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Marcelo Neves
University of Brasília
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All content following this page was uploaded by Marcelo Neves on 14 November 2016.
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I 1994 I volume 37
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Neste número:
Ciência, Socialismo e Dçmocracia
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ISSN ooii-5253
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Secretária
O Conceito de “Revolução Permanente": Trotsky e o
Cláudia Boccia Elo Micro!Macro
Carlos Eduardo Rebello de Mendonça 221
CONSELHO DE REDAÇÃO '_
Charles Pessanha, Marcus Figueiredo e Ricardo Benzaqiien de Arau1o Entre Subintegração e Sobreiiitegraçãoz CCCCCCCC E J CEE: E
CONSELHO EDITORIAL A Cidadania inexistente
Marcelo Neves 253
Amaury de Souza, Antonio Octávio Cintra, Aspásia Alcântara de Camargo, Bolívar Laniounier, Candido Men-
des, Carlos Estevam Martins, Celso Lafer, Eduardo Diatay B. de Menezes, Fábio lilaiiderley Reis, Femarido Reformas Econômicas e Democracia no Brasil dos Anos 90:
Henrique Cardoso, Francisco Weffort, Guilleniio O'Donnell, Hélgio Trindade, Maria do Carmo Campello de
Souza, Mario Brodmann Machado, Otáiio Guilherme Velho, Roberto DaMatta, Roque de Barros Laraia, Ruth As Câmaras Setoriais como Fórum de Negociação
Correa Leite Cardoso, Simon Schwartzman, Vilmar Faria, Wanderley Guilherme dos Santos. Eli Diniz 277
Os conceitos emitidos em artigos assinados são de absoluta e exclusiva responsabilidade de seus autores. Lobbying, Troca e Definição de Interesses -
Reflexões sobre o Caso Americano
itizoiiciior assiuaruius Gigi Graziano 317
DADOS - Revista de Ciências Sociais
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RÉSUME
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]usqu'à présent, la théorie trotskiste dela “Revolution Pe11:nanente" a été étudiée comme INTRODUÇÃO
un cas particulier d'analyse marxiste du processus de modemisation économique et de
ses rapports avec le politique, par la voie de l'interpénétration entre la “modernité" et i
le ”retard". Toutefois, le fait que cette théorie ait reçu deux formulations diffénentes de A ciciadafiia
. - , stituindo
i _ vem se cor ' ' - frequentes
em um dos temas mais -- da re-
la part de son auteur permet de pensar que, dans sa formulation la plus récente, elle tórlca politica
` ce do discui
° so das Ciencias
' -. Sociais
.~ - no Brasil.
. A ampliaçao
. _ do
a probablement change de status conceptual: il ne s'agirait plus seulement alors de la debate “ã° ÍmPlíCa› POYÉHL univocidade do termo Ao contrário quanto mais
description particulière d'une particularité historique mais d'une théorie concemant les 5° fala de Cidadania, mais ambígua se torna a expressão '
mécanismes de base déterminant le phénomène riévolutionnaire lui-même. C'est là ce
que nous nous sommes efforcé de developper. D3 meslflfi mãnêira, a retórica dos direitos dos cidadãos intensifica-se e estende
se quanto menores forem as condições estruturais e conjunturais de sua reali-
zação. Daí porque a cidadania, mesmo quando incorporada ao texto constitu-
cional por meio da abrangência da declaração de direitos é principalmente
um termo-questão de política simbólica.
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política. A cidadania ficaria restrita aos “direitos políticos”. hoje, o que não seria possível no período individualista dos direitos.
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Essasemãíritica estrita ultrapassou, porém. os modelos teóricos liberais, tendo Por fim, e como quinta fase no desenvolvimento do conteúdo da cidadania,
sido adotada por Marx na “Questão ]udaica'fl onde ele vai distinguir dos surge a noção de discriminações inversas. Dworkin, por exemplo, analisando
Menschenreafite (direitos humanos), definidos "como os direitos do membro reconstrutivamente a jurisprudência da Corte Suprema norte-americana, ar-
da sociedade burguesa, isto é, do homem egoísta'Í. os direitos politicos, que gumenta no sentido de que tais discriminações positivas em relação aos me-
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mí-_
implicam a participação no Estado como "comunidade política” (Marx, 1988, nos favorecidos podem estar perfeitamente de acordo com o direito - para ele
pp. 361 e ss., esp. 362 e 364). Os droits de I71omme eram vistos criticamente axiomático -- de igual consideração e respeito (Dworkin, 1991, pp. 223-39). Es-
como resultantes da “desagregação do homem” (Idem, p. 357), enquanto os sa orientação vem sendo adotada na práxis de grupos políticos, na jurispru-
droits du citoyen como político‹integ1-ativos. dência e também no âmbito da legislação, dirigindo-se a compensar discrimi-
nações sociais negativas contra minorias étnicas, sexuais e deficientes fisicos.
