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centralidades periféricas l periferias centrais

ACESSO A MORADIA NA ÁREA CENTRAL DO


RECIFE/PE
A REQUALIFICAÇÃO E A SEGREGAÇÃO NA PRODUÇÃO DO ESPAÇO
URBANO
Kilma Correia da Silveira
Departamento de Arquitetura e Urbanismo, DAU
Universidade Federal de Pernambuco, UFPE
kcsilveira@gmail.com

RESUMO: Este artigo busca fazer uma reflexão a cerca da produção do espaço urbano, na qual a requalificação da
área central do Recife se alinha a lógica apropriação e transformação do espaço em mercadoria e as consequências
dessa lógica de produção para a dinâmica socioespacial da área central do Recife, notadamente no que se refere ao
acesso à moradia. A partir da década de 1990, a área central do Recife vem recebendo investimentos públicos e
privados visando recuperar espaços deteriorados de uso e funções diversas e aumentar a atratividade do espaço. As
intervenções urbanas recentes permanecem estimulando as atividades institucionais, de turismo, lazer e as propostas
que contemplam a reabilitação do uso habitacional de interesse social sofrem com a descontinuidade e falta de
recursos. A produção estatal de moradias populares assumiu uma postura que beneficia o setor da construção civil que
investem apenas em projetos que lhe traga retorno financeiro. A área central do Recife apresenta uma dinâmica
socioespacial própria, com moradores em sua maioria de baixa renda, dessa forma, as estratégias de requalificação
precisam não só inserir novos moradores e sim garantir a permanência digna das pessoas que ali vivem. Assim, torna-
se oportuno afirmar que a produção social do habitat precisa ser considerada e assumida pelo Estado como mais uma
modalidade de política pública, colocando a moradia como um direito e não como uma mercadoria.

Palavras-chave: Requalificação. Segregação. Habitação.


centralidades periféricas l periferias centrais

ABSTRACT: This article aims to reflect about the production of urban space, in which the regeneration of the central
area of Recife aligns logic appropriation and transformation of space goods and the consequences of this production
logic for the socio-dynamics of the central area of Recife, notably with regard to access to housing. From the 1990s, the
central area of Recife the reef has received private and public investments to recover damaged areas of use and various
functions and increase the attractiveness of the space. Recent urban interventions remain encouraging institutional
activities, tourism, leisure and proposals that include the rehabilitation of the residential use of social interest suffer from
the discontinuity and lack of resources. The state production of affordable housing took a stance which benefits the
construction industry that invest only in projects that will bring you financial return. The central area of Recife has its own
socio-spatial dynamics, with residents mostly low-income, thus the requalification strategies must not only enter new
residents but guarantee the permanence of worthy people who live there. Therefore, it is appropriate to say that the
social production of habitat must be considered and accepted by the State as another form of public policy, placing the
housing as a right and not as a commodity.

Keywords: Requalification. Segregation. Housing.


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INTRODUÇÃO
Este artigo busca elaborar uma reflexão acerca da produção do espaço urbano, na qual a requalificação da
área central do Recife se alinha a lógica apropriação e transformação do espaço em mercadoria e as
consequências dessa lógica de produção para a dinâmica socioespacial da área central do Recife,
notadamente no que se refere ao acesso à moradia. Inserem-se nessa discussão os projetos de intervenções
urbanas de requalificação da área central do Recife, que se mostram intimamente relacionados à atração de
uma população com alto poder aquisitivo na ocupação do centro. Estas ações alteram as formas de
produção do espaço e contribuem para reprodução das desigualdades sociais, uma vez que, nem todos se
apropriam desse espaço de maneira democrática.

Diante dos problemas consequentes, de ordem social, cultural e político desse formato de apropriação do
espaço, é necessária uma redefinição do padrão de ocupação do espaço central a partir de projetos
baseados em participação popular e articulação institucional que se adequem às condições da realidade da
área central do Recife.

O trabalho estrutura-se em duas partes, de forma que, faz-se na primeira uma breve leitura da produção do
espaço urbano, abordando os agentes e processos contidos na requalificação urbana na área central do
Recife. E segundo, aborda o processo de segregação socioespacial e as formas de acesso à moradia na
área central do Recife.

