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(Continuação do Acórdão referente ao Processo nº 30.919/2016.........................................)
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as normas e procedimentos para uma navegação segura, em especial o item 0503, da
NORMAM-03/DPC, agindo com imprudência ao empreender navegação utilizando
propulsão a vela sem a devida habilitação, bem como em condições climáticas adversas,
colocando assim em risco a própria vida.
Recebida a Representação e citado o Representado, que não possui
antecedentes no Tribunal Marítimo, foi regularmente defendido.
Fernão Soares de Oliveira alegou, em sua defesa, por I. advogado
constituído, que ao sair para navegar na Praia de Guaecá com seu caiaque, bem próximo
da praia, foi surpreendido pela mudança repentina do vento, trazendo dificuldades para
que retornasse à costa, com isso abandonou o caiaque indo se abrigar na praia, quando
pela manhã foi encontrado por locais. Que durante a navegação não se afastou em
demasiado, pois permaneceu no visual dos banhistas.
Que a embarcação, a qual o representado conduzia, não se tratava de Veleiro
e sim de um simples caiaque conforme descrito pelo fabricante juntado a documentação
aos autos. É um caiaque de recreação com acessórios, que não possui qualquer tipo de
motorização. E nessa condição de caiaque não se exige a habilitação para sua condução
conforme regrado na NORMAM.
Finalizou alegando a falta da prova material eis que o caiaque não foi
periciado e requereu a improcedência da Representação.
Aberta a instrução, nenhuma prova adicional foi produzida.
Em alegações finais, falaram as partes.
É o Relatório.
Decide-se:
De tudo o que consta dos presentes autos, temos que a D. Procuradoria
representou em face de Fernão Soares de Oliveira, na qualidade de condutor do caiaque
sem nome, com fulcro no art. 15, alínea “e” (exposição a risco), da Lei nº 2.180/54,
fundamentando no IAFN.
O Representado ofereceu Defesa sem negar os fatos, mas requereu a
improcedência da Representação alegando que para conduzir a embarcação não se exige
habilitação e que se tratava apenas de um caiaque, sem qualquer motorização.
Das provas dos autos, além dos dois depoimentos que descrevem os fatos
como constam na exordial da PEM temos:
No anexo à Defesa, fl. 67, consta “DESCRITIVO CAIAQUE TRIMARAN
SAILER” (...) Vela GRANDE 4 cores (tradicional) de alta performance, em tecido
importado; Mastro em alumínio com estais, brandais e com regulagem; Leme retrátil
alumínio naval com pintura eletrostática; Bolina retrátil e removível em alumínio naval
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com pintura eletrostática.
O descritivo desta embarcação não deixa dúvidas que se trata de um caiaque
trimarã, veleiro, portanto, no mínimo, teria que ser conduzido por um amador habilitado
“Velejador – VLA”, como definido na NORMAM 03/DPC, item 0503, descrito na
exordial da PEM.
O acima descrito já afastaria a discussão acerca de ser ou não uma
embarcação, pois não se trata de algo improvisado, ou artesanal, mas de uma embarcação
fabricada pela empresa Caiaques Lontras, como consta no anexo à Defesa e a dúvida
levantada pelo Eminente Juiz Relator está na NORMAM 03/DPC, onde há uma
“aparente” contradição, em suas definições, pois, no seu CAPÍTULO 1
CONSIDERAÇÕES GERAIS – DEFINIÇÕES. 0106 – DEFINIÇÕES, consta:
Embarcação - qualquer construção, inclusive as plataformas flutuantes e as fixas quando
rebocadas, sujeita a inscrição na autoridade marítima e suscetível de se locomover na
água, por meios próprios ou não, transportando pessoas ou cargas.
A aparente contradição está na afirmativa que dá a impressão que toda
embarcação é sujeira a inscrição na autoridade marítima, entretanto, mais adiante, na
mesma norma, descreve as embarcações “dispensadas de inscrição”, ou seja, nem todas
as embarcações tem que ser inscritas na Capitania.
“Inscrição da Embarcação - é o seu cadastramento na CP, DL ou AG, com a
atribuição do nome e do número de inscrição e a expedição do respectivo Título de
Inscrição de Embarcação (TIE)”.