Tal concepção, que lirnita a cidadania ao direito à participação política, foi, mais As discriminações positivas rompem com a concepção universalista dos direi-
recentemente, perdendo espaço na linguagem das Ciências Sociais, destacando tos dos cidadãos, abrindo-se fragmentariamente às diferenças e condições par-
se a contribuição teórica de T. H. Marshall no sentido de sua maior abrangên- ticulares de grupos minoritários, sem que disso resulte negação do princípio
cia semântica. Nessa perspectiva, constata-se a ampliação evolutiva do concei- A-m._-mm-
da igualdade. I-lá apenas a pluralização da cidadania.
to, incluindo os direitos civis, políticos e sociais, cujos periodos de formação
teriam transcorrido, respectivamente, nos sécuios XVIII, XIX e XX (Marshall, CONQUISTA E AMPLIAÇÃO DA CIDADANIA COMO PROCESSO DE ÍURIDIFICAÇÃO
1976, pp. 71 e ss.).1 A igualdade inerente à cidadania só seria alcançada, en-
A ampliação dos temas juridificáveis nos quadros da positivação do Direito
tão, caso se estendesse simultaneamente à liberdade (civil), à participação (po-
(Luhmann, 1981a, p. 129; 1983a, p. 144; 1987a, p. 211) fez da juridificação um
lítica) e às necessidades (sociais). E é nesse sentido abrangente que ela entra-
dos problemas críticos do Estado moderno. Conceituado “para fora” como ex-
ria em "guerra", no século XX, com o sistema de classes capitalista, fundado
pansão do Direito e “para dentro'' como seu detalhamento e especialização (con-
na desigualdade (Marshall, 1976, p. 84).
densação) (Voigt, 1980, p. 16; Habermas, 1982b, vol. II, p. 524; Werle, 1982, p.
4), o fenômeno da juridificação foi, no âmbito de um intenso debate na Ale-
Mas a cidadania, orientada pelo princípio da igualdade, não esgota seu ciclo
manha Ocidental dos anos 80, classificado em três tipos básicos: legalização,
evolutivo nas três fases estudadas por Marshall, nas quais se conquistaram e
burocratização e justicialização (Voigt, 1980, pp. 18-23)? Os efeitos juridifican-
ampliaram direitos cuja titularidade, em última análise, era individual. Os di-
tes sobre a sociedade foram avaliados, por um lado, negativamente (alienação,
reitos políticos clássicos afirmavam a liberdade do indivíduo de participar po-
burocratização, "colonização do mundo da vida"), por outro, positivamente (as-
liticamente no exercido do poder, inclusive de associar-se e reunir-se com ou-
seguramento da liberdade e do status) (Voigt, 1980, p. 30). É quanto ao aspecto
tros indivíduos para esse fim. E mesmo os direitos sociais, enquanto droits-
positivo que se pode sustentar que a conquista e ampliação da cidadania im-
créances em contraposição aos droits-iibertés (Ferry e Renaut, 1992, pp. 26-32).
plicam um processo de juridificação das relações de poder.
referem-se à exigência de uma prestação do Estado em relação ao indivíduo.
