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O VINHO

Definição de vinho
História
Aspecto sociais, culturais, econômicos do vinho
Vinho e saúde
O vinho é, por definição, o produto da fermentação alcoólica natural do suco de uvas.
Este fenômeno ocorre espontaneamente na natureza quando uvas maduras têm suas
cascas rompidas, permitindo o ataque de leveduras selvagens responsáveis pela
transformação do açúcar da fruta em álcool. Portanto, é de se supor que o homem
primitivo tenha entrado em contato com esse produto casualmente. A adoção desse
protótipo de vinho por nossos antepassados deveu-se antes ao efeito causado no estado
anímico daqueles primeiros consumidores do que às qualidades gustativas do produto.
Diferentes pesquisas arqueológicas têm evidenciado que o vinho acompanha a
humanidade desde seus primórdios. A parreira vinífera parece ter origem na região ao sul
do mar Negro e sudoeste da cadeia dos Cáucasos. Essa área corresponde aos territórios
atuais da Turquia, Armênia e da Geórgia e nela floresceram, na era neolítica, os reinos da
Anatólia, dos hititas e da Armênia. Lá, foram encontrados os mais antigos vestígios
conhecidos de videiras. Mais importante é o fato que, em sítios arqueológicos da área,
estudiosos dessas civilizações encontraram sementes de uvas cultivadas datadas de
7000 AC. Esse período coincide com a transição social dos primeiros povos da Ásia
menor de um estado de grupamentos nômades para o estágio de sociedades fixas e
agricultoras. A viticultura evoluiu e difundiu-se em direção ao ocidente, até as margens do
Mediterrâneo, estabelecendo-se em Canaã, na Assíria e Fenícia. A região da
Mesopotâmia, pouco propícia ao cultivo da vinha, tornou-se grande importadora do
produto. O próximo império a produzir vinho foi o egípcio. A partir daí e da Anatólia, a
bebida foi levada à Grécia. Posteriormente, os fenícios também contribuíram para a
difusão do vinho em suas colônias mediterrâneas, principalmente Massília, a futura
Marseille. O uso do vinho nas várias cidades gregas enraizou-se de forma sólida naquelas
sociedades, tanto como produto alimentício como para uso ritual e religioso, no culto
dionisíaco.
O vinho tinha ainda função medicamentosa, sendo citado por Dioskurides, o pai da
farmacologia, e por Hipócrates de Cós, o pai da medicina. Da mesma forma, aparece
freqüentemente na literatura grega, bem como, em sua dramaturgia. No entanto, a
importância do vinho na civilização helênica também reside no fato que a partir de
750 AC iniciou-se a expansão grega no sul do atual território da Itália. Fundaram-se as
colônias de Neapólis (Nápoles), Tarentum (Taranto) e Siracusa. O sul da Itália e a Sicília

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integraram a chamada Magna Grécia, conhecida então como Enotria, a "terra das vinhas
treliçadas", referência, em grego, à abundância e forma de condução das videiras locais.
A forte presença grega na região influenciou de forma definitiva os padrões culturais da
civilização que se iniciava um pouco mais ao norte: a civilização romana.
Assim, observa-se que a maior parte dos grandes vinhos romanos era proveniente das
áreas que integraram a Magna Grécia: Falerno, Surrentinum, Caecubum na Campania e
Mamertinum na Sicília. O nome de uma das principais uvas da região, a aglianico, é
provavelmente uma corruptela da palavra helênico. No norte, apenas o Rhaeticum atingia
o nível daqueles vinhos meridionais. A situação atual é inversa, com os vinhos mais finos
sendo elaborados nas regiões setentrionais. Torna-se fácil imaginar que a expansão
imperial romana, bem como a política da Pax Romana e o aculturamento dos povos
bárbaros com o aparecimento dos chamados foederati, contribuíram para a difusão do
vinho em todas as províncias romanas estabelecidas nas terras conquistadas. No início a
cultura da vinha difundiu-se pela Gália cisalpina, onde já havia Massília com sua cultura
fenícia. Esta região era então a grande fornecedora para toda Gália setentrional. A seguir,
a viticultura estabeleceu-se na Gália narbonensis (Narbone). O cultivo da vinha no
restante da Gália tem origem controversa. É possível que os gauleses e mesmo os celtas
já o fizessem, pois, existem evidências arqueológicas disso. No entanto, a versão mais
aceita é a da sua propagação a partir das margens do Mediterrâneo para a região da
Lugdunencis (Lugdunum-Lyon), seguindo o curso do Rhône e, para Burdigala (Bordeaux),
na Aquitânia. A implantação da vitivinicultura na península ibérica foi facilitada pelo fato
de que já lá havia uma cultura do vinho, herdada dos fenícios através dos cartagineses,
que dominaram a região antes da destruição de Cartago nas guerras Púnicas contra
Roma. Sob domínio romano, a vinha floresceu na Baetica (Andaluzia), em Tarraconensis
(norte da Espanha e Portugal) e na Lusitania (Portugal).
No norte, o grande estímulo vinícola foi a descentralização administrativa do império
romano, levada a efeito por Diocleciano, em virtude das invasões bárbaras, no início do
século IV. Umas das capitais imperiais criadas foi Trier, a Augusta Treverorum, sob o
comando de Constantino, às margens do rio Mosel. A presença da corte na região
desenvolveu muito a viticultura local.
Após um período de calma relativa, a Europa mergulhou na grande noite que se seguiu à
queda do império romano do ocidente em 476. A barbárie e o caos subseqüentes
acarretaram uma total desorganização social e da atividade produtiva. A produção do
vinho nesse período é pouco conhecida mas sabe-se que foi mantida pelos inúmeros
novos senhores de terras e, principalmente, pelos bispados. Um novo alento foi tomado
após a reunificação da Europa, com a sagração no dia de natal de 800, de Carlos Magno
como imperador. Uma espécie de renascimento teve então lugar, revalorizando a cultura
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greco-latina. O culto do vinho veio como conseqüência lógica. Além da doação à abadia
local, do vinhedo que hoje leva seu nome em Corton e da lenda de que os primeiros
vinhedos do Rheingau teriam sido plantados por sua ordem, numerosos atos de
regulamentação da produção de vinhos foram promulgados por Carlos Magno. No
entanto, o fator decisivo na manutenção da tradição vitivínicola foi o desenvolvimento, a
partir do século XI, do monasticismo decorrente do surgimento das grandes ordens
monacais, como a Cluniacense e a Cisterciense. As imensas abadias dessas ordens,
como a de Cluny, eram verdadeiras cidades com extensas áreas plantadas para o
sustento da vida abacial. Inúmeros são os vinhedos famosos que pertenceram a esses
mosteiros beneditinos. O período que se seguiu foi de relativa estagnação. Um dos
grandes problemas do comércio de vinhos era a fragilidade do produto. Os vinhos de
então eram extremamente perecíveis, o que, com raras exceções, impedia a exportação.
O consumo era totalmente local. A maior concentração alcoólica, característica de vinhos
de clima quente, aumentava a durabilidade tornando-os mais procurados pelas regiões
importadoras. A progressiva aceitação do uso da garrafa e da rolha, em meados do
século XVII, mudaram radicalmente este panorama. Muitos vinhos de qualidade, antes
consumidos apenas pelos moradores da área de produção, passaram a ser
comercializados por toda Europa. Alguns deles tornaram-se verdadeiras manias em
várias cortes, adquirindo grande fama. Com isso, o mercado vinícola passou a ter cada
vez maior importância financeira para os países produtores. Essa situação perdurou até a
segunda metade do século XIX.
A partir de 1870, grande parte do vinhedo europeu foi devastado por uma praga agrícola
denominada Phylloxera vastatrix. Descobriu-se que o emprego de técnicas de enxertia
sobre porta-enxertos de origem americana, imunes à infestação, podia representar a
salvação de quase 8000 anos de tradição no cultivo da vinha. Todo o vinhedo europeu foi
replantado com as plantas originais enxertadas sobre "cavalos" americanos. Nesse fim de
século, também foi marcante a implantação definitiva de vinhedos de qualidade no novo
mundo. Assim, a Califórnia, a África do Sul, a Austrália e o Chile tiveram aumentadas
significativamente as suas áreas plantadas com videiras nobres de origem européia.
A primeira metade do século XX não apresentou fatos relevantes em relação ao vinho
exceto a promulgação, nos Estados Unidos, da Prohibition, a chamada Lei seca. O
próximo episódio histórico a influenciar a viticultura foi o eclodir da segunda grande guerra
quando essa atividade foi praticamente destruída. Mais uma vez, no entanto, após o
término do conflito, a cultura da vinha voltou a apresentar dias de esplendor.
Vários fatos de relevância têm ocorrido recentemente, modificando o panorama do
consumo mundial de vinhos. No dizer de Hugh Johnson, uma das maiores autoridades
mundiais em vinho, 80% das modificações em 8000 anos de relacionamento do homem
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com o vinho, ocorreram nos últimos trinta anos. As principais causas dessas alterações
são a diminuição das populações rurais, o menor consumo de vinho pelas populações
urbanas em decorrência do ritmo de trabalho e, a popularização do automóvel e o
conseqüente controle da ingestão alcoólica de seus motoristas. Contribuem também, a
difusão de vários conceitos de saúde e uma exigência, pelos consumidores, de melhor
qualidade. Esses fatos somados implicam em diminuição do consumo global. Outra
tendência relevante é a internacionalização do paladar. Essa corrente caracteriza-se pela
adoção de determinadas cepas de uvas como a Cabernet Sauvignon, a Chardonnay e a
Riesling. Tais variedades são vinificadas de modo a obter vinhos límpidos, frutados, com
pouco tanino e projetados para consumo imediato ou, no máximo, para um curto período
de guarda. Nota-se também uma preferência pelo vinho branco, que, nesse caso,
apresenta-se ligeiro, frutado e aromático. Esse estilo de consumo implica em dificuldades
para algumas regiões tradicionais, cujos produtos fortemente marcados por
características regionais, encontram certa rejeição no mercado internacional. Torna-se
cada vez mais difícil a comercialização de vinho tânicos, de paladar muito acentuado e
que necessitam de longos anos de amadurecimento.
Os países do novo mundo, com sua capacidade de produzir vinhos de acordo com a
exigência internacional e dotados de excelente relação custo-qualidade, invadiram o
mercado. No entanto, as regiões vinícolas tradicionais apresentam uma clara reação.
Nota-se uma nítida mudança do estilo de vinificação com abrandamento dos taninos e
aumento da fruticidade, além da diminuição do tempo previsto de amadurecimento. Tem
ocorrido também a implantação das chamadas uvas internacionais em áreas tradicionais
onde elas não são variedades normalmente presentes. Essa revolução, em pleno curso,
além da diminuição do consumo mundial, tem causado uma massificação do estilo dos
vinhos, com perda de algumas qualidades interessantes e características regionais. Por
outro lado, o consumidor tem sido beneficiado pela elevação geral da qualidade e pela
diminuição de preços dos vinhos médios.

Produção e consumo internacionais

A produção mundial de vinhos encontra-se, hoje, espalhada por todos os continentes. No


entanto, o maior volume e a maior concentração de vinhos de qualidade ainda estão
localizados nos países da bacia mediterrânea. Na última década, França e Itália têm se
revezado na liderança da produção mundial, com cerca de 70 milhões de hectolitros
anuais cada um. No momento, a Itália é a maior produtora e a segunda consumidora,
ocupando a França, a posição inversa. Nesses países, a produção de vinhos representa

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importante fração do produto interno bruto e parcela considerável de suas exportações.
Juntos, os dois exportam cerca de 30 milhões de hectolitros. Outras nações da região,
como Portugal, são essencialmente vinícolas. Cerca de 8% das terras agriculturáveis de
Portugal estão ocupadas pela vinha, com aproximadamente 235.000 trabalhadores
empregados nessa atividade. A Espanha possui a maior área de vinhedos do mundo. No
entanto, esses produtores clássicos vêm sofrendo forte concorrência de países
localizados fora da área mediterrânea. É difícil estabelecer o posicionamento atual dos
produtores em virtude das recentes mudanças no mapa político da Europa com a
fragmentação do 40 maior produtor mundial, a URSS. De qualquer forma, França, Itália,
Estados Unidos, Espanha e Argentina são os cinco grandes produtores.
O vinho vem, há tempos, deixando de ser consumido prioritariamente nas áreas
produtoras. Países que não se incluíam entre os grandes consumidores apresentam,
agora, grande importância. Assim, Japão, Estados Unidos, Luxemburgo e Bélgica
importam grandes quantidades de vinhos finos. Porém, a produção de vinhos finos
compreende cerca de 5% do volume total. Nesse segmento do mercado, existe uma
oferta insuficiente para uma demanda crescente, com conseqüente aumento de preços.
Entretanto, como já foi exposto anteriormente, existe um outro padrão de vinho que vem
conquistando a preferência do mercado consumidor. Países do novo mundo como os
Estados Unidos, a Austrália, o Chile e a África do Sul produzem vinhos que atendem a
esse padrão, muitas vezes a preços inferiores aos seus equivalentes europeus. Diante
dessa demanda comercial, algumas regiões tradicionais estão sendo obrigadas a se
adaptar para continuarem competitivas. Isso implica em pesados investimentos em
técnicas modernas de viticultura e equipamentos capazes de executar o processo
altamente tecnológico em que se transformou a vinificação. Embora a perda das
características regionais de alguns vinhos seja uma consequência notável, é importante
lembrar que os dois vinhos mais exportados do mundo (Mateus Rosé e Liebfraumilch),
são produtos de tecnologia e destituídos de caráter ou qualidade. Um outro fato que tem
influenciado o mercado mundial foi a criação do mercado comum europeu. A
padronização da lei entre os países integrantes que está em curso, seguramente facilitará
a vida do consumidor que, muitas vezes, se vê em dificuldades para compreender as
inúmeras diferenças de regulamentação entre os países e para comparar vinhos de
procedência diferente. Essa homogeneização dos dispositivos legais certamente levará a
um aumento seletivo das exportações dos países membros. Destarte, vinhos que
atendem aos requisitos comuns para receberem denominações de origem serão
beneficiados. O mercado comum europeu também torna possível, pela queda das
barreiras alfandegárias, o livre trânsito de vinho entre seus membros, o que, aliado à
maior exigência de qualidade e à diminuição do consumo vem provocando grandes
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excedentes de produção em diversas áreas. A impossibilidade de colocar comercialmente
esse verdadeiro mar de vinho acarreta vários problemas sociais como o desemprego e o
êxodo rural.
Nitidamente estamos atravessando uma época de mudanças que tenderá a uma
estabilização com uma nova distribuição do mapa mundial da produção e consumo de
vinhos.
Existem padrões variados de consumo de vinho determinados por diferenças sócio-
culturais. Assim, nos países tradicionalmente produtores, o vinho é encarado como
alimento, fazendo parte integrante das refeições. É inconcebível, principalmente nas
áreas rurais produtoras, a alimentação desacompanhada do vinho. O vinho cotidiano
dessas populações, encarado como componente alimentar, não possui conotação de
bebida sofisticada, reservada para reuniões sociais. É interessante notar que nesse
segmento social, embora o consumo seja alto, o alcoolismo é raro. Talvez isso seja
parcialmente devido ao fato de que o indivíduo entra em contato com a bebida alcoólica
na infância, à mesa de sua casa, dentro do ambiente de sua família e num clima de
moderação. Por outro lado, em regiões não produtoras e nos grandes aglomerados
urbanos, o tipo de consumo é totalmente diferente. O vinho utilizado habitualmente é o
branco, desvinculado da refeição, durante reuniões sociais. O uso do vinho como
acompanhamento alimentar fica restrito às refeições em restaurantes. Perde-se assim, o
caráter de alimento cotidiano como o é o pão. Nessa população, o consumo de bebidas
alcoólicas é misto, ocorrendo maior prevalência de alcoolismo devido ao uso de bebidas
destiladas.
Em relação à qualidade do vinho, sabe-se que nas zonas produtoras existe uma forte
regionalização. As populações bebem seus vinhos, aqueles que são produzidos
localmente. É inimaginável para, por exemplo, um piemontês, tomar um vinho produzido
na Sicília. Em geral, consomem-se vinhos genéricos reservando-se os mais finos para a
exportação e para dias festivos. Já nas grandes cidades e em zonas não produtoras,
bebe-se vinhos de procedências extremamente variadas. A tendência, no entanto, é o
consumo daquele padrão de vinho internacional já descrito. Os vinhos mais finos, de
grande qualidade e conseqüentemente caros, destinam-se a segmentos restritos da
população, de alto poder aquisitivo. São também consumidos por grupos de amadores e
conhecedores, interessados em um maior conhecimento daquela bebida e, portanto,
bebendo de maneira crítica.
Observamos, portanto, o vinho sendo consumido como alimento, como bebida sofisticada
em eventos sociais e como objeto de estudo e análise, tal como se fora uma obra de arte.

Consumo racional de vinhos


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O vinho, consumido racionalmente, pode ser um excelente auxiliar na manutenção da
saúde. São numerosos os relatos de entidades médicas conceituadas demonstrando um
benefício na ingestão moderada de álcool, que teria um efeito profilático da doença
arterosclerótica cardiovascular. No entanto, todas as pesquisas são concordantes quando
afirmam que esse efeito só se observa quando do uso de pequenas quantidades. A
ingestão maior está relacionada a uma perda desse efeito benéfico, além do risco
aumentado de desenvolvimento das doenças associadas ao álcool como a cirrose
hepática e a pancreatite crônica. Assim, o controle do consumo de álcool é imperioso e o
vinho tradicionalmente é a bebida da moderação. Outrossim, faz-se necessário conhecer
os limites máximos de consumo considerados seguros. O Royal College of Psychiatrists
and Physicians da Inglaterra recomendou recentemente que o limite de baixo risco é de
168 gramas de álcool por semana para homens e 112 gramas por semana para
mulheres. Para facilitar esse cálculo, considera-se para qualquer bebida alcoólica, uma
"unidade" de álcool como o equivalente a 8 gramas. No caso do vinho de mesa com 10 a
12 graus, uma unidade corresponderia a uma taça com cerca de 80 ml e o limite de
segurança estaria em torno de 240 ml /dia, ou seja, três taças.
Algumas situações específicas devem ser lembradas como o caso dos pacientes
diabéticos que não podem consumir vinhos de sobremesa, ricos em açúcar, e os
portadores de úlceras gastroduodenais que devem tratá-las antes de reiniciar o
consumo de vinhos. Também é importante evitar a associação de álcool com
outras drogas e medicamentos como calmantes, anti-depressivos, anti-alérgicos,
antiinflamatórios e analgésicos.

VITIVINICULTURA
UVAS VINÍFERAS

A Videira é uma planta arbustiva trepadeira e sarmentosa ou seja, apresenta ramos


longos e flexíveis. Pertence à família das ampelídeas ou vitáceas e ao gênero Vitis.
Dentre as espécies de interesse para a vitivinicultura estão a Vitis vinifera, originária do
continente europeu, e várias espécies de videiras americanas como a Vitis labrusca e a
Vitis bourquina. Importam, ainda, para a prática viticultural, as videiras híbridas. A
produção de vinhos finos, porém, está restrita àquela oriunda da Vitis vinifera. O vinho
obtido de parreiras americanas apresenta um aroma característico, determinado pela
presença de uma substância denominada antranilado de metila, a que se convencionou
chamar “foxé”. Esse aroma desagradável está presente no vinho comum, de garrafão,
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produzido no Brasil a partir dessas uvas cuja principal vocação é o consumo in natura,
como uva de mesa.
No entanto, a importância das videiras americanas e das híbridas reside no fato de que
seu sistema radicular é resistente à praga que em fins do século passado dizimou todo o
vinhedo europeu: a Phyloxera vastatrix, um pequeno inseto, de cerca de um milímetro.
Esses fatos determinaram uma mudança radical na vitivinicultura européia do fim do
século XIX. Assim, o plantio em pé franco (introdução direta do bacelo da videira no solo)
não pôde mais ser utilizado.
Todo o vinhedo foi então substituído por parreiras enxertadas, utilizando-se como porta-
enxertos as videiras americanas, com suas raízes resistentes à Phyloxera. A Vitis vinifera,
nesse processo, é enxertada no caule secionado da videira americana. A planta
resultante é imune à Phyloxera, com o porta-enxerto funcionando como mero condutor de
seiva. A videira européia continua como responsável genética pela qualidade da
produção.
A Vitis vinifera medra melhor em determinados tipos de clima. As melhores regiões são as
temperadas, compreendidas entre os paralelos 34 e 45 graus no hemisfério norte e 31 a
38 graus no sul. A videira é uma planta heliófila, que requer luz em abundância. Por outro
lado, os extremos de temperatura, abaixo de -15º C e acima de 35º C, são incompatíveis
com a sobrevida da parreira. Outrossim, os solos mais apropriados são aqueles de textura
média, bem drenados, e que permitem o enraizamento profundo da videira. Essa
característica faz com que a parreira recolha a umidade do subsolo, sendo portanto
resistente à seca.
Assim, o excesso de chuvas somente contribui para o aumento de doença fúngidas. O
clima e o solo estão intimamente ligados na determinação da qualidade final do fruto.
Climas quentes e secos determinam cachos com bagos grandes, ricos em açúcares
pobres em ácidos. Contrariamente, nos climas frios e úmidos, a tendência é a produção
de uvas com elevada acidez e com pequeno teor de açúcar. O teor mineral do solo
também influi na uva e no vinho: o solo mais alcalino está relacionado a maior teor
sacárico, o ferro produz maior quantidade de matéria corante, e assim por diante.
A reprodução da videira em vitivinicultura é promovida através de muda, pois a natureza
hermafrodita e heterogâmica de suas flores faria com que a fecundação natural
acarretasse uma extrema heterogeneidade genética, com conseqüente variação na
qualidade das uvas e do vinho. A planta adulta, que cumpre um ciclo vegetativo anual,
necessita de dias progressivamente mais quentes no decorrer desse ciclo. Assim, se
considerarmos o inverno como início do ciclo, nota-se que durante esse período a videira
permanece em repouso, desprovida de suas folhas. O começo da primavera promove o
movimento da seiva que poreja das extremidades podadas dos galhos. É o choro da
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videira. Esse fenômeno é importante porque antecede em cerca de 120 dias a data do
princípio da colheita. A partir daí começa a fase de crescimento vegetativo da planta, que
compreende a brotação, a ramificação e a frutificação, que se estendem até o outono. A
fase seguinte, já no verão, caracteriza-se pela formação de reservas com aumento dos
frutos que atingem a maturidade. Após a colheita, que no hemisfério sul é realizada entre
o final de janeiro e março, a parreira perde suas folhas e volta ao repouso hibernal.

Sistema de Plantio

A vinha, planta trepadeira, se deixada crescer ad libitum, se espalha pelo chão e,


encontrando apoio, fixa-se através de seu sistema de gavinhas e se ramifica pelo sistema
de condução. A maior parte dos sistemas de viticultura utiliza algum método de condução.
Em regiões de extremos de temperatura, vento ou pouca umidade, cultiva-se a parreira,
sem condução, como uma pequena árvore para melhor captação do calor ou da umidade
do solo. Os tipos mais freqüentes de vinha conduzida são a latada, em que os ramos
crescem sobre um suporte treliçado horizontal elevado formando um pergolado e a
espaldeira, que consiste de fileiras espaçadas e paralelas de arames esticados que
conduzem os ramos. O primeiro sistema permite uma maior produtividade, em detrimento
da qualidade. Possibilita também, um maior crescimento de fungos e não permite a
colheita mecânica. A espaldeira, por sua vez, diminui a produção, e permite maior
insolação dos frutos, que se apresentam em melhor estado sanitário. A colheita mecânica
é possível, bem como os tratos agrícolas mecanizados.

Localização do Vinhedo

A escolha da localidade para a implantação do vinhedo é de capital importância para a


determinação da qualidade da uva a ser produzida. Em geral são preferidas as encostas,
pois além de permitirem uma melhor exposição solar, propiciam uma boa drenagem do
terreno. Por esse mesmo motivo evitam-se as baixadas, que, com freqüência, sofrem
alagamento, como também as áreas sobre lençóis freáticos, que interrompem o
enraizamento profundo da planta. As encostas em margens de rios são adequadas, pois
além da disponibilidade de água, o sol refletido na superfície aumenta a luminosidade
sobre o vinhedo. A orientação das fileiras deve ser feita no sentido norte-sul, o que
protege a vinha dos ventos e permite maior exposição dos bagos ao sol da manhã e da
tarde, protegendo-os da radiação mais forte do meio-dia. Terrenos pouco acidentados são
os preferidos por permitirem a mecanização. A textura do solo deve ser média, bem
permeável e devem existir boas condições de drenagem da água. Embora essas
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características descritas sejam as ideais, muitos vinhos de grande qualidade são
produzidos sob condições aquém do ideal.

Tratos Viticulturais

O cuidado da vinha é atividade extremamente trabalhosa exigindo do viticultor atividades


constantes de combate a pragas como o mídio, o oídio, a antracnose e a podridão
cinzenta. A Phyloxera também demanda vigilância do vinhateiro. Além disso, são
extremamente importantes as podas. A finalidade dessas é reduzir o volume vegetativo
da planta fazendo com que o fluxo vital de seiva seja dirigido ao fruto. São realizadas
duas podas: a de inverno e a verde. Na primeira suprimem-se os brotos estéreis e ramos
secundários, seguindo diversos sistemas padronizados como o Guyot.
A poda verde retira o excesso de folhas permitindo maior insolação dos cachos e
diminuindo a umidade, o que evita doenças. São também eliminados os cachos doentes
ou mal formados.

Colheita
A colheita é realizada em épocas diferentes de acordo com a cepa, as condições
climáticas e o grau de maturidade pretendida ou conseguida pelo vinhateiro. Existem
cepas de amadurecimento mais precoce e outras tardias. Para tornar a decisão do
momento da colheita mais objetiva procede-se à coleta de amostras representativas do
vinhedo e, com auxílio do mostímetro, determina-se a quantidade de açúcar no mosto
dessas uvas. Sabe-se que são necessários 17 gramas de açúcar para se obter cada grau
alcoólico no vinho. Estabelecido o grau alcoólico desejado para o futuro vinho e com base
em curvas históricas dos anos anteriores, o vinhateiro faz uma previsão da data ideal da
vindima. A evolução dos açúcares da uva e de seus ácidos passa a ser monitorizada com
grande freqüência até a chegada do momento ideal da colheita. Esse momento varia de
acordo com o tipo de vinho que se pretende produzir. Desse modo, para vinhos brancos
frescos e aromáticos são necessárias uvas ricas em ácidos, com o devido teor sacárico.
Para se obter bons vinhos tintos, as uvas devem estar ricas em açúcar e matéria corante.
Os vinhos licorosos são provenientes de uvas supermaduras, com altíssima concentração
de açúcar. Podem ocorrer problemas sérios enquanto se aguarda a data da colheita, tais
como chuvas e ataque de fungos, prejudicando o trabalho do ano todo.
A colheita pode ser realizada por método manual ou mecânico. A vindima manual é
obrigatória nos vinhedos em terrenos acidentados. É também empregada na produção
dos grandes vinhos, pois permite seleção dos cachos e não provoca lesão da parreira. No
entanto, é um processo lento e caro. As colheitas mecânicas são rápidas e barateiam a
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produção, permitindo também a vindima noturna quando a temperatura é mais amena.
Porém, as colheitadeiras podem lesar as videiras e não permitem a seleção dos bagos
além de aumentar o volume de folhas e ramos junto aos cachos. Seu emprego é limitado
aos vinhedos situados em terrenos regulares.
A colheita deve ser iniciada em horários frescos para evitar a oxidação dos bagos. São
ainda importantes os cuidados tomados no acondicionamento e transportes das uvas à
cantina. Estas não devem ter suas cascas rompidas pois as leveduras selvagens nelas
existentes principiam o processo de fermentação, além de deixarem as uvas sujeitas à
oxidação. Para que isso não ocorra, transportam-se as uvas em pequenas caixas
plásticas que pelo seu pequeno volume não promovem o esmagamento precoce da uva e
permitem perfeita higienização.
O transporte para a cantina deve ser rápido e, se houver necessidade, utiliza-se o
anidrido sulfuroso para impedir o ataque de bactérias e o princípio da fermentação.

