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Número 04

Repensando o Planejamento
Marcos Thadeu Queiroz Magalhães
Yaeko Yamashita
Março de 2009
Repensando o Planejamento

Marcos Thadeu Queiroz Magalhães


Yaeko Yamashita

Publicação cujo objetivo é divulgar


resultados de estudos desenvolvidos pelo
Ceftru, os quais, por sua relevância, levam
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e estabelecem um espaço para sugestões.
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são de exclusiva e de inteira responsabilidade
do(s) autor(es), não exprimindo,
necessariamente, o ponto de vista do Centro
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Centro de Formação de Recursos Humanos multidisciplinar de Ciência e Tecnologia em
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www.ceftru.unb.br Prof. Dr. Paulo César Marques da Silva

Prof. Dr. Márcio Muniz de Farias

Prof. Dr. Carlos Alceu Rodrigues


ISSN 1983-3555 Prof. Dr. Carlos Felipe Grangeiro Loureiro

Textos para Discussão

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Repensando o Planejamento

Marcos Thadeu Queiroz Magalhães


Yaeko Yamashita

Repensando o Planejamento
Rethinking the Planning Process

Marcos Thadeu Queiroz Magalhães1


Yaeko Yamashita2

Resumo
O presente trabalho trata das limitações do método oficial de planejamento adotado pelo
Governo Federal Brasileiro, e propõe um novo esquema de planejamento para ultrapassar essas
limitações. Uma das limitações cruciais é a desconexão entre o planejamento, o acompanhamento e a
avaliação, notadamente a de resultados, que apesar de serem postos como atividades essenciais do
método, a prática tem evidenciado essa desconexão. De forma a superar essas limitações, este trabalho
revisita o planejamento desde seus aspectos mais fundamentais, desenvolvendo, a partir desta reflexão,
um modelo próprio capaz de integrar as diversas etapas (planejamento, acompanhamento e avaliação)
de forma integral e orgânica.

Palavras-chave: Planejamento; Planejamento Governamental; Planejamento de Transporte;


Planejamento Estratégico, Tático e Operacional.

Abstract
This paper addresses the current limitations of the official planning method adopted by the
Brazilian Federal Government, and it proposes a new planning framework capable of solving these
issues. A central example of such limitations is the disconnection amongst planning, monitoring and
evaluation. Although they are stated to be essential activities on this method, practice has increasingly
made the disconnection evident. Towards overcoming these limitations, the fundamentals of planning
are revisited to provide a base for developing a new planning framework capable of integrating the
different tasks (planning, monitoring and evaluation) in a comprehensive and organic manner.

Keywords: Planning; Government Planning; Transport Planning; Strategic, Tactic and Operational
Planning.

1 Centro de Formação de Recursos Humanos em Transportes – Ceftru e Programa de Pós-Graduação da Universidade de

Brasília, Doutorando e Mestre em Transportes pela UnB, e-mail: thadillo@gmail.com e thadillo@ceftru.unb.br.


2 Centro de Formação de Recursos Humanos em Transportes – Ceftru e Programa de Pós-Graduação da Universidade de

Brasília, PhD, e-mail: yaeko@unb.br.

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Repensando o Planejamento

Marcos Thadeu Queiroz Magalhães


Yaeko Yamashita

1 Introdução
O Plano Plurianual 2000-2003 inaugurou um novo momento no Planejamento Nacional: a
orientação a resultados (MPOG, 2002). Este novo modelo de planejamento, que envolve diferentes
níveis de decisão e desenvolvimento (estratégico, tático e operacional), tinha, e tem, como elemento
fundamental um processo de avaliação respaldado em indicadores. Nesta nova forma de organização,
os programas, como conjunto coerente de ações voltadas à obtenção de um objetivo comum e bem
definido, são as unidades referenciais à gestão pública.

Este processo de planejamento, por concepção, deveria contemplar as atividades de


planejamento, acompanhamento e avaliação (MPOG, 2002), esta última tanto para auditoria quanto
para realimentação e revisão do Planejamento. No entanto, na prática, alguns entraves ocorreram,
principalmente no que concerne à avaliação dos resultados finalísticos dos programas, ou seja, a
avaliação da obtenção dos resultados (objetivos) estabelecidos. No que diz respeito ao setor de
Transportes, as razões são as mais diversas e estão apontadas nos diversos relatórios de execução dos
Planos Plurianuais (MPOG, 2000; 2001; 2002; e 2005), variando desde à inexistência de uma estrutura
de coleta de dados até a questionamentos sobre a validade dos indicadores e a própria concepção dos
programas.

Assim, na maioria dos casos, a avaliação do plano fica restrita ao acompanhamento de sua
execução físico-financeira (MPOG, 2000; 2001; 2002; e 2005), o que, apesar de ser um processo
essencial, não é suficiente para as expectativas postas pela nova lógica da gestão pública. Este processo
de acompanhamento é conduzido sobre as metas físicas, sobre os chamados produtos diretos das
ações. Todavia, a isso se somam problemas como: a desconexão entre os resultados desejados e as
ações selecionadas; agrupamento gerencial inadequado; compromisso com resultados que ultrapassam a
capacidade de ação; e, pouca visão da necessidade de interação intersetorial.

Dessa forma, apesar da metodologia desenvolvida para o planejamento nacional, no caso do


setor de Transportes, ela não se mostrou suficiente para responder a um planejamento contínuo, no
qual o paradigma de orientação a resultados fosse efetivamente incorporado. Existe sim, uma exigência
formal que, no entanto, não é respaldada adequadamente pelo método e pelo conhecimento existente.

Dito isto, este trabalho se insere justamente nesta lacuna de conhecimento, tendo como
proposta um caminho metodológico de planejamento que integre planejamento, acompanhamento e
avaliação (de auditoria e planejamento) num único processo, coerente e efetivo, adequado ao paradigma
de orientação a resultados.

Neste sentido, o texto que se segue foi estruturado em seis seções, a contar com esta
introdução. A segunda seção trata da metodologia de Planejamento Nacional adotada pelo MPOG –
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, e suas limitações para o setor de Transporte, além
dos diferentes enfoques de avaliação: o primeiro voltado à auditoria e o segundo ao planejamento. Na
terceira seção, aborda-se os principais fundamentos e bases epistemológicas do planejamento. Em
seguida, desenvolve-se a proposta de modelo geral de planejamento, no qual o acompanhamento e
avaliação dos resultados são atividades orgânicas. Na seção cinco, indica-se alguns elementos para
superar as limitações do processo de avaliação conforme disposto no planejamento oficial. Por fim, faz-
se considerações finais sobre a proposta.

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Marcos Thadeu Queiroz Magalhães


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2 O planejamento oficial: o método adotado pelo Ministério do


Planejamento no Brasil a partir do PPA 2000-2003
A metodologia de planejamento, instituída com o PPA 2000-2003, é resultado de um esforço
iníciado em 1995, com o PPA 1996-1999 e que teve importantes avanços ao longo do exercício desse
Plano (MPOG, 2002).

Nela o elemento crucial no planejamento é a identificação de problemas, definidos como


“demandas não satisfeitas, carências ou oportunidades” (MPOG, 2006) que afetam um determinado
público e que, quando reconhecidos e declarados pelo governo, passam a fazer parte de sua agenda de
compromissos. Identificados os problemas, o próximo passo é apontar suas causas, ou seja, os
elementos que determinam a existência dos problemas. Em seguida, estabelece-se os objetivos e as
ações.

Assim, todas as ações são desenvolvidas de forma já orientada à solução dos problemas
apontados e suas respectivas causas, o que é o cerne do planejamento voltado aos resultados. Em
outras palavras, os programas não são determinados apenas pelas afinidades entre ações. Eles são
conjuntos de ações voltadas à solução de um problema específico que atinge um determinado público-
alvo (MPOG, 2002).

Pela metodologia do PPA, uma vez definido o objetivo, é necessário desenvolver um indicador
para acompanhar o resultado do programa, medindo sua efetividade, eficácia e eficiência. A estrutura
completa desse modelo é apresentada na Figura 1.

