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O The New York Times define fake news como “uma história inventada com a intenção
de enganar”. Obviamente, os conceitos de falsa propaganda, boato e desinformação
existem desde os primórdios da civilização, e há vários exemplos históricos de seu uso
ao longo dos séculos como recurso estratégico para vencer guerras, conseguir apoio
político, manipular a opinião pública, construir falsos heróis e difamar povos e religiões.
A Última Guerra Civil da República Romana, travada entre Marco Antônio e Otaviano
em 32 a.C., é emblemática neste sentido. Na disputa, Otaviano (que mais tarde se
tornaria o Imperador Augusto) apresentou ao Senado romano um testamento de Marco
Antônio, em que ele afirmava deixar seus bens para seus filhos com Cleópatra e
indicava seu desejo de ser enterrado ao lado dela em Alexandria, em vez de Roma.
Como definido pela Aos Fatos, primeira plataforma brasileira a checar sistematicamente
o discurso público, “checagem de fatos é um método jornalístico por meio do qual é
possível certificar se a informação apurada foi obtida por meio de fontes confiáveis e,
então, avaliar se é verdadeira ou falsa, se é sustentável ou não”.
Além da Aos Fatos, temos outros ótimos exemplos de projetos brasileiros de checagem,
como o Truco, iniciativa da Agência Pública, e a Lupa, ligada à revista Piauí. Nas
eleições que se avizinham, o trabalho dessas agências será fundamental para a correta
disseminação da informação.
A disseminação de notícias falsas é algo que pode abalar a reputação de uma pessoa ou
mesmo de uma empresa, uma vez que fake news são utilizadas para manipular
contextos. Por isso, é crescente a preocupação em se criar mecanismos de controle que
evitem a propagação de notícias falsas. Exemplo disso é o Conselho Consultivo
instituído pelo Tribunal Superior Eleitoral para estudar soluções para o problema,
sobretudo em ano eleitoral.
a vedação ao anonimato;
o direito de resposta proporcional ao agravo;
o direito à indenização por dano material, moral ou à imagem;
a inviolabilidade da intimidade, da vida privada e da honra das pessoas.
A responsabilização por publicação de fake news pode gerar dúvidas a respeito do
direito à liberdade de expressão e pensamento. É claro que a liberdade de manifestação
do pensamento é o direito de qualquer um manifestar livremente suas opiniões, ideias e
pensamentos sem medo de retaliação ou censura. Mas é importante esclarecer que o
direito à liberdade de manifestação e pensamento previsto na Constituição e em outros
dispositivos legais, não autoriza ofensas que possam ferir a honra e dignidade de uma
pessoa.
O dano material por sua vez, é o prejuízo financeiro. É necessário que o prejudicado
seja capaz de demonstrar que a publicação da notícia falsa foi a causa de seu prejuízo,
não sendo possível a indenização por dano presumido. O dano material poderá ocorrer
por uma diminuição do patrimônio da vítima, ou seja, o que ela perdeu/gastou (dano
emergente) ou ainda pelo que a vítima razoavelmente deixou de auferir em função
daquele prejuízo ocasionado (lucro cessante).
A reparação civil deverá ser aplicada de forma justa e proporcional, sem gerar
enriquecimento ilícito, sobretudo na apuração do dano moral, que deve levar em conta o
caráter punitivo/pedagógico da indenização. Para isso, é necessário balancear a situação
econômica das partes, o dano sofrido pela vítima de uma notícia falsa e a repercussão
dessa publicação em sua vida.
É fato (e não boato) que elas, as notícias falsas, existem desde de muito antes de
chegarmos ao estado atual e avançado de acesso, quase que em tempo real, das
informações (até o momento em que elas não se revelam desinformações) e notícias
sobre os mais variados temas do cotidiano, não apenas político. Todavia, foi no ato de
2017 e no contexto da eleição de Donald Trump que os riscos reais dessa prática se
tornaram evidenciados e motivo de verdadeira preocupação em todo o globo.
