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confronto entre maneiras diferentes de ver o mundo, tenderá a ser menos fre-
Çiente em sociedades culturalmente mais homogêneas. De qualquer forma,
por mais homogênea que uma sociedade for, sempre haverá diferenças de pon-
tos de vista entre jovens e idosos, entre mulheres e homens ou entre indivíduos
com diferentes status dentro da comunidade.
Outra diferença entre modos e gêneros é que um texto, do início ao fim, per-
tence ao mesmo gênero. Não é possível um conto, a partir de determinado pa-
rágrafo, transformar-se numa receita culinária ou num memorando, no entan-
to tendem a co-ocorrer num mesmo texto seqüências pertencentes a diferentes
modos de organização textual. Na verdade os modos, como já o dissemos em
outro trabalho, "só aparecem em estado 'puro' no nível microestrutural" - cf.
O LIVEIRA (in HENRIQUES e SIMÕES, 2004, p. 185). Podemos identificar o
m odo de organização de um parágrafo, de uma frase, de um fragmento de frase
etc., mas não do texto como um todo. Neste, o que existe é a predominância de
determinado modo sobre os demais.
Quanto à inserção de um gênero em outro (por exemplo: uma carta contida
num romance, um poema numa piada, uma fábula num livro didático, um
e-mail numa ata de reunião etc.) é um fenômeno textual completamente dife-
rente da coexistência de dois ou mais modos num mesmo texto. No caso de tais
inserções, a relação entre o texto inserido e o outro no qual se insere é de conti-
nente e conteúdo. Trata-se do fenômeno da citação: um texto de determinado
gênero é citado, às vezes na íntegra, em outro de outro gênero.
Na verdade cada gênero textual está associado a um contrato de comuni-
cação, ou seja, a um conjunto de "direitos" e "deveres" d e quem produz o texto
e de quem o interpreta. Cada gênero, de acordo com o contrato de comunica-
ção que a ele subjaz, aceita determinada temática, determinada macroestrutura
textual, certas estruturas sintáticas, certo vocabulário etc. e rejeita outros.
A própria relação de quem fala ou escreve com a veracidade do conteúdo da
mensagem é objeto do contrato de comunicação de cada gênero. Daí o exem-
plo, imaginado acima, do leitor que, lendo ficção como quem lê uma notícia,
"cobrasse" - injustamente - do autor fidelidade aos fatos. Essa cobrança seria
injusta, porque a "cláusula" do compromisso com a realidade, embora presente
no contrato da notícia, não pertence aos dos gêneros ficcionais. Sobre o con-
ceito de contrato de comunicação, ver CHARAUDEAU, 1992, p. 638, CHA-
RAUDEAU, 1983, p. 54 e MAINGUENEAU e CHARADEAU, 2002, p. 138-141
e OLIVEIRA, 2003, p. 33-40.
Um gênero textual, segundo BAKHTIN, 1997, p. 279, tem seu conteúdo
temático, seu estilo e sua construção composicional "marcados pela especi-
ficidade de uma esfera de comunicação''. Tais gêneros, segundo ele, são "tipos
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( ... )É preciso que súbito/ Tenha-se a impressão de ver uma garça apenas
pousada e que um rosto! Adquira de vez em quando essa cor só encon-
trável no terceiro minuto da aurora./( ... )/ É preciso que umas pálpebras
cerradas/ Lembrem um verso de Élouard e que se acaricie nuns braços/
Alguma coisa além da carne( ... )/ É preciso (... )!Que haja uma hipótese
de barriguinha /(... )e que exista um grande latifúndio dorsal!( ... )/ Que
ela surja, não venha; parta, não vá ! (... ) Oh, sobretudo ! Que ela não
perca nunca(...)/ a sua infinita volubilidade/ De pássaro( ... )/ e em sua
incalculável imperfeição/ Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de
toda a criação inumerável.- cf. MORAES, 1967, p. 234-237.
Referências bibliográficas
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