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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 19, Nº SUPLEMENTAR: 131-141 NOV.

2011

A NOVÍSSIMA CHINA E O SISTEMA INTERNACIONAL

Paulo G. Fagundes Visentini

RESUMO

A chegada da China à periferia em desenvolvimento, com uma agenda política e econômica abrangente,
inaugura um novo estágio na projeção internacional chinesa e no próprio sistema mundial. Quais são os
objetivos dessa Novíssima China em termos de política internacional? Não são poucos os que identificam
nas ações chinesas aspirações ambiciosas de dominação mundial, sucedendo os Estados Unidos como
liderança do planeta. Em uma manifestação que beira a sinofobia (como outrora o “perigo amarelo”),
argumentam que seu desenvolvimento almeja concentrar a riqueza mundial em suas mãos, quebrando com
a economia das demais nações. Tomando como base as relações estabelecidas com o continente africano,
defendemos a hipótese de que Pequim inaugura uma nova etapa na grande política internacional e suplanta
a fase em que a Nova China lutava para recuperar sua soberania e desenvolvimento, começando a Novíssima
China a transformar o próprio sistema mundial. Para tal, argumentamos que a China busca evitar as
hegemonias, tanto a dos Estados Unidos como a dela própria, pois nesse último caso, poderia ter a mesma
sorte que a Alemanha nas duas guerras mundiais. Não se trata de uma tarefa fácil, pois a China move-se em
meio à fluidez diplomática do período posterior à Guerra Fria e ao envelhecimento do capitalismo
contemporâneo em seus centros históricos.
PALAVRAS-CHAVE: diplomacia chinesa; sistema internacional; relações China-África.

I. INTRODUÇÃO to, particularmente com a África, em uma pers-


pectiva que ultrapassa a simples esfera comercial
Em 1949, com a proclamação da República
ou diplomacia de influência a ela associada.
Popular da China (RPC), Mao Zedong anunciava
o nascimento da Nova China. Ao longo de três O que deseja essa Novíssima China, em ter-
tumultuadas décadas, o país logrou reafirmar sua mos de política internacional? Não são poucos os
soberania e a ocupar um espaço político relevante que identificam nas ações chinesas aspirações
como membro permanente do Conselho de Segu- ambiciosas de dominação mundial, sucedendo os
rança da Organização das Nações Unidas (ONU), Estados Unidos da América (EUA) como lideran-
em um contexto de normalização das relações com ça do planeta. Em uma manifestação que beira a
a comunidade internacional. Nas três décadas se- sinofobia (como outrora o “perigo amarelo”), ar-
guintes, o país lançou um complexo e dinâmico gumentam que seu desenvolvimento almeja con-
modelo de desenvolvimento que não apenas alte- centrar a riqueza mundial em suas mãos, quebran-
rou substancialmente sua realidade interna, como do com a economia das demais nações. Mas o
também teve um profundo impacto nas relações “problema chinês” é como alcançar o desenvolvi-
econômicas e geopolíticas internacionais. mento por meio da integração de 22% da popula-
ção mundial aos benefícios da modernidade, sem
Nascia a Novíssima China, um Estado cujo mo-
que o sistema internacional entre em colapso. Para
delo político-econômico os grandes especialistas
que ele transforme-se gradualmente, a China bus-
encontram imensa dificuldade em definir. Um país
ca evitar as hegemonias, tanto a dos Estados Uni-
cuja importância internacional pode ser avaliada pela
dos como a sua própria, pois, nesse último caso,
solicitação de parceria econômica feita em Pequim,
ela poderia ter a mesma sorte que a Alemanha nas
em 2009, pela Secretária de Estado Hillary Clinton,
duas guerras mundiais. Não se trata de uma tare-
em um tom que contrastava vivamente com a ar-
fa fácil, pois a China move-se em meio à fluidez
rogância da administração George W. Bush. Ao
diplomática do período posterior à Guerra Fria e
mesmo tempo, a economia e a diplomacia chine-
ao envelhecimento do capitalismo contemporâneo
sas conseguem estabelecer relações aparentemen-
em seus centros históricos.
te sustentáveis com a periferia em desenvolvimen-

Recebido em 18 de janeiro de 2011.


Aprovado em 18 de fevereiro de 2011.
Rev. Sociol. Polít., Curitiba, v. 19, n. suplementar, p. 131-141, nov. 2011
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A NOVÍSSIMA CHINA E O SISTEMA INTERNACIONAL

II. A REINSERÇÃO DA CHINA POPULAR NO como a descoletivização gradual da agricultura, a


SISTEMA INTERNACIONAL introdução de uma economia mercantil dentro de
uma estrutura socialista, a criação de áreas espe-
Durante o ciclo colonial, estruturado ao longo
cíficas para a captação de capital e tecnologia es-
de quase cinco séculos de expansão e hegemonia
trangeiras e a instalação de empresas
européia, a Ásia conheceu uma situação de domi-
transnacionais, destinadas principalmente à expor-
nação direta e indireta, estagnação e mesmo re-
tação. Nas Zonas Econômicas Especiais (ZEEs),
trocesso nas diversas esferas da vida social. A
geralmente províncias costeiras, introduziu-se le-
China imperial, que até o século XVIII fora, em
gislações próprias para permitir o estabelecimen-
vários campos, a nação mais avançada do mun-
to de determinados mecanismos capitalistas e o
do, entrou em uma fase de isolamento, estagna-
assentamento de capitais e empresas estrangei-
ção e declínio. Apenas o Japão escapou a essa
ras.
sorte, tornando-se uma nação imperialista, apoia-
da em um militarismo extremamente agressivo. A nova linha representava uma mudança na
estratégia chinesa. Até o início dos anos 1960, a
A I Guerra Mundial, a Revolução Soviética, a
RPC enfatizara os problemas ligados à sua segu-
II Guerra Mundial e a Revolução Chinesa (com as
rança, pois tratava-se de uma revolução ainda não
guerras da Coréia e do Vietnã) geraram uma nova
consolidada, com uma economia débil e vivendo
realidade geopolítica. O Japão foi reconstruído,
uma conjuntura internacional adversa. Foi a épo-
industrializado e integrado à esfera de influência
ca em que a permanência no bloco soviético afi-
americana, o que posteriormente ocorreu com
gurava-se como necessária para atingir esse obje-
Taiwan e Coréia do Sul (Tigres Asiáticos). Assim,
tivo. Do início da década de 1960 à de 1970, a
essa Ásia insular e peninsular do Pacífico passou
preocupação do PCC voltou-se para a autonomia
a integrar o espaço capitalista sob ascendência dos
e independência, pois, apesar dos inúmeros pro-
Estados Unidos, enquanto a massa continental
blemas, o país lograra estabilizar-se, e a aliança
asiática fazia parte de um espaço socialista e o sul
com Moscou mais entravava do que auxiliava os
do continente formava um espaço neutralista, ape-
planos chineses de tornar-se novamente uma po-
sar da Guerra do Vietnã. Dessa forma, a Guerra
tência de âmbito mundial, politicamente respeita-
Fria implicava a divisão e fragmentação do espa-
da e economicamente desenvolvida.
ço asiático em regiões isoladas umas das outras,
processo que se aprofundou com a ruptura sino- A ênfase chinesa voltou-se para a moderniza-
soviética. ção do país em quatro áreas: indústria, agricultu-
ra, tecnologia e forças armadas. O melhor cami-
No início dos anos 1970, a China e os Estados
nho para atingir esses objetivos seria implementar
Unidos reaproximaram-se, em uma aliança
uma política de reformas econômicas internas,
antissoviética, a qual permitiu a Pequim ocupar o
abrir o país ao dinamismo da revolução tecnológica
assento permanente da China no Conselho de Se-
que se iniciava, associar-se à revoada dos gansos
gurança da ONU e normalizar suas relações com
asiáticos e tirar o máximo de benefícios econômi-
a maioria das nações. Era o fim de um longo iso-
cos e estratégicos de uma aliança com os Estados
lamento diplomático e marginalização imposta. Ao
Unidos, durante uma fase de distensão internaci-
mesmo tempo, encerrava-se o longo ciclo de con-
onal. Além disso, a normalização com o Japão,
flitos internos. Com o término da Revolução Cul-
ocorrida em 1978, permitia a Pequim desmantelar
tural e a aliança com os EUA, o moísmo com ên-
progressivamente a Pax Americana na Ásia, que
fase na luta de classes foi deixado de lado. Mao
mantivera afastados os dois maiores países da
Zedong morreu em 1976 e o grupo reformista
região. Washington percebeu a nova conjuntura
ampliou seu poder gradativamente, nele emergin-
unicamente a partir de seus objetivos, sem levar
do a liderança de Deng Xiaoping. No final da dé-
em consideração todos os futuros desdobramen-
cada o Partido Comunista da China (PCC) intro-
tos dessa política.
duziu uma série de reformas econômicas, que
culminaram com uma abertura externa seletiva e Ainda que marcada por inúmeras dificuldades
a adoção de novos padrões de desenvolvimento. bastante conhecidas, a RPC não teria de partir do
zero, como a Coréia do Sul dos anos 1950, pois
Em 1978 o país adotou a política das Quatro
possuía uma base industrial e infraestrutura con-
Modernizações, que consagra reformas internas
sideráveis, ainda que insuficientemente moderni-