Variedades de Uvas Viníferas


A Vitis vinifera se expressa de múltiplas maneiras reconhecidas como variedades dessa
espécie. Cada uma dessas variedades é típica de uma região produtora, existindo cepas
que mantém suas características em outras áreas enquanto outras só produzem vinhos
típicos em suas áreas nativas. Embora sejam conhecidas milhares de variedades de Vitis
vinifera, algumas dezenas têm maior expressão como produtoras de vinhos finos.
Segue-se uma lista de variedades tintas e brancas, suas regiões de origem e seus vinhos.

UVAS BRANCAS

1) CHARDONNAY

A Chardonnay é a mais famosa de todas as uvas brancas, tendo seu nome escapado dos
compêndios de botânica para se tornar uma marca, um nome de vinho extremamente
popular e facilmente reconhecido pelos consumidores. Em sua terra natal, a Borgonha, na
França, a Chardonnay é a única responsável por todos os finíssimos vinhos brancos
daquela região. No entanto, por ser a França um país que usa nos rótulos de seus vinhos
uma notação estritamente geográfica, o nome Chardonnay só era conhecido pelos
enólogos e produtores. No final do século XX, com a disseminação da Chardonnay por
praticamente todas as regiões vinícolas do mundo e com a prática, hoje quase universal,
de se identificar a variedade da uva nos rótulos dos vinhos, aliada ao enorme sucesso
alcançado por esta varietal, o nome Chardonnay é reconhecido como sinônimo de vinho
branco de alta qualidade. Deve-se ressaltar no entanto que apesar de toda a fama,

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existem diferenças muito significativas entre os diferentes vinhos produzidos no mundo
com a Chardonnay.
Entre os apreciadores de vinho, o sucesso da Chardonnay deve-se principalmente ao fato
de que, com raras exceções, o vinho feito com a varietal costuma dar enorme e imediata
satisfação a quem o bebe. O vinho da Chardonnay costuma ser pleno, acessível,
amanteigado, frutado e dependendo do tipo de vinificação adotado, ter ou não o sedutor
aroma de baunilha derivado do tratamento em tonéis de carvalho, além de não ser áspero
ou conter acidez agressiva.
Mas a Chardonnay não agrada apenas os consumidores. Os produtores a apreciam muito
por ser uma uva muito fácil de cultivar - é vigorosa, resistente, produzindo generosas
colheitas na maioria dos climas e solos. Os enólogos também a apreciam por sua extrema
maleabilidade, podendo produzir uma grande gama de estilos diferentes de vinhos, de
acordo com a técnica de vinificação adotada. Sua expressão máxima no entanto, continua
a ser na Borgonha, onde dá origem a alguns dos mais elegantes e refinados vinhos
brancos de todo o mundo (Montrachet, Mersault, etc...).

Aspectos Organolépticos da Chardonnay

A Chardonnay costuma ter uma enorme variedade de aromas e sabores. Entre os mais
conhecidos estão: maçã, pêra, frutas cítricas, melão, pêssego, abacaxi, manteiga, cera,
mel, “balas toffee” ou “butterscotch” (espécie de caramelo feito com açúcar queimado e
manteiga ou xarope de milho), baunilha, especiarias diversas, lã molhada (na Borgonha),
minerais e pedra de isqueiro (Chablis).

2) SAUVIGNON BLANC

A Sauvignon Blanc é a única varietal responsável por alguns dos mais populares e
respeitados vinhos brancos secos do mundo, os Sancerre e os Puilly - Fumé do Vale do
Loire, na França. É também a uva dos Sauvignon e Fumé Blancs nas demais partes do
mundo. Parece ter suas origens na região de Bordeaux, na França, onde costuma ser
adicionada à Sémillon, tanto nos vinhos secos (Graves), como nos doces (Sauternes),
conferindo sabor e vivacidade à mistura. Pode ser vinificada com ou sem tratamento em
carvalho, dando origem a vinhos bastante diferentes. Países do Novo Mundo,
especialmente a Nova Zelândia, têm tido muito sucesso nos vinhos desta varietal.

Aspectos Organolépticos da Sauvignon Blanc

Quando corretamente tratada, a Sauvignon costuma produzir vinhos com personalidade


forte, apesar de unidimensionais, bastante secos e com notável acidez (sua mais

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marcante característica). Os sabores e aromas encontrados com maior freqüência são os
herbáceos, tais como grama recentemente cortada, folhas de groselha em floração,
aspargos em lata e groselhas brancas (gooseberry). São também descritos aromas pouco
ortodoxos tais como almíscar, feijões verdes (indesejável), “gato macho” e urtiga. Na
Sauvignon do Vale do Loire é comum aparecer aromas minerais e de pedra de isqueiro (o
que explica a designação “fumé” que aparece em alguns vinhos desta uva).

3) RIESLING

A verdadeira Riesling de origem germânica, também conhecida como Johannisberg,


White Rhine ou Riesling Renano, é uma das melhores uvas do mundo. Tem em comum
com a Sauvignon Blanc uma personalidade extremamente marcante, que se manifesta
muito melhor sem a influência do carvalho, e uma acidez bastante elevada. É, no entanto,
muito mais adaptável que a Sauvignon, crescendo muito bem tanto no clima frio da
Europa (Alemanha e Alsácia), como no clima quente da Austrália. É ainda passível de ser
atacada pela “podridão nobre”, causada pela Botrytis cinerea, o fungo que acomete certas
uvas maduras, desidratando-as, dando origem a vinhos de imensa riqueza e doçura. O
resultado é uma grande variedade de estilos de vinhos, desde o totalmente seco até o
intensamente doce, com teores alcoólicos que variam de 6,5% na Alemanha até os 13%
na Alsácia e na Austrália. Alem disto, como a Chardonnay, a Riesling tem o potencial de
envelhecer por muitos anos, dando origem a vinhos de grande complexidade.
Independente de sua origem, de ser seco ou doce, velho ou novo, o vinho produzido com
a Riesling deve ter um intenso caráter frutado, balanceado por uma vívida acidez.

Aspectos Organolépticos da Riesling

Os aromas e sabores mais freqüentemente associados à Riesling são os de petróleo/


querosene, tostado, notas minerais, aromas florais (Mosel), mel (vinhos doces), maçãs
verdes crocantes, maçãs cozidas com especiarias, marmelo, laranja, lima (Austrália) e
maracujá (Austrália)

4) CHENIN BLANC

A Chenin Blanc, uma uva de elevada acidez e grande potencial de longevidade na sua
região nativa, chamada Pineau ou Pineau de la Loire, é provavelmente a variedade de
uva mais versátil do mundo, capaz de produzir alguns dos mais finos e longevos vinhos
brancos doces.
Quando as condições são favoráveis, o que infelizmente não costuma ocorrer em todos
os anos no Loire (Côteaux du Layon, Vouvray, etc...), a Chenin Blanc dá origem a

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magníficos vinhos doces, com toques de mel, além de estimulante e harmoniosa acidez.
Em anos menos favoráveis, os vinhos costumam ser mais leves, menos concentrados e
mais freqüentemente secos ou meio-doces, sendo sua elevada acidez mais útil para a
produção de vinhos espumantes secos em Saumur, Vouvray e Mont-Louis. No restante
do mundo, a Chenin Blanc produz vinhos simples, suaves, ácidos e frutados (África do
Sul, onde é a variedade mais plantada) ou vinhos secos e de caráter, cada vez mais
interessantes (Nova Zelândia).

Aspectos Organolépticos da Chenin Blanc

Os aromas e sabores mais freqüentes da Chenin Blanc são os de maçãs verdes,


damascos, nozes, avelãs, amêndoas, mel e marzipan.

5) MARSANNE

A Marsanne, provavelmente originária do norte do Rhône, no sul da França, é uma


varietal de crescente popularidade, sendo utilizada sozinha ou em combinação com sua
tradicional parceira Roussanne, em apelações como St-Joseph, St-Péray, Crozes-
Hermitage e em muito menor escala, em Hermitage. A capacidade da uva de produzir, em
termos quantitativos, grandes safras e as modernas técnicas de vinificação, que ajudaram
a minimizar a tendência natural da Marsanne de produzir vinhos com baixa acidez,
contribuíram sem sombra de dúvida para esta mudança no perfil de aceitação dos vinhos
feitos com a Marsanne.

Aspectos Organolépticos da Marsanne

A Marsanne, por si só, costuma apresentar aromas e sabores bastante acentuados,


geralmente herbáceos, lembrando frutas cítricas muito maduras e concentradas, às vezes
com toques minerais. Quando tratada com carvalho, apresenta excelente potencial de
envelhecimento. Os vinhos de Marsanne costumam ter cor profunda, corpo pleno, com
aromas bastante exuberantes, podendo em alguns casos lembrar amêndoas.

6) GEWURZTRAMINER

A Gewurztraminer é uma varietal extremamente aromática, que atinge o seu grau máximo
de qualidade na Alsácia, na França, onde dá origem a uma enorme gama de vinhos
personalíssimos, variando do totalmente seco até vinhos doces (VT - Vendage Tardive e
SNG - Sélection de Grains Nobles), sempre com elegância e fineza. Também na
Alemanha, na região de Pfalz, produz vinhos de excepcional qualidade. Também tem
aparecido em praticamente todas as regiões do mundo, tais como a Austrália, Califórnia e
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o Chile, porém com características muito distintas e com poucas das qualidades que a
tornaram famosa. A Gewurztraminer, no seu apogeu, apresenta o aroma mais peculiar
entre todas as uvas brancas, o que a torna absolutamente inconfundível numa
degustação às cegas. O vinho feito com esta uva tem um perfume floral, com uma
característica pungência, com um peculiar sabor e aroma de lichias, sendo geralmente
bastante encorpado, com textura untuosa, elevado teor alcoólico e baixa acidez.

Aspectos Organolépticos da Gewurztraminer

Como já foi dito, os aromas e sabores mais freqüentes são os de especiarias,


particularmente o gengibre e a canela, “Creme Nívea” e lichias.

7) MOSCATEL

Se um vinho tem aroma de uvas, então é quase certo que a uva do qual se originou é
uma uva da família Moscatel. Os vinhos feitos com esta uva podem ser secos, como na
Alsácia; leves, adocicados e frisantes, como em Asti, Moscato d’Asti e Clairette de Die;
muito doce, como no Moscatel de Valência; muito doce e fortificado, como no pesado,
super-doce, âmbar e castanho “Liqueur Muscats” Australiano e nos “vins doux naturels”
do Rhône e do Sul da França (dos quais os mais conhecidos são os Muscat de Beaumes-
de-Venise, Muscat de Rivesaltes e Muscat de Frontignan).

Aspectos Organolépticos da Moscatel

Os aromas e sabores mais citados são os de uvas, laranjas, rosas (Alsácia), bergamota /
tangerina (Alsácia), uvas passas (nos vinhos fortificados), cevada e açúcar mascavo
(demerara).

8) VIOGNIER

A varietal Viognier é uma uva importante por ser extremamente rara. A Viognier é a
responsável pelo Condrieu, um vinho branco excitante, perfumado, opulento (apesar de
seco) e encorpado, proveniente de uma minúscula região do norte do Rhône, sendo
cultivada em muito poucos lugares no mundo. O problema é que a Viognier é uma varietal
de cultivo complicado, sendo muito susceptível às diferentes doenças próprias dos
vinhedos, além de ser de difícil vinificação. Se o clima não for extremamente favorável,
possivelmente não haverá uvas para serem colhidas, e mesmo num ano considerado
bom, a produção é muito baixa (daí o preço proibitivo do Condrieu). A boa notícia é que
vários produtores de outras regiões do Vale do Rhône e de Languedoc estão plantando a
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Viognier, com bons resultados. A uva também está sendo cultivada na Califórnia,
produzindo vinhos bastante expressivos, porém com preços comparáveis aos de
Condrieu.

Aspectos Organolépticos da Viognier

Os aromas e sabores mais citados são os de flores de primavera (flor-de-maio e flor do


limoeiro), damascos, pêssegos, almíscar e algumas vezes, de “crème fraîche”, que é um
laticínio francês constituído por um creme de leite levemente acidificado (inexistente no
Brasil).

9) SÉMILLON

A Sémillon é a principal uva dos vinhos brancos de Bordeaux, tanto os secos


(especialmente em Graves), como os doces (Sauternes). Também consegue excelentes
resultados na Austrália, na região do Hunter Valley, na forma de um pouco usual vinho
branco seco.
Em Bordeaux é apreciada por sua suavidade, tal como lanolina, e em menor escala,
somente nos vinhos secos jovens, por seus aromas e sabores herbáceos (similares aos
da muito mais ácida Sauvignon Blanc, com a qual é comparável e freqüentemente
misturada). No Hunter Valley é renomada por produzir um longevo vinho branco seco, que
adquire crescentes sabores de mel e torradas com o envelhecimento. É também bastante
plantada no Chile e em menor escala na África do Sul.

Aspectos Organolépticos da Sémillon

Os aromas e sabores mais freqüentes são os de grama, cítricos, lanolina, mel e torradas.

OUTRAS UVAS BRANCAS DE INTERESSE:

• ALIGOTÉ - Uma uva agradável, porém comum, produzindo vinhos brancos secos,
ácidos e encorpados na Borgonha.
• COLOMBARD - A uva Colombard produz vinhos brancos leves, suaves, frutados e
baratos no Sudoeste da França, especialmente os Vin de Pays des Côtes de Gascone,
além dos vinhos que são a base para os vinhos fortificados locais como o “cognac” e o
“armagnac”. É também popular na Califórnia, África do Sul e Austrália.
• FURMINT - A Furmint, varietal branca encontrada em grande quantidade na Hungria
e em menor escala na Eslovênia, é uma uva refinada e apaixonante, dando origem a um
dos mais famosos e longevos vinhos de sobremesa do mundo, o Tokay. É uma varietal
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muito sensível a Botrytis cinerea (ou “podridão nobre”). Seus vinhos costumam ter acidez
extremamente elevada, alta concentração de açúcar residual e elevado teor alcoólico,
com grande potencial de envelhecimento. Os vinhos são ricos, concentrados e ardentes.
Pode produzir também vinhos completamente secos, robustos e potentes.
• MÜLLER-THURGAU - É uma uva resultante do cruzamento da Riesling com a
Sylvaner, plantada por toda a Alemanha, sendo a principal constituinte do Liebfraumilch. É
também a variedade mais comum na Inglaterra.
• PINOT BLANC - Em sua melhor expressão, como a cultivada na Alsácia, dá origem a
vinhos que se assemelham a um Chardonnay leve, sem tratamento em madeira, fresco e
herbáceo, com maçãs e toques de manteiga.
• PINOT GRIS (também conhecida como Pinot Grigio, Tokay ou Rülander) - Produz
vinhos leves, ácidos e neutros na Itália e Alemanha. Ou então vinhos maduros, ricos,
concentrados e pouco ácidos, com perfume de talco e toques de mel, tanto secos como
doces, na Alsácia.
• SYLVANER - Uma das menos expressivas e consideradas uvas brancas da Alsácia,
mas ainda assim não desprovida de atrativos. Na Alemanha, onde é conhecida como
Silvaner, é importante na região da Francônia.
• SCHEUREBE - É uma varietal híbrida de Riesling-Silvaner alemã, bastante
interessante, que dá origem a bons vinhos brancos secos e doces. Também é encontrada
na Inglaterra.

UVAS TINTAS

1) CABERNET SAUVIGNON

A Cabernet Sauvignon é a uva tinta mais conhecida e difundida em todo o mundo. Tem
grande facilidade de adaptação a diferentes climas e solos, sendo por isto cultivada em
praticamente todas as principais regiões vinícolas, das quais Bordeaux, na França, é a de
maior expressão.
É uma uva pequena, de casca muito espessa, cor intensa, com grande quantidade de
material sólido e escuro, além de taninos em abundância (exceto no Chile e África do Sul,
onde costuma ser menos tânica).

Aspectos Organolépticos da Cabernet Sauvignon

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Os aromas e sabores típicos da Cabernet Sauvignon jovem são os de groselhas negras
(blackcurrant), cassis e ameixas pretas. Quando mais evoluído, o “bouquet” pode revelar
aromas muito complexos, tais como os de carne de caça, couro, chocolate e azeitonas.
Se o vinho receber um tratamento em carvalho, surgem aromas de cedro, caixa de
charutos e tabaco, podendo ter acentuados aromas minerais como o de grafite.
Em alguns casos (Chile e Austrália) podem surgir aromas de hortelã e até mesmo
eucalipto.

2) MERLOT
A uva Merlot, tradicionalmente usada para arredondar as duras arestas dos vinhos feitos
com a Cabernet Sauvignon, sempre foi considerada como coadjuvante no processo de
fabricação dos grandes vinhos de Bordeaux.
No entanto, nos dias de hoje, cada vez mais a Merlot está deixando de lado este papel,
assumindo grande importância nos vinhos produzidos na margem direita do Gironde, em
Bordeaux (Pomerol e St. Emilion) e em varietais de outras regiões tais como a Califórnia,
o Chile e a Austrália. É bom lembrar que o famoso Château Petrus é produzido quase que
exclusivamente com Merlot.
A Merlot é por natureza menos tânica e de maturação mais precoce que a Cabernet
Sauvignon, se adaptando muito bem a solos argilosos e úmidos.

Aspectos Organolépticos da Merlot

Os aromas característicos da Merlot são os de frutas vermelhas escuras: amoras pretas e


ameixas pretas. São também descritos os exóticos aromas de rosas e bolo de frutas. No
caso do vinho ser tratado em tonéis de carvalho, pode surgir um delicioso toque de
chocolate, além de ser conferida ao vinho uma intensa riqueza textural.

3) PINOT NOIR

A Pinot Noir é a mais complexa e delicada de todas as uvas tintas. Seu cultivo fora da
Borgonha, sua terra natal, é extremamente difícil, sendo poucos os produtores bem
sucedidos. Mesmo na Borgonha, são raros os que conseguem expressar em seus vinhos
toda a grandiosidade da uva.
A Pinot Noir é uma das mais antigas uvas da França e é extremamente sujeita a
mutações. O plantio do clone errado, em locais não adequados, poderá resultar em
vinhos insípidos e sem personalidade.
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A uva tem casca fina, baixa acidez, cor média, poucos taninos e é melhor cultivada em
regiões de clima mais frio.
Os fatores mais importantes para a produção de grandes vinhos de Pinot Noir são:
produzir a uva em pequenas quantidades e em locais adequados, além de ter cuidados
extremos no processo de vinificação (fermentação com temperatura controlada, cuidados
higiênicos rigorosos e uso de métodos delicados de clareamento e / ou filtração). A este
respeito é bom frisar que atualmente os grandes vinhos da Borgonha são aqueles em que
praticamente não se usam quaisquer destes métodos, sendo o vinho resultante a
verdadeira expressão do “terroir”, sem manipulações.
Os vinhos de Pinot Noir, com raras exceções, não são muito longevos, atingindo sua
maturidade em 8 a 10 anos, permanecendo no auge por pouco tempo, para depois
declinar rapidamente.

Aspectos Organolépticos da Pinot Noir

Os aromas e sabores típicos da Pinot Noir quando jovem são os de frutas vermelhas,
especialmente framboesas, morangos e cerejas. Na Borgonha podem aparecer notas
florais, geralmente violetas, sendo que na Califórnia e Austrália são descritos aromas
“empireumáticos” (café torrado).
Quando amadurece, a Pinot Noir (principalmente na Borgonha) revela nuances muito
interessantes tais como caça, couro, alcaçuz, trufas negras, estábulo e o clássico “sous-
bois”, que é descrito como o aroma de terra úmida, cogumelos e folhas do bosque em
decomposição.

4) TEMPRANILLO

A Tempranillo é a uva mais comum da Espanha, possuindo cor intensa, com taninos e
acidez elevados. Quando pura, sem tratamento em carvalho, tem aromas e sabores de
frutas vermelhas e especiarias.
A grande dificuldade de se individualizar o sabor da Tempranillo é que os vinhos
espanhóis, tradicionalmente, sempre foram maturados por longos períodos em tonéis de
carvalho, tirando praticamente toda a fruta e a personalidade da uva. Atualmente, com a
adoção de novas técnicas de vinificação, este panorama está mudando e a Tempranillo
deverá ocupar em breve um lugar de destaque no mundo do vinho.

5) SYRAH / SHIRAZ

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A uva Syrah / Shiraz é mundialmente conhecida por dar origem a vinhos incrivelmente
concentrados, escuros, moderadamente ou muito tânicos, densos, alcoólicos e repletos
de aromas e sabores de especiarias. É uma variedade de fácil cultivo e difícil vinificação.
Pode ser usada sozinha ou em deliciosas combinações com outras uvas tintas,
especialmente a Grenache e a Cabernet Sauvignon. Na Côte-Rôtie, pode ser misturada
com a uva branca Viognier, produzindo vinhos com aromas florais exóticos e complexos.
A Syrah tem sua expressão máxima no Vale do Rhône, sul da França, especialmente nas
regiões de Hermitage, Côte-Rôtie e Crozes-Hermitage. Na Austrália, onde é conhecida
como Shiraz, é, sem dúvida alguma, a uva mais importante, produzindo verdadeiras obras
de arte como o Penfolds Grange, o melhor e mais longevo vinho australiano.
O vinho produzido com a uva Syrah / Shiraz é descrito como sensual e sedutor, sendo
muitas vezes o responsável pela paixão por vinhos tintos, despertada em neófitos
apreciadores de vinhos.

Aspectos Organolépticos da Syrah / Shiraz

Os aromas e sabores característicos da Syrah / Shiraz são os de especiarias


(particularmente a pimenta do reino preta), frutas escuras maduras (framboesa negra,
groselha negra, amora), alcaçuz, couro, caça e alcatrão, além de outros aromas do grupo
dos “empireumáticos” (tostado e defumado). São também descritos os aromas de
gengibre e chocolate escuro, notas florais (violeta), podendo em algumas regiões da
Austrália, aparecer um toque sutil de hortelã.

6) GAMAY

Gamay, a uva típica da região de Beaujolais, costuma produzir vinhos com média ou
muita intensidade de cor, com um característico tom púrpura, tradicionalmente descritos
com os termos vagos de “leve e frutado”.
Na verdade, o processo pelo qual o vinho é produzido - maceração carbônica, onde a
fermentação é feita a partir de uvas inteiras, começando dentro do bago - resulta em
aromas muito evidentes de bananas (às vezes, doce de banana), caramelo e até de
chiclete de bola e acetona. A expressão aromática de frutas frescas lembra morangos
silvestres.
Outra característica notável da Gamay é sua elevada acidez, um de seus atributos mais
desejáveis, pois confere ao vinho um frescor inigualável.

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Os vinhos produzidos com uvas de regiões diferenciadas, os chamados “Grand Crus”,
costumam ter mais caráter e podem, após 5 ou 6 anos atingir alguns dos atributos da
Pinot Noir. Esta, no entanto, não é a regra geral, sendo que os vinhos produzidos com
Gamay devem ser consumidos muito jovens, ressaltando o seu frescor e sua fruta
exuberante.

7) CABERNET FRANC

A uva Cabernet Franc é muito usada na região de Bordeaux, em associação com a


Cabernet Sauvignon. Com relação a esta, é considerada menos aristocrática, mais suave,
apresentando casca menos espessa, com menos cor, aromas e taninos. Tem um
característico toque herbáceo e vegetal, lembrando a pimenta verde, folhas e “cascas de
batatas”.
No entanto, na região de Saint Emilion, em Bordeaux, é a principal componente de vinhos
muito famosos tais como o Château Cheval Blanc (60%) e o Château L’Angelus (50%).
No Vale do Loire, na região de Chinon, onde é usada pura, exibe freqüentemente boa
acidez e sutis aromas e sabores de frutas vermelhas frescas (morango) e chocolate.

8) GRENACHE

A Grenache é a uva mais comum do Sul da França, sendo também muito plantada na
Espanha, onde é conhecida com o nome de Garnacha.
É também muito freqüente na Austrália, onde é usada para produzir vinhos baratos e de
baixa qualidade, aparecendo em pequena escala na Califórnia, em vinhos no estilo dos
produzidos no Vale do Rhône, na França.
No Sul da França, a Grenache é a principal uva do famoso Châteauneuf-du-Pape e dos
Côtes du Rhône, sendo também responsável pelo surpreendente Banyuls, um vinho de
sobremesa tinto, que é considerado a compatibilização ideal com chocolate.
Os vinhos produzidos com a Grenache são geralmente muito escuros, alcoólicos, com
toques de especiarias (pimenta), frutas vermelhas (framboesas) e ervas. Em
Châteauneuf-du-Pape costuma apresentar o exótico aroma de óleo de linhaça.

9) NEBBIOLO

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A pequena Nebbiolo, também conhecida como Spanna, Inferno e Grumello, tem seu
nome derivado de neblina, em italiano, numa referência às regiões repletas de neblina do
Piemonte, norte da Itália, sua terra natal, especialmente em Barolo e Barbaresco.
De casca muito espessa, costuma produzir vinhos extremamente escuros, secos,
grandiosos, com muita acidez e taninos exuberantes.
Seus aromas e sabores típicos são os de alcatrão, alcaçuz, violetas, rosas, ameixas
secas, bolo de frutas e chocolate amargo.

10) SANGIOVESE

A uva Sangiovese domina praticamente toda a região central da Itália, porém só


consegue ser grandiosa na Toscana, particularmente nas regiões de Chianti, Brunello de
Montalcino e Vino Nobile de Montepulciano.
Na sua melhor expressão, a Sangiovese produz vinhos de corpo médio a encorpado,
secos, levemente picantes, com aromas e sabores de cereja amarga, especiarias, tabaco
e ervas.
Principal componente dos vinhos da região de Chianti, em mistura com outras uvas
(geralmente a Canaiolo e a Mamolo) , a Sangiovese está cada vez mais sendo usada
pura ou em associação com a Cabernet Sauvignon , nos vinhos chamados de “Super-
Toscanos”, onde consegue expressar de forma exuberante todo o seu caráter. Com a
flexibilização da legislação, mesmo os vinhos da região do Chianti Classico DOCG tem
apresentado esta composição.

