos universais
expostos no manual escolar, a destacar: secagem, salga, congelação, fumagem e enlatamento. O
professor trouxe para a aula o peixe seco, esfumado e salgado, a verdura seca, a carne e o peixe
congelado, a sardinha enlatada e uma embalagem de sumo de frutas.
Em ambas as TAI´s, os alunos predispuseram-se a expor as experiências socioculturais e locais
usadas para a conservação dos alimentos após terem aprendido sobre os factores que contribuem
para a putrefacção dos alimentos “zvibolisi zva zvakuka/ sisinisi sa sakudya”. No decurso da aula,
os alunos voluntariavam-se para expor em L1 os procedimentos, experiências e técnicas
socioculturais e locais usados para a conservação da fruta, da verdura, dos cereais, da carne e do
peixe e o professor registava-os em L2 e em L1 no quadro em forma de frases ditadas pelos alunos
segundo mostra o extracto 69.

Extracto 69: Citi.DC10.200317


1. Alu.1 wowilela wo- wowilela (.) ukazeka (corta, corta (.) ferve)
2. Prof. ((escrevendo no quadro)) yema (0.4) primeiro faz-se o quê?
3. Alu.1 wovilela (corta)
4. Prof. ((regista no quadro)) (0.3) ehi::
5. Alu.1 ucikuwula (lava-as)
6. Prof. ehe::
7. Alu.1 ucikazeka (pôr a ferver)
8. Prof. e::
9. Alu.1 civitwa (coze)
10. Prof. cidigwitidi kuvitwa coca (depois de cozer o que se segue)
11. Alu.1 wocianeka ka lisani (deixa secar no sol)
12. Prof. ok. (...) ok cibawulela, adikhene hocani? ahigondeni (ok. como preparamos verduras secas, vamos ler)
13. Tur. “wocikuwulela” (lavámo-las)
14. Prof. ehe::
15. Tur. “lavar”
16. Prof. lavar depois?
17. Tur. “ferver”
18. Prof. ferver i cani khu cilungu, ngu cicopi (o que significa ferver em cicopi)
19. Tur. ngu halisa (é ferver)
20. Prof. ngu bhika, ngu halisa (é cozer, é ferver) depois

220
21. Tur. uaneka (secar no sol)
22. Prof. kuaneka ngu cani ngu cilungu (o que significa secar em português)
23. Tur. ((silêncio))
24. Prof. secar muito bem

No extracto 69, a alu.1 descreveu detalhadamente as técnicas locais usadas para conservar as
verduras através da cozedura e secagem ou somente a secagem, localmente denominado por
“cibawulela” (verdura seca) conforme mostram os registos (1 a 11). A seguir, a turma realizou a
leitura das frases registadas no quadro e ao longo desta, o professor solicitava a tradução de
algumas palavras-chave de L2 “ferver” para L1 (ngu halisa) ilustrado pelos registos (18 a 19) e de
L1 “kuaneka” para L2 (secar) conforme mostram os registos (22 a 23). Relativamente a palavra
“ferver” os alunos propuseram “ngu halisa” em (19) contudo, não foram capazes de propor o
equivalente da palavra “kuaneka” segundo mostra o registo (23) senão por via da ajuda do
professor que anunciou “secar” em (24).
No seguimento da mesma aula, constatei mais alunos que se predispuseram para descrever e/ou
explicar os prodecimentos locais usados para conservar o peixe, conforme mostra o extracto 70 a
seguir.

Extracto 70: Citi.DC10.200317


25. Prof. (...) nilava n´thu alavaku kubwabwata ngu ditshuri. i mani (quero um voluntário para falar a sério. quem é)
26. Tur. ((3 alu.s levantaram as mãos))
27. Alu.6 woyasidota (pescámos)
28. Prof. ((escreve no quadro)) ihi:: (sim)
29. Alu.6 uwuya (levámos a casa)
30. Prof. kudota (pescar) depois?
31. Alu.6 ugwita utasikanga (e depois expõe ao lume)
32. Prof. ukanga (expor ao lume) depois?
33. Alu.6 usitheletela ka titshekwa (enfiar nos espetos)
34. Prof. ok, kusimela, khandi tona (espetar, não é)
35. Tur. ngu tona (é verdade)
36. Prof. ((mostrando peixe seco e salgado)) ahanti sihakana asiya, masiwona (e estes peixinhos, estão a ver)
37. (...)
38. Tur. ((mais 3 alu.s levantaram e depois baixaram as mãos quando a alu.1 interveio))
39. Alu.1 woyadota (pesca)
40. Prof. ihi:: (sim)
41. Alu.1 uwuya naso (leva-os a casa)
42. Prof. ihi:: (sim)
43. Alu.1 utasi-
44. Prof. ((registando as ideias da alu.1 no quadro)) espera, nakhani (direi) pescar, depois
45. Alu.1 uta- utaaneka (ex- expõe no sol)

221
Nos registos (26 e 38) notabilizei-se a voluntarismo de dois alunos (alu.6 e alu.1) dispostos a
descrever duas técnicas de conservação do peixe, a destacar, a fumagem e a secagem. O alu.6 em
(27) descrevou detalhadamente os procedimentos usados para a fumagem do peixe (27 a 34) ao
passo que o alu.1 expôs as técnicas relacionadas com a secagem do peixe (39 a 45).
Na TAI de Ruwani, os alunos organizaram-se em grupos de estudo e cada grupo recebeu uma
folha de actividade escrita em duas línguas. Aos grupos cabia-lhes lê-la, discuti-la e por fim,
apresentar à turma o tipo de técnica usada localmente para conservar um dentre os quatros
alimentos, a saber: fruta (manga, laranja e cajú), verduras, cereais (milho), carne e peixe.
Efectivamente, os alunos interagiram em grupos de estudos, o professor ajudava-os a compreender
a essência da actividade e depois expuseram os seus resultados à turma e ao professor que os
registava no quadro conforme evidencia o extracto 71.

Extracto 71: Ruw.DC11.170317


1. Tur. ((o grupo 1 leu a actividade)) “como conservámos os verduras”
2. Prof. ((corrige-os)) as verduras
3. Tur ((grupo 1 em coro)) as verduras
4. Prof. (...) como é que nós podemos conservar a matsawa ya- ya- ya- ya- ti- ya- tiyini (as folhas de- de- de- de- quê)
5. Tur. ((completou)) ya tinyawa (de feijão nhemba)
6. Prof. ya tinyawa. wulani (de feijão nhemba digam)
7. Tur. ((grupo 1 em coro)) hotsemelela (cortamos)
8. Prof. ((registando no quadro)) hotsemelela (cortamos). folhas de feijão nhemba.
9. Alu.54 ((comenta para os colegas do grupo)) nyamutlha hitawulawula (hoje falaremos)
10. Prof. himaha yini (e fazemos o quê)
11. Tur. ((grupo 1 em coro)) hotsemelela, umaaneka (cortamos, secamos)
12. Prof. ((duvidava a escrita da sílaba tse))
13. Alu.55 ((ajudou-lhe pronunciando)) tse- tse- tse-
14. Prof. ((repetiu e escreveu)) (...) tse- tsemelela. higama hi yini (cortamos e depois o que fazemos)
15. Tur. ((coro)) hianeka (secamos)
16. Prof. kuaneka (secamos) -- kutsemelela ni kuaneka zviwuliswa kuyini hi cilungu (como se diz em português cortar e
secar)
17. Alu. 56 ((entre tantas vozes respondeu)) cor- cortar
18. Prof. digam lá cortar e
19. Tur. ((coro)) deixar no sol
20. Prof. cortar e depois deixar no -
21. Tur. e o prof. NO SOL

A seguir a leitura da actividade (1 a 6), o grupo 1 iniciou a descrição dos procedimentos


relacionados com a secagem de “matsawa ya tinyawa” (folhas de feijão nhemba) através das
técnicas locais usadas para preparar “cib´awulela” (secagem de verduras). O professor ocupava-se
em registar as ideias do grupo no quadro quando subitamente, o alu.54 em (9) advertiu aos colegas
“nyamutlha hitawulawula” (hoje vamos falar). De facto, o grupo falou tanto em L1 (7, 11, 15) como

222
em L2 segundo ilustram os registos (1, 3, 17 a 21) respectivamente, para explicar a técnica local de
secagem de verduras, tendo como exemplo folhas de feijão nhemba. O grupo interveio em coro,
ditando os procedimentos de preparação se “cib´awulela” ao professor que os registava no quadro
e provando que, em realidade, os alunos sistematizaram as suas experiências locais aquando da
concertação do grupo.
A seguir, mais três grupos apresentaram os seus resultados dentre os quais, a intervenção do grupo
3 suscitou uma cena de discussão dos alunos na aula conforme mostra o extracto 72. O grupo 3
tinha a responsabilidade de descrever os procedimentos usados localmente para a conservação do
peixe e da carne.

Extracto 72: Ruw.DC11.170317


1. Tur. ((grupo 3 leu)) “como conservámos a carne e o peixe?”
2. Prof. ok. (...) vamos lá. digam lá. como é que fazemos
3. Tur. ((grupo 3 e coro)) pôr no congelador
4. Prof. ((registou no quadro repetindo)) pôr no congelador ((enquanto registava a ideia do grupo, três alunos
expuseram os fenómenos que ocorrem no congelador))
5. Alu.62 gelador
6. Alu.63 gelar
7. Alu.64 ficar pedra
8. Prof. pôr no congelador depois
9. Tur. ((grupo 3 murmurou))
10. Prof. wulawulani vafana (digam lá meninos) (...) pôr no congelador e depois fazer o quê? gelar? meninos quem
pode ajudar (...) hichela ka jilera (metemos na geleira) ou himaha yini (ou que é que fazemos)
11. Alu.65 ((em voz baixa)) °hianeka° (secamos)
12. Alu.66 ((discordou a ideia da alu.65)) iwi::: watshuka uwona nyama vaaneka (o quê::: onde você viu a secagem da
carne)
13. Prof. a nyama avaaneki (a carne não se seca)
14. Alu.66 eh:: nada (não)
15. Prof. avaaneki (não se seca)
16. Alu.66 nada (não)
17. Prof. avaaneki (não se seca)
18. Alu.67 vaaneka zvinjanjana (secam-se os peixinhos)
19. Alu.68 ((espantou-se e questionou)) a peixe? (o peixe?)
20. Alu.67 vaaneka (seca-se)
21. Alu.69 ((confirmou)) vaaneka (seca-se)
22. Prof. vaaneka yini, i njanji kumbi i nyama (o que se seca, peixe ou carne)
23. Tur. ((alguns alu. da tur. responderam)) i njanji (é peixe)
24. Prof. he::: (o quê)
25. Tur. ((alguns alu.s)) i njanji (é peixe)
26. Prof. i nyama ou tinjanji, zvotlhe zvaanekiwa (tanto a carne como o peixe secam-se)
27. Tur. ((grupo 3 concordou)) hi:::
28. Prof. hitachela laha (vamos pôr aqui) pôr no congelador ou secar, não é isso. secar, ahizvona (não é isso)
29. Tur. ((alguns alu.s)) SIM

223
No registo (3), o grupo 3 apresentou o procedimento “pôr no cogelador” referente a congelação
como uma técnica de conservação da carne e do peixe. À medida em que o professor registava a
resposta do grupo no quadro, três alunos enriqueciam-a com outras três contribuições “gelador”
(alu.62 em 5), “gelar” (alu.63 em 6) e “ficar pedra” (alu.64 em 7). Em (11) interveio o alu.65 que
em jeito de ajuda ao grupo, propôs a técnica de “hianeka” (secar). Esta intervenção suscitou a
discussão entre os alunos na aula. O alu.66 em (12) espantou-se e discordou “iwi::: watshuka uwona
nyama vaaneka?” (o quê::: onde você viu a secagem da carne?). O professor questionou “a nyama
avaaneki?” (a carne não se seca?) em (13). O alu.66 discordou “eh:: nada” (eh:: não) em (14),
“nada” (não) em (16). A alu.67 decidiu dar a sua contribuição opinando a favor do alu.66 nos
seguintes termos “vaaneka zvinjanjana” (secam-se os peixinhos) em (18). O alu.68 inconformado
com a a intervenção do alu.67, questionou indignado em (19) “a peixe” (o peixe?). Subitamente, a
alu.67 respondeu em (20) “vaaneka” (seca-se). A alu.69 concordou com a alu.67 afirmando que
“vaaneka” (seca-se) (21). Diante desta discussão entre os alunos, o professor tranquilizou-os,
esclarecendo que “nyama ou tinjanji, zvotlhe zvaanekiwa” (tanto a carne como o peixe ambos
secam-se). Nos restantes registos (28 e 29) os alunos e o professor concertavam o registo no quadro
da conservação do peixe e da carne através da congelação e da secagem.
Os alunos mostraram nesta discussão e evidência que não são meros ouvintes ou receptores de
informação, mas sim, sujeitos que discutem sobre a veracidade do que aprendem com base nas
experiências quotidianas e socioculturais e num discurso baseado em práticas discursivas e
pedagógicas de translanguaging. Os alunos construiram o conhecimento discutindo e colaborando
construtivamente uns com os outros e num clima de altos níveis de disposição, motivação e
abertura na aula. Todos os alunos participavam interactivamente na resolução da actividade, na
apresentação dos respectivos resultados e no esclarecimento de dúvidas que no caso do grupo 3
suscitou a discussão dos demais alunos na aula.
As evidências da TC demonstravam cenários extremamente opostos aos das TAI´s. À partida, a
aula decorria sem nenhum material didáctico. Ao longo de toda a aula, evidenciei os esforços da
professora que persistentemente desenvolvia a aula com base num discurso de translanguaging
ocasional e perguntas relacionadas com as experiências locais relacionadas com a conservação dos
alimentos. Os alunos reagiam às perguntas em coro e raramente voluntariavam-se conforme ilustra
o extracto 73.

224
Extracto 73: Mikho.DC10.150317
1. Prof.a se hilava kuwulawula hi mahlayisela ya lezvi higaku, hizvihlayisisa kuyini? hazvana (agora vamos falar sobre a
conservação dos alimentos que nós comemos, como conservámo-os? estamos juntos)
2. Tur. ((coro)) hi::: (si:::m)
3. Prof.a hi::: hihlayisisa kuyini a mapapakayi (como conservámos as papaias), ora tomate, ora peixe. como é que
nós conservámos kasi zvingaboli. kasi zvingamahi yini? (para que não apodreçam. para que não façam o quê)
4. Tur. ((coro)) zvingaboli (não apodreçam)
5. (...)
6. Prof.a kani tinjanji para tingaboli, zvini umahaku? kani matsawu, a matsawu lezvi mambela. amambeli? (o que fazemos
para que o peixe não apodreça? a hortaliça que está a acabar. ou não está a acabar)
7. Tur. ((coro)) mambela (está a acabar)
8. Prof.a zvini hi mahaku kasi himahlayisa (o que fazemos para conservá-la)
9. Tur. ((silêncio))
10. Prof.a homahisa kuyi? (como fazemos?)
11. Alu.11 homabhika higama himaaneka (cozemos e depois secamos)
12. Prof.a homabhika higama himaha yini (cozemos e depois fazemos o quê)?
13. Tur. ((coro)) himaaneka (secamos)
14. Prof.a hu::: cozer e deixar secar, não é?
15. Tur. ((coro)) sim
16. Prof.a ideia dele diz que costuma cozer, cozer. vamos dizer cozer
17. Tur. ((repetição)) COZER
18. Prof.a cozer zvilava kuwula yini (o que quer dizer)?
19. Tur. ((coro)) kubika (cozer)
20. Prof.a akuaneka zviwula ku estendera. hazvana (secar significa estender. estamos juntos)
21. Tur. ((coro)) sim
22. Prof.a deixar secar (...) é de deixar fazer o quê?
23. Tur. SECAR

Ainda que a intenção da professora visasse incentivar a participação interactiva dos alunos,
expondo as suas experiências locais sobre a conservação dos alimentos, o seu discurso era tão
dominante que não concedia espaços para que os alunos reflectissem e respondessem de forma
livre e voluntária senão com base em respostas fechadas, passivas e extraídas das afirmações da
professora (3, 4, 6 e 7). Em (6 e 8) a professora solicitou que os alunos referissem como é que
localmente se conservava o peixe, as verduras ou hortaliças. Os alunos responderam com o silêncio
(9) e na insistência da professora em (10) apenas o alu.11 no registo (11) apresentou uma
experiência local “homabhika higama himaaneka” (cozemos e depois secamos). A professora
repetiu parcialmente a resposta do alu.11, induzindo a turma a completá-la em coro “himaaneka”
(13). A seguir, a professora traduziu a resposta do alu.11 “cozer e deixar secar” em (14) e orientou
a turma para que repetisse em coro “vamos dizer cozer” em (16t). A turma repetiu “cozer” em
(17). Em (19) os alunos traduziram a palavra “cozer” em “kubika” a pedido da professora, porém
em (20), ela traduziu a palavra “akuaneka” para “deixar secar” e reorientou a turma para que
repetisse em coro “secar” conforme mostram os registos (22 e 23).

225
Olhando para estas evidências, constatei que, pese embora os alunos conheçam as práticas e as
experiências locais de conservação dos alimentos, não participavam voluntariamente na aula
devido a falta de liberalização dos discursos bilingues nas aulas e ao clima de timidez, de vergonha,
e de insegurança instalado no contexto de sala de aulas. O silêncio, o murmúrio e o medo
enraizavam-se na turma tanto que se manifestavam inclusive diante de perguntas abertas e sobre
realidades socioculturais e quotidianas dos alunos conforme evidencia o extracto 74.

Extracto 74: Mikho.DC10.150317


55. Prof.a como é que fazem para conservar aquele peixe aí. momahisa kuyini (como fazem)
56. Tur. ((murmúrio))
57. Prof.a (...) levanta awula ku hina le kaya, awula lezvi zvimahekaku le kaya, aku homahisa kuhi (levanta e diga que nos
que lá em casa, explique como é que fazem lá em casa)
58. Tur. ((em silêncio e tímida))
59. (...)
60. Prof.a então, quando mamã traz muito peixe da Maxexwani, como vocês tratam aquele peixe para não
estragar (...) o que é que faz?
61. Tur. ((coro incompreensível, murmúrio em voz baixa)) (pôr no congelador)
62. Prof.a deixa aonde?
63. Tur. ((coro de alguns alu.s)) na geleira
64. Prof.a quando deixámos ali na geleira, estamos a congelar. estamos a fazer o quê?
65. Tur. ((coro de alguns alus.)) a congelar
66. (...)
67. Prof. quando trazem aquele peixe de Nyidambi. estão a ver aquele peixe de lá? (...) ata atazvimahisa kuyini
(como é que tratam)
68. Tur. ((murmúrio))
69. Prof.a Deli, votimahisa kuyini tinjanji letiya? utshuka uvawona (Deli, como tratam aquele peixe? já assistiu-os alguma
vez)
70. Alu.12 ((voz baixa)) °votikatinga° (fritam)
71. Prof.a votikatinga. amun´wenyani (fritam. outro voluntário)
72. Prof.a ((repetiu a resposta de um alu. não identificado)) (votikhona): mun´wanyani (cozem, outro voluntário)?
73. Tur. ((silêncio))
74. Prof.a vokatinga ni kutikhona. ina tinjanji letiya ta katingiwa (fritam e cozem. mas aquele peixe frita-se)
75. Tur. ahihi (não)
76. Prof.a hi mani atshukaku aga mas (mas quem já comeu)
77. Tur. ((alguns alu.s levantaram as mãos))
78. Prof.a mugisa kuyi? mubikisa kuyini (...) letiya lavi tinani masema (...) kasi masuka masema lawa, zvikona vamahaku. vomaha
yini (como comem? como preparam (...) este tipo de peixe tem um cheiro, então há uma técnica. que técnica
é essa)
79. Alu.13 ((em voz muito baixa)) <°votsheleka mavila, vayichela°> (fervem água e deitam sobre o peixe)
80. Prof.a (...) zvikona ndzingavawona vamaha laha ka ndzilu (eu já os vi a fazer uma técnica no lume)
81. Alu.14 votihisa (queimam)
82. (...)
83. Prof.a votikanga para mati lawaya mamaha yini (eles aquecem ao lume para que aquela água faça o quê)?
84. Tur. ((coro)) masuka (escorra)
85. (...)
86. Prof.a vasusa marumbu (...) vativeka ka yin (2x)(tiram as tripas (...) e expõe aonde)
87. Tur. ((coro)) ka ndzilu (2x)(no lume)

226
Os alunos não se voluntariavam flexivelmente, não respondiam rápidamente às perguntas a não
ser por via da insistência e da persistência questionadora e motivadora da professora (55, 57 e 60).
Após o murmúrio e o silêncio (56 e 58), os alunos intervieram em coro duas vezes, respondendo
inseguros, duvidosos e incertos (61 e 63). As únicas respostas voluntárias surgiram de três alunos
que em interacção com a professora tentavam expor as experiências locais usadas para conservar
o peixe de Nyidambi segundo ilustram os registos dos alu.s12 (70), alu.13 (79) e alu.14 (81).
As evidências acima descritas mostraram que o clima psico-pedagógico e linguístico, a
representação das experiências quotidianas e ou socioculturais na sala de aula e a centralização da
aula aos alunos são elementos que contribuíram para a distinção dos ambientes de aprendizagem
entre as TAI´s e a TC. Nas TAI´s, os alunos aprendiam num ambiente de duas línguas, num clima
sem medo, num contexto enriquecido pelos materiais locais e pela inclusão das experiências
quotidianas e ou socioculturais, num ensino descentralizado a todos os alunos e baseado na análise,
discussão e colaboração. Nestas circunstâncias, os alunos tinham oportunidades para participar e
interagir activa e abertamente na aula.
Na TC, os alunos aprendiam num ambiente em que as duas línguas eram usadas
predominantemente pela professora (discurso de translanguaging ocasional). Os alunos ainda que
desejassem responder as perguntas feitas pela professora, nunca se atreviam a usar a L1 para
responder as perguntas feitas em L2 senão nas formuladas em L1. Assim, os alunos só usavam a
L1 se a pergunta tiver sido efectuada em L1 e a L2 nas perguntas efectuadas em L2. Nestas
circunstâncias, os alunos não tinham a liberdade participar numa ou noutra língua que lhes
convier. Os alunos mostravam-se capazes de participar, mas ao mesmo tempo manifestavam medo
e vergonha de intervir em L2 num contexto pobre sob ponto de vista de materiais locais. A
professora centralizava a aula contudo, as experiências quotidianas dos alunos ainda que tenha
sido inclusas de forma superficial, suscitaram algumas oportunidades de participação de alguns
alunos que em L1 respondem às perguntas da professora formuladas em L1 conforme ilustram os
registos (16 a 33) do extracto 74.

7.2 Ciclo VI: Aprendizagem de novos conhecimentos a partir dos recursos


linguísticos e das materiais locais

Ao desenvolver este ciclo pretendia evidenciar exclusivamente sobre a conceptualização e


construção de novos conhecimentos académicos dos alunos a partir da reflexão sobre os fenómenos

227
observados na experiência prática e os conhecimentos socioculturais e quotidianos dos alunos, com
vista a responder a pergunta “Como os materiais didácticos locais e o uso de dois recursos
linguísticos facilitam a aprendizagem académica dos novos conhecimentos?”. As evidências e os
resultados deste ciclo seriam avaliados com base nos critérios e padrões de julgamento que se
apresentam na tabela 7.

Tabela 7: Critérios e padrões de julgamento de aulas ciclo VI


Ciclo: VI
Conteúdo: Composição dos solos
Título do ciclo: Conceptualização dos fenómenos da ciência a partir das experiências práticas na sala
de aulas e o fomento dos recursos linguísticos e discursivos (L1 e L2)
Pergunta de pesquisa do ciclo: Como os materiais didácticos locais e o uso de dois recursos
linguísticos facilitam a aprendizagem académica dos novos conhecimentos?
Critérios: Padrão de julgamento:

• Participação consciente, qualitativa e • Disposição dos alunos para participar na aula,


activa dos alunos condicionado pela expondo as suas conclusões
experiência prática • Interacção qualitativa na construção do
• Reflexão dos alunos e construção do conhecimento
conhecimento a partir da experiência • Qualidade da aprendizagem dinamizada pelos
prática recursos linguísticos e materiais locais
• Aprendizagem colaborativa e • Facilitação do ensino-aprendizagem
interactiva
• Flexibilidade e dinâmica qualitativa
da aula

7.2.1 Facilidade de aprendizagem de conteúdos académicos mais exigentes

As aulas sobre os solos destacaram-se como sendo as que requeriam muita atenção da parte dos
alunos por serem complexas e exigentes. A primeira aula iniciou com a abordagem de algumas
experiências sobre os solos que eram observáveis na vida quotidiana dos alunos e paulatinamente
desenvolveu-se para uma abordagem dos solos na visão da ciência, proporcionando oportunidades
para que os alunos transitassem das suas visões quotidianas para as visões universais e científicas.
A participação e interacção dos alunos na aula oscilava em dois níveis diferentes, observados em
três fases da aula, a saber: nível alto (observado na fase inicial da aula), nível baixo (evidenciado ao
longo da fase do desenvolvimento da aula) e por fim, nível alto (manifestado nas fases de avaliação

228
da aula). A exploração das práticas de collateral learning e cross-cultural border concretizado através
dos materiais locais (exposição de constituintes do sub-solo, amostras de diferentes tipos de solos) e
as práticas discursivas e pedagógicas de translanguaging contribuíram para garantir a facilidade da
leccionação e da aprendizagem do conteúdo ainda que complexo e exigente.

7.2.1.1 Experiências práticas e a aprendizagem de novos conhecimentos

No início da aula, o professor interagiu com os alunos sobre os solos, focalizando os aspectos
práticas e as realidades quotidianas locais. Os alunos participavam activamente, contudo quando
o professor perguntou sobre a composição do sub-solo, os alunos acalmaram-se e demonstraram
interesse em apresentar as suas limitadas respostas pois, o sub-solo é um tema estranho no conjunto
dos seus conhecimentos, suas experiências e suas realidades socioculturais conforme mostra o
extracto 75.

Extracto 75: Ruw.DC12.240317


1. Prof. tanani muwona a tema ya nyamutlha (venham ver o tema da aula de hoje)
2. Alu. 1 ((leu)) “matshamela ya misava” (composição do solo)
3. Prof. qual é o tema da aula?
4. Tur. ((leu em coro)) “composição do solo, matshamela ya misava” ((o tema da aula estava registado em duas
línguas))
5. Prof. todos conhecem misava (areia)
6. Tur. sim
7. Prof. ((retomando o tema da aula)) = muito bem. he::: a misava hi cilungu yivitanisiwa kuyini (como se chama
areia em português)
8. Tur. ((coro)) AREIA
9. Prof. areia, areia ahizvo. areia, eu vou buscar areia ((saiu da sala e buscou areia no pátio da escola)) = estão
a ver, ahiyona areia leyi (não é esta a areia)
10. Tur. hiyona (é)
11. Prof. agora solo é o quê?
12. Alu.2 i gambo (é sol)
13. Prof. he:::?
14. Alu.2. e Alu.3 ((em coro)) [i gambu (é sol)
15. Prof. solo não sol
16. Alu.4 misava (areia)
17. Prof. solo não sol
18. Alu.2 misava (areia)
19. Prof. misava i yini (o que é areia)
20. Tur. areia
21. (...)
22. Prof. em português chama-se areia. solo é outra coisa. é mais do que areia, entenderam?
23. Tur. ((uma alu.)) sim
24. (...)
25. Prof. quem sabe o que tem no solo?
26. Tur. ((silêncio))
27. Prof. se nós cavarmos para lá embaixo, cavarmos, cavarmos, o que vamos apanhar lá, lá, lá

229
28. Tur. ((4 alu.s levantaram as mãos))
29. Alu.18 água
30. Tur. ((outros alu.s repetiram)) água
31. Prof. água. mais?
32. Tur. ((risos mas não respondeu))

A aula iniciou com a leitura do tema da aula registado em duas línguas no quadro “matshamela
ya misava” (composição do solo) em (2) e, a posterior, houve a leitura em coro “composição do
solo - matshamela ya misava” (4). Nos registos seguintes, os alunos afirmaram conhecer a “misava”
(areia) tal que traduziram de L1 para a L2 (5 a 8). O professor retirou-se da sala de aula para trazer
a areia a fim de distingui-la do solo (9). Quando o professor perguntou “… solo é o quê?” dois
alunos (alu.2 e alu.3) responderam em como fosse sol “i gambu” (sol) em (12 e 14), mas após a
distinção entre “solo” de “sol” efectuada pelo professor em (15 e 17), o alu.4 (16) e depois a alu.2
(18) responderam correctamente em L1 “misava” (areia). Entretanto, a turma mostrou-se confusa
ao nomear o “solo” em como fosse a “areia” segundo ilustra o registo (20). A partir deste momento,
os alunos não mais participavam e muito menos interagiram motivados. Mostravam-se calmos,
sérios e atentos à distinção que o professor efectuava entre a “areia” e o “solo” (22). Em (25) o
professor perguntou-lhes o que se encontrava no solo. A turma ficou em silêncio, porém após a
reformulação da pergunta em (27) espontaneamente quatro alunos voluntariaram-se para intervir
dentre os quais, o alu.18 respondeu “água” (28). Na insistência do professor em (30) os alunos não
mais responderam (31), demonstrando a sua inocência em relação ao tema da aula. Em outras
palavras, os alunos participaram somente no que lhes era familiar e próximo às suas realidades
socioculturais. O silêncio esteve sempre associado às perguntas cujas temáticas eram desconhecidas
pelos alunos contrariamente dos alunos da TC que respondiam forçosamente às perguntas da
professora sem conceptualizá-las muito menos compreendê-las segundo mostra o extracto 76.

Extracto 76: Mikho.DC12.220317


1. Prof.a não – hoje vamos ver uma outra aula que fala de uma coisa que nós vivemos, todos nós conhecemos
que é a composição do solo. primeiro vamos definir o que é isso de solo. quem tem ideia? já ouviram falar de
SOLO? SOLO, já ouviram falar?
2. Tur. ((murmurou em voz baixa))
3. Prof.a he:::?
4. Tur. ((desmotivada e tímida)) °não°
5. Prof.a não nem, mas hão-de – mas eu sei que conhecem o solo. aqui onde nós vivemos aqui, vivemos aonde?
6. Tur. ((alguns alu.s responderam em coro)) em Bungi
7. Prof.a vivemos em Bungi nem
8. Tur. ((alguns alu.s)) sim

230
9. Prof.a he::: aqui em Bungi aqui tem muitos tipos de solos. tem solos onde nós vivemos (...) o que conseguem
ver lá fora?
10. Tur. ((alguns alu.s em coro)) mangueiras
11. Prof.a conseguem ver mangueiras. conseguem ver o quê mais?
12. Tur. ((algunas alu.s)) casas
13. Prof.a conseguem ver casas, mais
14. Tur. ( )
15. Prof. mafureiras
16. Alu.1 ( )
17. Prof.a não percebi (...) e muito mais. para dizer que tudo isso aí encontra-se no solo. nós pessoas estamos
aonde? (...). então precisamos ver a composição do solo, como é que esse solo está constituído. (...) o que é o
solo? ehhh, disse-se que o solo é camada superficial da terra, aquela parte de cima da terra que nós
conseguimos ver é o que se chama solo, a camada superficial da terra. estamos juntos?
18. Tur. ((responderam apenas que estavam a ouvir, mas não entendiam a explanação da prof.a)) sim
19. Prof.a o solo (0.2) é a camada (0.2) superficial da terra, aquilo que conseguimos ver. se formos a sair aqui
havemos de ver muita coisa. só de parar aqui (4s). sem precisar de cavar, você pára assim e consegue observar
muitas coisas

Em (2 e 4) os alunos demonstraram desconhecer o “solo”. A professora convencida de que os


alunos conheciam o “solo” questionou propositadamente “aqui onde nós vivemos aqui, vivemos
aonde?” (5), esperando que respondessem “no solo ou na areia”, contudo, a resposta dos alunos
foi “em Bungi”, contrariando às expectativas da pergunta da professora (6). Na insistência, a
professora afirmou que existiam muitos tipos de solos em Bungi. Na tentativa de facilitar a aula
com base na observação, perguntou o que os alunos viam fora da sala de aulas (9). Os alunos
mencionaram os seres vivos e não vivos que observavam no pátio da escola (10 a 14), mas não
incluiriam a “areia ou solo”. A seguir, a professora concluiu que todos os seres encontravam-se no
solo tendo, a seguir definido o conceito de solo (17 e 18).
Analisando os extractos acima constatei que os alunos TAI de Ruwani beneficiavam-se do
translanguaging para estabelecer pontes entre as noções de “misava” conhecido em L1 e “areia” e
“solo” em L2 diferentemente dos alunos de TC de Mikhokhweni que participavam sem
conceptualizar devidamente a noção de “solo” exposto em L2.
Em seguimento a aula da TAI de Ruwani, os alunos leram e interpretaram o texto do livro num
discurso de translanguaging enraizado e normalizado na sala de aulas e realizaram a experiência
sobre a construção das camadas do sub-solo, usando os materiais locais (água, areia vermelha,
areia preta, areia da superfície, areia composta por húmus, pedras, pedrinhas e um vaso
transparente). Os alunos ficaram eufóricos e entusiasmados tanto com a experiência prática
realizada na aula com a observação atento de todos, como com o resultado final constituído por
um vaso plástico que visualizava todas as camadas do sub-solo estruturadas no decurso da
experiência prática. De referir que os alunos observavam atenciosamente cada passo da

231
experiência, riam-se motivados e alegres e no fim da experiência os alunos descreveram em coro
as camadas que compunham o sub-solo conforme mostram os registos (36 a 48), tendo o alu.19
identificado, com base na sua reflexão, a camada propícia e favorável para o crescimento das
plantas agrícolas, conforme mostra o registo (57), no extracto 77.

Extracto 77: Ruw.DC12.240317


35. Prof. viram a composição do solo, do sub-solo? primeiro o que temos aqui?
36. Tur. ((respondiam em coro, observando para o vaso contendo as partes do sub-solo)) pedra
37. Prof. pedra pequena ou grande?
38. Tur. grande
39. Prof. grande. a seguir?
40. Tur. pedra pequena
41. Prof. pedra pequena, depois?
42. Tur. areia vermelha
43. Prof. ya, areia vermelha. normalmente é uma areia vermelha. he::: a seguir, depois da areia vermelha
44. Tur. areia ((murmúrio))
45. Prof. he:::
46. Tur. ((alguns alu.s)) estrume
47. Prof. não, este aqui não é estrume. esta, esta aqui. areia preta. depois da areia preta, vai?
48. Tur. ((alguns alu.s)) húmus
49. Prof. húmus. húmus unga citoromu (que é o estrume). depois do – do – do húmus vai um pouco de areia, um
pouco só que é a areia que estamos a ver aqui nas machambas
50. Prof . (...). estão a ver, é uma planta. loko hibzwala, hibzwala kala kwihi (quando semearmos, semearmos até
aonde)
51. Tur. ((alguns alu.s)) kala hansi (até no fundo)
52. Prof. hansi (no fundo) mas aonde (...) onde é que temos areia que pode fazer esta planta sobreviver? Luzi, quer
falar alguma coisa. vamos pôr aqui, semear em cima assim
53. Alu. 19 não
54. Prof. vamos pôr até aonde?
55. Luzi, alu.20 ( )
56. Prof. fale alto Luzi
57. Luzi. até na areia preta
58. Prof. até areia de estrume, aqui onde tem húmus. estão a ver aqui. porque húmus citurumu ahizvo (que é
estrume não é)
59. Tur. ((alguns alu.s)) sim

Na aula da TC de Mikhokhweni não se realizou a experiência de composição do sub-solo senão a


apresentação do vaso contendo todas as comadas que compõem o sub-solo. Nesta aula, os alunos
mostraram um novo clima na aula, isto é, os alunos estavam entusiasmados, ansiosos e alegres
quando observavam para os diversos tipos de solos que cada aluno trouxe e expôs na aula e quando
apreciavam as camadas do sub-solo no vaso. No entanto, este clima de entusiasmo, ansiedade e
alegria dos alunos não se reverteu flexivelmente na participação voluntária dos alunos aquando
das primeiras perguntas formuladas pela professora, conforme mostra o extracto 78.

232
Extracto 78: Mikho.DC12.220317
1. Prof.a quem pode me dizer o que vêem muito bem aqui na carteira? acho que daqui todos nós conseguimos
ver, não é?
2. Tur. ((silêncio))
3. Prof.a conseguimos ver?
4. Tur. <sim>
5. Prof.a é novidade aquilo que tem ai? hazvitiva kumbi ahizvitivi (conhecemos ou não)
6. Tur. ((coro)) hazvitiva (conhecemos)
7. Prof.a conhecemos não é?
8. Tur. ((meio motivada com os materiais exibidos na aula)) SIM
9. Prof.a quem pode me dizer então o quê está a ver aqui na carteira?
10. Tur. ((mostrava-se mais distraída, facialmente alegre, entusiasmada e sorridente))
11. Prof.a todos os meninos conseguem ver, qualquer um pode levantar (0.3) todos conseguem ver?
12. Tur. ((alto)) SIM
13. Prof.a Furani consegue ver?
14. Furani, Alu.3 sim
15. Prof.a o que consegue ver ali na carteira?
16. Alu.3 ((observa em silêncio))
17. Prof.a Pirisani o que consegue ver ali na carteira?
18. Pirisani, alu.4 ((silêncio))
19. Prof.a ((pegou a mão da alu.4)) anda ver talvez já que está sentada não consegue ver. eu perguntei se todos
conseguiam ver, pára lá daqui. pára daqui. o que está a ver aqui?
20. Alu.4 ((tímida, desconfortável e forçada a participar, calou-se))
21. Prof.a consegue ver alguma coisa, he::?
22. Tur. ((risos))
23. Prof.a não está ver nada?
24. Alu.4 ((baixa a cara preocupada, nervosa e tímida))
25. Prof.a kophuuu lomu matihleni akuwoni kwhatsi (está escuro nos olhos, não vêem bem). nem alguma coisa que você
conhece ai? consegue ver o quê menina?

Os alunos afirmaram que conheciam o que viam (6, 12) mas nenhum aluno levantou-se
voluntariamente quando em (9), a professora solicitou voluntários. Diante desta situação dois
alunos Furani (alu.3) e Pirisani (alu.4) foram solicitados forçosamente a nomear ao que viam. O
primeiro ficou em silêncio (16) mesmo depois de ter afirmado que via algo na mesa (13e 14). O
segundo foi retirado da sua carteira e puxado forçosamente pela mão da professora até a mesa na
qual se expunha o vaso das camadas do sub-solo. Diante da mesa que também continha os
diferentes tipos de areia e pedras, ela ficou estática e em silêncio, aterrorizada e envergonhada (19,
20 e 24) e após a incansável persistência da professora em (21, 23 e 25) finalmente a aluna interveio
em voz baixa “areia” (26) segundo evidencia o extracto 79 abaixo.

233
Extracto 79: Mikho.DC12.220317
26. Alu.4 ((após minutos de silêncio, a alu. interveio insegura)) °areia°
27. Prof.a consegue ver?
28. Alu.4 ((tímida e cabisbaixa)) °areia°
29. Prof.a onde está areia?
30. Alu.4 ((apontou com o dedo))
31. Prof.a uhu:::
32. Alu.4 ((partiu para a sua carteira, fugindo))
33. Prof.a ela disse que conseguiu ver o quê?
34. Tur. AREIA
35. Prof.a conseguiu ver o quê?
36. Tur. >AREIA<
37. (...)
38. Prof.a aparece no solo ou não aparece?
39. Tur. aparece
40. Prof.a aparece. outra coisa que nós podemos ver?
41. Tur. ((registou alguns voluntários que responderam de uma vez)) pedra
42. Prof.a uma pessoa para ir pegar e dizer
43. Tur. ((partiram das carteiras 3 voluntários em direcção a mesa de materiais didácticos))
44. Alu.5 pedra
45. Prof.a vamos repetir
46. Tur. PEDRA
47. Prof.a conseguimos ver – (2x)
48. Tur. pedra (2x)
49. Prof.a vamos falar alto, mozva ndlala mixu leyi (estão com fome logo de manhã)
50. Tur. >PEDRA<

Após resposta da alu.4 repetida propositadamente pela turma (34, 36 e 41), registei os primeiros
voluntários que se desafiavam para correr e pegar a pedra sobre a mesa (43). O primeiro aluno
nomeou “pedra” (44) e os restantes alunos repetiram “pedra” em coro baixo (46, 48) e alto (50) em
resposta a advertência da professora “vamos falar alto, mozva ndlala mixu leyi?” (vamos falar
todos, estão com fome logo de manhã? (49).
Comparando as duas turmas, notabilizei que os alunos de TAI de Ruwani descreveram de forma
mais livre, aberta, sem esforço e persistência do professor as camadas do sub-solo expostos no vaso
do que os de TC de Mikhokhweni. Estes últimos foram lentos e passivos ainda que estivesse diante
do vaso. Os materiais didácticos possibilitaram posteriormente a alguma participação e interacção
dos alunos de TC de Mikhokhweni que pela primeira vez mostravam-se motivados e voluntários
para interpretar as camadas de sub-solo exemplificados no vaso transparente, conforme evidencia
o extracto 80 em continuação das evidências expostas no extracto 79.