Como se viu, foi nesse episódio que observamos como os boatos virtuais possuem o
potencial de pautarem e confundirem o eleitorado (razão, inclusive, das falhas ocorridas
nas pesquisas de intenção de voto1). E isso é, evidentemente, algo que poderá também
afetar os resultados nas eleições domésticas brasileiras, evidenciando um claro prejuízo
à civilidade do debate democrático, catabolizando a já crescente polarização ideológica
que temos vivenciado desde a última eleição presidencial, em 2014, e logo após o
processo jurídico-político de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
Semanas atrás acompanhamos a comoção nacional em razão do brutal assassinato de
Marielle Franco e de seu motorista Anderson Pedro Gomes, o que provocou a
manifestação nas ruas de milhares de pessoas, e não só no Brasil2. Por outro lado, no
mundo digital, o episódio obteve um alcance sem precedentes, gerando milhares e
milhares de comentários, compartilhamentos e discussões, algo até mesmo
surpreendente para os analistas que buscam avaliar as repercussões, no campo das
mídias digitais, que geram os dados relativos a eventos políticos que repercutem no
âmbito digital.
Ironicamente, nada mais do que uma fake news sobre um projeto de lei em trâmite para
o controle de fake news, que é o PL 6812/2017, de autoria do deputado Luiz Carlos
Hauly (PSDB-PR). Tal projeto tem, em verdade, a finalidade de tornar crime “a
divulgação ou compartilhamento de notícia falsa ou ‘prejudicialmente incompleta’ na
internet”6, com a previsão de uma pena de detenção de dois a oito meses. Resta saber,
de qualquer forma, até que ponto medidas como essa afetam a propagação desse tipo de
notícia mentirosa e até que ponto invadiria o direito de livre manifestação do
pensamento.
É um debate, sem dúvida, necessário a ser feito. Vivemos uma era já dominada pelo
conceito de ‘pós-verdade’ (post-truth) que, segundo a Universidade de Oxford (por meio
do seu departamento que elabora os dicionários da língua inglesa, essa foi a palavra do
ano de 2016), “se relaciona ou denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm
menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças
pessoais”7. Essa denominação ajuda a compreender o risco de crescimento e avanço das
fake news, simbolizando o fato de que a preocupação com a verdade está perdendo o
espaço na sociedade e no debate público.
O caso Marielle, portanto, apenas simboliza, nesse ano de 2018, como serão
repercutidos e discutidos os principais acontecimentos, não apenas do campo político,
que acontecerão no Brasil e no mundo. Além desse, ainda veremos pela frente eventos
esportivos como a Copa do Mundo na Rússia; o casamento real britânico do príncipe
Harry com a atriz americana Meghan Markle, no castelo de Windsor; a primeira
participação do partido político das FARC, surgido do acordo de paz com a guerrilha na
Colômbia, nas eleições presidenciais daquele país; eleições nos EUA, como primeiro
teste após a eleição do presidente Donald Trump e, evidentemente, em um contexto de
combate à corrupção e um ambiente político de uma cada vez mais crescente
polarização ideológico-política, as eleições presidenciais no Brasil.
Por isso, quando chegarmos ao final do ano, por certo, a depender de como lidaremos
com esse fenômeno das fake news, terão elas definido, como dissemos logo de início, o
ano de 2018.
1) Há relatos que mesmo o próprio presidente eleito, Donald Trump se mostrou surpreso
pelos resultados. Cf. em https://tinyurl.com/y7hfn7ge. Acesso em 20 de março de 2018.
6) Para o acesso à integra do referido projeto de lei, cf. o seu interior teor disponível em
https://tinyurl.com/ya5jreg8. Acesso em 5 de abril de 2019.
Para entender o trabalho jornalístico nas redes sociais é preciso observar uma diferença
entre o profissional da comunicação e usuários de redes sociais. Neste sentido, Recuero
(2009) afirma que enquanto as informações difundidas pelas redes sociais não precisam,
necessariamente, ter um valor-notícia ou um compromisso social, como teoricamente,
as jornalísticas (ou aquelas produzidas pelos veículos) precisam. Uma informação que
circula em uma rede social, por exemplo, pode ter um forte caráter social.
Os números de usuários de redes sociais com Facebook e Twitter crescem a cada dia.
De acordo com o fundador do Facebook, Mark Zuckenberg, a rede social já conta com 1
bilhão de contas. Um estudo da Retrevo (2010) aponta que 48% dos norte americanos
checam ou atualizam seu Facebook ou Twitter antes de dormir. De todos os
entrevistados, 42% afirmaram que checar as redes sociais é a primeira coisa que fazem
ao acordar.