11) ZINFANDEL

A uva Zinfandel, cuja verdadeira origem permanece até hoje desconhecida, praticamente
só é encontrada na Califórnia.
Muito versátil, pode dar origem a uma imensa gama de vinhos, desde os brancos (na
verdade são levemente rosados), até aos fortificados tipo Porto.
No entanto, sua melhor expressão são os vinhos tintos secos, que costumam ser bastante
potentes, ricos, encorpados e com aromas e sabores de frutas vermelhas escuras
(amoras) e especiarias (pimenta do reino fresca). Com boa quantidade de taninos
maduros e não agressivos, os vinhos de Zinfandel geralmente estão prontos para serem
tomados em 2 ou 3 anos, sendo que os melhores exemplares chegam a durar 10 anos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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1) Joanna Simon - Discovering Wine - Mitchel Beazley Books - 1994
2) Jancis Robbinson’s Wine Course - Abbeville Press - 1995
3) Oz Clarke - Microsoft Wine Guide versão 1.0b - 1995
4) Stuart Walton - The World Encyclopedia of Wine - Lorenz Books - 1996
5) Tom Stevenson - Sotheby’s World Wine Encyclopedia - Dorling Kindersley – 1994

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NOÇÕES BÁSICAS DE DEGUSTAÇÃO

INTRODUÇÃO

A vida pode ser encarada de uma forma casual ou então levada muito a sério. Todos nós
escolhemos, de uma forma ou de outra, como e quando usar nossa energia e concentrar
nossa atenção. Você pode ouvir música, cozinhar seriamente ou cuidar de um
maravilhoso jardim. Talvez as coisas que você ame não sejam vitais, mas seguramente
tornam a sua vida mais rica. Uma paixão nunca é um esforço perdido, sendo esta a razão
pela qual os verdadeiros apreciadores do vinho aprendem a degustar. Nós sabemos que
o esforço despendido em entender e apreciar o vinho, ao contrário de simplesmente
gostar da bebida e de seus efeitos inebriantes, paga grandes dividendos. A verdadeira
degustação do vinho acrescenta uma nova dimensão à rotina básica diária de comer e
beber. Ela transforma a obrigação em prazer, uma necessidade elementar numa
celebração da vida. Segundo o enólogo francês Emile Peynaud, para degustar um vinho é
necessário submetê-lo aos nossos sentidos, analisando atentamente.

Degustação de Vinhos: Aspectos Gerais

Então, o que é realmente degustar um vinho? Como qualquer habilidade, uma


degustação responsável requer uma combinação de técnica e experiência. Quanto mais
você pratica, melhor você se torna. Dizem que, dado um vinho não identificado, um
degustador experiente, usando apenas seus sentidos e sua memória, pode identificar a
variedade de uva, a safra do vinho, sua região de origem e até o seu produtor. Este é o
mito. Na verdade, se o vinho for servido na temperatura ambiente e o degustador estiver
vendado, na maioria das vezes sequer conseguirá dizer se o vinho é branco ou tinto. A
degustação às cegas é na verdade um grande exercício intelectual, um jogo de raciocínio,
cujo verdadeiro objetivo é entender o vinho e não praticar um jogo de adivinhação.
Através do apurado uso de todos os sentidos e da comparação das sensações obtidas
com dados da memória de outras degustações, um degustador dedicado pode decifrar a
biografia de um vinho com razoável extensão, incluindo informações sobre a uva e a
região do vinho, sua relação com outros vinhos de mesmo tipo e origem, obtendo dados
para fazer um julgamento responsável de suas qualidades intrínsecas.
Cada garrafa de vinho traz uma mensagem, a incorporação física de um determinado
local e tempo, capturados e transmitidos para o prazer do degustador. É um verdadeiro
contato físico com o passado.

24
Mais do que isto, o vinho tem um verdadeiro efeito catalisador. O esforço de entendê-lo
através da degustação, repartindo este conhecimento com outros degustadores, cria uma
experiência comum, construindo laços que aproximam as pessoas. Emile Peynaud
enfatiza este aspecto da degustação em seu livro “O Gosto do Vinho”, um marco da
literatura especializada. Segundo Peynaud, “o grande vinho tem a maravilhosa qualidade
de imediatamente estabelecer a comunicação dentre aqueles que o estão bebendo.
Degustá-lo à mesa não deve ser uma atividade solitária, sendo que um vinho fino não
deve ser bebido sem comentários”.
As técnicas de degustação ampliam nossa habilidade de compreender plenamente um
vinho. Elas são realmente bastante simples e seguem uma série de passos logicamente
definidos. Alguns dos procedimentos podem parecer pouco naturais ou mesmo
pretensiosos para os não iniciados, mas eles foram desenvolvidos ao longo dos séculos
para atingir finalidades específicas. Após algum tempo, estes procedimentos estarão
automatizados.

As Normas Básicas da Degustação

Considere cuidadosamente as circunstâncias. Nem todos os vinhos merecem ser


cuidadosamente analisados. Se você estiver bebendo um Liebfraumilch alemão de
garrafa azul, em copos de plástico, numa festinha sem compromisso, qualquer tentativa
de degustação a sério será um esforço perdido e uma atitude esnobe. Degustadores
profissionais preferem uma sala com iluminação natural, livre de odores, com paredes e
mesas brancas para poder apreciar o vinho num ambiente o mais neutro possível,
tornando a análise mais precisa. Lembre-se que a degustação não é um teste - sua
resposta subjetiva é mais importante do que qualquer “resposta certa”. Não importa quão
avançada seja a sua técnica, a degustação não é uma ciência exata. A sensibilidade
individual varia bastante quando o assunto é aroma e sabor. Estas diferenças são
fisiológicas e culturais.
O objetivo da degustação de vinhos não é “descobrir” os mesmos aromas e sabores que
outro degustador está descrevendo.
Se você afinar as suas habilidades perceptivas e desenvolver seu próprio vocabulário
para descrevê-las, você certamente não apenas obterá maior prazer do vinho em si
mesmo, mas também estimulará melhor comunicação entre você e os amigos com os
quais você está compartilhando este precioso líquido.

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Os Mecanismos de Percepção Sensorial

Existe um mecanismo comum de percepção sensorial, válido para todos os nossos


sentidos, cuja seqüência lógica poderia ser esquematizada da seguinte maneira: estímulo
sensorial efetivo Æ receptor sensitivo Æ impulso elétrico Æ cérebro Æ avaliação. A
primeira fase deste processo seria o que chamamos de sensação e a segunda fase, com
a chegada do estímulo ao cérebro, seria a percepção. A avaliação da informação pelo
cérebro se fará baseada em experiências prévias, traduzindo-a através de palavras
adequadas preestabelecidas.
Lembre-se que os limiares de percepção são diferentes para cada indivíduo, e embora
não sejam alteráveis, podem ser conhecidos através do exercício constante. É importante
ressaltar que o reconhecimento das sensações exige um conhecimento prévio ou
memória sensorial, que pode e deve ser estimulado pelos interessados em degustar
vinhos.

ASPECTOS VISUAIS: OLHANDO O VINHO

A Técnica

O primeiro passo no exame de um vinho é o visual. Preencha o copo com cerca de 1/3 de
sua capacidade e nunca com mais da metade desta capacidade. Segure o copo pela
base. Isto pode, no início, parecer embaraçador, mas há boas razões para tal - segurar o
copo pelo corpo esconde o líquido de sua visão, impressões digitais dificultam a visão da
cor e o calor de sua mão altera a temperatura do vinho. Peynaud diz, “ofereça a alguém
um copo de vinho e você poderá dizer, pela maneira de segurar o copo, se é ou não um
conhecedor”. Comece a observar a cor, a intensidade e a limpidez e a formação das
“lágrimas”. Cada um desses atributos requer uma maneira diferente de observação.
Cor: A verdadeira cor, com suas matizes de tonalidades, é melhor julgada inclinando-se
o copo, olhando o vinho a partir da borda, observando-se as variações de tonalidades
existentes no líquido. Ainda com o copo inclinado, aproveite para avaliar o anel periférico,
que se localiza na parte mais distante do observador, onde o líquido está mais próximo da
borda do copo. Observe se há uma gradação de cor, do mais escuro para o mais claro à
medida que se distancia do centro para a periferia do vinho. Quanto mais maduro estiver
o vinho, mais aquoso será o anel periférico e mais perceptível será a gradação de cor.
Outro aspecto fundamental para ser avaliado nesta fase do processo diz respeito à

26
maturidade do vinho. Podemos afirmar de maneira genérica que os vinhos brancos
tendem a ficar mais escuros com a idade e os tintos mais claros.

Para os vinhos brancos, de acordo com o grau de envelhecimento, teremos a seguinte


seqüência de mudanças na cor:

branco papel Æ verdeal Æ amarelo palha Æ amarelo ouro Æ âmbar

Para os vinhos tintos, a seqüência seria a seguinte:

púrpura Æ rubi Æ granada Æ tijolo (alaranjado) Æâmbar

Intensidade: A intensidade, um atributo do vinho que diz respeito ao fato deste ser mais
claro ou mais escuro, ou seja, mais ou menos penetrável pela luz, e que não deve ser
confundida com a limpidez. É melhor aferida olhando-se o vinho diretamente de cima, em
direção à base do copo, através do líquido. A intensidade é um indício do extrato - a
concentração de sólidos no vinho, um dos componentes do assim chamado corpo do
vinho.

Limpidez: A limpidez - se o vinho tem ou não partículas em suspensão, é mais evidente


quando se olha uma fonte de luz através do líquido. Em princípio, um vinho deve ser
totalmente livre de partículas visíveis em suspensão. A presença de partículas em
suspensão pode não ser obrigatoriamente um defeito, já que vinhos engarrafados sem
filtração podem apresentá-las, porém exige um cuidado maior na análise dos aspectos
olfativos e gustativos.

“Lágrimas”: O passo seguinte é fazer o vinho girar no copo. Além de misturar toda a
gama de tonalidades, prepara o vinho para o próximo passo que é o exame olfativo do
mesmo. A maneira mais fácil de fazer isto é segurar o copo pela base, segurando a haste
com o indicador e o polegar e gentilmente rodar o pulso. Movimente o copo até que o
vinho esteja dançando, subindo em direção à borda. Então pare. Assim que o líquido
voltar para a parte inferior do copo, uma película transparente aparecerá na parede
interna, caindo com velocidade variável e irregularmente, formando as chamadas
“lágrimas” ou “pernas”. Estas são simplesmente uma indicação da quantidade de álcool
do vinho: quanto mais alcoólico for o vinho, as “lágrimas” serão mais abundantes e mais
estreitas. Lembre-se que o fenômeno da formação de “lágrimas” não tem qualquer
relação com o teor de glicerol do vinho e sim com o seu teor de álcool etílico ou etanol.
27
Cada um desses elementos revela diferentes aspectos do caráter do vinho e de sua
qualidade. Não se esqueça, durante este processo de apreciar a cor do vinho. Nenhum
outro líquido é tão vívido, com tonalidades variadas ou reflete a luz com tal prazer e
fineza. Há boas razões para que a aparência do vinho seja freqüentemente comparada
com pedras preciosas tais como o rubi, o topázio, a granada e a metais nobres como o
ouro. Em síntese, podemos dizer que a seqüência mais adequada para a análise visual
de um vinho é a que se segue:

1. Com o copo na vertical

a) Limpidez
b) Transparência
c) Brilho na superfície do líquido (bom indicador do teor de acidez do vinho)
d) Intensidade de cor (indicativo do extrato do vinho)
e) Presença de bolhas (lembre-se de que estas são normais nos vinhos espumantes
e que podem ser encontradas eventualmente e de forma passageira nos vinhos
não espumantes. Neste caso, sua persistência pode significar uma segunda
fermentação dentro da garrafa, constituindo-se num grave defeito).

2. Com o copo inclinado

a) Teor aquoso do anel periférico (indica a maturidade do vinho)


b) Cor: no centro do copo e no anel periférico
c) Presença de sinais de amadurecimento do vinho: reflexos de cor

3. Após a agitação

a) Viscosidade: velocidade com que as “lágrimas” se formam e com que descem pela
parede do copo.
b) Indicação do teor alcoólico do vinho: quantidade de “lágrimas” e sua largura.

ASPECTOS OLFATIVOS

A Técnica

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Quando você parar de agitar o vinho, durante a queda das “lágrimas”, é tempo de
começar o próximo passo: a análise olfativa. Agitando o vinho, este se vaporiza e a fina
película do líquido que recobre a parede interior do copo se evapora rapidamente. O
resultado é uma intensificação dos aromas que se tornarão mais concentrados se o copo
for mais estreito em sua porção superior. Coloque seu nariz diretamente no copo e aspire.
Não há consenso na maneira correta de se proceder esta aspiração. Alguns advogam
duas ou três rápidas inaladas, outros preferem apenas uma inalação profunda e
prolongada. Existem degustadores que preferem inalar isoladamente com cada uma das
narinas.

A Percepção dos Aromas e a Via Olfativa

O objetivo destes procedimentos é conduzir os aromas profundamente no nariz,


colocando-os em contato com os receptores olfativos e o bulbo olfativo, onde as
sensações são registradas e decodificadas. Estes receptores estão situados num local
remoto e protegido, na parte superior do nariz. Com prática e muita atenção, será possível
aprender como maximizar a percepção dos aromas e a seguir como decifrá-los. Devemos
ainda nos lembrar dos aromas que atingem os receptores nasais pela rinofaringe, a
chamada via retro olfativa, constituindo-se no mais importante componente do chamado
aroma de boca e da persistência aromática intensa. Este assunto será melhor visto mais
adiante, quando tratarmos da análise gustativa do vinho.

Os Aromas do Vinho

O mundo dos aromas é vasto e confuso e sabe-se que o vinho tem uma assombrosa
quantidade de elementos aromáticos. Nosso sistema olfativo é incrivelmente sensível, nos
sendo possível distinguir aromas em quantidades tão pequenas, que mesmo os mais
sensíveis equipamentos de laboratório terão dificuldade em medir. Nossa capacidade
analítica é extraordinária, estimando-se em cerca de 10 mil o número de aromas
diferentes que o ser humano pode identificar. São identificáveis nos aromas do vinho, pelo
menos 181 ésteres, 52 álcoois, 75 aldeídos e cetonas, 22 acetatos, 18 lactonas, 6
acetamidas secundárias, 29 compostos nitrogenados, 18 compostos de enxofre, 2 éteres,
11 furanos, 18 epóxidos, assim como 30 compostos não classificados. Muitas dessas
substâncias são modificadas de diferentes formas pelo amadurecimento e
envelhecimento do vinho, podendo interagir entre si, com propriedades aditivas,
dissimuladoras ou sinérgicas. Degustadores experientes adoram identificar aromas no

29
vinho, tais como chocolate, fósforo queimado, chá, tabaco, cogumelo, especiarias, frutas
diversas e até cheiro de sela molhada, pêlo queimado, grama cortada, estábulo e outros.
É notória a dificuldade de se encontrar palavras adequadas para descrever as complexas
e efêmeras sensações olfativas que emanam de um copo de vinho.
Para aumentar esta dificuldade, deve-se ressaltar que o aroma de um vinho está em
constante evolução, mudando suas características com rapidez desde o momento em que
é colocado no copo. Numa degustação, deve-se freqüentemente reavaliar os aromas do
vinho, captando-se estas mudanças.
Na realidade, o vinho tem aromas diversos do de uva. A análise de seus componentes
voláteis revela as mesmas moléculas que criam aromas que nos são familiares. Eis
alguns exemplos: rosa, cereja, banana, pêssego, mel e baunilha. Até alguns aromas
pouco comuns, tais como alcatrão, bacon defumado ou meias molhadas, identificados por
degustadores experientes, têm sua origem em substâncias com afinidades químicas
básicas.

A Classificação dos Aromas

Numa tentativa de facilitar a análise olfativa dos vinhos, poderíamos dividir teoricamente
os aromas em primários - originários da própria uva, secundários - originados do processo
fermentativo e do amadurecimento em madeira (carvalho) e terciários - originados do
envelhecimento na garrafa e também conhecidos por “bouquet”.

Segundo Peynaud, podemos agrupar os aromas, como se segue:

a) Florais:Æ rosas, violetas, jasmins, acácias, etc.


b) Frutados Æ cassis, cerejas, ameixas, pêssegos, limões, laranjas, etc.
c) Especiarias Æ pimenta, cravo, canela, alcaçuz, noz-moscada, etc.
d) Animais Æ caça, carne, pêlo molhado, couro, etc.
e) Vegetais Æ palha, capim, feno, cana de açúcar, cogumelos, chá, fumo, etc.
f) Minerais Æ vulcânico, petróleo, pedra de isqueiro, etc.
g) Balsâmicos Æ resinoso, pinho, eucalipto, baunilha, etc.
h) Químicos Æ odores da fermentação, fermento de pão, enxofre, esmalte de unha,
mercaptana (aliáceo), cola de aeromodelo, removedor de esmalte, etc.
i) Empireumáticos Æ odores associados a calor e fogo, tais como o alcatrão,
tostado, caramelo, café torrado, etc.
j) Outros aromas Æ chocolate, mel, caixa de charutos, “sous-bois”, etc.

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Da mesma forma que a cor, os aromas do vinho oferecem pistas de seu caráter, origem e
história. De uma maneira muito genérica e simplista poderíamos dizer que:

o Nos vinhos jovens predominam traços de flores e frutas frescas ou


vegetais, que evoluem com o envelhecimento do vinho para os aromas de
frutas mais maduras, secas ou em geléia.
o Nos vinhos mais envelhecidos predominam aromas animais ou de
decomposição.
o Nos vinhos brancos predominam aromas de flores brancas e amarelas ou
de frutas brancas ou amarelas: maçã, pêra, abacaxi, melão, pêssego,
maracujá, lírio, jasmim branco, etc.
o Nos vinhos tintos percebemos aromas de flores ou frutas vermelhas: rosa,
violeta, morango, cereja, framboesa, amora, groselha.
o Os aromas típicos das diferentes variedades de uvas e porque não, até de
algumas regiões vinícolas, podem ser reconhecidos em determinados
vinhos.

Ainda com relação ao aromas, devemos observar dois aspectos bastante importantes na
análise do vinho: a Intensidade e a Persistência.

A intensidade nem sempre é sinônimo de qualidade: muitas vezes um aroma muito


intenso pode ser comum, unidimensional, com pouca complexidade e fineza. Aromas
mais delicados podem ser mais complexos, finos e agradáveis. Portanto, o julgamento da
intensidade deve ter um peso relativo ao se analisar um determinado vinho. Lembre-se
também que a intensidade dos aromas está intimamente relacionada com a temperatura
de serviço do vinho, fato este que torna imprescindível a anotação deste dado na ficha de
degustação.
A persistência dos aromas tem também uma importância relativa, dando indícios da
qualidade do vinho. Também aqui deve-se levar em consideração a complexidade e a
fineza dos aromas que persistem no copo.
Devido ao fato que o sentido do gosto é limitado a apenas quatro sabores simples - doce,
salgado, ácido e amargo, o olfato adquire ainda maior relevância no exame sensorial de
um vinho.
Portanto, não deixe de se divertir com as maravilhosas sensações que este sentido lhe
proporciona. Dizem os cientistas que o aroma tem acesso direto ao cérebro, conectando-
se imediatamente à memória e à emoção. Assim como o perfume do ser amado ou o

31
delicado aroma dos bolos e dos biscoitos da infância, os aromas do vinho podem evocar
lugares e épocas específicas, com grande intensidade.

ASPECTOS GUSTATIVOS

A última parte da avaliação sensorial do vinho diz respeito aos aspectos gustativos. É
importante ressaltar que a expressão gosto abrange na verdade um conjunto de
sensações: as gustativas propriamente ditas, as cutâneas e as olfativas retro nasais.
O sentido do gosto revela, como já foi dito, quatro sabores: doce, salgado, ácido e
amargo.
A sensibilidade cutânea nos dá sensações táteis (adstringência, aspereza e maciez ou
untuosidade), térmicas e doloríficas, que poderíamos definir como complementares.
O olfato por sua vez fornece o aroma (sensações odoríficas retro nasais), que é o
componente mais importante do gosto, pois é o que mais influencia a avaliação do caráter
e da qualidade do vinho.
Todas estas sensações são percebidas quase ao mesmo tempo, e por isso muitas vezes
é difícil analisá-las, separá-las e atribuí-las com certeza a uma determinada modalidade
sensorial.
Mais uma vez a técnica correta é essencial para uma completa avaliação. Com os aromas
ainda reverberando em seus sentidos, leve o copo à boca e coloque uma quantidade
suficiente, ou seja, o bastante para que o vinho possa percorrer toda a sua boca.
Mantenha o vinho dentro da boca por cerca de dez a quinze segundos, fazendo-o manter
contato com as diferentes partes da língua que identificam as sensações gustativas.
Estas sensações se referem aos sabores doce, salgado, ácido e amargo.

Os Sabores do Vinho

Doce: No vinho, o sabor doce é provocado não só pelos açúcares residuais (frutose e
glicose), mas também pelo álcool e pela glicerina (glicerol). Estas substâncias são
percebidas na ponta da língua e são reconhecidas não apenas por sua doçura, mas
também porque provocam sobre as mucosas da boca uma sensação tátil de maciez,
pastosidade e untuosidade.

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Salgado: É um sabor raramente encontrado nos vinhos. É descrito, às vezes em vinhos
de apelações muito próximas ao oceano, sendo o Jerez na Espanha o exemplo mais
citado.

Ácido: Proveniente no caso dos vinhos, dos ácidos próprios da uva (tartárico, cítrico e
málico) ou dos ácidos provenientes da fermentação alcoólica (succínico, láctico e
acético). Estas substâncias são percebidas nas bordas laterais da língua e reconhecidas
pela salivação fluida e abundante que provocam, por irritação das mucosas.

Amargo: Os taninos podem provocar um amargor muito discreto e até agradável (se os
mesmos forem finos e maduros), que é sentido no fundo da língua. Isto é normal e ocorre
praticamente com quase todos os vinhos tintos. O amargor intenso e desagradável é,
sempre que presente, um defeito ou uma doença do vinho.

A amplitude destas sensações gustativas pode ser aumentada através de técnicas


especiais, que são mais apropriadas para as salas de degustação do que para ocasiões
sociais. Inicialmente segure o vinho na boca e, com os lábios entreabertos, inale uma
pequena quantidade de ar. Isto criará um turbilhonamento, que acelerará a vaporização
do vinho, intensificando os aromas. A seguir, mastigue o vinho vigorosamente para retirar
do mesmo cada sutil matiz de sabor.

O Álcool e o Corpo do Vinho

Nesta fase, deve-se proceder a avaliação do chamado “corpo” do vinho, que é a


sensação de “peso” que o vinho aparenta ter na boca. Pode ser definido ainda como o
quão diferente da água o vinho em questão aparenta ser. O “corpo” do vinho está
diretamente relacionado com o seu teor alcoólico - a quantidade de etanol do vinho e com
o seu extrato - a quantidade de material sólido diluído no vinho. O álcool também poderá
excitar os receptores térmicos da língua, provocando uma falsa sensação de calor
(pseudo térmica), freqüentemente acompanhada de uma ligeira ardência na mucosa
bucal.

O Aroma de Boca e a Persistência Aromática Intensa

Após a deglutição do vinho, expire lentamente através da boca e do nariz. Isto fará com
que os aromas atinjam o bulbo olfativo pela via retro nasal, que conecta a garganta e o

33
nariz, constituindo-se numa rota alternativa para os aromas, prolongando seus efeitos por
muito tempo após o vinho ter sido ingerido. É o que se costuma chamar de retro olfato.
Você descobrirá que quanto melhor for o vinho, seus aromas residuais serão mais
complexos, profundos e duradouros. O tempo de percepção destes aromas é chamado de
persistência aromática intensa, que nos grandes vinhos pode ultrapassar a marca de um
minuto. Este é um momento sublime, de reflexão e comunhão, que só o vinho é capaz de
proporcionar. Ao final da avaliação gustativa, deveremos ainda correlacionar todas as
sensações percebidas, expressando um conceito de difícil definição, que é o de equilíbrio
e harmonia do vinho.

O Equilíbrio do Vinho

O equilíbrio gustativo é o resultado da complexa interação entre as substâncias que


formam a estrutura do vinho, isto é, álcool, taninos, açúcares, extrato e ácidos. No caso
dos vinhos brancos devemos analisar a relação entre os açucares (se for o caso) e o
álcool, que conferem maciez ao vinho, em contraposição à acidez presente no mesmo.
No caso dos vinhos tintos, os elementos a serem apreciados são a acidez, os taninos e o
corpo do vinho (álcool + extrato).
Quanto mais correta e equânime for a relação entre os elementos, melhor será o
equilíbrio e a harmonia do vinho analisado. Para finalizar, lembre-se de que a degustação

de vinhos deve ser uma atividade extremamente agradável. constituindo-se numa


inigualável atividade intelectual, que deve ser praticada com grande paixão. Segue-se o
“Decálogo do Bom Degustador”, criado por Mario Telles Jr., da Associação Brasileira de
Sommeliers - São Paulo.

1. Deguste sempre nas melhores condições ambientais possíveis.


2. Sempre que possível, deguste às cegas.
3. Sempre que possível, deguste em grupo.
4. Não se deixe levar pelas emoções.
5. Cheque suas impressões com os outros membros do grupo.
6. Jamais pontue um vinho abaixo dos 50 pontos.
7. Nenhum vinho é totalmente horrível ou perfeito: diante de um vinho “perfeito”,
tente descobrir seu ponto fraco e diante de um vinho “ruim”, tente descobrir sua
melhor qualidade.
8. Evite odores externos que possam confundi-lo: não use perfume para degustar e
não fume antes ou durante uma degustação.
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9. Confie nos seus sentidos, não se deixando intimidar com termos complicados ou
demonstrações “mágicas” : degustar é um exercício de lógica e não um ato de
adivinhação.
10. Não seja chato: deguste na hora de degustar e beba socialmente quando indicado.
Não contribua para a injusta imagem de esnobismo que a degustação de vinhos
tem junto ao público leigo.

35
TÉCNICAS DE VINIFICAÇÃO
Arte e Ciência Na Produção De Vinhos

Vinificação é o nome que se dá ao conjunto de operações e processos envolvidos na


transformação das uvas em vinho. O vinho resultante deste processo é influenciado tanto
pela variedade da uva utilizada, quanto pelo tipo de solo, pelo clima e pelas técnicas de
vinificação empregadas pelo enólogo. Na produção de um grande vinho são fundamentais
não apenas os conhecimentos de física e química, mas também algo especial, uma boa
dose de arte e talento por parte do enólogo. A partir de uvas de boa qualidade, um
enólogo talentoso certamente produzirá um bom vinho. Já um enólogo pouco competente,
terá dificuldade para chegar a um mesmo resultado, apesar de contar com matéria prima
adequada. O enólogo pode produzir vinhos que reflitam seus métodos pessoais de
vinificação ou vinhos que respeitem as características intrínsecas da uva. As técnicas de
vinificação influenciam diretamente não só a qualidade final do vinho, como também suas
características e seu estilo. O processo básico e comum a todos os tipos de vinificação é
a fermentação alcoólica.

FERMENTAÇÃO ALCOÓLICA - FUNDAMENTOS

Por definição, fermentação é um processo biológico que inclui todos os processos nos
quais substâncias orgânicas sofrem alterações químicas, produzidas pela ação de
microorganismos, particularmente os fermentos e bactérias.
Na produção de vinhos, o processo se chama fermentação alcoólica, sendo que a
substância orgânica que serve de substrato ao processo é o açúcar da uva, a glicose, que
pela ação de fermentos, especialmente do gênero Saccharomyces, se transforma em
álcool etílico (etanol) e gás carbônico, numa reação química que produz calor. É
importante ressaltar que esta transformação particular só se dará num ambiente pobre em
oxigênio. Caso isto não ocorra, não se dará a formação de etanol e toda a glicose será
convertida em água e gás carbônico. Para cada molécula de glicose fermentada, duas
moléculas de etanol e gás carbônico são produzidas.