234
Extracto 80: Mikho.DC12.220317
1. Prof.a (...) hi mani atandzibzwela zvaku loko hihundzile lawa ya hombe hikuma yini (quem pode me dizer o que vem
depois das pedras grandes) outra pessoa para vir pegar o vaso ver e depois dizer
2. Alu.12 ((voluntariou-se e assegurou o vaso))
3. Prof.a uchuwuka kwhatsi (observe com atenção)
4. Alu.12 pedra
5. Tur. ((alguns alu.s repetiram)) pedra
6. Prof.a encontramos pedrinhas, diz pedrinhas
7. Alu.12 pedrinha (2x)
8. Tur. ((repetição indizuda pela alu.12)) pedrinha (2x)
9. Prof.a pedrinhas são muitas não é?
10. Alu.12 pedrinhas (2x)
11. (...)
12. Prof.a (...) zvikona zvin´wani kambe zvitaku kwalaha (há mais alguma coisa que vês também ai?) quem pode vir
me dizer, o que aparece depois de pedras grandes, pedrinhas
13. Tur. ((os alu.s agitaram-se, alguns levantaram-se e a alu.13 caminhou até a Prof.a afim de receber e observar
a camada no vaso))
14. Prof.a esta parte preta, o que isto aqui? levar mostrar teus colegas
15. Alu.13 ((recebeu o vaso, aproximou-o nos olhos e observou atenciosamente)) areia
16. Prof.a mostra, andar a mostrar
17. Alu.13 ((circulando de carteira em carteira repetia para tur.)) areia (10x)
18. (...)
19. Prof.a (...) ainda temos mais coisas aqui assim, isto aqui, quem quer me dizer o que é
20. Alu.14 ((levantou-se e aproximou-se à Prof.a))
21. Alu.14 ((observou o vaso durante 0.8)) areia
22. Prof.a mais, areia está aqui. (...). lezvi, lezvi uzviwonaku zva castanho zvini (isto, que vês, de cor castanha, o que
é)?
23. Alu.14 ((observou com atenção))
24. (...)
25. Prof.a zvini (o que é)?
26. Alu.14 ((observou atentamente (0.8)))
27. Prof.a quem quer ajudar?
28. (...)
29. Alu.12 ((assegurou o vaso)) xitrume
30. Prof.a ouviram?
31. Tur. ((um alu.)) sim
32. Prof.a então mostra lá ele
33. Alu.14 ((induzindo pelo alu.12 repete)) xitoromu (estrume)
34. Tur. ((riu ao ouvir a palavra xitoromu repetido erradamente pelo alu.14 ao invés de estrume))
35. Alu.12 estrume
36. Tur. estrume
37. Prof.a então vimos não é?
38. Tur. sim
39. Prof.a para as plantas poderem crescer bem, precisam de quê?
40. Tur. ((coro)) estrume

O cenário de sala de aulas de Mikhokhweni passou a novos padrões de abertura e predisposição


dos alunos para participar e construir o conhecimento construtivamente e sob mediação da
professora. Os alunos aprendiam num cenário enriquecido tanto de ponto de vista material
(materiais locais) como de ponto de vista linguístico (discurso de translanguaging). Assim, os alunos
estavam mais atraídos pelo ambiente de ensino-aprendizagem criado tal que se apresentavam

235
alegres, participativos e dinâmicos na aula. Concluindo, pela primeira vez os alunos da TC de
Mikhokhweni evidenciaram que eram capazes de, à semelhança dos alunos das TAI´s de Ruwani
e de Citimela, participar na aula que incluía os recursos e materiais locais para conceptualizar os
fenómenos da ciência.

7.2.1.2 Conceptualização científica dos fenómenos da ciência

Em ambas as turmas (TAI de Ruwani e TC de Mikhokhweni), a leccionação do conteúdo sobre


“Tipos de solos” centrou-se à figura do/a professor/a, incluiu as experiências quotidianas dos
alunos e explorou-se um discurso baseado no translanguaging. Os alunos apenas acompanhavam
passivamente a exposição dos professorese e respondiam as perguntas fechadas. A título de
exemplo, no extracto 81 observa-se que os alunos da TAI de Ruwani liam o texto relativo ao tema
da aula no livro de Ciências Naturais escrito em L2. De parágrafo em parágrafo e de período em
período, os alunos liam com pausas orientadas pela professora. Ela interpretava-os expondo num
discurso baseado em duas línguas e integrado exemplos de experiências locais, mas os alunos não
se engajavam interactivamente porque as perguntas eram fechadas.

Extracto 81: Ruw.DC13.240317

1. Prof.a então vamos encontrar três tipos de solos. quais são esses três tipos? vamos ler
2. Tur. ((leitura dos alunos no livro)) “os solos podem ser arenosos, argilosos e férteis”
3. Prof.a hi:::
4. Tur. e férteis
5. Prof. (...) solos arenosos, solos argilosos e solos férteis higihi tshamela, yitshamisili kuyini. hifanela ku hi, hiyitirisa kayini
(como são, como é que são. podemos usar para quê) (...) estão a entender
6. Tur. sim
7. Prof. a seguir solos arenosos
8. Tur. ((leitura)) “os solos arenosos são constituídos principalmente por areia”
9. Prof.a vamos parar ai (...) estão a dizer que solos arenosos são constituídos principalmente por areia (...) hi
mani angatlhamusela, angazvizva kwhatsi, kwhatsi, kwhatsi hizvikumile (quem entendeu muito bem e que pode nos
explicar. entendemos)
10. Tur. ((2 alu.s)) sim
11. Prof.a a misava leyi yiwuliwaku leyi (este é o solo de que se fala)
12. Tur. ((não respondeu, mostrava-se hesitante))
13. Prof.a solos arenosos i misava liyani yotala civhunyi. hazvikuma (solos arenosos são aqueles que têm muito areal.
entendemos)
14. Tur. sim
15. Prof.a solos arenosos hi leyi ya kuyini (como são os solos arenosos)
16. Tur. ((coro forte)) HI LEYI YA KUTALA A CIVHUNYI (SÃO AQUELES QUE TÊM MUITO AREAL)
17. (...)
18. Prof.a continuem a ler
19. Tur. ((leitura)) “a areia deixa passar a água com muita facilidade”
20. Prof.a a areia deixa passar a água com muita facili– ((interrompeu))

236
21. Tur. ((completou)) -dade
22. Prof.a deixa passar a água com facilidade, ndzikhema a misava liya ya civhunyi ndzitayiveka, ndziteka mati ndzichela.
a mati lawa matakuyini (o que acontecerá se introduzo água na porção de areal. onde irá a água)?
23. Tur. ((alguns alu.s)) matafamba (será absorvida)
24. Prof.a matakuyini (o que acontecerá)
25. Tur. matafamba (será absorvida)

O tema da aula era muito próximo às realidades socioculturais dos alunos que, se houvessem
oportunidades nos moldes das aulas anteriores, certamente que iriam participar e interagir
construtivamente na aula, integrando as suas experiências sobre os três tipos de solos expostos
passivamente pela professora através da estratégia de leitura dos alunos e da interpretação da
professora (1 a 8).
Com a excepção do registo (9) no qual a professora solicitou voluntários para explicar ou traduzir
para ou em L1 a característica dos solos arenosos, nos restantes registos avaliava a atenção dos
alunos sobre o que expunha (5, 18 e 20). De facto, os alunos provaram que estavam a atentos à
exposição interpretativa da professora segundo mostraram na avaliação que demonstrarei na
próximo sub-secção. Relativamente à pergunta (9), os alunos não a responderam, tendo sido
respondida pela respectiva professora em (13) e repetida pelos alunos em (16). A única intervenção
aberta da turma registou-se em (23 e 25) quando afirmava que a água “matafamba” (será
obsorvida) em resposta à pergunta em (22). Despropositadamente, as evidências constatadas nesta
extracto da TAI de Ruwani reforçam as reflexões desenvolvidas a partir das evidências das aulas
de TC de Mikhokhweni segundo as quais, a centralização da aula no/a professor/a inviabilizam,
por um lado, o surgimento dos ambientes participativos e interactivos dos alunos e, por outro lado,
a flexibilidade e o dinamismo do processo de ensino-aprendizagem ainda que os professores
explorem as estratégias discursivas de translanguaging e incorporem os fundos de conhecimentos
socioculturais através das estratégias de collateral learning e cross-cultural border nas aulas.
No cenário da TC de Mikhokhweni, os alunos observaram para os diferentes tipos de solos que
cada aluno trouxe para expor na aula e a seguir, a professora iniciou a interacção com os alunos
conforme ilustra o extracto 82.

Extracto 82: Mikho.DC13.240317


1. Prof.a hi::: ali nós temos três tipos de solos. temos –
2. Tur. ((completou, repetindo a afirmação daProf.a)) três tipos de solos
3. Prof.a três tipos de solos
4. Tur. ((repetiu parcialmente)) três tipos de –

237
5. Prof.a então, na base daquela areia alí, havemos de ver esta areia aqui está no solo X, agora esta areia aqui
está no solo Y. nesses tipos de solos que eu disse que são três, existe aquele tipo de solo que quando chove,
chover zvilava kuwula kuyini (o que quer dizer)
6. Tur. akuna vhula (chover)
7. Prof.a zvilava kuwula kuyini (o que quer dizer)
8. Tur. akuna vhula (chover)
9. Prof.a então existe aquele tipo de solo que quando chove deixa passar a água com facilidade, loko yina a vhuna
a mati mofamba, amanyimi. hazvana (quando chove a água se absorve instantaneamente. estamos juntos)
10. Tur. hi::: (sim)
11. Prof.a a mati moyini (o que faz a água)?
12. Tur. ((coro forte)) MOFAMBA, AMANYIMI (absorve-se instantaneamente)

A centralização da aula suscitou a participação passiva dos alunos que se evidenciava com base na
repetição da parte do discurso da professora (2, 4 e 12). Os registos (6 e 8) foram os únicos nos
quais os alunos participaram por própria iniciativa, traduzindo a palavra “chover” (akuna vhula).
Em continuação, a professora descreveu os tipos de solos (arenosos e argilosos) nos moldes acima
apresentados, tendo havido maior participação dos alunos no tipo de solo fértil segundo mostra o
extracto 83 em seguimento do extracto 82.

Extracto 83: Mikho.DC13.240317


1. Prof.a por exemplo, se eu for a tocar nesta areia aqui, esta areia aqui, estão a ver todos?
2. Tur. sim
3. Prof.a hingatshama ungi i ruka, misava leyi hayiwona hotlheni (com característica de termiteira, estamos a ver todos)?
4. Tur. sim
5. Prof.a hitshamisili kwhatshi i yini (tem característica de quê)?
6. Tur. ((repetiu em coro com base na afirmação da Prof.a em 3)) ciruka (termiteira)
7. Prof.a camaha yini a ciruka? loko hicikhoma (o que a termiteira faz quando seca)
8. Tur. ((murmúrio))
9. Prof.a ca olova loko hicikhoma uku u::: ca olova ahizvo (é mole quando se apalpa é mole não é)
10. Tur. ahihi (não).
11. Prof.a comaha yini (o que faz)
12. Tur. cotiya (é duro)
13. Prof.a ni misava ya kona leyi ya kutiya, loko yona vhula hihlengeletela mati, yigama hiya hi kuwoma yiva kwa iribzwi hi kutiya
(e os solos duros que após a chuva acumulam a água e depois secam como a pedra) esse tipo de solo chama-
se argiloso. chama-se?
14. Tur. ((repetiu)) argiloso
15. Prof.a SOLOS ARGILOSOS (2x)
16. Tur. SOLOS ARGILOSOS (2x)
17. Prof.a solos argilosos são impermeáveis. o que significa impermeável, esses solos aqui quando chove (...)
acumulam água por muito tempo. matshama mati kwalahaya (...) masiku (...) maza mawoma kwalahaya, a misava
hitlhela yipandzekela. hitlhela hi maha yini misava (a água acumula-se ali por dias, depois seca, a areia rancha-se. a
areia faz o quê)?
18. Tur. ((coro)) yipandzekela (racha-se)
19. Prof.a então a misava leyi ahiyinene para hirima ka yona (esse solo não é favorável para a agricultura) esse tipo de
solo não é um dos solos melhor para praticarmos a nossa agricultura. porque aí, (...) só para poder germinar
a cipfhaki lomuya, zvitanonoha hikusa a misava himahili yini? (o milho não crescerá porque o solo fez o quê)
20. Tur. ((coro)) yiwomili (secou)

238
21. (...)
22. Prof.a eu disse que é solo quê?
23. Tur. ((silêncio))
24. Prof.a é solo quê? é solo o quê esse tipo que seca, acumula muita água depois ele, naquele, na na zona fica
mesmo seca, é solo quê?
25. Tur. ((silêncio))
26. Prof.a é solo?
27. Tur. ((murmúrio))
28. Prof.a qual é o tipo de solo? eu disse que é solo argiloso. aquele fica uma argila. yitiya ikwa i nyeti (seca como
resina). chama-se solo?
29. Tur. ((coro forte)) ARGILOSO
30. Prof.a SOLO ARGILOSO
31. Tur. SOLO ARGILOSO

Neste extracto, as perguntas fechadas da professora limitavam a participação dos alunos que
simplesmente respondiam as perguntas com base na repetição da sua afirmação anterior, isto é,
através da resposta-afirmação ocasionado pela afirmação-pergunta, conforme ilustra a resposta em
(6) extraída da pergunta (3), resposta (14) em repetição da “argiloso” contido na afirmação-
pergunta (13), resposta (18) em repetição da afirmação-pergunta (17). Incrivelmente, os alunos
manifestaram o silêncio quando em (22, 24 e 28) não se recordavam do tipo do solo que descreviam
ainda que nomeado através da repetição que acima destaquei. À semelhança da repetição da
palavra “argiloso, solos argilosos” em (14, 15 e 16), mais uma vez os alunos repetiram em coro
“argiloso” em (29 e 31) sob orientação da professora.
As evidências da TAI de Ruwani patentes no extracto 84 ilustraram cenários nos quais os alunos
realizavam a tradução correcta dos conceitos “solos arenosos”, “solos argilosos”, “solos férteis” de
L2 à L1 usando os conhecimentos adquiridos aquando da leitura do texto em L2, das sessões de
interpretação e explicação expositiva da professora num discurso de translanguaging e da
exemplicação com base nas experiências quotidianas locais.

Extracto 84: Ruw.DC13.240317


1. Prof. prontos, mizvikumili kwhatsi (entenderam) nem?
2. Tur. hi::: (sim)
3. Prof. ((apontando para os tipos de solos escritos no quadro, reviu-os com a tur.)) aqui, solos arenosos, ate misava
ya yini mugondzisin (o profesor disse que é o solo)
4. Tur. ((coro forte)) MISAVA YA CIVHUNYI (SOLO ARENOSO)
5. Prof. então (0.3) ((escreveu em frente do termo solo arenoso)) misava (0.3) ((escreveu)) solo
6. Alu. 10 ya civhunyi (arenoso)
7. Prof. ya (0.4) civhunyi (arenoso). solos argilosos?
8. Tur. ((todos a falar)) [misava ya kupatselana ni madhaka (é um solo misturado com argila)
9. Prof. ((registando no quadro)) ok, ndzitawula ku misava ya madhaka (direi que é solo argiloso) pode ser?
10. Tur. sim
11. Prof. misava ya – (é solo –)
12. Tur. ((completou em coro)) madhaka (argiloso)

239
13. Prof. ((escrevendo no quadro)) madhaka (argiloso)
14. Prof. por fim, solos férteis?
15. Tur. ((coro forte)) MISAVA YA KUNONA (solos fertéis)
16. Prof. misava ya kunona (solos fertéis) MUITO BEM MENINOS

No extracto 84, os alunos compreenderam os tipos de solos ainda que a estratégia usada pela
professora não tenha suscitado a participação e interacção activa dos alunos. Os alunos realizaram
a tradução e/ou equivalência dos termos da aula de L2 para L1, a saber: “solos arenosos” –
“misava ya civhunyi” em (6), “solos argilosos” – “misava ya kupatselana madhaka (misava ya
madhaka)” em (8) e “solos férteis” – “misava ya kunona” em (15). Esta evidencia mostrou que
independentemente da estratégia de ensino-aprendizagem ter sido expositiva e centrada à figura
da professora, as duas línguas e os fundos de conhecimentos aplicados no acto de explanação da
professora contribuíram positivamente para a compreensão bilingue dos termos-chave da aula.
No seguimento da aulas evidenciado pelo extracto 85, os alunos TAI de Ruwani passaram à
experiência prática que consistita na avaliação prática dos níveis de permeabilidade e de
impermeabilidade dos onze tipos de solos locais expostos na aula afim de apurar os seus valores
agrícolas e classificá-los de acordo com os 3 tipos de solos cujos termos já tinham sido apresentados
em ambas as línguas no extracto 84. Na experiência prática com os diferentes tipos de solos, os
alunos observavam, analisavam e comentavam sobre os fenómenos da permeabilidade e/ou
impermeabilidade da água, segundo mostra o exemplo do extracto 85.

Extracto 85: Ruw.DC13.240317


1. Prof. vamos experimentar esta areia aqui. mawo, estão a ver esta areia? (vejam)
2. Tur. ((os alunos observavam atentamente))
3. Prof.a quem pode adivinhar que tipo de solo é este?
4. Alu. 19, Besusi fértil
5. Prof. fértil diz o Besusi. outro
6. Alu. 20 argiloso
7. Prof. argiloso não pode, argiloso andziku hi leyi ((levantou a amostra de solo argiloso)) (é este aqui). é este aqui
é argiloso, este aqui ((expôs à vista de todos)) porque não deixa passar a água (...)
8. Prof. solo fértil. olhem ((o prof. introduziu a água na garrafa do solo fértil)) estão a ver
9. Alu.21 matahuma hi laha (sairá por aqui)
10. Prof. é solo fértil este. estão a ver o que está a acontecer? sai rápido ou pouco?
11. Tur. pouco
12. Prof. então a misava leyi yakhoma a mati (este solo conserva a água). deixa passar uma parte da água mas fica
também uma parte de água aqui dentro (...) então é esta a água que a planta precisa para poder (0.3) crescer.
(...) yahikona ndzongo hibzwala a yini (quanda há humidade, podemos plantar o quê)
13. Tur. a cipfhaki (milho)
14. Prof. hi wona ku e::: yahikona ndzongo vakahino (vemos que, eh gente, ainda há humidade)
15. Tur. ((risos))

240
16. Prof. hibzwala a yini (o que semeamos)
17. Tur. a tsumbula (mandioqueira)
18. Prof. a mubavi vaku awubzwaliwi wuwona ku huuu ndzahaporovhetara a ndzongo, wuhuma. ok (a cacana que nunca se
semeia aproveita-se da humidade do solo e germina)
19. Tur. sim
20. Prof. este aqui é solo fértil. misava ya kuyini? (é solo)
21. Tur. YA KUNONA (FÉRTIL)

Nesta divertida experiência prática, os alunos observavam atentamente a impermeabilidade ou


permeabilidade da água em cada um tipo de solo e avaliavam o seu valor agrícola. Na primeira
experiência houve a reacção dos alu.19 e alu.20 que após observar o comportamento da água
propuseram que se tratava do solo fértil (4) e argiloso (6) respectivamente. A seguir, o professor
corrigiu a resposta do alu. 20 (argiloso) em (7) e em (8) introduziu a água no vaso do solo fértil. O
alu.21, livremente, suspeitou que a água sairia dum dos furos de fundo do vaso “matahuma hi
laha” (sairá por aqui) (9) e de facto saiu pouca água segundo concluíram os alunos em (11). Após a
explicação do professor em (12) sobre o valor do solo fértil, os alunos mencionaram nos registos
(13 e 17) que as plantas “cipfhaki” (milho) e “tsumbula” (mandioqueira) semear-se-iam num solo
fértil após chuva. Com esta aprendizagem, os alunos concluíram em L1 que o solo em estudo era
“ya kunona” equivalente ao “solo fértil” (21).
Esta evidência ilustrou que, pese embora não se tenham constatado os altos níveis de participação
e interacção dos alunos por se tratar de uma experiência prática, a inclusão dos conhecimentos
socioculturais na aula através de experiências com materiais locais e a manutenção de práticas
discursivas e pedagógicas de translanguaging concedem oportunidades para que os alunos se
concentrassem na conceptualização e na compreensão dos novos conhecimentos. Não houve
nenhuma ocasião em que o professor tenha forçado a participação dos alunos segundo observei
na TC de Mikhokhweni. Nesta, a professora explanava sobre as características de cada tipo de solo
sem realizar nenhuma experiência. Consequentemente, a participação dos alunos estava limitada
e dependente das perguntas passivas apresentadas na aula.

7.2.1.3 Elaboração interactiva e dinâmica do texto na aula

Nas duas aulas relativas ao estudo dos solos, os altos níveis de participação e de interacção dos
alunos na aula foram substituídas pela observação atenta às experiências práticas de sala de aulas
e conducentes a conceptualização e a construção de novos conhecimentos. Entretanto, a sessão de

241
recapitulação de aula anterior na aula seguinte restituiu sobremaneira a norma de participação e
interacção dos alunos na aula. Os alunos reviram qualitativamente as experiências, os resultados e
as conclusões da aula anterior de forma flexível e com alto níveis de dinamismo. Quanto mais os
alunos iam participando nesta actividade num discurso de translanguaging, o professor registava
todas as suas intervenções em forma de frases em L2 a fim de construir um texto colectivo conforme
mostra o extracto 86.

Extracto 86: Ruw.DC12.240317


1. Prof. se zvezvi, vamos fazer um texto. mazvikota kumaha um texto? hi::: (agora vamos fazer um texto. sabem
elaborar um texto)
2. Tur. ((um alu.)) sim
3. Prof. o nosso texto vai ser feito mayelanu ni lezvi hingagondza zvezvi. entendemos? (de acordo com o que
aprendemos)
4. Tur. ((alguns alu.s)) sim
5. Prof. (...) eu vou fazer perguntas e vocês vão dizer eee:: o que estudámos hoje? voluntários. vamos, vamos.
ahiwulawula hi yini nyamutla? (o que é que estudámos hoje)
6. Tur. ((coro)) hiwulawulili – (falávamos sobre –) ((interrompeu o prof.))
7. Prof. heyu heyu,tlakusani mawoko ndzitakota kulanga (atenção atenção levantem as mãos para que eu possa vos
escolher)
8. Tur. ((6 voluntários levantaram as mãos))
9. Alu.22 hiwawulawula hi maribzwi (falávamos sobre as pedras)
10. Prof. maribzwi ni yini? (pedras e mais o quê)
11. Alu.22 ni misava (...) (e solos)
12. Prof. areia -- a maribzwi i yini hi cilungu? (como as pedras se chamam em português)
13. Tur. pedra
14. Prof. ehe:: e quê?
15. Tur. ((murmúrio))
16. Prof. é?
17. Alu.23 areia
18. Prof. hi mani alavaku kutatisela zva kuhundza lezvi. (que quer dizer mais do que se disse até então) o que
estudámos hoje, o que falamos de quê hoje?
19. Tur. ((2 voluntários))
20. Alu.24 hiwawulawula hi matshamela ya misava (falamos sobre a composição do solo)
21. Prof. ehe:: falamos sobre a pedra, areia e falamos, hi matshamela ya misava. hi cilungu hiwulisa kuyini? (sobre a
composição do solo. como diríamos em português)
22. Tur. composição do solo
23. Prof. ya, falamos de composição –
24. Tur. do solo
25. Prof. do solo, hite a solo yitshamisili kuyini a solo? (o que dissem sobre a estrutura do solo) o que é que tem o
solo?
26. Tur. ((murmura))
27. Prof. ali disse, misava. misava i yini? (solo. o que é solo)
28. Alu. 25 areia
29. Prof. solo tem o quê?
30. Tur. ((os alu.s mencionam os constituintes do solo)) areia
31. Prof. areia
32. Tur. pedra
33. Prof. mais?
34. Tur. ((alguns alu.s)) plantas
35. Prof. plantas, perfeito

242
36. Alu.24 água
37. Prof. água
38. Alu.26 pedra
39. Prof. pedra. mais? falta uma coisa que vocês estão a esquecer
40. Alu.27, alu.28 ((simultaneamente)) [húmus
41. Prof. húmus claro. húmus, perfeito húmus e o quê?

Os alunos de TAI de Ruwani predispuseram-se firmemente a elaborar o texto (1 a 4). Inicialmente


a turma tencionava intervir em coro (6) em resposta a pergunta (5), no entanto, a advertência do
professor em (7) suscitou 6 voluntários que se predispuseram a expor a primeira resposta (8). No
registo (9), o alu.22 principiou referindo que “hiwulawula ni maribzwi” (falávamos sobre as pedras)
e completou “ni misava” (e areia) em (11). A fim de registar a primeira ideia, o professor solicitou
em (12) a tradução da resposta do alu.22. A turma expôs “pedra” em (13) e a posterior, o alu.23
acrescentou “areia” (17). A seguir, o alu.24 foi mais objectivo ao referir o tema principal da aula
em L1 “hiwawulawula ni matshamela ya misava” ( falamos sobre as formas e tipos do solo) (20) e
a turma traduziu para L2 “composição do solo” (22). Nos registos subsequentes (27, 30, 32, 34, 36
e 40), os alunos mencionaram sucessivamente os elementos que compunham o solo (areia, pedra,
plantas, água e húmus) em resposta à pergunta do professor em (25). Com estas evidências, os
alunos demonstravam quão a experiência prática de sala de aula mais as práticas de translanguaging
e o recurso a estratégia de inclusão dos conhecimentos socioculturais e dos materiais próximos às
realidades dos alunos conforme propõem as pedagogias de collateral learning e cross-cultural border
teriam contribuído para a compreensão efectiva do tema da aula e a construção de novos
conhecimentos a partir de duas perspectivas e/ou de duas visões diferentes. Os mesmos alunos
foram capazes de, mais uma vez, recapitular com sucesso as experiências sobre a permeabilidade
e impermeabilidade dos solos. Quanto mais os alunos participavam na recapitulação da aula, o
professor registava as suas contribuições no quadro em forma de frases. No fim desta actividade,
os alunos leram-nas e colaborativamente transforma-nas num pequeno texto construído de forma
interactiva e dinâmica depois de terem concordado que o mesmo resumia tudo quanto tinham
aprendido na aula.
Diante da mesma actividade, os alunos da TC de Mikhokhweni enfrentaram sérias dificuldades
para recapitular a aula anterior referente à composição dos solos como se pode concluir no
extracto 87.

243
Extracto 87: Mikho.DC13.240317
1. Prof.a então vamos falar um pouco da aula passada. o que nós vimos na aula passada. falamos de quê na aula
passada?
2. Tur. ((murmúrio))
3. Prof.a falamos de quê?
4. Tur. ((murmúrio))
5. Prof.a falamos de quê?
6. Tur. ((murmúrio))
7. Prof.a fala lá Rasoni. há muitas pessoas a falar. falamos do –?
8. Alu.1, Rasoni solo
9. Prof.a falamos do solo. verdade ou falso
10. Tur. ((coro)) verdade
11. Prof.a falamos do solo. então nós na aula passada falamos do solo, onde dissemos que o solo é a camada
superficial da terra. a camada que aparece na superficie terrestre da terra, lá onde as plantas crescem, lá onde
fazemos as nossas construções, as nossas machambas, a isso nós chamamos de solo. e dividimos a sua
composição, onde tivemos aquele vaso ali, onde dissemos que lá no sub-solo, lá muito embaixo, a primeira
coisa que nós encontramos lá embaixo são pedras grandes, nós vimos aqui aquelas pedras muito grandes,
depois daquelas pedras muito grandes, vimos pedrinhas, depois da pedrinhas apanhamos a parte da areia,
depois da parte da areia, apanhamos a parte do húmus, estrume, não é?
12. Tur. ((alguns alu.s em voz baixa disfarçada)) sim

Nenhum aluno predispôs-se a responder rapidamente a pergunta do professor em (1) senão através
de três murmúrios da turma (2, 4 e 6) equivalentes a três insistências da professora (1, 3 e 5). A
Rasoni, alu.1 não interveio voluntariamente, mas sim, indicada a dedo pela professora quando se
apercebeu que os demais alunos murmuravam. Ela respondeu parcialmente “solo” (8) e a turma
concordou “verdade” (10). Nos registos subsequentes, a professora não mais persistiu com a turma.
Ela decidiu explanar resumidamente a aula anterior, colocando os alunos a mero receptores de
factos que na aula passada aprenderam num discurso de translanguaging ocasional contudo,
expositivo, passivo e centrado na professora.
Observando para as evidências dos dois cenários acima concluo obviamente que, as práticas
discursivas e pedagógicas de translanguaging e o fomento dos fundos de conhecimentos socioculturais
são uma valiosa aposta pedagógica que permite reflectir e implementar diversas estratégias de
ensino-aprendizagem que encorajam e elevam a vontade dos alunos na construção participativa e
interactiva de novos conhecimentos como também na realização de actividades práticas. A título
de exemplo, o extracto 86 referente a TAI de Ruwani acima exposto e analisado, mostrou a
exploração das práticas de biliteracia na aula (construção do texto monolingue em L2) como uma
oportunidade pedagógica interligada aos ambientes de interacção bilingue.

244
7.1.1.4 Avaliação criativa e interactiva da aprendizagem de olhos vendados

A última aula deste ciclo terminou com uma evidência inédita demonstrada pelos alunos da TAI
de Ruwani durante a avaliação interactiva da aula que abordava a experiência prática sobre a
impermeabilidade e ou permeabilidade dos solos e os seus valores agrícolas conforme ilustra o
extracto 88. Após a observação da experiência seguida pela recapitulação dos episódios da aula, o
professor realizou uma sessão de avaliação da aula na qual os alunos deviam participar de olhos
vendados, respondendo às perguntas rápidas sobre o valor agrícola de cada tipo solo a partir do
que tinham observado e aprendido na experiência. Em outras palavras, os alunos explanariam
sobre os fenómenos de permeabilidade e impermeabilidade dos solos, nomeariam os tipos de solos
em duas línguas e a concluiriam reflexivelmente, sobre o impacto de cada solo no crescimento ou
não das plantas agrícolas, interligando os conhecimentos adquiridos na experiência prática de sala
de aulas e as experiências socioculturais da agricultura local.

Extracto 88: Ruw.DC13.240317


1. Prof. recapitulando, o que estudámos hoje?
2. Tur. estudámos (0.4)
3. Prof. heee:::
4. Tur. estudámos tipos de solos
5. Prof. estudámos tipos de solos. quais são os tipos de solos que nós estudámos? todos de olhos vendados, assim.
(0.4) fechar os olhos (2x) muku i::: n´wetlhe (façam todos assim ((gesticula o vendar dos olhos))) quero uma pessoa
para dizer um tipo de solo
6. Alu.21 ((antes do prof. terminar com a solicitação levantou a mão))
7. Tur. ((2 alu.s)) sou::: eu:::
8. Alu.21 solo arenoso
9. Prof. ((tocou num dos voluntários perguntando)) arenoso é o quê hi (em) citshwa?
10. Alu.22 civhunyi (areal)
11. Prof. a misava ya civhunyi yinene para kurima ou ahiyinene? (o solo arenoso é favorável para a agricultura)
12. Tur. ((coro forte)) AHIYINENE (não é favorável)
13. Prof. he::: voluntário levantem as mãos eu vou tocar
14. Tur. ((9 alunos levantaram as mãos))
15. Prof. ((tocou o alu.23 e perguntou)) yinene kumbi ahiyinene? (é ou não favorável)
16. Alu.23 ahiyinene (não é favorável)
17. Prof. hi mhaka muni, porquê ahiyinene? (porquê não é favorável)
18. Tur. ((todos os alu.s levntaram espontânea e simultaneamente as mãos))
19. Alu.24 ((falou baixo))
20. Prof. hi::: fale alto
21. Alu.24 ayinoni (não é fértil)
22. Prof.a kunona hite i yini hi cilungu? (o que quer dizer fértil em português)
23. Alu.25 >fértil<
24. Prof. fértil. é:: e o solo argiloso como nós chamamos em citshwa? voluntários, sempre com olhos vendados
25. Tur. ((5 alu.s levantaram as mãos))
26. Prof. aqui ((escolheu o alu.26))
27. Alu.26 ((levantou-se e fechou a boca e os olhos com as mãos))
28. Prof. solos argilosos como chamamos em citshwa?

245
29. A alu.26 ((mantinha-se com as mãos na boca e nos olhos))
30. Prof. ((tocou outro voluntário, alu.27)) aqui
31. Alu.27 ((com olhos vendados)) misava ya madhaka (solo argiloso)
32. Prof. misava ya madhaka. a misava ya madhaka yinene para kurima ou ahiyinene?
(solo argiloso. o solo argiloso é favorável para a agricultura ou não é favorável)
33. Tur. ((coro forte)) AHIYINENE (não é favorável)
34. Prof. ahiyinene. porquê ahiyinene? aqui, fala lá depressa (não é favorável, por que não é favorável)
35. Alu.28 porque yakoka mati (absorve a água)
36. Prof. porque yakoka mati, ahizvona. argila, solo argiloso yakoka mati? misaya ya madhaka? (absorve água, não é.
argila, o solo argiloso absorve a água? solo argiloso)
37. Tur. não
38. Prof. hi:: ya maha yini (o que faz)
39. Alu.29 ((levantou-se))
40. Prof. ya maha yini, ndzikukwenetili (já te toquei, diga o que faz)
41. Alu.29 yotshama mati (acumula a água)
42. Prof. yotshama mati. agora, kutshama mati, kutshama mati zvinene para amaplanta kumbi ahizvinene? (acumula água.
agora o acumulo de água faz bem as plantas ou não)
43. Tur. ahizvinene (não é favorável)
44. Tur. ((os alu.s leram os conteúdos no quadro)) “solos férteis, misava ya kunona”
45. Prof. misava ya kunona. a misava ya kunona yinene para kurima ou ahiyinene? (solo fértil. o solo fértil é ou não é ideal
para a agricultura)
46. Tur. yinene (é favorável)
47. Prof. porquê é que o solo fértil é bom para agricultura?
48. Alu.30 yapfuna ngovhu (porque é muito produtivo)
49. Prof. yapfuna ngovhu, mais, mayelani ni mati (é muito produtivo, mais, e de acordo com água)
50. Alu.31 ahikoki ngovhu mati (não absorve muita água)

Embora as experiências realizadas na aula tenham concentrado sobremaneira a atenção dos


alunos, a parte de avaliação final da aula mostrou resultados satisfatórios sob ponto de vista de
compreensão do conteúdo da aula. Os alunos voluntariaram-se espontaneamente e participavam
firmemente de olhos vendados. Nesta actividade, todos os alunos deviam vendar os olhos com as
mãos e só interveriam se forem tocados pelo professor. Em (6), o primeiro voluntário (alu.21)
levantou-se enquanto os outros suplicavam “sou::: eu:::” (7). O alu.21 interveio mencionando um
dos tipos de solos aprendido “solo arenoso” (8) e o alu.22 tocado pelo professor traduziu para L1
“civhunyi” (solo arenoso) (10). A pergunta sobre o valor do “civhunyi” (solo arenoso) na agricultura
em (11) foi respondida espontaneamente pela turma em coro “ahiyinene” (não é favorável) em (12)
e a seguir 9 voluntários em (14) levantaram as mãos após solicitação do professor em (13). O alu.16
em (16) reafirmou que o solo arenoso “ahiyinene” (não é favorável). Mais uma vez em (18), a turma
levantou as mãos para justificar por que o solo arenoso não é favorável para agricultura segundo
questionara o professor em (17). A resposta veio do alu.24 que depois da voz baixa, respondeu em
(21) que “ayinoni” (não é fértil). No registo 24, o professor questionava sobre o equivalente do
termo “solo argiloso” em L1. Cinco voluntários levantaram as mãos em (25), porém a alu.26 eleita
para intervir fechou a boca com as mãos envergonhada e manteve-se em silêncio após a

246
persistência do professor em (28). Colaborativamente, o alu.27 ajudou-a, apresentando o
equivalente “misava ya madhaka” (solo argiloso) (31).
Na análise do valor agrícola do solo argiloso (32), os alunos admitiram que “ahiyinene” (não é
produtiva) (33), contudo a razão da sua improdutividade não foi acertadamente justificada pelo
alu.28 ao contradizer–se nos seguintes termos “porque yakoka mati” (porque absorve a água) em
(35). O professor exclamou em (36) e em (41) o alu.29 corrigiu dizendo que “yotshama mati”
(acumula a água), não favorecendo as plantas segundo referiram os alunos em (43) em resposta à
pergunta do professor em (42). Por fim, os alunos concordaram que “misava ya kunona” (solos
férteis) eram favoráveis para a agricultura (46)). A alu.30 em (48) e o alu.31 em (50) justificaram
que eram favoráveis porque “yapfuna ngovhu” (é muito produtivo) e sob ponto de vista da água
“ahikoki ngovhu mati” (não absorve muita água) respectivamente.
A observação das experiências sobre a impermeabilidade ou permeabilidade dos solos possibilitou
a reflexão e a interacção dos alunos na recapitulação conforme ilustram as evidências acima. Os
alunos relacionavam os fenómenos que observavam na experiência prática dos solos com as
experiências locais relacionadas com a agricultura, especificamente, no que concerne ao
crescimento das plantas agrícolas. Ademais, a normalização das práticas e estratégias de
translanguaging na sala de aulas permitiu a predisposição voluntária e algumas vezes competitiva de
alguns alunos para participar na aula de olhos vendados. Com a excepção do silêncio e vergonha
do alu.26 em (29) e a resposta incorrecta do alu.28 em (35), os demais alunos apresentavam
respostas qualitativamente correctas, evidenciando a compreensão do tema da aula.
As evidências da TC ilustraram que o discurso expositivo da professora não concedeu
oportunidades para que os alunos interviessem com seus próprios esforços ou convicções tal como
ocorria na TAI de Ruwani. O extracto 89 é referente a parte final da aula sobre a composição dos
solos (impermeabilidade e permeabilidade e valores agrícolas) que observei na TC de
Mikhokhweni.

Extracto 89: Mikho.DC13.240317


1. Prof.a temos outro tipo de solos, lawayani mungawula ku (...) mute murima lomu kumahaku yini? (aquele que
disseram, cultivam onde tem o quê)
2. Tur. ((murmúrio))
3. Prof.a lomu masalakunyana a mati. mangafambi wotlhe, kambi mangasala wotlhe. hazwana? (onde permanece um pouco
de água, onde não é absorvida na totalidade, onde não fica muita água)
4. Tur. i::: (sim)

247
5. Prof.a mangafambi wotlhe mati kambi mangasali yini? (não se absorve toda água ou não permanece o quê)
((afirmação-pergunta))
6. Tur. ((coro através da resposta-afirmação)) mangasali wotlhe (não permanence toda água)
7. Prof.a hiku loko mangasali wotlhe, hicheletela kolomuya, zvitamaha yini? (porque se não permanence toda água, o que
acontecerá com a sementeira)
8. Tur. zvita – ((murmúrio))
9. Prof.a zvitamaha yini? (o que acontecerá)
10. Tur. zvotofa (morrerá)
11. Prof.a zvitafa hi yini hiku kuni mati? (morrerão porquê, porque tem água)
12. Tur. ((alguns alu.s)) hikusa matele mati (porque está cheio de água)
13. Prof.a zvitafa hi yini? (por que morrerá)
14. Tur. a mate matele (porque está cheio de água)
15. Prof.a hikusa a mati matele, zvimila zvitlhela zvihina. akuhina kambe kuyini? (porque está cheio de água, germinam e
depois apobrecem. a propósito o que significa apodrecer)
16. Tur. kubola (apodrecer)
17. Prof.a ehe::: azvibzwala zvipfhaki lomu ka congo wa mati, cimaha yini, ou citomila cimaha ndzuti. (...) (e::: semeiou o
milho na ribeira com água, o que acontecerá, ou germinará mas não reproduzirá)
18. Prof. então nós temos que praticar a agricultura nos solos férteis. solos?
19. Tur. ((coro)) férteis
20. Prof.a solos?
21. Tur. FÉRTEIS

No registo (1) a professora solicitou a menção do outro tipo de solo, todavia a turma murmurou
(2). Diante desta reacção, a professora ajudou a turma anunciando a característica principal do tal
solo na expectativa de a própria turma anunciar o respectivo nome conforme mostra o registo (3).
Contrariamente, a turma apenas concordou estar atenta (4), porém não o anunciou. Nisto, a
professora recorreu à pergunta fechada em (5) e a turma respondeu passivamente “mangasali
wotlhe” (não permanence toda água) (6). Nos registos subsequentes (10 a 16) a turma apresentou
respostas próprias em coro e em L1. Fundamentalmente, as respostas da turma estavam
essencialmente interligadas com os saberes e as experiências socioculturais relacionados com a
agricultura local. Quer dizer, os alunos participavam em coro, mas em voz audível, pois as suas
respostas reflectiam fenómenos e realidades agrícolas conhecidos. Por exemplo, em (10) os alunos
apontam que as sementes morrerão nas situações em que o solo estiver seco em resposta a pergunta
(7). Em (11) a professora faz uma pergunta propositadamente contraditória à resposta dos alunos
em (10) “zvitafa hi yini hiku kuni mati?” (morrerão porquê, porque tem água?). Em (12), alguns
alunos, responderam prontamente a tentativa de contradição da professora, demonstrando a sua
atenção “hikusa matele mati” (porque tem muita água). No fim do extracto, a professora promove
a exposição (17 e 18) e a repetição em coro (18 e 20) correspondido pelos alunos nos registos (19 e
21) “férteis”.