Por isso é comum circular entre usuários informações que não são necessariamente
voltadas para o âmbito jornalístico, e que podem tratar de dados inverídicos, como a
produção e difusão em larga escala de notícias falsas, abalando a credibilidade do
jornalismo, que vem diminuindo com as novas formas de informar.
https://tmbj.com.br/fake-news-e-responsabilidade-civil/
Vivemos em uma era em que o avanço da tecnologia somado ao amplo acesso à internet revolucionaram as formas de
reprodução de mídia e a comunicação entre as pessoas.
mais atualizado e por dentro dos eventos do dia-a-dia, é certo que, diante
Mas no que isto acarreta? O que uma notícia falsa ou boato é capaz de
gerar à população?
O cidadão, por sua vez, impactado pela notícia falsa e, vendo alguém de
a informação inverídica.
Pois bem. Diante dos recentes escândalos ocorridos com a maior rede
razão, existem nos dias de hoje ao menos quatro projetos de lei que
direito de outrem.
ofensor.
dano em questão e não o veículo utilizado para tanto. Desta forma, resta
ato ilícito.
notícia falsa.
A disseminação de fake news através da internet representa grande desafio aos operadores do Direito,
desde a atribuição da autoria delitiva até a remoção de conteúdo. Nesse diapasão, as redes sociais, sites e
aplicativos de mensagens são, atualmente, os veículos mais utilizados para a propagação de boatos,
afetando milhares de pessoas e, por vezes, o processo eleitoral, como ocorrera nas últimas eleições
francesas e norte-americanas.
É certo que, em algumas situações, a disseminação de notícias falsas poderá ou não configurar crimes,
demandando esforços por parte do operador do Direito para a responsabilização do autor da propagação.
Em contrapartida, a investigação de crimes cometidos na divulgação de notícias falsas não deve cingir-se
na atribuição da autoria. É recomendada uma atuação rápida visando a suspensão da divulgação do
conteúdo ilegal. Uma ação eficaz e oportuna minimizará os estragos causados pela propagação de fake
news. A regra é simples: mais tempo disponível, maior dano.
O ambiente das redes sociais é propício para a disseminação desse tipo de conteúdo, pois o algoritmo que
o governa busca conteúdos que agradem aos usuários e, depois, estes mesmos tratam de pulverizar essas
notícias, sem verificar a fonte, apenas porque o conteúdo os agrada no âmbito de suas convicções
pessoais.
Para as redes sociais, é interessante, do ponto de vista negocial, que os usuários passem mais tempo
utilizando seus produtos e interagindo com seus anúncios publicitários, pois, como é dito no meio do
marketing digital, “se você não paga por um produto, você é o produto”. Assim, cria-se uma simbiose
socialmente danosa, que deve ser combatida pelos provedores de aplicação, demonstrando haver um
verdadeiro comprometimento com a “responsabilidade social”, muitas vezes alardeada.
Remoção de conteúdo
1.1 Atribuição de autoria
Longes são os tempos em que a investigação policial restringia-se à realização de depoimentos,
declarações e exame pericial, dentre vários outros mecanismos para individualização da autoria delitiva.
Nos dias que correm, face às diversas inovações tecnológicas, os criminosos passam a utilizar dessas
facilidades para potencializar seus atos, alcançando um maior número de vítimas e homiziando-se da
persecução penal.
Nessa conjuntura, temos a propagação de fake news através de várias ferramentas disponíveis com os
mais distintos propósitos. Por vezes, esse comportamento poderá não constituir crime, ficando adstrito
apenas à responsabilização civil ou administrativa. Outrossim, poderá constituir infração criminal prevista
no Código Penal ou na legislação extravagante.
A infinidade de aplicações de internet existentes poderá, ocasionalmente, gerar dificuldades na atribuição
da autoria, eis que, para obtenção dos elementos informativos, o investigador terá de superar diversos
obstáculos, dentre os quais: o não recebimento de conteúdo e metadados por parte dos provedores; atraso
no recebimento de informações; exigência de MLAT para repasse de informações; aplicações de internet
sem representantes do mesmo grupo econômico no país ou que não ofertam o serviço ao público
brasileiro[1]; uso de bots[2] e de pessoas contratadas em outros países para espalhar notícias, dentre
outros.