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zada, satisfatórias para iniciar o desenvolvimento. do Conselho de Segurança da ONU (com poder
Por outro lado, a manutenção de uma estrutura de veto) é o único país em desenvolvimento que
socialista paralela, bem como de um considerável se encontra no núcleo do poder mundial.
volume de população vivendo no campo, permiti-
II. TIBETE E TIANANMEN 1989, A PRIMEIRA
ram ao setor capitalista da economia dispor de
TENTATIVA DE CONTENÇÃO
uma mão de obra abundante a um custo extrema-
mente baixo. Educação, saúde, habitação, alimen- Essa espetacular performance, entretanto, teve
tação e transporte público têm um custo baixo na também um outro lado. A descoletivização do cam-
China, permitindo-lhe uma elevada competitivi- po levou ao aumento da produção, mas gerou
dade. Esse é o significado profundo da ambígua crescentes desigualdades sociais e uma parcela
expressão “economia socialista de mercado”1. de camponeses sem terra, que se tornaram assa-
Além da base material e da estabilidade sócio-po- lariados ou migraram para as grandes cidades. Em
lítica construídas pelo regime socialista, a China um país com quase 700 milhões de camponeses,
possuía ainda a possibilidade de utilizar outros trun- isso constitui um problema sério. Embora em
fos, que haviam favorecido o desenvolvimento de menor intensidade, esse fenômeno também atin-
Taiwan, Hong Kong e Cingapura: a diáspora chi- giu as cidades, em um clima político bem mais
nesa e seus recursos financeiros. complexo. Esse fenômeno agravar-se-á significa-
tivamente na segunda metade dos anos 1980, com
Ao alterar a ênfase de sua política da luta de
os impactos da Perestroika soviética.
classes para as reformas rumo ao mercado, a aber-
tura externa e a aliança com Washington, os co- As reformas soviéticas criaram expectativas
munistas de Pequim não apenas reinseriam o país imensas de uma rápida inserção internacional da
no concerto das nações, como multiplicavam os União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
sinais de confiança, destinados a atrair os investi- (URSS), mas concretamente levaram o país à beira
mentos de seus compatriotas de além-mar, asso- do caos sócio-econômico e da ruptura política.
ciando-os ao projeto e modernização e oferecen- Era um caminho bem diverso do chinês. Pequim
do-lhes bons negócios. Essa estratégia viria a ser desencadeara suas reformas internas e abertura
coroada de sucesso, mesmo em relação aos arqui- externa essencialmente no plano econômico, sem
inimigos do outro lado do estreito de Formosa. estendê-las ao político, ao contrário de Moscou,
Com a introdução do princípio de “uma nação, que as iniciou pelo sistema político, uma década
dois sistemas”, Pequim conseguiu lograr com êxito depois. Ora, os reformistas de Deng Xiaoping
a reincorporação dos dois últimos enclaves colo- desencadearam seu processo de mudanças quan-
niais, Hong Kong e Macau, respectivamente em do a Revolução Científico-Tecnológica (RCT)
1997 e 1999. encontrava-se ainda em sua fase inicial, além de
aproveitarem uma conjuntura internacional mais
O impacto da inserção mundial da China é in-
favorável, conservando seu sistema político
tenso, não apenas pela acelerada taxa de cresci-
unipartidário, o que possibilitou estabilidade e con-
mento, mas pelo peso econômico e populacional
trole sobre as reformas. As reformas de
do país, bem como por sua dimensão continental.
Gorbatchov, por outro lado, deram-se sem um
O problema, entretanto, não diz respeito apenas
plano estratégico claramente definido, sem con-
ao peso da China, mas principalmente às caracte-
trole político e, pior ainda, em um momento em
rísticas do projeto chinês. Trata-se de uma po-
que a RCT já dera ao capitalismo uma dianteira
tência nuclear, com imensa capacidade militar,
inalcançável.
além do fato de tratar-se de um modelo de desen-
volvimento de pretensões autônomas. A Repúbli- Os efeitos internacionais da Perestroika e a
ca Popular da China, graças à sua capacidade mi- facilidade com que a URSS estava sendo integra-
litar de dissuasão, armamento nuclear, indústria da ao sistema mundial em uma posição politica-
armamentista própria, tecnologia aeroespacial e de mente subordinada, levaram determinadas forças
mísseis, bem como por ser membro Permanente políticas (dos EUA, de Taiwan e do próprio país)
a tentar atrair a China para o mesmo caminho.
Não se tratava de mera “conspiração”, pois as ten-
1 Segundo Medeiros (1999), a economia socialista de mer- sões sociais e as complexidades políticas (ampli-
cado consiste na descentralização do planejamento e na ação do número de atores políticos, com interes-
centralização do mercado. ses específicos) que acompanhavam as econo-