248
CAPÍTULO 8. Avaliação crítica dos professores sobre a viabilidade e validade
pedagógica da pesquisa

Introdução

Neste capítulo debruço-me as visões, reflexões e posicionamentos críticos de 4 grupos de


professores nos processos de validação interna e externa dos resultados gerados pelas EPC´s de
Acação Inovadora de Ruwani e de Citimela em comparação com as evidências e os resultados
colectados na EPC de Controle através de duas categorias de critérios e padrões de julgamento.
O processo de validação interna foi realizado por 2 grupos de professores das EPC´s de Acção
Inovadora de Ruwani (I grupo) e de Citimela (II grupo), respectivamente. Os professores destes
grupos tinham antecipadamente, algumas experiências, vivências e evidências dos resultados pela
pesquisa, pois co-participaram activamente em todas as etapas dos ciclos de pesquisa-acção ao
longo da I e da II fase desta pesquisa. As suas visões, reflexões e posicionamentos críticos avaliavam
a validade dos resultados da pesquia à luz dos seguintes critérios e padrões de julgamento:
motivação, participação e interacção dos alunos e facilitação do ensino-aprendizagem.
O processo de validação externa foi desenvolvido por 2 grupos de professores das EPC´s de Crítica
e Validação de Mikhokhweni (III grupo) e de Wulombe (IV grupo). Estes grupos de professores
foram convidados para participar na etapa final da pesquisa como avaliadores externos que se
confrontariam, pela primeira vez, com os resultados finais da pesquisa, analisando criticamente a
sua validade pedagógica através dos seguintes critérios e padrões de julgamento: participação
aberta, activa e voluntária dos alunos; nível de participação e de interacção dos alunos; facilitação
de ensino-aprendizagem e considerações gerais (delimitação das línguas e aprendizagem em L2,
aspectos negativos e positivos, comentários, perguntas, críticas e sugestões).
Ao longo das secções e sub-secções deste capítulo analisarei o valor, a relevância, a credibilidade,
a viabilidade e a validade pedagógica da proposta em pesquisa a partir da triangulação dos
diferentes visões, reflexões e posicionamentos críticos tanto dos professores das EPC´s de Acção
Inovadora (processo de validação interna) como as dos professores das EPC´s de Critica e
Validação (processo de validação externa) dentro das categorias dos critérios e padrões de
julgamento.

249
8.1 Impacto pedagógico da pesquisa: posicionamentos e visões críticas dos
professores

Ao longo das práticas pedagógicas que desenvolvi nesta pesquisa com os professores das EPC´s de
Acção Inovadora consegui romper com os princípios e pedagogia de separação e ou fronteiras
entre as línguas nas aulas e engajar os professores na reflexão, planificação e exploração de novas
práticas pedagógicas alicerçadas no translanguaging, collateral learning e cross-cultural border. No fim da
pesquisa, tanto os professores das EPC´s de Acção Inovadora como os das EPC´s de Crítica e
Validação foram confrontados com os resultados e evidências gerados pelas novas práticas
pedagógicas nas etapas iniciais, intermédias e finais que sob o ponto de vista linguístico, cultural e
pedagógico proporcionavam novas oportunidades de ensino-aprendizagem dos alunos bilingues
emergentes na 4ª classe de pós-transição.
As visões, reflexões e os seus posicionamentos críticos dos professores validaram o valor, a
relevância, a credibilidade e a viabilidade da presente proposta pedagógica, tanto numa como na
outra categoria de critérios e padrões de julgamento, conforme ilustram as sub-secções 8.1.1
(processo de validação interna) e 8.1.2 (processo de validação externa) respectivamente.

8.1.1 Visões críticas dos professores no processo de validação interna

No âmbito da validação interna, os professores avaliaram e validaram a proposta pedagógica em


pesquisa pelo facto desta não só motivar a participação e a interacção dos alunos nas aulas, mas
também facilitar o ensino-aprendizagem e a construção do conhecimento nas aulas de Ciências
Naturais.

8.1.1.1 Co-participação dos alunos

No extracto 90, a Prof.a Lambani do grupo da EPC de Acção Inovadora de Ruwani reflectiu sobre
a validade das evidências finais da pesquisa como uma proposta pedagógica viável para o ensino-
aprendizagem nas classes de pós-transição pelo facto de facilitar a participação dos alunos.

250
Extracto 90: Prof.a Lambani (EPC de Ruwani)
(...) só indo para os vídeos zvikumba ku acin´wanana cihatla citsaka hi citshwa, akama uwulawulaku ni cilungu co
i::: ((gesticulou a cabeça cabisbaixa)) a kama utaku utathlateka ((referindo-se ao uso de citshwa)) co i::: ((gesticulou
a acção de erguer a cabeça)) cilulama, ciwuya laha ka kunene. (...) já hi cilungu basi e::: tawuya. utlela nawena utisintira
kambe uku “ah ndzokala kuwulawula zvona? zvomahisa kuyini? Wazviwo?”. já, acho que é vantajoso

((...) só indo para os vídeos, evidenciará que a/o aluna/a fica mais esperta/o e aberta/o em citshwa. quando
você usa o português na aula ela/e fica cabisbaixa/a contudo quando você sobrepõe o citshwa ela/e ergue a
cabeça motivado e depoisinterage activamente (...) já somente em Português e::: é muito difícil. Em última
instância, sento-me mal e até auto-questiona-me “ah será que não estou a falar correctamente? o que se passa
comigo? já viu? já, acho que é vantajoso)

A reflexão da Prof.a Lambani baseava-se nas evidências que constatou na análise dos vídeos de
aulas da EPC de Acção Inovadora de Citimela e os da EPC de Controle de Mikhokhweni bem
como nas suas experiências práticas e pedagógicas como co-participante e professora principal da
TAI de Ruwani. Na sua reflexão, ela mostra que os alunos predispunham-se a participar e a
interagir activamente na aula sempre que os professores fomentassem práticas discursivas bilingues
(erguiam a cabeça, ficavam mais activos, abertos e espertos), todavia, quando os professores
promovessem práticas discursivas exclusivamente em L2 na aula, os alunos calavam-se, ficavam
desmotivados e cabisbaixos.
O Prof. Itwani da EPC de Acção Inovadora de Ruwani confessou que no início da pesquisa estava
céptico sobre a viabilidade pedagógica da proposta em estudo conforme ilustra o extracto 91. Uma
das questões que era colocada pelo Prof. Itwani tinha a ver com a garantia que a proposta
pedagógica propunha para a aprendizagem da L2 e o sucesso dos alunos no exame da 5ª classe,
uma vez que, na sua óptica, as práticas pedagógicas de translanguaging, collateral learning e cross-border
cultural colocavam em causa a pedagogia de separação das línguas L2 (meio de instrução) e L1
(meio auxiliar) e a maior exposição da L2 instituída pelo currículo como abordagem de ensino-
aprendizagem nas classes de pós-transição.

Extracto 91: Prof. Itwani (EPC de Ruwani)


(...) akusunguleni ndziwahi ni kukanakana, acho hiwulawulelo pode uzviperceberi kwalomuyani ndziku ndzingatevani ni
confusão ka exame cakalacakala, mas hi realidade ya tiru lowu wungakombiwa dá para acreditar que usando estes procedimentos
a criança mesmo assimila de melhor maneira a matéria porque mesmo os acanhados já têm aquela liberdade de se pronunciar (...)
mas o procedimento, o tipo de procedimento que está se pretende implementar (...) eu estou a ver que traz benefícios. (...)
mahambana a imagens hingamawona lomu. a ka cilungu ni ka kupatsa a tirimi timbiri, a reacção ka parte ka vanana hiwonikili
zvaku hi yihi. já a partir daí, hina hasekeleka zvaku loko kuwahi ni matimba mesmo, podia hi implementariwa

((...) no início desta pesquisa tinha receios, acho que teria se apercebido nas minhasintervenções, pois
questionava se esta proposta não criaria confusão no exame etc e etc mas a realidade e as evidências que esta
pesquisa nos apresenta dá para acreditar que usando estes procedimentos a criança mesmo assimila de melhor
maneira a matéria porque mesmo os acanhados já têm aquela liberdade de se pronunciar (...) mas o

251
procedimento, o tipo de procedimento que está se pretende implementar (...) eu estou a ver que traz benefícios
(...) as imagens que vimos são diferentes. nas turma em português e nas turmas de junção de duas línguas
vimos qual foi a reacção dos alunos. já a partir daí, nós concordámos que se houvesse vontade mesmo, esta
proposta podia ser implementada)

As evidências finais da pesquisa mudaram a visão incrédula do Prof. Itwani ao constatar que, ao
contrário da pedagogia de separação das línguas e da maior exposição da L2 nas classes de pós-
transição, as práticas pedagógicas de translanguaging e a integração dos fundos de conhecimentos
socioculturais através das pedagogias de collateral learning e cross-border cultural, permitiam a maior
participação dos alunos nas aulas de tal forma que, mesmo os acanhados, tomavam a iniciativa de
interagir na aula, melhorando assim a assimilação da matéria. Com base na comparação entre as
evidências das TAI´s e as da TC, o Prof. Itwani conclui ser importante a legitimação e a
implementação desta proposta pedagógica nas classes de pós-transição.
A combinação das práticas linguísticas bilingues e os materiais didácticos trazem mais benefícios
na aprendizagem dos alunos do que as práticas pedagógicas centralizadas somente na L2, segundo
referiu o Prof. Zemba no extracto 92.

Extracto 92: Prof. Zemba (EPC de Citimela)


(...) de facto eu acaba concluindo que o grande segredo para concretização daquilo que nós queremos numa
aula é o material didáctico. com material didáctico a aula fica mais viva (...) Para ganhar este aluno é preciso
mesmo essa junção. (...) acabo concluindo que aquela aquela junção traz sucessos, traz sucessos. Sem aquele
material a aula é difícil concretizar mas querendo levar sério (...) quando o prof. quer levar sério só e só o
português então há dificuldades

A L2 fragiliza a objectividade, a seriedade e a qualidade do ensino-aprendizagem. O material


didáctico tem uma função de concretização dos fenómenos e a aula torna-se mais dinâmica e ou
flexível uma vez que os alunos podem usar as duas línguas como recursos para a participação e
interacção nos ambientes de sala de aulas. Em suma, as visões e os posicionamentos acima são uma
amostra de análises relativas a viabilidade pedagógica da proposta em pesquisa compartilhada pela
maioria dos professores das TAI´s.

8.1.1.2 Co-participação colaborativa através de pontes entre as línguas e os


conhecimentos

Os professores das EPC´s de Acção Inovadora de Ruwani e Citimela reflectiram sobre o valor das
línguas e dos conhecimentos socioculturais e universais nas aulas. Os seus posicionamentos foram

252
unânimes e firmes em relação ao valor pedagógico destes dois elementos. Um dos posicionamentos
é da autoria do Prof. Azumbani da EPC de Acção Inovadora de Citimela conforme mostra o
extracto 93. Ele mostra criticamente que nas classes de pós-transição, os alunos não têm as
oportunidades de expor e de partilhar os seus fundos de conhecimentos nas línguas que mais
dominam.

Extracto 93: Prof. Azumbani (EPC de Citimela)


(...) tratando-se de questões de saberes locais (.) as crianças não porque não têm nenhum conhecimento mas
por outro lado não têm oportunidade não só olhar para o ensino bilingue não têm oportunidades de se
expressar de como elas são isto é na sua própria língua o seu conhecimento. elas não têm uma capacidade de
explicar devido lá em casa falam chope (.) falam gitonga falam sei lá línguas de lá de casa mas na escola
encontram o português. para mim não se difere tanto de eu ir a China para aprender chinês eu posso
aprender matéria mais simples mas por causa da língua (.) posso ter dificuldades de trazer uma retórica do
conhecimento que eu tenho por causa da língua. mas se me derem oportunidade de eu falar um pouco
daquilo que eu sei na minha língua procurando misturar com aquela língua que eu tenho que aprender eu
penso que para todos os níveis (.) a todas as classes do ensino primário mesmo nas classes do monolingue e
bilingue isto pode trazer muitos sucessos. usar as duas línguas ou usar a língua local como recurso isso de
certa maneira acredito que isto pode ajudar o aluno a dizer aquilo que sabe porque o fim último penso eu
que o fim último numa ciência é construir o conhecimento e não no entanto (.) claro que é necessário
português mas na construção do conhecimento eu quero acreditar que as crianças têm conhecimento apenas
não sabem explicar ou traduzir aquilo que sabem

Conforme ilustra o extracto 93, o Prof. Azumbani reconhece que os alunos não possuem uma
proficiência linguística para expor e explicar os seus fundos conhecimentos nas aulas em L2.
Portanto, ela considera que as práticas discursivas bilingues abrem oportunidades pedagógicas
para os alunos aplicarem os seus fundos de conhecimentos em L1 num processo que considera ser
uma tradução dos conhecimentos de L1 para a L2, o português.
As análises da Prof.a Nathumani da EPC de Acção Inovadora de Citimela alinham-se com os
posicionamentos do Prof. Azumbani e validam a proposta pedagógica em estudo com base nas
pontes que as línguas estabelecem entre si na aula. Ela entende que o fomento da L1 nas aulas
favorece a compreensão da L2 e dos conteúdos académicos. Nestas circunstâncias, os alunos têm
oportunidades para participar activamente nas aulas, expondo as suas experiências, as suas
realidades e os seus saberes locais e quotidianos que rodeiam o seu mundo sociocultural (domínio
dos fundos de conhecimentos socioculturais locais) segundo ilustra o extracto 94.

253
Extracto 94: Prof.a Nathumani (EPC de Citimela)

(...) ani nitiwonisa taku ehhh ka madharela yale yopatela, madharela ya silima ngutu. aamaha taku mwanana a participara (.)
unteka ngu ngu, uciteka ngu cicopi cakwe por exemplo, wakuluveta ku uncihokisa hale ka cilungu. atabwabwa ngu cilungu nakuve
watiziva tokhene, tona tiya atiwombaku nguti to hi:: wawo
((...) eu acho que ehhh a leccionação em duas línguas é uma leccionação de grande valor pedagógico. promove
a participação da criança (.) você inicia-a em sua língua cicopi por exemplo, ela facilmente compreenderá
quando for a vez de usar o português. na altura em que você se expressa em português ela já sabe de quê está
a falar disto e daquilo, já viu)
Ali há grande facilidade na compreensão dos conteúdos. Há uma boa compreensão. (...) proposta yiya yibom,
ayi yothumisa tidimi timbidi yibom (esta proposta de duas línguas é boa) (.) facilita na participação do próprio
aluno na sala de aulas. Há maior participação (...) podemos usar duas línguas na sala. podemos usar. ani
nawona nguti ta (eu tenho constatado que as turmas de) monolingue ni (e as de) bilingue, onde há grande
agitação é nas turmas de bilingue onde usamos as duas línguas. há grande agitação de participação, você dá
aulas até sentir que está a dar aulas porque as crianças participam, falam de coisas que conhecem usando a
sua língua

Na óptica da Prof.a Nathumani, a participação activa dos alunos da TAI supera os ambientes das
turmas monolingues. Aliás, vale referir que, mais do que co-participar activamente nos ciclos de
pesquisa-acção na EPC de Acção Inovadora de Citimela, a Prof.a Nathumani leccionava em duas
turmas, uma do programa monolingue em Português e a outra do programa de educação bilingue.
Consciente do problema linguístico e pedagógico das classes de transição, as suas reflexões validam
a viabilidade linguística e pedagógica das práticas de translanguaging, collateral learning e cross-cultural
border, pois mais do que motivar a participação dos alunos e facilitar a compreensão dos conteúdos
académicos, ela entende que há uma ponte de interacção entre as línguas e entre os conhecimentos
socioculturais dominados pelos alunos e os conhecimentos dos conteúdos da ciência. Nestas pontes
interactivas, ela conclui que os professores medeiam as aulas num repertório bilingue e com auto-
estima pelo seu trabalho pedagógico porque os alunos colaboravam na construção de
conhecimentos nas aulas, expondo seguramente os seus fundos de conhecimentos em L1,
facilitando e flexibilizando o processo de ensino-aprendizagem.
Avaliando criticamente a análise do extracto 94, fica mais que evidente que os alunos superavam
as dificuldades impostas pela baixa proficiência e baixa competência interaccional em L2 uma vez
que, através das práticas discursivas bilingues e dos fundos de conhecimentos, os alunos co-
participavam interactivamente nas aulas e construíam novos conhecimentos.
Um dos benefícios desta proposta pedagógica tem a ver com as facilidades que os alunos têm para
transformar os conhecimentos socioculturais acedíveis em L1 e juntá-los ao conhecimento
universal em L2 através da liberdade das línguas e da participação de todos os alunos conforme
refere o Prof. Azumbani no extracto 95.

254
Extracto 95: Prof. Azumbani (EPC Citimela)
(...) as crianças murcharam (.) não havia espontaneidade mas eu vi naquelas outras aulas que demos liberdade
delas se expressar nas duas línguas (.) então havia mesmo u::: um:: grau acentuado mesmo no sentido de
participação (...) quando começamos já com esta liberdade de ter que transmitir nas duas línguas (.) a criança
já se sentia acomodada ia adquirindo (.) aliás, a criança do jeito que fazia era transformar o conhecimento
que já tem em Cicopi o mesmo só e só para Português (...) mas este exercício eu penso que na verdade não é
assim de forma automática, é um processo, e este processo precisa de algum estímulos, ser estimulado destas
e doutras maneiras que é para usar estas duas línguas e sobretudo trazer este material concretizador porquê?
As nossas crianças na 4ª classe têm um défice mesmo acentuado no vocabulário (...) isto é comum para
crianças que estão no ensino (.) nesta fase. (...) com esta abertura de espaços de traduzir, usar português – copi
de forma planificada, claro, então isto vem catapultar de certa maneira as crianças dizem ahhh… afinal isto
é isto, isto é isto traduzir o pensamento em língua local para o Português e interpretar este conhecimento em
português para a língua local. então, isto incentiva também a sua participação porque as crianças ficam
murchas por causa da língua, isso é uma coisa que eu vivi quando dei aquelas aulas em português

A incorporação de duas línguas e do material didáctico estimulava a participação dos alunos na


aula, promovia a tradução dos seus pensamentos da L1 para a L2 e contribuía para que houvesse
a interpretação dos fenómenos em duas línguas. Nestes termos, os alunos demonstravam novas
atitudes na aula, pois os alunos que outrora eram “murchos” revertiam-se para alunos mais
participativos com base nas praáticas discursivas e interactivas do translanguaging. Mais uma vez, as
análises do Prof. Azumbani são resultados das suas evidências, seus sentimentos e suas experiências
práticas pedagógicas que desenvolveu aquando da leccionação de algumas aulas na TAI de
Citimela.
Nesta sub-secção analisei os posicionamentos dos professores que co-participaram nos diferentes
ciclos de pesquisa-acção nas duas fases da pesquisa razão pela qual, os seus posicionamentos estão
consubstanciados nas suas experiências e práticas pedagógicas (planificação, leccionação,
observação e reflexão). Na visão deste grupo de professores, as práticas discursivas e pedagógicas
de translanguaging e as de collateral learning e cross-cultural border são pedagogicamente benéficas pois,
permitem a aprendizagem construtiva e colaborativa dos conhecimentos da ciência. Na sub-secção
8.1.2, debruçarei-me sobre os posicionamentos dos professores em relação aos resultados da
pesquisa no âmbito do processo de validação externa.

8.1.2 Visões críticas dos professores no processo de validação externa

Os professores das EPC´s de Crítica e Validação de Mikhokhweni e Wulombe avaliaram


criticamente os resultados desta pesquisa com base em quatro critérios e padrões de julgamento,
nomeadamente: participação aberta, activa e voluntária dos alunos; nível de participação e de

255
interacção dos alunos; facilitação de ensino-aprendizagem e considerações gerais (delimitação das
línguas e aprendizagem em L2, aspectos negativos e positivos, comentários, perguntas, críticas e
sugestões). Os professores apresentaram, coincidentemente, posicionamentos unânimes
relativamente aos três primeiros critérios e padrões de julgamento, porém apresentaram
posicionamentos contraditórios no critério e padrão de julgamento sobre as considerações gerais.

8.1.2.1 Participação aberta, activa e voluntária

A análise sobre as fichas de avaliação e crítica dos resultados da pesquisa ilustra que os
posicionamentos dos professores das EPC´s de Crítica e Validação externa de Mikhokhweni e de
Wulombe concluíram que a proposta pedagógica em pesquisa cria oportunidades de participação
activa dos alunos a partir da qual se desenvolve a aprendizagem dos conteúdos, conforme ilustra
a tabela 8.

Tabela 8: Posicionamento dos professores sobre a participação aberta, activa e voluntária dos alunos
Critério e padrão EPC de Mikhokhweni EPC de Wulombe
de julgamento
1. A participação corresponde 1. A participação activa e voluntária dos
ao exigido neste ponto alunos durante a aula foi muito positiva
uma vez que demonstraram o domínio
do conteúdo
Participação aberta, 2. Esta participação é a mais 2. Os alunos participaram abertamente
activa e voluntário dos exigida para o ensino e voluntariamente
alunos 3. Os alunos participaram bem 3. Boa participação activa e voluntária
dando as suas contribuições dos alunos apesar de existir momentos
de pausa e de silêncio

Os professores das ambas as EPC´s apresentaram diferentes posicionamentos, contudo são todos
unânimes sobre as vantagens que a proposta propõe no que concerne a participação dos alunos
nas aulas e a sua contribuição para a construção de conhecimentos, conforme mostram os registos
(1, 2 e 3) de ambas EPC´s. Com vista a ampliar a compreensão do alcance dos posicionamentos
dos professores, analisei adicionalmente as visões dos professores apresentadas nas entrevistas
grupais não-estruturadas. A visão do Prof. Vinichi mostra que, de facto, os alunos participam e
constroem ideias, pensamento e conhecimento da ciência, conforme ilustra o extracto 96.

256
Extracto 96: Prof. Vinichi (EPC de Mikhokhweni)
(...) de facto os alunos participam abertamente e são activos. O nível de interacção é de facto satisfatório (...)
então um dos aspectos positivos de acordo com a ficha é que os alunos de facto abrem-se, falam, participam,
constroem ideias porque muitas das vezes o que é difícil é tirar um pensamento numa língua em que você
não domina ehhh, é difícil desenvolver um pensamento. então é numa língua que tu falas que é fácil
manipular a própria língua, escapar-se de algumas coisas. (...) pude ver que conseguiram também traduzir
alguns termos de Português e outros alguns exemplos, isso já é bom porque numa aula de Ciências Naturais
o que nós queremos é a própria ciência não nos importa muito a língua, o conhecimento porque é a aplicação
do conhecimento. eu acho que essa parte é é muito positivo

O posicionamento acima ilustra que a participação dos alunos nas aulas é um elemento pedagógico
imprescindível porque, a partir deste, os alunos pensam e expõem abertamente as suas ideias e ou
pensamento. Nestes termos, esta constatação é possível porque os alunos têm a liberdade de usar
a língua que mais dominam (L1) e a partir da qual pensam e constroem ideias. Assim, a inclusão
da L1 através das práticas pedagógicas é relevante para a construção e a compreensão activa dos
conteúdos científicos.
Complementando a análise do Prof. Vinichi, a Prof. Adhozani reconhece que os alunos da TC
têm enfrentado dificuldades para participar nas aulas por questões linguísticas e pela ausência de
material didáctico conforme evidencia o extracto 97.

Extracto 97: Prof.a Adhozani (EPC de Mikhokhweni)


o que eu observo lá na minha sala a interacção não é assim mesmo melhor. ali os alunos não estão muito
bem livre eu não sei se estão com medo ou o quê mas o que eu é que não participam mesmo de uma forma
desejada o que vinha acontecendo por exemplo nas aulas de citshwa lá na 3ª classe porque eles já estavam
totalmente livres. agora eu acho que eles agora sentem-se um pouco inibidos por questão da língua ou questão
da assistência, não sei. outra coisa que pode ajudar para mim é a questão mesmo de material concretizador
porque tratando de uma fase sei lá se é de transição ali temos que mostrar sabe por exemplo, que capim hi
citshwa wazvitiva (conhecem em citshwa) sem falta ku (que) capim hi leco co i::: (é aquele assim). mas já loko
uyamubzwela zvaku (se disser) “estão a ver come capim, come capim” ficamindiferentes, não sabem o que é
isso de capim. agora, se tivermos esse material loko uku (e disser) capim, logo a prior ukhoma uku ihhh vatekela
ku ahhh leci hacitiva leci já vazvitiva zvaku (mostrar-lhes, de certo que saberão de quê se trata e logo reconhecerão
que) capim de verdade a bzwanyi (capim) é capim. eu penso que material concretizador nesta fase aqui ajuda
muito mas muito mesmo, muito mesmo

À luz do extracto 97, evidencia-se que as práticas discursivas bilingues e a visualização dos
materiais didácticos eliminam as barreiras interactivas e comunicativas fomentadas pelas práticas
discursivas em L2. Em outras palavras, em todas as oportunidades nas quais os alunos têm a L1 e
os materiais representativos dos seus contextos socioculturais na aula, o ambiente de ensino-
aprendizagem torna-se mais cómodo, acessível e motivador tal que, participam e interagem
construtivamente na aula. Portanto, as práticas pedagógicas bilingues e os materiais didácticos do

257
mundo sociocultural dos alunos são as que melhor se adequam à flexibilidade e ao dinamismo do
ensino-aprendizagem, pois motivam a participação activa, aberta e voluntária dos alunos.

8.1.2.2 Níveis de interacção e de participação

As práticas pedagógicas bilingues elevam os níveis de interacção e de participação dos alunos. Na


tabela 9 , os professores concluíram que mais do que a participação, activa e voluntária dos alunos
nas aulas, o fomento de práticas pedagógicas de translanguaging e os fundos dos conhecimentos dos
alunos tem um impacto positivo no ensino-aprendizagem. Os níveis de interacção dos alunos são
satisfatórios, os alunos predispõem-se a colaborar activamente na construção dos conhecimentos
na aula.

Tabela 9: Posicionamento dos professores sobre os níveis de interacção e participação dos alunos
Critério e padrão EPC de Mikhokhweni EPC de Wulombe
de julgamento
1. A interacção e a participação 1. A interacção e participação
ocasionada pelas línguas nos alunos é dos alunos ocasionado pelas
activa línguas uma vez que nesta classe
já é a transição da L1 para L2 por
outras vezes houveram
problemas na sua participação
em dar alguns exemplos mas a
professora sempre recorria a
Nível de interacção e língua mãe assim como em
participação dos alunos alguns exemplos até que haja
uma interacção em ambas partes
2. A participação e interacção dos 2. O nível de interacção é
alunos é em duas línguas e é activa satisfatório
3. A participação é muito positiva e 3. O nível de interacção e de
aberta participação dos alunos é
satisfatório isto porque os
conteúdos de aulas são do nível

Em reacção às evidências relacionadas com os níveis de interacção e participação dos alunos nas
aulas, alguns professores teceram reflexões lastimáveis sobre os ambientes de comunicação e de
interacção professor – alunos e vice-versa nas turmas de pós-transição como também apresentaram
posicionamentos de satisfação pelos níveis de participação e de interacção alcançados nesta
pesquisa. A título de exemplo, extracto no 98, a Prof.a Ayenda descreveu satisfatoriamente os

258
benefícios de práticas pedagógicas bilingues e de inclusão dos materiais didácticos locais no que
concerne à promoção da participação e da interacção dos alunos nas classes de pós-transição.

Extracto 98: Prof.a Ayenda (EPC de Wulombe)


eu penso que para nosso caso de ensino bilingue é muito fácil trabalhar com as duas línguas mesmo até 5ª
classe ou ir para mais longe 7ª podemos usar as duas línguas. usando só português, a criança do resto fica
limitada, algumas palavras não consegue pronunciar em português mas quando pergunta em sua língua a
criança responde com facilidade. e a outra coisa é ter o material didáctico. quando nós temos o material
didáctivo a aula automaticamente passa a ser um toma lá, dá cá porque a criança vê e depois fala aquilo que
consegue ver. (...) aquelas primeiras aulas o que eu notei é que algumas aulas não tinham material didáctico,
a criança era muito assim tímida, para falar português, não conseguia pronunciar-se desta e daquela mas
quando já esteve naquela aula com material didáctico, a língua ou misturar mistura das duas de línguas as
crianças foram activas, conseguiram falar à vontade

Na visão da Prof.a Ayenda, a participação e a interacção dos alunos não se alcança em L2 e sem
os materiais didácticos. Contrariamente, o uso de um repertório discursivo baseado em duas
línguas e nos materiais didácticos facilitam o trabalho dos professores, pois a interacção de sala de
aula é caracterizado por pergunta-resposta “toma lá, dá cá”. Os materiais didácticos e a
liberalização das línguas motivaram os alunos a interagir aberta e flexivelmente na aula pois
“vê(em) e depois fala (m) aquilo que consegue(m) ver”.
Os óptimos níveis de participação e de interacção dos alunos alcançados nesta pesquisa
revitalizaram as atitudes reais e características dos alunos das classes antes da transição conforme
aponta a Prof.a Girisa no extracto 99.

Extracto 99: Prof.a Girisa (EPC de Wulombe)


(...) próprias aulas quando estamos dentro da sala usando este nosso ensino o aluno é muito activo, não tem
receio de falar é seu amigo diferente da do do monolingue. você fala primeiro a criança escuta e depois
começa a raciocinar agora aqui a criança é muito activa muito mesmo. não tem receio de falar. essa é a nossa
vantagem. é por isso que o Prof. Milisi estava a falar de que não podemos dizer que existe aspecto negativo
porque nós estamos no terreno a ver essa vantagem

A análise da Prof.a Girisa mostra que os alunos retomaram as suas características participativas e
interactivas nas aulas. A partir das práticas pedagógicas bilingues, os alunos não têm receios para
intervir diferentemente dos alunos do programa monolingue em Português. De forma unânime,
os professores concluíram que não constataram nenhum aspecto negativo e ou contrário à
viabilidade pedagógica dos resultados desta pesquisa. No decurso das análises críticas sobre os

259
resultados da pesquisa, o Prof. Milisi aproveitou-se da ocasião para, por um lado, lamentar e, por
outro lado, criticar e testemunhar os problemas de participação e de interacção que afectam os
alunos da sua turma de 5ª classe patente no extracto 100. A partir da sua lamentação, o Prof. Milisi
concordava com a ideia de que, de facto, é importante que as classes de pós-transição sejam
leccionadas com base nas práticas pedagógicas de translanguaging e dos fundos de conhecimentos
propostos pela pedagogia de collateral learning e cross-cultural border. Ademais, a lamentação do Prof.
Milisi criticava e chamava atenção para o facto de que, a problemática da participação e da
interacção não só afecta aos alunos da 4ª classe como também se estende aos alunos que
frequentam a 5ª classe. Os alunos desafiam as práticas pedagógicas em L2, exigindo discretamente
espaços de uso da L1, o Gitonga, no processo de ensino-aprendizagem conforme ilustra o extracto
100.

Extracto 100: Prof. Milisi (EPC de Wulombe)


1. Prof. Milisi agora p.e nesta modalidade que estou usar agora (...), agora estou na 5ª a criança só tem que ter
aquela disciplina naquele momento
2. Prof.a Girisa momento, 45min
3. Prof. Milisi mas estou a sofrer
4. Invest. por que é que sofre?
5. Prof. Milisi porque as crianças epa hi::: todo o momento, quer que a criança aprenda lá dentro usando
6. Invest. português
7. Prof.a Cirani Gitonga?
8. Prof. Milisi não não, é Gitonga
9. Prof.a Girisa Gitonga
10. Invest. vagulomba Gitonga avo? (exigem o Gitonga)
11. Prof. Milisi vagulomba Gitonga avo khawo - (eles exigem o Gitonga dizendo que)
12. Prof. s i::: hu::: português na sala mesmo na 5ª é difícil a criança falar em português na aula
13. Prof. Milisi estou a lutar mesmo com as crianças. é preciso trabalhar i:::
14. Prof.a Girisa a comunicação da criança só é Gitonga
15. Prof.a Ayenda é que usando só e só português não há-de haver aquela comunicação mesmo que nós
desejamos
16. Invest. então são duas lutas. he::: são duas guerras, guerra deles que querem Gitonga e guerra do prof.
que quer Português
17. Prof.a Cirani eles estão mais inclinados no Gitonga
18. Prof.a Girisa e gostam crianças
19. Invest. agora a solução é juntar as duas?
20. Prof.a Girisa sim, juntar as duas línguas
21. Prof. Milisi he:::?
22. Prof.a Cirani temos que juntar as duas
23. Prof.a Ayenda juntar as duas para facilitar a aprendizagem da crian

260
Conforme o registo (3), o Prof. Milisi refere que “mas estou a sofrer” porque os seus alunos o
desafiam a usar a L1 na aula ao invés da L2 na segunda classe de pós-transição (5ª classe). O prof.
Milisi lamentou enfrentar sérias dificuldades para ensinar em L2, “estou a lutar mesmo com as
crianças” (13), uma vez que os alunos não participam nas aulas nesta língua senão em L1 que é a
língua mais dominada e que lhes permite interagir qualitativamente nas aulas. Os alunos pedem o
uso da L1, pois, segundo, justificaram os outros professores “usando só e só Português não há-de
haver aquela comunicação mesmo que nós desejamos” (15), “eles estão mais inclinados no
Gitonga” (17), “e gostam de Gitonga” (19). Baseando-se nas suas experiências pedagógicas como
professores de educação bilingue e induzindos pelos resultados da pesquisa e pelas suas reflexões
críticas, os professores concordaram por unanimidade que é imperioso “juntar as duas línguas”
(22 e 23) através das práticas discursivas e pedagógicas de translanguaging e providenciar os materiais
didácticos socioculturais através das práticas pedagógicas de collateral learning e cross-cultural boder
para garantir que os alunos possam a participação e a interacção nas aulas e aprenderem os
conteúdos académicos.

8.1.2 3 Facilitação do ensino-aprendizagem

À semelhança dos anteriores critérios e padrões de julgamento, os posicionamentos dos professores


comungam da conclusão de que as evidências e os resultados desta pesquisa proporcionam
ambientes cómodos, acessíveis e motivadores aos alunos. Por esta razão, os alunos têm as
oportunidades de facilitação do ensino-aprendizagem conforme ilustra a tabela 10.

Tabela 10: Posicionamento dos professores sobre a facilitação do ensino-aprendizagem


Critério e padrão EPC de Mikhokhweni EPC de Wulombe
de julgamento
1. A facilitação do ensino- 1. Tratando-se duma língua que
aprendizagem é positivo dado que os é do domínio dos alunos, já para
alunos são participativos nas aulas a transição é muito facilitada
porque este mesmo aluno vem
com uma bagagem da fala e a
partir desta classe só vai se fazer
Facilitação do ensino- a aprendizagem da sua escrita
aprendizagem 2. A facilitação do ensino- 2. Os alunos demonstraram
aprendizagem é muito positiva compreender facilmente o que
porque os alunos actuam na aula aprendem
3. O ensino é muito dinâmico e 3. Facilitava o ensino porque
aprendem com facilidade usava duas línguas e apresentava
o material didáctico

261
De acordo com as vozes dos professores, a facilitação do ensino-aprendizagem é viabilizada pelas
práticas pedagógicas bilingues e pelo recurso aos materiais didácticos conforme mostram os
registos (1, 2 e 3) patentes na tabela 10. Confrontando estes posicionamentos críticos dos
professores com os colhidos nas conversas críticas e entrevistas grupais não-estruturadas constatei
as mesmas conclusões. A título de exemplo, no extracto 101, a Prof.a Adhozani vê a relevância das
práticas pedagógicas de translanguaging e dos materiais didácticos no ensino-aprendizagem a partir
das suas experiências pedagógicas como professora na TC. Os seus alunos encaravam sérias
dificuldades para participar, interagir activa e flexivelmente nas aulas bem como compreender os
conteúdos pois, tinham o desafio de por um lado compreender a L2 usada como meio de instrução
e por outro lado, conceptualizar e compreender os conteúdos da ciência. Este duplo desafio
constituía uma barreira linguística-pedagógica que inviabilizava a facilitação do ensino-
aprendizagem tanto da parte dos professores como da parte dos alunos.

Extracto 101: Prof. Adhozani (EPC de Mikhokhweni)


24. Invest. vocês acham ideal que esta proposta seja usada para as classes de 4ª, pelo menos para ciências
naturais?
Prof.a Adhozani usar as duas línguas neste caso
25. Invest. e material didáctico local e conhecimentos locais?
26. Prof.a Adhozani creio que deve-se apostar mesmo nisso. é muito importante
27. Invest. uwula lezvo hi kuyini mugondzisi? (porquê diz isso professora?)
28. Prof.a Adhozani ndziwula lezvi hi xiperiyensiya própria ndziyiwonaku pelo menos na sala ya mina hiku loko ndzowulawula
cilungu lomuya saleni, hi mina ndzoce. ndzitawulawula ndzitlhela ndzitihlamula hi ndzoce (diga isso com base na minha
própria experiência na TC pois se falo em português na aula, não motivarei os alunos a participar e a
interagir. irei perguntar-me e depois responder-me a mim mesma). pior senão tiver o material didáctico.
cilungu (português) é novidade, a matéria é novidade pelo menos se eu tiver material didáctico (...) por mim
eu acho importante, eu acho que ser mesmo importante continuarmos com esta modalidade

O posicionamento da Prof.a Adhozani considera imprescindível que o ensino-aprendizagem nas


classes pós-transição seja desenvolvido nos moldes da abordagem em estudo porque, segundo as
suas análises, o ensino em L2 perpetua as aulas expositivas, passivas, centradas no/a professor/a
que faz as perguntas e as responde uma vez que os alunos não as entendem e/ou não as conseguem
responder em L2 senão em L1 proibida, evitada e portanto, não liberalizada.
As práticas pedagógicas de translanguaging assim como o material didáctico atraem os alunos aos
conteúdos e contribuem para a sua compreensão, conforme mostra o extracto 102 referente ao
posicionamento da Prof.a Gerani.

262
Extracto 102: Prof.a Gerani (EPC de Mikhokhweni)
1. Prof.a Gerani bem eu não tenho muita coisa a falar. só secundar a ideia dela. realmente, o uso das duas
línguas assim como o material didáctico puxa o aluno para conseguir se inteirar nos conteúdos. porque eu
lembro-me no ano passado, numa aula que eu estava a dar ali, não ideia do tema
2. Invest. daquelas que fazíamos juntos?
3. Prof.a Gerani sim, mas que mandei um aluno aí para comprar gelinho
4. Invest. recordo-me
5. Prof.a Gerani pelo menos eu consegui naquele momento ai, epa (...)
6. Invest. estávamos a falar de estados
7. Prof.a Gerani ya acho que eram estados físicos da água. i::: foi quando descobri que pelo menos com material
didáctico a criança fica mais esperta
8. Invest. e então professores, usando duas línguas e materiais didácticos, vocês acham que, vocês
conseguem ensinar melhor, é fácil o trabalho?
9. Prof.a Gerani é fácil sim porque aquela é uma forma de concretizar a aula e o aluno também estar aí a saber
loko uku por exemplo hiwulawula hi (...) (se disser por exemplo estamos a falar de) animais domésticos, trazer aí
uma imagem aí de um animal, atazvitiva zvaku (saberá que) animal doméstico e animal selvagem hi leci, leci
hicifuyaku i huku, leci citshamaku kwatini hi leciya. loko wozvikota kuzvi improvisara (é isto, o que domesticamos é a
galinha, o que vive na selva é isto. se puder improvisar) a aluno fica mais activo e participa. para dizer que é
muito importante

O posicionamento da Prof.a Gerani é consubstanciado pela reflexão das suas experiências


pedagógicas como professora da TC da I fase de pesquisa. Ela concorda que as práticas
pedagógicas de translanguaging e o material didáctico contribuem para a concretização da aula, isto
é “puxa o aluno para conseguir se inteirar nos conteúdos” (29). Nestes termos, ela concluiu que
esta proposta é pedagogicamente importante porque facilita o ensino-aprendizagem e ademais,
torna a aula mais concreta.
No seguimento do processo de validação dos resultados desta pesquisa, o extracto 103, evidencia
o posicionamento integral Prof. Vinichi sobre a real dimensão pedagógica da proposta em pesquisa
que vai mais além da facilitação do ensino-aprendizagem.

Extracto 103: Prof. Vinichi (EPC de Mikhokhweni)


44. Prof. Vinichi os vídeos já dizem quase tudo. o primeiro vídeo, neste caso (...) mostra que há problemas de
comunicação entre o prof. e os alunos. há uma barreira que é causada pela língua
45. (...)
46. Prof. Vinichi ehe::: então o prof. ai vai falando sozinho e chegava às conclusões sozinho e prontos ((risos))
47. Prof.a Adhozani atiwotisa atlhela atihlamula (questiona-se e responde-se)
48. Prof. Vinichi atlhela atihlamula, então orindzela kuyiba simbi basi atahuma aya recreio, basi atawulawula aku até
amanhã (responde às suas perguntas e então espera pelo toque do sino para ir ao recreio e ao retornar a aula
dirá até amanhã)
49. ((Risos))
50. Prof. Vinichi quanto as outras aulas, mostraram de que ehhh evidências de que há uma interacção, há uma
facilidade de aprendizagem tanto o aluno interage, o prof. tem também numa facilidade de comunicação. se
tomarmos em conta que o português aparece como uma língua estrangeira, uma língua que mesmo o próprio
prof. pode até ter algumas dificuldades porque é uma língua estrangeira, a oferta em si. então essa forma de
dar as duas língua si::: ya mostra mesmo que há um benefício, há um benefício. é o que alias fazemos lá só
que não temos uma liberdade tal, o prof. é autónomo mas tem algumas limitações. tem que fazer, quando
encontra um encrave por exemplo, ai volta a recorrer na língua, ensina usando a própria língua citshwa nesse

263
caso porque Ciências Naturais (...) as crianças na 4ª ainda não têm maturidade suficiente para uma
abordagem científica em português. então, essa interacção, mistura das línguas dá, dá mesmo para promover

O Prof. Vinichi critica as barreiras de comunicação e interacção em L2 entre o professor e os


alunos nas aulas de TC assim como a centralização do ensino-aprendizagem nos professores “(...)
o prof. ai vai falando sozinho e chegava às conclusões sozinho e prontos” (46), “atiwotisa atlhela
atihlamula” (ele questiona-se e responde-se) (47). Diante desta constatação, o Prof. Vinichi conclui,
ironicamente, que nos ambientes de ensino-aprendizagem em L2, o professor “atlhela atihlamula,
então orindzela kuyiba simbi basi atahuma aya recreio, basi atawulawula aku até amanhã”
(responde às suas perguntas e, então, espera pelo toque do sino para ir ao recreio, retorna à aula,
fala e ao retornar a aula dirá até amanhã” (48). Em outras palavras, o Prof. Vinichi critica a
exposição dos conteúdos na aula sem a devida co-participação interactiva dos alunos devido aos
baixos níveis de proficiência e de competência interaccional em L2 bem como a falta de
oportunidades de facilitação e de compreensão dos conteúdos em L2. Relativamente às TAI´s, o
Prof. Vinichi entende que o ensino em duas línguas promove a interacção, a facilidade de
comunicação e de aprendizagem porque, por um lado, a L2 é uma língua estrangeira e, por outro
lado, os alunos da 4ª classe “(...) ainda não têm maturidade suficiente para uma abordagem
científica em português” (Prof. Vinichi, extracto 102, registo 50).