Nesse cenário de incertezas do recebimento de dados, as notícias falsas ganham um campo fértil para
prosperar em velocidades proporcionais aos estragos causados a um indivíduo ou a um país inteiro,
comprometendo, por vezes, até mesmo o processo eleitoral.
Diante dessa constatação e nas situações tipificadas como crime na propagação de notícias falsas, a
autoridade policial deverá levar em conta não apenas individualizar o autor, mas, sim, representar por
medidas capazes de minimizar os danos advindos dessa proliferação na internet. Noutra banda, mesmo
quando o fato não configurar infração penal, a vítima ou seu representante legal devem envidar esforços
junto ao Poder Judiciário na busca de reparação do dano sofrido.
Nas situações em que a notícia falsa estiver fora do Brasil, algumas medidas não judiciais podem ser
tomadas objetivando a remoção. No caso de as fake news estarem hospedadas em território americano e
envolverem conteúdo protegido por direitos autorais, é possível enviar, diretamente para o infrator ou
local de hospedagem, uma DMCA Notice and Takedown. Essa notificação é prevista na seção 512
do Online Copyright Infringement Liability Limitation Act[9] do Digital Millennium Copyright
Act[10] (1998) e deverá ser feita na forma lá estabelecida.
Em se tratando de hospedagem de conteúdo oriundo de violação de direitos autorais no território europeu,
poderá ser enviada uma notificação baseada no artigo 14 da Diretiva de Comércio Eletrônico (2000)[11],
bem como outras leis podem ser aplicadas, dependendo do país europeu que esteja hospedando o
conteúdo ilícito.
No Brasil, também é comum aos provedores acatarem, prudentemente, pedidos de remoção de conteúdo
violador de direitos autorais, mesmo antes do início dos procedimentos judiciais cabíveis.
Caso o conteúdo das fake news não inclua material protegido por direitos autorais em território americano
ou europeu, outra solução é enviar diretamente para o infrator ou local da hospedagem do conteúdo,
a Cease and Desist Letter[12]. Esse procedimento é útil para informar a ilegalidade e inveracidade dos
fatos noticiados, os dados de contato do notificante, bem como as penalidades às quais o infrator estará
sujeito ao não cessar tal procedimento. Em fase extrajudicial, que poderá terminar em um processo
judicial, o registro das fake news publicadas em ata notarial é procedimento mandatório para a
consolidação da prova de existência de tal fato[13]. Em fase policial, esse documento pode ser substituído
por certidão lavrada por servidor dotado de fé pública. As indicações supracitadas, principalmente as
destinadas a países estrangeiros, são ferramentas úteis especialmente nos casos de redes sociais que, em
sua maioria, estão sediadas fora do território nacional. Muito embora possuam ferramentas de notificação
em seus próprios serviços, por vezes são reticentes na remoção de conteúdo sendo, a via tradicional,
indicada nesses casos.
Conclusão
As inovações tecnológicas têm trazido grandes desafios aos operadores do Direito. Na seara de fake news,
a velocidade de propagação urge a tomada de medidas eficazes visando minorar os danos sofridos por
terceiros.
Várias iniciativas têm sido debatidas sobre esse tema, tais como: criação de grupos de trabalho,
proposições legislativas, reuniões com provedores de aplicação de internet, agências de checagem de fato,
utilização de inteligência artificial e aprendizado de máquina para detecção e combate aos bots, dentre
outros. Não obstante, a divulgação de boatos, atos criminosos e mentiras tem ganhado espaço na internet.
Ademais, em ano de eleição dos representantes do Executivo e Legislativo em níveis federal e estadual,
indubitavelmente o Poder Judiciário será demandado na busca de soluções e decisões eficazes para
resolução desses conflitos.
É certo que, ao ser veiculado material na internet, dificilmente a remoção será feita de forma permanente,
pois os conteúdos podem ter sido salvos por quaisquer pessoas. Há sempre o risco de nova postagem,
devendo a vítima de fake news atentar para um permanente monitoramento de seu nome e fatos na
internet. Apesar disso, tanto na área cível quanto no campo criminal, a suspensão da divulgação de
noticias falsas é medida eficaz para reduzir seus efeitos danosos.
Referências
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RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS MORAIS DECORRENTES DE
MANIFESTAÇÕES DE EXPRESSÃO NA INTERNET