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micamente bem sucedidas reformas chinesas eram efeitos desestabilizadores, gerando a fragmenta-
consideráveis, além dos dirigentes chineses en- ção social e nacional, essa última particularmente
contrarem-se divididos quanto aos limites e ao rit- presente nos países periféricos. É nesse quadro
mo dessas mesmas reformas. de reordenamento mundial que a Ásia emerge
como uma nova fronteira econômica.
Uma mobilização popular multifacética e con-
traditória emergia no país, especialmente como Os problemas e perspectivas da Ásia não po-
movimento contra a corrupção, e o jovem dem, contudo, ser avaliados unicamente a partir
empresariado e os ultra-reformistas do PCC, da perspectiva econômica. A segurança regional
nucleados em torno do Primeiro-Ministro Zhao levanta uma série de interrogações que, provavel-
Ziyang, procuraram capitalizá-lo em sua luta con- mente, condicionarão as possibilidades econômi-
tra os reformistas moderados como “movimento cas posteriores. A ascensão econômica da China,
pela democracia”. A concentração popular na Praça potencializando o incremento e modernização de
da Paz Celestial (Tiananmen), ponto de inflexão seu potencial militar e, conseqüentemente, ampli-
desse confronto, ocorria durante as comemora- ando sua autonomia político-diplomática, passa-
ções do Movimento de 4 de maio de 1919 e a ram a preocupar particularmente os EUA, que
visita de Gorbatchov, que deveria encerrar três buscam reafirmar sua predominância a um custo
décadas de divergência, e motivava os reformis- mais baixo que durante a Guerra Fria.
tas radicais.
A região do sudeste asiático é particularmente
A repressão militar ao movimento em junho de sensível ao ingresso da China na economia mun-
1989 e a conseqüente derrota dos ultra-reformis- dial, por seu peso e por anular certas vantagens
tas, impediu que a China tivesse o mesmo destino comparativas da região. A Associação de Nações
da União Soviética: a desagregação do país e o do Sudeste Asiático (Asean) tem agido com rapi-
colapso do regime socialista. É, pois, interessante dez, estreitando a cooperação política e econômi-
que naquele ano a estratégia ocidental de luta con- ca entre seus membros, para acelerar o desenvol-
tra o socialismo teve duas conseqüências opos- vimento econômico e garantir a segurança da re-
tas: a derrota dos comunistas soviéticos, simboli- gião. Em 1995, o Vietnã, antigo rival, passou a
zada pela derrubada do muro de Berlim, e a vitória integrar a organização, seguido por Laos, Mianmar
dos comunistas chineses, sinalizada pela repres- e Camboja, abarcando todo o sudeste asiático.
são da Praça da Paz Celestial. Analistas da política
A evolução da Ásia a partir do fim da Guerra
internacional interpretaram essa contradição ar-
Fria e do desaparecimento da URSS foi rápida e
gumentando que se tratava de uma vitória defini-
profunda, gerando uma nova realidade ainda não
tiva sobre a URSS, enquanto no caso chinês, o
devidamente avaliada, pois suas diversas regiões
próprio desenvolvimento capitalista necessaria-
constitutivas, que se encontravam
mente conduziria, em médio prazo, à adoção de
compartimentadas, têm se encaminhado para a
um regime político calcado no modelo ocidental
fusão em um único cenário estratégico. De fato,
de democracia liberal (a tese da contradição entre
o continente asiático esteve, nesse século, sub-
abertura econômica e fechamento político).
metido a uma série de divisões, cujas formas e
III. O FIM DA GUERRA FRIA E A NOVA REA- abrangência alteraram-se, sem que o problema
LIDADE GEOPOLÍTICA NA ÁSIA desaparecesse. A Guerra Fria não fez senão tor-
nar ainda mais herméticas as fronteiras entre as
O declínio e, finalmente, a desintegração da
regiões, tais como o anel insular sob controle norte-
URSS puseram fim à Guerra Fria e ao sistema
americano, a massa continental socialista (dividi-
bipolar, abrindo uma nova era de incertezas na
da desde os anos 1960 entre a China e a Sibéria e
construção de uma nova ordem mundial, em uma
Ásia central soviéticas), o subcontinente indiano
conjuntura marcada pelo acirramento da compe-
influenciado pelo neutralismo, o sudeste asiático
tição econômico-tecnológica mundial. O fenôme-
em conflito e em disputa, o que também era o
no da globalização passa, cada vez mais, pela
caso de outra região asiática, o Oriente Médio.
regionalização, isto é, pela formação de pólos eco-
nômicos apoiados na integração supranacional em Vários “muros” asiáticos ruíram com a desin-
escala regional. E a intensidade do processo de tegração da URSS em fins de 1991. Desde então,
globalização provocou, inicialmente, profundos a cooperação entre a Rússia e a RPC tem sido
crescente nos campos econômico-comercial,

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tecnológico-militar, diplomático e de segurança. e de imensos recursos naturais, como petróleo e


Especialmente importante têm sido as vendas de gás, inicialmente manteve sua dependência em
armamento sofisticado e a transferência de relação à Rússia, nos quadros da Comunidade de
tecnologia avançada no campo aeroespacial e nu- Estados Independentes (CEI). Mas o rápido
clear. A queda do “muro sino-soviético”, por ou- declínio econômico, militar e diplomático de Mos-
tro lado, também permitiu a integração progressi- cou levaram o Cazaquistão, Uzbequistão,
va da Sibéria ao dinamismo econômico da Ásia- Tadjiquistão, Quirguistão e o Turcomenistão a
Pacífico, seja diretamente ao capitalismo oceâni- buscarem novas alternativas, inclusive porque as
co transnacionalizado, seja via cooperação bilate- potências médias da região, Irã, Turquia, Arábia
ral com o socialismo de mercado chinês. Saudita, Paquistão, Índia e China, por motivos
econômicos, políticas e por determinadas
A normalização política que se seguiu aos acor-
vinculações históricas, étnicas e religiosas, não
dos de paz do Camboja em 1992, por sua vez,
permaneciam passivas frente ao vácuo de poder
terminou com o isolamento da Indochina em rela-
criado na região, projetando sua diplomacia em
ção ao restante do sudeste asiático. Essa nova di-
direção a essa área. Assim, além de ampliado, o
mensão diplomático-estratégica, associada ao di-
conjunto asiático tornou-se mais diversificado,
namismo econômico da região, propiciou o
com a abertura de uma “nova fronteira” econô-
acercamento sino-vietnamita e uma crescente
mica e política.
cooperação de Pequim com a Asean. Tanto os in-
teresses econômicos como a criação de um diálo- A independência dos países muçulmanos da
go permanente no campo da segurança têm cria- antiga Ásia central Soviética, por outro lado, afe-
do uma situação de crescente cooperação entre a tou diretamente o Oriente Médio, ampliando seu
China e o sudeste asiático. Da mesma maneira, hinterland e colocando-o em contato direto com
apesar das recorrentes situações de tensão calcu- a Ásia. Nascia o Grande Oriente Médio. Como
lada na península coreana e seu entorno, a diplo- foi mencionado, potências médias da região, como
macia chinesa tem encontrado formas de gerar Turquia, Irã, Arábia Saudita e Paquistão, lutam
contínuos rearranjos para evitar possíveis ruptu- por estender sua influência à Ásia Central, sendo
ras ou a intrusão de problemas estratégicos no o interminável conflito afegão um dos pivôs do
nordeste asiático. novo jogo geopolítico. Além disso, a fronteira
impermeável que antigamente separava a URSS
Outra região que possuía uma dinâmica pró-
do Oriente Médio desapareceu com a formação
pria e uma inserção internacional específica, e que
dos novos estados.
hoje começa a somar-se ao dinamismo da Ásia
Oriental, é o subcontinente indiano. A Índia ca- Washington, por sua vez, busca não apenas
racterizava-se por uma industrialização substitutiva ter um acesso direto aos recursos econômicos da
e autocentrada, e era aliada de Moscou no plano Ásia Central, como procura evitar que a região
estratégico (vale dizer, anti-chinesa), apesar de sua torne-se uma espécie de zona de contato entre a
diplomacia neutralista voltada ao não alinhamento Ásia e a Europa. A reabertura da Rota da Seda,
e ao Terceiro Mundo. O colapso da União Sovié- antiga ligação terrestre entre a Europa e a Ásia
tica, a ascensão econômica da Ásia Oriental e anterior à era das navegações, é bem mais do que
Sudeste, os efeitos da globalização econômica e um episódio vinculado ao turismo.
da RCT, a normalização das relações da China com
Contudo, de momento, o mais importante é
seus vizinhos e as novas ameaças à segurança in-
que o potencial conflitivo da região e a dimensão
diana, levaram Nova Delhi tanto a promover uma
de cerco, real ou potencial, que a estratégia norte-
abertura calculada de sua economia, como a bus-
americana provoca (sobretudo em relação à Chi-
car um modus vivendi com a China e a mover-se
na), fazem que a noção de segurança asiática seja
em direção a uma complexa e ambígua aliança com
ampliada para a Ásia central e, por meio dessa, ao
os Estados Unidos.
próprio Oriente Médio. Assim, além dessa última
Quase simultaneamente, o espaço geopolítico região possuir vínculos econômicos com a Ásia,
asiático ampliava-se ainda mais com o surgimento novos problemas têm permitido o estabelecimen-
de novos estados, resultantes do desmembra- to de um contato mais sistemático entre os dois
mento da URSS. A antiga Ásia central Soviética, cenários, anteriormente distantes. Lentamente, a
detentora de uma posição estratégica privilegiada Ásia política começa a identificar-se com a Ásia