Com relação à fermentação alcoólica na produção de vinhos, ressaltamos os seguintes


aspectos:

36
o Como é a glicose o substrato da reação química, frutas como as uvas,
naturalmente ricas em glicose, serão facilmente fermentadas.
o Como o processo produz gás carbônico e calor, ambos terão que ser
cuidadosamente manuseados na produção de vinhos. Os tanques de fermentação
são equipados com válvulas especiais para escape de gás carbônico, que ao
mesmo tempo impedem a entrada de oxigênio nos mesmos. O calor é um grande
problema na produção de vinhos brancos, pois os delicados compostos químicos
que lhes conferem aromas e sabores são facilmente destruídos em altas
temperaturas. Assim, os tanques de fermentação são dotados de sistemas de
resfriamento, que mantém a temperatura estável durante todo o processo de
fermentação.
o Como os microorganismos que transformam a glicose em álcool são leveduras e
nem todas as leveduras são iguais, as cepas que irão produzir a transformação
devem ser cuidadosamente selecionadas. As espécies selvagens que
freqüentemente se encontram nas cascas das uvas devem ser evitadas, pois são
pouco resistentes ao álcool, paralisando a fermentação ao redor de 6% a 9% de
teor alcoólico, além de produzir aromas muito desagradáveis. Por esta razão, os
produtores de vinhos adicionam o dióxido de enxofre (SO2) durante o
esmagamento das uvas, visando impedir o crescimento destas cepas selvagens e
preparando o mosto para a inoculação de leveduras selecionadas, geralmente das
espécies Saccharomyces cerevisae, bayanus e elipsoideus.
o Como a fermentação alcoólica requer um ambiente muito pobre em oxigênio,
deve-se evitar que o ar entre no tanque de fermentação. Este é um fator crítico na
produção de vinhos brancos, levando a vinhos com baixos teores de álcool, com
grave ameaça à estabilidade dos mesmos. No caso dos vinhos tintos, uma
pequena quantidade de oxigênio não causará problemas, sendo até desejável no
processo de fermentação.

VINIFICAÇÃO DE BRANCOS

O vinho branco é elaborado diretamente de uvas brancas ou do suco incolor de uvas


tintas (o pigmento está nas cascas). No entanto, os grandes vinhos brancos são
produzidos exclusivamente de uvas brancas. As principais etapas do processo são:

Remoção do Suco das Uvas

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Esmagando as Uvas / Produzindo o Mosto

Apesar de alguns vinhos brancos, especialmente os vinhos que servem de base para a
produção de espumantes, serem feitos sem romper a casca das uvas, este processo
praticamente inicia a vinificação. De maneira ideal, o esmagamento deve apenas romper
a casca das uvas, permitindo o livre fluxo do suco, sem qualquer dano às sementes,
engaços e cascas. Estas partes da uva não devem participar do processo de fermentação
pois apresentam grande concentração de taninos, transmitindo adstringência e amargor
ao vinho. O esmagamento das uvas normalmente é feito numa máquina chamada
desengaçadeira-esmagadeira, que também retira o engaço (hastes e cabos dos grãos).
Este equipamento normalmente está localizado do lado de fora da vinícola, e dá origem
ao chamado mosto, que é a mistura de suco, sementes, engaços e cascas, produtos do
esmagamento dos bagos de uva. O termo mosto também pode se referir ao suco
produzido após a prensagem, portanto, de uma maneira mais ampla podemos definir
mosto como sendo o material fermentável produzido por esmagamento ou prensagem da
uva.

Resfriando o Mosto / Separando o Mosto-Flor

Se nesta fase da vinificação o mosto não estiver ainda resfriado, podemos fazê-lo através
de equipamentos adequados. Parte do suco das uvas, durante o processo de
esmagamento, flui livremente pelo próprio peso das uvas, sendo separado para posterior
fermentação. Este mosto, rico em aromas e sabores, é denominado “mosto-flor”, sendo
geralmente utilizado para a produção de vinhos mais nobres.
O restante do mosto é então encaminhado para as prensas, onde terá continuidade o
processo de extração do suco das uvas.

Adicionando Dióxido de Enxofre

O dióxido de enxofre (SO2) é freqüentemente adicionado às frutas inteiras durante o


processo de esmagamento e posteriormente ao mosto e ao vinho. O objetivo é proteger
as uvas do ataque de bactérias e impedir a oxidação do suco e do vinho, o que poderia
levar à formação de pigmentos escuros e deterioração dos aromas e sabores. Além disso,
o dióxido de enxofre inibe a fermentação produzida por leveduras selvagens. Os enólogos
procuram manter os níveis de SO2 bem baixos - 35 a 125 partes por milhão. No entanto,
como o SO2 é gradualmente consumido durante a vinificação, há necessidade de um
cuidadoso monitoramento, com adições periódicas no decorrer do processo. O uso de
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dióxido de enxofre deve ser feito de maneira cuidadosa, pois pode transmitir odores
indesejáveis ao vinho (fósforo queimado), além de desencadear reações alérgicas em
indivíduos susceptíveis.

Deixando o Mosto em Contato com as Cascas - Maceração Pelicular

Ao produzir um vinho varietal de grande qualidade, alguns enólogos costumam deixar o


mosto em contato com as cascas por algumas horas. Se este processo for conduzido
adequadamente, ou seja, sempre em baixas temperaturas e por curtos períodos de
tempo, haverá grande concentração de aromas e sabores varietais, sem o concomitante
aumento de taninos. Este processo é utilizado na produção de vinhos das uvas
Chardonnay, Riesling, Sauvignon Blanc e Viognier.

Prensando o Mosto

Após o contato com as cascas ou diretamente após o esmagamento e a separação do


mosto-flor, o restante do mosto é enviado para a prensagem. Nas modernas vinícolas, as
prensas utilizadas são pneumáticas, onde um balão de borracha é inflado, exercendo
pressões que podem ser controladas pelos enólogos.
Como já foi dito, o mosto-flor é obtido sem prensagem mecânica, sendo mais rico em
açúcar e menos ácido e com menos taninos que o mosto obtido por prensagens mais
fortes. As prensagens são realizadas em escala crescente, sendo o produto das
prensagens diferente em seu conteúdo de açúcar, álcool e taninos. Quanto mais intensa
for a prensagem, menor o teor de açúcar e maior o teor de álcool e taninos. A juízo do
enólogo estes diferentes mostos de prensa poderão ou não ser adicionados ao mosto-flor
antes da fermentação, ou então ser fermentados separadamente para a utilização futura

em cortes, ou mesmo para venda. Em algumas ocasiões este mosto de prensa é


fermentado e a seguir destilado, dando origem aos aguardentes vínicos (grappa). Depois
de extraído todo o suco, a prensa é esvaziada e o bagaço será usado como fertilizante.

Fermentação do Mosto

Corrigindo e Clarificando o Mosto

39
Entre a prensagem e o início da fermentação, o mosto é preparado para o processo,
sendo resfriado e clarificado (por decantação, filtração ou centrifugação), visando a
remoção de pedaços de cascas, gravetos ou partículas de terra provenientes do parreiral
e de outros sólidos em suspensão. Se for necessário e a legislação local permitir, podem
ser feitas correções no mosto, com adição de açúcar ou concentrado de uvas, visando
aumentar o teor final de álcool ou ainda adicionar ácido tartárico para aumentar a acidez.

Fermentando o Mosto - Curvas de Fermentação - Fermentação Interrompida

Uma vez terminado o processo de prensagem, o mosto é submetido ao processo de


fermentação alcoólica, conforme descrito anteriormente. Como já vimos, este processo
transforma a glicose, pela ação de leveduras selecionadas, em álcool etílico, gás
carbônico e água, produzindo calor. Como a glicose é mais pesada que o etanol, é
possível acompanhar o progresso da fermentação medindo a queda da densidade do
mosto. Este processo de acompanhamento se faz através das curvas de fermentação,
que dão uma idéia bastante precisa do consumo de glicose e da produção de etanol,
permitindo ao enólogo detectar precocemente qualquer anormalidade no processo
fermentativo.
O problema mais temido pelos enólogos é uma parada na fermentação, quando, por uma
série de razões, a fermentação é interrompida antes que toda a glicose tenha sido
consumida. Entre as principais causas deste problema estão a desativação das leveduras
por inibidores naturais, altas temperaturas no processo de fermentação ou ainda a falta
de nutrientes necessários para a multiplicação das leveduras.

Fermentação em Aço Inoxidável - Fermentação em Barricas de Carvalho

O processo de fermentação dos vinhos brancos pode ser realizado tanto em tanques de
aço inoxidável, com temperatura controlada, como em barricas de carvalho. Na imensa
maioria das vezes se utilizam os tanques de aço, visando preservar o caráter varietal das
uvas brancas. No entanto, alguns grandes vinhos, especialmente feitos com a uva
Chardonnay, são fermentados diretamente nas barricas de carvalho.
A fermentação em barrica funciona como uma preparação para o amadurecimento em
madeira, produzindo vinhos muito complexos e com perfeita integração entre o vinho e a
madeira. Durante o período em que o vinho permanece na madeira, extrai da mesma
pigmentos corantes, aromas e sabores. Se a fermentação for feita na barrica, as
leveduras também irão agir sobre estes componentes, produzindo alterações químicas
que se traduzirão por um vinho de cor mais clara, com menos aromas e sabores próprios
40
da madeira e com maior complexidade. Isto advém do fato de que o vinho, após a
fermentação, ficará em contato com as leveduras mortas no processo - sim, as leveduras
morrem durante o processo de fermentação, devido ao álcool produzido - extraindo
destas compostos nitrogenados e açúcares complexos, que darão origem a novos aromas
e sabores durante o período de amadurecimento na madeira e no envelhecimento na
garrafa. Este processo de fermentação é denominado “sur lie”, ou literalmente, sobre os
sedimentos, sendo referido no rótulo dos vinhos como “Barrel Fermented”.

Temperatura de Fermentação

No caso dos vinhos brancos a temperatura de fermentação é um fator crucial para o


sucesso, ou o fracasso, da vinificação. Como regra geral, quanto mais baixa a
temperatura, maior a qualidade do vinho. A temperatura média habitual na fermentação
de vinhos brancos é de 18oC, visando mais uma vez preservar os delicados aromas e
sabores das varietais brancas. Nesta temperatura, a fermentação normalmente se
completa em duas a seis semanas.

Produzindo Vinhos Brancos Secos e Doces


A fermentação alcoólica estará terminada quando a quantidade apropriada de açúcar tiver
sido consumida, de acordo com o estilo do vinho que se pretenda produzir. Para os
vinhos secos, deixa-se a fermentação se processar completamente, até que todas as
moléculas de açúcar tenham se convertido em álcool. No entanto, mesmo estes vinhos
sem qualquer resquício de glicose terão cerca de 0,2% a 0,3% de açúcar residual,
detectado por análises químicas, representando uma pequena fração de açúcares
complexos das uvas, que as leveduras não conseguem fermentar.
Em certos casos, permite-se que o vinho mantenha teores de açúcar residual, de acordo
com o desejo do enólogo. Para isto, a fermentação pode ser interrompida antes que toda
a glicose tenha se convertido em álcool, diminuindo-se a temperatura para cerca de
-4oC, centrifugando-se ou filtrando-se o vinho a seguir, para a retirada das leveduras
inativadas pelo frio. Desta forma, vinhos com 2% a 3% de açúcar residual podem ser
obtidos. Outra maneira de se obter vinhos com açúcar residual são a adição da chamada
“reserva doce”, que nada mais é que o suco da uva, às vezes até do mesmo mosto
original, que foi conservado com SO2, resfriado e guardado ou de suco de uva
concentrado, técnica que não é recomendável para a produção de vinhos de qualidade
superior.

Trasfega - Quando Realizar


41
Quando a fermentação alcoólica termina, as células das leveduras se depositam no fundo
dos tanques, formando um sedimento. Os diferentes tipos de sedimentos que se formam
durante estágios diferentes do processo de vinificação são nomeados de acordo com seu
conteúdo, tais como sedimento de fermentos, sedimentos de gelatina, etc. De maneira
geral, o vinho recém produzido é prontamente transferido para um tanque limpo, para
iniciar o processo de clarificação e estabilização. A este processo de transferência de
tanque para tanque dá-se o nome de trasfega. Em alguns casos, especialmente para a
uva Chardonnay, o enólogo pode permitir que o vinho permaneça em contato com as
leveduras por algum tempo, variável de semanas a meses. Este processo se chama de
amadurecimento “sur lie”, e exige um cuidadoso monitoramento para se evitar a formação
de aromas e sabores indesejáveis.

Fermentação Maloláctica - Fundamentos

A fermentação maloláctica é um processo pelo qual o ácido málico presente no mosto é


convertido em ácido láctico e gás carbônico, pela ação de bactérias, num ambiente livre
de oxigênio. Como o ácido láctico (que também é encontrado no leite) é menos potente
que o ácido málico substituído, há uma redução da acidez do mosto e do vinho produzido.

A redução do teor de acidez depende do quanto da acidez do mosto é devida ao ácido


málico, cuja concentração depende do tipo de uva usada e da safra, já que o ácido málico
é consumido pela respiração da planta durante o período de amadurecimento das uvas.
Além de reduzir a acidez, a fermentação maloláctica produz outras alterações
organolépticas, dentre as quais destacamos a produção de gás e a diminuição do caráter
frutado do vinho, com a produção de aromas transitórios de queijo. Porém, há aspectos
bastante positivos, como permitir ao vinho desenvolver maior complexidade com a idade,
incluindo aromas e sabores amanteigados. Isto se dá porque dentre os sub-produtos da
fermentação maloláctica, estão novas moléculas de aromas e sabores, que entram nas
complexas reações de oxi-redução do amadurecimento em madeira e no envelhecimento
na garrafa. Como a oferta de compostos para estas reações aumenta nos vinhos que
sofreram a fermentação maloláctica, o “bouquet” destes vinhos será mais complexo.
A fermentação maloláctica, na vinificação de brancos, é muito utilizada em vinhos
produzidos com a Chardonnay e em casos onde há acidez excessiva em sucos de uvas
provenientes de regiões frias ou de safras onde houve muita exposição ao frio.
Um dos fatores mais críticos com relação à fermentação maloláctica é o controle do
momento correto para se iniciar esta fermentação e ter-se absoluta certeza de que a
42
mesma está totalmente concluída antes do engarrafamento, já que as bactérias que dão
origem ao processo podem se desenvolver em ambiente livre de oxigênio, tolerando
também os níveis de álcool etílico encontrados na maioria dos vinhos. Desta forma, o
processo pode continuar após o engarrafamento, estragando completamente o vinho.
Para se ter certeza que não ocorrerá a maloláctica na garrafa, deve-se ter certeza que
todo o ácido málico foi consumido e quando for se utilizar o vinho em cortes, promover a
remoção de todas as bactérias e proceder ao engarrafamento do vinho em condições
assépticas.
Deve-se ressaltar que a imensa maioria dos vinhos brancos produzidos no mundo são
produzidos com ênfase na fruta e como já dissemos, a fermentação maloláctica reduz o
caráter frutado do vinho. Assim, a maioria dos enólogos toma todos os cuidados
necessários para prevenir a ocorrência da maloláctica, através de ajustes nos níveis de
ácidos antes e após a fermentação, fazendo a trasfega o mais precocemente possível,
usando a filtração, mantendo níveis adequados de SO2 e resfriando adequadamente o
mosto e o vinho.

Clarificação e Estabilização do Vinho

Uma vez completada a fermentação, o vinho branco recém produzido começa sua
transformação, passando de um líquido turvo, cheirando a fermento, instável e talvez até
ligeiramente amargo, para o aspecto familiar que conhecemos, ou seja, claro, límpido e
brilhante. Os processos de clarificação e estabilização podem ser realizados enquanto o
vinho passa pelo amadurecimento em tanques e tonéis, porém é freqüentemente
terminado antes disso se o vinho for amadurecer em pequenas barricas de carvalho.
Durante estes estágios, os níveis de SO2 são mantidos em patamares baixos, para
proteger o vinho durante as operações normais na vinícola.

Clarificação

As vinícolas costumam utilizar vários processos para a remoção de partículas em


suspensão ou componentes do vinho que podem causar turvação, entre eles a trasfega, a
centrifugação, a filtração e o uso de substâncias inertes. Estes processos são
freqüentemente combinados entre si, visando minimizar a manipulação do vinho e reduzir
o risco de exposição excessiva ao oxigênio, que sempre deve ser considerada quando um
vinho é transferido de recipiente.

43
1. TrasfegaÆ A trasfega consiste em aguardar que as partículas em suspensão se
sedimentem naturalmente, pela força da gravidade, transferindo-se o vinho então
para um novo recipiente.

2. Centrifugação: A centrifugação usa o mesmo princípio que a trasfega, porém com


forças de maior magnitude e por esta razão a sedimentação se faz num período
de tempo mais curto. Na vinificação dos brancos estes dois métodos podem ser
utilizados para a clarificação do mosto, antes da fermentação.

3. Filtração: Na filtração o vinho é forçado através de um elemento filtrante, que


seqüestra e remove as partículas. Uma enorme variedade de filtros é utilizada nas
vinícolas, visando a remoção de partículas de diferentes tamanhos, conforme o
desejo do produtor. Estes filtros podem remover desde partículas macroscópicas,
tais como gravetos e pedaços de casca, até as microscópicas, como as bactérias
que causam a fermentação maloláctica, num processo chamado de filtração
estéril. No processo de filtração são utilizadas bombas de pressão para forçar a
passagem do vinho através dos filtros. O processo de filtração deve ser feito
cuidadosamente para não remover elementos importantes do vinho, diminuindo
sua qualidade. Nos dias de hoje, muitos vinhos de qualidade superior são
engarrafados sem qualquer processo de filtração.

4. Uso de Substâncias Clarificantes: Neste caso, substâncias orgânicas ou


minerais são adicionadas ao vinho, interagindo com elementos específicos do
mesmo e formando partículas que se depositam no fundo dos tanques, sendo
posteriormente removidas por trasfega, centrifugação ou filtração. Este processo
pode ser utilizado tanto para clarificar como para alterar algumas características
organolépticas específicas do vinho. Entre estas substâncias encontramos por
exemplo a gelatina e a clara se ovo - que reagem com os taninos, reduzindo a
adstringência do vinho - a bentonita - que reage com proteínas causadoras da
turvação do vinho quando este é exposto ao calor - e várias outras. Este é o
processo mais utilizado na produção de vinhos de qualidade, pois preserva ao
máximo as moléculas que dão aromas e sabores aos vinhos.

Estabilização

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Este conjunto de processos visa proceder às estabilizações ao calor, ao frio e
microbiológica do vinho e uma vez concluído, deve dar origem a um vinho que deve se
manter claro e inalterável em seus aspectos de aromas e sabores, de acordo com
parâmetros definidos pelo produtor, em função das condições esperadas de transporte e
armazenamento. A estabilização do vinho visa também evitar que o vinho se estrague,
devido a fermentações indesejáveis, especialmente após o engarrafamento.

Estabilização ao Calor: A estabilização ao calor visa evitar que um vinho que seja
exposto a temperaturas elevadas não se torne turvo. Esta preocupação atinge
principalmente as vinícolas cujos vinhos vão viajar por longas distâncias, em caminhões,
trens ou navios, nem sempre dotados de refrigeração. O principal produto utilizado para a
estabilização ao calor é a bentonita, um tipo de argila que remove as proteínas do vinho
que podem causar turvação quando este é aquecido ou exposto à luz.

1. Estabilização ao Frio: A estabilização ao frio visa evitar a formação de cristais,


quando o vinho é exposto a temperaturas ao redor de 0o C. Estes cristais são
geralmente constituídos por bitartarato de potássio, podendo ser ocasionalmente
vistos nas laterais das garrafas ou nas rolhas dos vinhos, sendo freqüentemente
claros e simétricos. Para se conseguir a precipitação destes cristais e sua
posterior retirada, os vinhos são resfriados a cerca de - 4o C por duas a quatro
semanas, sendo então filtrados.

2. Estabilização Microbiológica: A estabilização microbiológica visa evitar que


ocorram quaisquer outras fermentações adicionais ou crescimento bacteriano que
provoquem a turvação do vinho (causada pelas leveduras que estão no processo
de fermentação) ou a adição de gás carbônico, ou ainda que causem o
aparecimento de odores e sabores indesejáveis. Diz-se que uma fermentação é
indesejável quando esta produz alterações que estraguem o vinho, quando ocorra
no vinho errado (por exemplo, a fermentação maloláctica num vinho de baixa
acidez), ou ainda quando ocorrer no momento errado (após o engarrafamento, por
exemplo).
Partindo-se do princípio que a fermentação exige a presença de microorganismos,
seus nutrientes e condições ambientais específicas, as fermentações indesejáveis
podem ser evitadas pela ausência de um ou mais destes elementos. A
fermentação alcoólica, que requer açúcar, fermento e ausência de oxigênio é
indesejável após o engarrafamento, e a estratégia mais simples para evitá-la é
fazer o vinho seco, consumindo todo o açúcar disponível. Se no entanto
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desejarmos uma certa dose de açúcar residual, devemos retirar todos os
microorganismos que poderiam fermentar este açúcar, fazendo a filtração estéril
do vinho e prevenindo o crescimento de novas bactérias durante os processos de
amadurecimento e engarrafamento. Outra estratégia possível seria deixar os
microorganismos no vinho e prevenir seu crescimento através da fortificação com
álcool ou da adição de conservantes. Em casos de vinhos muito doces,
geralmente produzidos com uvas afetadas pela Botrytis, os açúcares têm
concentração tão elevadas que inibem o crescimento de bactérias, tal como ocorre
nas geléias.
Existem outros três tipos de fermentação indesejável que podem estragar o vinho:
a causada pelas bactérias do vinagre, a maloláctica após o engarrafamento e a
causada pelo Brettanomyces, uma levedura que produz ácido acético e ácido
butírico, dando origem a aromas de “pau de galinheiro”, suor de cavalo, amônia,
urina de rato e feijão queimado.
O Brettanomyces pode ser evitado desde que se adotem medidas higiênicas
rigorosas em todos os equipamentos da vinícola, assim como nos tonéis e
barricas.

Amadurecimento do Vinho - Tanques de Aço - Barricas de Carvalho

O amadurecimento do vinho pode ser feito em tanques de aço ou em barricas de


carvalho, simultaneamente aos processos de clarificação e estabilização. Durante este
estágio, os aromas dos vinhos brancos aumentam em complexidade e sua cor pode se
tornar ligeiramente mais escura, tanto pela interação de seus componentes como por
contato com o oxigênio durante seu manuseio na vinícola. O amadurecimento também
pode incluir a adição de aromas e sabores de carvalho, através do contato com barricas
desta madeira. É nesta fase que se completa a fermentação maloláctica, aumentando a
gama de componentes do vinho, favorecendo o desenvolvimento de maior complexidade
durante o envelhecimento na garrafa. Em geral os vinhos passam pelos processos de
trasfega, clarificação e filtração quando ainda estão nos tanques de aço inoxidável, antes
de serem transferidos para as barricas de carvalho, se for o caso. A exceção fica por
conta dos vinhos fermentados em barris, onde então são realizados todos os
procedimentos.
A imensa maioria dos vinhos brancos é produzida de forma a valorizar sua juventude e
seu caráter frutado, preservando seus aromas e sabores varietais, sem a adição de
qualquer novo componente. Assim, estes vinhos são amadurecidos por curtos períodos

46
de tempo, em grandes tanques de aço inoxidável (e raramente em grandes tonéis de
madeira).
No entanto, existe uma minoria de vinhos brancos, geralmente produzidos com as uvas
Chardonnay e ocasionalmente com a Sauvignon Blanc e a Chenin Blanc, que são
amadurecidos em pequenas barricas de carvalho, com conseqüências dramáticas para o
produto final. Mais adiante veremos como se dá a influência da madeira nos vinhos nela
fermentados e/ou amadurecidos.

Cortes, Varietais e Término da Vinificação

Os cortes, ou misturas, de diferentes vinhos, podem ser realizados com a finalidade de


aumentar a complexidade, balancear componentes organolépticos ou corrigir defeitos do
vinho final.
Estes cortes podem ser feitos em diferentes estágios da vinificação, desde o parreiral,
onde diferentes castas de uvas podem ser plantadas, colhidas e até esmagadas em
conjunto. Pode-se ainda, após esmagar e prensar separadamente as uvas, misturar
diferentes mostos, que serão fermentados em conjunto. Nos vinhos de melhor qualidade
os cortes são feitos com os vinhos praticamente prontos, imediatamente antes do
engarrafamento. Os cortes podem ser feitos com vinhos de diferentes varietais; da
mesma varietal, porém de diferentes safras ou de vinhedos diferentes, ou ainda de
diferentes parcelas da mesma safra, manuseadas de forma diversa.
Assim, o enólogo poderá adotar técnicas de vinificação diferentes para um mesmo lote de
uvas, misturando os produtos finais antes do engarrafamento. Desta forma, parte do vinho
poderá sofrer fermentação maloláctica, parte ser fermentada em barricas e parte ser
amadurecida em carvalho, obtendo-se vinhos com diferentes características
organolépticas, que farão parte do vinho final em proporções variáveis, de acordo com o
estilo de vinho desejado.
Além dessas diferenças causadas voluntariamente, problemas tais como o
desenvolvimento de acidez volátil, de odores indesejáveis ou amargor poderão ser
corrigidos com a mistura de diferentes lotes de vinho. Este procedimento deve ser
conduzido com cautela para não se arruinar totalmente o vinho.
Os estágios finais da vinificação incluem uma clarificação e filtração, antes do
engarrafamento. Quando se utiliza a filtração estéril, deve-se engarrafar o vinho em
condições assépticas, evitando a contaminação por bactérias.

Engarrafamento do Vinho

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O engarrafamento é a última etapa da produção de um vinho e também marca a última
oportunidade para o enólogo controlar o que ocorre com o mesmo. Desta forma, todos os
vinhos devem ser cuidadosamente checados com relação à sua estabilidade antes do
engarrafamento, procedendo-se ao necessário ajuste dos níveis de SO2, para proteger o
vinho através desta derradeira manipulação na vinícola. Na maioria das vinícolas o
engarrafamento é totalmente mecanizado, consistindo num processo rápido e eficiente

Envelhecimento na Garrafa

Os vinhos engarrafados costumam ser estocados nas vinícolas até estarem prontos para
ser comercializados. O envelhecimento na garrafa, no caso dos vinhos brancos, pode
durar desde alguns dias até alguns meses, sendo que existem alguns brancos que podem
envelhecer por muitos anos.
De maneira geral, todos os vinhos se beneficiam com este período de envelhecimento
após serem engarrafados, às vezes porque alguns aromas indesejáveis se produzem
durante o engarrafamento e os vinhos precisam de um certo tempo para se recuperar
desta chamada “doença da garrafa”.

Os vinhos que provavelmente irão melhorar por um período de um a cinco anos na


garrafa são os produzidos com as uvas Chardonnay, Sauvignon Blanc, Gewürztraminer,
Pinot Blanc e Riesling. Note que os vinhos brancos procedentes de regiões mais frias
costumam ser mais longevos que os vinhos procedentes de regiões mais quentes.
Os vinhos brancos doces costumam ser muito longevos, alguns chegando a envelhecer
muito bem por mais de um século!