No item 0112 - ATIVIDADES COM EQUIPAMENTOS DE
ENTRETENIMENTO AQUÁTICO, na letra i) Quadro resumo de regras e
recomendações para os equipamentos. O quadro abaixo apresenta as principais
especificidades dos equipamentos de entretenimento aquático e principais exigências e
recomendações quanto a sua utilização, que inclui os caiaques como embarcações miúdas
dispensadas de inscrição e de habilitação para sua condução, mas de uso obrigatório do
colete salva-vidas.
Ainda no item 0215 - CLASSIFICAÇÃO DAS EMBARCAÇÕES. As
embarcações serão classificadas como descrito a seguir: (...) d) Tipos de Embarcações “6
Caiaque - Pequena embarcação com proa e popa semelhantes, dotada de um pequeno
poço ao meio onde se assenta o remador; 7 Caique Pequeno bote a remos, com proa e
popa cortadas em painel. Possui três bancadas, uma central para o remador e as outras
pequenas na proa e na popa para passageiros; (...) 18 Multicasco (Catamarã, Trimarã, etc)
Embarcação constituída de dois ou três cascos paralelos ligados por uma estrutura rígida.
As de dois cascos são chamadas de catamarã e as de três cascos (ou um casco central e
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dois balanceiros) chamadas de trimarãs.
Na SEÇÃO I - INSCRIÇÃO E REGISTRO DA EMBARCAÇÃO. 0202 -
OBRIGATORIEDADE DE INSCRIÇÃO E/OU REGISTRO. c. Estão dispensadas de
inscrição as embarcações miúdas sem propulsão e os dispositivos flutuantes destinados a
serem rebocados, do tipo banana-boat, com até 10 (dez) metros de comprimento; (...) f)
Aplicação de Normas às Embarcações Dispensadas de Inscrição. As embarcações e os
dispositivos flutuantes dispensados de inscrição continuam sujeitos às normas previstas
na legislação em vigor e à jurisdição do TM.
A própria NORMAM 03/DPC estabelece que mesmo as embarcações miúdas
e dispensadas de inscrição continuam sujeitas às normas previstas na legislação em vigor
e à jurisdição do Tribunal Marítimo.
Mesmo que nas normas da Autoridade Marítima não estivesse assim
definida, na Lei Orgânica do Tribunal Marítimo, Lei nº 2.180/54, “JURISDIÇÃO E
COMPETÊNCIA” temos: “Art. 10. O Tribunal Marítimo exercerá jurisdição sobre: a)
embarcações mercantes de qualquer nacionalidade, em águas brasileiras; Art. 11.
Considera-se embarcação mercante toda construção utilizada como meio de transporte
por água, e destinada à indústria da navegação, quaisquer que sejam as suas
características e lugar de tráfego. Parágrafo único. Ficam-lhe equiparados: a) os artefatos
flutuantes de habitual locomoção em seu emprego; b) as embarcações utilizadas na
praticagem, no transporte não remunerado e nas atividades religiosas, cientificas,
beneficentes, recreativas e desportivas”.
Por todo o exposto, afastando a discussão acerca do caiaque ser ou não
embarcação ou a ela equiparada, que se encontra claro na NORMAM 03/DPC e na Lei nº
2.180/54, adentrando no mérito temos:
A Defesa do Representado, fls. 67 a 69, não contestou os fatos apresentados
na exordial da PEM, mas “alega ter sido surpreendido pela mudança repentina de vento,
trazendo dificuldade para que retornasse a costa”; (...) “que a embarcação a qual o
representado conduzia, não se tratava de Veleiro, e sim de um simples Caiaque conforme
descrição em anexo do próprio fabricante”.
No Relatório do IAFN, a causa determinante do acidente foi a imprudência
do condutor do caiaque “por ignorar as condições desfavoráveis de tempo, uma vez que
estava previsto mau tempo, conforme Aviso de Mau Tempo nº 1237/2015, emitido às
14h do dia 5 de setembro de 2015, pelo Serviço Meteorológico Marinho”.