Nas últimas décadas, a cidadania tem-se desenvolvido no sentido da conquis- O processo de juridificação desenvolveu-se no Estado moderno em quatro fa-
ta e ampliação dos direitos referentes a interesses coletivos e difusos, os cha- ses (Habermas, 1982b, vol. II, pp. 524 e ss. ; Neves, 1991, pp. 160 e ss.; 1992a,
mados direitos de "terceira geração" (Lafer, 1988, pp. 131 e ss.). É verdade que pp. 31 e ss.), cada uma delas tendo um significado específico para a constru-
durante 0 surgimento da legislação social trabalhista também houve a emer- ção da cidadania. H'
254 255
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No primeiro período, a juridificação conduz aos clássicos direitos subjetivos malmente do “mundo da vida", como, por exemplo, o Direito de Familia e a
privados, estando vinculada ao conceito de “Estado burguês” do período ab- legislação do ensino, a juridificação teria efeitos negativos, socialmente desin-
solutista. Na medida em que tais direitos não eram exercíveis perante o sobe- tegradores. Fala-se então de colonização interior do mundo da vida: “A tese
rano, mas apenas diante de outros súditos, não se poderia, a rigor, falar de da colonização interior afirma que os subsistemas econorrua e Estado, em face
cidadania. A relação assimétrica entre soberano e súditos, constituída por po- do crescimento capitalista, tornam-se mais complexos e invadem sempre mais
deres e direitos no pólo superior e de deveres no polo inferior, era incompati- profunda mente a reprodução simbólica do mundo da vida” (Idem, p. 539). O
vel com o princípio de igualdade que informa a noção de cidadania. Direito-meio, expressão sistêmica da racionalidade-com-respeito-a-fins, a ser-
viço da economia e do poder, invadiria a esfera do agir comunicativo, fundada
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-re-. . “ Na segunda fase, a juridificação conduz à positivação dos direitos subjetivos no entendimento, e, dessa forma, prejudicaria a construção de uma razão in-
públicos de caráter liberal, correspondendo ao Estado burguês de Direito. Os tersubjetiva. q
sujeitos privados passam a dispor de direitos exerciveis contra o ”soberano'Í.
que, por sua vez_. fica obrigado a respeitar-lhes a esfera de ação preestabeleci- Mas Habermas reconhece que a juridificação, também na fase do Estado social
da jurídico-positivamente. A cidadania surge, então, como afirmação das li- e democrático de Direito, teria efeitos positivos quando o Direito como insti-
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berdades negativas, na forma dos direitos civis clássicos. tuição desempenhasse um papel regulativo a favor do plexo de ação do mun- _
mocrático e social de Direito, que trouxe consigo a positivação dos direitos so- Além das quatro fases acima referidas, podemos interpretar a instituição dos
ciais, a intervenção compensatória na estrutura de classes e na economia, a direitos coletivosldifusos e das discriminações inversas como um novo momento
política social do Estado e a regulamentação juridica das relações familiares e do processo de juridificação. Quanto aos primeiros, o Direito Positivo respon-
educacionais. É a esta fase que se dirige a critica habermasiêma à juridificação de à incapacidade de ação eficaz dos indivíduos isolados contra a atuação das
(lferrechtlichung), com base na distinção entre Direito como meio (Medium grandes organizações. As ações coletivas e referentes a direitos difusos possi-
Recht) e Direito como instituição. No primeiro caso, “o Direito é combinado bilitam o acesso mais generalizado e eficiente dos indivíduos e grupos aos be-
de tal forma com os meios [Medien] dinheiro e poder, que ele mesmo assume nefícios e vantagens do sistema social, fortificando a cidadania. ]á as discrimi-
o papel de meio de direção [Steuerun,gsmedium]”. como no campo do Direito nações inversas, além de asseguranem juridicamente a integração das mino-
Econômico, Comercial e Administrativo. Por “instituições jurídicas" Habermas rias nos sistemas sociais, institucionalizam o direito de ser diferente. Ao discri-
compreende “normas jurídicas que por meio das referências positivas a proce- minarem juridicamente, orientam-se pelo princípio igualitário da cidadania.
dimentos não podem se tomar suficientemente legitimadas”. Na medida em
que elas pertencem “às ordens legítimas do mundo da vida" (espaço do agir AUIUNOMIA DO SISTEMA JURÍDICO COMO CONDIÇÃO DA CIDADANIA
comunicativo), precisam de “justificação material” (Habermas, 1982b, vol. Il,
p. 536). De acordo com esse modelo analítico, o Direito como meio teria “força Se, de um lado, a conquista e ampliação da cidadania podem ser interpretadas
constitutiva”, o Direito como instituição apenas “função rvegulativa” (Idem, p. como processo de juridificação, por outro, é possível conceber a autonomia do
537). Na medida em que o Direito atuasse como meio na esfera regulada infor- sistema jurídico como condição de sua realizabilidade.