Figura 1: Modelo Integrado Plano/Orçamento/Execução/Avaliação do PPA. Adaptado de MPOG


(2002)
Cabe observar os seguintes pontos na metodologia do PPA:
• os programas são as unidades de gestão do plano;
• os objetivos e indicadores são especificados por programa;
• a avaliação acontece com base na execução e subsidia a revisão do plano;
• são mensurados os objetivos e indicadores, produtos e metas, e produtos e custos.
Sobre este modelo, é possível fazer os seguintes comentários e identificar as seguintes lacunas:
• não há uma etapa em que haja a especificação do objeto a ser planejado e seus limites;
• não explicita as etapas de construção do planejamento, por exemplo, quando se definem
diretrizes, estratégias;
• há apenas um grande processo de revisão, que pode ser entendido como a revisão do
Plano;

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• não reconhece que os indicadores são utilizados tanto em relação aos objetivos quanto à
relação produto-meta e produto-custo;
• não explicita os diferentes níveis de decisão e seus produtos.
Antes de avançar para a proposta de um novo modelo que ultrapasse essas limitações, cabe
abordar brevemente alguns aspectos da implicação desse modelo no processo de planejamento,
acompanhamento e avaliação.

2.1 As Conseqüências do Modelo Oficial de Incoerências entre Plano, Acompanhamento e


Avaliação.

Com base no material apresentado, fica evidente (Figura 1) que o modelo de planejamento,
acompanhamento e avaliação tem seu desenvolvimento direcionado exclusivamente aos programas.
Dessa forma, implica-se nos seguintes pontos (Figuras 2 e 3):

• Direcionados aos programas, os indicadores, que são elementos-base de qualquer


sistema de avaliação, perduram enquanto durem os programas.
• Extintos os programas, extinguem-se os indicadores.
• Criados novos programas, desenvolvem-se novos indicadores.
• Como o foco direciona-se sobre os programas, existe grande dificuldade de sintetizar
uma visão geral acerca do objeto de planejamento.

}
Figura 2: Indicadores voltados para Programas e dificuldade de síntese acerca do estado
do objeto de planejamento.

Assim, observando a figura 2, tem-se a primeira implicação: a dificuldade de sintetizar os


indicadores de forma a representar, por exemplo, o estado do Transporte no País. Como os indicadores
são desenvolvidos sobre os objetivos do programa e não sobre o objeto do Planejamento Nacional de
Transportes, por princípio, não se pode esperar que os indicadores representem a situação do
Transporte.

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Figura 3: Extinção dos programas implica na descontinuidade do uso dos indicadores. Isto
determina a impossibilidade da síntese do estado do objeto de Planejamento.

Da figura 3, tem-se mais uma implicação: a descontinuidade temporal. Mesmo que os


indicadores pudessem traduzir o estado do Transporte, uma vez estando vinculados à existência dos
programas, não se garante sua disponibilidade para o acompanhamento do estado do sistema. Além
disso, é sabido que alguns programas apenas geram resultados após sua plena implementação (MPOG,
2000; 2001; 2002; e 2005) se o indicador pára de ser aferido quando da extinção de seu programa.
Assim, fica impossível mensurar o resultado obtido e, consequentemente, não se consegue saber se os
problemas enfocados no plano ainda persistem, se as estratégias foram bem definidas ou mesmo se as
ações geraram seus resultados específicos. Como conseqüência, estabelece-se uma descontinuidade no
processo de planejamento.

Por fim, o custo do sistema de monitoramento é demasiado variável, pois é função do número
de programas existentes. Posto isto, verifica-se dificuldade na provisão de recursos para o
monitoramento e no desenho de um sistema estável para acompanhamento e coleta de dados.

Na proposta apresentada neste artigo, tenta-se equacionar também este problema. Em seguida,
explorar-se-á os diferentes enfoques de avaliação que fazem parte de um processo integral de
planejamento.

2.2 Os Enfoques da Avaliação: Auditoria e Planejamento

É importante destacar que, dentro do processo de planejamento, existem dois tipos de


avaliação. Uma de natureza mais operacional, de auditoria, e outra de natureza mais estratégica/tática, a
avaliação do planejamento como um todo. Cada um destes enfoques será abordado a seguir.

2.2.1 O Enfoque da Avaliação de Auditoria

No planejamento, são definidos os desejos por produtos e os resultados que se pretende obter
com a realização de uma determinada atividade. As medidas de desempenho, por vezes chamadas de
indicadores, traduzem a situação observada (MARTINS, 2004 apud CÂMARA, 2006), e a avaliação do
desempenho permite que se forme um conhecimento sobre o assunto, possibilitando a antecipação de
fatos, a correção de cursos de ações e, por fim, um processo de melhoria contínua, preocupação central
no planejamento.

Assim, através da avaliação de desempenho, é possível saber (GAO, 2005 apud CÂMARA,
2006): quão bem uma atividade está sendo desempenhada; se as metas traçadas estão sendo atingidas;
se as atividades realizadas estão de acordo com as necessidades, provocando, assim, a satisfação destas

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necessidades; se os processos estão sendo controlados e se há necessidade de melhorias e em que áreas


as melhorias devem ser realizadas.

Nesse sentido, Câmara (2006) observa que a avaliação de desempenho pode servir como um
sistema de advertência ao avaliador, adiantando-lhe o caminhar das atividades e funcionando como uma
forma de melhorar a prestação de contas do Poder Público à sociedade sobre as atividades concedidas.

A base deste enfoque é o modelo entrada-saída-resultado ou “input-output-outcome” (Figura


4), modelo utilizado, inclusive, pelo TCU (2000).

Figura 4: Modelo Entrada-Saída-Resultado.

A este respeito cabem as seguintes observações:


• este enfoque de avaliação é orientado a processos, verificando sua correção, sua
conformidade ao que foi previamente estabelecido no Planejamento;
• os indicadores de entradas representam os insumos que foram ou são utilizados no
processo;
• os indicadores de saída representam os produtos das ações;
• os indicadores de resultado representam as alterações no estado-de-coisas, o impacto
finalístico dos produtos.
Neste processo de avaliação, é possível formular juízos de valor sobre a eficácia e a eficiência
dos processos no que concerne à sua produtividade, bem como ao seu nexo lógico, com um objetivo
último. No entanto, não se pode julgar a eficácia e a eficiência da estratégia adotada no planejamento
em relação ao seu objetivo final, uma vez que, como está hoje posto, não se consegue enxergar toda a
estratégia setorial.

2.2.2 O Enfoque da Avaliação de Planejamento

Infelizmente, o Brasil ainda não possui um processo de Planejamento que consiga integrar
adequadamente as implementações operacionais e gerar um fluxo de informação que possibilite a
gestão e o re-planejamento. Dessa forma, percebe-se que esta avaliação é feita sobre esforços isolados,

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mas ainda não institucionalizados. Ademais, o processo de avaliação, voltado para o planejamento, vem
hoje a reboque do processo de auditoria, comentado anteriormente. Isto ocorre principalmente pela
demanda e atuação dos organismos de controle, a exemplo dos Tribunais de Contas, Ministério
Público, Controladorias, dentre outros, como pode ser confirmado nos diversos relatórios de avaliação
do PPA, bem como em alguns Acórdãos dos Tribunais de Contas.

No passado, o enfoque da auditoria ficava restrito à avaliação de eficácia e eficiência, ou seja, se


os processos geravam os produtos previstos e se geravam o máximo de produtos com o mínimo de
recursos. Assim, como a avaliação do planejamento tardava a se desenvolver, os organismos de
controle passaram a incorporar a preocupação do resultado social, verificando a existência no nexo
lógico entre solução e problema existente. É neste contexto que o termo efetividade se insere e, assim, o
processo de auditoria passa a incentivar um processo de amadurecimento dos métodos, técnicas e
recursos de Planejamento.