Avaliação Sensorial e Análise Laboratorial

Todo o processo de produção de vinhos brancos deve ser cuidadosamente e


continuamente avaliado por extensivos controles laboratoriais, além de avaliações
sensoriais de suas características organolépticas, realizadas por técnicos e enólogos
experientes. Como exemplo, pode-se citar o ajuste do nível de dióxido de enxofre em
todas as fases do processo, que num vinho branco médio é feito cerca de quatro
vezes, ou ainda a detecção precoce do crescimento das bactérias do vinagre, através da
dosagem de acetato de etila, prevenindo a deterioração do vinho.

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Os testes laboratoriais também são utilizados para determinar a eficácia dos métodos de
clarificação e estabilização do vinho, evitando excessos que seriam altamente prejudiciais
para a qualidade final do mesmo.
A avaliação sensorial é de fundamental importância para qualquer vinícola e quase
sempre envolve um painel de degustadores, que testam o vinho em degustações técnicas
ou às cegas, freqüentemente comparando o vinho com produtos semelhantes de outra
empresas.

VINIFICAÇÃO DE TINTOS

A vinificação dos tintos, em linhas gerais, possui as mesmas etapas da vinificação dos
brancos, porém existem algumas diferenças fundamentais, que serão explicitadas a
seguir. Os vinhos tintos possuem aromas e sabores mais intensos que os brancos, e
estes são extraídos, juntamente com a cor e os taninos, das cascas das uvas durante a
fermentação. O manuseio desta extração determina em grande parte o estilo do vinho e é
a parte mais importante da produção de vinhos tintos. Os taninos extraídos protegem o
vinho tinto durante os longos períodos em que desenvolvem seu complexo “bouquet”. Os
processos viticulturais também são de importância fundamental na produção dos vinhos
tintos, devendo as uvas ser cultivadas e colhidas dentro dos mais estritos padrões de
excelência, visando oferecer ao enólogo as melhores uvas possíveis, colhidas em seu
máximo grau de maturidade fisiológica. Uma vez colhidas, por processos mecânicos ou
manuais, as uvas deverão ser encaminhadas o mais rápido possível para a vinícola, onde
se dará início ao processo de vinificação.

Removendo o Suco das Uvas / Rompendo as Cascas

Assim que as uvas chegam à vinícola, são colocadas no esmagador-desengaçador para a


produção do mosto, sendo adicionado o dióxido de enxofre, em quantidades menores que
no caso dos brancos, pois os taninos exercem um significativo efeito anti-oxidante. O
ajuste de acidez, se necessário, é feito antes da fermentação, pela adição de ácido
tartárico. Uma vez completado este processo, o mosto, composto pelas cascas, bagas e
suco é bombeado para um tanque de fermentação, onde se dará a fermentação alcoólica.

Fermentação Alcoólica / Maceração

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Neste estágio da vinificação dos tintos, a cor, os componentes de aroma e sabor e os
taninos serão extraídos das cascas. A concentração destes componentes sensoriais
definirá os parâmetros mais importantes para o estilo do vinho a ser produzido.
As diferenças mais importantes, determinadas pela técnica de vinificação entre um vinho
rose - um vinho leve para consumo imediato - e um vinho de guarda - que exigirá 15 a 20
anos de adega - produzidos com a mesma uva, Cabernet Sauvignon por exemplo, são
estabelecidas durante a maceração, ou seja, o contato com as cascas, no processo de
fermentação alcoólica.

1. Formação do “Chapéu: O mosto colocado no tanque de fermentação é então


inoculado com as leveduras, que darão início ao processo de fermentação alcoólica, com
a transformação da glicose em álcool etílico e gás carbônico. Os sólidos dissolvidos no
mosto (basicamente cascas, sementes, engaços residuais e a polpa da uva), que de
início estão dispersos, com a produção de gás carbônico começam a ser empurrados
para o topo do tanque de fermentação, dando origem ao denominado “chapéu”. Se este
“chapéu” não se misturar com o mosto, a extração será mínima a partir das cascas,
porque a maceração se fará apenas na interface entre o suco e as cascas. Além disso, a
parte superior do “chapéu” está em contato com o ar, podendo haver o crescimento das
bactérias do vinagre. Para aumentar a extração e reduzir o risco de contaminação, é
necessário manter o “chapéu” coberto pelo mosto, saturado de CO2.

2. Manuseando o “Chapéu: Existem várias maneiras de se manter o “chapéu”, em


contato constante com o mosto. A mais utilizada é o bombeamento do mosto sobre o
“chapéu”, drenando-se o mesmo da parte mais baixa do tanque e conduzindo-o ao topo
por meio de uma bomba, forçando-o através de um bico de forma a obter um spray com
força suficiente para romper o “chapéu”, submergindo-o. Este método ainda permite
resfriar o mosto, interpondo-se um resfriador entre a bomba e a parte superior do tanque
e promovendo o esfriamento do mosto durante o processo de bombeamento. Pode-se
utilizar também métodos mecânicos para a submersão do “chapéu”, seja a perfuração por
punção, seguida de sua mistura com o mosto, seja com o uso de dispositivos hidráulicos
de diferentes concepções. Existem ainda tanques especiais que não permitem que o
“chapéu” suba para o topo do tanque, mantendo-o preso no meio do mosto, método este
denominado “fermentação com chapéu submerso”.
O método de bombeamento é o mais eficaz para a extração dos elementos da uva, sendo
também o mais freqüentemente utilizado pelas vinícolas.

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Na fermentação dos vinhos tintos são utilizados tanques abertos em sua parte superior,
permitindo assim o acesso ao “chapéu”. Teoricamente, haveria uma exposição bastante
intensa do vinho ao ar, favorecendo sua degradação, conforme foi discutido quando da
vinificação dos brancos. No entanto, por ser a fermentação realizada em temperatura
mais elevada, o tempo necessário para que esta se complete é menor, além do que, o
gás carbônico formado protege o mosto da oxidação. Na verdade, o oxigênio é necessário
para o bom desenvolvimento dos vinhos tintos. A exposição ao ar não prejudica os fortes
aromas e sabores, além de remover os aromas indesejáveis que são produzidos durante
a fermentação. A exposição ao ar começa também o processo de amadurecimento do
vinho no tonel, que envolve uma exposição controlada ao oxigênio, além da incorporação
de aromas e sabores da madeira.

3. Maceração - O Contato das Cascas com o Suco: Na casca das uvas tintas e nas
porções da fruta imediatamente abaixo da casca estão a maioria dos compostos que lhes
dão cor, aroma e sabor, enquanto que o suco destas uvas é praticamente incolor, no
máximo um pálido rosado ou amarelo. As cascas das uvas tintas são também ricas em
taninos (3,0% a 6,5%). As moléculas de taninos são na verdade polímeros, que contém
duas a dez moléculas menores, que são intimamente relacionadas às moléculas de cor.
Maceração é o nome que se dá ao período em que as cascas são mantidas em contato
com o mosto, durante a fermentação. A decisão de quando separar a casca do suco
interfere diretamente no tipo de vinho que será produzido. Quanto maior for este período,
maior será a extração de cor e taninos das cascas para o suco. Como as moléculas de
cor são menores, são extraídas mais rapidamente que os polímeros de taninos, que são
significativamente maiores. Deve ser também ressaltado que os sabores varietais mais
intensos são conseguidos com períodos mais longos de maceração. Também deve
ser levado em conta que os vinhos tintos irão perder cor, numa proporção que pode
chegar a 50%, durante o processo de amadurecimento.

4. Maceração Prolongada: Maceração prolongada é a denominação que se utiliza


quando o contato das cascas com o suco da uva se prolonga após o término da
fermentação alcoólica, podendo se estender por várias semanas.
A maneira de se conduzir esta maceração inclui o uso de tanques de fermentação com
capacidade de serem hermeticamente fechados, logo após o término da fermentação
alcoólica. Esta é uma prática usada largamente em Bordeaux e também na produção de
vinhos tintos de guarda, em diversos países. A maceração prolongada produz alterações
organolépticas altamente desejáveis na cor, aroma, amargor e adstringência, que tornam
os vinhos mais acessíveis num prazo mais curto, sem interferir na sua capacidade de
51
melhorar durante o envelhecimento na garrafa. Ao final da fermentação, quando todo o
açúcar tiver sido consumido, o vinho resultante será amargo e adstringente. Tais
sensações, percebidas como aspereza pelo palato, são causadas pelos taninos jovens,
cuja adstringência é potencializada por seu amargor. Nesta fase, os pigmentos vermelhos
do vinho exibem um evidente caráter purpúreo, sendo que os aromas são muito frutados
e pungentes. A maceração prolongada muda o caráter das moléculas de tanino e também
modifica o aroma do vinho. Nos estágios iniciais da maceração a aspereza do vinho
jovem parece aumentar, porém após a primeira semana o amaciamento dos taninos tem
seu início. Isto ocorre porque na primeira semana, mais taninos pequenos - que causam
mais amargor e adstringência - são absorvidos pelo vinho, até que, por sua grande
quantidade, começam a se combinar entre si, unindo-se na formação de longos
polímeros. Ainda nesta etapa, mais moléculas de pigmento são extraídas, e também se
unem umas às outras para dar origem a moléculas de cor maiores e mais estáveis. Os
pigmentos de cor menores se juntam aos longos polímeros de taninos, criando estruturas
tão grandes, que acabam se precipitando no fundo do tanque. Como as moléculas
polimerizadas dos taninos são menos amargas e menos adstringentes, este processo dá
ao vinho uma sensação de maciez quando em contato com o palato. Também a
polimerização das moléculas de cor causa uma mudança de tonalidade do vinho,
passando do púrpura para vermelho.
Durante a maceração prolongada o vinho deve ser continuamente monitorado, para se
aferir as mudanças na cor e no teor de taninos. A decisão de terminar o processo de
maceração é baseada totalmente no sabor e na cor do vinho. Uma vez concluída a
maceração, o vinho é drenado do tanque, faz-se a prensagem do conteúdo sólido e
iniciam-se os processos de clarificação e estabilização.

5. Temperatura de Fermentação dos Tintos: A temperatura de fermentação dos tintos é


significativamente mais elevada que a dos brancos, oscilando entre os 26oC a 30oC.
Devem ser evitadas temperaturas acima de 32oC a 34oC, pois existe o risco de inativação
das leveduras pelo calor.

6. Fermentação Maloláctica: A fermentação maloláctica é realizada mais


freqüentemente nos tintos que nos brancos, sendo realizada nos mesmos moldes
anteriormente descritos e desempenhando um importante papel no desenvolvimento da
complexidade durante o amadurecimento e envelhecimento dos vinhos tintos. Tal como
ocorre com os brancos, a maloláctica é evitada em vinhos tintos de regiões muito
quentes, pois estes possuem níveis de acidez naturalmente baixos.

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Drenagem dos Tanques / Vinho de Prensa

Após o término da fermentação e da maceração o vinho é drenado dos tanques, sendo


então colocado nos tanques de aço ou nos tonéis e barricas de madeira para o período
de amadurecimento. Os sólidos restantes nos tanques de fermentação são então
prensados, obtendo-se o chamado “vinho de prensa”, que possui elevados teores de cor e
taninos. Este vinho pode sofrer a fermentação maloláctica, sendo reservado para ser ou
não utilizado no corte final do vinho, a critério do enólogo.

Clarificação e Estabilização
O processo de clarificação e estabilização dos tintos segue as mesmas técnicas e
diretrizes já descritas na vinificação dos brancos. No entanto, como os vinhos tintos
permanecem na vinícola por períodos mais longos, geralmente dois ou três invernos, a
estabilização ao frio não precisa ser realizada logo após a fermentação. Da mesma forma,
a estabilização ao calor geralmente não é necessária, pois as proteínas que criam a
instabilidade ao calor se combinam com os taninos, sendo removidas durante o
amadurecimento. A estabilidade do vinho ao frio e ao calor é testada imediatamente antes
do engarrafamento, e se houver necessidade os vinhos serão estabilizados por
resfriamento e pelo uso de bentonita.

Amadurecimento nos Tanques, Tonéis e Barricas

O amadurecimento dos vinhos tintos pode ser feito em tanques de aço inoxidável, em
grandes tonéis de madeira ou em pequenas barricas de carvalho, dependendo do tipo de
uva e do estilo de vinho que esta sendo produzido. Podem-se ainda utilizar diferentes
recipientes para parcelas diferentes do vinho, misturando-se os produtos finais em
proporções variáveis, durante o processo de corte.
No caso dos vinhos tintos de qualidade superior, e principalmente para os vinhos de
guarda, o amadurecimento é feito em pequenas barricas de carvalho, novas ou de idades
variáveis, por períodos que variam de 12 a 18 meses. Neste período de amadurecimento
os vinhos expressam suas características varietais, estabilizam sua cor, diminuem sua
adstringência e amargor e se tornam mais concentrados. Durante o período em que
permanecem na madeira, os vinhos são também expostos gradualmente a pequenas
quantidades de oxigênio, ocorrendo então as reações de oxidação dos taninos e outros
componentes do vinho, além de haver a extração de compostos aromáticos e taninos da
madeira, preparando o vinho para seu envelhecimento na garrafa.
Corte e Término da Vinificação
53
Os vinhos tintos, da mesma maneira que os brancos, podem ser varietais - quando
possuírem a quantidade mínima de uma mesma uva especificada pelas diferentes leis de
cada país ou região - ou então ser um “corte”, onde vinhos de diferentes uvas, ou vinhos
de uvas de uma mesma safra - porém tratadas com técnicas de vinificação diferentes -
são misturados em proporções variáveis, de acordo com a intenção do enólogo. O corte
mais famoso no caso dos vinhos tintos é o chamado corte bordalês, utilizado em
Bordeaux na França, que consiste na utilização das uvas Cabernet Sauvignon, Cabernet
Franc, Merlot, Petit Verdot e Malbec para a obtenção do vinho final. A tabela a seguir dá
uma idéia da contribuição de cada uma das uvas para as características finais do vinho.

Variedade da Uva Elementos Características Características Outros Efeitos no


Vegetais da Fruta Estruturais Corte
cedro groselha taninos auxiliar no
Cabernet hortelã cassis corpo pleno desenvolvimento do
Sauvignon eucalipto “blackberry” riqueza de sabores bouquet na garrafa
pimentão cereja negra
cravo cereja vermelha menos corpo tem mais aromas e é
“dill” framboesa menos riqueza mais picante que a
Cabernet Franc pimenta negra “blueberry” eventualmente pode Cabernet Sauvignon
especiarias “cramberry” ser mais tânica que e a Merlot
a Cab. Sauvignon
Merlot elementos florais cereja vermelha amacia os taninos dá novas dimensões
frutas delicadas ameixa macia ao palato ao perfil aromático e
ao sabor
Petit Verdot pimenta negra pouco frutada fornece taninos, aumenta a cor - é a
densidade e mais escura das
intensidade varietais de Bordeaux
Malbec elementos variáveis com o cor e taninos, em não relatados
apimentados vinhedo e a safra alguns casos

(baseada em Mitch Cosentino’s “Guide to Blending the Bordeaux Varietals”)

Após o amadurecimento na madeira e o corte, as vinícolas testam a estabilidade do vinho,


tomando as medidas necessárias, conforme as necessidades. Análises de laboratório
verificam os níveis de SO2 e verificam a existência de qualquer causa de instabilidade. Os
vinhos então poderão ser filtrados e encaminhados para a linha de engarrafamento.

Engarrafamento

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O engarrafamento dos tintos é feito com o mesmo cuidado e nos mesmos moldes dos
brancos.

Envelhecimento na garrafa

O envelhecimento na garrafa é fundamental para os vinhos tintos de qualidade superior,


os chamados vinhos de guarda, permitindo que estes desenvolvam os aromas (bouquet)
e sabores que lhes dão fama e distinção. Os vinhos tintos devem sua longevidade
aos taninos extraídos durante a maceração e amadurecimento em madeira e ao seu
teor de acidez. Os vinhos tintos destinados a longos períodos de amadurecimento em
barril e envelhecimento na garrafa, possuem elevados teores de taninos, quando jovens.
Durante estes períodos os taninos e os pigmentos de cor se polimerizam, da mesma
maneira que foi descrito quando tratamos da maceração prolongada, diminuindo a
adstringência do vinho e mudando sua tonalidade do vermelho-púrpura para o tijolo-
alaranjado. Os vinhos muito velhos têm ainda menor intensidade de cor porque suas
moléculas de pigmentos se precipitam, formando um depósito no fundo da garrafa. Este
sedimento também pode conter cristais de tartarato. As características organolépticas que
se procura desenvolver quando se permite ao vinho envelhecer na garrafa, estão
sintetizadas no “bouquet”, um complexo conjunto de aromas e sabores criados pela
reação dos componentes aromáticos varietais entre si e com os componentes extraídos
da madeira. O envelhecimento na garrafa adiciona novos aromas e sabores ao vinho
porque a imensa maioria das reações ocorre na ausência de oxigênio, ou seja, são
reações de redução.
Após os taninos e demais componentes do vinho interagirem com a pequena quantidade
de oxigênio remanescente na garrafa, consumindo-o completamente, o que ocorre após
cerca de 30 dias de permanência na garrafa, o ambiente dentro da garrafa se torna
anaeróbio. Esta é a primeira vez na vida de um vinho tinto em que as reações químicas
se darão na total ausência de oxigênio. Quanto mais ácido for o vinho, ou seja, quanto
menor for o seu pH, mais lentas serão estas reações, o que favorece o desenvolvimento
de aromas e sabores de maior complexidade. Não há qualquer dúvida que o
envelhecimento na garrafa acrescenta uma nova e fascinante dimensão de
complexidade aos vinhos tintos.
Os vinhos estocados na temperatura ideal, variando de 10oC a 16oC, de maneira uniforme
e em garrafas maiores, desenvolverão maior complexidade e qualidade.
Portanto, quanto mais baixa for a temperatura e mais lentas forem as reações, maior será
a complexidade final do vinho tinto de guarda. Temperaturas mais altas aceleram o

55
envelhecimento do vinho, sendo que são também aceleradas reações indesejáveis,
fazendo com que o vinho não atinja o seu máximo potencial de desenvolvimento de
aromas e sabores. A variação de temperatura no local onde o vinho está guardado
também é bastante prejudicial, pois os processos de expansão (calor) e contração (frio)
fazem com que a rolha se movimente ligeiramente, permitindo que pequenas quantidades
de oxigênio entrem na garrafa e se dissolva no vinho, estragando-o.

Maceração Carbônica - Uma Fermentação Diferente

A maceração carbônica é um tipo peculiar de fermentação, que se processa em ambiente


anaeróbio, havendo uma mudança no metabolismo das uvas, permitindo que haja a
produção de álcool, sem a intervenção de leveduras. Os vinhos produzidos por esta
técnica, habitual em Beaujolais, são intensamente frutados, com baixos teores de álcool,
ácidos totais e açúcares residuais, além de corpo leve. Seus aromas característicos são
de cerejas e framboesas, incluindo ainda um peculiar e inconfundível aroma de banana.
O processo consiste em se colocar os cachos de uvas inteiros, num tanque de
fermentação. O ar do tanque pode ser removido pela injeção de gás carbônico ou se
tornará saturado pelo gás carbônico que será produzido pela fermentação alcoólica
normal, do suco liberado das uvas esmagadas pelo peso das uvas colocadas sobre estas.
Geralmente este suco no fundo do tanque sofre uma maciça inoculação de leveduras
selecionadas, com o intuito de se produzir o CO2 rapidamente para preencher o tanque.
Este ambiente anaeróbio, saturado de CO2, provoca uma alteração metabólica nas uvas
intactas, que passam a usar seus açúcares para produzir energia, tendo o álcool como
sub-produto. Este álcool, em concentração elevada dentro da uva, acaba por inativar todo
o metabolismo, interrompendo o processo. Durante esse processo, chamado de
fermentação intracelular, os tanques se aquecem, favorecendo a extração dos aromas e
sabores. Uma vez concluídas ambas as fermentações, dentro e fora das uvas, o conteúdo
do tanque é drenado e as uvas prensadas para a obtenção do vinho de prensa, que neste
caso particular é mais desejável que o vinho obtido por fluxo livre.

Todo este processo dura cerca de 4 a 10 dias. Ambos os vinhos são então colocados
num novo recipiente onde se dá uma rápida fermentação alcoólica convencional,
concomitante a uma fermentação maloláctica. Após ser submetido aos processos
convencionais de estabilização e clarificação, o vinho é engarrafado e prontamente
enviado ao mercado.

USO DE MADEIRA (CARVALHO) NA VINIFICAÇÃO


56
O carvalho é a madeira de escolha para uso durante a produção de vinhos tintos e
brancos. As barricas feitas com carvalho podem ser utilizados tanto para a fermentação
quanto para o amadurecimento de vinhos de qualidade superior. Tal escolha deriva do
fato das árvores serem suficientemente grandes para a produção de barricas de diversos
tamanhos, do fato da madeira ser forte, pouco porosa e maleável, podendo ser trabalhada
em formas curvas, necessárias para a confecção das barricas, e principalmente por
conter aromas e sabores altamente desejáveis para a produção de vinhos de alta
qualidade.
Quando os vinhos são amadurecidos em barricas de madeira, três eventos acontecem: o
álcool e a água evaporam através da madeira, concentrando o vinho; o oxigênio se
dissolve no vinho, permitindo a ocorrência de reações químicas dependentes deste
elemento e substâncias da madeira são extraídas para o vinho. Entre estas substâncias
estão componentes de cor, aroma e sabor, além de taninos. Quando os enólogos
decidem amadurecer o vinho em carvalho, procuram tirar vantagem destes fatos, estando
particularmente interessados nos sabores que serão incorporados ao vinho.
Antes de amadurecer um vinho na madeira, os enólogos terão que tomar várias decisões
para assegurar que a qualidade e a quantidade de características do carvalho que serão
adicionadas ao vinho sejam compatíveis e bem balanceadas com as características e
intensidade dos aromas e sabores varietais do vinho. Tais decisões se iniciam no
processo de fabricação das barricas.
Os fatores relativos ao carvalho, que influenciam as características do vinho final, são:
procedência do carvalho, grau de tostadura interna da barrica, tamanho da barrica, tempo
de permanência na barrica, porcentagem do vinho amadurecido em barrica, idade das
barricas e tratamento prévio a que o carvalho foi submetido antes da fabricação da
barrica. A tabela abaixo sintetiza esta influência:

Fator MAIS Aromas e Sabores de MENOS Aromas e Sabores


Carvalho de Carvalho
Procedência do Carvalho América do Norte França & Europa
Grau de Tostadura Elevado Médio ou Baixo
Tamanho da Barrica Menor Maior
Tempo na Barrica Mais Longo Mais Curto
% de Vinho no Carvalho Alta Baixa
Idade das Barricas Novas Usadas (1ano, 2 anos, etc...)
Tratamento Prévio Mínimo Lavagens Repetidas

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Além dos fatores acima citados, o ambiente onde as barricas serão estocadas exerce
influência na concentração dos componentes do vinho. Especificamente, o ambiente pode
afetar a evaporação de água e a concentração de álcool, que pode aumentar ou diminuir,
dependendo da umidade relativa do local do armazenamento. Assim, em barricas
estocadas em ambientes relativamente secos, a evaporação das moléculas de água, que
são menores que as de álcool, será muito mais rápida e haverá concentração dos
componentes do vinho, podendo seu teor alcoólico aumentar em até 1%. Se por outro
lado, o ambiente for úmido, haverá menor evaporação da água, com menor concentração
dos elementos do vinho e como a evaporação de álcool será relativamente maior que a
da água, poderá haver uma diminuição discreta do teor alcoólico do vinho.

VINIFICAÇÃO DE ESPUMANTES

Por definição, vinhos espumantes são vinhos de mesa que contêm grande quantidade de
dióxido de carbono -CO2 - dissolvido, que borbulha e forma uma camada de espuma ou
“mousse”, na superfície do vinho. Este CO2 pode ser incorporado ao vinho de diferentes
maneiras, sendo que a escolha do método de espumatização pode afetar dramaticamente
o resultado final.
Os métodos mais comuns de produzir vinhos espumantes se utilizam de duas
fermentações alcoólicas, aprisionando-se o CO2 produzido durante a segunda. A primeira
fermentação produz um vinho normal, bastante ácido, seco e “tranqüilo”, ao qual são
adicionados açúcar e leveduras para se produzir a segunda fermentação, que é realizada
de forma a prevenir que o gás carbônico escape. Os vinhos espumantes também podem
ser produzidos aprisionando-se o CO2 formado de uma única fermentação alcoólica ou
maloláctica ou ainda por carbonatação, com a injeção pura e simples de CO2 no vinho,
artificialmente e não por fermentação. Estes dois últimos métodos não são utilizados na
produção de espumantes de qualidade.
Para realizar a segunda fermentação alcoólica, duas técnicas distintas podem ser
utilizadas: a fermentação em tanques e a fermentação na garrafa. Estes processos dão
origem a produtos bastante distintos. A fermentação em tanque, também conhecida por
método Charmat, é a escolhida para a produção de espumantes mais baratos, feitos para
comercialização precoce, cuja ênfase está no caráter fresco e frutado da uva. A
fermentação em garrafa também pode produzir vinhos jovens e frutados, porém é
normalmente utilizada para a produção de espumantes mais complexos, porque permite

58
ao vinho permanecer em contato com os sedimentos das leveduras da segunda
fermentação, dando origem ao complexo e característico “bouquet de Champagne”.

Um Pouco de História

A primeira descrição de um vinho espumante foi feita pelo monge Dom Pérignon,
responsável pela adega da Abadia dos Beneditinos em Hautvilliers, uma cidade no Distrito
de Champagne, na França, entre os anos de 1668 a 1715, onde se tornou famoso por
suas inovações nas técnicas de vinificação e por sua habilidade de mesclar vinhos. Sua
lendária habilidade em degustar vinhos é em parte atribuída à deficiência visual que o
acometeu no final da vida. Dom Pérignon foi um dos primeiros enólogos a utilizar rolhas
para vedar as garrafas, ao invés de pano ou madeira, além de preferir garrafas de vidro
mais resistente, que haviam sido recentemente importadas da Inglaterra. Conforme conta
a história, numa primavera, Dom Pérignon estava exercitando sua arte de degustar
vinhos, que haviam sido fermentados e engarrafados na colheita do inverno anterior.
Durante a degustação, descobriu algumas garrafas com grande quantidade de bolhas.
Eufórico com o achado, comunicou o fato aos outros monges, dizendo: “Venham rápido
irmãos, estou bebendo estrelas”. É por esta razão que muitos rótulos de vinhos
espumantes e champagnes são decorados com estrelas, numa simpática referência à
frase antológica de Dom Pérignon.

Méthode Champenoise - Fermentação na Garrafa

O significado exato do termo “ méthode champenoise” é difícil de ser especificado, uma


vez que uma variedade muito grande de técnicas de vinificação é usada na região de
Champagne, na França. No entanto, este termo pelo menos implica no fato de que você
irá consumir o vinho proveniente da mesma garrafa onde ocorreu a segunda fermentação
alcoólica, apesar de não haver qualquer referência às técnicas de vinificação empregadas
(cortes, fermentação, amadurecimento e clarificação). O termo “méthode champenoise”
não possui uma clara definição legal, apesar dos esforços dos produtores franceses em
restringir seu uso, da mesma forma que procuram restringir o uso do termo “Champagne”
aos vinhos espumantes produzidos exclusivamente no distrito de Champagne.