256 257
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determinidade" do Direito, ou seja, autonomia operacional do sistema jurídi- gresso, igualmente, no Direito tag; Íšlišia racläp-na_l:_iade ético-procedimental in- .. o'
co em relação às determinações do seu "meio ambiente" (Luhmann, 1981a, pp. democracia real.. Id ca. ao autonomia do Direito sem
‹ Em, 1987, P. 16; 1992, esp. pp 571 e .
419 e ss.; 1983b; 1985; 1988; Neves, 1992a, pp. 34~e ss.). Reconstrói-se, então, -Q~'-wa-4.__._-.
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o conceito de "autopoiese", originário da teoria biológica (Maturana e Varela, Nesse sentido susten
1980, pp. 73 e ss.; 1987, esp. pp. 55-60; Maturana, 1982, esp. pp. 141 e ss., 157 f fa que a positiva ão " ° ~ - - . lH .
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e ss., 279 e ss.),° e afirma-se que o Direito Positivo (moderno) se reproduz pri- VOL ___ p_ 359)_ z m‹'=-IS 0 eslocamento de seus problemas (Idem, 1982b. nll
flfil š.
(lícito/ilícito) (Luhmann, 1986; 1993, pp. 165 e ss.). Assim como em relação aos
outros sistemas sociais diferenciados, não se trata aqui de autarquia, (quase) Entretanto embora '
. f haja concepçoes
“ teoricas
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diferenc' d
privação de meio ambiente (Idem, 1983a, p. 69; Teubner, 1982, p. 20). O Direi- Sistema lurídicof uma de carate
' ét . _ - la as da fiUf0Homia do
to é visto como "um sistema normativamente fechado, mas cognitivamenle aber- funcional, não só Habermas vlgncílqo procedimental, outra de base sistêmico- fia ~
a a autonomia do D' ' . Ji-z_,
to" (Luhmann, 1983b, p. 139). Ao mesmo tempo em que o Direito Positivo fa- Para Luhmann , a dem ocracia° no sistema 1' - lrelto à dem°°raC1a ~
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luhmanniano, a cidadania Pode ser lida I I pp. 111 e SS.) No modelo
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Nesse contexto, o sistema jurídico pode assimilar, de acordo com seus próprios ,, _ _ como inclus` d _ ¡Hl_,l¡;š¡.l `
Ha prestacao dos sistemas sociais" ou se'a ao e toda a P0Pulaçao .t 1 .Illllljr'«'_'.
critérios, os fatores do meio ambiente, não sendo diretamente influenciado por benefícios, vantagens e regras (Lu____;_an llgšlzcesso/dependencia aos seus
estes. A vigência jurídica das expectativas normativas não é determinada ime- bida estaria indissoci n' I PP- 25 e ss.). Assim conce-
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cas, nem mesmo por proposições científicas (Idem, 1985, p. 17; 1990b, pp. 593 .Fsl,':l:`ií 'l
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e ss. e 663 e ss.); ela depende de processos seletivos de filtragem conceitual
Portanto1 definindo -se a cidadania
' como auton ' ' mffl.l,¿~~!1,l_j|l__i~
no interior do sistema jurídico.7
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mo inclusao - ela ~ . mma pu blica 9 P1`1Vfidã
' ou co-
f Pfessllpoe autonomia do ' - f - ;lj¡jj___¿_ll_
Especi'almente nesses ponto, emergem as divergências entre a teoria luhman- der concreto de indivíduos e oz-ganizaÇ_ Sistema juridico em relação ao po. ll,llj_lllll_`lj
~ significa
nao - - . que o "¢am ,. - , . ' ef 9 Sã I' (Lefortz 1981 z P. 64). Isso
por Habermas. Para Luhmann, à positividade do Direito é inerente não ape- _ Po juridico não se' ' '
trucos e políticos, mas tão-só que a Cidad la Cé0I1d1c1onado.por fatores econô- Âll lil l l l âl.
nas a supressão da determinação imediata do Direito pelos interesses, vonta- an ' f . ,. _ ;'; §»`_`lfl l(.
des e critérios políticos dos "donos do poder", mas também a neutralização bloqueantes e destrutivas de Particularism Ia lncompahvel com mgerenclas 'il‹'›l'lti›f:l¡ll_\1à
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duçao ._ do Direito.