8.1.2.4 Considerações gerais: delimitação das línguas e aprendizagem da L2

As considerações gerais incluem diferentes pontos de reflexão crítica dos professores em relação à
validade da proposta pedagógica, nomeadamente: aspectos negativos e positivos,comentários,
perguntas, críticas e sugestões. Os professores apresentaram posicionamentos convergentes e
divergentes em uns e em outros pontos relativos à proposta pedagógica em pesquisa. Os professores
convergem no que concernente à viabilidade pedagógica da proposta segundo ilustra a tabela 11.

264
Tabela 11: Posicionamentos convergentes dos professores
Critério e padrão EPC de EPC de Wulombe
de julgamento Mikhokhweni

1. Aula aberta, 1. Liberdade de expressão, criatividade na resolução de


alunos participam problemas, evita a timidez, reacção aos materiais
sem receio, o concretizadores na aula.
conteúdo é 2. Trata-se de uma modalidade de ensino que visa ajudar
elaborado pelas a criança a corresponder de forma positiva na aula.
ambas partes. 3. Que seja uma boa experiência que nos próximos
Considerações tempos possamos usar, dado que, viemos trabalhando
gerais numa outra modalidade que a sua transição começa na 3ª
classe.
4. O ensino é muito vantajoso tanto para o aluno como
para o professor.
5. Esta modalidade irá ajudar muito na criança no
processo de ensino-aprendizagem.
6. Sugeria que esta modalidade seja expandida para
melhorar o processo de ensino-aprendizagem uma vez
que a modalidade que está em vigor não propõe o uso das
línguas.

As visões dos professores validam a viabilidade pedagógica das práticas de translanguaging e as de


collateral learning e cross-cultural border dadas as vantagens, os benefícios pedagógicos que conferem ao
ensino-aprendizagem nas classes de pós-transição (vide os registos 2 e 3). Os alunos superam a
timidez, os receios e expressam-se de forma aberta e criativa na aprendizagem (registo 1 de ambas
EPC´s). A avaliação dos professores conclui que esta proposta é viável dado o seu impacto na
melhoria da crise pedagógica do processo de ensino-aprendizagem centrado na L2 e que, por isso,
sugerem que seja expandida pelas demais EPC´s (vide os registos 3 e 6).
Na esteira dos posicionamentos a favor da validação da proposta em pesquisa, na tabela 12, os os
professores reflectiram sobre a “delimitação das línguas e a aprendizagem da L2” e questionaram
a viabilidade da proposta na garantia do aproveitamento dos alunos no exame da 5ª classe a ser
realizado em L2.

265
Tabela 12: Posicionamentos divergentes dos professores
Critério e padrão EPC Mikhokhweni EPC de Wulombe
de julgamento
1. Como será feito a avaliação da assimilação da 1. Será que esta criança
matéria na forma de escrita? O professor irá usar terá domínio da língua
as duas línguas? Que língua (s) os alunosirão usar portuguesa até ao fim do
nas respostas? ciclo?
Considerações 2. Na abordagem do conteúdo podia-se sim usar as 2. O mesmo aluno estará
gerais duas línguas mas com uma certa delimitação para em pé de igualdade com
não se resulte num crioulo. o do monolingue de
modo a enfrentar o
mesmo exame nesta
modalidade de ensino?

Em relação à delimitação das línguas, alguns professores não concordavam com o uso arbitrário
da L1 como um repertório linguístico concorrente da L2 sobretudo nas construções frásicas e ou
enunciados discursivos bilingues conforme mostra o extracto 104.

Extracto 104: Prof. Vinichi (EPC de Mikhokhweni)


(...) o que eu pude perceber é que os professores precisarão de uma capacitação, porque começava uma frase
me português em que não termina uma frase em português depois vai meter uma palavra em copi numa
única construção. começou em português. é um discurso que começa em português mas vai terminar numa
outra língua. não é um discurso completo. então a sugestão é que quando se começa um enunciado em língua
portuguesa que que termine em língua portuguesa. mas bem é difícil numa interacção com os alunos ah::
então o que queria dizer é que a mistura sim mas é preciso algumas barreiras. se começou em citshwa pelo
menos terminar em citshwa a frase completa. é sugestão. colocar umas pequenas balizas só que é difícil numa
interacção

O posicionamento do Prof. Vinichi no extracto 104 sugere que os discursos de sala de aulas podem
ser bilingues, porém os enunciados e ou as construções frásicas orais não devem congregar duas
línguas (enunciados de translanguaging), mas sim, uma ou outra língua, ainda que admite ser uma
prática difícil de controlar. Nos mesmos termos, a Prof.a Gerani critica as construções frásicas
bilingues e sugere que as frases sejam ou em L2 ou em L1.
No seguimento das críticas sobre a delimitação das línguas, a Prof.a Adhozani, no extracto 105,
propõe que as línguas sejam usadas com delimitações ou fronteiras ou etapas da aula conforme
prevê o método prever-rever14, pois o uso liberalizado do citshwa, L1, poderá deformar os alunos
e criar barreiras para o uso e a aprendizagem do português, L2.

14De acordo com o INDE/MINED (2003a), o método prever-rever prevê o uso de duas línguas (L1 e L2) na mesma
aula, porém separadas uma da outra em três momentos da aula de Ciências Naturais, Matemática e Ciências Sociais

266
Extracto 105: Prof.a Adhozani (EPC de Mikhokhweni)
(...) para mina yoleyo ya prever-rever yinene hiku loko utinyiketela kwaleniya ka citshwa basi ou muita das vezes hiya
kwaleniya, kutaku kutlela kwhatsi a n´wanana alemala kwaleniya. já leyi ya prever rever hi mawonela ya mina ndziwayiwona
kwhatsi yinene. ((...) em minha opinião o método prever-rever é ideal porque se fomentar demasiadamente o
citshwa na aula ou recorrê-lo constantemente vai parecer que estamos a deformar o aluno. por isso, o método
prever-rever acho que ser ideal no ensino-aprendizagem)

A Prof.a Gerani concordou com a separação das línguas através do controlo dos espaços de
intervenção do Citshwa (L1) uma vez que a considera como deformadora dos professores e dos
alunos, conforme mostra o extracto 106.

Extracto 106: Prof.a Gerani (EPC de Mikhokhweni)


57. (...) mugondzisi wa kona loko wotinyiketela hi ntamu nguvhu seno ka citshwa seno, watlhela utshama deformado. já loko
utana uyivanyana seno ka cilungu seno utachelanyana ((...) se o professor incentivar mais para o uso do citshwa poderá
deformar-se. entretanto se, por um lado roubar um pouco o português e meter também um pouco de citshwa)
fazer aquela mistura você também como pessoa não fica muito desactualizado. sim porque a bilingue loko
hingayiwoni kwhatsi (se não nos precavemos) de 1ª até a 3ª apesar de que eu ainda não tenho ya deformara nyana
kutsongwana phela (deforma um pouco)
58. (...) hi kutata nguvhu citshwa hikusa lahaya ndzingawula zvaku i citshwa hicona cinga bazi tá ver, já lahaya loko
kwahikwasikana mesmo há possibilidade mesmo yaku ugena lahaya, nawuyagena laha a vanana avangatakuma
dificuldade loko vacikela ka 4ª. (se encher itshwa uma vez que esta língua é a base e havendo possibilidade de usar
um pouco de cada língua, os alunos não teriam as dificuldades ao transitar para a 4ª classe)

A sugestão da Prof.a Gerani patente no extracto 106, propõe que as línguas devem ser usadas
através de práticas discursivas bilingues equilibradas nas aulas, isto é, “roubar um pouco de
português (L2) e meter também um pouco de citshwa (L1), fazer aquela mistura” sem encher
demasiadamente a L1. No extracto 107, o Prof. Vinichi concorda com as práticas discursivas
bilingues equilibradas sugeridas pela Prof.a Gerani como forma de garantir o desenvolvimento das
competências em ambas línguas, no entanto, quando os alunos demonstrarem competências
linguísticas em L2, o Prof. Vinichi propõe que os professores definam regras de delimitação entre
as línguas.

nas classes de pós-transição: (prever em L1) – discussão sobre os conceitos, perguntas prognósticas, revisão da aula;
(ensinar em L2) – leccionação da aula em L2 e (rever em L1) – avaliação da aula.

267
Extracto 107: Prof. Vinichi (EPC de Mikhokhweni)
55. (...) zvachukwata kusimama nahipatsanisela, hipatsanisela já loko utazviwona ku a::: vanana va mina já a::: he:: vahatla
– avahana maproblema ha::: pode já wazviwona zvaku akahana munhu anga ni madificuldade, vazvizva kwatshi ahhh (...)
já vacizwa kwhatsi ciputukezi pode já u kutsongwani kutsongwani uveka mimbinganyu mas ahi mimbinganyu yotlhela uteka
cibobo. (acho ser relevante que usemos as práticas pedagógicas bilingues, mas quando constatarmos que os
meus alunos já não demonstram problemas, vejo que não há nenhum que tem dificuldades linguísticos,
quando entendem bem (...) entendem bem o português pode-se gradualmente definir fronteiras mas não são
fronteiras para palmatoriar a quem as despespeite)
56. ((Risos))
57. (...) mimbinganu havoce vatayizwa zwaku haaa… mimbinganu já leyi, vatacica havoce. Nazvizva kuveka mihawu (...)
hina higondzisaku lomuya hazvizva zvaku eee… tawuya. (...) zvibom lezvi utaku ni gondzo leyi hiku zvinyingi zvitocica . ((...)
os alunos compreenderão o valor das fronteiras de modo que irão respeitá-las sem que sejam regras rígidas
pois, nós leccionámos e sentimos que há muitas dificuldades de aprendizagem por causa das regras
rigidamente definidas. é delouvar esta pesquisa porque há muitos aspectos que devem ser reformados)

Analisando este extracto, compreende-se que o posicionamento do Prof. Vinichi sugere que as
práticas discursivas bilingues devem servir de estratégias recursivas para melhorar as dificuldades
linguísticas e de aprendizagem dos alunos em L2 durante um certo período de tempo. A ideia
básica vigente no seu posicionamento aponta que as práticas discursivas bilingues devem permitir
que os alunos sejam linguisticamente autónomos em L2 nas aulas leccionadas em L2. Alcançada
a autonomia em L2, os professores podem propor algumas regras de separação das línguas.
A análise da Prof.a Ayenda no extracto 108 é, por um lado, contrária aos posicionamentos e visões
das Prof.as Adhonazi, Girani e do Prof. Vinichi e, por outro lado, responde a alguns
posicionamentos registados na tabela 11.

Extracto 108: Prof.a Ayenda (EPC de Wulombe)


(...) eu penso que a criança estará habilitada a falar português, afinal de contas nós não estamos para deixar
o português de lado. nós vamos continuar a dar o português mas vamos misturar as duas línguas no sentido
de a criança perceber as coisas na sua língua e ao mesmo tempo traduzir para o português. (...) então, a
criança vai mentalizar e não vai esquecer aquela frase que já pronunciamos na língua e não vai esquecer em
português. vai já ter noção daquilo que está a tirar da língua para o português. então tanto para o exame,
penso que o exame poderá também enfrentar talvez o que eu vejo poderia a criança ter algumas dificuldades
de interpretar porque ai no exame nem sempre o prof. estará sempre para explicar nas duas línguas é onde
poderá ter algumas dificuldades mas uma criança bem preparada na 3ª, 4ª e 5ª classe ou desde a 1ª acho que
pode enfrentar o exame na língua portuguesa

À luz do extracto 108, o posicionamento da Prof.a Ayenda defende que as práticas pedagógicas
desta pesquisa habilitarão os alunos a aprenderem o português (L2) e as coisas (conteúdos da
ciência) a partir de práticas pedagógicas e discursivas bilingues. Assim, ela antevê que os alunos

268
estarão preparados para fazer o exame em português desde que estas práticas esteja fortemente
iniciadas nas classes anteriores, isto é, a partir da 3ª classe ou antes (1ª classe). Concluindo, a Prof.a
Ayenda posiciona-se com base na ideia de que, à medida que os alunos compreenderão a ciência
em português e em citshwa, desenvolverão a proficiência linguística bilingue (incluindo as
biliteracia) e os conteúdos académicos em duas línguas e estarão habilitados para enfrentar o
exame da 5ª classe em português.

8.1.3 “Aprendemos sim e daqui em diante o que nos espera?”

As sessões de validação dos resultados da pesquisa transcenderam para além da a analise e reflexão
sobre a viabilidade e a validade da proposta pedagógica centrada nas práticas pedagógicas de
translanguaging e nas práticas pedagógicas de collateral learning e cross-cultural border. As evidências e os
resultados finais alcançados pela pesquisa suscitaram ocasiões de profunda análise e reflexão dos
professores sobre os problemas pedagógicos relacionados com a transição e do ensino-
aprendizagem em L2. A título de exemplo, os professores mostraram-se desassossegados,
inconformados, preocupados, apáticos e, acima tudo, críticos em relação à falta de participação e
de interacção professor – alunos e vice-versa nos ambientes de ensino – aprendizagem em L2. Ao
confrontarem-se com as evidências e os resultados desta proposta pedagógica, os professores
validaram-na por considerá-la linguística, cultural e pedagogicamente viável. Nas sub-secções a
seguir, descreverei algumas análises e reflexões dos professores sobre a apropriação e aplicação da
proposta pedagógica nas classes de pós-transição como também em algumas classes antes da
transição.

8.1.3.1 “Antes dávamos aulas mas agora construímos o conhecimento”

A avaliação da maioria dos professores comungava da opinião de que a proposta pedagógica desta
pesquisa devia ser implementada como uma abordagem específica para as classes de pós-transição
dadas as suas vantagens linguísticas e pedagógicas no ensino-aprendizagem. É neste contexto que
o Prof. Azumbani, no extracto 109, conclui que esta proposta possui uma grande valor pedagógico
para os alunos bem como para as práticas pedagógicas dos professores.

269
Extracto 109: Prof. Azumbani (EPC de Citimela)
(...) para mim as palavras também são essas de agradecer a oportunidade ehhh, é claro que está a fazer um
projecto mas para nós estávamos a aprender. há muita coisa nova, outras coisas que fazíamos por vezes na
inocência por exemplo roubávamos por vezes usar a língua local como recurso uma e outra vez mais sem
planificar que aqui quero usar de forma didáctica. então esta pesquisa de certa maneira veio nos despertar
em como usar estas línguas de forma didáctica, de forma pedagógica eh não só, aprendemos muito e muito
que até descobrimos que os nossos alunos com esta pesquisa passaram a nos entender, passamos a comunicar
com os nossos alunos, saímos da aulas e passámos a criar o conhecimento porque na verdade o que acontecia
antes eram aulas, dávamos aulas, mas não construíamos o conhecimento. dávamos aulas porque
planificávamos e prontos a aula aconteceu nem mas assim como construção de um conhecimento que partia
das experiências, do conteúdo local das crianças isso não acontecia. (...) eu aprendi muita coisa que garanto
que isso não vai morrer por aqui (...)

No extracto 109, o Prof. Azumbani destaca que a nova proposta pedagógica possibilitou a viragem
de ambientes de ensino-aprendizagem passivo caracterizado pelo que denomina por “dar aulas”
para ambientes de ensino-aprendizagem participativo e interactivo “aprendemos muito e muito
que até descobrimos que os nossos alunos com esta pesquisa passaram a nos entender, passamos a
comunicar com os nossos alunos” na qual as línguas e os fundos de conhecimentos contribuíam
para “construir o conhecimento que partia das experiências, do conteúdo local das crianças”.
No extracto 110, o Prof. Vinichi teceu as últimas palavras em relação aos resultados da pesquisa,
referindo que estes romperam com a pedagogia de separação e de fronteira de línguas prescrita
nos programas de ensino. A partir desta pesquisa os professores adoptaram novas práticas
pedagógicas com vista a melhorar o ensino-aprendizagem e jamais reclamarão por causa dos
problemas linguísticos – pedagógicos causados pela transição para a L2.

Extracto 110: Prof. Vinichi (EPC de Citimela)


(...) hinawu hikona kutatisela kub´onga lezvi hingatshama laha, hizvi hizviwona ku kasi akugondzisa, atidlela ta magondzisela
tinyingi tola kusechiwa tisa tikumiwa atindlela ta kufambisa tiru wa hina. Ohhh… hina hivakonsumidori (...) zvikona zvitaku
kwaleniya minayu (...) se kulaveka hilandza ma método lawaya mangab´oholelwa ka zvibhukwana “tirani hi lezvi, tirani hi
lezvi”, mas hazviwona ku akutshika ka lezvi vangetirani hi zvona zvikona zvin´wanyani zva zvinene zvokala zvingese phululiwa
já pelo menos hasuka lomu ka wukhumu gaku zvikona zva zvinene, hizviwonile zvona, já hivhulekile, ((risos)) hingatatshama
basi nahiku “ehhh”
((...) temos muito a agradecer por termos sentado aqui, vimos que afinal de contas há várias estratégias de
ensino, contudo precisam de ser investigadas para melhorar o nosso trabalho. ohhh nós somos consumidores
(...) nós só cumprimos as regras dos superiores (...) é necessário seguir os métodos que foram prescritos nos
programa de ensino “trabalhem assim e assim”, mas vemos que para além dos métodos que nos obrigam a
usar, há outros melhores que ainda não foram avaliados. por isso, saímos da escuridão, estamos iluminados,
pois vimos boas práticas, já estamos abertos ((risos)) jamais iremos reclamar)

Conforme o extracto 110, o Prof. Vinichi conclui que a pesquisa abriu-lhe novos horizontes
pedagógicos e iluminou-lhes na escuridão “hasuka lomu ka wukhumu gaku zvikona zva zvinene,
hizviwonile zvona, já hivhulekile (...)” (saímos da escuridão, estamos iluminados, pois aprendemos

270
boas práticas, já estamos abertos (...)). Aos posicionamentos finais dos Prof. s Azumbani e Vinichi
juntam-se os dos demais professores que evidenciaram e validaram a viabilidade desta pesquisa
conforme debruçarei na sub-secção (8.1.3.2).

8.1.3.2 “E agora, como nos deixa?”

No fim da sessão de avaliação crítica e de validação da pesquisa, vários professores posicionaram-


se a favor da adopção e da implementação da nova abordagem pedagógica, conforme mostram os
extractos 111 a 115, que passo a citar a seguir.

Extracto 111: Prof.a Girisa (EPC de Wulombe)


(...) bem eu acho que sim que é um projecto que se pode implementar (...)

Extracto 112: Prof.a Nathumani (EPC de Citimela)


eu das aulas que decorreram aqui, foram boas aulas, (...) conseguiram alcançar os objectivos. já (0.3) ani
nicilava kukhani tisimama basi tonatiwa ta malingwa ya amambidi yawa basi. tinasimami tiya masoni. (queria dizer esta
proposta de duas línguas siga a diante. que siga a diante)

Extracto 113: Prof. Anato (EPC de Ruwani)


para mim contra factos não há argumentos. nós estamos satisfeitos com os vídeos. os vídeos trazem as
realidades daquilo que é a nossa pesquisa. loko kuhi ni vaseketeli, hakholwa zvaku hingaengisiwa só já ahi parte ya hina
leyi yaku epa hitaplementera. (se tivéssemos apoiantes, temos a certeza de que seriamos ouvidos, contudo essa não
é da nossa parte, pois, a nossa é: vamos implementar)

Extracto 114: Prof. Itwani (EPC de Ruwani)

a ka cilungu ni ka kupatsa a tirimi timbiri, a reacção ka parte ka vanana hiwonikili zvaku hi yihi. já a partir daí, hina hasekeleka
zvaku loko kuwahi ni matimba mesmo, podia hi implementariwa. (ensinar em português e ensinar em práticas bilingues,
vimos qual é que satisfaz a reacção dos alunos. já a partir daí, concordámos que se houver interesse esta
proposta devia ser implementada)

Extracto 115: Prof. Vinichi (EPC de Mikhokhweni)

(...) hina higondzisaku lomuya hazvizva zvaku eee… tawuya (...) zvibom lezvi utaku ni gondzo leyi hiku zvinyingi zvitocica.
((...) nós que ensinamos sentimos muitas dificuldades (...) o que esta pesquisa traz é muito bom porque há
muito que vai mudar)

Os posicionamentos do Prof. Zemba no extracto 116 questiona sobre o futuro das práticas e
experiências pedagógicas aprendidas, enraizados e normalizados como cultura pedagógica entre
os alunos das TAI de Citimela uma vez que a pesquisa chegara ao fim.

271
Extracto 116: Prof. Zemba (EPC de Citimela)
(...) queria falar como minhas últimas palavras porque este é um projecto de pesquisa que incluiu algumas
escolas do distrito e essa maneira de trabalhar nem somos todos que usámos, mas nós somos os poucos que
usámos e gostámos. então daqui em diante, o que é que nós podemos fazer? expandimos? parámos por aqui?
o que está a acontecer, certamente esta maneira de trabalhar não são todos que estão a usar simplesmente as
escolas abrangidas pela pesquisa (...) agora qual é o pensamento, como é que nos deixa?

Como se constata no extracto 116, o Prof. Zemba mostrou-se preocupado com o fim da pesquisa
porque as práticas e experiências pedagógicas da nova proposta de ensino-aprendizagem foram
aderidas pelos professores e pelos alunos, conforme referiu “usámos e gostámos”. Por esta razão,
questionou-me “agora qual é o pensamento, como é que nos deixa?”.
A intervenção do Prof. Azumbani no extracto 117, aparece como uma sugestão à pergunta do
Prof. Zemba, mas ao mesmo tempo, era uma questão igual à formulada pelo Prof. Zemba
conforme ilustra o extracto 117.

Extracto 117: Azumbani (EPC de Citimela)


então nós pedíamos a permissão de continuarmos porque nós gostámos, então achámos que isso nos ajuda,
reduz o sacrifício, o esforço que empreendíamos para fazermos, para concretizar uma aula. então a questão
é morre ou temos a permissão de continuarmos?

À semelhança dos posicionamentos dos professores citados nos extractos 111 a 115, o Prof.
Azumbani comunga da ideia de que a proposta pedagógica em estudo “reduz o sacrifício o esforço
que empreendíamos para fazermos, para concretizar a aula” em L2 razão por isso, questionou-me
se haveria alguma permissão para a sua contínua implementação ou não “morre” com o término
da pesquisa?

272
TERCEIRA PARTE. Discussão e
Conclusões
CAPÍTULO 9. Discussão e conclusões

Introdução

Com esta pesquisa-acção participativa desafiava-me a revitalizar os ambientes participativos e


interactivos dos alunos bilingues emergentes na primeira classe de pós-transição (4ª classe) a partir
da exploração das práticas pedagógicas de translanguaging (García 2009; Creese & Blackledge 2010;
García & Wei 2014) e de ensino-aprendizagem das Ciências Naturais baseadas no collateral learning
(Jegede 1993, 1998, 1999; Jegede & Aikenhead 1999) e cross-cultural border (Aikenhead 1996, 2001b;
Aikenhead & Jegede 1999) após constatar que os alunos encaravam sérias dificuldades de
aprendizagem em L2. No decurso da pré-fase da pesquisa, observei que nas classes antes da
transição (1ª, 2ª e 3ª) leccionadas em L1, os alunos apresentavam elevados níveis de participação e
de interacção do que nas classes de pós-transição (4ª e 5ª), nas quais a L2 é o principal meio de
instrução, não obstante a L1 ser um meio auxiliar. Nestas classes, os alunos manifestavam
estratégias de participação e de interacção passivas e caracterizadas, substancialmente, pelo
silêncio às perguntas dos professores (IRF), murmúrio de alguns alunos, uso de voz baixa, repetição
de respostas individuais e coro. Diante destes fenómenos decorrentes de baixos níveis de
proficiência e de competência linguística e interaccional em L2, uma vez que os alunos são
bilingues emergentes (García et al. 2008; García & Kleifgen 2018) os professores envidavam
esforços linguísticos através da “pedagogia de persistência e de insistência”, adoptavam estratégias
que promovessem no mínimo o progresso da aula através da participação e a interacção passiva e
disfarçada dos alunos (coro, repetição e respostas fechadas sim/não).
À luz da teoria da educação anti-colonial, patente no capítulo 2, esta pesquisa propõe a restituição
da dignidade pedagógica, cultural e linguística africana através da inclusão dos conhecimentos e
nas línguas indígenas no ensino-aprendizagem da ciência como forma de lutar contra a neo-
colonialismo promovido com base no universalização da ciência ocidental “científica” e do
fomento das línguas ocidentais nos programas de ensino dos países africanos (Dei & Asgharzadeh
2001; Dei 2002). A ideia central desta pesquisa é reconquistar os espaços de actuação das
realidades socioculturais e linguística dos alunos na construção dos conhecimentos científicos por
forma a proporcionar o progresso académico e cognitivo dos alunos (Ogunniyi 2005; Shizha 2005,
2010a e 2014). O ensino da ciência nos contextos pós-coloniais africanos, os conhecimentos e as

275
línguas ocidentais silenciam os conhecimentos, as realidades, o pensamento, as culturais e as
línguas africanas dominados pelos alunos por considera-los ilógicos e incapazes de cosntruir um
pensamento racional (Shizha 2005; Dei 2010). Porém, o ensino da ciência e da tecnologia
dependem do meio sociocultural e das línguas indígenas locais (Ogunniyi 2005; Dei 2010). Esta
pesquisa corrobora com a educação anti-colonial baseada na sensibilidade cultural e linguística
africana. Com efeito, ela preconiza que o ensino-aprendizagem da ciência devia ser desenvolvido
através das pontes entre as línguas (ocidentais vs africanas) e das transições entre os sistemas de
conhecimentos (fundos de conhecimentos socioculturais e os conhecimentos universais) (Dei &
Asgharzadeh 2001; Shizha 2005).
Com a adopção da teoria pedagógica de translanguaging e as collateral learning e de cross-cultural border
nesta pesquisa-acção participativa procurava, à luz da teoria da educação anti-colonial,
descolonizar as fronteiras linguísticas e os saberes demarcados pelo currículo de educação bilingue
através da valorização e promoção de duas línguas (L1 e a L2), formando um único repertório
discursivo (translanguaging) e de dois sistemas de conhecimentos (fundos de conhecimentos
socioculturais locais e os conhecimentos universais) que constituem cosmovisões, perspectivas para
compreender a ciência (collateral learning e cross-cultural border) cujos resultados os apresentei nos
capítulos 5, 6, 7 e 8.
Os resultados do capítulo 5 mostram que as práticas discursivas de translanguaging ocasional e
planificado e o recurso aos exemplos e ou realidades socioculturais locais nas aulas, ocorre uma
motivação dos alunos em participar e interagir na construção dos conhecimentos inerentes a aula.
No capítulo 6, os alunos os alunos adaptam-se às práticas discursivas e pedagógicas de
translanguaging e as de collateral learning e cross-cultural border representados através dos fundos de
conhecimentos socioculturais no ensino-aprendizagem dos conteúdos da ciência. As atitudes dos
alunos são caracterizadas pelos altos níveis de participação e de interacção na construção do
conhecimento através do voluntarismo espontâneo, competitivo e colaborativo. As aulas tornam-
se mais flexíveis e dinâmicas. Em continuação, os resultados do capítulo 7 ilustram a normalização
das práticas pedagógicas e discursivas de translanguaging e as de collateral learning e cross-cultural border
como uma única proposta pedagógica que se adequa aos alunos bilingues emergentes, pois
permite-lhes aprender qualquer conteúdo da ciência através de ambientes participativos e
interactivos e recorrendo aos fundos de conhecimentos para explicar os fenómenos da ciência. Por
fim, os resultados do capítulo 8 ilustram os posicionamentos dos professores nos processos de

276
validação interna e externa da pesquisa através dos seus resultados finais da pesquisa.
Resumidamente, todos os professores validaram criticamente os resultados da pesquisa e
concluiram que a proposta pedagógica em pesquisa é válida e viável para o ensino-aprendizagem
nas classes de pós-transição (4ª e 5ª classes) porque motiva a participação e a interacção dos alunos
nos propósitos de construção da aula, superando os ambientes passivos e disfarcantes que
caracterizavam o ensino-aprendizagem em L2 e os alunos aprendem de forma flexível e dinâmica
as duas línguas e os dois sistemas de conhecimentos.
Ao realizar esta pesquisa visava responder às seguintes perguntas:

1. Pergunta 1: Como influenciar os alunos bilingues emergentes a revitalizarem os ambientes


participativos e interactivos no ensino de Ciências Naturais através da promoção de
práticas pedagógicas de translanguaging e as de collateral learning e cross-cultural border?

2. Pergunta 2: Como facilitar e melhorar o ensino-aprendizagem de Ciências Naturais através


de ambientes participativos e interactivos suscitados pelas práticas pedagógicas de
translanguaging e as de collateral learning e cross-cultural border?

3. Pergunta 3: Como impulsionar a flexibilidade e o dinamismo dos alunos bilingues


emergentes no ensino-aprendizagem a partir práticas pedagógicas de translanguaging e as de
collateral learning e cross-cultural border?

A sensibilidade do problema da participação e de interacção dos alunos nas classes de pós-transição


motivou-me, metodologicamente, a optar pela realização de uma pesquisa-acção participativa com
o objectivo de envolver a co-participação dos professores na pesquisa de uma proposta de solução
pedagógica. Nestes termos, participaram nesta pesquisa três grupos de professores oriundos de três
EPC´s que seleccionei para a pesquisa (EPC´s de Acção Inovadora; EPC de Controle e EPC de
Crítica e Validação) e três turmas de pesquisa (duas TAI´s e uma TC) durante duas fases distintas
(I fase - pesquisa preliminar e II fase - pesquisa de validação).
Os resultados que descrevi nos capítulos da II parte deste trabalho, evidenciam novos paradigmas
sobre a participação e a interacção dos alunos bilingues emergentes bem como a flexibilidade e o
dinamismo do ensino-aprendizagem com consequência do fomento das práticas pedagógicas e

277
discursivas de translanguaging e da incorporação dos fundos de conhecimentos socioculturais locais
através das pedagogias de collateral learning e cross-cultural border. Estes resultados abrem novas
perspectivas pedagógicas discutíveis à luz do marco teórico, da literatura citada, das perguntas
formuladas e da hipótese desta pesquisa.
No capítulo 9, proponho-me a discutir os resultados alcançados nos capítulos da II parte, a
apresentar as implicações práticas e pedagógicas aprendidas, propor algumas recomendações e,
por fim, lavrar as conclusões da pesquisa.

9.1 Discussão dos resultados

Em resposta a cada uma das perguntas da pesquisa, identifiquei determinados resultados que mais
do que responder às questões acima, também respondem aos objectivos pelos quais desenvolvi esta
pesquisa-acção participativa. Em primeiro lugar discutirei os resultados que respondem à pergunta
1, seguindo a pergunta 2 e por fim a pergunta 3.

9.1.1 Pergunta 1

Pergunta 1: Como influenciar os alunos bilingues emergentes a revitalizarem os ambientes


participativos e interactivos no ensino de Ciências Naturais através da promoção de práticas
pedagógicas de translanguaging e as de collateral learning e cross-cultural border?

A discussão sobre a pergunta 1 restringir-se-á aos resultados relacionados com a revitalização dos
ambientes participativos e interactivos em consequência, em primeiro lugar, das práticas
pedagógicas de translanguaging e, em segundo lugar, em consequência da sua interligação destas
com as práticas de collateral learning e cross-cultural border no ensino-aprendizagem. Esta discussão
conduzirá a pesquisa a responder simultaneamente aos seguintes objectivos: (i) analisar a
funcionalidade pedagógica do translanguaging como estratégia que impulsiona a participação e a
interacção dos alunos nas aulas e (ii) analisar a impacto pedagógica de collateral learning e de cross-
cultural border como estratégias que facilitam o ensino-aprendizagem de Ciências Naturais.

278
9.1.1.1 A L1 activa a participação dos alunos

As evidências da pesquisa mostraram resultados segundo os quais, o uso excessivo da L2 nas aulas
desencoraja a participação e a interacção dos alunos nas aulas, todavia as poucas ocasiões nas quais
os professores exploram a L1, os alunos reagiam, mostrando a sua disponibilidade em participar
de forma mais activa e aberta na aula. Ora, esta reacção dos alunos desaparecia logo que os
professores retomavam a L2 como língua de instrução. Em outras palavras, a participação dos
alunos estava associada à L1 em detrimento da L2, meio de instrução. Este fenómeno coincide
com os estudos que mostram que a L1 promove a participação e a interacção dos alunos na aula
em L2 (Lisanza 2014), medeia a aprendizagem colaborativa (Antón & DiCamilla 1999), os alunos
interagem com entusiasmo (Martin-Beltrán 2010a, Martin 1999) e são expressivos e divertidos de
tal forma que compreendem facilmente os conceitos científicos dos conteúdos (Prophet & Dow
1994).
Um fenómeno de destaque nesta pesquisa ilustrou que o uso ocasional, limitado e recursivo da L1
como meio auxiliar no ensino em L2, suscitava situações de “oscilação” dos níveis de participação
e de interacção dos alunos. Em outras palavras, quando os professores efectuavam perguntas em
L1, os alunos participavam aberta e activamente em L1, no entanto, quando as formulavam em
L2 como o principal meio de instrução, os alunos retraíam-se, desmotivavam-se, baixavam as caras
e activavam as estratégias de participação passiva e disfarçada, com destaque para o silêncio, o
murmúrio e a fala em voz baixa. Desta forma, a separação das línguas suscitava, coincidentemente,
a separação de oportunidades de participação e de interacção dos alunos que só se observavam,
exclusivamente quando os professores usavam ocasionalmente a L1 e não quando se usava a L2.
Esta análise alinha-se com a visão segunda a qual a língua de instrução é o maior obstáculo que
enfrenta a educação em África (Bamgbose 1991 e 2009; Bunyi 1999; Wolff 2011; Mazrui 1993 e
2002; Brock-Utne & Alidou 2011; Heugh 2011a, 2011b). A dominação das línguas ex-coloniais
(L2) no ensino cria dificuldades académicas para a maioria dos alunos porque não as dominam
(Shizha 2015). Brock-Utne & Alidou (2011) advogam que as L1 e as culturas locais têm um valor
pedagógico na elevação da capacidade de aprendizagem crítica centrada nos alunos.
Ao nível do ensino da ciência Shizha (2015), Dei & Asgharzadeh (2001) sublinham que as L1´s
desempenham um papel imprescindível no ensino-aprendizagem da ciência visto que garantem a
maior participação dos alunos na construção do conhecimento. Nesta óptica, Shizha (2015) conclui
que a dominação das línguas ex-coloniais no ensino da ciência inviabiliza o desenvolvimento das

279
habilidades académicas dos alunos africanos porque que compreendem as línguas de instrução e
ademais, são vedados de aprender nas suas L1.
As conclusões dos autores acima citados comprovam as evidências e os resultados que constatei
nas aulas da TC de Mikhokhweni bem como no ciclo de observação das aulas leccionadas em
exclusivamente em L2 no início da II fase. As atitudes linguísticas-pedagógicas dos alunos
envolvidos nesta pesquisa alertam para o facto de que a L2 não pode ser a única língua de instrução
nas classes de pós-transição. Em outras palavras, os alunos opõem-se à pedagogia de separação, de
fronteiras das línguas no ensino-aprendizagem bem como à pedagogia monolingue que valoriza a
maior exposição da L2. Os alunos resistem à dominação pedagógica e linguística em L2
proficientemente sub-desenvolvida, não obstante as estratégias de insistência e de persistência
linguística-pedagógica dos professores nesta língua. As reacções negativas dos alunos nas aulas em
L2 são evidências da resistência contra a marginalização da sua identidade linguística no ensino-
aprendizagem e do fomento não liberalizado e recursivo da L1 inferiorizada pela transição para a
L2 (Dei 2010; Shizha 2005; wa Thion´go 2013).
Nas poucas ocasiões em que a L1 era usada na aula, conseguia-se experimentar e avaliar a
viabilidade da pedagogia bilingue (L2 e L1) na aula. As duas línguas funcionavam como um único
repertório linguístico para e no ensino-aprendizagem. A participação e a interacção dos alunos
ocorriam condicionadas às práticas de translanguaging, isto é, pela plena integração e uso da L1
como mais uma língua paralela à L2. Se a integração e o uso da L1 fossem ocasionais, os alunos
somente participavam e interagiam nessa ocasião em L1 e quando se retornava à L2, os alunos
activavam as estratégias de participação passiva e disfarçada. Com estas atitudes, os alunos exigiam
o que Cleghorn (1992) denomina “ligação e cruzamento de línguas”, um dos princípios para o
ensino no contexto africano, quer dizer, um ensino-aprendizagem centrado nas práticas
pedagógicas bilingues.
Os resultados que aqui discuto mostram quão a transição para a L2 na 4ª classe não é,
pedagogicamente, viável para a promoção de um ensino-aprendizagem construtivo, colaborativo
e participativo. Os alunos são mais activos e construtivos num ensino em L1 e/ou quando se
tomam ambas as línguas como ferramentas do ensino-aprendizagem sobretudo nas situações em
que os alunos têm baixa proficiência em L2 (Antón & DiCamilla 1999) que é o caso dos alunos
desta pesquisa. Portanto, a participação e a interacção construtiva, dinâmica e activa dos alunos é
somente garantida, ou por um ensino-aprendizagem em L1 liberalizado como potencial meio de

280
instrução, ou por um ensino-aprendizagem baseado nas práticas pedagógicas em duas línguas (L1
e L2), isto é, nas práticas de translanguaging em que as duas línguas inter-relacionam-se e constituem
um único repertório linguístico e discursivo em todo o processo de ensino-aprendizagem. Nestes
termos, as línguas tornam-se ferramentas de mediação, de expansão de oportunidades de
aprendizagem e de construção de conhecimentos bem como recursos disponíveis para encorajar a
comunicação na aula (Arthur 1994; Martin-Beltrán 2010a).

9.1.1.2 Participação nas práticas de translanguaging

A liberalização da L1 e a promoção pedagógicas das práticas discursivas bilingues (translanguaging)


superavam a participação passiva e disfarçada dos alunos num ensino-aprendizagem em L2. Os
resultados desta pesquisa ilustram que os alunos apropriavam-se das práticas discursivas de
translanguaging de tal forma que os seus níveis de predisposição para participar da aula eram
surpreendentemente altos. Os alunos predispunham-se a responder as perguntas efectuadas tanto
em L2 como em L1. A partir destas evidências conclui que as práticas discursivas de translanguaging
eram as mais preferidas pelos alunos do que as práticas pedagógicas de separação das línguas e de
maior exposição da L2 e recurso da L1 como meio auxiliar no processo de ensino-aprendizagem.
Estas análises coincidem em parte com as efectuadas sobre os resultados de algumas pesquisas
citadas na revisão de literatura. A título de exemplo, Poza (2016) concluiu que as práticas
pedagógicas bilingues e flexíveis de translanguaging incentivam o surgimento de espaços e
oportunidades de interacção e de colaboração entre os bilingues emergentes no contexto do
ensino-aprendizagem. Kampittayakul (2017), mostrou que as práticas de translanguaging criam um
ambiente interactivo e, consequentemente, oportunidades de aprendizagem dos alunos. Nesta
mesma linha de análise, Esquinca, Blanca & de la Pedra (2014) sublinharam que, para além das
oportunidades de participação e de flexibilidade do ensino-aprendizagem, as práticas pedagógicas
e discursivas de translanguaging criavam as oportunidades de discussão e de inter-ajuda entre os
alunos no contexto da construção dos conhecimentos.
Os resultados desta pesquisa ilustram que a planificação e exploração das práticas pedagógicas e
discursivas de translanguaging engajavam a participação e a interacção dos alunos nas aulas. Elas
tornavam-se em ferramentas pedagógicas imprescindíveis para promover um ensino-
aprendizagem participativo, interactivo e activo dos bilingues emergentes. Os alunos

281
predispunham-se a participar das aulas. Entretanto, caso os professores usassem excessivamente a
L2 como a língua do discurso na aula, os alunos não mais participavam na aula em nenhuma das
línguas senão quando os professores retomassem ao discurso baseado em L1 e/ou nas duas línguas
como um e único repertório discursivo. Noutras ocasiões, a participação dos alunos activava-se
quando os professores recorriam à reformulação ou re-interpretação das perguntas de L2 para a
L1 e incentivando os alunos a participarem na aula numa ou noutra língua que lhes conviesse.
Com base nestas análises, conclui que o translanguaging não surgia à toa. Ele era dependente da
postura pedagógica dos professores. Em outras palavras, a participação discursiva dos alunos nos
ambientes de translanguaging só era possível quando planificado e promovido pedagogicamente
pelos professores no contexto de ensino-aprendizagem. Assim, o fluxo das práticas pedagógicas e
discursivas de translanguaging e a participação activa dos alunos evidenciam-se sempre que os
professores descentralizavam as aulas para os alunos. Desta forma, os professores criam
oportunidades e/ou espaços que motivavam e encorajavam sobremaneira a participação e de
interacção dos alunos nas aulas e por conseguinte, a flexibilizavam e dinamizavam o processo de
ensino-aprendizagem. Em contrapartida, a participação e a interacção dos alunos tornava-se
passiva e disfarçada sempre que os professores fomentavam as práticas pedagógicas e discursivas
de translanguaging num ensino-aprendizagem pedagogicamente expositivo e centrado nos
professores. Os alunos intervinham através do coro, repetição e das respostas fechadas “sim/não”
induzidos e controlados pelos professores uma vez as suas práticas pedagógicas não concediam
espaços e oportunidades para os alunos participarem aberta e livremente numa ou noutra língua.