1. Variedades de Uvas, Condições de Cultivo, Época de Colheita

As varietais preferidas para a produção de espumantes pelo “méthode champenoise” são


a Chardonnay, a Pinot Noir e a Pinot Meunier, que são as mais utilizadas no distrito de
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Champagne, na França. Na Califórnia a Pinot Blanc é utilizada em substituição à Pinot
Meunier, sendo outras varietais utilizadas em várias regiões vinícolas do mundo.
Com exceção da região do Mosel, na Alemanha, o distrito de Champagne é a região
produtora de uvas mais ao norte de todo o mundo. Suas uvas amadurecem lentamente
sob condições climáticas muito frias, fazendo com que seu conteúdo em ácidos totais e
sua proporção de ácido málico sejam bastante elevados, tendo como conseqüência direta
um elevado nível de acidez, baixos teores de açúcar e baixo caráter varietal, a
composição perfeita para a produção de vinhos espumantes. Os sabores e aromas
varietais não são necessários em vinhos espumantes, pois poderiam mascarar os aromas
mais desejáveis neste caso, que são aqueles derivados do longo amadurecimento sobre
o sedimento das leveduras da segunda fermentação na garrafa (“sur lie”), o chamado
“bouquet de Champagne”. Desta forma, a colheita das uvas em Champagne é feita
precocemente e de modo manual, com as frutas plenas de acidez refrescante, com o
devido cuidado para se evitar o caráter herbáceo de frutas muito imaturas. Como já foi
dito, estas uvas terão maiores quantidade de ácido (pH mais baixo) e teores de açúcar
menores que os desejáveis para a produção de vinhos finos, sendo que os vinhos
produzidos destas uvas terão pouco caráter frutado, sendo bastante ácidos e com baixo
teor alcoólico. No entanto, este é o perfil ideal dos vinhos base para a produção de
espumantes pelo “méthode champenoise”, pois estes necessitam alta acidez para
compensar o açúcar do ”liqueur de dosage”. Além disso, o seu teor alcoólico será
significativamente aumentado pela segunda fermentação. Tanto as análises laboratoriais
quanto a avaliação sensorial devem ser extensivamente usadas pelos produtores para
decidir qual será o momento ideal para se proceder à colheita das uvas.
Além do clima frio, o adequado manejo das vinhas - evitando o solo muito fértil que
estimularia o crescimento muito vigoroso das uvas - é importante para a produção de
vinhos espumantes de qualidade. Existe, sem sombra de dúvida, uma relação direta entre
a adequação das técnicas viticulturais e a qualidade do vinho produzido.
No entanto, no caso dos vinhos espumantes, esta relação é mais difícil de ser percebida,
pois estes vinhos são produzidos por cortes de vinhos de vinhedos e até safras
diferentes, sendo ainda fermentados duas vezes.

2. A Produção dos Vinhos Base

Os vinhos base para a produção de espumantes são na verdade pequenos lotes de


vinhos secos brancos e tranqüilos, que são misturados para criar o vinho de “cuvée” (“vin
de cuvée”), que será colocado na garrafa para a segunda fermentação e envelhecimento.
Muitos dos métodos utilizados para a produção do vinho base se originaram das técnicas
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utilizadas primariamente para a vinificação da Pinot Noir no distrito de Champagne.
Apesar da Pinot Noir ser uma uva tinta, seu suco é incolor, e vinhos brancos podem ser
feitos desta e de muitas outras uvas tintas, desde que se utilizem técnicas especiais que
minimizem a extração de cor das cascas e da polpa. Estas técnicas incluem a colheita
das uvas ainda imaturas, sob as condições mais frias possíveis; seleção das uvas para a
remoção de uvas que não estejam 100% sadias (pois estas podem ter as cascas
danificadas) e prensagem das uvas íntegras, sem o esmagamento prévio. Estes métodos
são utilizados para todas as varietais usadas na produção de espumantes pelo “méthode
champenoise”, especialmente no distrito de Champagne, pois minimiza a extração de
taninos, assim como de material corante das cascas das uvas.
Desta forma, o primeiro passo na produção de vinhos espumantes pelo “méthode
champenoise” é a prensagem dos cachos de uvas inteiros, incluindo os engaços. Neste
processo, prensas muito delicadas são utilizadas, sendo o suco produzido
cuidadosamente testado e dividido entre o suco que flui livremente (mosto-flor) e os sucos
obtidos por graus diferentes de prensagem. É o mosto-flor que será fermentado para a
preparação do “vin de cuvée”. Os sucos obtidos por prensagem delicada são fermentados
separadamente, dando origem aos chamados vinhos de corte ou “vins de taille”, que
podem ser subdivididos, de acordo com o grau de prensagem, em “première, deuxième
ou troisième tailles”. O suco obtido pela prensagem final e portanto mais vigorosa, será
fermentado para dar origem ao “vin de presse”. Deve-se ressaltar que o mosto-flor é
praticamente incolor, tendo pouco caráter varietal, com sabor bem fresco e ácido.
O “vin de cuvée” e os melhores vinhos “première taille” são tipicamente usados em cortes
para a produção de espumantes, sendo que o melhor “vin de cuvée” é reservado para a
produção do mais seco e prestigiado vinho de cada produtor, quando então recebe a
designação de “tête de cuvée”. Os vinhos “première taille” podem também ser utilizados
para a produção de espumantes mais doces, os “extra-dry” ou “demi-sec”. Os vinhos
derivados das prensagens mais vigorosas e o “vin de presse” são vendidos para outros
cortes ou então destilados para a produção do “marc”, um tradicional aguardente vínico
francês.
Durante o processo de prensagem são utilizadas quantidades mínimas de dióxido de
enxofre (SO2), desde que o mosto deixa as prensas até seu armazenamento em tanques
de aço inoxidável, onde será refrigerado e submetido ao processo de clarificação pré-
fermentação, tanto por deposição como por centrifugação. Os diferentes mostos
provenientes tanto de prensagens diversas como de diferentes varietais e vinhedos, ou
ainda de uvas colhidas em datas diversas serão mantidos separados durante todo o
processo de fermentação. Para que esta aconteça, cada um destes mostos será
inoculado com leveduras selecionadas, sendo a fermentação conduzida em tanques de
61
aço inoxidável ou em barricas de carvalho francês. Como não se deseja que os vinhos
tenham caráter varietal, se utilizam temperaturas de fermentação mais elevadas que o
usual, sendo então a primeira fermentação alcoólica rapidamente completada, em cerca
de 7 a 10 dias. Os vinhos recém fermentados são então resfriados, filtrados para a
remoção das leveduras e outras matérias sólidas, clarificados por trasfega ou
centrifugação e estabilizados a frio.
O principal objetivo da maioria dos produtores de espumantes pelo “méthode
champegnoise” é criar um estilo de vinho não safrado, que seja consistente de ano
para ano. Para ajudar a minimizar a variação da composição das uvas entre as diferentes
safras e assegurar uma consistência de estilos, alguns produtores podem adicionar ao
mosto, antes da fermentação, o chamado “vinho de reserva” que nada mais é do que uma
mistura de diferentes vinhos base de anos anteriores, enquanto que outros produtores
adicionam a reserva quando da preparação do cuvée.
A ocorrência da fermentação maloláctica é permitida por alguns produtores, que
acreditam que a mesma possa melhorar o balanço açúcar / ácido, adicionando
complexidade e persistência ao vinho. Esta opinião não é no entanto unânime, sendo
grande o número de produtores que evitam a todo custo a ocorrência da maloláctica em
seus vinhos.

3. A Criação do Vinho de Cuvée - “Assemblage”

Um cuvée é na verdade um corte de diferentes vinhos. Na produção de espumantes pelo


“méthode champegnoise”, cuvées são os vinhos obtidos pela mistura de diferentes lotes
de vinhos base, que serão convertidos em espumantes através da segunda fermentação.
A criação do “vin de cuvée” é a etapa mais crítica na produção de espumantes, sendo
necessárias cinco a sete semanas de trabalho intensivo, misturando e degustando os
vinhos até encontrar a composição adequada.
Os vinhos base ideais para serem utilizados na obtenção do cuvée são límpidos, claros,
livres de odores indesejáveis, com aromas e sabores delicados, com moderados teores
de álcool, com acidez elevada e corpo leve. Estes vinhos não são equilibrados ou
agradáveis para consumo como vinhos de mesa, porém se tornam espumantes
equilibrados após serem misturados e por causa da segunda fermentação, ganharem o
CO2, alguns graus a mais de álcool, riqueza e complexidade nos aromas e sabores, além
de uma discreta diminuição em sua acidez. A grande dificuldade para produzir o cuvée é
que é necessária uma grande experiência do profissional que irá fazer o corte, pois este
deverá saber por antecipação como se comportará o cuvée após a segunda fermentação
e mais 2 a 4 anos de envelhecimento na garrafa.
62
Para a produção do cuvée os vinhos base que foram separados por variedade,
prensagem, vinhedo e data de colheita são degustados e misturados entre si e com o
vinho de reserva dos anos anteriores. Os cortes resultantes são então degustados e
ajustados repetidas vezes até que se consiga o resultado desejado. Um cuvée pode
conter até cerca de 70 vinhos diferentes.
As diferentes varietais são utilizadas no cuvée de acordo com o estilo de vinho desejado.
Assim, a Pinot Noir é usada para a obtenção de corpo, além de profundidade e riqueza de
sabor e a Chardonnay por sua acidez e potencial de envelhecimento. A Pinot Meunier é
uma uva de apelo frutado e floral imediato, sendo a primeira a impressionar o olfato por
seus aromas marcantes.
Após a conclusão dos processos de mistura, o cuvée obtido pode ser estabilizado ao frio
e ao calor, podendo ou não ser filtrado antes do início da segunda fermentação.

4. A Segunda Fermentação - “Prise de Mousse”

A segunda fermentação, ou “prise de mousse”, literalmente, aprisionar a espuma, é feita


com o cuvée colocado em grandes tanques onde então se adiciona o “liqueur de tirage”,
que é uma mistura de um vinho de cuvée, açúcar, leveduras e nutrientes. Isto feito,
procede-se ao engarrafamento desta mistura para que processe a segunda fermentação
e o subseqüente envelhecimento na garrafa. Nesta fase do processo as garrafas são
fechadas com tampas de metal, resistentes à pressão que se formará dentro das
garrafas. A segunda fermentação pode durar de 10 dias a três meses, dando origem ao
vinho espumante, pois as leveduras adicionadas transformarão o açúcar adicionado em
álcool, com a produção de gás carbônico, que permanecerá dissolvido no vinho. As
leveduras utilizadas na segunda fermentação são geralmente de espécies ou cepas
diferentes das utilizadas na primeira, pois as condições da segunda fermentação são
muito diferentes: maior teor de álcool (9 a 11%), menor teor de açúcar, pressões
crescentes de gás carbônico (chegando a 6 - 7 atmosferas no final do processo), além de
temperaturas mais baixas. A cepa de leveduras utilizada também deve morrer no final do
processo, depositando-se numa fina camada dentro da garrafa, sem aderir ou manchar o
vidro, além de, pelo processo de autólise, produzir aromas e sabores desejáveis durante o
processo de envelhecimento “sur lie”.

5. Envelhecendo com as Leveduras - “Sur Lie”


As garrafas são colocadas então em posição horizontal para envelhecer por dois a quatro
anos, onde o vinho ficará em contato com uma fina camada constituída pelas leveduras
que restaram após o processo de fermentação. Durante o envelhecimento, dois
63
processos ocorrem: os vinhos sofrem mudanças à medida que as reações de
envelhecimento na garrafa ocorrem e as células das leveduras se rompem, num processo
conhecido como autólise, liberando compostos nitrogenados (aminoácidos), açúcares
complexos e outros compostos para o vinho. Estas substâncias ajudam no
desenvolvimento do “bouquet de Champagne”, além de favorecer a dissolução do gás
carbônico no vinho, permitindo a lenta liberação das bolhas quando o vinho for aberto. O
passo seguinte é a preparação para se remover estes resíduos de leveduras da garrafa.

6. Coletando as Leveduras - “Rémuage”


A “remuage” é um processo que implica em girar as garrafas lentamente, inclinando-as
progressivamente, com a finalidade de coletar, com a ajuda da gravidade, os restos das
leveduras na extremidade superior da garrafa, para posterior remoção. O processo, que
foi inventado pela viúva Nicole-Barbe Clicquot-Ponsardin, pode ser realizado
manualmente em estruturas chamadas “pupitres”, ou então por meios mecânicos, quando
uma grande quantidade de garrafas é movimentada simultaneamente. Quando o
processo de remuage se completa, todo o sedimento estará coletado no gargalo da
garrafa, próximo à tampa de metal. As garrafas são então colocadas cuidadosamente
com a ponta para baixo (“sur pointe”), antes da remoção do sedimento, continuando o
processo de envelhecimento.

7. Removendo as Leveduras - “Dégorgement”


Antes de proceder à remoção do sedimento, as garrafas podem ser resfriadas a - 4o C,
por cerca de 1 a 2 semanas para que os cristais de tartarato se precipitem. Durante o
processo de remoção das leveduras, o vinho é mantido a baixa temperatura, para reduzir
a pressão do gás carbônico e minimizar a perda do gás quando a garrafa for aberta. Para
o processo de “dégorgement”, as garrafas são colocadas, com a ponta para baixo, numa
solução congelante. Quando o vinho do gargalo é congelado, o sedimento das leveduras
ali coletado, juntamente com os cristais de tartarato são aprisionados num “cubo de gelo”
de vinho. A seguir a garrafa é colocada na posição de 45o e a tampa de metal é removida.
A pressão do gás carbônico empurra o vinho congelado para fora, juntamente com o
sedimento, deixando o vinho remanescente na garrafa límpido e brilhante.
Quando o processo é feito de maneira rápida e eficiente, muito pouco vinho e pressão de
gás carbônico são perdidos, cerca de uma atmosfera, de um total de 6,5 atmosferas de
pressão existentes no interior da garrafa. Se alguma quantidade de vinho for perdida, será
reposta com vinho do mesmo cuvée, quando da adição do “liqueur de dosage”. O
processo de “dégorgement” é feito habitualmente de maneira automatizada, sendo
seguido rapidamente pelo processo de dosagem e re-arrolhamento.
64
8. Ajustando o Açúcar - “Liqueur de Dosage”

Após a retirada do sedimento e antes do arrolhamento, as garrafas são completadas em


seu nível e é adicionado o “liqueur de dosage” ou “liqueur d’expédition”. Em todos os
casos, exceto para o Extra-Brut, este “liqueur” inclui uma pequena quantidade de açúcar.
Quanto mais jovem for o vinho, maior a quantidade de açúcar necessária para
contrabalançar sua acidez. A elevada acidez é crucial para um fino espumante de
Champagne, pois mantém o vinho fresco durante seu lento período de envelhecimento.
A doçura dos espumantes de Champagne pode ser indicada com muita precisão pelo seu
teor de açúcar residual, que é medido em gramas por litro. Os níveis permitidos pela
regulamentação de Champagne são os descritos na tabela abaixo.
Tipo Açúcar (g/l) Características Organolépticas
Extra-Brut 0–6 Totalmente seca (“bone dry”).
Brut 0 – 15 Seca a muito seca, porém nunca austera.
Extra-Sec ou Um nome enganoso. O Champagne pode variar de
Extra-Dry 15 – 20 seca a ligeiramente doce.
Sec ou 17 – 35 Cuidado. Apesar do nome estes Champagnes
Dry possuem um considerável grau de doçura.
Demi-Sec ou 35 – 50 Doces, mas não a nível de vinhos de sobremesa.
Rich
Doux 50+ Muito doces, muito raras.

9) Envelhecimento na Garrafa

O período mínimo de envelhecimento na garrafa para um vinho espumante feito pelo


“méthode champenoise” é de alguns meses, e de maneira ideal, este período deveria ser
anterior à liberação do produto no mercado. Durante este período, que pode variar de 3 a
9 meses, o “liqueur de dosage” se combina perfeitamente com o vinho e uma certa
complexidade poderá ainda se desenvolver.
Por conter uma grande quantidade de gás carbônico dissolvido, os vinhos espumantes
não experimentam os mesmos tipos de reações químicas que os vinhos tranqüilos,
durante o envelhecimento na garrafa. No entanto, os vinhos espumantes, especialmente
os de Champagne, de alta qualidade, poderão melhorar ainda por muitos anos na garrafa.
De maneira muito geral podemos recomendar que não se guarde os vinhos espumantes

65
por mais de 10 anos, sendo que a maioria estará em seu melhor período de consumo
entre dois a três anos após a liberação.

Método Charmat - Fermentação em Tanque

O método Charmat, ou de fermentação em tanque, é utilizado para a produção de vinhos


espumantes relativamente simples, cujas principais características são a juventude e a
ênfase nas frutas. O caráter das leveduras não é importante nestes vinhos. Não sendo
desejado seu envelhecimento, todo o processo pode ser completado em duas semanas.
Com exceção da Moscatel, as varietais escolhidas para a produção de vinhos por este
processo não possuem características marcantes, sendo usadas com mais freqüência a
Colombard, a Chenin Blanc e a Sylvaner.
Da mesma maneira que foi descrito para o “méthode champenoise”, as uvas são
precocemente colhidas para manter sua elevada acidez e a fermentação se faz em
temperaturas relativamente elevadas. Os vinhos base para os espumantes pelo método
Charmat, devem a grosso modo preencher os mesmos requisitos que os necessários
para a produção pelo “méthode champenoise”.

Após os vinhos base terem sido misturados, dando origem ao vinho de cuvée, este é
estabilizado ao frio e ao calor, clarificado e inoculado com leveduras (acompanhadas de
açúcar e nutrientes), sendo então colocado em tanques especiais, com temperatura
controlada e resistentes a pressões elevadas. Nestes tanques ocorrerá a segunda
fermentação, sendo o gás carbônico aprisionado junto com o vinho.
Após a fermentação, o vinho é rapidamente removido dos espessos depósitos de
leveduras. Ao contrário do que ocorre quando o vinho fica em contato com finas camadas
de leveduras, o contato com estas grossas camadas de leveduras tem maior
probabilidade de produzir odores sulfurosos pouco desejáveis.
O vinho, agora já espumante, é estabilizado a frio para a remoção dos cristais de
tartarato, sendo submetido à filtração estéril para a remoção de células de leveduras
remanescentes. A seguir é adicionado a “dosage”, que pode incluir uma certa quantidade
de dióxido de enxofre, sendo engarrafado em condições de assepsia para garantir que a
“dosage” não irá fermentar. Todo o processo é feito sob pressão, para impedir a saída do
gás carbônico.
A grande vantagem no método de fermentação em tanques é o seu relativo baixo custo,
quando comparado com o “méthode champenoise”.

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Método de Transferência

O método de transferência, muito pouco utilizado nos dias de hoje, combina a


fermentação na garrafa, com o objetivo de produzir espumantes com o “bouquet de
Champagne”, com o processo de clarificação em tanque, com o objetivo de reduzir as
variações entre as garrafas e reduzir os custos de produção.
O cuvée é engarrafado e a segunda fermentação é conduzida da mesma maneira que no
“méthode champenoise”. Nesta etapa, ao invés de ser feito o processo de “rémuage”, as
garrafas são esvaziadas usando um equipamento especial de transferência (daí o nome
do método), sendo seus conteúdos misturados. O vinho é então manipulado num tanque,
sendo clarificado por filtração, adicionando-se a “dosage”. O vinho é a seguir re-
engarrafado, nas garrafas utilizadas para a fermentação, que foram cuidadosamente
lavadas. Todo o processo, desde o uso da máquina de transferência é feito sob pressão
para se evitar a perda do gás carbônico.

Método Asti - Espumantes por Fermentação Única

Os Asti Spumanti italianos, feitos com a uva moscatel, são produzidos interrompendo-se a
fermentação alcoólica antes que a mesma se complete e filtrando-se os vinhos enquanto
os mesmos ainda estão saturados de CO2, proveniente da fermentação. Estes vinhos são
invariavelmente doces.
Comparando os Dois Métodos Mais Importantes : Champenoise e Charmat

Etapa da Vinificação Méthode Champenoise: Método Charmat:


Fermentação na Garrafa Fermentação em
Tanque
Varietais Preferidas Chardonnay Colombard
Pinot Noir Chenin Blanc
Clima mais adequado Mais Frio Frio ou Calor
Seleção e Preparação do Corte dos Vinhos Base,
Cuvée Clarificação, Estabilização Igual
Adição de Fermento e
Açúcar
Segunda Fermentação Na Garrafa Em Tanque
Pressurizado

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Envelhecimento “sur lie” 1 a 3 anos Geralmente Evitado
Coleta dos Sedimentos “Rémuage” Filtração
Remoção do Sedimento “Dégorgement” Filtração
Ajuste do Teor de Açúcar Adição da “dosage” em cada Adição da “dosage” ao
garrafa tanque do vinho
Engarrafamento Re-arrolhamento da mesma Engarrafamento em
garrafa onde fermentou máquinas + SO2
Potencial de Envelhecimento Até 10 anos Alguns Meses
Após a Liberação
Tempo do Processo 2 a 4 anos 15 dias a 2 meses

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VINIFICAÇÃO DE ROSADOS

Existem três formas de se produzir um vinho rosado: através de maceração por tempo
mínimo (também chamado de método de sangria), por prensagem e pela mistura de
vinhos tintos e brancos.

Maceração Curta

Este é o processo que produz os vinhos rosados de melhor qualidade, sendo o mais
freqüentemente utilizado nos dias de hoje.

O vinho obtido é o resultado da vinificação de uvas tintas, pelo método de vinificação de


vinho tinto, onde a maceração, ou seja, o contato das cascas com o mosto, é restrita a um
período de poucas horas a 2 ou 3 dias, de acordo com a cor final desejada. Após este
tempo, o tonel é “sangrado” para remover um terço a um quarto do seu conteúdo e o
restante usado para fazer vinho tinto. O volume “sangrado” continua a fermentar, mas por
não estar mais em contato com as cascas, não recebe pigmentos corantes adicionais.
Após a fermentação alcoólica, estes vinhos geralmente são submetidos à fermentação
maloláctica.

Método de Prensagem

O vinho rosado de prensa é feito de uvas vermelhas, usando o método de vinificação de


uvas brancas. As uvas são esmagadas e a seguir prensadas em baixa temperatura,
sendo que uma parcela dos pigmentos é dissolvida no mosto, obtendo-se desta forma a
tonalidade rósea desejada. A intensidade de cor vai depender da intensidade da
prensagem utilizada. O mosto rosado é então fermentado sob as mesmas condições de
mosto de uvas brancas, isto é, em baixas temperaturas e bem protegido contra oxidação.
A fermentação maloláctica é opcional neste processo, da mesma forma que na vinificação
de brancos.

Mistura de Tintos e Brancos


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O vinho rosado não deve ser elaborado pela mistura de brancos e tintos. Uma exceção é
a região de Champagne onde legalmente se tinge seu vinho branco, adicionando tinto da
mesma área da apelação.
Além dos já citados, existe um tipo de rosado extremamente raro que só é encontrado na
região do Jura, na França. É produzido com técnica de vinificação de vinho tinto, a partir
de uma uva especial - a Poulsard - por ter casca e suco róseo. É um vinho longevo e sua
qualidade melhora com a idade.

VINIFICAÇÃO DE VINHOS DOCES

Quando terminar a fermentação e nem todo o açúcar presente no mosto tiver sido
transformado em álcool, teremos um vinho adocicado. Se a parcela de açúcar residual for
superior a 40 gramas por litro, o vinho será licoroso.
Como cada 17 gramas de açúcar levam à produção de um grau de álcool, mostos muito
ricos em açúcar poderiam teoricamente ser capazes de produzir vinhos de elevado teor
alcoólico, superior a 15O. Mas como as leveduras morrem acima de 15o de álcool, o vinho
resultante apresenta açúcar não convertido, ou seja, açúcar residual. Os vinhos doces,
isto é, aqueles que apresentam açúcar residual detectável ao paladar, podem ser
produzidos de várias maneiras: pelo uso uvas infectadas pela Botrytis ou de uvas passa
(secas ao sol) ou ainda por fortificação.

Uso de uvas Afetadas pela Botrytis Cinerea

Trata-se da infecção dos bagos das uvas pelo fungo Botrytis cinerea, fato este que
ocorre espontaneamente em algumas poucas regiões do mundo - tais como Sauternes
(em Bordeaux) e Vale do Loire na França, Vale do Reno e do Mosel na Alemanha, na
Hungria e Áustria - sendo conhecida como “podridão nobre”. Esse microorganismo altera
a permeabilidade da casca da uva, permitindo sua desidratação. Esta modificação se
traduz por uma certa queda na taxa de acidez, enquanto eleva bastante a concentração
de açúcar. O uso destas uvas dá origem aos mais nobres vinhos de sobremesa do
mundo, tendo como exemplo máximo o Château d’Yquém, de Sauternes. Pode-se obter
mais açúcar residual, interrompendo artificialmente a fermentação. Isto pode ser
conseguido, por exemplo, pela adição de SO2, o anidrido sulfuroso, ou por resfriamento.
Na Califórnia desenvolveu-se técnica de botritização em laboratório com infecção artificial
dos vinhedos, obtendo-se resultados satisfatórios.

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Uso de Uvas Dessecadas

Esse processo baseia-se no fato de as uvas desidratadas terem uma maior concentração
de açúcar. As uvas podem dessecar no pé, por colheita tardia ou após a colheita, quando
são estendidas em esteiras de palha ou estantes para secar ao sol. Exemplos deste tipo
de vinho são: Vin de Paille, Vin Santo e o Reccioto Amarone della Valpocicella.

Por Fortificação

Consiste na adição de álcool (álcool neutro ou aguardente vínica) ao mosto em


fermentação, interrompendo-a pela inativação das leveduras, que não resistem à maior
concentração alcoólica. O término precoce da fermentação deixa grandes quantidades de
açúcar residual. São exemplos o Vinho do Porto e o Marsala, além dos chamados vins
doux naturels do sul da França, tais como o Muscat de Rivesaltes e o Muscat de
Beaumes-de-Venise
Os Jerez adocicados espanhóis são exceção à regra, pois a fortificação é realizada após
o término da fermentação, sendo então adicionado suco de uvas, que dá o caráter
adocicado desejado.

VINIFICAÇÃO DE FORTIFICADOS

São vinhos de teor alcoólico mais elevado, oriundos de uma adição artificial de álcool. É
o caso, por exemplo, do vinho do Porto e do Jerez.

No caso do Porto, o álcool é proveniente de uma aguardente vínica adicionada durante o


processo de fermentação. A adição de álcool eleva artificial e propositadamente o teor
alcoólico do mosto a mais ou menos 19º impedindo que as leveduras continuem a
trabalhar, embora ainda houvesse açúcar para ser fermentado. Com isto se obtém um
vinho com teor alcoólico elevado (entre 18o e 20o , dependendo do que se pretende) e
com um teor sensível de açúcar residual, características marcantes do vinho do Porto.

No caso do Jerez ou do Porto seco, o álcool é acrescentado após a fermentação,


resultando num vinho alcoólico e seco.