No entanto, cabe ressaltar que a avaliação do planejamento é, diferentemente da de auditoria,


voltada ao objeto planejamento, aos problemas de planejamento e à assertividade das soluções, principalmente no que
diz respeito à sua concepção. Cabe observar ainda que este gap entre avaliação de auditoria e
planejamento não é exclusiva do Brasil. Diversos países, inclusive da União Européia, apenas
recentemente iniciaram o desenvolvimento de um sistema de avaliação de programas de governo.
Portanto, esse é um dos pontos a serem contornados pela proposta de modelo de planejamento
apresentado neste trabalho.

3 Revendo as bases do planejamento


O esforço aqui intentado é o de construir um processo de planejamento que seja aderente com
o acompanhamento e a avaliação, mantendo o paradigma de orientação a resultados. Nesse propósito,
o desafio é conseguir ultrapassar as limitações impostas pelo método existente, e para isso faz-se
necessário repensar o planejamento. Essa seção explora este tema, desde suas definições fundamentais,
fundamentos epistemológicos até a proposição de um processo de planejamento que consiga integrar a
elaboração do plano, sua implementação, avaliação e revisão. A seguir, as principais definições de
planejamento serão abordadas.

3.1 As Diferentes definições de Planejamento e suas Nuances

Planejar é uma ação essencialmente racional, humana, e para ela existem diversas definições,
algumas delas vistas a seguir.

Ferrari (1979) define planejamento como um método contínuo destinado à solução racional de
problemas que afetam uma sociedade, espacialmente e temporalmente localizada e determinada,
antecipando suas conseqüências num momento futuro. É, portanto, um processo continuado que segue
métodos científicos para a condução da análise e elaboração de soluções.

Com uma visão um pouco diferenciada, Güell (1997) define como Planejamento (estratégico)
um método sistemático de gerir as mudanças (na empresa) com o propósito de competir
vantajosamente (no mercado), adaptar-se ao seu entorno, redefinir produtos e maximizar os benefícios.
Essa definição ressalta um caráter competitivo ao planejamento, particular às relações empresariais-
comerciais.

Matus (1984 e 1993) busca uma acepção mais geral e essencial para o Planejamento e para o ato
de planejar, e o define como a tentativa de submeter à vontade do homem (planejador) o curso

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encadeado dos acontecimentos cotidianos, que determinam uma direção e uma velocidade à mudança
de um contexto. Neste processo, tenta-se tomar as rédeas de uma situação, deixando a posição de
conduzido para a de condutor do próprio destino.

Cada uma destas definições traz embutido um viés específico, a saber: o planejamento
tradicional (tecnicista); o planejamento estratégico (foco empresarial) e o planejamento estratégico
situacional (político-social). O primeiro concebe o planejamento mais próximo a uma teoria da decisão,
segundo a qual o resultado depende das escolhas do planejador/ator singular. O segundo e o terceiro se
aproximam da teoria dos jogos, segundo a qual o resultado depende de um contexto de atores que
tomam decisões simultâneas. O segundo diferencia-se do terceiro pela sua forte abordagem não-
cooperativa (um ganha, outro perde).

Independente de que viés adotar, alguns elementos se colocam como fundamentais e inerentes
ao planejamento: o sujeito que planeja e age; o objeto planejado, que muda, e uma intenção,
expectativa, ou fim. Estes aspectos serão oportunamente discutidos nas seções seguintes.

3.2 O Ator do Planejamento: Homem Indivíduo vs. Homem Coletivo

O conflito entre Homem Indivíduo e o Homem Coletivo é um elemento essencial na


compreensão da essência do ator que planeja e age, e inerente a qualquer processo de planejamento.

Matus (1984 e 1993) defende que é no processo de planejamento que o Homem Indivíduo
realiza um ato de reflexão superior e reconhece que só a consciência e a força do Homem Coletivo
podem encarnar a chamada “Vontade Humana”, enfrentar a correnteza do curso normal dos fatos e
desviar seu curso em direção a objetivos racionalmente decididos. Ou seja, nesta afirmação, Matus
defende que o Homem Indivíduo não é uma força potente para gerar mudanças, força esta apenas
conseguida quando o Indivíduo se reconhece Coletivo e, como tal, atua no sentido de provocar
mudanças na direção desejada.

O Homem Coletivo é, portanto, força social. Não é, contudo, homogêneo em objetivos e


intenções, encarnando em diversas forças sociais com objetivos e desejos diferenciados sobre e em
relação às coisas. Quando se fala em ator, considera-se o homem coletivo como força social capaz de
transformação real. Assim, discernir entre atores e expectadores é necessário e determinante na
construção de um plano político e pragmaticamente viável.

Desta forma, o planejamento não se refere simplesmente à relação do homem com as coisas. E
sim, do homem com as coisas relacionadas com outros homens, ou seja, um problema entre os
homens. Isso faz com que o objeto de planejamento seja um elemento em constante mudança. Dessa
forma, sejamos ou não o agente desta mudança, haverá sempre um outro agente atuando na
determinação do rumo dos fatos. É, portanto, o homem coletivo o verdadeiro ator do planejamento.

Cabe agora explorar a relação entre o homem coletivo e o objeto de planejamento em seu
aspecto epistemológico.

3.3 Fundamentos Epistemológicos do Planejamento

Na construção de sua teoria do planejamento, Matus (1984 e 1993) aborda a relação entre o
sujeito que planeja e o objeto planejado. Os principais aspectos são aqui apresentados sem, entretanto,
entrar nos debates filosóficos mais profundos.

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A relação de sujeito-planejador e objeto-planejado tem sido vista de diversas formas ao longo da


história do planejamento, em nuances análogas ao debate existente no âmbito da Teoria do
Conhecimento, área da Filosofia. Dois paradigmas são fundamentais: um concebe o sujeito fora do
objeto planejado; o outro o concebe como parte do objeto planejado.

Figura 5: Sujeito fora do objeto. Existe apenas uma interpretação.

A primeira visão é aquela que entende que o Sujeito está isolado e fora do objeto. Essa, segundo
Matus (1984 e 1993), é a abordagem do planejamento tradicional (Normativo).

De acordo com essa visão, existe apenas um sujeito que planeja e apenas um objeto. Este
sujeito detém a visão única do objeto, para o qual existe apenas uma interpretação possível e verdadeira.
Além disso, esse caso concebe que o objeto é possível de ser apreendido e compreendido
completamente pelo sujeito, que uma vez tendo conhecido o objeto, passa a conhecer todas as leis que
o regem, resultando numa total possibilidade de predição/previsão.

É como a visão de um alienígena sobre a Terra. Do espaço, pode-se ver sua forma, suas cores,
seus continentes e massas de água. Ele abarca todo o planeta e acredita que isso é suficiente para
determinar seu rumo. Entretanto, não vê à distância a dinâmica microscópica dos habitantes dos
diversos continentes, suas diferenças culturais, etc.

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Figura 6: Diferentes sujeitos (atores) dentro do objeto e interferindo em seu desenvolvimento. Cada ator
possui uma interpretação particular.

A segunda visão entende que o Sujeito está dentro do objeto planejado, participando com
outros sujeitos. Esta segunda linha, que caracteriza os fundamentos epistemológicos do planejamento
estratégico situacional, concebe o sujeito com, dentro e parte do objeto do conhecimento, no nosso
caso, do objeto do planejamento.

Segundo esta visão, o sujeito é parte do objeto e é sujeito como parte deste objeto. Ele não está
sozinho, contudo convive com outros sujeitos em constante relacionamento com o mesmo objeto.
Entende, ainda, que não é possível o conhecimento do objeto como “coisa-em-si”, mas tão somente
como fenômeno, aparência, aparência esta determinada pela intenção do sujeito acerca do objeto.
Equivale a dizer que cada sujeito enxerga o objeto através de uma lente/filtro particular, entretanto
ninguém consegue enxergar o objeto imediato, e essa visão depende do que queremos e/ou do que nos
interessa acerca do objeto.

A partir disso, pode-se entender que cada Sujeito guarda apenas uma visão parcial do objeto,
cujos aspectos constituintes desta visão são mediados pela sua relação com o objeto. Mas, ao mesmo
tempo, existem outros sujeitos, que também possuem visões parciais e todos eles atuando sobre o
“mesmo” objeto. Neste contexto, não é possível, para qualquer ator isolado, explicar a transformação
do objeto, uma vez que esta dinâmica é determinada num contexto de interação mais complexo. Há,
assim, a necessidade de envolvimento dos diversos atores para o desenvolvimento de uma visão plural.
Pois somente dessa forma o objeto pode ser definido de uma forma mais adequada ao planejamento.