9.1.1.3 Super-participação: cruzamento entre o translanguaging e os fundos


de conhecimentos

As práticas discursivas de translanguaging impulsionavam a participação e a interacção dos alunos


bem como flexibilizavam as aulas diferentemente das estratégias de participação passiva e
disfarçada em L2. Estudos de Adler (1998) constataram que a incorporação da L1 no ensino em
L2 e das representações culturais dos alunos cria oportunidades de expressividade informal dos
alunos. Da mesma forma, Andersson, Kagwesage & Rusanganwa (2013) observaram que a
liberalização de múltiplas línguas ocasiona eventos práticos de translanguaging e cenários de
discussão e de interacção dos alunos ao longo da aprendizagem.

282
Os resultados desta pesquisa sublinham três conclusões distintas, a saber: (i) a promoção das
práticas pedagógicas de translanguaging sem a inclusão dos fundos de conhecimentos suscitava a
predisposição dos alunos para participar voluntariamente na aula; (ii) a integração dos fundos de
conhecimentos nas aulas dominadas pelo discurso em L2 despertava a atenção dos alunos, mas
não suscitava a participação voluntária e espontânea de todos os alunos senão de alguns em L2,
numa voz baixa, tímidos, inseguros e cabisbaixos; (iii) o fomento dos fundos de conhecimentos
socioculturais e a liberalização das línguas através de práticas discursivas de translanguaging nas aulas
despertavam altos níveis de motivação e de predisposição dos alunos que espontaneamente se
voluntariavam e competiam uns com os outros para participar na aula.
Quanto mais os professores promoviam a liberalização das línguas através das práticas discursos
de translanguaging e incorporavam os fundos de conhecimentos socioculturaias no ensino-
aprendizagem dos conteúdos da ciência, os alunos co-participavam activamente, expondo os seus
saberes, suas experiências, vivências culturais e quotidianos em L1, seguidos de práticas de
interpretação, tradução ou equivalência linguística L1 para a L2 ou L2 para a L1. Noutras
ocasiões, os alunos participavam em L2 se estivessem seguros e confiantes do que fossem expor. À
medida em que as aulas se iam desenvolvendo, os alunos superavam o silêncio, o murmúrio e as
estratégias de participação passiva e disfarçadas. A partir desta abordagem de ensino-
aprendizagem, os alunos aprendiam não apenas os conteúdos da aula a partir de duas cosmovisões,
mas também a L2 a partir da L1, explorando activamente as práticas de interpretação, tradução
ou equivalência linguística da L1 para a L2 ou da L2 para a L1 permanentemente nas aulas. As
línguas tornavam-se em ferramentas de mediação e objectos de análise num espaço de interacção
bilingue (Mercuri & Ebe 2011), recursos para interagir frontalmente com o professor e para
desenvolver o vocabulário em L2 (Viniti & Subhan 2014) e ferramentas académicas para o
desenvolvimento da consciência metalinguística a partir da análise e da comparação entre as
línguas (Antón & DiCamilla 1999, Martin-Beltrán 2009, Cenoz & Gorter 2015). Nestes moldes, as
línguas desempenhavam um triplo papel, a destacar: (i) meios de instrução e ou intermediação
bilingue e bicultural nas aulasa; (ii) recursos para a aprendizagem da L2 a partir da L1 e (iii)
ferramentas discursivas na sala de aulas. Com base nestes papéis associados às práticas de
translanguaging, os alunos eram participativos, interactivos e colaborativos em ambas as línguas
(Esquinca et al. 2014, Gort & Pontier 2013). Nestes ambientes, os alunos criavam um cenário de
participação competitiva na aula, tinham a oportunidade de interpretar e ou explicar os fenómenos

283
naturais do conteúdo da aula com base nas suas experiências e realidades socioculturais locais;
discutir os aspectos contraditórios que criavam alguma confusão na cosmovisão de alguns alunos
num contexto da aprendizagem colaborativa e construtiva. Os alunos aprendiam os conteúdos das
Ciências Naturais de forma activa, tornando-se agentes responsáveis pela construção da
aprendizagem enquanto os professores desempenhavam a função de mediadores linguísticos e
culturais na aula (construção de novos conhecimentos a partir de duas línguas e duas cosmovisões
de conhecimentos).
Os estudos de Jegede & Okebukola (1991b) comprovaram que no ensino da ciência com base em
duas visões de mundo, os alunos exteriorizam eficientemente as suas atitudes positivas sobre o valor
instrucional dos seus meios socioculturais inclusos no ensino-aprendizagem. Corroborando com
estes autores, evidenciei nesta pesquisa que os fundos de conhecimentos eram conhecimentos
prévios e que ao serem integrados diante dos conhecimentos universais e explorados nas aulas em
paralelo com os conteúdos universais, criavam imensas oportunidades para a participação de
diferentes alunos na aula, expondo-os livremente numa ou outra língua, gerando-se, por
conseguinte, ambientes de discursos participativos e interactivos de translanguaging e e facilidade de
compreensão dos conteúdos.
Os fundos de conhecimentos elevavam excessivamente os níveis de motivação e de predisposição
dos alunos para participar e interagir na aula. Os alunos competiam uns com os outros para
contribuir activa e espontaneamente na construção do conhecimentos a partir da L1 e/ou da L2.
As duas línguas fluíam, os dois sistemas de conhecimentos complementavam-se e as aulas
flexibilizavam-se. Quanto mais as aulas se iam desenvolvendo nesta nova abordagem pedagógica,
os alunos eram cada vez mais super-motivados, mais alegres e mais confortáveis em todas as etapas
das aulas, evidenciando novas formas de ser e de estar jamais evidenciadas nas aulas da 4ª classe
leccionada em L2. O ensino tornava-se acessível, atractivo, dinâmico e compreensível para todos
os alunos, pois transitavam com agilidade de uma visão de fundos de conhecimentos socioculturais
para a visão de conhecimento universal e vice-versa (Aikenhead 2001a, 2002) e expondo
livremente os seus pensamentos, as suas ideias e reflexões tanto em L1 como em L2.

284
9.1.2 Pergunta 2

Como facilitar e melhorar o ensino-aprendizagem de Ciências Naturais através de ambientes


participativos e interactivos suscitados pelas práticas pedagógicas de translanguaging e as de collateral
learning e cross-cultural border?

A discussão sobre a pergunta 2 visa analisar o quão os resultados pedagógicos das práticas de
translanguaging e de collateral learning e cross-cultural border contribuem para a facilitação do
ensino-aprendizagem em resposta ao objectivo (ii) (avaliar a viabilidade do translanguaging, de
collateral learning e de cross-cultural border como proposta pedagógica, linguística e cultural aplicável
no ensino-aprendizagem participativo, interactivo, dinâmico e flexível das Ciências Naturais nas
classes de pós-transição (4ª e 5ª classes)).

9.1.2.1 Aprendizagem construtiva

Os fundos de conhecimentos socioculturais locais e a permanente promoção e a liberalização das


práticas discursivas em ambas as línguas elevam sobremaneira o nível de participação e interacção
dos alunos na construção de conhecimentos na aula. Esta combinação pedagógica mais do que
facilitar a aprendizagem dos conteúdos pelos alunos, suscita um ambiente propício para uma
aprendizagem colaborativa, interactiva e construtiva entre os alunos e os professores.
Os resultados desta pesquisa mostram que a participação dos alunos era mais consciente e
qualitativa pois, por um lado, não tinham limitações ou barreiras linguísticas e discursivas uma vez
que se tinha instituído, liberalizado e normalizado o uso de duas línguas como um único repertório
discursivo nas aulas e, por outro lado, a inclusão dos conhecimentos socioculturais abria espaços
para a descentralização do processo de ensino-aprendizagem. A partir destas práticas e destes
ambientes de sala de aulas, os alunos tinham a facilidade de reflectir sobre os conteúdos que
aprendiam, predispunham-se a discuti-los abertamente uns com os outros e inclusive com os
professores e, ademais, voluntariavam-se espontaneamente para explicar alguns fenómenos dos
conteúdos da aula a partir das suas experiências, suas realidades quotidianas e dos seus meios
socioculturais.
Martin-Beltrán (2014) entende que o translanguaging e os fundos de conhecimentos são mediadores
das actividades cognitivamente complexas e factores que contribuem para elevar os níveis de

285
participação e interacção linguística dos alunos. No contexto desta pesquisa constatei fenómenos
discrepantes à visão da autora. Nos casos em que se abordavam os conteúdos universais cognitiva
e academicamente exigentes, complexos e inacessíveis na cosmovisão e nos fundos de
conhecimentos socioculturais dos alunos, estes baixavam os seus níveis de participação e de
interacção na aula, ficavam em silêncio e concentrados à explanação dos professores. Nestas
situações, a ausência de representatividade entre os conteúdos universais e os fundos de
conhecimentos socioculturais não permitia que houvesse transição e/ou ponte entre os
conhecimentos universais e os fundos de conhecimentos ainda que se promovessem as práticas
pedagógicas e discursivas de translanguaging. Na visão de Jegede 1995, os fundos de conhecimentos
conhecidos pelos alunos não interagiam com os conteúdos da ciência (parallel collateral learning) e por
esta razão, não os alunos não se voluntariavam de forma espontânea e competitiva ainda que os
professores persistissem e insistissem com as mesmas perguntas inúmeras vezes e ou as
reformulassem para e em L1. A incompatibilidade entre os dois sistemas de conhecimentos
constituía uma barreira cultural e pedagógica que só era solucionada através da inclusão dos
exemplos dos contextos socioculturais locais. Esta inclusão, ainda que de fosse breve e/ou
ocasional, reactivava a vontade e a re-participação dos alunos naquele breve momento.
A literatura relativa às abordagens de collateral learning e as de cross-cultural border advoga que o ensino
da ciência depende dos níveis de compatibilidade, harmonia e de complementaridade que se
estabelecem com os ambientes socioculturais dos alunos. Por esta razão, os contextos
socioculturais, exemplos locais, línguas maternas e as tecnologias locais têm uma relevância
pedagógica no ensino da ciência, pois minimizam as incompreensões (Medvitz 1985; Jegede 1995,
1999; Aikenhead 1996, 1997; Cobern & Aikenhead 1999; Aikenhead & Jegede 1999; Jegede &
Aikenhead 1999). A incompatibilidade dos conhecimentos causa choques culturais e um ensino de
memorização e de assimilação da ciência (Aikenhead & Jegede 1999).
Nos casos em que os conteúdos universais eram incompatíveis com as visões socioculturais e ou as
vivências quotidianas dos alunos, os recursos e/ou materiais locais reduziam os níveis de
incompatibilidades, evitavam a mera assimilação descontextualizada dos conteúdos e
surpreendentemente, geravam ambientes de participação e interacção activa dos alunos na
construção do conhecimento apesar dos conteúdos da aula serem desconhecidos e ou distantes dos
seus fundos de conhecimentos socioculturais. Quer isto dizer que, a exposição e a exploração dos
recursos e ou materiais locais na aula possibilitava que os alunos não enfrentassem situações de

286
frustração, desinteresse e desatenção à aula devido à incompatibilidade entre as visões de
conhecimento, mas sim, possibilitava-os que observassem, reflectissem e dessem as suas vozes em
relação aos fenómenos suscitados pelas experiências práticas. Esta evidência materializava por um
lado, as aportações de Jegede (1995, 1999) segundo as quais, o ensino das ciências deve reconhecer
ambientes eco-culturais dos alunos para explicar os fenómenos naturais, princípios e teorias, uma
vez que se evitaria a conversão das visões do mundo indígena a favor das visões consideradas mais
científicas, reduziria os conflitos culturais e cognitivos no ensino e, por outro lado, as visões de
Aikenhead (2006) que propõem que o professor deve tornar-se num “culture broker” que pedagógica,
cultural e linguisticamente negocia as incompatibilidades entre o mundo da ciência e o da cultura
dos alunos através do fomento da comparação das conceptualizações e das epistemologias da
ciência e as da cultura local, alterando as línguas para que os alunos não assimilem passivamente
o conhecimento científico fora das suas visões socioculturais (Aikenhead 1997). Nestes moldes, os
alunos compreenderão facilmente a ciência e exteriorizarão as suas atitudes positivas na instrução
(Jegede & Okebukola 1991a, 1991b).
Analisando as evidências e os resultados desta pesquisa, concluo que, diante de conteúdos
universais ou “estranhos” às visões e/ou aos fundos de conhecimentos socioculturais dos alunos, a
promoção das práticas de translanguaging por si nunca proporcionavam nenhuma possibilidade de
participação e de interacção dinâmica e flexível dos alunos na aula, mas sim, o pacifismo dos alunos
evidenciado através de maior atenção à exposição dos professores, silêncio às perguntas abertas,
alta concentração e por conseguinte, o surgimento da fadiga, desmotivação e do desinteresse dos
alunos pela aula. A única possibilidade conducente à activação dos ambientes participativos e
interactivos dos alunos nas circunstâncias em que os conteúdos universais da aula eram diferentes
dos fundos de conhecimentos socioculturais dos alunos era por via da realização de experiências
práticas sobre os fenómenos dos conteúdos universais, usando os recursos e materiais socioculturais
locais sob observação dos alunos e usando práticas discursivas baseadas no translanguaging como
estratégias comunicativas. Nestas circunstâncias, os alunos observavam e reflectiam sobre os
fenómenos gerados pelas experiências práticas, e facilmente, participavam na aula, respondendo
às perguntas dos professores e interpretando os fenómenos observados na experiência prática. As
práticas discursivas de translanguaging permitiam a intervenção dos alunos numa ou noutra língua
bem como efectuar uma equivalência terminológica entre as palavras em L1 anunciadas durante

287
a observação da experiência e os termos científicos em L2 usados nos conteúdos da aula e patentes
no manual de Ciências Naturais.
Em suma, a aprendizagem construtiva não está condicionada somente à promoção das práticas de
translanguaging no ensino de conteúdos universais ou da ciência, mas sim, à combinação destes com
a inclusão dos conhecimentos socioculturais dos alunos e dos respectivos recursos e materiais locais.
Esta combinação pedagógica permite aos alunos participar activamente na construção do
conhecimento através da observação, comparação, reflexão e auto-descobrimento das lógicas e
essências dos fenómenos naturais bem como através da discussão e interacção colaborativa entre
os alunos e estes com os professores. Às perguntas abertas formuladas pelos professores no âmbito
das aulas, os alunos respondem-nas, usando os seus pontos de vista e suas próprias reflexões e/ou
conclusões em resultado da experiência prática observada. Nestes cenários, os alunos aprendem os
conteúdos da ciência mais cautelosos e mais atenciosos. As suas intervenções eram resultados das
suas profundas reflexões num contexto em que as duas línguas e os dois sistemas de conhecimentos
inter-relacionavam-se, cruzavam-se e complementavam-se.

9.1.2.2 Pontes entre os conhecimentos e entre as línguas

Os alunos movimentavam-se desde as visões de conhecimentos socioculturais às visões de


conhecimentos universais e vice-versa em consequência da pedagogia de cross-cultural border num
ambiente discursivo marcado pela negociação, complementaridade e pela interacção entre as
línguas. A harmonia e/ou a compatibilidade entre as visões de conhecimentos contribuía
imensuravelmente para a super-motivação dos alunos e à elevadíssimos níveis de participação
discursiva e interactiva baseados no translanguaging, gerando a flexibilidade e dinamismo na
aprendizagem. Perante a incompatibilidade entre as visões de conhecimentos, os alunos prestavam
mais atenção à explanação ou experiências de sala de aulas na qual o discurso era o de
translanguaging e, com efeito, no momento da avaliação da aula, os alunos predispunham-se a
participar de forma flexível e dinâmica.
A diferença entre as duas visões de conhecimentos causava baixos níveis de participação dos alunos
na aula e por conseguinte, maior atenção e concentração à explanação dos professores. Alguns
alunos discordavam de certos realidades e informações provenientes dos conhecimentos universais
e outros ainda, exclamavam-se discretamente. Caso a explanação do/a professor/a fosse alongada,

288
em L2 e sem referência aos exemplos das realidades quotidianas, os alunos demonstravam-se
desmotivados, desconcentrados e desinteressados com a aula. Desta forma, os alunos opunham-se
à transmissão dos conhecimentos da ciência exclusivamente numa língua que não lhes possibilitava
interagir na aula e sem nenhuma interligação com as suas realidades e ou conhecimentos
socioculturais. Por conseguinte, os alunos silenciavam-se e mostravam-se confusos, desatentos e
desinteressados pela aula incompreensível devido a três factores interligados: (i) ausência do
discurso em duas línguas; (ii) falta da inclusão dos conhecimentos socioculturais na aula e (iii)
centralização da aula na figura do/a professor/a.
Os estudos de Aikenhead & Jegede (1999), Jegede & Aikenhead (1999) e Aikenhead (2006)
concluem que a facilitação do ensino-aprendizagem é possível se os professores actuarem como
“culture broker” que, imergem na cultura, nos aspectos cognitivos, metacognitivos e emocionais dos
alunos e para adoptarem estratégias activas de ensino-aprendizagem que minimizam os conflitos
culturais entre os conhecimentos ocidentais e os indígenas e evitam que os alunos sofram a
assimilação do conhecimento científico. A promoção das práticas discursivas em duas línguas, a
inclusão dos conhecimentos socioculturais nos universais e a descentralização da aula a favor dos
alunos suscitavam efeitos positivos na cognição dos alunos a avaliar os seus altos níveis de
participação e de interacção dos alunos na construção do conhecimento. Nestes ambientes, os
alunos aprendiam, por um lado, os conteúdos da aula e, por outro lado, aprendiam as línguas
(consciência metalinguística) simultaneamente, uma das características das práticas pedagógicas de
translanguaging (García 2009, García & Wei 2014, García 2014). Além dos discursos de translanguaging
enraizados e normalizados nas aulas, destacavam-se as práticas bilingues de equivalência, tradução
e interpretação de uma língua para outra nas aulas. Inesperadamente, os alunos apresentavam
equivalências lexicais de forma flexível, no entanto, quando se tratassem de equivalências frásicas
de L1 para a L2 e vice-versa, os alunos reflectiam por alguns segundos e a seguir, alguns
voluntariavam-se e expunham, cuidadosamente, as suas propostas de equivalências frásicas. A
partir destas práticas, os alunos aprendiam os conteúdos da aula e simultaneamente aprendiam a
L2 a partir da L1 e vice-versa.
Nas situações de maior exposição da L2, os alunos envidavam esforços cognitivos e linguísticos
para compreender simultaneamente a língua de instrução e os conteúdos das ciências ainda que
os professores, em algumas vezes, recorressem, ligeiramente, a alguns exemplos das realidades

289
socioculturais locais sempre que notabilizassem a desmotivação, o desinteresse e a incompreensão
dos alunos.
Concluindo, a aproximação entre os conhecimentos universais e socioculturais através das práticas
pedagógicas de collateral learning e cross-cultural border e as práticas discursivas de translanguaging
garantiam a compreensão e a construção do conhecimento sobre os fenómenos naturais e
favoreciam a aprendizagem das línguas. Estas práticas garantiam a aprendizagem dos alunos num
ambiente confortável, harmonioso e favorável à participação e à interacção, pois, os
conhecimentos socioculturais, os conteúdos e as línguas constituíam ferramentas pedagógicas e
discursivas num clima de altos níveis de disposição, motivação e abertura à interacção espontânea
e competitiva. Nestas circunstâncias, o ensino-aprendizagem era acessível e compreensível para
todos os alunos a avaliar pelos seus níveis de participação linguística na construção do
conhecimento nas aulas e nas sessões de recapitulação das aulas. Os alunos inter-relacionavam as
realidades, os recursos, as experiências dos seus contextos socioculturais com os conteúdos da
ciência através das duas línguas em diferentes eventos de ensino-aprendizagem, garantiam o
desenvolvimento do seu bilinguismo emergente e dinâmico através de um repertório linguístico no
qual, a L1 operava como língua de apoia ao desenvolvimento da L2 (Lewis et al. 2012) bem como
língua de inclusão dos fundos de conhecimentos socioculturais na aula. A construção dos
conhecimentos académicos através da negociação entre os dois sistemas de conhecimentos
universais num discurso interactivo baseado no translanguaging mais do que desenvolver as duas
línguas, a L1 desenvolvia-se como língua da ciência capaz de expressar as conceptualizações, as
epistemologias e as terminologias científicas apresentadas pelos conteúdos universais em L2.

9.1.2.3 Clima dos alunos no ambiente da aula

O enraizamento e a normalização das práticas pedagógicas linguísticas e culturais no ensino-


aprendizagem das Ciências Naturais revitalizavam os ambientes de participação e de interacção
activa, livre e aberta dos alunos aos moldes das classes antes da transição leccionadas em L1. A
sala de aulas transformou-se num espaço no qual, os alunos reafirmavam as suas capacidades e
habilidades intelectuais participando activa e construtivamente na aprendizagem.
A incorporação das realidades, das experiências e dos conhecimentos socioculturais dos alunos nos
conteúdos universais mais a liberalização das línguas nas aulas, causaram outros fenómenos além

290
dos relacionados com a participação voluntária, espontânea e competitiva. Quanto mais as aulas
avançavam, os alunos afirmavam-se e consolidavam-se como agentes activos e construtores da
aprendizagem, apropriavam e interiorizavam as novas práticas de ensino-aprendizagem ao ponto
de se apresentarem super-motivados, ansiosos, entusiasmados, empolgados, eufóricos e
emocionados (alegres) na: (i) observação de fenómenos naturais realizados através de experiências
práticas na sala de aula; (ii) recapitulação da aula e na (iii) construção e/ou explicação de
fenómenos naturais a partir de visões dos conhecimentos socioculturais. Com base nestes novos
fenómenos, os alunos auto-controlavam a aprendizagem, instituíam e fomentavam uma nova
pedagogia, a pedagogia de aprendizagem divertida essencialmente centrada numa aprendizagem
descontraída, emocional, livre de esforços cognitivos e limitações linguísticas como também
centrada nos próprios alunos. A criação dos ambientes de aprendizagem divertida possibilitava a
intervenção e expressão à vontade e activa de vários alunos, interacção e/ou discussão dos alunos
aos pares ou pequenos grupos e integração de ideias divertidas no contexto do conteúdo da aula.
Esta evidência foi também referida por Stears, Malcolm & Kowlas (2003), ao referirem que, na
resolução de actividades, os alunos divertiam-se, engajavam-se e transitavam sem dificuldades dos
conhecimentos quotidianos para os conhecimentos estruturados pela ciência e vice-versa.
Os alunos voluntariavam-se massivamente e de forma competitiva para enriquecer as aulas,
apresentando para cada pergunta, várias propostas de respostas, ideias e reflexões
fundamentalmente baseadas nos seus fundos de conhecimentos locais e suas reflexões,
diversificando assim as visões de interpretação, de análise e de compreensão dos conteúdos da
ciência. No decurso destes ambientes, os alunos inter-ajudavam-se e incentivavam-se uns com os
outros quando constatassem que alguns voluntários escolhidos para intervir na aula registavam
algumas limitações ou dificuldades nas suas intervenções ou respostas tanto em L2 como em L1.

9.1.3 Pergunta 3

Como impulsionar a flexibilidade e o dinamismo dos alunos bilingues emergentes no ensino-


aprendizagem a partir práticas pedagógicas de translanguaging e as de collateral learning e cross-cultural
border?

291
O ensino-aprendizagem em L2 mais do que promover a participação passiva e disfarçada dos
alunos suscitavam a inflexibilidade das aulas. Os professores persistiam e insistiam linguística e
pedagogicamente a participação dos alunos através da repetição da mesma pergunta,
reformulação em L2 e/ou em L1 bem como promoviam o coro, terminação de palavras e frases
com o objectivo de garantir um mínimo progresso da aula. Ao discutir esta pergunta, prevejo
avaliar os resultados da pesquisa que evidenciam a superação deste problema como consequência
das práticas pedagógicas de translanguaging e de collateral learning e cross-cultural border desenvolvidas
como uma única proposta pedagógica no ensino de Ciências Naturais.

9.1.3.1 Novos ambientes: flexibilidade e dinâmica das aulas

Os estudos de García (2009), García & Wei (2014) afirmam que o translanguaging proporciona um
ensino-aprendizagem dinâmico porque as línguas transformam-se em ferramentas e recursos que
fomentam práticas discursivas bilingues, ocasionando oportunidades de participação e de
interacção dos alunos. Creese & Blackledge (2010) advogam que a pedagogia flexível bilingue
proporcionado pelo translanguaging no ensino-aprendizagem eleva a participação construtiva dos
alunos nas aulas porque, neste processo, há pontes entre as línguas e os alunos demonstram as suas
performances identitárias. Nesta óptica, surge o bilinguismo dinâmico caracterizado pelas
múltiplas práticas interactivas multilingues (García 2009, García & Wei 2014).
Os resultados desta pesquisa evidenciam que, de facto, a flexibilidade e o dinamismo dos alunos e
do ensino-aprendizagem surgiam decorrentes da combinação de três factores, a destacar: (i)
liberalização das línguas nas aulas como um único repertório discursivo de sala de aulas; (ii)
compatibilidade entre os conteúdos universais e os fundos de conhecimentos no ensino-
aprendizagem e (iii) a centralização da aula nos alunos. Os alunos exploravam as oportunidades
concedidas pela liberalização das línguas nas aulas, participando espontânea e flexivelmente numa
ou noutra língua, gerando eventos discursivos de translanguaging nas aulas. Os níveis de flexibilidade
e de dinamismo das aulas e dos alunos eram comprovados pela super-motivação e pela espontânea
predisposição dos alunos para participar voluntariamente na aula, assemelhando-se à constatação
de García & Leiva (2014), segundo a qual, o translanguaging permite a participação de todos os
alunos. A compatibilidade entre os fundos de conhecimento e os conteúdos universais facilitava a
participação activa dos alunos nas aulas evidenciada através da exposição das suas experiências

292
quotidianas, saberes e realidades socioculturais durante a construção dos conhecimentos sobre os
fenómenos da ciência. Os níveis de flexibilidade e de dinamismo dos alunos eram
surpreendentemente elevadíssimos visto que os alunos tinham, por um lado, as oportunidades
concedidas pela liberalização das línguas e, por outro lado, as oportunidades de expor os seus
fundos de conhecimentos diante da construção dos conhecimentos universais. O ensino-
aprendizagem era mais acessível e fácil para todos os alunos. Consequentemente, todos
participavam activa e competitivamente na construção dos conhecimentos na aula. Nestes
ambientes, os professores descentralizavam as aulas através da concessão de oportunidades e
espaços contínuos de participação, de interaccão e de colaboração construtiva dos alunos.
Creese & Blackledge (2010) observaram que no âmbito da pedagogia flexível bilingue, os
professores e os alunos efectuam inter-ligações entre os domínios sociais, culturais, comunitários e
linguísticos referentes às suas vidas. De facto, a combinação entre as práticas discursivas de
translanguaging, os fundos de conhecimento compatíveis com os conteúdos universais e a
descentralização das aulas motivava o voluntarismo espontâneo e competitivo, surgindo assim os
altos níveis de flexibilidade e de dinamismo das aulas pois, por um lado, os conteúdos eram
acessíveis à compreensão dos alunos e, por outro lado, a liberalização das línguas facilitavam a
participação activa dos alunos.
A pedagogia de translanguaging proporciona práticas linguísticas flexíveis e maximiza as interacções
dos alunos (García & Wei 2014). Esta constatação é congruente assim como é contraditória em
relação as observações dos dois autores. As evidências da pesquisa ilustram que as práticas
pedagógica e discursivas de translanguaging por si só motivavam a participação dos alunos, porém
não maximizavam a interacção activa dos alunos a ponto de elevar os níveis de flexibilidade e de
dinamismo das aulas a não que houvesse a incorporação e a exploração dos fundos de
conhecimentos socioculturais. Mesmo assim, o fomento das práticas discursivas de translanguaging e
a abertura de espaços para os fundos de conhecimentos socioculturais dos alunos não garantiam a
flexibilidade e a dinamismo dos alunos se os professores monopolizassem ou centralizassem a aula
através de discursos expositivos, transmissão de conhecimentos e perguntas fechadas. O que se
evidenciava é que os alunos acompanhavam passivamente a aula, não tinham as oportunidades e
espaços de intervenção e de interacção para participarem na aula e construirem activa e
construtivamente o conhecimento devido à monopolização da aula pelos professores. Nestes
termos, a aula tornava-se inflexível, estática e monótona uma vez que os professores discursavam

293
excessivamente sem se preocuparem com a concessão de espaços para a participação activa dos
alunos.
Portanto, ainda que Baker (2001) advogue que o translanguaging proporciona um forte bilinguismo,
desenvolve ambas as línguas e os conteúdos em paralelo e facilita a cooperação entre o contexto
social do aluno e o da escola, há que referir que, baseando-se nos resultados e nas evidências desta
pesquisa, a flexibilidade e o dinamismo da aula não dependem, exclusivamente, das práticas
pedagógicas bilingues que são promovidas pelo translanguaging, mas sim, de uma explícita relação
pedagógica destas com os fundos de conhecimentos socioculturais dos alunos e de uma abordagem
de ensino-aprendizagem construtiva. Em continuação desta análise, vale relembrar que, mesmo
nas aulas em que os professores exploravam ocasionalmente o translanguaging através da integracção
e do uso da L1, a participação flexível e dinâmica dos alunos evidenciava-se se o conteúdo da aula
fosse compatível ou próximo dos seus fundos de conhecimentos socioculturais. Concluindo, a
flexibilidade e o dinamismo do processo de ensino-aprendizagem surgem quando os alunos
participavam de forma espontânea, voluntária e competitiva um atrás do outro nas aulas
contextualmente desenvolvidas através da mediação e/ou transição harmoniosa entre os fundos
de conhecimentos socioculturais e os conhecimentos universais sem causar conflitos e/ou choques
culturais e cognitivos nos alunos, e da exploração das práticas discursivas bilingues como um único
repertório discursivo na sala de aulas.

9.1.3.2 Mãos e mãos no ar e “sou eu… sou eu…”

A aproximação entre as visões dos conhecimentos, a liberalização das línguas como meios
discursivos nas aulas e o fomento de um ensino-aprendizagem participativo e construtivo permitia
aos alunos integrar os seus fundos de conhecimentos diante dos conteúdos dos conhecimentos
universais e participar discursivamente na aula através de qualquer que fosse a língua. Neste
contexto, a motivação, a predisposição e o voluntarismo dos alunos eram tão elevados que muitos
manifestavam a sua disponibilidade e prontidão para intervir na aula. Os alunos levantavam
espontânea e competitivamente as mãos para o ar, suplicavam incansavelmente a participação
através da expressão “sou::: eu::: sou:: eu:::” tantas vezes quanto fossem necessárias. Os alunos
escolhidos pelos professores contribuíam com firmeza e sem hesitação, equívocos e vergonha pois
estavam seguros das suas respostas. Os alunos participam um atrás do outro, havendo momentos

294
em que, enquanto um aluno intervinha, os demais mantinham as mãos levantadas no ar,
predispostos a expor outras ideias para além da resposta do/a voluntário/a escolhido/a bem como
prontificando-se antecipadamente para mais uma competição na próxima pergunta.
Os alunos dinamizavam as aulas a partir da manifestação do voluntarismo espontâneo e
competitivo como também através das suas várias contribuições e ideias apresentadas em cada
pergunta. Quer dizer, para cada pergunta, os alunos apresentavam mais de uma proposta de
resposta razão pela qual, voluntariavam e participavam um atrás do outro. Os professores
enfrentavam a dura missão de escolher um aluno de cada vez dentre tantos que se predispunham
a participar na aula. Estrategicamente, os professores escolhiam os alunos que não tinham tido a
oportunidade de participar na aula. Contudo, observei alguns momentos nos quais determinados
alunos violavam o princípio de participação por via da escolha, intervindo sem a autorização dos
professores. O dinamismo da aula era regulado e controlado pelos professores que, avaliavam a
cada resposta apresentada pelos alunos e decidia escolher outros voluntários e/ou transitaria para
outras perguntas ou outros momentos da aula. Diante das perguntas mais complexas e ou
relacionadas com os conhecimentos universais e distanciadas dos fundos de conhecimentos
socioculturais locais, a maioria dos alunos não se predispunha para participar na aula. Nestas
situações, as aulas registavam momentos de baixa flexibilidade e dinamismo.
Em suma, os níveis de flexibilidade e de dinamismo dos alunos incrementavam-se qualitativamente
quando o translanguaging e os fundos de conhecimentos locais normalizaram-se como uma única
proposta pedagógica nas aulas de Ciências Naturais.

9.2 Implicações práticas da pesquisa

Esta pesquisa abrem uma nova era pedagógica para o processo de ensino-aprendizagem nas classes
de pós-transição do programa transicional moçambicano numa fase curricular em que a transição
para a L2 suscita uma crise pedagógica caracterizada pela baixa participação e de interacção dos
alunos na construção do conhecimento, baixa flexibilidade e de dinamismo do processo de ensino-
aprendizagem e por conseguinte, o ensino é desenvolvido com recurso às estratégias de
aprendizagem e de participação passiva. Os alunos que, outrora, aprendiam em ambientes de altos
níveis de participação e de interacção construtiva nas aulas em L1, desta vez não participam devido
não só à baixa proficiência em L2, mas também à maior exigência linguística e académica dos

295
conteúdos disciplinares. Os ambientes de sala de aulas são caracterizados por alunos que aprendem
através de estratégias de participação passivas sob insistência dos professores, contrariando os
ambientes de aprendizagem construtivos, participativos e interactivos que ocorrem nas classes
leccionadas em L1 antes da transição.
Os resultados a que cheguei nesta pesquisa desafiam o programa transicional a romper tanto com
as pedagogias de dominação linguística veiculada através de práticas monolingues em L2 quanto
com a marginalização do poder pedagógico da L1 no ensino da ciência, bem como impor-se contra
as pedagogias de subjugação dos sistemas culturais, tradições e cosmovisões, saberes, experiências
e realidades socioculturais locais no ensino das ciências (Dei & Asgharzadeh 2001; Dei 2002, 2010).
Em outras palavras, há que liberalizar e promover a L1 de meio auxiliar da L2 para recurso
linguístico paralelo à L2 uma vez que ambas podem fomentar práticas pedagógicas bilingues e
transformarem-se num e único único repertório linguístico funcional e imprescindível para os
alunos bilingues emergentes.
De acordo com o INDE/MINED (2003a), a utilização das L1´s no ensino básico justifica-se pelas
razões de natureza linguístico-pedagógica, cultural e identidade e direito humano. A partir das
duas primeiras razões (linguístico-pedagógica e cultura e identidade), pressupõe-se que o professor
actue como um mediador cultural, facilitador do ensino-aprendizagem através do uso das L1´s e
da cultura local. Assim, as L1´s e a cultura local são elementos pedagógicos de base para a
construção dos conhecimentos académicos se relacionados com a L2 e com os conteúdos
universais. Esta convivência linguística e cultural suscita os ambiente interactivo, construtivo e
colaborativo no ensino-aprendizagem. Entretanto, a transição da L1 para a L2 a partir da 4ª classe,
a separação e/ou fronteiras entre as línguas nas aulas a favor da maior exposição da L2 e a exclusão
da L1 como também a ausência de práticas pedagógicas centradas na cultural, nas experiências,
saberes, realidades e vivências socioculturais locais através da L1 inibe que o ensino-aprendizagem
nas classes de pós-transição seja construtivo, participativo, colaborativo, flexível e dinâmico.
A partir desta pesquisa, concluo que o ensino-aprendizagem que se quer que seja, de facto, um
mecanismo para a construção do desenvolvimento cognitivo e linguístico dos alunos nas classes
pós-transição deve, por um lado, capitalizar as experiências, realidades, saberes locais entre outros
fundos de conhecimentos em paralelo aos conteúdos universais e, por outro lado, deve fomentar
as L1´s como recursos, ferramentas linguística e pedagógicas lado a lado com a L2 de forma
sistematizada e/ou planificada para que as aulas não sejam espaços de legitimação da supremacia

296
dos conhecimentos universais, desconfiguração das culturas dos alunos, marginalização, alienação
cultural, identitári e linguística africanas através da transmissão ou exposição dos conteúdos
científicos em L2 (Shizha 2005, 2012; Dei & Asgharzadeh 2001), mas sim espaços de desconstrução
e reconstrução participativa dos conhecimentos da ciência a partir das realidades socioculturais e
das L1´s dos alunos.
Os alunos da 4ª classe pós-transição são bilingues emergentes em fase de desenvolvimento
emergente e contínuo do bilinguismo dinâmico e abertos às práticas pedagógicas bilingues, pois
garantem a aprendizagem paralela de L2 e da L1, assim como facilitam a melhor compreensão
dos conteúdos académicos em ambientes participativos e interactivos do que o ensino numa L2
proficientemente sub-desenvolvida. A inclusão dos fundos de conhecimentos socioculturais diante
dos conteúdos da ciência propõe um ensino dos conteúdos da ciência a partir do contexto
sociocultural o que pressupõe que os alunos construam os conhecimentos da ciência a partir de
uma visão policêntrica, isto é, a partir das realidades, experiências e cosmovisões socioculturais
locais (Shizha 2005, 2010; Dei 2010).
Ao longo da pesquisa explorei tanto as práticas discursivas de translanguaging como a pedagogia de
collateral learning e cross-border cultural através de pontes entre os repertórios linguísticos (L1 e L2) e
entre os conteúdos universais e os fundos de conhecimentos socioculturais como uma única
abordagem pedagógica de ensino-aprendizagem. As evidências que arrolei nesta pesquisa ilustram
que as práticas pedagógicas e discursivas bilingues e a visão policêntrica do ensino da ciência
suscitam ambientes de ensino-aprendizagem construtivo, participativo e interactivo dos alunos nas
aulas, visibilizam o potencial pedagógico dos fundos de conhecimentos socioculturais locais na
facilitação da aprendizagem dos conhecimentos da ciência e flexibilizam e dinamizam os alunos
nos processos de ensino-aprendizagem. Estes resultados têm implicações práticas no ensino de
Ciências Naturais nas classes de pós-transição do programa transicional devido ao seu enorme
poder pedagógico no processo de construção do conhecimento.
Em primeiro lugar, a liberalização das línguas e o fomento das práticas discursivas de translanguaging
nos ambientes de sala de aulas têm um valor pedagógico relevante para que os alunos possam
participar activamente nos diferentes momentos da aula. Os alunos sentir-se-ão livres de usar um
ou outro repertório linguístico para expor os seus pensamentos e conhecimentos socioculturais nas
aulas. Ademais, as práticas discursivas de translanguaging proporcionam oportunidades de contínua
aprendizagem da L2 a partir da L1 e vice-versa. Desta forma, os alunos aprenderão as línguas não

297
só a partir das práticas discursivas como também através de determinadas práticas linguísticas que
os professores poderão aplicar para alcançar certos fins de aprendizagem (p.e: leitura de textos em
L2 e interpretação em L2 e L1; tradução de palavras e frases orais e escritas de L2 para a L1 e vice-
versa, comparação entre as línguas, etc.).
Em segundo lugar, os fundos de conhecimentos e as experiências concretas sobre fenómenos
naturais, recorrendo os materiais locais e são óptimos recursos e ferramentas para facilitar a
compreensão de quaisquer conteúdos da ciência desde os mais simples aos mais complexos assim
como para garantir que os alunos aprendam a pensar e a construir um raciocínio lógico através da
observação crítica dos fenómenos naturais. Quanto mais os professores envidarem esforços para
reduzir as incompatibilidades entre os conhecimentos universais ou da ciência e os fundos de
conhecimentos socioculturais, maior será a facilidade que os alunos terão para relacionar,
comparar, analisar os conteúdos da ciência a partir das suas realidades, experiências e cosmovisões
socioculturais locais. Assim, os alunos motivar-se-ão a participar qualitativamente nas aulas,
expondo diferentes perspectivas e reflexões dos próprios alunos.
Em terceiro lugar, tanto as práticas discursivas de translanguaging como os fundos de conhecimentos
serão pedagogicamente relevantes para proporcionar ambientes de participação e de interacção
dos alunos, flexibilizar e dinamizar o potencial dos alunos nas aulas se os professores adoptarem
uma postura de mediadores do ensino-aprendizagem. Por esta razão, os professores devem, em
primeira instância, fomentar o discurso de translanguaging nas aulas e, em segunda instância,
centralizar a aula nos alunos através de criação de espaços e de oportunidades que possibilitem a
sua participação activa.