_ As influências políticas OS o it'
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moral do sistema jurídico. Habermas reconhece que as fronteiras entre Direito 1§f\'i|\~Ê.¡Í`'
sub0__d¿nam_se aos Critério omicas no sistema jurídico i l
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e Moral existem, por considerar que a racionalidade procedimental do discur- _ S estabelecidos el - - . , _ llli ll 'il
so moral não regulado juridicamente é incompleta, argumentando que nele implâzâ generalização mcluâeme de roda a P0 oulfrófmo slslema '“nd*“°' Is” .i_l._.llllll_lj'_l
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lillrl]
- inexiste um terceiro (Unbeteüigte) encarregado de decidir as questões entre as tanto acesso aos seus benefícios e vantagení P a¢ãodno Direito, significando -l_,jl_-'Wi '
partes (Habermas, 1992, p. 565). Mas, embora não negue a autonomia do sis- . .
aos seus critérios Ou se' - c. z quanto ependência ' em relaçao
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_ _ ' laz a cidadania ress “ ~ . l|l`lliíl1~
tema jurídico, atribui-lhe uma fundamentação ética: direitos, mas também a igualdade de dívereupll)/I? não apenas a Igualdade de vll
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I s ( aishall, 1976, pp. 112 e ss.).
E essa bipolaridade
' só ef possível se o sistema
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"Um sistema jurídico adquire autonomia não apenas para si sozinho. Ele é au mente. J ndlco se repmdul âufonoma-
tônomo apenas na medida em que os procedimentos institucionalizados para
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258 I
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MOMENTOS IURIDICO-POLÍTICOS DA CONQUISTA E AMPLIACAO DE DIREITOS e sobreintegração no sistema constitucional, tal corno ocorre nos países perifé-
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DE CIDADANIA ricos, destacadamente no Brasil. Nesse caso, não se realiza a inclusão como
i acesso e dependência simultâneos ao Direito Positivo. A rigor, porém, não se
A conquista de novos direitos de cidadania e sua ampliação passam por três
trata de relações alopátricas entre grupos humanos no espaço social (l\_Jeves,
momentos jurídico-políticos. Em primeiro lugar, surge a semântica dos direi- pp:
Evidentemente, a simples declaração dos direitos fundamentais na Constitui- A subintegração das massas é inseparável da sobreintegração dos grupos pri-
ção não significa a conquista e realização da cidadania. É imprescindível a for- vilegiados, que, principalmente com o apoio da burocracia estatal, desenvol-
ça normativa da Constituição (Hesse, 1984), ou seja, a sua integração ao viven- vem suas ações bloqueantes da reprodução do Direito. É verdade que os so-
ciar e agir dos cidadãos e agentes públicos, na forma de direitos e deveres recí- brecidadãos utilizam regularmente o texto constitucional democrático - em
procos. A cidadania exige, portanto, a concretização das normas constitucio- princípio, desde que isso seja favorável aos seus interesses elou para a prote-
nais referentes aos direitos fundamentais. Ausente tal concretização, perma- ção da “ordem social". Tendencialmente, porém, na medida em que a Consti-
i tuição impõe limites ã sua esfera de ação política e econômica, é posta de lado.
nece o texto, sem o seu significado normativo generalizado. Só quando a. Cons-
tituição é um reflexo da esfera pública (Häberle, 1980, p. 87), existe e desenvolve- Ela não atua, pois, como horizonte do agir e vivenciar jurídico-político dos "do-
se a cidadania; havendo bloqueios do processo de concretização constitucio- nos do poder'Í, mas sim como uma oferta que, conforme a eventual constela-
nal por fatores políticos, econômicos e culturais, a reprodução autônoma do ção de interesses, será usada, desusada ou abusada por eles. Assim sendo,
i Direito não se realiza. E, portanto, a cidadania permanece no texto constitu- a garantia da impunidade é um dos traços mais marcantes da sobrecidadania.
cional como bela fachada de uma construção interiormente em minas.
O chamado princípio da não-identificação da Constituição (Krüger, 1966, pp.