Figura 7: A união das diferentes interpretações do objeto tidas pelos diversos atores é uma visão geral,
mais próxima e completa do objeto de planejamento.

3.4 A Proposta: Modelo Geral de Planejamento, Acompanhamento e Gestão

É na tentativa de integrar os enfoques de auditoria e planejamento num único quadro-


conceitual que se optou por adotar um modelo esquemático de planejamento que incorporasse os
princípios do modelo de planejamento apresentado pelo MPOG (2002), desde que ultrapassasse as
limitações inerentes a este.

Este modelo será apresentado a seguir e tem como postulado a epistemologia do planejamento
estratégico situacional ( MATUS, 1984 e 1993).

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Figura 8: Processo Integrado de Planejamento.

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Sobre a Figura 8, alguns pontos cruciais devem ser observados/esclarecidos:


• O processo de Planejamento, principalmente em seus níveis estratégico e tático, tem
forte participação dos tomadores de decisão (discussão política) mas respaldados por
suporte técnico, de forma que o escopo do plano deve ser necessariamente um
compromisso político-social.
• Não existe planejamento sem a definição/delimitação clara do Objeto Planejado.
• No nível estratégico, é definido o que fazer; no tático, o como fazer; e no operacional, o que
implementar.
• Os programas são o resultado e especificação de estratégias. Eles contemplam um único
objetivo, ou seja, uma alteração específica no estado-de-coisas, e têm especificados seus
instrumentos de financiamento, de atuação (arranjo institucional), bem como os
instrumentos de publicação.
• Monitoramento é a etapa que fornece os inputs de dados para os diversos níveis de
avaliação.
• São quatro ciclos de avaliação e revisão: um operacional, no qual os dados do
monitoramento servem para a avaliação dos procedimentos de execução e
implementação; um tático, que utiliza os dados para saber se as estratégias e programas
foram os mais adequados; um estratégico, que utiliza os dados para acompanhar a
consecução das metas, bem como saber se as metas estabelecidas foram factíveis; e o
mais estrutural, em que usa-se dos dados para a revisão do diagnóstico e conseqüente
identificação dos problemas e redefinição dos objetivos do Plano.

Agora, explorar-se-á cada nível especificamente.

3.5 Nível Estratégico

Este é o nível responsável pela definição do que deve ser feito, definindo os requisitos da
solução que deverá ser desenvolvida ao longo do planejamento. Sua nuance é fortemente política. A
seguir cada aspecto é trabalhado em maiores detalhes.

Definição do Objeto (1)


O planejamento tem sempre um objeto sobre o qual se propõe atuar. A delimitação do objeto é
essencial ao planejamento, pois é a partir daí que se identificam os atores, obtém-se a noção mais clara
dos limites de intervenção sobre o objeto, e reconhecem-se os conhecimentos necessários à abordagem
adequada. Esta tarefa não é, contudo, algo trivial, e necessita, muitas vezes, da discussão a respeito dos
elementos demasiado abstratos. Ser negligente com esta tarefa é construir uma torre sobre areia
movediça. É arriscar a perder todo o esforço empenhado numa difícil tarefa.

Assim, quando se fala em planejar os transportes, deve-se ter definido esse conceito e seus
limites, sendo possível e necessário discernir tanto “o que é transporte” quanto “o que não é”. Deste
processo, surge uma estrutura analítica do objeto através da qual se pode inserir, de forma adequada e
coerente, todos os elementos componentes e intervenientes. Via de regra, essa estrutura analítica, bem como
as relações de causa-efeito conhecidas, são oferecidas pela ciência que trata do fenômeno abordado. Ou seja, o
planejamento é respaldado por uma base de conhecimentos, seja do senso comum, seja do
conhecimento científico. E, pelas propriedades do conhecimento científico (ver Morais, 2002), é
sempre preferível que este seja o elemento tomado como base para o planejamento.

A definição do objeto de estudo é tão boa quanto o seja a base de conhecimentos


proporcionados pela ciência e, na ausência desta, pelo senso comum.

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Figura 9: Objeto mal definido versus Objeto bem definido.

Retomando as noções da relação sujeito-objeto de planejamento, coloca-se a necessidade da


inclusão dos diversos atores para tornar possível a síntese do objeto planejado em sua completude,
considerando os mais diversos enfoques e intencionalidades. Por isso, a necessidade de um processo
participativo e de um mediador capaz de captar e organizar as diversas contribuições que surgem neste
processo.

Nesse contexto, de forma simplificada, definir o objeto é responder à questão: “o que estou
planejando?” ou, “sobre o que estou preocupado?”. Como pano de fundo destes questionamentos, é
conveniente que exista um conjunto de parâmetros sintéticos que sirvam como orientadores dessas
questões. Estes parâmetros são comumente chamados de indicadores finalísticos.

Imagem-Objetivo (2)

Tendo identificado adequadamente o objeto e uma estrutura analítica preliminar para abordar o
fenômeno de interesse, faz-se necessário o primeiro esforço de articulação dos diferentes atores: a
construção da visão.

A Imagem-Objetivo (Visão) é a síntese, para o objeto do planejamento, de um estado de coisas desejado. Consiste
no conjunto das diferentes expectativas dos atores, um referencial para o qual deve se dirigir todo esforço de planejamento.
É uma utopia concreta. É descrever o estado desejado do objeto num tempo futuro.

Na prática, a visão assume a forma de um enunciado descritivo e sintético da situação desejada


no futuro. De sua análise são obtidos os objetivos de curto e médio prazo necessários ao
desenvolvimento das ações e dos programas estratégicos.

A construção da visão deve contemplar a expectativa de cada ator quanto a cada dimensão e
seus elementos constituintes. Dessa forma, questões que poderiam ser feitas para o desenvolvimento
desta visão acerca do objeto seriam:
• Como deveria ser o transporte no futuro?
• Quais os “sintomas” de um bom transporte? Ou quais os fatos que, caso percebidos,
farão dizer que o transporte é bom?
o que se considera como sendo boas condições de transporte?
o que condições são satisfatórias?

É importante que, para auxiliar em outras etapas do planejamento, a exemplo da avaliação, que
estas respostas sejam dadas na forma de indicadores finalísticos.

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Repensando o Planejamento

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Yaeko Yamashita

Este é o momento de delinear as expectativas dos atores e construir um grande escopo de visão
de futuro. Aqui não é feito nenhum juízo de valor acerca das expectativas de cada ator, nem qualquer
consideração sobre viabilidade. Deve-se observar, ainda, que a construção da visão do transporte deve
sempre acontecer de forma integrada à superestrutura a qual suporta, enquanto infra-estrutura.

Uma técnica adequada ao desenvolvimento desta tarefa é a técnica de cartelas, que consiste em
especificar um tema e solicitar que os participantes escrevam seus pensamentos em pequenas cartelas,
sendo o material posteriormente sistematizado e apresentado para validação. Funciona como uma
técnica de brainstorming.

Diagnóstico (3)

A estrutura analítica, fornecida pela ciência (ou, na ausência desta, pelo senso comum), é o
ponto de partida para a abordagem do objeto do planejamento. Ela serve como fio condutor na
investigação do fenômeno em questão e permite que os levantamentos sejam feitos de modo ordenado
e coerente, facilitando as avaliações e interpretações dos resultados. Assim, essa estrutura deve ser a
mesma utilizada para a formulação da visão, caso contrário seria impossível compará-las.

É coerente que o diagnóstico seja feito tendo como base parâmetros sintéticos (indicadores
finalísticos) que orientem à exploração das questões realmente relevantes e que sejam os mesmos
utilizados no desenvolvimento de todas as etapas do plano, desde a visão até o processo de
monitoramento Assim, isso proporciona um processo mais ágil, econômico e tempestivo para o
planejamento.