1. A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO E A REQUALIFICAÇÃO DA ÁREA CENTRAL DO


RECIFE
A apreensão do espaço e seus elementos constitui fator diretamente relacionado com a base material do
modo de produção capitalista e os aspectos de sua dinâmica. O espaço é “um produto social resultado de
ações acumuladas através do tempo, e engendradas por agentes que produzem e consomem o espaço”
(CORRÊA, 2002, p.11).

Sobre o ponto de vista das ações investidas no processo de produção do espaço urbano, destacam-se seus
agentes estruturadores de maior expressão: os proprietários dos meios de produção, sobretudo os grandes
industriais; os proprietários fundiários; os promotores imobiliários; o Estado; os grupos sociais excluídos. Sob

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a égide de interesses particulares e objetivos bem definidos em relação às intervenções na cidade, esses
agentes são vistos com “agentes sociais concretos, e não mercado invisível ou processos aleatórios atuando
sobre o espaço abstrato” (CORRÊA, 2012).

Ainda na perspectiva alcançada por Corrêa (2012), que delimita claramente os papeis dos agentes
produtores do espaço, observa-se, também, uma característica peculiar nas suas ações, quando diz que as
práticas espaciais são trabalhadas de acordo com as relações do capitalismo globalizado. Essas práticas se
comportam como um conjunto de ações espacialmente localizadas que vão desempenhar um impacto direto
no espaço, alterando-o no todo ou em parte ou preservando-o em suas formas e interações espaciais com a
sociedade, além de revelar de maneira muito clara a forma de dialogo entre o espaço e os grupos que o
produzem.

Dessa forma, os agentes se apropriam do espaço e suas práticas acumuladas no tempo produzem uma serie
de processos distintos, que por sua vez não são excludentes, pois podem ocorrer simultaneamente ou ainda
de forma complementar. Esses processos criam funções e formas espaciais, ou seja, criam atividades e suas
materializações, cuja distribuição espacial constitui a própria organização espacial urbana. São os processos
espacial, responsáveis imediatos pela organização espacial desigual e mutável da cidade capitalista. A
compreensão da organização espacial é um elemento importante para entender as consequências espaciais
desencadeadas por um fenômeno estudado.

Podemos destacar o processo espacial de centralização, tendo a área central como forma espacial e o
processo de descentralização, tendo os núcleos secundários como forma espacial. Na dinâmica
socioespacial das cidades, umas das mudanças mais significativas é a redefinição do papel do centro.
Historicamente a área central concentrou diferentes usos, como atividades comerciais, serviços, gestão
pública e outras instituições e até mesmo uso habitacional. Com o crescimento e expansão da cidade
surgiram novos núcleos centrais secundários, o que em parte colaborou para a desvalorização das áreas
centrais. Entretanto, o espaço urbano não é imutável, de forma que, nesses espaços desvalorizados são
inseridas novas praticas pelos agentes, vetores constitutivos de um processo de valorização-desvalorização-
revalorização das diferentes parcelas da cidade.

Os centros urbanos de diversas cidades como Barcelona e Londres, foram exemplos de áreas
desvalorizadas que tiveram como estratégias de revalorização, projetos de requalificação urbana, trazendo
para essas áreas não apenas capital relacionado ao turismo, indústria e comércio, mas também ao mercado
imobiliário. (SERAFIM, 2012).
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Na busca para se tornarem mais atrativas para o capital, as cidades procuram no mercado insumos para
realizarem suas funções. Assim, a produtividade, competitividade e subordinação dos fins à lógica do
mercado, são características presentes no empreendedorismo como modelo gestão adotado pelas cidades.
Na perspectiva de criação de espaços de oportunidades na cidade empreendedora, o planejamento e gestão
urbana podem ser visto como instrumento de valorização do espaço para a venda ou consumo da cidade.
Requalificar o centro é uma ação estratégica no sentido de ampliar a atratividade e reanimar o espaço.
Nessa perspectiva, Harvey coloca que:

A valorização de regiões urbanas degradadas, a inovação cultural e a melhoria física do


ambiente urbano (incluindo a mudança para estilos pósmodernistas de arquitetura e
design urbano), atrações para consumo (estádios esportivos, centros de convenção,
shopping centers, marinas, praças de alimentação exóticas) e entretenimento (a
organização de espetáculos urbanos em base temporária ou permanente) se tomaram
facetas proeminentes das estratégias para regeneração urbana. (HARVEY, 2005, p. 176)
Na reorganização do seu espaço urbano contido no processo de requalificação de uma área central, os
agentes sociais agem seletivamente sobre um determinado lugar a partir da variação de atributos presentes
entres estes e outros lugares. De forma que, a seletividade configura o espaço por decorrência da uma
escolha de um grupo social, de acordo com a presença de fatores que atendam seus objetivos. Esta prática,
assim como as outras, modela o espaço urbano na medida em que provocam uma diferenciação
socioespacial urbana entre a área selecionada e a área ao seu redor.