9.2.1 Oportunidades de estratégias inovadoras de ensino

As práticas pedagógicas e discursivas de translanguaging, os fundos de conhecimentos e a


centralização da aula nos alunos facilitam o ensino-aprendizagem e a actuação do professor bem
como a participação dos alunos na construção de novos conhecimentos. A combinação destes três
elementos inova as práticas pedagógicas do ensino das Ciências Naturais na 4ª classe, bem como
abrem novas oportunidades para que os professores possam revolucionar e transformar as suas
práticas pedagógicas no ensino dos conteúdos da ciência, promovendo práticas pedagógicas
interactivas, colaborativas e construtivas. Os professores terão que reflectir sobre como desenvolver

298
flexivelmente as práticas pedagógicas bilingues nas aulas uma vez ser necessário explorar as duas
línguas como recursos e ferramentas pedagógicas para o ensino-aprendizagem dos conteúdos
académicos e simultaneamente como objectos de aprendizagem explícita e implicitamente no
decurso da mesma aula. Nestes termos, no âmbito da concepção e da planificação de aulas, os
professores reflectirão sobre a materialização dos dois desafios que referi no período anterior e
valorizarão o contexto sociocultural dos alunos nas aulas. A seguir, apresento um exemplo de
perguntas de reflexão que sugiro que deviam ser formuladas e respondidas pelos professores
sempre que pretendam adoptar esta proposta pedagógica no ensino-aprendizagem:
1. Que fundos de conhecimentos socioculturais devem ser sistematizados e explorados na aula
como referência para facilitar a negociação, a construção e a compreensão dos
conhecimentos da ciência?
2. Como enquadrar os fundos de conhecimentos socioculturais e os conhecimentos universais
nos conteúdos da aula?
3. Como encorajar as transições culturais e acautelar os conflitos culturais e cognitivos em
situações de incompatibilidade, incongruência e de oposição entre os fundos de
conhecimento socioculturais e os conhecimentos da ciência?
4. Como relacionar os termos da ciência em L2 com os termos da L1?
5. Que experiências práticas, tecnologias locais e materiais ou recursos locais seriam
necessárias para facilitar a compreensão dos fenómenos, dos conceitos, das epistemologias
dos conteúdos da ciência?
6. Como expor os conhecimentos socioculturais e os conhecimentos da ciência para que os
alunos possam reflectir, discutir e tomar decisões fundamentadas na razão sem forçá-los à
assimilação e à alienação cultural através dos conhecimentos da ciência?
7. Que actividades práticas e pedagógicas devem ser propostos para que os alunos interajam
usando práticas discursivas de translanguaging na construção do conhecimento livre e
activamente?
8. Que actividades práticas linguísticas explícitas e implícitas devem ser potenciadas para que
os alunos aprendam metalinguisticamente as duas línguas no decurso dos conteúdos da
ciência?
9. Como valorizar e capitalizar a diversidade de visões, crenças, ideias e construções dos
alunos harmonizando-os, adaptando-os e acomodando-os no ensino da ciência?

299
As respostas às questões acima inovam as práticas pedagógicas dos professores, propõem novas
atitudes pedagógicas, linguísticas e culturais dos professores bem como proporcionam novos
ambientes de ser e de estar dos alunos nas aulas. Evidentemente que as aulas serão marcadas por
altos níveis de participação e de interacção dos alunos e os professores assumirão o papel de
mediadores do ensino-aprendizagem flexível e dinâmico, conforme evidenciam os resultados dos
capítulos 5 (secção 5.2), 6 (secções 6.1 e 6.2) e 7 (secções 7.1 e 7.2). O ensino-aprendizagem será
desenvolvido num ambiente de fácil compreensão dos conteúdos. Nos casos em que os conteúdos
da ciência ocidental forem academicamente exigentes e complexos e incompatíveis, incongruentes
das cosmovisões e dos fundos de conhecimentos socioculturais, a incorporação dos recursos e/ou
materiais locais e a realização de experiências práticas e/ou laboratoriais concederão as
oportunidades de observação participativa e de reflexão dos alunos sobre os fenómenos da ciência
vivenciados a olho nu, facilitando a resposta a eventuais perguntas e construindo uma
compreensão sólida do conteúdo. Nestas circunstâncias, os alunos serão capazes de explicar e
descrever objectivamente os respectivos fenómenos naturais cientificamente inacessíveis, exigentes
e complexos devido à observação das experiências práticas realizada com base nos recursos e
materiais locais e numa prática discursiva de translanguaging. Na ausência dos materiais e recursos
locais e das experiências práticas, os alunos não os compreenderão, ainda que se promovam as
práticas discursivas de translanguaging como estratégia comunicativa e interactiva no processo de
ensino-aprendizagem.

9.2.1.2 Adaptar e potenciar as práticas dos professores

Nas classes antes da transição, os professores vivenciam experiências de ambientes de altos níveis
de participação e interacção dos alunos em L1. As aulas apresentam níveis de flexibilidade e de
dinamismo e os alunos voluntariam-se competitivamente para contribuir activamente na
construção de conhecimentos (Benson 1997, Chimbutane 2011, 2012). Nas classes de pós-
transição, as experiências vivenciadas nas classes leccionadas em L1 antes da transição mudam,
pois, os alunos jamais participam e interagem num ensino em L2, meio de instrução que nos
moldes da L1 (vide o capítulo 5, sub-secção 5.1.1). Segundo referi no capítulo 5 (sub-secção 5.1.3),
o fomento de práticas ocasionais de L1 e de translanguaging nas aulas, a aproximação dos conteúdos
da disciplina com as realidades socioculturais dos alunos e o recurso aos exemplos do quotidiano

300
dos alunos, ocasionam alguns momentos de participação e de interacção espontâneos dos alunos
e por conseguinte, a aula ganha uma ligeira flexibilidade e dinamismo. À luz das evidências e os
resultados desta pesquisa, sugiro ser importante potenciar as experiências e práticas do
translanguaging ocasional desenvolvidas recursivamente pelos professores no ensino-aprendizagem
em L2 através da liberalizando-os para adoptar de forma planificada as práticas pedagógicas e
discursivas de translanaguaging como recursos, ferramentas e estratégias flexíveis de ensino-
aprendizagem (Creese & Blackledge 2010), promover pedagogicamente a L1 como um recurso
linguístico e pedagógico igual a L2 e que juntos se tornam num único repertório linguístico e
discurso na sala de aulas, ultrapassando, assim, as pedagogias monolingues em L2, separação e a
delimitação de fronteiras entre as línguas (L2 e L1) (INDE/MINED 2003a). Ademais, tendo em
conta que nesta pesquisa evidenciei que as práticas pedagógicas bilingues por si sós não promovem
a participação e interacção favoráveis para a construção colaborativa do conhecimento, torna-se
necessário, que a par das práticas pedagógicas e discursivas de translanguaging, os professores possem
a incorporar os fundos de conhecimentos socioculturais dos alunos na planificação e na leccionação
dos conteúdos universais à luz da pedagogias de collateral learning e cross-cultural border bem como
promover um ensino-aprendizagem centrado nos alunos. As experiências desta pesquisa mostram
que os professores e os alunos adaptam-se flexivelmente à nova abordagem de ensino-
aprendizagem em estudo. À medida que as aulas se vão desenvolvendo, os professores evidenciarão
indicadores de optimização dos níveis de participação e de interacção dos alunos e os de
flexibilidade e dinamismo das aulas.

9.2.1.3 Capitalização das oportunidades de fluxo das práticas de biliteracia

No âmbito do ensino-aprendizagem de Ciências Naturais à luz das práticas pedagógicas desta


pesquisa surgiam, de forma natural e contextual, práticas flexíveis de biliteracia nos moldes de
translanguaging. Neste contexto, houve a necessidade de explorá-las imprescindivelmente, pois eram
legítimos resultados colaterais da pesquisa e que permitiam a conciliação entre a participação e da
interacção dos alunos engajados na construção do conhecimento e o desenvolvimento da
biliteracia. A incorporação destas práticas de biliteracia complementavam as aulas por forma a
que não fossem exclusivamente discursivas, a destacar: leitura de texto do livro escrito em L2 e
respectiva interpretação e análise em duas línguas; leitura e interpretação de textos bilingues em

301
duas línguas; identificação e tradução de palavras difíceis; equivalências de palavras-chave ou
termos do conteúdo da aula em duas línguas; práticas de tradução de enunciados, construção
participativa do texto registado em L2 a partir de ideias dos aulos expostas numa ou noutra língua
e por fim, liberalização de registos bilingues no quadro e o incentivo à cópia de ideias relevantes
da aula registadas em duas línguas. Estas práticas contribuíram sobremaneira na
operacionalização pedagógica desta proposta em pesquisa.
Os professores e os alunos devem capitalizar e fomentar todas as oportunidades de práticas de
biliteracia nas aulas como complementos pedagógicos das práticas discursivas bilingues pois,
materializam e visualizam os valiosos contributos que os alunos expõem discursiva e
interactivamente nas aulas, facilitam o desenvolvimento da literacia em L2 através da L1 e vice-
versa, bem como maximizam simultaneamente a aprendizagem dos conteúdos académicos e a
aprendizagem de ambas as línguas num e único conteúdo da aula.

9.3 Recomendações

Os resultados pedagógicos evidenciados nas TAI´s e na TC e os posicionamentos críticos dos


professores nos processos de validação interna e externa comprovam que a proposta pedagógica
baseada nas práticas de translanguaging, collateral learning e cross-cultural border é viável para o ensino-
aprendizagem nas classes de pós-transição (4ª e 5ª classes) cujos alunos são bilingues emergentes.
Nestes termos, há que referir que estas práticas pedagógicas são uma inovação pedagógica para o
programa transicional porque, por um lado, opõem-se à pedagogia de separação, delimitação e de
fronteira de línguas a favor da maior exposição da L2 e a evitação da L1 e liberalizando-as através
das práticas pedagógicas de translanguaging e, por outro lado, propõem que o ensino-aprendizagem
de Ciências Naturais se efectue através da inclusão permanente dos fundos de conhecimentos
socioculturais dos alunos em “cross-cultural” com os conteúdos universais. Estas propostas coincidem
em parte com as práticas informais, improvisadas e ocasionais dos professores nas classes de pós-
transição, a saber: (i) práticas pedagógicas bilingues p.e code-switching ou alternância de códigos que
são usadas de forma informal pelos professores (Chimbutane 2015); (ii) práticas de translanguaging
ocasional constatadas nesta pesquisa e, (iii) o recurso de exemplos e/ou realidades do contexto
sociocultural local no ensino de conteúdos científicos. Ainda que estas práticas ocorram de forma
instantânea e discreta, elas impulsionam de alguma forma a participação, a compreensão e a

302
conceptualização linguística e cognitiva dos conteúdos da aula. Contudo, estas práticas não são
maximizadas como estratégias pedagógicas porque o ensino deve ser desenvolvido
maioritariamente em L2.
Analisando as evidências de adaptabilidade dos professores às práticas pedagógicas de
translanguaging, collateral learning e cross-cultural border, fico com impressão de que esta proposta
pedagógica pode ser adoptada a partir das seguintes acções:

(i) Re-consciencialização e/ou re-orientação linguística-cultural e pedagógica dos


professores para que possam adoptar as práticas pedagógicas e discursivas de
translanguaging planificado nas aulas de Ciências Naturais a partir da sistematização e
capitalização das suas práticas e experiências informais, ocasionais e não planificadas
de uso de duas línguas na aula;
(ii) Adopção de um ensino-aprendizagem baseado nas realidades culturais, experiências e
nas práticas locais, nos recursos didácticos entre outros fundos de conhecimentos
socioculturais compatíveis ou incompatíveis com as visões dos conhecimentos
universais/científicos, acautelando-se atenciosa e pedagogicamente dos conflitos
culturais e cognitivos;
(iii) Investigação e sistematização dos fundos de conhecimentos socioculturais relacionados
com os conteúdos de Ciências Naturais e por último;
(iv) Substituição o ensino centrado no/a professor/a pelo ensino centrado no/a aluno/a.
Nesta nova abordagem, o/a professor/a actuará como mediador/a transcultural que
promove diferentes visões socioculturais relacionados com o conteúdo da aula no
desenvolvimento das competências académicas e científicas e um mediador
“translingues” que incentiva práticas discursivas e pedagógicas bilingues/multilingües.

Para fins de leccionação, a proposta de translanguaging, collateral learning e cross-cultural preconiza as


seguintes estratégias pedagógicas:

303
a) Práticas discursivas e interactivas:
(i) Liberalizar as línguas como um único repertório na aula;
(ii) Desenvolver um ensino-aprendizagem num discurso de translanguaging;
(iii) Encorajar os alunos a participarem em L1 ou L2 e/ou em ambas línguas;
(iv) Promover práticas de interpretação das intervenções tanto dos alunos como do
professor de uma língua para outra.
b) Práticas de literacia:
(i) Promover práticas de leitura de textos do livro em L2, elaborar textos bilingues e
interpretá-los com recurso o discurso de translanguaging e os fundos de
conhecimentos socioculturais;
(ii) Incentivar práticas de produção escrita em duas (frases e pequenos textos) a partir
das ideias dos alunos e ou aprendidas na aula.
c) Práticas de tradução:
(i) Promover actividades nas quais os alunos aprendem a traduzir palavras, frases e
pequenos textos de uma língua para outra em grupos;
(ii) Registar as palavras-chave, termos e palavras da aula em L2 e os respectivos
equivalentes socioculturais em L1 e vice-versa.
d) Práticas de ensino dos fundos de conhecimentos e os conhecimentos
universais:
(i) Incorporar os fundos de conhecimentos no conteúdo da aula para explicar os
fenómenos da ciência;
(ii) Relacionar, comparar as visões socioculturais e as visões científicas, destacando as
diferenças e as semelhanças;
(iii) Negociar (fazer equivalências) os sentidos das palavras-chave e os termos da aula
em L2 e na L1;
(iv) Realizar experiências práticas com recursos e materiais didácticos locais para
demonstrar fenómenos naturais;
(v) Acomodar os conhecimentos científicos que sejam incongruentes e incompatíveis
com os socioculturais.

304
A adopção destas estratégias pedagógicas nas aulas pressupõe a definição de uma política
linguística-pedagógica específica para as classes de pós-transição, discuta sobre os seguintes pontos:

a) Redefinição do valor linguístico-pedagógico da L1 nas classes de pós-transição;


b) Abolição da pedagogia de separação de L2 e da L1, do papel da L1 como meio auxiliar da
L2, promovendo as duas línguas como recursos, ferramentas e um único repertório
linguístico-pedagógico no ensino-aprendizagem;
c) Promoção de um ensino de Ciências Naturais baseada nas visões policêntricas a partir dos
conteúdos da disciplina e dos fundos de conhecimentos socioculturais locais.

Conclusões

Ao realizar esta pesquisa-acção propunha-me a revitalizar os ambientes participativos e


interactivos dos alunos bilingues emergentes bem como elevar os níveis de flexibilidade e de
dinamismo do ensino-aprendizagem nas classes de pós-transição (4ª e 5ª classes). Este problema
está intrinsicamemte relacionado com o facto de os alunos apresentarem baixos níveis de
proficiência e de competência interaccional em L2, no novo meio de instrução.
À luz da teoria da educação anti-colonial (Dei 2000, 2002, 2005, 2010; Shizha 2005, 2009, 2010a)
e das teorias pedagógicas de translanguaging (García 2009; García & Wei 2014) e de collateral learning
(Jegede 1995, 1999; Jegede & Aikenhead 1999) e cross-cultural border (Aikenhead 1996, 2001a,
Aikenhead & Jegede 1999, Aikenhead 2006), esta pesquisa conclui que a exploração das suas
práticas pedagógicas como uma única proposta pedagógica viabilizam o ensino de Ciências
Naturais nas classes de pós-transição do programa de educação bilingue (4ª classe).
A capitalização pedagógica dos fundos de conhecimentos socioculturais locais e das L1´s no ensino-
aprendizagem da ciência através das pedagogias de collateral learning e de cross-cultural border
minimiza os choques culturais, as confusões e contradições cognitivos causados pela
incompatibilidade e diferenças entre as visões dos conhecimentos socioculturais e as dos
conhecimentos universais. A partir dos fundos de conhecimentos socioculturais, os alunos bilingues
emergentes desenvolvem-se cognitiva e academicamente, pois têm a oportunidades de mediar,
relacionar, analisar, comparar, reflectir, concluir e construir novos conhecimentos académicos a

305
partir da interligação entre as suas experiências e realidades quotidianas, saberes locais, recursos e
materiais socioculturais e conteúdos universais ou conhecimentos científicos.
As práticas discursivas de translanguaging liberalizam o uso das línguas como recursos, ferramentas
e meios pedagógicos; abrem espaços interactivos que motivam sobremaneira a participação dos
alunos nas aulas. Os alunos têm as facilidades de explicar, expor, explanar as suas ideias, reflexões
e conhecimentos socioculturais numa ou noutra língua bem como em ambas as línguas no âmbito
da construção de novos conhecimentos académicos.
As práticas discursivas de translanguaging interligam as duas línguas como um único repertório
linguístico e discursivo de sala de aula ao passo que os fundos de conhecimentos socioculturais e os
conhecimentos universais estabelecem entre si pontes de negociação, complementaridade e ou de
oposição. Tanto nas situações de complementaridade como nas de oposição entre as duas visões
de conhecimentos, o estudo conclui que os alunos exploram as práticas discursivas de translanguaging
e participam na aula para expor os seus pensamentos, ideias, reflexões, conhecimentos. As aulas
são flexíveis e dinâmicas. Os alunos participam de um ensino-aprendizagem construtivo,
compreensível e acessível.
O recurso às práticas discursivas e pedagógicas de translanguaging no ensino-aprendizagem dos
conhecimentos universais sem a inclusão dos fundos de conhecimentos socioculturais desperta a
atenção dos alunos bilingues emergentes, mas não os motiva a participar de forma voluntária e
competitiva nas aulas. Nestas circunstâncias, os alunos participam respondendo somente ao que
lhes parece acessível sob ponto de vista linguístico, cognitivo e académico. Em outras palavras, os
alunos respondem às perguntas fáceis e simples em L1 e/ou em L2, porém silenciam-se perante
perguntas díficeis, complexas e exigentes sob ponto de vista linguístico, cognitivo e académico. Os
alunos têm algumas dificuldades para conceptualizar os conhecimentos universais leccionados
através da pedagogia de translanguaging em sem a inclusão activa dos seus fundos de conhecimentos.
Entretanto, na situação em que ocorre o fomento dos fundos de conhecimentos socioculturais nos
conteúdos universais e exploram-se as práticas discursivas em L2 como meio de instrução, os
alunos conceptualizam os conteúdos universais, constroem cognitivamente reflexões, análises,
ideias, mas mostram-se hesitantes, inseguros e timidez porque não conseguem se exprimir e
expressar os suas reflexões, análises, ideias e os seus fundos de conhecimentos numa L2
proficientemente baixa. Nestas situações, os alunos não participam de forma voluntária, aberta e
dinâmica.

306
As práticas pedagógicas e discursivas de translanguaging e as de fomento dos conhecimentos
socioculturais são as que atraem e motivam os alunos bilingues emergentes a envolver-se linguística
e academicamente na aprendizagem participativa, construtiva, colaborativa e flexível dos
conhecimentos académicos/científicos. Nestas práticas, os alunos tornam-se agentes que
constroem os conhecimentos académicos/científicos em ambientes cómodos e divertidos. Os
alunos não se cansam de participar tanto em L2 como em L1 na aula. Os professores enfrentam a
dura missão de eleger os voluntários dentre tantos que competem uns com os outros para participar
na aula. Os alunos conceptualizam os conteúdos da ciência através dos seus conhecimentos
socioculturais e através das duas línguas.
Com base nas evidências desta pesquisa, concluo que as práticas pedagógicas de inclusão liberal
da L1 no ensino em L2 e o uso de ambas as línguas no ensino (pedagogia de translanguaging), mais
a inclusão dos fundos de conhecimentos socioculturais nos conteúdos científicos (pedagogia de
collateral learning e cross-cultural border) proporcionam inúmeras oportunidades de participação e de
interacção dos alunos bilingues emergentes; desenvolvem a proficiência e as competências
interaccional e metalinguística bilingues; constroem com facilidadade os novos conhecimentos
académicos em ambientes caracterizados pela colaboração flexível e dinâmica dos alunos e das
aulas. Concluindo, a proposta pedagógica translanguaging, collateral learning e cross-cultural border
permite aos alunos bilingues emergentes desenvolver simultaneamente as competências cognitivas,
linguísticas, académicas e científicas através da transculturalidade entre as visões policêntricas dos
conhecimentos e através de práticas do translanguaging de bilinguismo dinâmico e flexível.

307
Referências bibliográficas

Abagi, O. (2005). The Role of the school in Africa in the twenty-first century: coping with forces
of changes. Abdi, A. & Cleghorn, A. (eds). Issues in african education: sociological perspectives. New
York: Palgrave Macmillan, 297-315.

Abdi, A. (2005). African philosophies of education: counter-colonial criticisms. Abdi, A. &


Cleghorn, A. (eds). Issues in african education: sociological perspectives. New York: Palgrave
Macmillan, 25-41.

Abdi, A. (2012). Decolonizing philosophies of education: an introduction. Abdi, A. (ed.).


Decolonizing philosophies of education. Rotterdam: Sense Publishers, 1-14.

Abd-Kadir, J. & Hardman, F. (2007). The Discourse of whole class teaching: a comparative study
of kenyan and nigerian primary english lessons. Language and Education, 21:1, 1-15.

ACALAN (2006). Synthesis of the Bamako international forum on multilingualism. Disponível em:
http://www.acalan.org/eng/events/forum/Synthesis.pdf Acesso: 20.09.2013

Adams, S. (1999). An analysis of border crossing between learner´s life worlds and school science.
JOSAARMSE, 3:1, 14-21.

Adegbija, E. (1994). Language attitudes in sub-saharan africa: a sociolinguistic overview. Clevedon:


Multilingual Matters.

Adler, J. (1998). A Language of teaching dilemmas: unlocking the complex multilingual secondary
mathematics classroom. For the Learning of Mathematics, 18:1, 24-33.

Ahluwalia, P. (2001). Politics and post-colonial theory: african inflections. London and New York:
Routledge.

Aikenhead, G. (1996). Science education: border crossing into the subculture of science. Studies in
Science Education, 27, 1-52.

Aikenhead, G. (1997). Toward a first nations cross-cultural science and technology


curriculum. Science Education. 81, 217-238.

Aikenhead, G. (2001a). Integrating western and aboriginal sciences: cross-cultural science


teaching. Research in Science Education, 31: 3, 337-355.

Aikenhead, G. (2001b). Student´s ease in crossing cultural borders into school science. Science
Education, 85, 180-188.

Aikenhead, G. (2002). Cross-cultural science teaching: rekindling traditions for aboriginal students.
Canadian Journal of Science, Mathematics and Technology Education, 2:3, 287-304.

309
Aikenhead, G. (2006). Science education for everyday life: evidence-based practice. New York: Teachers
College Press.

Aikenhead, G. & Jegede, O. (1999). Cross-cultural science education: a cognitive explanation of a


cultural phenomenon. Journal of Research in Science Teaching, 36:3, 269-287.

Alidou, H. (2011). Use of african languages for lietracy: conditions, factors and processes in Benin,
Burkina Faso, Cameroon, Mali, Tanzania and Zambia. In Ouane, A. & Glanz, C. (eds).
Optimising learning, education and publishing in Africa: the language factor. a review and analysis of theory
and practice in mother-tongue and bilingual education in Sub-saharan Africa. UIL/ ADEA, 217-250.

Andersson, I. et al. (2013). Negotiating meaning in multilingual group work: a case of higher
education in Rwanda. International Journal of Bilingual Education and Bilingualism, 16:4, 436-450.

Andersson, I. & Rusanganwa, J. (2011). Language and space in a multilingual undergraduate


physics classroom in Rwanda. International Journal of Bilingual Education and Bilingualism, 14:6,
751-764.

Antón, M. (1999). The Discourse of a learner-centered classroom: sociocultural perspectives on


teacher-learner interaction in the second-language classroom. The Modern Language Journal,
83:3, 303-318.

Antón, M. & Dicamilla, F. (1999). Socio-cognitive functions of L1 collaborative interaction in the


L2 classroom. The Modern Language Journal, 83:2, 233-247.

Appiah, K. A. (1992). In my father´s house: Africa in the philosophy and culture. Oxford: Oxford University
Press.

Arthur, J. (1994). Talking like teachers: teachers and pupil discourse in botswana primary
classrooms. Language, Culture and Curriculum, 7:1, 29-40.

Arthur, J. & Martin, P. (2006). Accomplishing lessons in postcolonial classrooms: comparative


perspectives from Botswana and Brunei Darussalam. Comparative Education, 42:2, 177-202.

Au, K. (2009). Isn´t culturally responsive instruction just good teaching? Social Education, 73:4, 179-
183.

Babaci-Wilhite, Z. (2013). Local languages of instruction as a right in education for sustainable


development in africa. Sustainability, 5, 1995-2017.

Babaci-Wilhite, Z. (2015). Local languages as a human right in education: comparative cases from Africa.
Rotterdam: Sense Publishers.

Baker, C. (2001). Foundations of bilingual education and bilingualism. 3rd edition. Clevedon: Multilingual
Matters.

310
Bamgbose, A. (1983). Education in indigenous languages: the west African model of language
education. The Journal of Negro Education, 52:1, 57-64.

Bamgbose, A. (1991). Language and the nation. Edinburgh: Edinburgh University Press.

Bamgbose, A. (1999). African language development and language planning. Social Dynamics. 25:1.
pp. 13-30.

Bamgbose, A. (2006). African languages in the school system. ACALAN. Bulletin D´Information, 1, 9-
11.

Bamgbose, A. (2011). African languages today: the challenge of and prospects for empowerment
under globalization. In Bokamba, E. et al. (ed). Selected proceedings of the 40th annual conference on
african linguistics. Somerville: Cascadilla Proceedings Project, 1-14.

Barnes, C. (2006). Preparing preservice teachers to teach in a culturally responsive way. The Negro
Educational Review, 57:2, 85-100.

Benson, C. (1997). Relatório final sobre o ensino bilingue: resultados de avaliação externa da experiência de
escolarização bilingue em Moçambique (PEBIMO). INDE: Maputo.

Benson, C. (2008). Mother tongue-based education in multi-lingual contexts. In Haddad, C. (ed.).


Improving the quality of mother tongue-based literacy and learning: case studies from Asia, Africa and South
America. Bangkok: UNESCO, 1-12.

Brock-Utne, B. (2000). Whose education for all?: recolonization of the african mind. New York: Falmer
Press.

Brock-Utne, B. (2012). Language and inequality: global challenges to education. Compare: A Journal
of Comparative and International Education, 42:5, 773-793.

Brock-Utne, B. & Alidou, H. (2011). Active students – learning through a language they master.
In Ouane, A. & Glanz, C. (eds). Optimising learning, education and publishing in Africa: the language
factor. a review and analysis of theory and practice in mother-tongue and bilingual education in Sub-saharan
Africa. UIL/ ADEA, 187-216.

Brown, A. & Ryoo, K. (2008). Teaching science as a language: a “content-first” approach to


science teaching. Journal of Researching in Science Teaching, 45:5, 529-553.

Bunyi, G. (1997). Multilingualism and discourse in primary school mathematics in Kenya.


Language, Culture and Curriculum, 10:1, 52-65.

Bunyi, G. (1999). Rethinking the place of african indigenous languages in african education.
International Journal of Educational Development, 19, 337-350.

311
Bunyi, G. (2008). Tha place of african indigenous knowledge and languages in education for
development: the case of Kenya. In Dlamini, S. (ed). New directions in african education: challenges
and possibilities. Alberta: University of Calgary Press, 15-40.

Cabral, A. (1973). Return to the source. African Informative Service (ed). Selected speeches by Amilcar
Cabral. New York and London: Monthly Review Press.

Campbell, B. & Lubben, F. (2000). Learning science through contexts: helping pupils make sense
of everyday situations. International Journal of Science Education, 22:3, 239-252.

Canagarajah, S. (2011). Translanguaging in the classroom: emerging issues for research and
pedagogy. Wei, L. (ed). Applied Linguistics Review. Berlin: De Gruyter Mouton, 1-28.

Carr, W. & Kemmis, S. (1986). Becoming critical: education, knowledge and action research. London:
Routledge Farmer.

Carstens, A. (2016). Translanguaging as vehicle for L2 acquisition and L1 development: students


perceptions. Language Matters, 47:2, 203-222.

Cekaite, A. (2007). A child´s development of interactional competence in a swedish L2 classroom.


The Modern Language Journal, 91:1, 45-62.

Cenoz, J. & Gorter, D. (2015). Focus on multilingualism as an approach in educational contexts.


In Blackledge, A. & Creese, A. (eds). Heteroglossia as practice and pedagogy. New York: Springer,
239-254.

Cesáire, A. (1978). Discurso sobre o colonialismo. Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora.

Chimbutane, F. (2011). Rethinking bilingual education in postcolonial contexts. Bristol: Multilingual


Matters.

Chimbutane, F. (2012). O uso da língua materna como recurso no processo de ensino e


aprendizagem de/em língua segunda. In Chimbutane, F. & Stroud. C. (orgs). Educação
bilingue em Moçambique: reflectindo criticamente sobre políticas e práticas. Textos Editores. Maputo,
75-104.

Chimbutane, F. (2015). O uso da L1 dos alunos como recurso no processo de ensino e


aprendizagem de/em Português/L2: o contexto de ensino bilingue em Moçambique. Revista
Científica da Universidade Eduardo Mondlane. Séries Letras e Ciências Sociais, 1:1, 7-23.

Chin, C. (2006). Classroom interaction in science: teacher questioning and feedback to students´
responses. International Journal of Science Education, 28:11, 1315-1346.

Clegg, J. & Afitska, O. (2011). Teaching and learning in two languages in african classrooms.
Comparative Education, 47:1, 61-77.

312
Cleghorn, A. (1992). Primary level science in Kenya: constructing meaning through english and
indigenous languages. International Journal of Qualitative Studies in Education, 5:4, 311-323.

Cobern, W. (1996). Constructivism and non-western science education research. International


Journal of Science Education, 4:3, 287-302.

Cobern, W. & Aikenhead, G. (1996). Cultural aspects of learning science. In Fraser, B. & Tobin,
K. (eds). International handbook of science education. Kluwer Academic Publishers. Disponível em:
http://www.wmich.edu/slcsp/121.htm. Acesso: 11.02. 2016.

Cook, V. (2001). Using the first language in the classroom. The Canadian Modern Language Review,
53:3, 403-423.

Costa, V. (1995). When science is “another world”: relationships between worlds of family, friends,
school, and science. Science Education, 97:3, 313-333.

Creese, A. & Blackledge, A. (2010). Translanguaging in the bilingual classroom: a pedagogy for
learning and teaching? Modern Languages Journal, 94: 1, 103-115.

Creswell, J. (2009). Research design: qualitative, quantitative, and mixed methods approaches. London: Sage
Publications.

Creswell, J. & Miller, D. (2000). Determining validity in qualitative inquiry. Theory into Practice, 39:3,
124-130.

Cummins, J. (1976). The influence of bilingualism on cognitive growth: a synthesis of research


findings and explanatory hypotheses. Working Papers on Bilingualism, 9.

Cummins, J. (1979). Linguistic interdependence and the educational development of bilingual


children. Bilingual Education Working Paper, 3:2, 3-69.

Cummins, J. (1980). The construct of language proficiency in bilingual education. In Alatis, J. E.


(ed). Georgetown University Round Table on Languages and Linguistics 1980. Washington, DC:
Georgetown University Press, 81-104.

Cummins, J. (1981). The role of primary language development in promoting educational success
for language minority students. In California State Department of Education (ed). Schooling
and language minority students: A theoretical framework. Los Angeles: Evaluation, Dissemination and
Assessment Center, 3-49.

Cummins, J. (2000). Language, power and pedagogy: bilingual children in the crossfire. Clevedon:
Multilingual Matters.

Cummins, J. (2007). Rethinking monolingual instructional strategies in multilingual classrooms.


Canadian Journal of Applied Linguistics/ Revue canadienne de linguistique applique, 10:2, 221-240.

313
Cummins, J. (2008). Teaching for transfer: challenging the two solitudes assumption in bilingual
education. In May, S. & Hornberger, N. (eds). Encyclopedia of Language and Education. 2nd edition.
Volume 1: Language Policy and Political Issues in Education. New York: Springer, 65-75.

Dei, G. (2000). Rethinking the role of indigenous knowledge in the academy. International Journal of
Inclusive Education, 4:2, 111-132.

Dei, G. (2008). Possibilities in african schooling and education. In Dlamini, N. (ed). New directions
in Africa education: challenges and possibilities. Alberta: University of Calgary Press.

Dei, G. (2010). Teaching Africa: towards a transgressive pedagogy. New York: Springer.

Dei, G. (2011a). Integrating local cultural knowledge as formal and informal educations for young
african learners: a ghanaian case study. Canadian and International Education/ Educations
Canadienne et International, 40:1, 21-40.

Dei, G. (2011b). Education and socialization in Ghana. Creative Education, 2:2, 96-105.

Dei, G. (2012a). Indigenous anti-colonial knowledge as ‘heritage knowledge’ for promoting


black/african education in diasporic contexts. Decolonizing: Indigeneity, Education & Society, 1:1,
102-119.

Dei, G. (2012b). Culture, identity and education in African education: the relevance of local
cultural resource knowledge. In Asabere-Ameway et al. (eds). Contemporary issues in african
sciences and education. Sense Publishers. Rotterdam, 127-148.

Dei, G. (2014). Indigenizing the curriculum: the case of the African University. In Emeagwali, G.
& Dei, G. (eds). African Indigenous Knowledge and the Disciplines. Rotterdam: Sense Publishers,
113-130.

Dei, G. & Asgharzadeh, A. (2001). The power of social theory: the anti-colonial discursive
framework. Journal of Educational Thought, 35:3, 297-323.

Denzin, K. (1978). The research act: a theoretical introduction to sociological methods. 2nd edition. New York:
McGraw-Hill.

Djité, P. (2008). The sociolinguistics of development in africa. Clevedon: Multilingual Matters.

Driver, R. et al. (1994). Constructing scientific knowledge in the classroom. Educational Researcher,
23:7, 5-12.

Emeagwali, G. & Dei, S. (2014). Introduction. In Emeagwali, G. & Dei, S. (eds). African indigenous
knowledge and the disciplines. Rotterdam: Sense Publishers.

Esquinca, A, et al. (2014). Meaning making an translanguaging in a two-way dual language


program on the U.S. – Mexico border. Bilingual Research Journal: The Journal of the National
Association for Bilingual Education, 37:2, 164-181.

314
Fakudze, C. (2004). Learning of science concepts within a traditional socio-cultural environment.
South African Journal of Education, 24:4, 270-277.

Fanon, F. (1968). Os condenados da terra. Tradução de José L. de Melo). Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira.

Fanon, F. (2008). Pele negra, máscara branca. Tradução de Renato da Silveira. Salvador: EDUFBA.

Ferguson, G. (2003). Classroom code-switching in post-colonial contexts functions, attitudes and


policies. In Makoni, S. & Meinhof, U. (eds). African and applied linguistics. Amsterdam: John
Benjamins.

Frederiksen, C. & Donin, J. (2015). Discourse and learning in contexts of educational interaction.
In Markee, N. (ed.). The handbook of classroom discourse and interaction. John Wiley & Sons. West
Sussex, 96-114.

García, O. et al. (2008). From english language learners to emergent bilinguals. Equity matters: Research
Review, 1

García, O. (2009). Bilingual education in the 21st century: a global perspective. Oxford: Wiley/Blackwell.

García, O. (2012). Theorizing translanguaging for educators. In Celic, C. & Seltzer, K. (aut).
Translanguaging: a CUNY-NYSIED guide for educators. New York: CUNY-NYSIEB, 1-6.

García, O. & Sylvan, C. (2011). Pedagogies and practices in multilingual classrooms: singularities
in pluralities. The Modern Language Journal, 95:3, 387- 399.

García, O. (2014). What is translanguaging? expanded questions and answers for U.S educators.
Hesson, S. et al. (aut). Translanguaging in curriculum and instruction: a CUNY-NYSIEB guide for
educators. New York: CUNY-NYSIEB, 1-20.

García, O. & Wei, L. (2014). Translanguaging: language, bilingualism and education. New York: Palgrave
Macmillan.

García, O & Leiva, C. (2014) Theorizing and enacting translanguaging for social justice. In
Blackledge, A. & Creese, A. (ed.). Heteroglossia as practice and pedagogy. New York: Springer,
199-216.

García, O. & Kleifgen, J. (2018). Educating emergent bilinguals: policies, programs, and practices for english
learners. 2nd edition. New York: Teachers College Press.

Gay, G. & Kirkland, K. (2003). Developing cultural critical consciousness and self-reflection in
preservice teacher education. Theory into Practice, 42:3, 181-187.

Gay, G. (2000). Culturally responsive teaching: theory, research and practice. New York: Teachers College
Press.

315
Gay, G. (2002). Preparing for Culturally Responsive Teaching. Journal of Teacher Education, 53:2,
106-116.

George, J. (1999a). World view analysis of knowledge in a rural village: implications for science
education. Science Education, 83, 77-95.

George, J. (1999b). Indigenous knowledge as a component of the school curriculum. In Semali,


L. & Kincheloe, J. (eds). What is indigenous knowledge?: voices from the academy. New York: Falmer
Press..

Gitari, W. (2009). Exploring the understanding and common use of scientific and everyday
knowledge and students´ agency in a kenyan high school. Canadian Journal of Science,
Mathematics and Technology Education, 9:4, 262-275.

González, N. et al. (2001). Bridging funds of distributed knowledge: creating zones of practices in
mathematics. Journal of Education for Students Placed at Risk (JESPAR), 6:1-2, 115-132.

Gort, M. & Pontier, R. (2013). Exploring bilingual pedagogies in dual language preschool
classrooms. Language and Education, 27:3, 223–245.

Gutiérrez, K. et al. (1999). “Rethinking diversity: hybridity and hybrid language practices in the
third space”. Mind, Culture, and Actviity, 6:4, 286-303.

Hamid, M. & Honan, E. (2012). Communicative english in the primary classroom: implications
for english-in-education policy and practice in Bangladesh. Language, Culture and Curriculum,
25:2, 139-156.

Harper, S. (2017). Engaging karen refugee students in science learning through a cross- cultural
learning community. International Journal of Science Education.
DOI.10.1080/09500693.2017.1283547

Hedges, H. et al. (2011). Early years curriculum: funds of knowledge as a conceptual framework for
children´s interests. Journal of Curriculum Studies, 43:2, 185-205.

Heller, M. (2006). Linguistic minorities and modernity. 2nd edition. London: Continuum.

Herbert, S. (2008). Collateral learning in science: students´ responses to a cross-cultural unit of


work. International Journal of Science Education, 30:7, 979-993.

Heugh, K. (2011a). Theory and practice – language education models in Africa: research, design,
decision-making and outcomes. In Ouane, A. & Glanz, C. (eds). Optimising learning, education
and publishing in Africa: the language factor. a review and analysis of theory and practice in mother-tongue
and bilingual education in sub-saharan Africa. UIL/ ADEA, 105-155.

Heugh, K. (2011b). Da línguas maternal ao uso de uma língua internacional no processo de ensino
e aprendizagem: as implicações do modelo de “transição” no sistema escolar em África. In

316
Chimbutane, F. & Stroud. C. (orgs). Educação bilingue em Moçambique: reflectindo criticamente sobre
políticas e práticas. Textos Editores. Maputo, 53-74.

hooks, B. (2003). Teaching community: a pedagogy of hope. New York: Routledge.

Hornberger, N. & Link, H. (2012). Translanguaging in today’s classrooms: a biliteracy lens. Theory
Into Practice, 51:4, 239-247.

Hornberger, N. (2003). Continua of biliteracy. In Hornberger, N. (ed). Continua of biliteracy: an


ecological framework for educational policy, research and practice in multilingual settings. Clevedon:
Multilingual Matters.

INDE/MINED (2003a). Programa de ensino básico - I Ciclo (1ª e 2ª Classes). Maputo: INDE/MINED.

INDE/MINED. (2003b). Plano curricular do ensino básico: objectivos, política, estrutura, plano de estudos e
estratégias de implementação. Maputo: INDE/MINED.

Jacobson, R. (1990). Allocating two languages as a key feature of a bilingual methodology. In


Jacobson, R. & Faltis, C. (eds). Language distribution issues in bilingual schooling. Bristol:
Multilingual Matters, 3-17.

Jegede, O. (1993). African cultural perspectives and the teaching of science. In J. Solomon &
Aikennead, G (Eds). Science, technology and society education for future citizens. New York: Teachers’
College Press, 120-130.
Jegede, O. (1995). Collateral learning and the eco-cultural paradigm in science and mathematics
education in Africa. Studies in Science Education, 25:1, 97-137.

Jegede, O. (1999). Science education in nonwestern cultures: towards a theory of collateral


learning. In Semali, L. & Kincheloe, J. L. (eds). What is indigenous knowledge? voices from the
academy. New York: Falmer Press, 119-142.

Jegede, O. & Aikenhead, G. (1999). Transcending cultural borders: implications for science
teaching. Journal for Science & Technology Education, 17: 1, 45-66.

Jegede, O. & Okebukola, P. (1991a). The relationship between African traditional cosmology and
students´s acquisition of a science process skill. International Journal of Science Education, 13:1,
37-47.

Jegede, O. & Okebukola, P. (1991b). The effect of instruction on socio-cultural beliefs hindering
the learning of science. Journal of Research in Science Teaching, 28:3, 275-285.

Jick, T. (1979). Mixing qualitative and qualitative methods: triangulation in action. Administrative
Science Quarterly, 24:4, 602-611.