Um diagnóstico, portanto, deve apresentar uma visão completa do estado do objeto do


planejamento (preferencialmente sendo orientado pelo uso de indicadores), em detalhe suficiente para
que seja possível comparar este estado com a imagem-objetivo, referência do deve-ser, e permitir o
levantamento dos problemas e suas causas, a etapa seguinte neste processo de planejamento.

Identificação de Problemas (4)

Um dos pontos-chave para o planejamento é a identificação dos problemas a serem


solucionados. E aqui surge a questão: O que é um problema?

Problema é a existência de uma desigualdade (distância) entre um estado atual de coisas e uma expectativa ou
referencial acerca de um objeto.

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Situação Atual

Situação Desejada

Figura 10: Situação atual e situação desejada. Duas referências para a determinação do problema. (Cortesia:
Joaquim Aragão)

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Mas como identificar um problema e suas causas? Para responder a esta questão, tome-se uma
situação hipotética.

Um morador de um bairro periférico de uma grande cidade reclama do sistema de transporte.


“O transporte aqui é muito ruim. Eu saio do trabalho, já no escuro, tenho que esperar no ponto um
tempão, e a rua está toda escura! E para piorar, quando o carro chega, tenho que ir em pé e apertado
até o terminal!”

Observando este enunciado, que problema pode ser identificado? Retomando a definição de
problema apresentada nesta seção, temos que este é a existência de uma diferença entre um estado atual
de coisas e uma expectativa sobre este mesmo estado de coisas. Muitas pessoas ao lerem o enunciado
afirmariam que o problema seria, entre outras coisas: ou (1)“o sistema de transporte é ruim”; ou (2)“o
veículo é superlotado”; ou (3)“o ponto é escuro”; ou (4)“o ônibus demora”; ou ainda, uma série de
combinações destas respostas.

No entanto, estes elementos ilustram um fato recorrente: a confusão entre causas dos
problemas, os problemas em si, e objetivos ou expectativas. Nenhum dos elementos apresentados
anteriormente são, em seu contexto próprio, problemas. Um deles é a expressão de um juízo de valor,
uma opinião ou avaliação (1); outros são declarações de fato ou percepção (2, 3 e 4) que causam
entraves ao usuário do transporte coletivo. Isto posto, resta ainda resolver a primeira questão: o
problema.

Na linha da definição inicial, o problema para o caso apresentado, considerando como objeto o
transporte, seria, em primeira instância, a condição insatisfatória de transporte. Como causas, têm-se o
longo período de espera, a pouca iluminação e a superlotação dos veículos.

Mas identificar apenas um problema pontual não é suficiente para gerar grandes
transformações. Assim, deve-se proceder, para cada um dos elementos constituintes da visão, um
diagnóstico do estado presente do objeto, comparando em seguida com o estado desejado. Nos casos
em que se constata uma discrepância entre o estado atual e o desejado além de um limite tolerável pelos
atores, verifica-se o problema.

Figura 11: Quando a situação atual apresenta-se fora do espaço de tolerância dos atores, qualifica-se o
problema.

Resta, ainda, identificar as causas. Matus (1984 e 1993) indica algumas questões para apontar as
causas dos problemas (explicação), a saber:

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• Como era antes?


• Como é hoje?
• Como evoluiu do que era para o estado atual?
• Qual tendência segue?
• Que fatores impulsionam essas mudanças?

Respondendo a estas perguntas, consegue-se montar uma estrutura causa-efeito para os


problemas identificados. Falta-nos agora definir os objetivos.

Princípios e Valores (5)

Os fins não justificam os meios. Esta é uma questão sempre presente e de forte apelo moral.
Dessa forma, por mais apelativo que seja um resultado, por mais grave que seja o problema, existem
sempre algumas restrições que devem ser postas à seleção de objetivos e ao desenvolvimento das
alternativas de ação para a consecução destes resultados. E quando se fala em restrições, fala-se em
valores e princípios.

Estes dois elementos buscam, via de regra, garantir o espaço de aceitabilidade no desenho das
ações, a integridade de variáveis que não devem ou não podem ser afetadas pelas ações previstas no
Plano, entre outros interesses. Podem ser, ainda, restrições que atores mais fracos colocam ao espaço
de atuação daqueles mais fortes, inclusive como uma compensação quando problemas que lhe eram de
interesse não foram considerados no projeto de governo.

Os princípios são, por definição, elementos primeiros e invioláveis. Todo desenvolvimento de diretrizes, estratégias
e ações deve levar em consideração estes elementos referenciais, nunca atentando contra eles.

Princípios e valores gerais sobre o transporte podem ser retirados da Carta Magna. Outros, mais
específicos, podem ser consultados nas Diretrizes políticas, base legal existente, bem como nos Planos
Diretores Urbanos, códigos de conduta, dentre outros dispositivos.

Figura 12: Elementos dos quais podem ser retirados valores e princípios para o planejamento de
transporte.

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Objetivos (6)

Cada problema possui um conjunto específico de causas. Daí pode-se tirar os objetivos, ou
resultados desejados. Os objetivos assumem, em geral, a forma da negação da problemática existente
(MATUS, 1984 e 1993). Assim, para tornar mais clara e operacional a noção de objetivo, cabe definí-lo:

Os objetivos são resultados a serem alcançados. São fenômenos sensíveis, ou seja, passíveis de serem notados por
quem os observa. Por isso, ao se referir a um objetivo, usa-se um substantivo.

Por exemplo, constatando-se que um dos problemas acerca do transporte público por ônibus,
um serviço que compõe o sistema de transporte, é:

• Problema (constatação): condição insatisfatória de transporte do usuário do transporte


coletivo.
• As causas apontadas foram (explicação): longo período de espera, pouca iluminação e
superlotação dos veículos.
• Objetivo geral (o que quero que aconteça no final – em longo prazo): melhoria da
condição de transporte do usuário do transporte coletivo (o resultado final a ser
alcançado).
• Os objetivos específicos (que resultados parciais espera-se buscar – em médio e curto
prazos): redução do tempo de espera, melhoria da iluminação pública nos pontos de
parada e aumento no conforto do usuário no interior do veículo.

Estes objetivos são os elementos que devem orientar o desenvolvimento das ações, ao passo
que a imagem-objetivo (ou visão) é um resultado que está fora do horizonte do plano. Apesar disso, ela
pode ser detalhada em objetivos mais precisos. Um objetivo geral pode ser quebrado em mais de um
objetivo intermediário, e este pode ser detalhado em mais de um objetivo intermediário ou específico.
Vejamos:

Figura 13: Diferentes níveis de complexidade de objetivos. Esta estrutura mostra objetivos
complementares para a consecução daquele hierarquicamente mais elevado.

O nível de detalhamento da estrutura de objetivos deve corresponder à maturidade e ao


conhecimento possuído pelo grupo de atores participantes no planejamento. Como auxílio ao
detalhamento da estrutura de objetivos, pode-se utilizar as seguintes questões:

• O que precisa acontecer para que se considere que o objetivo foi alcançado?
• O que será perceptível no contexto e será condição necessária e suficiente para que se
afirme que o objetivo foi alcançado?

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• O que significa dizer que o objetivo foi alcançado?

Este processo de questionamento deve ser feito até que a resposta para as questões acima se
refira ao próprio objetivo (referência cíclica ou auto-referência).

Outro ponto importante a se observar é que a estrutura não precisa estar completamente
acabada, pois, muitas vezes, não existe ainda conhecimento e amadurecimento necessários para sua
definição mais fina. Isso acontecendo, deve-se adotar a estratégia de discutir e fundamentar bem os
objetivos mais gerais para que se garanta a robustez da estrutura e, num momento posterior, o
detalhamento maoir dos objetivos com os novos conhecimentos adquiridos.

Metas (7)

Metas são resultados (objetivos) com prazo definido para consecução. Elas refletem o
compromisso político, o horizonte de realização (curto, médio e longo prazo) e as prioridades. Seu
estabelecimento é o primeiro passo para a definição da viabilidade, tanto política quanto técnica,
daqueles resultados almejados. É especificar “O que fazer...”, “Onde fazer...” e “Em que tempo...”.