O grande desafio mediante as complexidades das intervenções urbanas é que muitas vezes são ações
guiadas por interesses particulares e assim, a requalificação pode significar o favorecimento de uma classe
social mais influente em detrimento a outras menos favorecidas. Seguindo a linha de raciocínio, o processo
de requalificação de uma área central pode apresentar indicadores sobre a existência de uma tendência que
prepara o espaço, revalorizando-o seletivamente para configuração de novos padrões.

Ao trazermos essas colocações para uma realidade mais próxima, podemos utilizar o Recife que é uma
cidade que possui características marcantes de intensas diferenças econômicas e sociais expressas no
espaço. Assim como em outras cidades brasileiras, a área central do Recife apresentou um decréscimo de
população residente nas últimas décadas. Apesar de já ter sido uma área habitacional durante a ocupação
holandesa do século XVII até inicio do século XX, sua consolidação se deu ao longo do tempo como zona
comercial e de serviços. Diversos fatores levaram à desvalorização da área central do Recife, como a
redução das atividades portuárias no final do século XX, a expansão dos núcleos urbanos com a oferta de
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terrenos em outras áreas do Recife, o surgimento de novas centralidades com incremento de serviços e
infraestrutura em áreas mais afastadas do centro, principalmente nos eixos sul e noroeste.

Com o propósito de reverter essa situação de desvalorização, foram realizados alguns programas de
intervenção urbana na área central do Recife. As primeiras propostas partiram do interesse de preservação
de patrimônio histórico, cultural e arquitetônico, com o Plano de Preservação de Sítios Históricos da Região
Metropolitana do Recife em 1976. Já na década de 1990, com o Plano de Revitalização do bairro do Recife
(1993) o enfoque se deu na dimensão econômica. Desde então a área central do recife vem recebendo
investimentos públicos e privados para requalificação urbana, visando recuperar espaços deteriorados de
uso e funções diversas e aumentar a atratividade do espaço.

Dentre alguns exemplos de intervenções urbanas da área central do Recife, podemos citar: o projeto Morar
no Centro (2000-2005) com foco em empreendimento imobiliário para fins habitacionais; a implantação do
Porto Digital (2000), parque tecnológico referencia em Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e
Economia Criativa (EC); a reabilitação urbana dos polos Bom Jesus e Alfandega (1995 – 2000) com objetivos
– previstos no Plano de Revitalização do bairro do Recife – voltados para o turismo e lazer; o Projeto
Complexo Turístico Cultural Recife/Olinda (2003 - 2005); a construção das “torres do Cais de Santa Rita”
(2006) empreendimento imobiliário para fins habitacionais de alta renda; o Projeto Porto Novo (2010) também
voltado para o turismo e lazer e o Projeto Novo Recife (2009) complexo residencial e empresarial.

Ao fazer uma breve revisão histórica das principais intervenções empreendidas no Centro Histórico do
Recife, Menezes, 2015, demostra que as intervenções urbanas recentes permanecem estimulando as
atividades institucionais, de lazer/turismo, comércio e serviços e as propostas que contemplam a reabilitação
do uso habitacional sofrem com a descontinuidade e falta de recursos.