No depoimento do Representado, fls. 12 a 14, o próprio declarou que estava
em um caiaque, chamado trimarã, equipado com vela e dois flutuadores; estava só a
bordo (em um caiaque para duas pessoas); não era habilitado; “saiu navegando
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paralelamente à praia, o vento batia sentido terra para o mar, velejando de través, com
isso sempre o afastando da praia, quando viu que não ia conseguir voltar para a praia, o
mesmo arriou a vela e remou, tentando se aproximar de terra, não obtendo sucesso,
decidiu então abandonar a embarcação, com isso alcançou uma pedra, onde resolveu
passar a noite naquele local”.
Por todo o exposto, não havendo qualquer prova em contrário do que consta
na exordial da PEM e estando superada a “aparente contradição da NORMAM 03/DPC”,
ou seja, trata-se de uma embarcação, movida a velas e a remos, temos que:
1. Deveria estar sendo conduzida, no mínimo, por um “velejador”;
2. Caso não estivesse usando as velas não teria se afastado tanto da praia;
3. Caso fosse conduzida por um velejador, o simples fato de o vento estar
soprando de terra para o mar não seria impedimento de se aproximar da praia; e
4. Caso fosse um condutor prudente teria se informado acerca de aviso de
mau tempo para a área, pois havia aviso de ressaca entre Santos (SP) e Arraial do Cabo
(RJ), com ondas de S/SE 2,5m, emitido às 14h do dia 5 de setembro de 2015 e válido até
o dia 6, zero hora.
A favor do Representado temos o seu depoimento, onde esclarece os fatos e
assume a responsabilidade pelo fato da navegação em pauta, ao declarar que faltou
planejamento e que o próprio seria o responsável pelo fato, o que deve ser considerado a
seu favor na aplicação da pena, além de ter perdido sua embarcação e sofrido pequenas
escoriações e ter ficado exposto sozinho, sobre uma pedra durante o período de seu
“desaparecimento”.
Assim,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Marítimo, por maioria, nos termos do
voto do Exmo. Sr. Juiz Fernando Alves Ladeiras, que pediu vista: a) quanto à natureza e
extensão do fato da navegação: caiaque trimarã movido a vela e a remo que foi deixado à
deriva pelo seu condutor, ao não conseguir se aproximar de terra, com danos materiais e
lesões corporais leves no condutor, Fernão Soares de Oliveira, médico, não habilitado,
mas sem registro de danos ambientais; b) quanto à causa determinante: erro de manobra e
navegação, por falta de habilidade com a embarcação e por ignorar as condições
desfavoráveis de tempo; e c) decisão: julgar o fato da navegação tipificado no art. 15,
letra “e” (exposição a risco), da Lei n° 2.180/54, como decorrente de imperícia e
imprudência do Representado, Fernão Soares de Oliveira, não habilitado, condutor do
caiaque trimarã movido a vela e a remo, acolhendo os termos da Representação da D.
Procuradoria Especial da Marinha e, também, na aplicação da pena, os argumentos de sua
Defesa, considerando as circunstâncias, consequências e atenuante, com fulcro nos
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artigos 58, 121, inciso I, 124, incisos I e IX, 127, 128 e 139, inciso IV, letra “d”, todos os
artigos da Lei n° 2.180/54, aplicar-lhe a pena de repreensão. Custas processuais na forma
da lei, sendo acompanhado pelos Exmos. Srs. Juízes Sergio Bezerra de Matos, Marcelo
David Gonçalves e Maria Cristina de Oliveira Padilha. O Exmo. Sr. Juiz-Relator
mandava arquivar os autos do Processo, tendo em vista que o fato descrito na inicial foge
à esfera de competência do Tribunal Marítimo, sendo acompanhado pelo Exmo. Sr. Juiz-
Revisor, sendo ambos vencidos.
Publique-se. Comunique-se. Registre-se.
Rio de Janeiro, RJ, em 15 de maio de 2018.
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Assinado de forma digital por COMANDO DA MARINHA
DN: c=BR, st=RJ, l=RIO DE JANEIRO, o=ICP-Brasil, ou=Pessoa Juridica A3, ou=ARSERPRO, ou=Autoridade Certificadora SERPROACF, cn=COMANDO DA MARINHA
Dados: 2018.11.26 14:55:06 -02'00'