Para exemplificar o estabelecimento de metas, para os objetivos utilizados como exemplo


anteriormente no texto, teríamos:

• Meta para a redução do tempo de espera: redução em 20% até o final do primeiro ano do
plano.
• Meta para a melhoria da iluminação pública: 100% das paradas de ônibus iluminadas ao final
de 1 ano e seis meses do plano.
• Meta para a melhoria do conforto do usuário no interior do veículo: redução da ocupação máxima
para 4pax/m² até o final do primeiro ano do plano.

Como foi dito anteriormente, metas são compromissos e traduzem (devem traduzir) as
prioridades políticas e técnicas, colocadas no espaço e no tempo, de forma conjunta, garantindo sua
viabilidade como projeto político e sua exeqüibilidade dentro das limitações e possibilidades técnicas.
Não especificar um tempo para a consecução de um objetivo é não priorizá-lo, não transformá-lo em
compromisso, tanto técnico quanto político.

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Figura 14: Objetivos e Metas de Longo, Médio e Curto Prazo. Complexidade de Escopo e Dimensão
Temporal.

Para a definição e o acompanhamento das metas é necessário o desenvolvimento de um sistema


de indicadores, núcleo principal de um sistema de planejamento, acompanhamento e avaliação.
Considerações acerca deste elemento serão feitas oportunamente.

3.6 Nível Tático

O nível tático é aquele responsável por desenvolver a solução para os problemas e requisitos
postos pelas decisões de nível estratégico. Neste nível, o lado técnico ganha mais importância, apesar de
ainda ser fortemente influenciado por relações de cunho político. Agora, cada aspecto será abordado
mais detidamente.

Diretrizes (8)

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Figura 15: Diversos caminhos para se chegar ao mesmo resultado. O nível tático se preocupa com a
construção e seleção do melhor caminho.

Para se alcançar um objetivo sempre existe mais de um caminho. Isto se verifica muitas vezes
nos diversos projetos de governo apresentados por diferentes partidos políticos que, via de regra,
apresentam os mesmos objetivos (melhoria da educação, melhoria da saúde, aumento do número de
empregos), mas diferentes caminhos para a realização destes. Desenvolver o caminho é uma decisão
eminentemente tática.

O primeiro passo na definição do plano de ação é definir as diretrizes e respectivas estratégias e


programas. Diretrizes são linhas gerais condutoras do desenvolvimento das estratégias, elementos
limitadores das possibilidades de solução. Elas são dispositivos de restrição do escopo de elementos
que podem ser incorporados pelas estratégias. Podem limitar sobre qual dimensão do objeto se deverá
atuar (ver estrutura analítica do sistema de mobilidade), sobre qual problema deve ser construída, entre
outros aspectos. Desta forma, restringe-se as possibilidades de atuação possível para aquilo que é
politicamente desejável e sustentável.

Estratégias (9)

Estratégias são “pacotes” definidos de projetos e ações selecionadas para a consecução dos diversos objetivos, tendo
as diretrizes como elemento de restrição.

Nesse sentido, as estratégias são alternativas, opções postas aos tomadores de decisão. São
desenvolvidas num contexto de limitação de recursos, capacidade de controle e de poder de pressão.

Como exemplo, pode-se simular, de forma simplificada, a construção de algumas estratégias.


Para isso, retomemos o objetivo “redução do preço do transporte urbano” e seus objetivos específicos,
e coloquemos duas diretrizes hipotéticas: intervenção funcional e intervenção institucional e cultural.

Objetivo Geral: Redução do Preço do Transporte Público


Objetivos Aumento da
Específicos Eficiência na
Reestruturação do Mercado Estratégias
Prestação do
Transporte
- revisar o modelo
funcional e as linhas
de transporte;
- rever a integração
(a limitação funcional não
Diretriz 01 dos diferentes modos
permite a definição de ações
Intervenção na formação das redes Estratégia 01
necessárias para a
Funcional de mobilidade;
consecução deste objetivo)
- restringir instalação
de atividades
comerciais densas em
zonas congestionadas.

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- instituir - regulamentar a estrutura de


departamento de prestação do serviço de
fiscalização e vistoria transporte público;
dos veículos do - realizar licitação de novos
etriz 02 transporte público; serviços e linhas.
Intervenção - ministrar cursos de
Estratégia 02
Institucional e capacitação para os
Cultural motoristas;
- veicular campanhas
educativas aos
usuários do transporte
público.

Figura 16: Exemplo de Diretrizes, estratégias e ações, voltadas para um objetivo.

A figura acima apresenta algumas ações hipotéticas para atender a cada objetivo dentro da
limitação posta pela diretriz de cada estratégia. Observe que na Estratégia 01 o escopo de ações foi reduzido
àquelas específicas sobre os aspectos funcionais e, por isso, não pôde contemplar nenhuma ação para o
objetivo de reestruturação de mercado, já que as ações necessárias envolvem atuação sobre o aspecto
Político Institucional e Econômico.

Desenvolvidas as estratégias, e respectivos programas, os atores decidem por qual delas adotar.
Sua implementação fica assegurada enquanto houver a base política que sustente a decisão.

Instrumentos de Atuação (10)

Uma questão que surge ao longo do desenvolvimento de um plano é a das atribuições dos
atores, ou seja, “quem faz o que”. Limitou-se o escopo desta seção a evidenciar alguns elementos
importantes à discussão institucional como parte do processo de planejamento.

A este respeito, nenhum plano pode ser bem implementado e conduzido se as atribuições e
responsabilidades de cada ator não forem claramente definidas e aceitas. A explicitação destes
elementos é necessária sob pena de se conduzir a um contexto em que as diversas instituições se
esquivem de responsabilidades e as atirem para terceiros quando é conveniente.

Portanto, definir a estrutura institucional de gestão é uma tarefa complexa e politicamente


desafiadora. Isto ocorre porque, neste processo, são definidos os poderes legais dos atores, poderes
estes necessários e limitadores de sua capacidade de governo e influência sobre a condução do futuro
do Sistema de Mobilidade e, com isso, da própria cidade.

Assim, no desenvolvimento da estrutura organizacional, diversos elementos devem ser levados


em consideração, entre eles aspectos relacionados tanto às disposições jurídicas e legais existentes
quanto àquelas provenientes de áreas como Economia, Ciência Política e Administração. Nesta
avaliação, deve imperar o senso crítico, caracterizado pela ponderação criteriosa e pragmática anterior à
assimilação de conceitos e soluções.

Em tempo, pode-se colocar algumas questões que devem ser respondidas quando da discussão
da estrutura organizacional:

• Quem e qual estrutura deve se responsabilizar pelo planejamento?


• Quem e qual estrutura deve se responsabilizar pelo financiamento?

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• Quem e qual estrutura deve se responsabilizar pela regulação?


• Quem e qual estrutura deve se responsabilizar pela gestão?
• Quem e qual estrutura deve se responsabilizar pela operação/execução?
• Quem e qual estrutura deve se responsabilizar pela comunicação e articulação?

Sem perda de efeito, esta seção buscou transmitir uma mensagem importante: a organização e a
capacitação institucional como elementos fundamentais ao desenvolvimento e à implementação de um
plano.

Instrumentos de Financiamento (11)

Não é apenas a dimensão política que inviabiliza uma estratégia ou um programa. A


disponibilidade de recursos financeiros é outro elemento de forte restrição de viabilidade. Cabe ao nível
tático prever as alternativas de provisão de recursos financeiros necessários ao desenvolvimento de cada
projeto/ação previsto no programa.

Antes de qualquer ação, o mais importante a se definir é a necessidade de recursos para a


execução de cada projeto/ação e, em seguida, para cada programa. A orçamentação é uma tarefa que
deve ser conduzida com muito cuidado e atenção, uma vez que a subestimativa de custo pode acarretar
na interrupção de uma obra e, por outro lado, uma superestimativa pode restringir recursos que seriam
mais eficientemente aplicados em outras ações.