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geográfica e, ainda mais importante, progressiva- trução de uma Ordem Mundial não hegemônica,
mente esboça-se a noção de Eurásia, analisada com um modelo de desenvolvimento nacional, de
adiante. segurança e de governabilidade, o que atrai a aten-
ção mundial, em uma época marcada pela instabi-
IV. A EURÁSIA E A ORGANIZAÇÃO DE COO-
lidade posterior à Guerra Fria.
PERAÇÃO DE SHANGHAI
Esse Novo Segundo Mundo3 mantém uma dis-
A expansão do cenário estratégico asiático para
creta e sutil cooperação estratégica com o “Velho
o interior da Eurásia significa a ampliação de re-
Segundo Mundo” (reduzido à CEI), como foi vis-
cursos naturais e industriais desse, mas, em um
to, e também tem uma relação menos antagônica
quadro de maior diversidade, igualmente o
do que se poderia pensar com os países capitalis-
surgimento de novos problemas e conflitos. Isso
tas da Ásia. Por um lado, os modelos de desen-
afeta tanto os países da Ásia quanto os EUA. Se
volvimento e os regimes políticos dos países asi-
os primeiros conseguem com isso ampliar seu
áticos possuem fortes semelhanças e importantes
espaço de manobra econômica e diplomática, por
interesses comuns, sejam eles formalmente capi-
outro, a complexidade contida na nova realidade
talistas, sejam socialistas. Esses modelos políti-
em formação acrescenta dificuldades a uma re-
co-econômicos, “autoritários e estadistas” na pers-
gião que atravessa uma evolução acelerada (com
pectiva norte-americana, encontram-se hoje sob
todas suas implicações) e não conta com meca-
a pressão ocidental, desde o campo dos direitos
nismos próprios de segurança coletiva. Para os
humanos ao dos mecanismos econômicos. A ten-
Estados Unidos, uma Ásia maior, comportando
dência dos países da região, então, é a de afirmar
maior número de atores políticos e com uma eco-
certo discurso e política comuns. Contudo, al-
nomia que progressivamente entrelaça o próprio
guns são extremamente vulneráveis a esse tipo de
continente, significa maiores dificuldades de in-
pressão, por sua dependência diplomática, militar
fluência sobre a evolução político-econômica da
e comercial em relação aos EUA. Assim, a China,
região.
embora esquivando-se formalmente de desempe-
Existe também outra nova realidade que tem nhar tal papel, acaba sendo a principal garantia do
de ser levada em conta quando se analisa o fenô- chamado “modelo asiático”, um dos responsáveis
meno asiático. No estudo dos cenários estratégi- pelo acelerado crescimento econômico da região.
cos dos anos 1990, alguns analistas referem-se à
Existe também outro fator de longo prazo que
formação de um “Novo Segundo Mundo”,
se encontra associado a esse fenômeno. Com a
nucleado pela RPC. De fato, como lembra o
reincorporação de Hong Kong em 1997 e de
politólogo britânico Halliday (2007), até 1989 vi-
Macau em 1999, para os asiáticos simboliza o
viam em países classificados como socialistas, 1,7
eclipse do ciclo colonial, o que coincide com a
bilhões de pessoas. Após o colapso do bloco so-
ascensão econômica da região. E os dirigentes
viético, existiam ainda 1,3 bilhões nessa posição.
asiáticos têm perfeita consciência de que sem a
Não se trata, contudo, de considerar-se esse como
China isso não seria possível, o que não significa
um simples elemento residual.
ignorar a existência de divergências intra-asiáti-
Acadêmicos norte-americanos, como cas. Observado desde a perspectiva da geopolítica
Huntington (1997), destacaram que o fim do con- clássica da virada do século, não seria absurdo
flito Leste-Oeste e o enfraquecimento de ideolo- visualizar a afirmação da massa continental, ou
gias universalistas, como o socialismo, tiveram Heartland, que passaria a desafiar a Ilha Mundi-
seu lugar ocupado pelo “conflito de civilizações”. al. Estaria essa economia, cada vez mais da Ásia
Assim, o Novo Segundo Mundo atravessa uma continental e menos do Oceano Pacífico, em con-
NEP2 que, diferentemente da soviética, não se dições de sobrepujar a hegemonia da economia
encontra limitada a “um só país”, mas inserida na anglo-saxônica centrada nos grandes espaços
economia mundial, sobre a qual influi de maneira marítimos planetários?
considerável e crescente. Além disso, ele está
gestando um paradigma alternativo para a cons-
3 O conceito de “Novo Segundo Mundo” é apresentado
no Estudo de Macrocenários, realizado pela Secretaria de
2 A política econômica socialista apoiada no mercado, que Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República
vigorou na URSS entre 1921 e 1927. durante o governo Fernando Henrique Cardoso.