“Em todas as tentativas de requalificação executadas no Bairro, faltou uma abordagem


holística [...] Atualmente, o Bairro do Recife teve praticamente extinto o uso habitacional,
com exceção da Comunidade do Pilar [...] A comunidade possui um dos piores índices
de renda e de desenvolvimento humano da cidade, justamente num dos lugares que
mais recebeu investimentos de requalificação.” (MENEZES, 2015, p.9)
Tomando como principais elementos de análise os projetos de intervenção urbana no centro histórico e a
evolução dos domicílios e da população residente a autora aborda a questão da perda do protagonismo da
habitação no centro histórico e a defesa da diversidade de funções no espaço urbano – residencial,
comercial, prestação de serviços, institucional etc – como estratégia mais adequada para a requalificação do
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centro histórico do Recife. Complemento que é possível identificar um resgate da habitação na área central
do Recife, por intermédio da iniciativa privada, entretanto direcionado para uma classe média alta, como
exemplos as torres gêmeas e o Novo Recife. Nesse sentido a habitação tem caráter de atração de novos
moradores e não permanência dos atuais, o que pode resultar em processos de desigualdade socioespacial,
como segregação, uma vez que, insere-se na área um novo padrão de moradia, socialização e consumo
distinto e não interativo do padrão existente no bairro.

3. A segregação e as formas de acesso à moradia na área central do Recife

No que se refere à segregação como processo espacial decorrente da divisão social do espaço, Carlos
(2016, p.97) coloca que “a segregação é a expressão do desdobramento da contradição que produz o
espaço urbano [...] que é, ao mesmo tempo e dialeticamente, valor de uso (condição necessária à realização
da vida) e valor de troca (mercadoria cujo uso está submetido ao mercado imobiliário visando à produção do
valor)”.
No contexto da mercantilização da moradia, quando esta passa a ser mais valorizado pelo seu valor de troca
no mercado do que pelo seu valor de uso, ocorre a disputa pelos grupos sociais que possuem maior poder
de apropriação do espaço a partir do seu valor de troca. Assim, a segregação ocorre quando as formas de
localização diferenciada no espaço urbano dos grupos sociais levam a separação, entre uma parte
(segregada) e o conjunto do espaço urbano, dificultado suas relações e articulações.

Nesse sentido, a segregação socioespacial está intrinsicamente relacionada as formas de acesso a moradia.
Para entender a questão de onde e como morar é preciso que se compreenda a questão da habitação. No
contexto brasileiro, a política urbana e habitacional passou por três fases sucessivas:

“Nas primeiras décadas do século XX, sob influência do higienismo e do modernismo a


política de erradicação de favelas privilegiava a preservação dos valores estéticos e
higiênicos da cidade sobre o bem-estar dos habitantes, e para tanto deveriam erradicar-
se as sub-habitações e junto com elas os seus moradores. [...] A segunda fase, de
caráter assistencialista e clientelista caracterizou a atuação do Sistema Financeiro de
Habitação e do BNH, [...] Finalmente a terceira fase está sendo construída ao longo dos
últimos anos, a partir da ampla movimentação nacional que veio concretizar-se no Fórum
Nacional de Reforma Urbana, que desde a época da Constituinte (1986), defendia os
princípios do direito à cidade e à moradia.” (DE LA MORA, 2007, p.5)
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Segundo De La Mora, 2010, podemos considerar quatro formas de produção do habitat, a produção
empresarial segue a lógica do mercado imobiliário de lucro e rentabilidade, dessa forma, atende a uma
parcela da população de médio/alto padrão socioeconômico. A qualidade do habitat, nesse caso, esta
relacionada com o poder aquisitivo da população. A produção estatal utiliza uma lógica de visibilidade e
potencialidade eleitoral para efetivar os programas habitacionais, de forma que, é excluída a população que
não atende e este “mercado político”. A produção espontânea compreende a parcela da população excluída
do mercado imobiliário e das políticas compensatórias estatais, restando-lhe a autoconstrução de habitações
populares precárias de infraestrutura e acesso aos serviços básicos. Por último, a produção social do habitat
se constrói mediante a síntese da produção estatal e espontânea, como uma especificidade das políticas
públicas, onde o sujeito de direito à moradia é protagonista e se articula com outras instituições para ter
acesso à moradia. Assim, a produção social do habitat envolve participação social – auto ou co-gestão, e
articulação interinstitucional.