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FATORES QUE INFLUENCIAM NA DECISÃO DA COMPRA DE UM
VINHO

" A bottle of wine begs to be shared; I have never met a miserly wine lover "
CLIFTON FADIMAN

Devemos pressupor, que o indivíduo ao tomar a iniciativa de adquirir uma garrafa de


vinho, deve ter o espírito desarmado para apreciar o produto que essa garrafa contém,
que lhe poderá propiciar grandes prazeres. Essa compra, muitas vezes pode ser
otimizada, levando-se em conta alguns fatores, que poderão transformar essa aquisição
em um momento de satisfação dupla: ter conseguido uma boa relação qualidade x preço
e a certeza (teórica) de poder degustar um produto em boas condições.
Enumeraremos a seguir, algumas sugestões que devem ser seguidas ao adquirirmos uma
garrafa de vinho:
1. Dê preferência a um estabelecimento comercial com um bom giro do produto, de
modo que as garrafas não tenham ficado por muito tempo expostas nas
prateleiras.
2. Dê preferência para os locais onde garrafas estão expostas deitadas, de modo
que o líquido fique sempre em contacto com a rolha.
3. Dê preferência ao estabelecimento comercial que mantiver seu estoque em
ambiente climatizado
4. Mesmo que as garrafas expostas estejam de pé, nunca deixe de verificar o nível
do líquido dentro da garrafa e se houve algum vazamento.
5. Tempo médio para consumo dos vinhos nacionais:
a. Brancos - 1 a 2 anos da data da vindima
b. Tintos - 1 a 3 anos da data da vindima
6. Em relação aos vinhos importados, informe-se como foi feito o transporte desde a
origem até o Brasil. Dê preferência aos importadores que se utilizam de
"containers refrigerados".
7. Sempre que possível tenha em seu poder uma tabela de safras, com as
respectivas notas. Exemplo a elaborada pelo expert americano Robert Parker Jr.
8. Solicite cotações a várias importadoras pois muitas vezes o mesmo vinho pode ser
comercializado por mais de um estabelecimento.
9. Verifique o estado de conservação da cápsula e rolha e a possível ocorrência de
vazamentos. Rejeite qualquer garrafa com sinais de vazamento ou com rolha
"saltada".
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10. Ao adquirir uma garrafa ou uma caixa de vinho, tenha consciência do valor
investido, não deixando, por descuido, que fiquem no interior do carro expostas ao
sol e no calor. Isto poderá comprometer a qualidade do vinho.
11. A relação qualidade x preço nos vinhos importados é importantíssima. Uma das
fontes que nos orientam com clareza neste parâmetro é o contacto com
apreciadores e conhecedores de um bom vinho! Muitas vezes, por exemplo, um
vinho chileno, possui uma relação qualidade x preço mais vantajosa que muitos
vinhos famosos e tradicionais.
12. Como o "hobby" do vinho não é barato, não deixe de sempre solicitar o tradicional
DESCONTO, por ocasião da compra.
13. Um dos itens que devemos levar em consideração para a aquisição de um
determinado vinho, é a ocasião e em companhia de quem iremos degustá-lo.
Muitas vezes, numa situação onde os convidados não possuem "boca" para a
degustação de um ótimo vinho, não é conveniente que o sirvamos. Um grande
vinho deve ser curtido e reverenciado por seus degustadores e apreciadores.

CÁPSULAS

A cápsula recobre a rolha e o gargalo da garrafa. Oferece à rolha uma certa proteção
contra ataque de bactérias e organismos que podem danificá-las. As cápsulas tradicionais
são feitas de chumbo. As cápsulas feitas com liga de estanho/alumínio entraram no
mercado a partir de 1992, para evitar os potenciais danos à saúde causados pela cápsula
de chumbo. Alguns produtores e negociantes codificam suas cápsulas em cores, para
distinguir os diferentes tipos de vinhos, porém não existe um padrão universal para essa
identificação. Os vinhos de menor preço são encapsulados com plástico.
Além de sua função protetora, as cápsulas trazem o nome e o brazão impressos na parte
superior, o que ajuda a identificar as garrafas quando as etiquetas não estão visíveis.
Nunca sirva um vinho antes de cortar a cápsula pelo menos 0,5 cm abaixo do "bico" da
garrafa, para que o vinho não seja contaminado.

Rolhas de Cortiça, Rolhas Sintéticas ou Tampas de Rosca, eis a questão.

Nos últimos tempos, uma questão vem se tornando o centro das discussões quando o
assunto é a forma de se tampar uma garrafa de vinho. Tudo porque a velha e confiável
rolha, que há alguns séculos vem cumprindo a nobre missão de preservar o vinho nosso
de cada dia, mantendo-o longe do alcance do oxigênio e de outras ameaças ao precioso
líquido.
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Com o passar dos anos, a cortiça está se tornando cada vez mais cara e rara, levando
inevitavelmente à busca de alternativas ao seu uso. No entanto, o que parecia muito
simples, na prática se mostrou muito mais complicado, pois além da tecnologia, há no
assunto uma boa dose de romantismo e tradição. Mas será que é só isso mesmo ou
existem outras variáveis envolvidas nesta questão? É o que iremos tentar decifrar,
percorrendo os caminhos desta mudança.

Um pouco de história

Em Portugal, entre os séculos XVII e XVIII, quando nossos antepassados buscavam uma
maneira de tampar as garrafas que transportariam os vinhos do Douro para Londres,
diversas tentativas foram feitas com trapos, madeira e até com o próprio vidro, até que se
descobriu que a rolha feita de cortiça seria o ideal.

A rolha de cortiça feita com a casca do sobreiro, que os árabes já usavam séculos antes,
seria a tampa ideal para conservar aquele vinho em perfeitas condições.

Até então, salvo esparsas tentativas com a rexina, que era a resina do pinheiro ( usada
pelos gregos para tentar conservar as ânforas de vinho 6 séculos A.C.) , na maioria das
diversas regiões produtoras, os vinhos eram guardados em talhas, ânforas, barricas e
tonéis, num processo totalmente aeróbico e sem nenhum cuidado de controle de
temperatura e higiene tornando-os muito menos agradáveis do que são hoje .

A “doença da rolha”

Essa tampa feita de cortiça atravessou mais de três séculos, porém tinha ainda um sério
problema: até pouco mais de 20 anos atrás, 10 a 20% das garrafas apresentavam a
chamada doença da rolha que tecnicamente é a contaminação do vinho por um composto
químico, o 2,4,6 tricloroanisol (TCA), formado durante o processo de produção da rolha.
Nesse caso o vinho apresenta um desagradável aroma de mofo e dizemos que o vinho
está bouchonée. Com a evolução das técnicas de produção e dos métodos de
esterilização da cortiça, esse índice foi diminuindo, sendo que há dez anos o índice de
garrafas com problema na rolha estava em torno de 7%, acreditando-se que hoje seja
ainda menor, na casa dos 5%, como citado no Harpers Wine and Spirit Weekly em maio
de 2003.

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Claro que as diversas qualidades de sobreiros produzem diferentes tipos de casca e
conseqüentemente diferentes níveis de qualidade de cortiça, mas a maior parte das
rolhas de boa qualidade vem da Península Ibérica, fazendo de Portugal e Espanha os
maiores produtores individuais do mundo, responsáveis por 50% da produção total.
Outros países, principalmente do oriente produzem uma parte dos outros 50 % da cortiça
destinada às rolhas dos vinhos.

Os principais tipos de rolha de cortiça são: a Interiça ou Maciça, a Twintop que seria um
sanduíche de duas partes de cortiça maciça com um recheio de aglomerado de cortiça no
meio; a Altec, uma rolha de aglomerado de pedaços de cortiça de bom tamanho e
conseqüentemente de melhor qualidade e a rolha de Aglomerado Simples usada por
vinhos mais baratos.

Hoje podemos dizer que realmente a cortiça natural caminha para uma grande (de 60 a
80%) redução do TCA pois Amorim, o maior produtor de cortiça do mundo criou um novo
processo industrial que irá reduzir ainda mais a doença da rolha, conhecido por ROSA
(rate of optimal steam application, ou índice ótimo de aplicação do vapor), que é um
processo de esterilização da rolha com vapor.

Antes do ROSA, a Amorim havia criado um sistema de esterilização das mantas de


cortiça individualmente, com uso de água fervendo Junto com este sistema, a Amorim
utiliza o CONVEX (continuous volatile extraction ou extração contínua de voláteis), onde
as substâncias voláteis presentes na água, geradas durante o processo de cozimento são
removidas concomitantemente.

Sabaté, o segundo maior produtor de cortiça do mundo reuniu há pouco mais um ano, um
grupo de diversos especialistas para mostrar na CEA (Comissão de Energia Atômica da
França em Montelimar na Provença) seu moderno e revolucionário processo de extração
do TCA pelo uso gás carbônico em estado supercrítico, conhecido como Diamant, o qual
reduzirá o TCA em 97%, porém isso não será muito estimulado enquanto sua nova
fábrica não estiver pronta.

Este é um conceito difícil de explicar, mas basicamente consiste em usar o gás carbônico
em condições extremamente particulares de temperatura e pressão, onde se consegue
que a substância consiga penetrar na cortiça como um gás e ao mesmo tempo consiga
retirar as substâncias voláteis como se fosse líquido.
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O surgimento das rolhas sintéticas

Com a evolução dos processos de produção dos vinhos, com a melhoria da qualidade dos
clones dos diversos tipos de uva, a escolha dos melhores terroirs (ou melhores locais
para plantio das diferentes varietais), também no campo das rolhas surgiram novas
pesquisas. A grande mudança do perfil médio dos vinhos obrigou a uma mudança
equivalente na qualidade das rolhas. Todos sabemos que as produções de cortiça não
podem ser expandidas facilmente, pois além de ser um produto natural, dependem do
sobreiro, que leva cerca de dez anos para desenvolver uma espessura mínima de cortiça
(casca). Todos esses fatores acabaram estimulando a pesquisa para o desenvolvimento
de rolhas sintéticas.

Inicialmente houve um certo preconceito, pois muitos tradicionalistas não podiam aceitar
uma rolha plástica para aquele produto tão artesanal, tão cuidadosamente manipulado e
tão nobre. Mas com o tempo, aparentemente esse preconceito vem diminuindo dia a dia,
mesmo porque nos testes cegos desenvolvidos pelos grandes institutos de pesquisa,
observa-se que de fato os vinhos correntes com rolhas sintéticas se apresentam tão bem
ou mesmo melhor do que aqueles arrolhados com cortiça.

Falo dos vinhos correntes, que são aqueles mais simples, produzidos para o consumo
imediato ou a curto prazo, ou seja, não destinados a longos períodos de guarda. Isso
pode ser testado na prática, experimentando diversos vinhos argentinos, chilenos,
americanos, italianos, etc... , que usam esse sistema de fechamento da garrafa.

As rolhas sintéticas vêm sistematicamente demonstrando um bom nível de qualidade no


que diz respeito à impermeabilidade, elasticidade, resistência, e aquelas que
demonstram maiores níveis de similaridade com a cortiça conseguem preservar a
qualidade dos vinhos, deixando-os livres da temida doença da rolha. Essas são as rolhas
conhecidas pelos nomes de Auscork, Aegis, NuKork, Supremecorq, Nomacork.

Outras que não vêm obtendo os mesmos resultados, e pelo contrário, têm apresentado
resultados críticos e até medíocres nas pesquisas e testes são a Tag e a Ecorc, sendo a
pior de todas conhecida por Betacorque.

ScrewCap, a revolucionária tampa de rosca

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Paralelamente a tudo isso surge outra forma de se tampar o vinho: a ScrewCap ,
conhecida por ROTE (roll-on tamper evident), a nossa Tampa de Rosca. Só para lembrar,
esse tipo de tampa é encontrado nas garrafas de destilados, nos vidros de azeite, e em
diversos tipos de líquidos, até nos remédios.

Hoje grande parte dos vinhos da uva riesling australianos e os da uva sauvignon blanc da
Nova Zelândia já são fechados com esse tipo de tampa, conhecida naqueles países por
seu nome comercial, Stelvin. Tudo isso devidamente endossado pelo AWRI (Instituto de
Pesquisas do Vinho da Austrália). Vinhateiros de diversos países vêm adotando este
método com muito sucesso e os testes mostram que de fato os resultados são positivos.
Fala-se que muitos testes já estão em curso em países europeus, inclusive na França.

Os mais recentes estudos sobre a eficiência das tampas de rosca, mostra que elas
realmente vedam totalmente a garrafa, impedindo a entrada de ar de forma muito eficaz.
No entanto, o que poderia ser uma vantagem, pode estar conspirando contra o uso deste
tipo de tampa, pois em algumas garrafas que as utilizaram, surgiram preocupantes
aromas e sabores de borracha.

Estes aromas indesejáveis podem ter se originado em enxofre reduzido, processo


químico causado pela ausência de oxigênio. Peter Godden, autor da experiência, é
enfático em dizer textualmente que “esta é uma importante característica dos vinhos que
usam tampas de rosca e nós fizemos esta comunicação para evitar que se fizesse o
engarrafamento em massa de vinhos em condições extremas de ausência de oxigênio,
vedando-os posteriormente com tampas de rosca, o que poderia acarretar o aparecimento
posterior destes aromas indesejáveis de borracha”.

A partir desta constatação, uma pergunta fica sem resposta: será que nós realmente
precisamos de uma vedação perfeita? O que realmente se procura é algo que vede o
vinho tão bem quanto a rolha de cortiça, mas sem os riscos da contaminação pelo TCA.
Não queremos nada melhor que a rolha, pois isto poderá acarretar mudanças que não
desejamos na evolução a longo prazo de nossos prezados e valiosos vinhos de guarda.

Dizem que os grandes produtores franceses despendem altos valores em pesquisas


sobre rolhas sintéticas e screwcaps, com a justificativa que estes investimentos poderão
retornar na forma de melhoria na qualidade dos vinhos, em melhor produtividade e até em
redução de custos, pois uma rolha de cortiça de boa qualidade, com 4 a 5 cm de
comprimento, custa mais de US$1.00.
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E o interesse mercadológico dos produtores de rolhas sintéticas, dos produtores de
cortiça, e dos fabricantes das máquinas automáticas de fabricar as tampas e das
máquinas de tampar as garrafas ? Há muito interesse envolvido neste assunto ! Só o que
podemos fazer é esperar os resultados do uso dessas rolhas e tampas nos vinhos mais
longevos e seu efeito sobre a evolução dos vinhos, pois os testes efetuados nos últimos
20 anos (quando foi inventada a rolha sintética) são com vinhos correntes, para serem
consumidos no curto prazo. Precisamos também esperar que haja disposição para se
efetuar esses testes com os vinhos de alto preço e prestígio, destinados à guarda por
longo tempo.

(Texto de Hélio Guedes, extraído da revista Wine Style 01 – usado sob permissão)

O ESTADO DA ROLHA

Após a retirada da cápsula de uma garrafa, devemos proceder um exame do topo da


rolha. Uma rolha totalmente limpa e sem vestígios de vazamento sinaliza que o vinho
contido naquela garrafa foi recentemente engarrafado ou reengarrafado. Com o passar
dos anos, a rolha se torna mais escura e a sua superfície, que fica em contato com o ar,
acumula pó e sedimentos, próprios da cave onde esteve armazenado. Se o rótulo disser
que o vinho possui dez anos, por exemplo, e a rolha parecer nova, é uma evidência
suspeita. Um antigo BORDEAUX, comprado diretamente no Château, pode ter uma rolha
que pareça mais jovem que o vinho, isto é justificável em razão de que um BORDEAUX
de ótima qualidade tem a sua rolha trocada a cada 25 anos, para oferecer assim, a
máxima proteção ao vinho.

DETALHES QUE PODEM SER NOTADOS NAS ROLHAS


1. Cristais: Inofensivo. Indicam que o vinho não foi superfiltrado; os vinhos brancos
podem desprender cristais de tartarato, se tiverem sido submetidos a baixas temperaturas
em algum momento de sua vida.
2. Secura: Cuidado! As garrafas podem ter sido armazenadas de pé, possibilitando o
encolhimento da rolha e a conseqüente entrada de ar na garrafa, causando oxidação do
vinho. Verifique se o líquido ainda poderá ser aproveitado.
3. Mofo no topo da Rolha: Inofensivo. Um armazenamento em condições úmidas pode
provocar o aparecimento de mofo na parte superior da rolha, sob a cápsula. Após abrir a
garrafa, deve-se limpar bem o seu bico e em seguida provar o vinho, antes de serví-lo.

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RÓTULOS
o Na França, frases como "Grand Vin", "Grande Reserve", ou "Cuvée Speciale" no
rótulo, não possuem um significado legal. De forma similar "Private Reserve", nada
significa nos Estados Unidos.
o Existe na França a "Appellation Controlée" – DOC, com normas e regras regidas
pelo governo.
o “Superieur” significa normalmente um teor alcoólico 1,0% mais elevado, o que não
melhora necessariamente a qualidade do vinho. Em geral, todavia, um vinho com
12% de teor alcoólico é preferível a um de 11%.
o Ter cuidado com vinhos alemães, seus rótulos trazem muitas informações, que
devem ser bem interpretadas.
o Nos vinhos da Austrália, Califórnia e Espanha são colocados os contra-rótulos,
com informações técnicas mais detalhadas, que o produtor julga importante para
os consumidores em potencial.
o Segue exemplo detalhado de rótulo de um vinho francês da região de
BORDEAUX:

ƒ Nome do Produtor do Vinho: “Chateau Latife Rothschild”


ƒ Ano da colheita: “1978”
ƒ Local onde foi engarrafado: “Mis en bouteilles au Château”
ƒ Comuna onde está situado o Château: “Pauillac”
ƒ Denominação de origem controlada: “Appelation Pauillac Controllé”
ƒ Teor alcoólico: “12,5%”

GARRAFAS

Os recipientes utilizados para armazenar ou guardar o vinho são tão importantes, que
podemos dividir a História do Vinho em três fases, de acordo com o recipiente:

1. Fase do Barro: Utilizavam-se ânforas de barro cozido (cerâmica) e o vinho só podia


ser conservado misturado ao mel ou resinas, tendo que ser diluído para ser bebido. Sua
fase mais conhecida foi dos gregos e romanos, até o ano 1000 DC.
2. Fase do Tonel: Iniciada a partir da descoberta das vantagens do casamento do vinho
com a madeira e de seu desenvolvimento em contacto com a mesma. Havia, porém,
problemas sérios de conservação, pelo contacto do oxigênio com o vinho dentro do tonel,

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a partir de sua abertura e, de praticidade, pelos enormes volumes dos tonéis, o que
dificultava a guarda do vinho nas residências.
3. Fase da Garrafa: Iniciada no final do século XVII, com a invenção, na Inglaterra, da
garrafa de vidro forte, semelhante em espessura à conhecida hoje, já que antes disto,
existiam garrafas de vidro fino e pouco resistentes. Em consequência, modificou-se
totalmente a técnica de vinificação, surgindo os vinhos de guarda, os espumantes e uma
utilização mais adequada da cortiça, conhecida e usada como tampa da ânforas desde os
tempos da Roma Antiga.
Apesar dos avanços tecnológicos, e tentativas de substituição por outros tipos de
recipientes - papel especial ou plásticos - o vidro, pela sua inércia de reação e ausência
de odor, permanece soberano para a conservação do vinho por períodos prolongados. A
forma das garrafas - embora possa em alguns casos obedecer a critérios técnicos e
funcionais, por exemplo a indentação inferior nas garrafas de champagne - habitualmente
difere, por motivos de tradição regional.
A cor da garrafa tem grande importância na proteção do vinho contra as diferentes
radiações de luz solar, sendo por isso preferível as de cor verde ou marron às incolores.

LEMBRAR QUE:

As garrafas menores fazem o vinho amadurecer mais rapidamente e, são habitualmente


mais caras; prefira comprar vinhos doces (de sobremesa) nessas garrafas.

As garrafas magnun são consideradas como ideais para a guarda de vinhos e por isso,
em relação aos grandes vinhos de BORDEAUX e da BOURGOGNE, seu preço é maior.

Relação Vinho/Pessoa - O cálculo clássico em um jantar é de meia garrafa por pessoa.


Esta relação se aplica a um jantar informal ou estilo "buffet", com poucos vinhos servidos -
em média dois, um tinto e um branco. Caso haja mais tipos de vinho disponíveis, o
consumo tende a crescer.
Vinhos com sedimento, necessitando decantação, proporcionarão menos copos.

Em caso de refeições, calcule grosseiramente 8 a 10 copos de vinho por garrafa de 750


ml; tratando-se de degustação de 13 a 14 copos por garrafa.

ADEGA

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É de suma importância a maneira de conservação e/ou guarda de nossas garrafas de
vinho, para que as características do líquido se mantenham adequadamente e ele possa
evoluir normalmente pelos anos.
As garrafas devem sempre permanecer deitadas para evitar o ressecamento da rolha e,
conseqüentemente impedir a entrada de oxigênio, o que poderia provocar a oxidação do
vinho.
São três cuidados básicos que devemos tomar na escolha de um local para a instalação
de uma adega:

1. Não devemos ter um gradiente térmico no ambiente, isto é, a alternância de


temperaturas. Caso isto ocorra, a solução é partir para um local refrigerado.
2. Não devemos ter luz intensa direta sobre as garrafas. O ideal seria um ambiente de
penumbra.
3. Não devemos ter vibrações de qualquer natureza no interior da adega.

4. Evitar a proximidade de materiais de limpeza, tintas, solventes, derivados de petróleo,


etc

Concluímos então que o ambiente ideal para uma garrafa de vinho é aquele com:
temperatura constante, sombra, ausência de ruídos e vibrações e longe de produtos
químicos.
Para quem mora em apartamento, o aconselhável é identificar um local adequado e ali
instalar um pequeno armário (climatizado - de preferência), que poderá conter até 200
unidades, com as seguintes dimensões:
Profundidade - 0.45m Altura - 2.50m Largura - 0.80m
Com prateleiras metalizadas e espaçamento de 10 cm entre elas.
Existem também os móveis climatizados, porém em nossa opinião, com o valor de um
investimento em uma pequena adega dessas ( para 60 garrafas por exemplo), pode-se
construir uma com três vezes a capacidade ( 180 garrafas ).
Devemos numerar os compartimentos ( números na horizontal e letras na vertical ), para
que possamos localizar a qualquer hora e com facilidade uma determinada garrafa.
Recomenda-se a manutenção de um livro ou caderno para anotações pertinentes ( data
da aquisição, preço pago, período provável de consumo, em companhia de quem
tomamos determinado vinho, com que alimento, etc ).

DICAS IMPORTANTES

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o O vinho deve ser conservado sempre deitado, para que atinja o seu ápice.
o A umidade relativa no interior da adega deve ser em torno de 65% a 75%.
o Evitar grandes variações de temperatura. Temperatura ideal – 14ºC a 17ºC.
o Longe da claridade (que acelera o envelhecimento), vibrações e produtos
químicos.
o Livre de aromas / cheiros estranhos.
o Para que não se percam os rótulos por fungos, mofo ou umidade, aconselhamos
ao se colocar a garrafa na prateleira, envolvê-la em um pedaço de plástico - tipo
“MAGIPACK” - protegendo-se o rótulo, ou aplicar uma camada de verniz incolor
(utilizado para fixar desenhos/pinturas), criando-se assim uma proteção
permanente para o rótulo.
o Ter um termômetro de máximas e mínimas instalado no interior da adega, bem
como um pequeno higrômetro.

RELAÇÃO QUALIDADE – CUSTO

Sendo o vinho considerado uma das mais sofisticadas bebidas e que possui uma enorme
gama de variedades, torna-se necessário ao consumidor conhecer certas regras básicas
que possam identificá-lo e, conseqüentemente, proporcionar prazer ao seu adquirente.
Algumas dessas informações já as temos em nosso poder - a linguagem do rótulo e a
análise da garrafa ( cápsula, rolha, nível do líquido ).
Por mais nobre que seja o vinho, trata-se de um produto comercial e, nos dias atuais, a
pergunta feita após degustarmos um vinho é: A garrafa vale o preço cobrado? Existem no
mercado, vinhos para todos os gostos e bolsos. " A única relação qualidade X custo que
devemos ter em vista é a nossa, de nada valem os parâmetros de outros países".

CONSUMO DO VINHO
"Quanto mais velho o vinho, melhor..." - frase muito utilizada, porém totalmente falsa.
Qualquer vinho, é preciso lembrar, está vivo! Caso você encontre algum já morto, é algo
que não necessita de uma palavra de um expert para anunciá-lo.
O vinho nasce, cresce, atinge o seu ápice e daí tende à decrepitude até a morte. O
grande segredo, é saber a hora correta de tomá-lo, seu auge.

Os vinhos para consumo diário são, em geral, elaborados para serem bebidos jovens. Até
os anos 70, a vinificação dos grandes vinhos (BORDEAUX, por exemplo) era feita de
modo que o seu auge fosse atingido em 15 a 20 anos. Hoje a tendência é de que se
antecipe esse auge para 7 a 10 anos.
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O consumo de um vinho depende fundamentalmente de como ele foi envelhecido, de
como ele foi conservado, de como ele foi transportado desde o seu engarrafamento na
origem até chegar ao nosso poder. Sendo o Brasil um país de clima tropical, torna-se
necessário tomar-se alguns cuidados na guarda e no manejo da garrafa, para que ela não
perca as principais características do líquido que contém.
Os vinhos tintos, sempre suportam melhor o envelhecimento que os brancos. Durante
vários meses após o engarrafamento, os vinhos finos ficam numa espécie de choque
silencioso. Não devemos abri-los imediatamente após essa operação, porém esperar
cerca de quatro a cinco meses, para então degustá-los. O mesmo pode-se dizer da
viagem que o vinho enfrenta até chegar ao mercado. Isto pode deixá-lo tão sem graça
quanto o engarrafamento. Devemos dar-lhes algumas semanas para repousarem.
A principal exceção é o Beaujolais Nouveau, cujo grande charme é ser bebido no próprio
ano de sua vindima. Sabe-se porém que ele melhorará substancialmente nos seis meses
subseqüentes ao seu engarrafamento.
Concluindo, diríamos que a abertura de uma garrafa de vinho, somente nos dará o prazer
total se for compartilhada com outras pessoas e mais ainda, se essas pessoas também
apreciarem o vinho.

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NOÇÕES DE ENOGASTRONOMIA

A multiplicidade de preparações culinárias, a diversidade de sabores dos alimentos e a


extrema variedade de estilos de vinhos fazem com que a harmonização eno-gastronômica
seja assunto complexo e controverso. A compatibilização vinho-alimento é antes de tudo,
questão de gosto pessoal. Todos temos o direito inalienável de consumir nossos pratos
prediletos com o vinho que nos parece oferecer a melhor combinação com eles. No
entanto, existem alguns “casamentos” consagrados pelo simples motivo que agradam à
maioria das pessoas que os experimentam. Por outro lado, pelas razões contrárias, há
combinações notadamente antagônicas. O mecanismo que regula estes “casamentos” é a
interação entre componentes químicos do vinho e do alimento. Pode ocorrer atenuação,
exacerbação ou neutralização de determinados sabores. Há, ainda, a possibilidade de
que novos sabores advenham do pareamento vinho-comida na boca. As combinações
eno-gastronômicas vêm sendo testadas ao longo dos séculos e várias “regras” foram
sendo criadas. Dentro das limitações acima expostas, essas regras servem como
diretrizes gerais, podendo ser quebradas quando o gosto pessoal assim o determinar.

"AS REGRAS"

o Carne vermelha ou caça com vinho tinto.


o Peixes ou frutos do mar com vinho branco
o Cada prato acompanhado de um vinho.
o Grandes vinhos com pratos simples.
o Combinações difíceis: Vinagre, frutas cítricas, ovos, aspargos, alcachofras,
chocolate. Pratos orientais: indianos, japoneses, tailandeses e coreanos.