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Um elemento-chave para responder a essa As ações que os Estados Unidos desenvolvem


questão será a posição que o Japão vier a adotar. na região, devido à necessidade de evitar o
Esse país, tido até recentemente como paradigma surgimento de pólos de poder e de desenvolvi-
do desenvolvimento asiático, encontra-se em es- mento autônomos na Ásia, conduzem esse país a
tagnação e na encruzilhada de grandes e inadiáveis uma série de atitudes que acabam favorecendo
decisões. Sua economia enfrenta uma prolongada uma razoável acomodação das divergências de
recessão, a população está envelhecida, o con- Pequim com seus vizinhos. Os EUA têm procura-
senso social começa a dar sinais de esgotamento do estabelecer um cerco geopolítico à China,
e o sistema político organizado em 1955, durante como bem o demonstram os acordos de Washing-
a Guerra Fria, entrou em colapso, e passa por ton com a Mongólia, além de fomentar o separa-
redefinições que, todavia, ainda não estão sufici- tismo no Tibete e em Taiwan, com apoio ao dis-
entemente claras. Contudo, o nó da questão en- curso independentista, como observou-se nas elei-
contra-se justamente na política internacional, em ções taiwanesas de 1996.
relação à qual Tóquio precisa definir-se: como
Os Estados Unidos também parecem dispos-
parte da economia Nichibei, ou seja, como a fron-
tos a instrumentalizar política e economicamente
teira oriental do império americano, ou como par-
a Índia e o Vietnã como parte de sua estratégia de
te da Ásia e sua fronteira ocidental.
isolamento da China e de contenção de seu desen-
A economia nipônica tem se voltado progres- volvimento, tirando proveito da rivalidade desses
sivamente para o continente; as questões de se- dois países em relação à Pequim. Contudo, Wa-
gurança regional têm obrigado o país a um maior shington parece desconsiderar que tanto Nova
envolvimento local (como no caso da península Delhi como Hanói definem-se estrategicamente
coreana) e as pressões norte-americanas para que pelos Cinco Princípios da Coexistência Pacífica e
o Japão enquadre-se ao novo padrão que a potên- pelo ideário de Bandung, como a China. Assim,
cia protetora busca implementar para a economia apesar de divergências concretas, esses três im-
mundial, levam muitos estadistas e empresários a portantes países asiáticos possuem muitas pers-
defender uma maior autonomia para a nação, apoi- pectivas e interesses comuns de longo prazo. A
ando-se no continente. Mas, por outro lado, o evolução de seu inter-relacionamento recente pa-
Japão ainda depende significativamente dos EUA; rece apontar nessa direção.
são tremendamente vulneráveis às pressões diplo-
Para muitos analistas está ocorrendo a emer-
mático-militares por sua dependência em matéria
gência da Eurásia como região geopolítica e
de segurança, além de encontrarem fortes reser-
geoeconômica. Dentre os três grandes centros de
vas entre os países do continente, pois as grandes
desenvolvimento do Hemisfério Norte, sempre
questões herdadas da II Guerra Mundial ainda não
houve vínculos estreitos por meio dos Oceanos
estão solucionadas como o foram na Europa.
Pacífico e Atlântico, associando a economia da
Em um plano mais geral, a situação da Ásia América do Norte com a da Ásia Oriental e da
encontra-se marcada por uma série de contradi- Europa Ocidental, respectivamente. Mas desde a
ções. Os países asiáticos, mesmo a China, conti- derrocada do sistema colonial, Ásia e Europa têm
nuam favoráveis à manutenção da presença mili- caminhado separadas, o que agora começa a mu-
tar americana na região, pois ela garante a segu- dar. A possibilidade de que um triângulo venha
rança regional a um custo reduzido e, ainda, no realmente a formar-se poderia alterar o equilíbrio
caso de Pequim, justifica um acercamento entre internacional.
os asiáticos para conter o “hegemonismo” de
A Rússia, por sua vez, ainda que tenha se tor-
Washington na área. Trata-se de uma postura de-
nado um parceiro qualitativamente inferior à anti-
fensiva que acaba, em certa medida, por legitimar
ga URSS, tem mantido com países-chave da Ásia
a China aos olhos de seus vizinhos. Contudo, as
uma crescente cooperação em campos particu-
nações asiáticas rechaçam as pressões econômi-
larmente sensíveis, como também foi visto ante-
cas e as ingerências políticas norte-americanas,
riormente. Além disso, esse país constitui preci-
tanto em assuntos internos como externos, que
samente o elo terrestre que serviria de base para a
constituiriam justamente os temas mais importantes
constituição de um grande espaço econômico
para a Casa Branca, já que seu poder bélico não é
eurasiano. A Rússia, desde que Evgueni Primakov
utilizado explicitamente.
tornou-se Primeiro Ministro, mas especialmente

137
A NOVÍSSIMA CHINA E O SISTEMA INTERNACIONAL

desde que Vladimir Putin assumiu a presidência, produziu igualmente a explosão da “bolha finan-
passou a reorganizar-se, a crescer economicamen- ceira”. Para evitar a inflação, o governo bloqueou
te, a recuperar parcialmente sua capacidade mili- a oferta de dinheiro, condenando o país à estag-
tar e a desenvolver um significativo protagonismo nação. Ao mesmo tempo, vários bancos faliam,
diplomático. Além da parceria estratégica sem que o Estado pudesse socorrer a todos.
estabelecida com a China, ambos os países cria-
No momento em que a China começou a con-
ram a Organização de Cooperação de Shanghai,
cretizar seu processo de reunificação (iniciado com
um acordo de caráter econômico e de segurança,
a devolução de Hong Kong em 1997) e os Tigres
que engloba igualmente o Cazaquistão, o
tentavam consolidar seu desenvolvimento em mol-
Uzbequistão, o Tadjiquistão e o Quirguistão, além
des autônomos, prosseguia a estagnação japonesa
de associados e observadores. A Ásia central pos-
e, em seguida, ocorreu o terremoto financeiro nos
sui recursos em gás e petróleo que são indispen-
países mais vinculados e dependentes dos Estados
sáveis ao desenvolvimento chinês.
Unidos (Tailândia, Indonésia e Coréia do Sul). Essa
Por fim, importantes países asiáticos indivi- crise, apesar de haver reduzido inicialmente a pro-
dualmente e organizações regionais como Asia- dução, afetou especialmente o âmbito financeiro,
Pacific Economic Cooperation (APEC), The com a desvalorização das moedas locais, o que
Pacific Economic Cooperation Council (PECC), permitiu ao capital forâneo adquirir empresas naci-
South Asian Association for Regional Cooperation onais a um preço reduzido. Além disso, intensifica-
(Saarc) e Asean, entre outras, têm buscado um vam-se as pressões pela fragmentação da China
maior acercamento com países-chave do Tercei- (revivendo a questão do Tibete e de Taiwan) e con-
ro Mundo, particularmente com os chamados tra a Indonésia, que acabaram derrubando o regi-
emergentes, como o conjunto da África Austral me autoritário de Suharto. Mas a China e a Malásia,
nucleado pela África do Sul posterior ao Apartheid bem como o Vietnã, resistiram à crise e a Coréia do
e com o Mercado Comum do Sul (Mercosul), Sul recuperou-se.
particularmente com o Brasil. Assim, o Oceano
A crise ocorreu em um contexto em que o de-
Índico estaria constituindo-se em uma espécie de
senvolvimento da Ásia-Pacífico vinha encaminhan-
rota de ligação com o Sul. A cooperação mais es-
do-se para uma interiorização no continente e seu
treita com essas regiões, apesar de atualmente
centro, o que é particularmente visível não apenas
possuir um impacto limitado no plano puramente
pela intensificação das relações econômicas entre
econômico, possui um potencial promissor de
os próprios países asiáticos. Já a corrida
médio e longo prazo, além de constitui um ele-
armamentista (particularmente naval) na Ásia Ori-
mento estratégico nas disputas entre os pólos de-
ental tem sido percebida de maneiras diferentes.
senvolvidos do Hemisfério Norte. Não se pode
Enquanto para analistas ocidentais essa corrida evi-
deixar de considerar que, pelo fato do pólo asiáti-
dencia a ascensão da rivalidade e da desconfiança
co constituir em linhas gerais uma área em desen-
entre os estados asiáticos, para muitos destes re-
volvimento, existe um amplo espaço para o esta-
presenta implicitamente a capacitação e moderni-
belecimento entre este e os mercados emergentes
zação militar, como forma de dissuadir coletiva-
antes referidos, de uma parceria estratégica ca-
mente possíveis ingerências extra-regionais contra
paz de influenciar o futuro perfil da ordem inter-
a sua soberania (conceito hoje desprezado no Oci-
nacional emergente.
dente, mas profundamente arraigado na Ásia).
V. A CRISE ASIÁTICA DE 1997, A SEGUNDA
VI. GUERRA AO TERRORISMO, A TERCEIRA
TENTATIVA DE CONTENÇÃO
TENTATIVA DE CONTENÇÃO
O contínuo desenvolvimento econômico asiá-
A Guerra ao Terrorismo, que os Estados Uni-
tico, contudo, sofreu em 1997 o forte impacto da
dos desencadeou após os atentados de 11 de se-
crise financeira, que atingiu vários países e reper-
tembro de 2001, inaugurou uma ampla interven-
cutiu na região como um todo. A chamada crise
ção na Ásia central e ocidental. A implantação
asiática teve antecedentes no Japão, que desde o
americana no Afeganistão e no Iraque, bem como
final dos anos 1980 conhecia dificuldades econô-
a presença militar parcial no Cáucaso e nas repú-
micas, e buscava cooperar com o continente para
blicas ex-soviéticas da Ásia Central, bem como a
compensar seus crescentes problemas com os
exploração da crise coreana e da luta contra o ter-
EUA. Em 1991 estourou a “bolha imobiliária”, que
rorismo na linha que vai do sul das Filipinas até o