No que se refere à promoção da habitação, na área central do Recife podemos citar três projetos de
conjuntos habitacionais, onde a produção estatal dessas moradias segue a passos lentos. No bairro de São
José, o conjunto habitacional para os moradores das palafitas dos Coelhos, prevê 224 unidades
habitacionais na Praça Sergio Loreto e 160 unidades na Travessa Gusmão. Na Ilha de Joana Bezerra, o
conjunto habitacional Vila Brasil prevê a construção de 448 unidades habitacionais para os moradores das
palafitas de São José1. As obras foram anunciadas em 2006, iniciadas em 2009 e 2010, e apenas as
unidades da Travessa Gusmão foram entregues em junho de 2016, os outros não tem previsão de entrega2.
No bairro do Recife, a comunidade do Pilar é negligenciada desde a década de 90, quando foi incluída no
Plano de Revitalização do bairro do Recife (1993). A estratégia era voltada para o turismo, atividades de
lazer, consumo e serviços, ficando o uso habitacional em segundo plano. Houve redefinição dos objetivos do
projeto, o Pilar foi incluído num outro projeto (complexo Recife-Olinda) e só em 2000 foi anunciado um o
projeto para o Pilar: Programa de Requalificação Urbanística e Inclusão Social da Comunidade do Pilar, com
obras iniciadas em 2010 e o prazo de conclusão em 2012 (prazo estendido para 2017). Em cinco anos a
prefeitura entregou apenas 80 unidades habitacionais das 588 previstas3, sem contar os outros
equipamentos previstos para a comunidade como, escola, unidade de saúde, mercado publico, praça e
outros que não foram nem iniciados.

Na área central do Recife os exemplos de produção popular do habitat há exemplos de ocupações


consolidadas como a ZEIS4 do Coque e Coelhos, outras que ainda não possuem a condição de ZEIS como a
comunidade do Pilar e outras ocupações irregulares mais recentes, como a Vila Sul, inicialmente ocupando o

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bairro de São José e depois sendo relocada. Orientados pelo Movimento de Luta de Bairros, Vilas e Favelas
(MLB) cerca de 200 famílias ocuparam em 2014 um terreno pertencente à União, concedido para exploração
da Ferrovia Transnordestina Logística (FTL), hoje, são cerca de 2000 famílias. A maioria das famílias é
proveniente da comunidade do Coque, onde afirmam não terem condições de pagar aluguel de casas e
barracos. A situação das famílias ainda não está definida, apenas foi realizado um cadastramento das
famílias pela prefeitura5.

A promoção da habitação na área central do Recife é um dos aspectos reveladores das desigualdades
inerentes à prática de produção espacial pelos agentes sociais, sobretudo nos projetos de requalificação.
Como visto na seção anterior, os promotores imobiliários voltam-se para a atração de novos moradores de
classe média alta, seguindo a lógica da produção empresarial apontada por De La Mora. O Estado assume
uma postura empresarialista de forma que as ações e investimentos concretos priorizam o turismo, lazer,
consumo e negligencia o déficit habitacional nos bairros da área central. E os grupos sociais excluídos – os
moradores de baixa renda que ali permanecem, acabam por ter a produção espontânea/popular como
alternativa de acesso a moradia.

O direito a moradia e a cidade esbarram principalmente na dificuldade de acesso da população ao mercado


imobiliário e a incapacidade das políticas públicas habitacionais de atender a demanda da população
excluída dessa produção empresarial, gerando um cenário em que a principal alternativa é a produção
popular da habitação. Entretanto, há outra alternativa para esta parcela da população excluída do mercado
imobiliário e dos programas governamentais – a produção social do habitat. A produção social do habitat é
possível a partir do acesso a fundos públicos por organizações sociais, para financiamento da moradia. O
diferencial se dá pela participação efetiva dos sujeitos beneficiados, que identificam, propõe, negociam e
definem a melhor solução para a provisão das habitações, e a articulação entre organizações
governamentais, não governamentais e empresariais.

Os mecanismos de participação social vêm sendo adotados nas políticas públicas habitacionais, entretanto,
em muitos casos se verifica a participação apenas consultiva e não deliberativa, o que dificulta a efetiva
produção social do habitat. O processo de participação também exige universalidade, representatividade,
transparência e equidade nas decisões. Assim como a participação, a articulação institucional é fator
fundamental antes, durante e depois do processo de produção social do habitat. O protagonismo dos
usuários envolve a co-gestão com diversas instituições que os apoiam por meio de recursos financeiros,
humanos, assistência técnica, legal etc.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os planos propostos para a área central do Recife, enquanto estratégias de requalificação urbana
permanecem com foco nas atividades ligadas ao turismo, lazer e consumo e quando há o interesse no uso
habitacional, este é direcionado para novos moradores, de classe média alta. Dessa forma, a produção do
espaço urbano expressa nas interversões na área central do Recife pode ser compreendida como um
processo que intensifica o processo de segregação socioespacial. Visto que os empreendimentos são
direcionados a uma classe privilegiada específica ao passo que projetos que garantem o acesso e
permanência da parcela da sociedade não incluída nessa logica são negligenciados.