Kampittayakul, T. (2017). Developing thai learners´cic through translanguaging in one-on-one


english tutorial sessions. The New English Teacher, 11:1, 69-95.

317
Kamwendo, G. (2010). Denigrating the local, glorifying the foreign: malawian language policies in
the era of african renaissance. International Journal of African Renaissance Studies – Multi – , Inter
– and Transdisciplinarity, 5:2, 270-282.

Kemmis, S. & McTaggart, R. (2007). Participatory action research: communicative action and the public
sphere. Disponível em:
http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.473.4759&rep=rep1&type=pd
f Acesso: 10.12.2014.

Kempf, A. (2009). Contemporary anticolonialism: a transhistorical perspective. In Kempf, A. (ed).


Breaching the colonial contract: anti-colonialism in the US and Canada. Springer.

Koosimile, A. T. (2004). Out-of-school experiences in science classes: problems, issues and


challenges in Botswana. International Journal of Science Education, 26:4, 483-496.

Krause, L. & Prinsloo, M. (2016). Translanguaging in a township primary school: policy and
practice. Southern African Linguistics and Applled Language Studies, 34:4, 347-357.

Kyeyune, R. (2003). Challenges of using english as a medium of instruction in multilingual


contexts: a view from ugandan classrooms. Language, Culture and Curriculum, 16:2, 173-184.

Ladson-Billing, G. (1995a). But that’s just good teaching! the case for culturally relevant pedagogy.
Theory into Practice, 34:3, 159-165.

Ladson-Billings, G. (1995b). Toward a theory of culturally relevant pedagogy. American Educational


Research Journal, 32:3, 465-491.

Lee, J. et al. (2008). Learning in two languages: interactional spaces for becoming bilingual speakers.
The International Journal of Bilingual Education and Bilingualism, 11:1, 75-94.

Lemke, J. (1990). Talking science: language, learning, and values. Ablex Publishing. London.

Lewis, G. et al. (2012a). Translanguaging: origins and development from school to street and
beyong. Education Research and Evaluation, 18:7, 641-654.

Lewis, G. et al. (2012b). Translanguaging: developing its conceptualization and contextualization.


Educational Research and Evaluation, 18-7, 655-670.

Lisanza, E. (2014). Dialogic instruction and Learning: the case of one Kiswahili classroom in
Kenya. Language, Culture and Curriculum, 27:2, 121-135.

Lopes, A. (2004). A Batalha das línguas. perspectivas sobre linguística aplicada em Moçambique. Maputo:
Imprensa Universitária.

Makalela, L. (2015). Moving out of linguistic boxes: the effects of translanguaging strategies for
multilingual classrooms. Language and Education, 29:3, 200-217.

318
Martin, P. (1999). Bilingual unpacking of monolingual texts in two primary classrooms in Brunei
Darussalam. Language and Education, 13:1, 38-58.

Martin-Beltrán, M. (2009). Cultivating space for the language boomerang: the interplay of two
languages as academic resources. English Teaching: Practice and Critique, 8:2, 25-53.

Martin-Beltrán, M. (2010a). The two-way language bridge: co-conctructing bilingual language


learning opportunities. The Modern Language Journal, 94:2, 254-277.

Martin-Beltrán, M. (2010b). Positioning proficiency: how students and teachers (de)construct


language proficiency at school. Linguistics and Education, 21:4, 257-281.

Martin-Beltrán, M. (2014). “What do you want to say?” how adolescents use translanguaging to
expand learning opportunities. International Multilingual Research Journal, 8:3, 208-230.

Mayoh, K. & Knutton, S. (1997). Using out-of-school experience in science lessons: reality or
rethoric? International Journal of Science Education, 19:7, 849-967.

Mazak, C. & Herbas-Donoso, C. (2014). Translanguaging practices and language ideologies in


Puerto Rican University science education. Critical Inquiry in Language Studies, 11:1, 27-49.

Mazrui, A. (1993). Language and the quest for liberation in africa: the legacy of Frantz Fanon.
Third World Quarterly, 14:2, 351-363.

Mazrui, A. (2002). The english language in african education: dependency and decolonization. In
Tollefson, J. (ed). Language policies in education: critical issues. London: Lawrence Erlbaum
Associates, 267-283.

Mazrui, A. (2004). English in Africa: After the Cold War. Sydney: Multilingual Matters.

Mazula, B. (1995). Educação, cultura e ideologia em Moçambique: 1975-1985. Maputo: Edições


Afrontamento.

Mchombo, S. (2014). Language, learning, and education for all in Africa. In Babaci-Wilhite, Z.
(ed). Giving spaces to african voices: rights in local languages and local curriculum. Rotterdam: Sense
Publishers.

McKinley, E. (2005). Locating the global: culture, language and science education for indigenous
students. International Journal of Science Education, 27:2, 227-241.

McNiff, J. & Whitehead, J. (2002). Action research: principles and practice. 2nd edition. London:
Routledge Falmer.

McNiff, J. & Whitehead, J. (2006). All you need to know about action research: an introduction. London:
Sage Publications.

McNiff, J. & Whitehead, J. (2010). You and your action research project. 3rd edition. London: Routledge.

319
McTaggart, R. (1997). Guiding principles for participatory action research. In McTaggart, R. (ed).
Participatory action research: international contexts and consequences. Albany: State University of New
York Press.

Medvitz, A. (1985). Problems in the application of science education to national development. Nairobi:
Institute for Development Studies.

Memmi, A. (1974). The Colonizer and the colonized. London: Earthscan Publications.

Mercuri, S. & Ebe, A. (2011). Developing academic language and content for emergent bilinguals
through a science inquiry unit. Journal of Multilingual Education Research, 2:6, 80-102.

Moll, L. et al. (1992). Funds of knowledge for teaching: using qualitative approach to connect homes
and classrooms. Theory and practice, 31:2, 132-141.

Mondlane, E. (1995). Lutar por Moçambique. Maputo: Colecção “Nosso Chão”.

Motlhaka, A. & Makalela, L. (2016). Translanguaging in an academic writing class: implications


for a dialogic pedagogy. Southern African Linguistics and Applied Language Studies, 34:3, 251-260.

Msimanga, A. & Lelliott, A. (2014). Talking science in multilingual contexts in South Africa:
possibilities and challenges for engagement in learners’ home languages in high school
classrooms. International Journal of Science Education, 36:7, 1159-1183.

Mungwini, P. (2013). African modernities and the critical reappropriation of indigenous


knowledges: towards a polycentric global epistemology. International Journal of African
Renaissance Studies – Multi – , Inter – and Transdisciplinarity, 8:1, 78-93.

Myhill, D. (2004). Making connections: teachers´use of children´s prior knowledge in whole class
discourse. British Journal of Educational Studies, 52:3, 263-275.

Naidoo, P. & Vithal, R. (2014). Teacher approaches to introducing indigenous knowledge in school
science classrooms. African Journal of Research in Mathematics, Scince and Technology Education,
18:3, 253-263.

Nashon, S. (2003). Teaching and learning high school physics in kenyan classrooms using
analogies. Canadian Journal of Science, Mathematics and Technology Education, 3:3, 333-345.

Ngara, C. (2007). African ways of knowing and pedagogy revisited. Journal of Contemporary Issues in
Education, 2:2, 7-20

Ngwaru, J. M. (2011). Transforming classroom discourse and pedagogy in rural Zimbabwe


classrooms: the place of local culture and mother tongue use. Language, Culture and Curriculum,
24: 3, 221-240.

320
Nikula, T. & Moore, P. (2016). Exploring translanguaging in CLIL. International Journal of Bilingual
Education and Bilingualism. DOI: 10.1080/13670050.2016.1254151

Norman, D. (1978). A theoretical introduction to sociological methods. New York: McGraw-Hill.

Nsamenang, B. (2005). The Intersection of traditional african education with school learning. In
L. Swartz, C. et al. (eds). Psychology: an introduction. Cape Town: Oxford University, 327-337.

Nsamenang, A. & Tchombe, T. (2011). Introduction: generative pedagogy in the context of all
cultures ca contribute scientific knowledge of universal value. In Nsamenang, A. & Tchombe,
T. (eds). Handbook of african educational theories and practices: a generative teacher education curriculum.
North West Region: Human Development Resource Centre (HDRC), 5-20.

Ogawa, M. (1995). Science eduaction in a multiscience perspective. Science Eduaction, 79:5, 583-
593.

Ogunniyi, M. (1988). Adapting western to traditional african culture. International Journal of Science
Education, 10:1, 1-9.

Ogunniyi, M. (2005). Cultural perspectives on science and technology education. In Abdi, A. &
Cleghorn, A. (eds). Issues in african education: sociological perspectives. New York: Palgrave
Macmillan, 123-140.

Paxton, M. (2009). `It´s easy to learn when you using your home language but with English you
need to start learning language before you get to the concept´: bilingual concept development
in an english medium University in South Africa. Journal of Multilingual and Multicultural
Development, 30:4, 345-359.

Phelan, P. et al. (1991). Students´ multiple worlds: negotiating the boundaries of family, peer and
school cultures. Anthropology & Education Quarterly, 22, 224-250.

Phillipson, R. (1992). Linguistic imperalism. Oxford: Oxford University Press.

Pomeroy, D. (1994) Science education and cultural diversity: mapping the field. Studies in Science
Education, 24:1, 49-73.

Poza, E. (2016). The language of ciencia: translanguaging and learning in bilingual


scienceclassroom. International Journal of Bilingual Education and Bilingualism. DOI:
10.1080/13670050.2015.1125849

Prah, K. (2009). The burden of english in Africa: from colonialism to neo-colonialism. In Monaka,
K. et al. (eds). Mapping Africa in the english-speaking world. Newcastle: Cambridge Scholar
Publishing, 128-142.

Prah, K. (2011). The language of development and tge development of languages in contemporary
Africa: the challenge of african development in the context of current linguistic realities and

321
dominant knowledge in applied linguistics. Annual Conference of the American Association for Applied
Linguistics (AAAL). Chicago. (26-29 March 2011).

Probyn, M. (2015). Pedagogical translanguaging: bridging discourse in south african science


classrooms.Language and Education, 29:3, 218-234.

Prophet, R. & Rowell, P. (1993). Coping and control: science teaching strategies in Botswana.
International Journal of Qualitative Studies in Education, 6:3, 197-209.

Prophet, B. & Dow, P. (1994). Mother tongue language and concept development in science: a
Botswana case study. Culture and Curriculum, 7:3, 205-216.

Rassool, N. (2007). Global issues in language, education and development: perspectives from postcolonial countries.
Clevedon: Multilingual Matters.

Rodney, W. (1973). How europe underdeveloped Africa. Dar-Es-Salaam: London and Tanzanian
Publishing House.

Rollnick, M. & Rutherford, M. (1996). The use of mother tongue and english in the learning and
expression of science concepts: a classroom-based study. International Journal of Science
Education, 18:1, 91-103.

Roy-Compbell, Z. (2006). The state of african languages and the global language politics:
empowering african languages in the era of globalization. In Arasanyin, O. & Pemberton,
A. (eds). Selected proceedings of the 36th annual conference on african linguistics. Somerville: Cascadilla
Proceedings Project, 1-13.

Rubagumya, C. (1994). Language values and bilingual classroom discourse in Tanzanian


secondary schools. Language, Culture and Curriculum, 7:1, 41:53.

Sagor, R. (1993). How to conduct collaborative action research. Alexandria: ASCD.

Sagor, R. (2005). A four-step process for educators and school teams. California: Corwin Press.

Sayer, P. (2013). Translanguaging, TexMex, and bilingual pedagogy: emergent bilinguals learning
through the vernacular. Tesol Quarterly, 41:1, 63-88.

Setati, M. (1998). Code-switching in a senior primary class of science-language mathematics


learners. For the Learners of Mathematics, 18:1, 34-40.

Setati, M. & Adler, J. (2000). Between languages and discourses: language practices in primary
multilingual mathematics classrooms in South Africa. Educational Studies in Mathematics, 43,
243-269.

322
Shizha, E. (2005). Reclaiming our memories: the education dilemma in postcolonial african school
curricula. In Abdi, A. & Cleghorn, A. (eds). Issues in african education: sociological perspectives. New
York: Palgrave MacMillan, 65-68.

Shizha, E. (2009). Chara chimwe hachitswanyi inda: indigenizing science education in Zimbabwe. In
Kapoor, D. & Jordan, S. (eds). Education, participation action research, and social change: international
perspectives. New York: Palgrave Macmillan, 139-154.

Shizha, E. (2010a). The interface of neoliberal globalization, science education and indigenous
african knowledges in Africa. Journal of Alternative Perspectives in the Social Sciences, 2:1, 27-58.

Shizha, E. (2010b). Rethinking and reconstituting indigenous knowledge and voices in the
academy in Zimbabwe: a decolonization process. In Kapoor, D. & Shizha, E. (eds). Indigenous
knowledge and learning in Asia/Pacific and Africa: perspectives on development, education and culture. New
York: Palgrave Macmillan, 115-130.

Shizha, E. (2011). Neoliberal globalization, science education and indigenous african knowledges.
In Kapoor, D. (ed). Critical perspectives on neoliberal globalization, development and education in Africa
and Asia. Rotterdam: Sense Publishers, 15-32.

Shizha, E. (2014). The indigenous knowledge systems and the curriculum. In Emeagwali, G. &
Dei, G. (eds). African indigenous knowledge and the disciplines. Rotterdam: Sense Publishers, 113-
130.

Shizha, E. & Abdi, A. (2014). Education for development: an africanist postcolonial perspective.
In Shizha, E. (ed). Remapping Africa in the global space: propositions for change. Rotterdam: Sense
Publishers, 73-88.

Shizha, E. (2015). Reclaiming indigenous cultures in Sub-Saharan African education. In Jacob,


W. et al. (eds). Indigenous education: language, culture and identity. New York: Springer, 301-318.

Simmons, M. & Dei, G. (2012). Reframing anti-colonial theory for the diasporic context.
Postcolonial Directions in Education, 1:1, 67-99.

Snively, G. & Corsiglia, J. (2001). Discovering indigenous science: implications for science
education. Science Education. 85. pp. 6-34.

Solomon, J. (1983). Learning about energy: how pupils think in two domains. European Journal of
Science Education, 5:1, 49-59.

Stanley, W. & Brickhouse, N. (2001). Teaching sciences: the multilingual question revisited.
Science Education, 85, 35-49.

Stears, M. et al. (2003). Making use of everyday knowledge in science classroom. African Journal of
Research in Mathematics, Science and Technology Education, 7:1, 109:118.

323
Stevenson, A. (2013). How fifth grade latino/a bilingual students use their linguistic resources in
the classroom and laboratory during science instruction. Cultural Studies of Science Education,
8:4, 973-989.

Stringer, E. (2007). Action research. 3rd edition. London: Sage Publications.

Sutherland, D. & Dennick, R. (2002). Exploring culture, language and the perception of the nature
os science. International Journal of Science Education, 24:1, 1-25.

Taale, K. et al. (2012). Children´s Indigenous Ideas and the learning of conventional science. In
Asabere-Ameway, A. et al. (eds). Contemporary issues in african sciences and education. Rotterdam:
Sense Publishers, 63-72.

Taylor, S. & Sobel, D. (2011). Culturally responsive pedagogy: teaching live our students’ lives matter. Bingley:
Emerald Group Publishing.

Tomal, D. (2010). Action research for educators. 2nd edition. New York: Rowman & Littlefield.

Tran, N. (2011). The relationship between students´ connections of out-of-school experiences and
factors associated with science learning. International Journal of Science Education, 33:12, 1625-
1651.

Trudell, B. (2007). Local community perspectives and Language of education in Sub-Saharan


African communities. International Journal of Educational Development, 27:5, 552-563.

Ünsal, Z. et al. (2016). Science education in a bilingual class: problematizing a translational


practice. DOI 10.1007/s11422-016-9747-3

Vaish, V. & Subhan, A. (2014). Translanguaging in a reading class. International Journal of


Multilingualism. DOI: 10.1080/14790718.2014.948447

Velasco, P. & García, O. (2014) Translanguaging and the writing of bilingual learners. Bilingual
Research Journal: The Journal of the National Association for Bilingual Education, 37:1, 6-23.

Villegas, A. (1990). Culturally responsive pedagogy for the 1990s and beyond. Washington: ERIC.
Disponível em: http://files.eric.ed.gov/fulltext/ED339698.pdf Acedido: 09. Dez. 2015.

Vogt, L. et al. (1987). Explaining school failure, producing school success: two cases. Anthropology &
Education Quarterly, 18:4, 276-286.

wa Thiong´o, N. (1981). Decolonizing the Mind: The Politics of Language in African Literature. Harare:
Zimbabwe Publishing House.

wa Thiong’o, N. (2013). Tongue and Pen: A Challenge to Philosophers From Africa. Journal of
African Cultural Studies. 25:2. pp. 158-163.

Walsh, S. (2011). Exploring Classroom Discourse Language in Action. Routledge. New York.

324
Wee, B. (2012). A Cross-cultural exploration of children´s everyday ideas: implications for
science teaching and learning. International Journal of Science Education, 34:4, 609-627.

Wei, L. (2014). Negotiating Funds of Knowledge and Symbolic Competence in the


Complemantary School Classrooms. Language and Education, 28:2, 161-180.

Wolff, E. (2011). Background and history – language politics and planning in Africa. Ouane, A. &
Glanz, C. (eds). Optimising learning, education and publishing in Africa: the language factor. a review and
analysis of theory and practice in mother-tongue and bilingual education in Sub-Saharan Africa. UIL/
ADEA, 49-100.

Yi, Y. & Macaro, E. (2012). The medium of instruction and classroom interaction: evidence from
hong kong secondary schools. International Journal of Bilingual Education and Bilingualism, 15:1,
29-52.

Zuber-Skerritt, O. (1996). “Introduction: new directions in action research”. In Zuber Skerritt, O.


(ed). New directions in action research. London: The Falmer Press, 2-8.

325
Anexos
Anexo 1: Comprovativos de autorização oficial para realizar a pesquisa
Anexo 2: Amostra de termos de consentimento ético
Anexo 3: Amostra de ficha de observação e reflexão de aulas
Anexo 4: Amostra de aulas submetidas ao processo de validação interna
Anexo 5: Amostra de aulas submetidas ao processo de validação externa

327
Anexo 1: Comprovativos de autorização oficial para realizar a pesquisa

REPUBLICA DE MOqAMBIQUE
MINISTERIO DA EDUCACAO E DESENVOLVIMENTO HUMAI\O
DIRECQAO NACIONAL DO ENSINO PRIMARIO

Exma Senhora
Directora Provincial de
Educagiio e Cultura de
Inhambane

Nota no /MINED/DINEP/2015 01 de Junho de 2015

Assunto: Realizagflo de uma pesquisa de estudos de doutoramento nas Escolas do


Ensino Bilingue da Provfncia de Inhambane

A Direcgio Nacional do Ensino Prim6rio (DINEP) informa que se apresentou na

pela
Direc96o o Sr. Gervdsio Absolome Chambo, doutorando em Estudos Linguisticos
Universidade de Vigo (Espanha), que pretende desenvolver uma pesquisa interpretativa,
do
enquadrada n4 Srea de muttilinguimo, multiculturalismo e bilinguismo, nas turmas

Ensino Bilingue, da 4 e 5, classe, a nivel da Provincia de lnhambane.

do
Devido a contribuigSo que os resultados da pesquisa podem vir a ter para a melhoria
Ensino Bilingue no pais vimos, por este meio, solicitar d v.Excia a autorizagao
do

doutorando paru a realizagio da pesquisa acima referida'

Cordiais saudag6es

fiiY*'i"':'
A Directora Nacional
, t'.: n.

---'9'

.//

o
Av.24de Julho Ne 167 - 3e Andar - Telefone ns 21491658 - Fax ne 2L492L96 - c' P' 34

329
2

Exma Senhora Directora Provincial de Educagiio e Desenvolvimento Humano


Inhambane

Data: 16 de Setembro de 2016

Assunto: Inicio da pesquisa nas EPC's do distrito de Inharrime, Jangamo e Homoine

Em seguimento ao despacho da V.Excia Senhora Directora Provincial de 13 de Julho de


2015 (em anexo), autorizando o senhor Gerryisio Absolone Chambo, doutorando pela
Universidade de Vigo - Espanh4 a realizar a pesquisa de campo nas escolas de educagSo
bilingue da provincia de Inhambane, inserida nos estudos de doutoramento, vem por este
meio, comunicar a V.Excia que, a partir do presente 3" trimestre de 2016 ao lo trimestre de
20t7, realizar| a sua pesquisa em quatro EPC's selecciondas, disciplina de cidncias naturais
- 4" classe da educagdo bilingue, com base no m6todo de Pesquisa-Acgdo Participativa,
denffo dos prad6es de 6tica de pesquisa (em anexo) e em duas fases distintas:

l. I Fase: Pesquisa Preliminar - Setembro aNovembro de 2016; e


2. II Fase: Pesquisa de Validagio - Janeiro a Margo de 2017.

As escolas seleccionadas para as duas fases s6o:

1. EPC de Maxavela- distrito de Homoine


2. EPC de Golo - Distrito de Homoine
3. EPC de Cumbana - Distito de Jangamo
4. EPC de Dongane - Distrito de Inharrime

A pesquisa sen{ efectuada de forma tiangular, cabendo a cada EPC uma categoria por
actividade, segundo ilustra-se a abaixo:

l. EPC de Maxavela e de Dongane - ser6o EPC's AcA6o Inovadora


2. EPC de Golo - contribuir6 como EPC de Controle e Validagio
3. EPC de Cumbana: participar6 como EPC de Critica

As EPC's de Aca6o Inovadora @PC de Maxavela e Dongane) ser6o alvo de experimentagio


activa da inovagSo pedag6gica na disciplina de cidncias naturais, 4a classe e nos dois tempos
semanais. Nestas EPC's, a pesquisa envolver6 a participagio activo dos professores de
educagSo bilingue para contribuir com as seguintes actividades:
l. Planificagdo de inovagSo (aulas), ac96o (leccionagio de aulas), observagdo (assistCncia
de aulas) e reflexSo (an6lise, critica e replanificagdo da pr6xima aula);

330
REPI-IB LICA DE MOQAMBIQUE
GOVERNO DA PROVINCIA DE INHAMBANE
DIRECCAO PROVINCTAL DA EDUCAQAO E DESENVOLVTMENTO HUMAI\O

Ao
Senhor Gervrisio Absolone Chambo

N/Ref: 69/DPEDFVSEC/00 0 120 I 6 Data: 2710912016

ASSUNTO: Comunicacflo de despacho

Pela presente, cumpre-nos transcrever na fntegra o Despacho de 22 de Setembro de 2016 da


Excelentissima Senhora Directora Provincial de Educag6o e Desenvolvimento Humano, exarado sobre o
pedido de realizagdo de pesquisa de campo nas escolas de educagSo bilingue na provfncia de Inhambane
do Sr. Gervdsio Absolone Chambo estudante da Universidade de Vigo na Espanha, cujo teor d:

" Visto

Autorizo,
Assinatura ilegivel
27 t$et?0!6,,
. .:^\'t-
A=4L -c

ffiffiG/,^o"
Direcgdo Provincial de Edpcai.do de hhmbme-
Av. Patrice Lumumba Cidade da Maxixe Tel:+258-293 30056 Fax:+258-293 30056 Email: dpec inhambane@yahoo.com.br

331
Dl:partrlment0
a
universida6#So de Tl $til"tiii{it}
e l".iltg{.irsticri
Tel. 986 8t? 5i I webswi8o3rh06
Facultade de Filoloxia
fax 986 812 371 depb12@wigo.e5
e Traduci6n
Carnpus d€ ViSo
E-36310 Ylgo

Exm* Senhora Directora Nacional do Ensino Primdrio


Minist€rio de Educag6o e Desenvolvimeato Humano
Mogambique - MaPuto

Data: lv{aputo, i I de Fevereiro de 2$15

pesquisa dt estudos
Assuatc: soticitaqao de autorizaqao oficiai para realizaqio da
de doutoramento

Gerv,sio Absotone Chambo, de nacionaliilade rnoqarnbicana d douto'rando


do

programa de doutoran6nto em esturlos iinguistieos da Universidade


de Vlgo

(Espanha).
na 6rea
o requerente pretende desenyolver uma pesquisa interpretativa, enquadrada

do multilinguismo, mutticulruralismo, bilinguismo e educagao -q inerente i


pedagogiaparaoprogramadeeducaq{obiiingue,especificamentenasclassesp6s.
t'ansiqfro (4o e 5u classes). Os rssulg{ios da pesquisa constituirflc
uma tese de

doutorarnento que serii defbn<lida acad€mica e publicamente em 2018'

A pesquisa surge relacionada com a especificidade do programa de educag&o


bilingue de lvlogambique que preve. numa I'ase critica do curriculo'
a r'ipida
transiqfio do meio de instrugio, isto s. de Ll hL?. depois de tr$s classes
(l',2" e 3u)

de Llcomo meio de insrruQao. Atd a0 periodo da transigao (3o ciasse). os alunos


n&o possuem
apresentafi habilidades brlsicas de c,:municag6o oral em L2 contudo,
a profici€ncia linguistica acaddmica e cognitiva nesta lingua que os possibilite
aprender as disciplinas cognitivarnente exigentes como ri o caso das ci€nci*s
naturais e rna{emiltica que sao leccionadas maioritariamente em L2'

A pesquisa procura estudar a adopgao de uma pedagogia linguisricamente assente


em duas linguas (Ll e L2) e culturalmsnte centrada em dois saberes (universals e

,J

l\. ita

-B

332
Anexo 2: Amostra de termos de consentimento ético

TERMOS DE CONSENTIMENTO ÉTICO DA PESQUISA

EPC DE ACÇÃO INOVADORA

PESQUISA: Duas línguas e dois saberes no ensino de ciências naturais na


educação bilingue – avaliação do impacto pedagógico

Investigador responsável: Gervásio Chambo (Doutorando, Universidade de Vigo)


Contacto: 846701651. Email: gervasioabsolone@gmail.com

Nesta pesquisa-acção participativa inserida nos estudos de doutoramento pretendo, em


colaboração com os professores, alunos e a comunidade local, estudar o impacto
pedagógico resultante do uso simultâneo de dois recursos linguísticos (L1 e L2) e culturais
(saberes locais e universais) na flexibilização qualitativa de aprendizagem dos alunos e na
actuação do professor durante o ensino de ciências naturais, na 4ª classe de educação
bilingue.

Û A pesquisa será realizada em duas fases durante 5 meses (I Fase: Setembro – Novembro
de 2016 e II Fase: Janeiro – Março de 2017).
Û A participação desta pesquisa é voluntária e isenta de qualquer tipo de compensação.
Û O/a professor/a participará em todas etapas da pesquisa como co-investigador/a
activo/a com direito à análise, crítica, sugestão e validação dos respectivos resultados finais.
Û A identidade civil e física dos co-investigadores e dos alunos será confidencial e protegida
através de pseudónimos e códigos.
Û Todas as actividades e informações serão colectadas, gravadas, protegidas em arquivos
seguros e nunca serão usadas fora dos propósitos desta pesquisa sem o consentimento
assinado pelo/a co-investigador/a.
Û A pesquisa será conduzida isenta de quaisquer riscos desfavoráveis aos co-investigadores
e aos alunos.
Û Os co-investigadores beneficiarão de formação avançada em pesquisa-acção aplicada à
inovação e flexibilização pedagógica, visando elevar a qualidade de ensino-aprendizagem
bilingue em classes pós-transição. Os alunos beneficiarão duma aprendizagem flexível,
atractiva, dinámica e participativa sem barreiras linguísticas e de conteúdos.
Û O/a co-investigador/a poderá informar sobre a sua interrupção e ou retirada da
pesquisa sem qualquer justificação bem como solicitar a destruição da sua informação e da
sua identidade.

Eu__________________________________li os termos de consentimento ético desta


pesquisa, estou satisfatoriamente esclarecido/a, protegido/a e disposto/a a participar,
podendo retirar-me, sem prejudicá-la sempre que me convier.

Assinatura_____________________(participante). Data______________

Assinatura_____________________(investigador). Data______________

333
TERMOS DE CONSENTIMENTO ÉTICO DA PESQUISA

EPC DE CONTROLE

PESQUISA: Duas línguas e dois saberes no ensino de ciências naturais na


educação bilingue – avaliação do impacto pedagógico

Investigador responsável: Gervásio Chambo (Doutorando, Universidade de Vigo)


Contacto: 846701651. Email: gervasioabsolone@gmail.com

Nesta pesquisa-acção participativa inserida nos estudos de doutoramento pretendo, em


colaboração com os professores, alunos e a comunidade local, estudar o impacto
pedagógico resultante do uso simultâneo de dois recursos linguísticos (L1 e L2) e culturais
(saberes locais e universais) na flexibilização qualitativa de aprendizagem dos alunos e na
actuação do professor durante o ensino de ciências naturais, na 4ª classe de educação
bilingue.

Û A pesquisa será realizada em duas fases durante 5 meses (I Fase: Setembro – Novembro
de 2016 e II Fase: Janeiro – Março de 2017).
Û A participação desta pesquisa é voluntária e isenta de qualquer tipo de compensação.
Û O/a professor/a e a sua turma participarão das etapas da II Fase da pesquisa como
grupo de controle no qual observar-se-ão práticas pedagógicas sobre o ensino e
aprendizagem de ciências naturais.
Û A identidade civil e física do/a co-investigador/a e dos alunos será confidencial e
protegida através de pseudónimos e de códigos.
Û Todas as actividades e informações serão colectadas, gravadas, protegidas em arquivos
seguros e nunca serão usadas fora dos propósitos desta pesquisa sem o consentimento
assinado pelo/a co-investigador/a.
Û A pesquisa será conduzida isenta de quaisquer riscos desfavoráveis aos co-investigador/a
e aos alunos.
Û O/a co-investigador/a poderá informar sobre a sua interrupção e ou retirada da
pesquisa sem qualquer justificação bem como solicitar a destruição da sua informação e da
sua identidade.

Eu__________________________________li os termos de consentimento ético desta


pesquisa, estou satisfatoriamente esclarecido/a, protegido/a e disposto/a a participar,
podendo retirar-me, sem prejudicá-la sempre que me convier.

Assinatura_____________________(participante). Data______________

Assinatura_____________________(investigador). Data______________

334
TERMOS DE CONSENTIMENTO ÉTICO DA PESQUISA

EPC DE CRÍTICA E VALIDAÇÃO

PESQUISA: Duas línguas e dois saberes no ensino de ciências naturais na


educação bilingue – avaliação do impacto pedagógico

Investigador responsável: Gervásio Chambo (Doutorando, Universidade de Vigo)


Contacto: 846701651. Email: gervasioabsolone@gmail.com

Nesta pesquisa-acção participativa inserida nos estudos de doutoramento pretendo, em


colaboração com os professores, alunos e a comunidade local, estudar o impacto
pedagógico resultante do uso simultâneo de dois recursos linguísticos (L1 e L2) e culturais
(saberes locais e universais) na flexibilização qualitativa de aprendizagem dos alunos e na
actuação do professor durante o ensino de ciências naturais, na 4ª classe de educação
bilingue.

Û A pesquisa será realizada em duas fases durante 5 meses (I Fase: Setembro – Novembro
de 2016 e II Fase: Janeiro – Março de 2017).
Û A participação desta pesquisa é voluntária e isenta de qualquer tipo de compensação.
Û O/a professor/a participará em certas sessões de crítica e validação da pesquisa como
co-investigador/a activo/a com direito à análise, crítica, sugestão e validação dos
respectivos resultados preliminares e finais.
Û A identidade civil e física dos co-investigadores e dos alunos será confidencial e protegida
com pseudónimos e códigos.
Û Todas as actividades e informações serão gravadas e protegidas em arquivos seguros.
Nunca serão usadas fora dos propósitos desta pesquisa sem o consentimento assinado
pelo/a co-investigador/a.
Û A pesquisa será conduzida isenta de quaisquer riscos desfavoráveis aos co-investigadores
e aos alunos.
Û O/a co-investigador/a poderá informar sobre a sua interrupção e ou retirada da
pesquisa sem qualquer justificação bem como solicitar a destruição da sua informação e da
sua identidade.

Eu__________________________________li os termos de consentimento ético desta


pesquisa, estou satisfatoriamente esclarecido/a, protegido/a e disposto/a a participar,
podendo retirar-me, sem prejudicá-la sempre que me convier.

Assinatura_____________________(participante). Data______________

Assinatura_____________________(investigador). Data______________

335
Anexo 3: Amostra de ficha de observação e reflexão de aulas

FICHA DE OBSERVAÇÃO E REFLEXÃO DE AULA


Conteúdo: Dieta Equilibrada
Ciclo: III
Título do ciclo: Interacção e participação a partir de materiais didácticos locais e de dois recursos linguísticos (L1 e L2)
Pergunta de pesquisa do ciclo: Como os materiais didácticos locais e o uso de dois recursos linguísticos condicionam a
interacção e participação qualitativa dos alunos na aula?
Critérios: Padrão de julgamento:
• Participação consciente, qualitativa e activa • Nível de participação consciente, qualitativa e
dos alunos condicionado pelo material local activa dos alunos
e disposição de dois recursos linguísticos • Disposição dos alunos para participar da aula
• Qualidade de interacção em duas línguas • Interacção qualitativa na construção do
• Aprendizagem colaborativa suscitado pelos conhecimento
dois recursos linguísticos e os materiais • Qualidade da aprendizagem dinamizada pelos
locais recursos linguísticos e materiais locais
• Flexibilidade e dinâmica qualitativa da aula • Facilitação do ensino e aprendizagem pela
parte do prof. e dos

1. Que tipo de qualidade pedagógica é observável nesta aula?

2. Que tipo de qualidade de interacção e participação os alunos demonstram


ao terem dois recursos linguísticos e os materiais locais na aula?

3. Como decorre o ensino e aprendizagem tendo na aula dois recursos


linguísticos e materiais locais?

4. Qual é o tipo de dinâmica e de flexibilidade que se observa na aula?

5. O que não correu bem ou mal nesta aula?

6. O que deve ser melhorado ou implementado na próxima aula a partir da


observação e reflexão desta aula?

337
Anexo 4: Amostra de aulas submetidas ao processo de validação interna

II Fase de Pesquisa de Campo

Workshop de Crítica e Validação Interna da Pesquisa

Esta pesquisa estuda sobre os níveis de interacção e de participação dos alunos e os níveis
de dinâmica e flexibilidade do ensino e aprendizagem quando, pela primeira vez, os
alunos aprendem em L2, língua de instrução na 4ª classe, depois de três classes instruídas
em LM.
As constatações das aulas observadas nesta pesquisa mostraram-nos que os alunos não
interagem e não participam de forma aberta, flexível e segura em L2 como o faziam nas
classes anteriores instruídas em L1. As aulas são inflexíveis e monótonas. Os professores
envidam muito esforço físico e linguístico para desenvolver a aula. A partir destas
constatações, a nossa pesquisa aposta no uso simultâneo e sem separação de duas línguas
(L2 e LM) e dois saberes (saberes dos livros e saberes locais), desafia-se a revitalizar os
níveis elevados de:

(i) Interacção e participação dos alunos na aula;


(ii) Dinâmica e flexibilidade do ensino e aprendizagem; e
(iii) Facilitação do ensino e aprendizagem tanto para o/a professor/a
como para os alunos.

A partir de resultados preliminares alcançados nesta II Fase de pesquisa, decidimos


organizar a I sessão de Crítica e Validação da pesquisa para que em conjunto, possamos
discutir e julgar o valor pedagógico da pesquisa como avaliadores externos que têm
experiências de leccionação na educação bilingue. Assim, nesta sessão somos solicitados
a julgar, criticar, questionar, sugerir e advertir de forma aberta e sem receios ou
represálias, com o objectivo de melhorar a qualidade de pesquisa. Na prática, a nossa
missão permite-nos:

(i) Apreciar criticamente os resultados preliminares alcançados;


(ii) Avaliar de forma crítica os resultados alcançados tendo em
conta os objectivos desta pesquisa;
(iii) Apresentar perguntas, dúvidas, pedir esclarecimentos sobre os
pontos que achar necessários para a compreensão e reflexão
sobre os resultados até então alcançados;
(iv) Valorar o impacto dos resultados da pesquisa na melhoria da
qualidade de ensino e aprendizagem tendo em conta o problema
que motivou a pesquisa;
(v) Criticar o que acharmos necessário e relevante para esta
pesquisa;
(vi) Validar o benéfico e reprovar o desnecessário;

339
(vii) Sugerir ideias, propostas que acharmos convenientes para elevar
a qualidade do nosso ensino e aprendizagem em pesquisa.

O que nos motiva a organizar estas sessões é que confiámos e acreditámos que os
professores têm ideias, sugestões, análises, críticas, opiniões que enriqueceriam cada vez
mais a nossa pesquisa. O provérbio citshwa diz “a tihlo agizvikoti kutibuveta acidokoro
hagoce”. Nós que estamos nas escolas de Acção e Inovação, sentimo-nos incapazes de
avaliar com imparcialidade os resultados que alcançamos. Por esta razão, a nossa pesquisa
está aberta a aproximar-se aos professores e tê-los como avaliadores e críticos externos
que acompanham o percurso da pesquisa e dão apoio identificando os pontos negativos,
positivos e sugerindo novas ideias.
Nas páginas que se seguem, apresentamos extractos de 3 aulas colhidas em 3 escolas, duas
de Acção Inovadora e uma de Controle e a Ficha de Avaliação e Crítica. Durante o
workshop, poderemos exibiremos vídeos para evidenciar as aulas.
Como devemo-nos organizar para o workshop? Sigamos os seguintes passos: (i) Leia e
memorize os critérios e padrões de julgamento patentes na página a seguir; (ii) Leia as
notas de observação e transcrição da aula, avalie os critérios e padrões de julgamento da
aula e tome notas pessoais numa folha a parte (reflexões, perguntas, críticas, análises,
comentários, sugestões etc e etc); e (iii) Preencha a Ficha de Avaliação e Crítica patentes
no fim deste material.

Aula 1
Estratégia da aula do ciclo I: Usar as duas línguas nas intervenções interactivas e
participativas na aula. A aula foi estrutura em momentos “fases” muito focalizados ao
incentivo à interacção e participação dos alu. tanto em L1 como em L2 no ensino do
conteúdo “Cadeia Alimentar – Interdependência entre os Seres Vivos”.
Título do ciclo: Dispertar a participação aberta dos alunos na aula
Pergunta de pesquisa do ciclo: Como a L1 e a L2 impulsionados pelos prof. activam
a participação flexível, aberta e activa dos alunos?

Critérios Padrão de julgamento


• Participação espontânea, • Nível de participação
aberta e activa voluntário dos alunos
• Disposição e motivação dos voluntários
alunos em intervir na aula • Livre expressão dos alunos
• Interacção conversacional • Participação segura e activa
prof. – alunos e alunos – dos alunos
prof. • Colaboração dos alunos na
• Aprendizagem colaborativa aprendizagem
baseada em duas línguas • Facilitação da aprendizagem
• Livre participação dos em duas línguas
alunos

340
Notas de observação e transcrição da aula

1. Prof.: então hoje, vamos lembrar antes da nossa aula , aquilo que estudámos na 3ª
classe sobre os seres (interrompe para os alu. responder, mas não respondem) vivos.
Estamos juntos? Silêncio. Estamos juntos? Alguns alu.: sim. Prof.: todos sabemos o que
são seres vivos? Silêncio. Sabemos o que são seres vivos? Heee... Quem sabe o que são
seres vivos? Silêncio. O que são seres vivos? Silêncio. Não estudaram isso na 3ª classe isso?
Silêncio. Estudaram na 3ª classe ou não? Silêncio. Quem sabe? Silêncio. Siwumbwa sa
wutomi, masiziva? Silêncio. Masiziva siwumbwa sa wutomi? Silêncio. Heee... masiziva
siwumbwa sa wutomi? Silêncio. Heee... Migondidi siwumbwa sa wutomi? Heee...?
Silêncio. I cani siwumbwa sa wutomi? Silêncio. Heee...? I cani siwumbwa sa wutomi? Ou
um menino para dar um exemplo wa siwumbwa sa wutomi asizivaku. Silêncio. Heee...
Ciwumbwa cokari ciku ni wutomi, acizivaku kasi hingagonda ka 3ª. Tur. em silêncio.
Alguns alu. continuam a copiar dos dados. Silêncio e silêncio muito forte. Prof.: vamos
falar? Silêncio. Siwumbwa siku ni wutomi misizivaku. Silêncio frustante. Khamisizivi
siwumbwa sa wutomi? Heee... bhonyani por exemplo, mayiziva bhonyani? Silêncio?
Mayiziva bhonyani? Tur. alguns: hiii... I cani bhonyani? Silêncio? Heee... I cani
bhonyani? Heee... O prof. e nós todos ficamos em pânico uma vez que a tur. não reage
segundo previamos na nossa planificação. Em nossa previsão, esperavamos que os alunos
fizessem uma ponte entre a noção de siwumbwa sa wutomi em L1 e seres vivos em L2
(este não conhecem). Pelas evidências de sala de aulas, os alunos não estão reagem mesmo
aplicando-se a L1. O prof. estratégico que é, saiu da sala e trouxe consigo uma planta e
uma pedra como forma de reactivar os alunos, distinguindo os seres vivos dos não vivos.