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 19, Nº SUPLEMENTAR: 131-141 NOV. 2011

Paquistão, evidencia o perfil da política externa curto” da capacidade militar norte-americana.


do governo Bush para a Ásia. Parece haver a in- Estreitou a cooperação político-econômica com
tenção de inserir uma cunha no coração geopolítico os vizinhos asiáticos e intensificou o comércio com
da Eurásia, dificultando a integração física da a América Latina e seus regimes esquerdistas, mas
Rússia com a China. Esta manifestou discreta- sem confrontar Washington nessa região que é
mente o que considerou um cerco estratégico por sua área de influência. Ao mesmo tempo, a China
Washington, além da ameaça que paira quanto ao aproximou-se do continente africano, tanto por
acesso ao petróleo da Ásia central por parte da motivos econômicos (mercados e matérias-pri-
economia chinesa. mas) quanto diplomáticas (combater a presença
remanescente de Taiwan). Em novembro de 2006
Por meio de guerras teatrais contra os debili-
foi realizada, em Pequim, a terceira Cúpula Chi-
tados países do chamado Eixo do Mal, confor-
na-África, com a presença de mais de 40 lideres
me Todd (2003), o que a administração republi-
africanos, ocorrendo o lançamento de uma espé-
cana busca é conter a formação de uma conste-
cie de Plano Marshall chinês para o continente,
lação de pólos de poder na Eurásia, capazes de
por meio de investimentos em infraestrutura e ajuda
contribuir para a formação de um sistema inter-
ao desenvolvimento.
nacional multipolar. O desenvolvimento e a au-
tonomia da Eurásia deixariam a América “margi- O desenvolvimento econômico chinês e o fim
nalizada”, uma vez que perderia sua posição de da Guerra Fria foram determinantes para as rela-
liderança junto à economia e ao sistema de segu- ções entre a China e a África. Até então, a política
rança mundial. Daí manter-se uma situação de externa chinesa para o continente negro baseava-
instabilidade permanente na região. Como os se na antiga disputa ideológica, primeiramente com
pólos de poder asiático estão reagindo? Com muita os Estados Unidos e as potencias coloniais euro-
cautela. A Coréia do Sul tenta evitar uma escala- péias, e, depois, com a União Soviética. Assim, a
da, mantendo negociações com o Norte e, junta- China buscava parcerias que convergissem com
mente com o Japão e a China, tentando impedir sua posição conjuntural, bem como uma diplo-
uma ação americana. macia de prestígio. Quando o país distanciava-se
da URSS, aliava-se com aqueles que fossem con-
A China, por sua vez, teve uma atuação dis-
tra a infiltração do bloco soviética no continente,
creta quanto à guerra contra o Iraque, evitando
como em uma tentativa de polarizar o sistema in-
polemizar demasiadamente com os EUA. O inter-
ternacional de uma forma mais intensa. Assim,
câmbio econômico com Washington é vantajoso
durante a década de 1980, houve um decréscimo
e Pequim necessita manter seu crescimento eco-
nas relações sino-africanas, pois muitos acredita-
nômico ao menos por mais uma década. Ao mes-
vam que a China não precisa da África como das
mo tempo, o dragão chinês busca cada vez mais
potências ocidentais para edificar seu próprio for-
associar os vizinhos ao seu processo de desen-
talecimento econômico.
volvimento econômico, o que vem fazendo com
sucesso, enquanto participa nas iniciativas regio- Quando o bloco soviético começava a esface-
nais de cooperação, econômicas, políticas ou de lar-se, ocorreu um episódio bastante importante
segurança, como no caso da Asean. Assim, a Chi- para os acontecimentos posteriores envolvendo
na vai tornando-se o centro de gravidade da Ásia esses atores. Os eventos da Praça da Paz Celestial
e, discretamente, participando de modo prudente, geraram forte reação da comunidade internacio-
mas segura, na grande diplomacia mundial. Ela nal. A reação por parte de governantes africanos,
seguramente conformará um pólo de poder com todavia, foi diferente. Não faltaram líderes que
alguns países vizinhos, em um sistema internaci- defendessem a atitude do governo chinês. Dessa
onal multipolar, regido por uma ONU forma, a China passou a encarar a África de outra
redimensionada pelo novo equilíbrio de forças que forma, visualizando uma possível aliança política
se viria a formar. que lhe serviria de sustentação, principalmente na
ONU. Paralelamente, a China aproveitava a oca-
VII. O MUNDO EM DESENVOLVIMENTO SE
sião para minar a presença de Taiwan no conti-
TORNA ESTRATÉGICO PARAA CHINA: O
nente. Percebeu-se, igualmente, que haveria van-
CASO DA ÁFRICA
tagens econômicas possíveis com os africanos, e
Evitando confrontar os EUA na Ásia central, a política externa voltou-se mais em direção ao
Pequim buscou áreas não cobertas pelo “lençol continente.