A PMI (2004) coloca algumas técnicas para auxiliar na definição de recursos:


• Estimativa análoga: feita com base na experiência de projetos e ações semelhantes. É pouco
acurada, apresentando maior margem de erro de estimativa.
• Determinação dos valores de custo de recursos: para isso deve-se estimar o valor para cada recurso e
pessoa que será alocada no projeto. Necessita de bom conhecimento do mercado e do processo
de trabalho.
• Estimativa “bottom-up”: é uma estimativa feita a partir de atividades, ou grupos de atividades, bem
específicas, necessitando de maior detalhamento da EAP (Estrutura analítica do projeto). O
custo do projeto é assim determinado como agregação dos custos individuais de cada atividade.
• Estimativa paramétrica: normalmente feita com base em parâmetros-base para cálculo de custo.
Em geral o uso de software específico é recomendado e necessita de um banco de dados
históricos para melhor avaliação.

Além destas, existem diversas alternativas que podem ser utilizadas para o mesmo fim. Cada
uma apresenta prós e contras e necessita de diferentes níveis de maturidade organizacional.

Definidos os custos dos projetos e dos programas, é necessário desenvolver alternativas de


provisão dos recursos financeiros exigidos. Dessa forma, para o desenvolvimento destas alternativas,
existem hoje disponíveis diversas alternativas e ferramentas, cada uma com suas nuances particulares.
No entanto, essas alternativas não serão aqui abordadas.

Instrumentos de Comunicação (12)

Tanto no desenvolvimento do plano quanto durante sua implementação, faz-se necessária a


difusão de dados e informações importantes para os diversos atores. Além dessa ação, que tem caráter
meramente informativo, as atividades participativas (audiências e consultas públicas, workshops e
seminários) são fundamentais no processo de desenvolvimento do plano, desde a definição do objeto
até o desenvolvimento dos programas, sendo o cerne do processo de construção do plano.

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Repensando o Planejamento

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Este processo, tanto nas ações de informação quanto de participação, deve ser bem planejado e
desenvolvido para que atenda, de um lado, às expectativas políticas e, de outro, às disposições legais, a
exemplo das questões de participação.

Dessa maneira, o Plano de Comunicação deve acompanhar o cronograma de desenvolvimento


do planejamento/implementação e prever itens como:
• No desenvolvimento do Plano:
o Calendário de Audiências Públicas.
o Calendário de Consultas Públicas.
o Calendário das Oficinas de Trabalho.
o Relatórios de Andamento.
o Documentos e Estudos.
o Definição dos veículos de comunicação a serem utilizados e infra-estrutura necessária
(rádio, TV, internet, mídia escrita, etc).
• Na implementação do Plano:
o Relatórios de Andamento.
o Avaliação de Resultados.
o Prestação de Contas.
o Coleta de dados para acompanhamento.
o Definição dos veículos de comunicação a serem utilizados e infra-estrutura necessária
(rádio, TV, internet, mídia escrita, etc).

Além disso, um dos instrumentos mais importantes de informação é o Sistema de Avaliação


(Indicadores).

Programas (13)

Por fim, as estratégias e seus instrumentos de financiamento e comunicação específicos são


traduzidos em Programas. Os Programas são conjuntos de ações complementares voltadas a um
objetivo definido.

Deve-se ter claro que os programas não são compostos por ações semelhantes, mas sim ações
sinérgicas para a consecução de um mesmo objetivo. Caso contrário, a avaliação por resultados pode
ficar comprometida, uma vez que fica ameaçada a coerência do processo de planejamento e da
especificação de programas.

São elementos essenciais na definição de um programa:


• Objetivo do Programa.
• Indicadores e Valores referenciais de avaliação.
• Ações componentes do programas.
• Fontes de Recurso.
• Atores/Agentes responsáveis.
• Mecanismos de Monitoramento.
• Plano de Comunicação.

3.7 Nível Operacional

O nível operacional é aquele responsável pela execução do que foi estabelecido nos níveis
estratégico e tático, bem como pelo fornecimento de elementos para o acompanhamento e avaliação do
plano pelos mais diversos níveis. A seguir, cada aspecto é abordado em maiores detalhes.

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Publicação nos Veículos de Comunicação (14) e Implementação (15)

Ficam sob a responsabilidade do nível operacional a execução dos programas, projetos e ações,
bem como a veiculação das informações referentes ao plano. É neste nível que os procedimentos e
normas de execução são definidos e postos em prática.

Cabe ao nível operacional, por exemplo, desenvolver ou contratar os projetos de:


• intervenção viária;
• ciclovias;
• estacionamentos;
• trens urbanos;
• metrôs;
• passarelas;
• sinalização;
• revitalização e/ou requalificação urbana (seguindo os preceitos do PDU);
• revisão funcional do serviço de transporte urbano, etc.

Além disso, cabe a ele, ainda, atividades como:


• desenvolver e veicular nos meios de comunicação especificados as campanhas
educacional e informativas;
• produzir e enviar, para a aprovação do legislativo, os parâmetros legais a serem
incorporados nas Leis de Uso e Ocupação do Solo, Código de Obras, Código de
Condutas, entre outros dispositivos legais especificados pelo nível tático;
• realizar ou licitar a execução das obras e fiscalizar seu desenvolvimento;
• fiscalizar a prestação do serviço de transporte;
• fiscalizar e controlar o uso e ocupação do solo;
• fiscalizar e controlar as atividades econômicas;
• fiscalizar, controlar e manter os terminais, estacionamentos, pontos de parada;
• fiscalizar, controlar e manter as vias e seus componentes e
• fiscalizar e controlar as obras em área privada; entre outras atribuições.

No entanto, é importante lembrar que estas atribuições não ficam limitadas a um único órgão
da administração pública, e sim a uma estrutura mais complexa, cuja organização e distribuição de
atribuições foram discutidas e definidas no nível tático. Neste bojo, pode-se citar as Secretarias de
Transporte e Trânsito, Secretarias de Serviços Públicos, Secretarias de Obras e Infra-Estrutura,
Secretarias de Controle do Uso do Solo, etc. como elementos organizacionais existentes em algumas
cidades e muitas vezes relacionados à gestão do sistema de transporte.

Monitoramento (16)

Outra atribuição importante do nível operacional é o monitoramento de todo o sistema. É no


nível operacional que são obtidos os dados básicos para qualquer avaliação seja operacional, tática ou
estratégica (ver Figura 8 – 17a/17b/17c).

Nesse contexto, sua realização é a conseqüência de todo um processo de desenvolvimento e


especificação de um Sistema de Avaliação, o qual se baseia nos indicadores que deram suporte ao
desenvolvimento do plano e que cobrem os diversos níveis de decisão, sistematizando as necessidades
de informação de cada ator, os referenciais de interpretação e os dados necessários às avaliações.

O monitoramento, em nível operacional, pode servir a dois fins distintos:

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• Auditoria e controle: orientado para os órgãos de auditoria e controle, como Ministério Público,
Tribunais de Contas, Agências Reguladoras, e mesmo os órgãos responsáveis pelo
acompanhamento de obras, por exemplo. Seu foco é processual.
• Planejamento, Acompanhamento e Avaliação: voltado aos atores e órgãos responsáveis pelo processo
de planejamento e implementação. Seu foco é finalístico, ou seja, está preocupado com
resultados dos processos e sua relação com os meios empregados.

O sistema de avaliação, cuja visão geral é apresentada na próxima seção, é concebido e


desenvolvido durante o processo de planejamento, devendo as atribuições sobre o processo de
monitoramento ter sido especificadas quando da discussão organizacional.

4 Ultrapassando as limitações da avaliação no modelo de


planejamento oficial: um incremento na proposta de modelo de
planejamento, acompanhamento e gestão

Antes de qualquer definição, é importante ter a consciência do que é um sistema de indicadores.


Ele não é apenas um sistema de suporte à decisão, mas, antes disso, um sistema de símbolos e
significados, um código, uma linguagem. E assim, três elementos são fundamentais: o objeto
representado, as formas de representação e as regras de interpretação.