A produção estatal de moradias populares assumiu uma postura que beneficia o setor da construção civil que
investem apenas em projetos que lhe traga retorno financeiro. A produção social do habitat precisa ser
considerada e assumida pelo Estado como mais uma modalidade de política pública, colocando a moradia
como um direito e não como uma mercadoria.

É preciso considerar que os bairros da área central do Recife apresenta uma dinâmica socioespacial própria,
com moradores em sua maioria de baixa renda. Assim, torna-se oportuno afirmar a importância de não só
inserir novos moradores, mas que principalmente haja um planejamento que conheça e respeite os valores
culturais das pessoas que ali vivem, trazendo subsídios não só para materializar os direitos básicos do
cidadão, mas, uma inclusão onde as oportunidades para se alcançar tais êxitos sejam disponíveis, podendo
assim ter a opção de continuar exercendo seus modos de vida e práticas culturais.

5. REFERÊNCIAS
CARLOS, Ana Fani Alessandri. A prática espacial urbana como segregação e o “direito à cidade” como
horizonte utópico. In. VASCONCELOS, Pedro de Almeida; CORRÊA, Roberto Lobato; PINTAUDI, Silvana
Maria (orgs.). A cidade contemporânea: segregação espacial. São Paulo: Contexto, 201.
CORRÊA, Roberto Lobato. O espaço urbano. São Paulo: Ática, 2002.
______. Espaço, um conceito-chave da geografia. In: CASTRO I.E. et al. (Orgs.). Geografia: conceitos e
temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012, p. 15-47.

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DE LA MORA, Luis. (Org). Producão Social do Habitat. Habitat para a Humanidade, Recife, 2007.
DE LA MORA, Luis. Produção Social do Habitat: Estratégia dos excluídos para a conquista do direito à
cidade e à moradia. In: Novos Padrões de Acumulação Urbana na Produção do Habitat. Olhares
Cruzados Brasil - França. Editora Universitária, UFPE, 2010.
HARVEY, David. A Produção Capitalista do Espaço. São Paulo: Annablume, 2005.
MENEZES, Larissa Rodrigues. Um século de exclusão do uso habitacional no centro histórico do Recife. In:
XVI Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e
Regional, 2015, Belo Horizonte. Acesso em 13/09/2016. Disponível em
http://xvienanpur.com.br/anais/?wpfb_dl=572
SERAFIM, Ana Regina Marinho Dantas Barbosa da Rocha. Transformações do espaço urbano da cidade
do Recife-PE como produto e condição de reprodução das intervenções urbanas: análise dos
projetos de requalificação. Tese (Doutorado em Geografia Humana). Universidade de São Paulo – USP,
2012.
SILVA, Ailson Barbosa da. Moradia é Central no Recife. In: XIV Encontro Nacional da ANPUR. Maio de
2011. Rio de Janeiro – RJ, Brasil. Acesso em 09/09/2016. Disponível em
http://unuhospedagem.com.br/revista/rbeur/index.php/anais/article/view/3155

Notas
1
http://www2.recife.pe.gov.br/noticias/17/01/2013/pcr-construira-habitacionais-para-832-familias
2
http://jconline.ne10.uol.com.br/canal/cidades/geral/noticia/2015/02/21/familias-ameacam-invadir-habitacionais-
inacabados-no-recife-169165.php
3
http://jconline.ne10.uol.com.br/canal/cidades/geral/noticia/2015/06/16/comunidade-do-pilar-a-espera-das-moradias-
prometidas-186016.php
4
De acordo com a Lei de Uso e Ocupação do Solo do Recife (Lei 16.176/96) as Zonas Especiais de Interesse Social -
ZEIS - são áreas de assentamentos habitacionais de população de baixa renda, surgidos espontaneamente, existentes,
consolidados ou propostos pelo Poder Público, onde haja possibilidade de urbanização e regularização fundiária.
5
http://www.folhape.com.br/cotidiano/2016/8/comunidade-vive-o-fantasma-de-cumprimento-de-ordem-de-reintegracao-
0039.html

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