139
A NOVÍSSIMA CHINA E O SISTEMA INTERNACIONAL

Outro ponto comum entre chineses e africa- cio-econômico de ambos, pois isso dificultaria sua
nos é o fato de que compartilhavam a visão de subserviência às potências do Norte.
que as críticas ocidentais apenas procuravam re-
No decorrer da década de 1990, o acelerado
tardar o desenvolvimento dos países mais pobres.
crescimento econômico pelo qual passava a Chi-
Ambos têm um passado comum de exploração
na suplantou a limitada oferta de petróleo que as
européia, o que os torna desconfiados de eventu-
estatais do país produziam, em comparação com
ais manifestações contrárias às suas políticas do-
as crescentes necessidades. Além disso, uma gran-
mésticas e soberania. Além disso, a possibilidade
de parcela da população deixou a linha da pobre-
de crescimento econômico, desvinculado da su-
za, sobretudo aqueles que saíram do campo. Há
jeição a agendas de liberalização política impostas
alguns anos, Angola tornou-se o maior fornece-
pelos países da Organização para a Cooperação e
dor do combustível para o país asiático, superan-
Desenvolvimento Econômico (OCDE) anima inú-
do a Arábia Saudita. Além disso, os chineses im-
meros governantes africanos.
portam outros minérios e vários produtos alimen-
O continente passou, então, a ser considerado tícios.
pela política externa chinesa como o maior espa-
Com base nesses princípios, ocorreu, em 2000,
ço de aliados no mundo. Por outro lado, os afri-
a criação do Fórum de Cooperação China-África,
canos vêem com bons olhos a parceria com a
que visa a regulamentar as relações entre as par-
China, sobretudo devido à posição dessa no Con-
tes, de modo a promover o desenvolvimento mú-
selho de Segurança da ONU. Depois de 1989, a
tuo. As reuniões são trienais e seus principais pon-
ajuda humanitária e os negócios entre as partes
tos não se limitam ao aumento do comércio, mas
cresceram significantemente. O número de visi-
também à cooperação científico-tecnológica e à
tas diplomáticas entre chefes de Estado voltou a
ajuda econômica chinesa, que ocorrem, sobretu-
ter um ritmo ascendente, e foram criadas novas
do, por meio de investimentos em infraestrutura.
iniciativas para que empresas pudessem deslocar-
Na última reunião do Fórum, em 2009, os chine-
se para o continente. Naturalmente, as empresas
ses prometeram conceder dez bilhões de dólares
estatais foram pioneiras, mas logo seguidas pela
em empréstimos aos países africanos, além de
iniciativa privada e atores subnacionais chineses.
favorecer a iniciativa privada chinesa a investir
Vale notar que a China tem, historicamente, mais no continente negro.
relações amigáveis com seus vizinhos. Sempre foi
Quando os Estados Unidos iniciaram uma gran-
de seu interesse buscar parcerias para evitar con-
de intervenção na Ásia central e no Oriente Mé-
frontos futuros, de modo a forjar um jogo de soma
dio, em função da “guerra ao terrorismo”, os in-
positiva. Por isso, os chineses sempre evitaram a
teresses chineses foram gravemente afetados.
intervenção em assuntos internos de outras na-
Havia projetos de oleodutos e gasodutos em mar-
ções. Aos africanos, evidentemente, isso era mui-
cha nessas regiões, e a segurança energética foi
to favorável, pois os organismos internacionais,
ameaçada. Para evitar confrontos com Washing-
tais como o Fundo Monetário Internacional (FMI),
ton, Pequim procurou um espaço onde sua inser-
sempre condicionam empréstimos a medidas de
ção fosse menos onerosa diplomaticamente. Esse
ajuste econômico restritivo e choques de gestão,
espaço era a África e, em menor medida, a Amé-
além de um elevado grau de liberalização político-
rica do Sul. Na mesma linha, a crescente necessi-
econômica que comprometiam a governabilidade
dade de minerais, alimentos e outras matérias pri-
dos estados africanos.
mas, além de áreas para investimento de capitais
Os chineses, por outro lado, concedem ajuda chineses e mercados para seus produtos, fez que
sem questionamentos e com poucas exigências. a cooperação sino-africana atingisse um patamar
Essas medidas são muito criticadas pelo Ociden- estratégico.
te, que detrata a ajuda chinesa a países com histó-
A oferta de prédios públicos (palácios presi-
rico de desrespeito aos direitos humanos, os cha-
denciais, ministérios, hospitais, escolas, centros
mados “estados delinqüentes”. Essas reclamações
de convenções e estádios esportivos) entusiasmou
são encaradas com ceticismo por parte de africa-
os africanos. Os produtos chineses, extremamente
nos e chineses, que entendem que se trata de mais
baratos, encontraram na África um espaço ines-
uma tentativa de impedir o desenvolvimento só-
perado, permitindo aos africanos o acesso a um

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 19, Nº SUPLEMENTAR: 131-141 NOV. 2011

consumo antes inimaginado. Mesmo em remotas passaria de uma espécie de neoimperialismo à


aldeias africanas há um pequeno comércio chinês chinesa, e que a concessão de empréstimos sem
do tipo “1,99”. Grandes obras de infraestrutura, a exigência de garantias político-institucionais fa-
novas ou reconstruídas após décadas de guerra voreceria ditaduras.
geram milhões de empregos, embora a China em-
Os detratores ignoram, contudo, que a maio-
pregue, em muitos casos, sua própria mão de obra
ria dos africanos exalta a participação chinesa,
e haja algumas tensões localizadas. Projetos de
sempre fazendo questão de diferenciá-la da euro-
mineração, prospecção de petróleo, exploração de
péia. Essa atuação é bastante coerente com o his-
madeira, projetos agrícolas, assistência técnica e
tórico da política externa chinesa, que prioriza a
vultosos investimentos mudaram o panorama eco-
não intervenção nos assuntos domésticos. Vê-se,
nômico africano.
portanto, uma nítida intenção de fortalecimento
Mais ainda, os africanos deixaram de solicitar político-econômico por parte dos chineses, que
empréstimos ao FMI, passaram a ser mais seleti- vêem na África uma oportunidade ímpar para ex-
vos com a ajuda ocidental e, sobretudo, a desen- pandir negócios, encontrar parceiros diplomáti-
volver uma diplomacia mais assertiva. Se há ca- cos e alterar o perfil da ordem mundial, rumo à
sos de corrupção, isso também havia com os ne- multipolaridade. Resta, por enquanto, esperar para
gócios europeus. O fornecimento de armamento que os africanos organizem-se melhor para que
e o apoio diplomático chinês, sobretudo vetando estabeleçam uma política coerente em relação à
iniciativas ocidentais no Conselho de Segurança China. Até o momento, os chineses sempre to-
da ONU contra estados africanos, elevaram a mam a dianteira e regem as negociações, mesmo
autoconfiança do continente, que não se sente mais que elas sejam organizadas bilateralmente.
abandonado. É isso que Bruxelas, Washington e
Assim, a chegada da China à periferia em de-
as organizações não-governamentais não conse-
senvolvimento, com uma agenda política e eco-
guem compreender. Para os africanos, trata-se de
nômica abrangente, parece inaugurar um novo
uma descolonização econômica e de uma nova
estágio na projeção internacional chinesa e no pró-
projeção internacional.
prio sistema mundial. A China estabeleceu com a
A atuação chinesa suscita reações bastante di- África, por exemplo, uma relação que não é me-
versas na comunidade internacional. Os pontos ramente conjuntural, mas irreversível. Ainda que
positivos são o crescimento econômico por que sem condições de impor nada aos africanos, et
os países africanos vêm experimentando e o in- pour cause, Pequim inaugura uma nova etapa na
vestimento pesado em infraestrutura, sempre ne- grande política internacional e suplanta a fase em
gligenciado pelos europeus. Por outro lado, ape- que a Nova China lutava para recuperar sua so-
sar das críticas, há, globalmente, um equilíbrio berania e desenvolvimento, pois a Novíssima Chi-
comercial entre os estados africanos e a China. na começa a transformar o próprio sistema mun-
Há quem argumente, ainda, que essa relação não dial.