A CIDADANIA 1NEx1srEN'rEz RELAÇÕES DE SUBINTEGRAÇÃO E SOBREINTEGRAÇÃO 178-85; I-Iollerbach, 1969, pp. 52-7), que se vincula estreitamente ao principio
da indisponibilidade do Direito e da imparcialidade do Estado de Direito (Ha-
Definida a cidadania como integração jurídica igualitária na sociedade, pode- bermas, 1987; 1992, pp. 583 e ss.), está ausente no contexto das relações de
se afirmar que ela está ausente quando se generalizam relações de subintegração subintegração e sobreintegração no sistema constitucional (Neves, 1992a,
260 261
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pp. 53 e ss. e 95 e ss.). Em certa medida, a Constituição só é concretizada se mas iuridicas atuariam no lugar do Direito Positivo com relação ã solução de
interesses de grupos privilegiados não são comprometidos. Constitucionali- conflitos (Santos, 1977; 1980; 1988). Quanto a essa restrição, deve-se advertir
Iir
¡¬*_'_' dade contra os interesses da sobrecidadania "não é aconselhável", “é inade- que o debate em torno da juridificação e desjuridificaçâo refere-se ao Direito
quada ao meio ambiente”. (Daí não se deve deduzir nenhuma esquematização Positivo como sistema social diferenciado.” As "alternativas" para 0 funciona-
simplista, porque entre os sobrecidadãos ocorrem conflitos jurídicos também mento insatisfatório do Direito Positivo implicam, nas sociedades periféricas,
no plano constitucional, que não raramente são solucionados conforme a "lei tanto um discurso "'ético-social” (Santos, 1988, p. 25). como também a interfe-
fundamental". Mas se o status quo é ameaçado, eles tendem a fórmulas conci- rência não-mediatizada do cridigo do poder e do código econômico nos meca-
liatórias que '_'rompern" ou “escavam" a Constituição.) Reformas sociais dentro nismos de solução de conflitos. O fato de, nesse contexto social, muitas "uni-
da “ordem constitucional” são freqüentemente caracterizadas como subversi- dades soc-iais.-" de uma sociedade supercomplexa disporem de diferentes códi-
vas, tão logo ponham na ordem do dia a abolição de privilégios e/ou a introdu- gos ”lícito1'iiícito” 13 não leva. de forma alguma, a uma racionalidade jurídica
ção eventual de medidas favoráveis à subcidadania. Subjacente à não- tópica, como ocorreria no caso de um Direito pós-moderno (Lacieur, 1985), mas,
identificação formal do texto constitucional estatuído, encontra-se a identida- antes, a uma extrema insegurança jurídica. cuja manutenção está relacionada,
de da realidade constitucional com as classes e grupos privilegiados, de tal ma- contraditoriamente, à conservação de privilégios, sendo, portanto, prejudicial
neira que a institucionalização dos direitos fundamentais é estruturalmente de- sobretudo aos socialmente “deficientes” (os “subintegrados"). Esse tipo de si- mí
turpada. O agir e o vivenciar normativo do subcidadão e do sobrecidadão fa- tuaçâo não representa nenhum pluralismo como alternativa ao IegaIr'smo,13
m
zem implodir a Constituição como ordem básica da comunicação jurídica.” mas sim reações difusas à falta de legalidade. _
portamento mediante a normatização constituinte não é seguida, de maneira não pode haver Constituição promotora do desenvolvimento de contextos
Ê
i alguma, da orientação generalizada das expectativas normativas com base no fragmentários e instáveis do seu meio ambiente social, na medida em que
P
texto constitucional, quer dizer, não é acompanhada da generalização congruen- esse, como condição de seu funcionamento e concretização, atua destrutiva-
|
l
› te das expectativas normativo-constitucionais.1° mente em relação a ela. O problema está na própria falta de realização
de Constituição como espaco jurídico da cidadania ou, como diriam os pós-
Contra a noção de uma realidade constitucional desjuridificante poder-se-ia, modernos, das cidadanias.
nos quadros do pluralismo jurídico, apresentar a objeção de que outras for-
262 263
A FALTA DE IDENTIDADEÍAUTDNOMIA DE UMA ESPERA DA IURIDICIDADE der" e "dinheiro". Tal pretensão "normativa", embora encontre indícios na “mo-
dernidade central", não parece encontrar o mínimo de fundamento nas rela-
já observei que se, de um lado, a conquista e ampliação da cidadania podem ser ções da`“modernidade periférica”. Aqui, a modernidade constrói-se ne-
interpretadas como processo de juridificação, por outro, é possivel conceber a gativamente como desagregação da consciência moral convencional (inclusive
autonomia do sistema jurídico como condição de sua realizabilidade. A contra- da pré-convencional), sem que daí resulte a estruturação da consciência moral
rio sensu, a desjuridificaçâo, enquanto condição negativa da cidadania, impli- pós-convencional e, muitos menos, a autonomia de uma “esfera pública”.