Uma outra fonte de referência para as combinações de vinhos e alimentos é a tradição


cultural regional. Esta muitas vezes confirma as considerações acima. É fácil imaginar o
cordeiro de Pauillac acompanhado pelo vinho de Bordeaux ou o “boeuf bourguignone”
com um borgonha tinto. No entanto, nestas mesmas regiões observamos: Lampréias a
bordalesa - peixe de água doce cozido no vinho tinto; morangos com vinho tinto e, na
Borgonha, “oeufs en meurette” com molho de Borgonha tinto.

Certas harmonizações também podem refletir gostos regionais, que nem sempre são
generalizados: Sardinhas assadas com vinho tinto e Bacalhau com vinho tinto verde.
Seguem algumas combinações que são bem aceitas:

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o Ostras e Chablis.
o Salmão defumado e Riesling.
o Salmão fresco Chardonnay ou Riesling.
o Peixes brancos grelhados com molhos untuosos e Chardonnays.
o Queijo de cabra e Sancerre.
o Roquefort e Sauternes.
o Stilton e Porto.
o Presunto e charcutaria e Beaujolais.
o Presunto cru e xerez fino.
o Foie gras e Sauternes
o Cordeiro e Bordeaux tinto.
o Caça e Borgonha tinto.
o Pizza e massas com molho vermelho e Chianti.
Concluímos que os parâmetros são insuficientes para o planejamento da harmonização
de qualquer prato com vinho. Para tanto, são necessários princípios ao invés de
regras. Os princípios não revelam exatamente o que tomar para acompanhar
determinado prato, mas norteiam como se chegar ao vinho que poderá ser a melhor
escolha, em determinada situação. Devemos conhecer as características
organolépticas do vinho bem como as do prato. Para tanto, devemos conhecer os
ingredientes que entraram na composição da receita e como foram preparados,
lembrando que muitas vezes o ingrediente principal é um mero transportador dos sabores
determinados pelo molho. De posse desses dados, podemos combiná-los por
complementaridade ou por antagonismo.
Exemplos de combinações por antagonismo:
o Atenuar a acidez de um prato pela doçura do vinho.
o Avivar o paladar de um prato doce pela acidez do vinho.
o Opor a untuosidade da receita aos taninos e ácidos do vinho.
o Equilibrar a suculência do prato com vinhos mais encorpados.
o Equilibrar a condimentação de certos pratos com vinhos mais aromáticos.

Um exemplo clássico de harmonização por antagonismo é o do Roquefort com Sauternes:


o gosto extremamente salgado do queijo é atenuado pela doçura extrema do

vinho e sua untuosidade - mais de 90% de gordura - é equilibrada pela grande acidez do
vinho.

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Empregamos ainda, o princípio da complementaridade. Assim, uma sobremesa de
caráter doce predominante e sabores cítricos será harmonizada, por antagonismo, com
um vinho de acidez marcante mas que, complementarmente, também seja doce - para
não ressaltar a doçura do prato - e, se possível, apresente aromas de frutas cítricas.
As ostras, com sabor marinho lembrando iodo, harmonizam-se com os sabores minerais
do Chablis.

Nem sempre o resultado é previsível pois algumas vezes, a interação entre os


componentes cria novos sabores que podem ser agradáveis como os do queijo com o
vinho tinto ou desagradáveis, quando usamos um vinho tânico com peixe oleoso criando
um terceiro sabor que é um desastre. Pode haver sinergismo, quando a combinação
vinho e comida cria um efeito melhor que o vinho sozinho ou a comida sozinha ou
neutralidade quando o vinho e a comida seguem cada um seu caminho sem interferência
ou com pouca interferência um com outro.
O único modo de testar um “casamento” é, após levantar as hipóteses possíveis, degustar
o vinho e a comida conjuntamente analisando-se o resultado final. O único modo de
aprender como combinar vinho / comida é degustar vinho e comida conjuntamente.
Para uma refeição sem surpresas devemos nos ater às combinações consagradas. Uma
inovação bem planejada pode ser um grande achado. Experimente!

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O SERVIÇO DO VINHO

O cuidado em servir o vinho e os hábitos adquiridos ou as lendas que cercam o vinho não
contribuem para modificar os vícios ou as virtudes deste, mas podem ampliar
significativamente o prazer que ele pode nos dar.
Se existem taças, garrafas de cristal, decanters, e até mesmo rituais específicos para
determinados tipos de vinho, não é por necessidade física ou outra razão qualquer, que
não seja auxiliar a expressão dos variados prazeres sensoriais que este vinho pode nos
oferecer.
Ao consultar a literatura, encontraremos até menção a que “ao acentuar as diferentes
características do vinho e recordarmos suas origens, reforça-se a experiência, e podemos
mesmo torná-la memorável”.
Não é portanto por acaso que os vinhateiros franceses, ao adquirirem vinho, provem-no
com maçã verde, que aguça o paladar, e, ao contrário, ao venderem este mesmo vinho, o
sirvam com queijo, o qual amaciando o paladar esconde muitos dos defeitos que ele
possa ter.
Assim, ao se falar de serviço do vinho, logo afloram duas questões: O que é? Para que
serve?
A primeira indagação - “o que é” - tem resposta muito simples. É a forma como o vinho é
servido, o estabelecimento da seqüência dos vinhos de uma refeição, escolha da técnica
e o tipo de saca-rolhas utilizados para abrir as garrafas, a avaliação da necessidade de
decantação e assim sucessivamente.
Quanto à questão - “para que serve?” - a resposta não é mais complexa: Para extrair de
uma garrafa de vinho o máximo de prazer que ele nos pode oferecer. Em poucas
palavras, de nada adianta estarmos diante do mais maravilhoso vinho do mundo, se não o
servirmos adequadamente, pois sem os cuidados, que serão mais detalhados adiante, ele
não exibirá todo o seu potencial nem todas as suas qualidades.
Evidentemente, não se pode falar em serviço sem antes abordarmos a figura do
“sommelier” - figura absolutamente identificada com o serviço do vinho.

A língua portuguesa é a única que traduz este termo, para “escanção”, podendo ser
encontrado no Dicionário Português/Francês de Paulo Ronai a tradução como “garçom
encarregado das bebidas”. Já em definição menos simplista, Aurélio Buarque de Holanda
define o escanção como “aquele que punha o vinho na copa e a apresentava ao rei” e
“aquele que dá de beber aos convidados”.

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Claro está pelas definições acima que se trata de profissão milenar, que encontramos
desde a Antigüidade e que a essa época era exercida por nobres. A comida, por outro
lado, no Antigo Egito, era servida por escravos.
Encontraremos referências ao “sommelier” no Egito, na Grécia, no Renascimento, etc.
Sua presença já é descrita desde o tempo dos assírios e babilônios e no início das
primeiras dinastias egípcias.
Entre os gregos esta função era exercida pelos arcontes ou simposiarcas, que tinham a
missão de servir os vinhos, escolhendo os jarros e taças de vinho.
Na antiga Roma, encontramos os mesmos durante os banquetes (os "prandii"), sendo
entitulado de "Rex Bibendi".
Durante a época do Renascimento, generalizou-se o hábito entre os nobres de possuir
um copeiro, auxiliado por um garrafeiro.
Em 1700, esse profissional aparece citado nos éditos do Duque de Savoia, com o nome
de "Somegliere di bocca e di corte", citando-se nos mesmos o direito do próprio utilizar um
anel com as iniciais ducais para lacrar as barricas de vinho.
O instrumento do “sommelier” para provar o vinho era o taste-vin, do qual conhecemos
diversos tipos. É um recipiente de metal (preferivelmente prata) que o sommelier usava
pendurado como um colar. O tipo mais conhecido era o “borgonhês”, no qual podemos
identificar uma grande bolha (elevação) ao centro, que delimitava o nível de vinho que
deveria ser servido, já que ela jamais deveria ser coberta.
Tem pequenas “pérolas” ou saliências que servem para auxiliar a oxigenação do vinho;
pequenas nervuras que se destinam a auxiliar a observação das tonalidades dos vinhos
brancos e finalmente ligeiras depressões que auxiliam a observação das tonalidades dos
tintos.
Existem taste-vins de outras regiões produtoras de vinhos, como por exemplo os taste-
vins de Bordeaux ou da região do Porto.
É importante ressaltar, entretanto, que atualmente estas peças são meramente
decorativas, sendo os copos o recipiente apropriado para provar o vinho.
A figura do sommelier, por outro lado, ainda se encontra presente nos bons restaurantes.
É o profissional que deverá auxiliar o cliente a escolher o vinho que melhor se
compatibilize com o prato escolhido e proceder ao seu serviço. Certamente, uma
compatibilização perfeita tornará a refeição memorável e inesquecível. Nos grandes
restaurantes, o sommelier é o responsável pela elaboração da carta de vinhos bem como
sua escolha, compra e armazenamento adequado.

Feitas todas essas considerações preliminares, é hora de iniciarmos o serviço


propriamente dito. O serviço do vinho, evidentemente, deve começar com a abertura da
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garrafa. E para procedermos à abertura da garrafa temos de começar pela remoção da
cápsula que envolve a rolha.
Podemos dizer que a esmagadora maioria das garrafas de vinho vem vedada com rolha e
cápsula, quase sempre de chumbo e, mais raramente, de alumínio ou plástico.
Vinhos de má qualidade podem ser vedados com tampas de metal que lembram os
refrigerantes e envoltos com cápsulas plásticas.
Dessa maneira iremos comentar sobre os vinhos que realmente nos interessam, ou seja,
vedados com rolha e envoltos com uma cápsula de metal (chumbo).
Temos aqui que fazer uma opção: iremos decantar, ou não, o vinho? E já que tocamos
nesse assunto, o qual é deveras controvertido, é oportuno responder às mesmas
perguntas iniciais do serviço do vinho, quais sejam, “o que é?” e “para que serve?”.
Decantar é, após manter a garrafa em pé durante o tempo suficiente para que a matéria
em suspensão (borra) deposite no fundo, passar delicadamente o vinho para um
decanter, que nada mais é do que uma garrafa de cristal de modo que o depósito
permaneça na garrafa original. Para facilitar a trasfega do líquido e a separação da borra
podemos ainda lançar mão de um funil com ou sem filtro.
A questão da decantação é uma questão controvertida. Há aqueles que são favoráveis à
decantação, há aqueles que são absolutamente contrários à mesma.
Definitivamente, não há sentido em decantar vinhos brancos pois não há borra.
Entretanto, muitos conhecedores recomendam a passagem dos grandes vinhos brancos
para um decanter a fim de promover a sua aeração que auxilia a liberação dos aromas.
No que diz respeito aos tintos, entendemos que duas são as condições que justificam a
decantação: Vinhos muito jovens, que irão se beneficiar do contacto com o oxigênio ao
serem transferidos da garrafa para o decanter e vinhos muito antigos, que freqüentemente
apresentam borra.
Feita a opção de decantar (ou não), passaremos à abertura da garrafa. Se não formos
decantar, cortaremos a cápsula logo abaixo da rolha (a coroa), até porque esta tem um
efeito decorativo.
Utilizamos uma pequena faca, ou a lâmina que existe em muitos modelos de saca-rolhas
ou, ainda, um desencapsulador, que é um pequeno aparelho que envolve a cápsula e
com o auxílio de uma lâmina interna corta a cápsula na altura da coroa.
Se a nossa opção é decantar o vinho, devemos retirar toda a cápsula, para facilitar a
visualização do depósito no momento da decantação, visualização essa que é facilitada
quando, no processo, utilizamos alguma fonte de iluminação (uma vela, por exemplo)
atrás do gargalo da garrafa.

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A retirada das cápsulas de cera - que encontramos em alguns vinhos do Porto e vinhos
de mesa (particularmente os portugueses) - provoca muita sujeira, daí recomendarmos
serem retiradas na cozinha.
Retirada a cápsula, devemos sempre limpar o gargalo, com o auxílio de um guardanapo,
preferivelmente, de pano.
A próxima etapa é a retirada da rolha. Existe uma infinidade de tipos de saca-rolhas como
o clássico (ou profissional), com alavanca cuja espiral (ou “rabo de porco”) deve ter um
mínimo de cinco voltas completas, pois parafusos menores tornam muito difícil a retirada
de rolhas maiores. Existem, também, os saca-rolhas com sistema “screwpull”, de espiral
longa, no qual após girarmos a alavanca até o ancoramento da camisa na borda da
garrafa, prosseguimos a rotação da espiral que começa a tracionar e extrair a rolha. Os
“espaciais”, também utilizam o sistema “screwpull”, porém são mais sofisticados.
Para rolhas mais difíceis, geralmente muito longas, de vinhos envelhecidos (Bordeaux de
vinte anos, por exemplo), podemos nos valer do “amigo do mordomo”. Trata-se de um
dispositivo com duas hastes metálicas paralelas, que iremos encaixar entre a rolha e o
vidro, e girar lentamente até a rolha sair.
No caso de sermos obrigados a jogar a rolha para dentro da garrafa, ou esta ali cair,
poderemos sempre nos valer do “cork lift” ou pescador, que é um instrumento que nos
permite “pescar” a rolha de dentro da garrafa.
Ainda poderemos nos deparar com rolhas muito antigas, geralmente em vinhos do Porto,
que apesar de ainda vedarem a garrafa, já estarão esfareladas, sendo daí necessário nos
valermos de uma tenaz, e procedermos então o que se denomina “abertura a fogo”.
A tenaz lembra um quebrador de nozes do tamanho de uma tesoura de jardim.
Aquecemos a tenaz no fogo, e a aplicamos, em brasa, exatamente abaixo da rolha. A
seguir, colocamos um pano úmido exatamente aonde acabamos de colocar a tenaz em
brasa. Repetimos essa operação quatro ou cinco vezes e a garrafa de vidro se parte, sem
deixar nenhum caco.
Retirada a cápsula e extraída a rolha limpamos novamente o gargalo.
Um capítulo à parte deverá ser dedicado à abertura de champagnes e espumantes. Em
decorrência do processo de dupla fermentação a que estas bebidas são submetidas elas
têm gás, que é o que nos dá a sensação de “borbulhar” na boca, sendo até visualmente
fácil de verificar este gás, após servido o líquido no copo.
Para conservar este gás, portanto, devemos evitar o estouro, muito bonito em festas ou
passagens de ano, mas que elimina parte do gás destes vinhos. Pelas mesmas razões,
ou seja, de se evitar o estouro, devemos evitar sacudir a garrafa.
Devemos sempre ter à mão um guardanapo, pois é muito comum, quando da abertura,
por causa do gás, parte do líquido vazar da garrafa.
90
Assim, como nos vinhos de mesa, devemos extrair a cápsula, quando se trata de um
espumante ou champagne, devemos retirar sua cápsula, abrir a “gaiola” e começar a
retirar a rolha em movimentos circulares ou em alavanca, sempre protegendo os olhos e
mantendo o polegar sobre a rolha para evitar um estouro que poderá inclusive machucar
quem estiver abrindo a garrafa ou mesmo alguém que esteja no interior da sala.
Existem, evidentemente, outras formas de se abrir uma garrafa de champagne ou
espumante. Existem os abridores, que têm como grande desvantagem não permitir que
se evite o estouro. Existe também a abertura a sabre, que consiste em correr um sabre
pela garrafa até que este encontre uma saliência exatamente abaixo da rolha, quando a
garrafa, que por causa do gás se encontra sob pressão, rompe naquele ponto.
Chegada a hora de servir o vinho, devemos segurar a garrafa mostrando o rótulo, enlaçá-
la cuidadosamente ou, no dizer dos românticos, “como a uma mulher”, dar a rodadinha
final após servirmos o copo para evitarmos pingos na toalha. Existe uma série de
apetrechos para tentar evitá-los.
O melhor copo para se servir o vinho é indiscutivelmente o copo oficial de degustação,
“ISO", o qual possue medidas específicas:
Diâmetro da borda = 46mm, tolerância de + ou – 2mm.
Altura do bojo = 100mm, tolerância de + ou – 2mm.
Diâmetro da parte mais larga = 65mm, tolerância de + ou – 2mm.
Altura da haste = 55mm, tolerância de + ou – 3mm.
Diâmetro da haste = 9mm, tolerância de + ou – 1mm.
Diâmetro da base = 65mm, tolerância de + ou – 5mm.
Altura total = 155mm, tolerância de + ou – 5mm.
Capacidade total = 215m, tolerância de + ou – 10ml.
Espessura do vidro = 0,8mm, tolerância de + ou – 0,1mm.
Material de cristal transparente e incolor, com 9% de chumbo.

A razão de serem os copos transparentes e incolores é para que possamos melhor


apreciar e julgar as nuances de tonalidade dos vinhos.
Já o desenho mais bojudo em baixo e com menor diâmetro em cima se destina a permitir
a expansão dos aromas e direcioná-los ao nariz, para podermos melhor apreciá-los.
Evidentemente, há copos específicos para determinadas regiões produtoras de vinhos,
como os copos para Chianti, para Borgonha, as flûtes de champagne, etc. Entretanto é o
copo oficial de degustação que melhor serve para se analisar os vinhos de uma maneira
geral e é nele que se realizam degustações em qualquer parte do mundo.
Os copos coloridos, os lapidados, as taças rasas de champagne podem ser excelentes
objetos de decoração, mas, definitivamente, não servem para a degustação de vinho.
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Entretanto, como toda regra têm sua exceção, existe um copo lapidado, que é específico
para a região produtora alemã do Mosel.
Talvez fosse até desnecessário dizer, mas os copos devem estar limpos, sem odor de
detergente ou de armário fechado e brilhantes. O crítico de vinhos Hugh Johnson, inglês
que é reputado como um dos maiores conhecedores de vinho do mundo, sugere que “o
ideal é enxaguá-las com água quente e lustrá-las à mão, processo mais fácil enquanto as
taças ainda estão quentes. Não deve estar aderido nenhum fiapo de pano”.

Outra questão a ser abordada é a que diz respeito à conservação dos vinhos após a
abertura, pois é muito freqüente não ser possível consumir a garrafa inteira. Infelizmente
ainda é pouco comum em nosso mercado a “meia garrafa” de 0,375 ml, muito
conveniente em diversas ocasiões.
Os equipamentos de conservação em nitrogênio, não obstante serem excelentes para
restaurantes e bares que servem vinhos em taça, não são de uso prático para
consumidores domésticos.
A estes resta o uso do “vacuvin”, que consiste em uma tampa de borracha, que por ter um
pequeno canal, valvulado na sua abertura, permite com o auxílio de uma bomba de
sucção, a retirada do ar (ou de grande parte dele) que se encontra no interior da garrafa,
retardando o processo de oxidação que se inicia após a abertura da garrafa de vinho.
Outro conselho importante é guardar a garrafa de vinho parcialmente consumida na
geladeira, pois as baixas temperaturas inibem e retardam o processo de oxidação.
Quanto à questão da temperatura de serviço, costuma-se dizer que os vinhos brancos
devem ser gelados e os tintos servidos à temperatura ambiente.
Acreditamos que aí reside o maior erro a ser cometido. Os vinhos tintos devem, sim, ser
servidos à temperatura ambiente. Só que à temperatura ambiente da Inglaterra, e nunca
as do Brasil, que chegam facilmente aos trinta ou quarenta graus centígrados.
Poderíamos sugerir as seguintes temperaturas de serviço de vinhos:
o Espumante doce 7 a 8 Cº
o Espumante Brut 6 a 8 Cº
o Brancos Suaves e Doces 8 a 9 Cº
o Brancos Secos 10 a 12 Cº
o Rosés 12 a 14 Cº
o Tintos Leves 12 a 15 Cº
o Tintos Tânicos 16 a 20 Cº
É bastante significativo que a tabela acima seja encontrada, com mínimas diferenças, em
toda a literatura especializada.

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Como saber quando o vinho está na temperatura correta? Termômetros confeccionados
especialmente para mensurar a temperatura de vinhos são hoje facilmente disponíveis no
mercado.
Ao controlar a temperatura de serviço do vinho, é importante ter em mente que: quanto
mais quente o vinho, mais se realçam o açúcar e o álcool e quanto mais frio, mais
se realçam a acidez e o tanino.
Assim, ao refrescarmos um vinho pouco tânico (por exemplo, um Beaujolais), não
correremos maiores riscos, pois não haverá taninos a realçar. Ao contrário, ao
refrescarmos um Barolo, extremamente tânico, deveremos ser cuidadosos, pois ao
refrescarmos em demasia o mesmo ficará imbebível, alguma coisa como uma lixa na
língua.
Por outro lado, ao não refrescarmos um vinho quando necessário, a sensação de álcool e
açúcar realçada, irá tornar o vinho bastante desagradável.
Existem algumas regras sobre a sucessão dos vinhos à mesa, as quais passamos a
expor, apesar de algumas delas serem de clara obviedade: primeiro os brancos, a seguir
os rosados e por último os tintos; primeiro os mais jovens e a seguir os mais velhos;
primeiro os mais secos e a seguir os mais doces; primeiro os mais leves e a seguir os
mais encorpados; e, evidentemente, primeiro os piores e por último os melhores.
Estas regras se devem basicamente aos seguintes fatores: durante a refeição aumenta
a sensibilidade aos ácidos e diminui a sensibilidade aos taninos; o que nos conduz à
regra geral de começar com mais frescor, a seguir servir o vinho mais macio e por
derradeiro o mais tânico.
Surge aqui uma questão natural. Já somos especialistas em abrir uma garrafa de vinho, já
sabemos a que temperatura servi-lo, já sabemos até a ordem preferível dos vinhos em
uma refeição. Mas vamos a um restaurante e o sommelier ou, lamentavelmente no mais
das vezes, o maitre, pela ausência de um sommelier, nos entrega a carta de vinho. Aí,
com efeito, começam a surgir os problemas complicados. Infelizmente, na maioria das
vezes, ao invés da carta de vinhos nos dar informações precisas, nos oferece um nome

qualquer, como “Chateauneuf du Pape”, às vezes com o ano (mas muitas vezes nem o
ano da safra fornece) e o preço (muitas vezes, infelizmente, escorchante).
A Carta de Vinhos, se bem elaborada, deveria fornecer diversas informações: o nome; o
tipo de vinho; o ano da safra; o produtor (ou a informação de ser um vinho de
negociante); o país de origem; a capacidade da garrafa; e, obviamente, o preço.

Os critérios que devem nos orientar quando escolhemos o vinho em um restaurante foram
bem definidos pelo crítico de vinhos e gastronomia Saul Galvão: “Ninguém deve ficar
93
intimidado pelo ambiente e por isso pedir algo caro, de prestígio. Pode-se sempre ficar
com um razoável, que esteja num bom preço. É o vinho que deve ajustar-se ao seu bolso.
Além disso, por que pedir um vinho de classe, se ele não é tratado com cuidado? Esses
especiais são melhores em casa, ou então nos restaurantes que os respeitam e tratam
bem. Essas exceções devem ser prestigiadas”.
Ainda sobre a carta de vinhos, há que se comentar que alguns poucos restaurantes a
fazem como deve ser, e ainda menos a adaptam ao objetivo do restaurante. Se se trata
de um restaurante de cozinha italiana, obviamente é normal se prestigiar o vinho italiano;
se se trata de um restaurante de cozinha portuguesa, obviamente é normal se prestigiar o
vinho português, e assim sucessivamente.
Ainda há a questão da recusa do vinho por estar o mesmo deteriorado. A recusa pode ser
feita, basicamente, por duas razões: o vinho está oxidado ou “bouchonné”.
O vinho oxidado é basicamente aquele que não foi consumido dentro da época em que
deveria ter sido ou que foi mal conservado. Ficou oxidado. O papel do oxigênio não foi
descoberto até o ano de 1.863, quando Napoleão III pediu a Louis Pasteur que
averiguasse porque era tão grande a quantidade de vinho que se deteriorava em sua
viagem ao consumidor e que trazia grave prejuízo para ao comércio francês. Pasteur
demonstrou que um contato excessivo com o ar permite o desenvolvimento da bactéria do
vinagre. Por outro lado descobriu que as quantidades de oxigênio produzidas pela
maturação do vinho são muito pequenas; que a ação do oxigênio não é brusca mas
gradual, e que numa garrafa de vinho há suficiente quantidade dissolvida desse gás para
desencadear um processo de envelhecimento que dure anos.
Demonstrou também ao guardar vinho hermeticamente em tubos de ensaio cheios e
semicheios, alternativamente, que o oxigênio do ar presente no tubo de ensaio semicheio
produzia, em poucas semanas, a mesma borra (depósito) que se encontra nas garrafas
muito velhas, afetando sua cor exatamente como o faz numa idade muito avançada.
Tais descobertas aceleraram notavelmente o conhecimento do processo do que ocorre
numa garrafa. O oxigênio do vinho age sobre os componentes do mesmo para
amadurecê-lo, mas continua sua ação muito além do processo de maturação - é a partir
deste momento que o vinho se deteriora.
Os estudos de Pasteur sobre a questão da ação do oxigênio sobre os componentes do
vinho, amadurecendo-o e, após o término de seu processo de amadurecimento, passando
a deteriorá-lo, criaram os fundamentos do nosso conhecimento atual sobre vinhos, e o
porque ao nos depararmos com um garrafa descobrimos que ele está oxidado.
A outra das razões da recusa de um vinho é ele se encontrar “bouchonné”. Trata-se de
um fungo que ataca a rolha e altera sensível e maleficamente seu aroma e seu paladar.

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Evidentemente, o cliente pode recusar um vinho no restaurante sob estas condições e o
anfitrião deve poupar seus convidados de tomá-lo sob tais condições. A única ponderação
que teríamos a fazer é que, ao recusar um vinho em um restaurante, cabe ao cliente
solicitar outro, de valor análogo, pois o que se discute não é o custo do vinho, mas sim
sua qualidade.
Um último comentário é cabível no que tange ao papel atual do sommelier. A ele cabe
fazer a mais perfeita compatibilização entre o prato pedido pelo cliente e a bebida que
este possa consumir, evidentemente respeitado o valor que o cliente pretenda gastar, não
devendo o sommelier fazer sugestões de vinhos especiais, de custo muito elevado.
Pode, e deve, entretanto, fazer sugestões, observando os limites acima e respeitando o
estilo do restaurante em que trabalha, que permitam harmonizar melhor a refeição
solicitada pelo cliente com o vinho. Assim, certamente auxiliará a engrandecer essa
profissão, que é nobre desde a Antigüidade, e cujo nome escolhemos para a nossa
Associação.

BIBLIOGRAFIA

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Hugh Johnson & James Halliday: The Art and Science of Wine, 1992
Jancis Robinson: The Oxford Companion to Wine, 1994
Tom Stevenson: New Sotheby’s Wine Encyclopedia, 1997
Robison, Jancis - 1984 - How To Choose And Enjoy Wine
Robison, Jancis - 1982 - The Great Wine Book
Robison, Jancis - 1994.- The Oxford Companion To Wine
Beaulieu, François - 1979 - Les Vins Français
Johnson, Hugh - 1985 - How To Enjoy Your Wine
95
Johnson, Hugh - 1985 - The World Atlas Of Wine
Sutcliffe, Serena - 1982 - Manual De Los Vinos
Galvão, Saul - 1997 - Tintos e Brancos
La Revue Du Vin De France
The Wine Spectator Magazine
Decanter Magazine
The Wine Advocate

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