O Objeto Representado é aquilo sobre o que versa o sistema de indicadores. Se falarmos a


respeito de Transporte, neste caso, o objeto é o próprio transporte. As formas de representação são as
alternativas de como reproduzir o objeto, ou parte dele, de forma que possa ser possível comunicar ou
transferir as “impressões” para outras pessoas; seria, por analogia, um código. E as regras de
interpretação são as informações que permitem que cada usuário do sistema de indicadores possa tomar
o código e decifrá-lo, compreendê-lo. São estas regras que permitem que haja um “senso comum”
evitando que existam diferentes interpretações de um mesmo elemento, o que dificultaria a
comunicação e a tomada de decisão.

4.1.1 Nível de Detalhamento: Um Dilema

Sobre as formas de representação, existe um importante dilema: mais ou menos detalhe?

De forma geral, o sonho de qualquer técnico ou pesquisador é ter o máximo de elementos para
exploração. No entanto, a experiência demonstra que a complexidade envolve custos muito altos, e
que, se muito complexo, um sistema de gestão fica mais caro que o próprio investimento/execução.

Neste sentido, é importante desenvolver e adotar a complexidade na justa medida das


necessidades para o adequado exercício das atribuições. Por exemplo, basta um ponto no mapa se a
informação que se deseja é a localização de um objeto, não sendo necessário desenhá-lo com requintes
de detalhes. Esta analogia cabe para qualquer elemento de um sistema de indicadores para avaliação:
cada elemento deve ter sua complexidade ajustada a medida do que é necessário aos diversos
interessados do sistema. Assim, o referencial é a necessidade de informação dos grupos-alvo.

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4.1.2 Partido Metodológico para a Construção do Sistema de Avaliação: Contornando as


Falhas do Modelo Atual

Diante do exposto sobre os problemas operacionais no processo de avaliação do PPA e retomando as


implicações do atual modelo do MPOG, comentadas na segunda seção, é necessária uma nova
concepção de sistemas de avaliação que seja voltada ao objeto planejado, ao invés de se limitar a
elementos deveras efêmeros. Alguns pontos desta concepção são: (i) registro permanente do estado dos
Transportes; (ii) alteração de um elemento pontual do estado-de-coisas, vinculando-se a um indicador já
existente, quando um programa é criado; (iii) aferição do indicador, mesmo quando um programa é
extinto, pois ele está relacionado a um aspecto do transporte, o objeto planejado, e não ao programa;
(iv) a coleta de dados é permanente e independente dos programas.

As Figuras 17 e 18 a seguir ilustram a concepção.

Figura 17: Conjunto de Indicadores descritivos como base. A síntese indica o estado do
Transporte.

Assim, o sistema é antes concebido como uma forma de representação do Transporte no País.
Concebido dessa forma, ele é capaz de fornecer a síntese do estado do Transporte, inclusive
subsidiando um índice global, um IDT (Índice de Desenvolvimento dos Transportes), tal qual o IDH
(Índice de Desenvolvimento Urbano).

Figura 18: O conjunto dos indicadores no tempo. Os programas que surgem vinculam-se aos
indicadores, e não vice-versa. Os dados para a aferição do estado do Transporte estão sempre
disponíveis.

As implicações desta nova abordagem são simples: (i) indicadores discutidos e aceitos, sendo
resultados de um processo de construção de consenso; (ii) custo fixo, ou pouco variável, para o
processo de monitoramento; (iii) possibilidade de automação de processo, dada a previsibilidade dos
processos, bem como do escopo de dados e procedimentos de coleta; (iv) reprodutibilidade da

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experiência, resultante de um processo de padronização de procedimentos e equipamentos; (v)


disponibilidade de séries históricas, o que possibilita o acompanhamento do sistema e o
amadurecimento do planejamento e do acompanhamento de natureza operacional.

4.1.3 Passos para a Construção


A concepção geral para a construção do sistema de avaliação é dada por Magalhães (2004) e
Magalhães&Yamashita (2005). Um processo de duas etapas: elaboração e implementação. No primeiro,
todo o sistema de avaliação é construído e pactuado entre os diversos atores. No segundo, ele é
implementado segundo as especificações da primeira etapa.

No que diz respeito ao escopo de indicadores, deve-se proceder, resumidamente, da seguinte


forma: (i) definir os elementos a serem representados acerca do Objeto; (ii) definir os critérios de
qualidade (adequação ao uso); (iii) levantar as formas de representação existentes; (iv) aperfeiçoar,
desenvolver e selecionar as alternativas de representação mais adequadas e (v) registrar e documentar os
elementos produzidos e definidos.

Com isto, orienta-se o escopo àquilo que é relevante, evita-se trabalho redobrado, aproveitando
os esforços já existentes, e garante-se a disponibilidade de documentação para a transferência do
conhecimento.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar do exposto aqui, resta ainda muito trabalho acadêmico a ser executado para
implementar uma sistemática de planejamento, acompanhamento e avaliação nos moldes aqui
propostos.

O escopo deste texto foi orientado à superação das limitações observadas no método oficial de
planejamento. Os esforços foram centrados na abordagem metodológica e de fundamentos, como
elementos-chave na superação dos limites e falhas observadas. Trata-se, assim, de sugerir uma mudança
paradigmática na forma de fazer planejamento, hoje dominado, via de regra, pelo paradigma da
competitividade do planejamento estratégico organizacional, equivocadamente aplicado aos mais
diversos casos, sem qualquer restrição.

Ademais, cabe esclarecer um ponto crucial: na concepção de planejamento aqui adotada, o


resultado do planejamento não é o plano em si, mas seus resultados, ou seja, a alteração no estado de
coisas sobre o qual o planejamento se propôs a agir. Esse entendimento é vital para romper com a idéia
de planejamento enquanto rito burocrático, e elevá-lo a efetivo instrumento de transformação e/ou
controle da realidade.

Atualmente, um dos grandes desafios no processo de planejamento é a compreensão e


sistematização do Objeto de Planejamento, neste caso, do Transporte, que muitas vezes é tratado como
algo trivial, obvio, mas que quando abordado adequadamente e com a devida atenção mostra-se
extremamente complexo. Uma breve revisão da literatura fundamental em Transportes e o seu
confrontamento com os problemas hoje postos para os estudiosos são atividades capazes de revelar as
diversas lacunas de conhecimento (teorias, métodos, ferramentas e aplicações) existentes. Isso também
dificulta o estabelecimento de indicadores finalísticos, bem como a análise de problemas relacionados a
transporte.

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Yaeko Yamashita

Outro ponto importante a ser destacado é que o processo de planejamento aqui apresentado é
pautado numa posição cooperativa em oposição ao paradigma não-cooperativo do planejamento
estratégico organizacional. Afinal, no que diz respeito às questões de transporte, a cooperação se faz
necessária para a obtenção de resultados politicamente aceitáveis e sustentáveis.

O esquema geral do processo de planejamento requer, ainda, o detalhamento e a seleção de


técnicas específicas para o desenvolvimento de cada etapa. Por exemplo, no desenvolvimento da visão,
workshops e dinâmicas de participação podem ser utilizadas. No desenvolvimento de estratégias, técnicas
de avaliação de projetos são necessárias. Portanto, resta ainda bastante trabalho a ser desenvolvido no
que concerne a metodologia a ser adotada em cada etapa do planejamento.

Sobre o sistema de avaliação, vinculá-lo a um escopo específico de programas é deixá-lo


vulnerável a mudanças na orientação política, bem como a mudanças necessárias ao próprio
planejamento, uma vez que, a cada ano, programas podem ser criados e extintos, desde que amarrados
com a orientação global do plano de governo. Assim, a saída está em abordar questões finalísticas,
pouco mutáveis, mas cujo sucesso depende da superação do desafio da definição do objeto de
planejamento.

Por fim, é importante lembrar que essa proposta de planejamento engloba um sistema em torno
do qual diversos atores vão se comunicar, exercer suas pressões políticas, trocar informações. Desse
modo, ele não pode ser construído fora de um processo participativo, com disseminação de
conhecimentos e capacitação institucional. Não pode, portanto, ser o projeto de um ator isolado, mas
um esforço coletivo, e a consciência disto é fundamental.

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