ca falta de autonomia do sistema jurídico. Ou seja, enquanto não se constrói a
identidade da(s) esfera(s) de juridicidade, a partir de uma concretização consti- E mesmo se partirmos para a concepção fragmentária da pós-modernidade,
tucional generalizante, não há espaço para a cidadania. No plano da teoria da ainda assim sua construção nos países periféricos teria um sentido negativo.
sociedade, esse é um dos problemas específicos da modernidade periférica, que É que as principais teorias da pós-modernidade desenvolvem, em contraposi-
pode ser caracterizada como “modernidade negativa", partindo-se tanto da pers- ção à racionalidade sistêmica generalizada e à razão universalista, a noção de
pectiva sistêmica quanto do modelo com pretensão ético-procedimental. racionalidade tópica. Tal situação implicaria interconexões de incertezas
«n - .lr*. ,Ç.'›ç¬¶-
(des)construtivas entre sistemas tópicos de comunicação (Ladeur, 1985; 1990;
De acordo com a teoria dos sistemas, a sociedade moderna resultaria da hiper- 1991; 1992). No caso da (pós)modernidade periférica, as inter-relações entre
complexificação social vinculada à diferenciação funcional das esferas do agir os campos de ação tendem, imprevisivelmente, a intrincamentos bloqueantes
e do vivenciar. Implicaria, portanto, o desaparecimento de conteúdos morais vá- e destrutivos. Essa situação de miscelânea social implica dificuldades na cons-
lidos para todas as conexões de comunicação, e o surgimento de sistemas so- trução da identidade do sistema jurídico, advindas diretamente da falta de au-
ciais operacionalmente autônomos, reproduzidos com base nos seus próprios tonomia da respectiva esfera de ação.
códigos e critérios, embora condicionados pelo seu meio ambiente circundante
¡|.¬_-. wø- (autopoiese) (Luhmann, 1987b). Na modernidade periférica, à hipercomplexi- No que diz respeito à teoria ético-procedimental, já observei que a desagrega-
ficação social e à superação do “moralisrno” fundamentador da diferenciação hie- ção da moral pré-convencional primitiva e convencional pré-moderna não con-
rárquica, não se seguiu a construção de sistemas sociais que, embora interpe- duziu, na modernidade periférica, à construção e ao desenvolvimento da cons-
netráveis e mesmo interferentes, construam-se autonomamente no seu topos ciência moral pós-convencional. Daí porque a fundamentação moral da indis-
específico. Isso nos põe diante de uma complexidade desestruturada 'e deses- ponibilidade e imparcialidade do sistema jurídico, em contraposição à sua ins-
truturante. Daí resultam problemas sociais bem mais complicados do que aqueles trumentalidade sistêmica (Habermas, 1992, pp. 583 e ss.; 1987), não encontra
que caracterizam os países da “modernidade central". As relações entre os "cam- espaço nas relações intersubjetivas em torno do Direito. A tendência é a ins-
pos” de ação assumem formas autodestrutivas e heterodestrutivas, com todas trumentalização política do Direito, seja por meio da mutação casuística das
as suas conseqüências bem conhecidas entre nós. Portanto, a modernidade não estruturas normativas, principalmente durante os períodos autoritários, ou me-
se constrói positivamente, como superação da tradição mediante o surgimento diante o jogo de interesses particularistas bloqueadores do processo de con-
de sistemas autônomos de ação, mas apenas negativamente, como hipercom- cretização normativa. Nesse contexto, a autonomia privada (”direitos huma-
plexificação desagregadora do moralismo hierárquico tradicional. nos") e a autonomia pública (“soberania popular"), embora, em regra, declara-
das no texto constitucional, são rejeitadas mediante os mecanismos de deses-
Conforme a concepção ético-procedimental proposta por Habermas, a moder- truturação política do processo concretízador da Constituição.