Paulo G. Fagundes Visentini (paulovi@ufrgs.br) é Doutor em História Econômica pela Universidade de


São Paulo (USP) e Professor de Relações Internacionais na Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(Ufrgs).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
HALLIDAY, F. 2007. Repensando as Relações XX e XXI. In: FIORI, J. L. (org.). Estados e
Internacionais. Porto Alegre: UFRGS. moedas no desenvolvimento das nações.
Petrópolis: Vozes.
HUNTINGTON, S. P. 1997. O choque de civili-
zações. Rio de Janeiro: Objetiva. TODD, E. 2003. Depois do império. São Paulo:
Record.
MEDEIROS, C. 1999. China: entre os séculos

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 19, Nº SUPLEMENTAR: 145-148 NOV. 2011

current level of technological development, we seek to provide a correct interpretation of China’s


multi-lateral agreements at the global level, within the context of the United Nations’ Committee for
Peaceful Use of Outer Space (CPOUS) and within a regional context, with the recently established
Asian Pacific Space Cooperation Organization (APSCO). Similarly, we are able to understand the
meaning, potential and practical limitations of Chinese bilateral cooperation with Brazil and South
Africa, regional powers located outside of Asia. We conclude that Chinese space cooperation is
meant to increase Beijing’s international influence without generating exaggerated reactions from
other major powers. Thus, China attempts to postpone the militarization of space, seeking partnerships
with regional powers who are still newcomers to the field, while keeping the future and expectations
linked to the impact of digitalization into account.
KEYWORDS: Space Cooperation; Chinese Space Program; International Security.
* * *
RELATIONS BETWEEN CHINA AND LATIN AMERICA: SHORT OR LONG DURATION?
Matt Ferchen
This article focuses on business relations and investments involving China and Latin America during
the decade of the 2000s. There are three major interpretations, different yet interconnected, on this
set of relations. According to the first one, Latin America, a region with abundant natural resources,
exports primary products to a China in expansion that is experiencing a shortage of the latter. Close
to this interpretation is also another one, advocated by prominent members of government, which
asserts that economic relations between China and Latin America are fundamentally complementary
and have a positive effect on both. In contrast, other observers have emphasized that what is seen as
complementarity is in truth little more than a new form of Latin American dependence. These
authors argue that, notwithstanding the rapid expansion of businesses and investments bringing short
term benefits to both countries, the nature of these relations based on commodities actually reinforces
dysfunctional standards of Latin American development which many countries within the region
rejected some time ago and from which they have been trying to free themselves for a period now
spanning more than half a century. Taking this discussion as our reference point, we present a
general view of trade and investment relations between China and Latin America, highlighting the
important role played by Chinese demand for Latin American commodities. This is followed by a
description of different interpretations on what guides this commercial relationship as well as what
consequences it may produce. We conclude by exploring the implications of our findings with regard
to the notion that China provides the sole model for domestic and international political economy.
KEYWORDS: Business; Investment; China, Latin America.
* * *
THE NEW CHINA AND THE INTERNATIONAL SYSTEM
Paulo G. Fagundes Visentini
China has arrived on the periphery of development, bringing with it a wide political and economic
agenda. This marks a new phase in China’s international projection and in the world system itself.
What are the goals of this new New China in terms of international politics? There are many who
claim that China entertains ambitions of world dominance, seeking to move into the position the
United States has held in terms of planetary leadership. In a manifestation of what comes close to
resembling sino-phobia (a new version of the “yellow threat”), there are those who argue that
Chinese development seeks to concentrate world wealth, breaking up the economies of other nations
of the world. In advancing the hypothesis that Peking has inaugurated a new stage in international
politics, substituting the one in which the New China was struggling to regain sovereignty and
development, we base our argument on the relationships that China has established with the African

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 19, Nº SUPLEMENTAR: 145-148 NOV. 2011

continent. The new New China, then, has begun to transform the world system itself. In this sense,
we argue, China has sought to avoid hegemonies, whether that of the Unitied States or its own. If
this were not so, its fate could turn out to be similar to that of Germany’s, in the aftermath of two
World Wars. Yet such strategies might not be feasible, since China must act today within the context
of post-World War diplomatic fluidity and an aging contemporary capitalism whose historic centers
are in rapid decline .
KEYWORDS: Chinese Diplomacy; International System; China-Africa Relations.
* * *

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 19, Nº SUPLEMENTAR: 151-154 NOV. 2011

LA NOUVELLE CHINE ET LE SYSTÈME INTERNATIONAL


Paulo G. Fagundes Visentini
L’arrivée de la Chine à la périphérie en développement, avec un agenda politique et économique
varié, inaugure une nouvelle étape dans la projection internationale chinoise et même dans le
système mondial. Quels seraient les objectifs de cette Nouvelle Chine par rapport à la politique
internationale ? Il y a ceux qui identifient dans les initiatives chinoises, des aspirations ambitieuses de
domination mondiale, succédant les États Unis autant que pays en tête de la planète. Avec une
manifestation qui tend vers la sinophobie (connue avant comme la « peur jaune »), on argumente que
son développement souhaite concentrer la richesse mondiale dans ses mains, en brisant l’économie
des autres nations. En ayant comme principe les relations établies avec le continent africain, nous
soutenons l’hypothèse selon laquelle, Pékin inaugure une nouvelle étape dans la grande politique
internationale et supplante la phase où la Nouvelle Chine luttait pour récupérer sa souveraineté et
son développement, et ainsi, la Nouvelle Chine commence à transformer le système mondial lui-
même. Pour cela, nous argumentons que la Chine cherche à éviter l’hégémonie, celle des États
Unis, et la sienne aussi. Car dans ce cas, elle pourrait avoir le même sort que l’Allemagne dans les
deux guerres mondiales. Ce n’est pas une tâche facile, car la Chine se déplace entre la fluidité
diplomatique de la période postérieure à la Guerre Froide, et le vieillisement du capitalisme contemporain
dans ses centres historiques.
MOTS-CLÉS: la diplomatie chinoise; le système international; les relations Chine-Afrique.
* * *

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