2. O prof. possuindo uma pedra e uma planta dirigi-se à tur.: I ncani asi? Aci i cani aci?
Tur.: difilori. Prof.: Aci? Tur.: dirigwi. Prof.: ngu cihi ciku ni wutomi aha. Tur. pensa.
Prof.: ngu ciku ni wutomi? Tur. alguns murmuram: cifilori. Prof.: heee. Tur. alguns:
cifilori. Prof.: I cani? Tur. alguns: cifilori. Prof.: m´mweyo basi aciwomba, ngu cihi ciku
ni wutomi? Alu.2 voluntariamente: cifilori. Prof. levantando a maão da pedra: aciya? A
alu.2 e a tur. ficam calados. Prof.: dirigwi dini wutomi? Alu.2 e a tur.: ahihi. Prof.: então,
siwumbwa sa wutomi ngu sihi (adianta a mão que tem a planta)? Silêncio. Prof. remata:
ngu sotshe sihari siku ni cani? Tur. coro baixo: siku ni wutomi. Prof.: siku ni cani? Tur.:
siku ni wutomi. Prof.: siku ni wutomi. Estamos juntos? Tur.: sim. Prof.: então ka sotshe
simaha si siku ni wutomi, hingamixawulani siwumba ou qualquer cihari kani i cani
micizivaku cidi ni wutomi. (---) Por exemplo nawomba ku khani dirigwi (escreve no
quadro), dirigwi, tem vida? É um ser vivo? Tur. em coro fraco: não. Prof.: então
hingamiwombetelani asi misizivaku anu siku ni wutomi. Vamos falar. Um voluntário de
cada vez. Surpreendentemente, logo em centésimos de segundos, um alu.3 levanta-se:
mati. Prof.: mati, ihuuu... (escreve no quadro). Prof.: mati... Alu.4: n´thu. Prof.: n´thu
(escreve no quadro). N´thu, ok. Dhumani adikhene n´thu. Ngu cilungu n´thu i ca? Tur.
em coro murmurado: pessoa. Prof.: heee... um minuto, um minuto, um menino para falar.
Havia dois voluntários mas é que disse, alu.5: pessoa. Prof.: em voz alta? Alu.5: pessoa.
Prof.: pessoa – repete o prof. e escreve no quadro. Prof.: huuu... cimwani ciwumbwa ca
wutomi? Outro sere vivo, outro menino para dizer. Alu.6: ciwonga. Prof.: hiii... Alu.6.:
cimanga. Prof.: womba. Alu.6: cimanga. Prof.: aheee... temos que falar em voz alta
341
(escreve no quadro e diz: cimanga). Prof.: outro menino para dizer cimanga em português.
O que é cimanga em português? Tulani levanta-se mas o prof. orienta: ehhh... primeiro
é levantar a mão. Quem quer falar levanta a mão. Alu.7 levantou a mão mas havia mais
alunos com mão não bem levantada. O prof.: ok. O prof. escolhe: Layani. Layani: gato.
Prof.: em voz alta. Layani: gato. Prof.: gato (escreve no quadro). Prof.: ok, outro
voluntário, aciwomba outro sere vivo que conhece. Levanta a mão que quer falar. Há
duas mãos no ar. Prof.: ok, só estão a falar os meninos. Gosto de ver também as meninas
a falar. De repente uma alu.8 põe-se de pé. Prof.: ok, vamos deixar Lipisu falar depois vai
falar Zelani. Lipisu: phongo. Prof.: heee... Lipisu: phongo. Prof.: temos que falar em voz
alta (omissão por não ouvir-se bem). Phongo (escreve no quadro). Phongo, um menino
para nós dizer phongo em português o que é? Muitos alunos predispõem-se a levantar
para responder em português. Uma alu.9 no meio de tantos é escolhida pelo prof. para
responder. Kulani, alu.9: cabrito.
3. No acto de levantamento do seres vivos os alunos sim, estavam mais participativos que
nunca teriamos visto antes. A estratégia que tenhamos proposto para a equivalência de
palavras em duas línguas contribuem significativamente à participação, dinâmica e
flexibilidade da aula. É uma interacção e participação livre e espontânea em ambas
línguas (min 12.30 a 17.48). Os alunos, todos mostram-se motivados para expôr as suas
ideias e resposta em forma de chuva de ideias, mas o fazem em voz baixa e alguma
timidez. É verdade, as vozes dos alu. são inaudíveis. Não se ouvem a primeira vez. Este é
um ponto a melhorar nos próximos ciclos de acção. A tur. não mencionava as plantas. O
prof, vendo esta exclusão, chama atenção aos alunos nos seguintes termos: Ok, mas há
uma aqui. Ka siwa siku ni wutomi, hadivala minhonga yokari. Estão a perceber. Estamos
a esquecer as plantas. Vocês há pouco tempo disseram que (pausa, levanta a planta pata
tur.) isto cifilori, é um ser vivo, não é? Alguns alu.: sim. Prof.: quando eu trouxe a planta
e a pedra, vocês disseram que a planta é um sere vivo, mas aqui nos exemplos que estamos
a trazer, não estou a ver nenhuma planta. Hadivala minhonga kasi ngu cani? Munhonga
yokari miyidzivaku to khanhu está dentro do conjunto dos seres vivos. Vamos falar. A tur.
de forma espontânea age. Vi três maozinhas no ar. O prof. escolhe a Canani que se
levanta e em voz baixa diz: mudimwa. Prof.: heee... Canani: mudimwa. O prof. escreveu
no quadro. Quando este dizia “ok, mudimwa em português” e vira-se novamente para a
tur., três alu. já tentavam levantar-se voluntariamente para dizer outras plantas. Prof.: ok,
mudimwa em português? Há alu. voluntários que o prof. decidiu escolher os alu. que
ainda não tinham participado, falado. Prof.: Koxi já falou, quero aqueles que ainda não
falaram, vamos lá voluntários, quero aqueles que não falaram ainda. Alguns alu. estão
entusiasmados em falar, mas o interesse do prof. em envolver a todos faz com que estes
tenham que indicar os que ainda não falaram na aula. Prof.: quem ainda não falou,
voluntários. Uma alu. diz: Rumani. Prof.: ahhh... voluntários. Thelani, vamo lá fa... estão
a falar mesmas pessoas. Thelani levanta-se e pensa. Prof. pergunta: mudimwa ngu cilingu
i cani? Thelani mante-se no silêncio. Prof.: voluntário, quem quer ajudar nossa amiga? O
prof. tem a oportunidade de escolher entre os alu. voluntários aqueles que ainda não
falaram uma evidência clara dos critérios e padrões de julgamento relativos à participação
espontânea dos alu. motivados pela L1 e L2 (equivalência lexical). Prof.: Kalani já falou,

342
Lupisu já falou, voluntários (2x). Vale referir aqui que não houve para além de uma alu.
de frente que levantou a mão. O prof. escolhe uma alu. que não levantou a mão. Prof.:
Phayila levantou a mão, mudimwa (pausa) em português? Ajuda lá nossa amiga (não se
percebe). A alu. demora levantar-se ao levantar-se mostra-se insegura e meio tímida,
responde de forma inaudível e em voz baixíssima. Prof.: fale em voz alta. Ouviu Rutha?
Pergunta lá, o que disse? Pergunta em voz alta, o que você disse? Rutha, meio tímida e
meiga pergunta: o que você disse? Phayila repete em voz um pouco audível: laranja. Prof.
dirigindo-se à Rutha: ouviu? Rutha: sim. Prof.: disse o quê? Rutha: laranja. Prof. à tur.:
laranja ngu cicopi i cani? Tur. em voz baixa: didimwa. Prof.: heee (3x). Tur.: didimwa
(3x). Prof.: o quê (2). Tur.: didimwa (2x). Prof.: didimwa, não é. Então se é que laranja
didimwa adile dakona dile, n´nhonga wa kona i cani, heee...? Awuzu? Awuzu, de pé:
laranjeira. Prof.: em voz alta? Awuzu: laranjeira. Prof. repete e escreve no quadro. Prof.
manda a Thelani repetir duas vezes a palavra “laranjeira” que ela não conseguia dizer
em português.
4. Os alunos intervieram com outros exemplos de plantas como seres vivos de forma mais
espontânea e dinâmica mas o problema que se verifica por enquanto é o uso da voz baixa.
O prof. exige que os alu. falem em voz alta. Este problema possivelmente é local mas que
na nossa pesquisa teremos que tomá-lo em sério, inventando novas estratégias de
superação. No seguimento da aula, o prof. orienta uma actividade que consistia na
classificação dos seres vivos em três categorias de alimentação: seres vivos que se
alimentam de plantas, seres vivos que se alimentam de animais e seres vivos que se
alimentam de seres vivos animais e plantas. Prof.: mas se nós voltarmos a ver esses seres
vivos, eee... vimos que yaho minhonga, saho sihari, não é? Estamos juntos? Tur. voz
baixa: sim. Prof.: então eu só quero saber quais são, destes seres vivos, vamos tirar as
plantas para aqui. Estamos juntos? Alguns alu. em voz baixa: sim. Asi siku aha, hithavisa
minhonga hiciyibhala ahawa, estamos juntos? Tur. silêncio. Prof.: hithavisa minhonga
hiciyibhala ahawa. Quais são as pessoas estranhas aqui, mbongola i nhonga? Tur. coro
murmurado: não. Prof.: eee... quais são pessoas estranhas aqui? A tur. pensa e não se
activa no diálogo. Prof.: quem pode tirar nome de uma planta e escrever alí? Há três mãos
de voluntários no ar, dentre elas uma que participa pela primeira vez da aula. Ela foi ao
quadro, escreveu uma planta na classe dos seres vivos que se alimentam de plantas. A tur.
presta atenção à primeira alu. e depois os demias foram realizando a actividade de forma
voluntária. Aqui os alunos tinham que pensar e classificar os seres vivos. Foi uma óptima
oportunidade em que os alu. participavam da aula de forma aberta. Compreendem muito
bem a actividade que é explicada em L2 e L1 é preparada ou realizada em grupos. Cada
grupo e aos pares devia indicar os animais que comem plantas, animais e animais e
plantas. A resolução foi feita de forma muito interessante porque cada dupla tinha que
levantar de forma ordinária apresentar proposta de seres vivos por cada classe. Os alunos
tinham a liberdade de acrescentar outros animais para além dos levantados e escritos no
quadro. Os alu. interagem aos pares em plena aula algo que não se verificava nas outras
aulas. Vemos alunos empenhados, a interagir em voz baixinha supostamente em L1. O
prof. verifica par por par.

343
5. Prof,: Ok, podemos começar daqui. Animais que só comem plantas, este grupo quais
são (este grupo tinha ficado com a responsabilidade de classificar seres vivos que se
alimentam de plantas). Asi sakudya minhonga basi, sakudya minhonga, mwasi. Uma al.10
de frente levanta-se, o prof. decide orientar que a dupla que quer falar deve pôr a mão no
ar. Duas duplas alu. de frente e de trás põem as mãos no ar. Prof.: hiii... vamo lá começar
daqui (referindo-se à dupla de frente). Alu.10 em voz baixa e tímida: phongo. O quê.
Alu.10: phongo. Prof.: phongo. Em português Canani phongo é o quê? Canani: cabrito.
Prof.: a seguir? Alu.11: homu. Prof.: fale alto. Chkani, homu em português o que é?
Chekani (voz baixinha): boi. Prof.: É. Chekani: boi. Prof.: boi. Ahiii... a seguir. Duas alu.
que formam o mesmo par levantam-se em simultâneo. Uma, a Alu. 12: burro. Prof.: em
português, ahhh... disse em português, em cicopi? Alu.13: buru. Prof.: heee... em cicopi.
Alu.13: buru. Prof.: em cicopi burro o que é afinal? Tur.: mbongola. Prof.: É. Tur. voz
alta: mbongola. Prof.: mbongola, não é. A seguir. Animais que só comem capim ou
plantas. A alu.14 do quarto par do grupo não foi capaz de apresentar a sua resposta. A
colega levantou-se, o prof. recpitulou o que se tinha adiantado e ela, alu.15 diz:
hipopótamo. Prof.: muito bem (escreveu no quadro). Muito obrigado, podem sentar.
Vamos a este grupo (grupo dos animais que comem animais). Asi sakudya basi nyama
(3x), heee... vamos começar (pausa), animais que só comem carne, asi sa kuhanya ngu
nyama basi. Hiii... vamos. Alu.15: gato. Prof.: heee... Alu.15: gato. Prof.: gato (escreve no
quadro). Gato. Gato em cicopi o que é? Ngu cicopi i cani gato? Alu.16 (voz baixa)
cimanga. Prof.: em voz alta. Alu.16: cimanga. Muito bem. A seguir. Asi. Alu.17: yimbwa.
Prof.: heee.... Alu17: yimbwa. Prof.: em voz alta. Alu.17: yimbwa. Prof.: eee... o que é em
português yimbwa. Alu.18: cão. Prof.: cão. Huuu... OK. Alu.19 (em voz baixa):
ngonyamu. Prof.: heee... Alu.19: ngonyamu. Prof.: em voz alta. Alu.19: ngonyamu. Prof.:
em voz alta Iziyani. Iziyani, alu.19: NGONYAMU. Prof.: ngonyamu. Em português,
Dimirwani? Dimirwani (alu.20) não conhece o equivalente em português. Não se levanta.
Prof.: NGONYAMU ngu cilungu i cani ngonyamu? Dimirwani não responde logo a prof.
pergunta à tur.: i mani ayidzivaku ngonyamu ngu cilungu. Uma mão no ar. Prof.: ok. O
alu.21 levantou-se (nunca tinha participado) e disse: crocodilo. Prof.: heee... Alu.21:
crocodilo. Prof.: ok. Outro que quer nos ajudar, crocodilo ngu cilungu i cani? (pausa) A
tur. não se predispõe a dizer em português. Prof. persiste: quem quer nos ajudar? Tru.
Silêncio. Prof.: voluntários, i yaaa... (riso breve), ngonyamu. Cakunga n´thu n´khoheni ka
cona cidi ni matoya mu (gesticula sobre a cara). Tur. silêncio. Ca khohe caku, n´kondoni
wa kona wonga bwonga wa n´thu mas ya ferenti hambi ya mandzani conga ya n´thu,
caku loko cicitsimbila co iii... (imitando o andar do leão com os braços esticados como
quem anda) cidi ni matoya otala n´khoheni. Tur. silêncio. Prof.: hiii... A tur. não consegue
adivinhar tal animal provavelmente por ser estranho ao seu ambiente local. Não há leões
na área muito menos acesso à televisão o que poderia ajudar na adivinha dos alu. O prof.
acabou anunciando: leão. Mais, mais, a seguir. Já hini siraru já. Simwanyani? Silêncio.
Prof.: grupo atrás. Silêncio. Sihari sakudya nyama basi. A dupla não intervem
possivelmente por não terem alistado os animais que apenas comem carne. Esta foi uma
dentre as restantes evidências desta fase da aula em que há alu. que não dão resposta.
Depois, quando não espera, saiu do alu.22: coelho. Prof.: i cani kambe coelho? Alu.22
silêncio. Prof.: quem pode dizer, coelho? Quatro e depois sete voluntários. Prof. enquanto
344
tenta escolher dentre os voluntários vai dizendo: coelho, coelho, coelho sim Hathani.
Hathani: civhundza. Prof.: civhundza cihanya ngu nyama? Tur. coro fraco: ahihi. Prof.:
cihanya ngu nyama civhundza? Tur. coro baixo: ahihi. Prof.: hingaciveka hayi civhundza
aha? Cikhala hayi. Tur. em coro murmura certadamente mas inaudível. Prof.: cikhala
hayi civhundza? Tur. coro: ka mwasi. Prof.: heee... ka mwasi. Prof.: ka mwasi. Então
coelho deve vir aqui. Então por fim temos animais (lê e escreve com pausas) que (---)
comem (---)plantas (---) e carnes. Esse grupo, era vosso trabalho. Aheee... Sem demora,
levanta o alu.23: pato. Prof.: heee... Alu.23: pato. Prof.: pato. Didya cani dipatu? Alu.23:
nyama ni (não compreendi). Prof.: ka nyama dingadya ca? Dingadya ca? Alu.23: sirambu.
Prof.: sirambu só. Sirambu (hesitou) (---) dipatu didhunda kukhala thembweni, dinamana
sirambu n´thembweni?. Tru.: ahihi. Prof.: Heee... Ahivhuneni, i cani caku dingadya
dipatu. I cani? Há alu. que hesitam a levantar-se num clima de sala de aulas agradável.
Alu.24: mafaka. Prof.: ni cani kambe? Alu.25: dizongonono. Prof. repete:
DIZONGONONO, uhuuu... ni cani kambe? Hidikhantu dipatu dadya mafaka
dizongonono ni cani kambe? Alu.24: tinyemba. Prof.: tinyemba, ni cani kambe? Alu.26:
nyakhele. Prof.: nyakhele. Alu.27: sidhodho. Prof.: sidhodho. Ok pode ficar aqui. Dadya
sidhodho, sidhodho i nyama não é isso? I mafaka é uma planta. Então dipatu está certo.
Dadya nyama, dadya maplantas.
Ficha de Avaliação e Crítica dos Resultados Alcançados

Terminada a leitura das notas de observação e transcrição de aula, por favor, escreva as
suas reflexões, críticas, sugestões, comentários, perguntas nesta ficha, guiando-se pelos
seguintes temas:

1. Participação aberta, activa e voluntária dos alunos.

2. Nível de interacção e participação dos alunos.

3. Facilitação do ensino e aprendizagem.

Aspectos positivos:

Aspectos negativos:

Comentários:

Perguntas:

Críticas:

345
Anexo 5: Amostra de aulas submetidas ao processo de validação externa

II Fase de Pesquisa de Campo

Workshop de Crítica e Validação Externa da Pesquisa

Esta pesquisa estuda sobre os níveis de interacção e de participação dos alunos e os níveis de
dinâmica e flexibilidade do ensino e aprendizagem quando, pela primeira vez, os alunos aprendem
em L2, língua de instrução na 4ª classe, depois de três classes instruídas em LM.
As constatações das aulas observadas nesta pesquisa mostraram-nos que os alunos não interagem
e não participam de forma aberta, flexível e segura em L2 como o faziam nas classes anteriores
instruídas em L1. As aulas são inflexíveis e monótonas. Os professores envidam muito esforço físico
e linguístico para desenvolver a aula. A partir destas constatações, a nossa pesquisa aposta no uso
simultâneo e sem separação de duas línguas (L2 e LM) e dois saberes (saberes dos livros e saberes
locais), desafia-se a revitalizar os níveis elevados de:

(iv) Interacção e participação dos alunos na aula;


(v) Dinâmica e flexibilidade do ensino e aprendizagem; e
(vi) Facilitação do ensino e aprendizagem tanto para o/a professor/a como
para os alunos.

A partir de resultados preliminares alcançados nesta II Fase de pesquisa, decidimos organizar a I


sessão de Crítica e Validação da pesquisa para que em conjunto, possamos discutir e julgar o valor
pedagógico da pesquisa como avaliadores externos que têm experiências de leccionação na
educação bilingue. Assim, nesta sessão somos solicitados a julgar, criticar, questionar, sugerir e
advertir de forma aberta e sem receios ou represálias, com o objectivo de melhorar a qualidade de
pesquisa. Na prática, a nossa missão permite-nos:

(viii) Apreciar criticamente os resultados preliminares alcançados;


(ix) Avaliar de forma crítica os resultados alcançados tendo em conta os
objectivos desta pesquisa;
(x) Apresentar perguntas, dúvidas, pedir esclarecimentos sobre os pontos
que achar necessários para a compreensão e reflexão sobre os
resultados até então alcançados;
(xi) Valorar o impacto dos resultados da pesquisa na melhoria da qualidade
de ensino e aprendizagem tendo em conta o problema que motivou a
pesquisa;
(xii) Criticar o que acharmos necessário e relevante para esta pesquisa;
(xiii) Validar o benéfico e reprovar o desnecessário;

347
(xiv) Sugerir ideias, propostas que acharmos convenientes para elevar a
qualidade do nosso ensino e aprendizagem em pesquisa.

O que nos motiva a organizar estas sessões é que confiámos e acreditámos que os professores têm
ideias, sugestões, análises, críticas, opiniões que enriqueceriam cada vez mais a nossa pesquisa. O
provérbio citshwa diz “a tihlo agizvikoti kutibuveta acidokoro hagoce”. Nós que estamos nas
escolas de Acção e Inovação, sentimo-nos incapazes de avaliar com imparcialidade os resultados
que alcançamos. Por esta razão, a nossa pesquisa está aberta a aproximar-se aos professores e tê-
los como avaliadores e críticos externos que acompanham o percurso da pesquisa e dão apoio
identificando os pontos negativos, positivos e sugerindo novas ideias.
Nas páginas que se seguem, apresentamos extractos de 3 aulas colhidas em 3 escolas, duas de
Acção Inovadora e uma de Controle e a Ficha de Avaliação e Crítica. Durante o workshop,
poderemos exibiremos vídeos para evidenciar as aulas.
Como devemo-nos organizar para o workshop? Sigamos os seguintes passos: (i) Leia e memorize
os critérios e padrões de julgamento patentes na página a seguir; (ii) Leia as notas de observação e
transcrição da aula, avalie os critérios e padrões de julgamento da aula e tome notas pessoais numa
folha a parte (reflexões, perguntas, críticas, análises, comentários, sugestões etc e etc); e (iii)
Preencha a Ficha de Avaliação e Crítica patentes no fim deste material.

Aula 1
Estratégia da aula do ciclo I: Usar as duas línguas nas intervenções interactivas e participativas
na aula. A aula foi estrutura em momentos “fases” muito focalizados ao incentivo à interacção e
participação dos alu. tanto em L1 como em L2 no ensino do conteúdo “Cadeia Alimentar –
Interdependência entre os Seres Vivos”.
Título do ciclo: Dispertar a participação aberta dos alunos na aula
Pergunta de pesquisa do ciclo: Como a L1 e a L2 impulsionados pelos prof. activam a
participação flexível, aberta e activa dos alunos?

Critérios Padrão de julgamento


• Participação espontânea, • Nível de participação
aberta e activa voluntário dos alunos
• Disposição e motivação dos voluntários
alunos em intervir na aula • Livre expressão dos alunos
• Interacção conversacional • Participação segura e activa
prof. – alunos e alunos – dos alunos
prof. • Colaboração dos alunos na
• Aprendizagem colaborativa aprendizagem
baseada em duas línguas • Facilitação da aprendizagem
• Livre participação dos em duas línguas
alunos

348
Notas de observação e transcrição da aula
1. Prof.: então hoje, vamos lembrar antes da nossa aula, aquilo que estudámos na 3ª classe sobre
os seres (interrompe para os alu. responder, mas não respondem) vivos. Estamos juntos? Silêncio.
Estamos juntos? Alguns alu.: sim. Prof.: todos sabemos o que são seres vivos? Silêncio. Sabemos o
que são seres vivos? Heee... Quem sabe o que são seres vivos? Silêncio. O que são seres vivos?
Silêncio. Não estudaram isso na 3ª classe isso? Silêncio. Estudaram na 3ª classe ou não? Silêncio.
Quem sabe? Silêncio. Siwumbwa sa wutomi, masiziva? Silêncio. Masiziva siwumbwa sa wutomi?
Silêncio. Heee... masiziva siwumbwa sa wutomi? Silêncio. Heee... Migondidi siwumbwa sa
wutomi? Heee...? Silêncio. I cani siwumbwa sa wutomi? Silêncio. Heee...? I cani siwumbwa sa
wutomi? Ou um menino para dar um exemplo wa siwumbwa sa wutomi asizivaku. Silêncio.
Heee... Ciwumbwa cokari ciku ni wutomi, acizivaku kasi hingagonda ka 3ª. Tur. em silêncio.
Alguns alu. continuam a copiar dos dados. Silêncio e silêncio muito forte. Prof.: vamos falar?
Silêncio. Siwumbwa siku ni wutomi misizivaku. Silêncio frustante. Khamisizivi siwumbwa sa
wutomi? Heee... bhonyani por exemplo, mayiziva bhonyani? Silêncio? Mayiziva bhonyani? Tur.
alguns: hiii... I cani bhonyani? Silêncio? Heee... I cani bhonyani? Heee... O prof. e nós todos
ficamos em pânico uma vez que a tur. não reage segundo previamos na nossa planificação. Em
nossa previsão, esperavamos que os alunos fizessem uma ponte entre a noção de siwumbwa sa
wutomi em L1 e seres vivos em L2 (este não conhecem). Pelas evidências de sala de aulas, os alunos
não estão reagem mesmo aplicando-se a L1. O prof. estratégico que é, saiu da sala e trouxe consigo
uma planta e uma pedra como forma de reactivar os alunos, distinguindo os seres vivos dos não
vivos.
2. O prof. possuindo uma pedra e uma planta dirigi-se à tur.: I ncani asi? Aci i cani aci? Tur.:
difilori. Prof.: Aci? Tur.: dirigwi. Prof.: ngu cihi ciku ni wutomi aha. Tur. pensa. Prof.: ngu ciku ni
wutomi? Tur. alguns murmuram: cifilori. Prof.: heee. Tur. alguns: cifilori. Prof.: I cani? Tur.
alguns: cifilori. Prof.: m´mweyo basi aciwomba, ngu cihi ciku ni wutomi? Alu.2 voluntariamente:
cifilori. Prof. levantando a maão da pedra: aciya? A alu.2 e a tur. ficam calados. Prof.: dirigwi dini
wutomi? Alu.2 e a tur.: ahihi. Prof.: então, siwumbwa sa wutomi ngu sihi (adianta a mão que tem
a planta)? Silêncio. Prof. remata: ngu sotshe sihari siku ni cani? Tur. coro baixo: siku ni wutomi.
Prof.: siku ni cani? Tur.: siku ni wutomi. Prof.: siku ni wutomi. Estamos juntos? Tur.: sim. Prof.:
então ka sotshe simaha si siku ni wutomi, hingamixawulani siwumba ou qualquer cihari kani i cani
micizivaku cidi ni wutomi. (---) Por exemplo nawomba ku khani dirigwi (escreve no quadro),
dirigwi, tem vida? É um ser vivo? Tur. em coro fraco: não. Prof.: então hingamiwombetelani asi
misizivaku anu siku ni wutomi. Vamos falar. Um voluntário de cada vez. Surpreendentemente,
logo em centésimos de segundos, um alu.3 levanta-se: mati. Prof.: mati, ihuuu... (escreve no
quadro). Prof.: mati... Alu.4: n´thu. Prof.: n´thu (escreve no quadro). N´thu, ok. Dhumani adikhene
n´thu. Ngu cilungu n´thu i ca? Tur. em coro murmurado: pessoa. Prof.: heee... um minuto, um
minuto, um menino para falar. Havia dois voluntários mas é que disse, alu.5: pessoa. Prof.: em voz
alta? Alu.5: pessoa. Prof.: pessoa – repete o prof. e escreve no quadro. Prof.: huuu... cimwani

349
ciwumbwa ca wutomi? Outro sere vivo, outro menino para dizer. Alu.6: ciwonga. Prof.: hiii...
Alu.6.: cimanga. Prof.: womba. Alu.6: cimanga. Prof.: aheee... temos que falar em voz alta (escreve
no quadro e diz: cimanga). Prof.: outro menino para dizer cimanga em português. O que é cimanga
em português? Tulani levanta-se mas o prof. orienta: ehhh... primeiro é levantar a mão. Quem
quer falar levanta a mão. Alu.7 levantou a mão mas havia mais alunos com mão não bem
levantada. O prof.: ok. O prof. escolhe: Layani. Layani: gato. Prof.: em voz alta. Layani: gato.
Prof.: gato (escreve no quadro). Prof.: ok, outro voluntário, aciwomba outro sere vivo que conhece.
Levanta a mão que quer falar. Há duas mãos no ar. Prof.: ok, só estão a falar os meninos. Gosto
de ver também as meninas a falar. De repente uma alu.8 põe-se de pé. Prof.: ok, vamos deixar
Lipisu falar depois vai falar Zelani. Lipisu: phongo. Prof.: heee... Lipisu: phongo. Prof.: temos que
falar em voz alta (omissão por não ouvir-se bem). Phongo (escreve no quadro). Phongo, um menino
para nós dizer phongo em português o que é? Muitos alunos predispõem-se a levantar para
responder em português. Uma alu.9 no meio de tantos é escolhida pelo prof. para responder.
Kulani, alu.9: cabrito.
3. No acto de levantamento dos seres vivos os alunos sim, estavam mais participativos que nunca
teriamos visto antes. A estratégia que tenhamos proposto para a equivalência de palavras em duas
línguas contribuem significativamente à participação, dinâmica e flexibilidade da aula. É uma
interacção e participação livre e espontânea em ambas línguas (min 12.30 a 17.48). Os alunos,
todos mostram-se motivados para expôr as suas ideias e resposta em forma de chuva de ideias, mas
o fazem em voz baixa e alguma timidez. É verdade, as vozes dos alu. são inaudíveis. Não se ouvem
a primeira vez. Este é um ponto a melhorar nos próximos ciclos de acção. A tur. não mencionava
as plantas. O prof, vendo esta exclusão, chama atenção aos alunos nos seguintes termos: Ok, mas
há uma aqui. Ka siwa siku ni wutomi, hadivala minhonga yokari. Estão a perceber. Estamos a
esquecer as plantas. Vocês há pouco tempo disseram que (pausa, levanta a planta pata tur.) isto
cifilori, é um ser vivo, não é? Alguns alu.: sim. Prof.: quando eu trouxe a planta e a pedra, vocês
disseram que a planta é um sere vivo, mas aqui nos exemplos que estamos a trazer, não estou a ver
nenhuma planta. Hadivala minhonga kasi ngu cani? Munhonga yokari miyidzivaku to khanhu
está dentro do conjunto dos seres vivos. Vamos falar. A tur. de forma espontânea age. Vi três
maozinhas no ar. O prof. escolhe a Canani que se levanta e em voz baixa diz: mudimwa. Prof.:
heee... Canani: mudimwa. O prof. escreveu no quadro. Quando este dizia “ok, mudimwa em
português” e vira-se novamente para a tur., três alu. já tentavam levantar-se voluntariamente para
dizer outras plantas. Prof.: ok, mudimwa em português? Há alu. voluntários que o prof. decidiu
escolher os alu. que ainda não tinham participado, falado. Prof.: Koxi já falou, quero aqueles que
ainda não falaram, vamos lá voluntários, quero aqueles que não falaram ainda. Alguns alu. estão
entusiasmados em falar, mas o interesse do prof. em envolver a todos faz com que estes tenham
que indicar os que ainda não falaram na aula. Prof.: quem ainda não falou, voluntários. Uma alu.
diz: Rumani. Prof.: ahhh... voluntários. Thelani, vamo lá fa... estão a falar mesmas pessoas.
Thelani levanta-se e pensa. Prof. pergunta: mudimwa ngu cilingu i cani? Thelani mante-se no
silêncio. Prof.: voluntário, quem quer ajudar nossa amiga? O prof. tem a oportunidade de escolher
entre os alu. voluntários aqueles que ainda não falaram uma evidência clara dos critérios e padrões

350
de julgamento relativos à participação espontânea dos alu. motivados pela L1 e L2 (equivalência
lexical). Prof.: Kalani já falou, Lupisu já falou, voluntários (2x). Vale referir aqui que não houve
para além de uma alu. de frente que levantou a mão. O prof. escolhe uma alu. que não levantou
a mão. Prof.: Phayila levantou a mão, mudimwa (pausa) em português? Ajuda lá nossa amiga (não
se percebe). A alu. demora levantar-se ao levantar-se mostra-se insegura e meio tímida, responde
de forma inaudível e em voz baixíssima. Prof.: fale em voz alta. Ouviu Rutha? Pergunta lá, o que
disse? Pergunta em voz alta, o que você disse? Rutha, meio tímida e meiga pergunta: o que você
disse? Phayila repete em voz um pouco audível: laranja. Prof. dirigindo-se à Rutha: ouviu? Rutha:
sim. Prof.: disse o quê? Rutha: laranja. Prof. à tur.: laranja ngu cicopi i cani? Tur. em voz baixa:
didimwa. Prof.: heee (3x). Tur.: didimwa (3x). Prof.: o quê (2). Tur.: didimwa (2x). Prof.: didimwa,
não é. Então se é que laranja didimwa adile dakona dile, n´nhonga wa kona i cani, heee...? Awuzu?
Awuzu, de pé: laranjeira. Prof.: em voz alta? Awuzu: laranjeira. Prof. repete e escreve no quadro.
Prof. manda a Thelani repetir duas vezes a palavra “laranjeira” que ela não conseguia dizer em
português.
4. Os alunos intervieram com outros exemplos de plantas como seres vivos de forma mais
espontânea e dinâmica mas o problema que se verifica por enquanto é o uso da voz baixa. O prof.
exige que os alu. falem em voz alta. Este problema possivelmente é local mas que na nossa pesquisa
teremos que tomá-lo em sério, inventando novas estratégias de superação. No seguimento da aula,
o prof. orienta uma actividade que consistia na classificação dos seres vivos em três categorias de
alimentação: seres vivos que se alimentam de plantas, seres vivos que se alimentam de animais e
seres vivos que se alimentam de seres vivos animais e plantas. Prof.: mas se nós voltarmos a ver
esses seres vivos, eee... vimos que yaho minhonga, saho sihari, não é? Estamos juntos? Tur. voz
baixa: sim. Prof.: então eu só quero saber quais são, destes seres vivos, vamos tirar as plantas para
aqui. Estamos juntos? Alguns alu. em voz baixa: sim. Asi siku aha, hithavisa minhonga hiciyibhala
ahawa, estamos juntos? Tur. silêncio. Prof.: hithavisa minhonga hiciyibhala ahawa. Quais são as
pessoas estranhas aqui, mbongola i nhonga? Tur. coro murmurado: não. Prof.: eee... quais são
pessoas estranhas aqui? A tur. pensa e não se activa no diálogo. Prof.: quem pode tirar nome de
uma planta e escrever alí? Há três mãos de voluntários no ar, dentre elas uma que participa pela
primeira vez da aula. Ela foi ao quadro, escreveu uma planta na classe dos seres vivos que se
alimentam de plantas. A tur. presta atenção à primeira alu. e depois os demias foram realizando a
actividade de forma voluntária. Aqui os alunos tinham que pensar e classificar os seres vivos. Foi
uma óptima oportunidade em que os alu. participavam da aula de forma aberta. Compreendem
muito bem a actividade que é explicada em L2 e L1 é preparada ou realizada em grupos. Cada
grupo e aos pares devia indicar os animais que comem plantas, animais e animais e plantas. A
resolução foi feita de forma muito interessante porque cada dupla tinha que levantar de forma
ordinária apresentar proposta de seres vivos por cada classe. Os alunos tinham a liberdade de
acrescentar outros animais para além dos levantados e escritos no quadro. Os alu. interagem aos
pares em plena aula algo que não se verificava nas outras aulas. Vemos alunos empenhados, a
interagir em voz baixinha supostamente em L1. O prof. verifica par por par.

351
5. Prof,: Ok, podemos começar daqui. Animais que só comem plantas, este grupo quais são (este
grupo tinha ficado com a responsabilidade de classificar seres vivos que se alimentam de plantas).
Asi sakudya minhonga basi, sakudya minhonga, mwasi. Uma al.10 de frente levanta-se, o prof.
decide orientar que a dupla que quer falar deve pôr a mão no ar. Duas duplas alu. de frente e de
trás põem as mãos no ar. Prof.: hiii... vamo lá começar daqui (referindo-se à dupla de frente).
Alu.10 em voz baixa e tímida: phongo. O quê. Alu.10: phongo. Prof.: phongo. Em português
Canani phongo é o quê? Canani: cabrito. Prof.: a seguir? Alu.11: homu. Prof.: fale alto. Chkani,
homu em português o que é? Chekani (voz baixinha): boi. Prof.: É. Chekani: boi. Prof.: boi. Ahiii...
a seguir. Duas alu. que formam o mesmo par levantam-se em simultâneo. Uma, a Alu. 12: burro.
Prof.: em português, ahhh... disse em português, em cicopi? Alu.13: buru. Prof.: heee... em cicopi.
Alu.13: buru. Prof.: em cicopi burro o que é afinal? Tur.: mbongola. Prof.: É. Tur. voz alta:
mbongola. Prof.: mbongola, não é. A seguir. Animais que só comem capim ou plantas. A alu.14
do quarto par do grupo não foi capaz de apresentar a sua resposta. A colega levantou-se, o prof.
recpitulou o que se tinha adiantado e ela, alu.15 diz: hipopótamo. Prof.: muito bem (escreveu no
quadro). Muito obrigado, podem sentar. Vamos a este grupo (grupo dos animais que comem
animais). Asi sakudya basi nyama (3x), heee... vamos começar (pausa), animais que só comem
carne, asi sa kuhanya ngu nyama basi. Hiii... vamos. Alu.15: gato. Prof.: heee... Alu.15: gato. Prof.:
gato (escreve no quadro). Gato. Gato em cicopi o que é? Ngu cicopi i cani gato? Alu.16 (voz baixa)
cimanga. Prof.: em voz alta. Alu.16: cimanga. Muito bem. A seguir. Asi. Alu.17: yimbwa. Prof.:
heee.... Alu17: yimbwa. Prof.: em voz alta. Alu.17: yimbwa. Prof.: eee... o que é em português
yimbwa. Alu.18: cão. Prof.: cão. Huuu... OK. Alu.19 (em voz baixa): ngonyamu. Prof.: heee...
Alu.19: ngonyamu. Prof.: em voz alta. Alu.19: ngonyamu. Prof.: em voz alta Iziyani. Iziyani,
alu.19: NGONYAMU. Prof.: ngonyamu. Em português, Dimirwani? Dimirwani (alu.20) não
conhece o equivalente em português. Não se levanta. Prof.: NGONYAMU ngu cilungu i cani
ngonyamu? Dimirwani não responde logo a prof. pergunta à tur.: i mani ayidzivaku ngonyamu
ngu cilungu. Uma mão no ar. Prof.: ok. O alu.21 levantou-se (nunca tinha participado) e disse:
crocodilo. Prof.: heee... Alu.21: crocodilo. Prof.: ok. Outro que quer nos ajudar, crocodilo ngu
cilungu i cani? (pausa) A tur. não se predispõe a dizer em português. Prof. persiste: quem quer nos
ajudar? Tru. Silêncio. Prof.: voluntários, i yaaa... (riso breve), ngonyamu. Cakunga n´thu
n´khoheni ka cona cidi ni matoya mu (gesticula sobre a cara). Tur. silêncio. Ca khohe caku,
n´kondoni wa kona wonga bwonga wa n´thu mas ya ferenti hambi ya mandzani conga ya n´thu,
caku loko cicitsimbila co iii... (imitando o andar do leão com os braços esticados como quem anda)
cidi ni matoya otala n´khoheni. Tur. silêncio. Prof.: hiii... A tur. não consegue adivinhar tal animal
provavelmente por ser estranho ao seu ambiente local. Não há leões na área muito menos acesso
à televisão o que poderia ajudar na adivinha dos alu. O prof. acabou anunciando: leão. Mais, mais,
a seguir. Já hini siraru já. Simwanyani? Silêncio. Prof.: grupo atrás. Silêncio. Sihari sakudya nyama
basi. A dupla não intervem possivelmente por não terem alistado os animais que apenas comem
carne. Esta foi uma dentre as restantes evidências desta fase da aula em que há alu. que não dão
resposta. Depois, quando não espera, saiu do alu.22: coelho. Prof.: i cani kambe coelho? Alu.22
silêncio. Prof.: quem pode dizer, coelho? Quatro e depois sete voluntários. Prof. enquanto tenta
escolher dentre os voluntários vai dizendo: coelho, coelho, coelho sim Hathani. Hathani:

352
civhundza. Prof.: civhundza cihanya ngu nyama? Tur. coro fraco: ahihi. Prof.: cihanya ngu nyama
civhundza? Tur. coro baixo: ahihi. Prof.: hingaciveka hayi civhundza aha? Cikhala hayi. Tur. em
coro murmura certadamente mas inaudível. Prof.: cikhala hayi civhundza? Tur. coro: ka mwasi.
Prof.: heee... ka mwasi. Prof.: ka mwasi. Então coelho deve vir aqui. Então por fim temos animais
(lê e escreve com pausas) que (---) comem (---)plantas (---) e carnes. Esse grupo, era vosso trabalho.
Aheee... Sem demora, levanta o alu.23: pato. Prof.: heee... Alu.23: pato. Prof.: pato. Didya cani
dipatu? Alu.23: nyama ni (não compreendi). Prof.: ka nyama dingadya ca? Dingadya ca? Alu.23:
sirambu. Prof.: sirambu só. Sirambu (hesitou) (---) dipatu didhunda kukhala thembweni, dinamana
sirambu n´thembweni?. Tru.: ahihi. Prof.: Heee... Ahivhuneni, i cani caku dingadya dipatu. I cani?
Há alu. que hesitam a levantar-se num clima de sala de aulas agradável. Alu.24: mafaka. Prof.: ni
cani kambe? Alu.25: dizongonono. Prof. repete: DIZONGONONO, uhuuu... ni cani kambe?
Hidikhantu dipatu dadya mafaka dizongonono ni cani kambe? Alu.24: tinyemba. Prof.: tinyemba,
ni cani kambe? Alu.26: nyakhele. Prof.: nyakhele. Alu.27: sidhodho. Prof.: sidhodho. Ok pode ficar
aqui. Dadya sidhodho, sidhodho i nyama não é isso? I mafaka é uma planta. Então dipatu está
certo. Dadya nyama, dadya maplantas.

Ficha de Avaliação e Crítica dos Resultados Alcançados

Terminada a leitura das notas de observação e transcrição de aula, por favor, escreva as suas
reflexões, críticas, sugestões, comentários, perguntas nesta ficha, guiando-se pelos seguintes temas:

1. Participação aberta, activa e voluntária dos alunos.

2. Nível de interacção e participação dos alunos.

3. Facilitação do ensino e aprendizagem.

Aspectos positivos:

Aspectos negativos:

Comentários:

Perguntas:

Críticas:

Sugestões:

353

Vous aimerez peut-être aussi