nidade resultaria da evolução da consciência moral no sentido da superação
das estruturas pré-convencionais e convencionais com o advento de uma mo- Da mesma maneira, é intransponível o modelo luhmanniano da autopoiese
ral pós-convencional (Habermas, 1982a, esp. pp. 12 e ss.). Isso significa uma à realidade jurídica da modernidade periférica, destacadamente no Brasil. As
clara diferenciação entre sistema e "mundo da vida”,“ este enquanto horizonte sobreposições particularistas dos códigos político e econômico às questões ju-
do "agir comunicativdfl. orientado na busca do entendimento intersubjetivo, rídicas impossibilitam a construção da identidade do sistema jurídico. Em lu-
aquele como espaço de intermediação do "agir-racional-com-respeito-a-fins" gar da autopoiese, está a alopoiese do Direito (Neves, 1991, pp. 163 e ss. ; 1992a,
(instrumental e estratégico).15 Nessa perspectiva, a modernidade exigiria po- esp. pp. 81 e ss. e 182 e ss.; 1992b). Isso significa que não surge uma esfera
sitivamente a construção de uma “esfera pública" (Ôfƒentlidikeit), topos de- de juridicidade apta a, de acordo com seus próprios critérios e de forma con-
mocrático discursivamente autônomo com relação aos "meios" sistêmicos "po- gruentemente generalizada, reciclaras influências advindas do seu contexto
264 265
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económico e politico, como também daquilo que os alemães denominam de no processo de concretização. Assim sendo, a “cidadania” construída e ampliada
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“boas relações”. O intrincamento do(s) código(s) jurídico(s) com outros códi- aparentemente no interior dos textos constitucionais encobre uma realidade
gos sociais atua autodestrutiva e heterodestrutivamente. O problema não resi- de não-cidadania. Excluídos aqui, esquematicamente, os períodos autoritários
de, em princípio, na falta de abertura congnitiva (heterorreferência ou adapta- de negação da cidadania no plano das próprias Cartas e leis constitucionais
ção), mas sim no insuficiente fechamento operacional (auto-referência), que (1937 e 1964), observa-se uma crescente ampliação dos direitos fundamentais
obstaculiza a construção da própria identidade do sistema jurídico. Se tal iden- sem que se verifique, no âmbito da realidade constitucional, uma resposta re-
:idade pode ser vista, eventualmente, no plano da estrutura dos textos norma- levante no sentido da construção da cidadania. Do periodo de restrição dos
tivos, ela é destruída gradativamente durante o processo de concretização ju rí- direitos civis aos ingênuos e libertos na Carta Imperial de 1824 até o amplo
dica.” Assim sendo, não se constrói, em ampla medida, generalização con- reconhecimento dos direitos civis, políticos, sociais e coletivos no texto consti- _
gruente de expectativas normativas a partir dos textos constitucionais e legais. tucional de 1988, teria havido um .processo intenso de conquista e desenvolvi-
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Daí resulta que a própria dišfinção"'e'nÊrë`4lícitó: nê ilícito élâóciâlifiêntëiobnubila- mento da cidadania. Mas essa evolução no cenário do palco constitucional não
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lã da, seja por falta de institucionalização (consenso) ou de identificação do sen- teve significado relevante na práxis político-jurídica (Neves, 1992a, esp. pp. 110
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tido das normas.” A conseqüência mais grave é a insegurança destrutiva nas e ss., 1994, pp. 153 e ss.).
.. relações de conflitos de interesses. hm
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:-3. Indaga-se, portanto, qual seria o sentido das declarações constitucionais de di- _
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O último recurso seria afirmar a autonomia/identidade de esferas jurídicas plu- reitos de cidadania, se lhes resta um grau muito reduzido de eficácia jurídica.
ralistas de ação, na perspectiva pós-moderna do Direito. Contudo, nesse caso, A resposta parece-me que se encontra na sua importância político-simbólica.
pressupõe-se racionalidade jurídica a partir da congruência tópica de expecta- Paradoxalmente, na medida em que se reduz a eficácia jurídico-normativa das
tivas normativas, como também compatibilização (des)construtiva do dissen- declarações constitucionais de direitos, fortifica-se sua função simbólica. Ocorre
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so entre sistemas locais de ação. E são exatamente as incongruências autodes- como que uma hipertrofia da sua dimensão político-simbólica em detrimento
trutivas das expectativas normativas e as incompatibilidades heterodestrutivas
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de sua função jurídico-normativa (Neves, 1992a, pp. 61-5 e 104-6; 1994).
5:
de dissensos entre campos de ação que impedem a construção da identidade
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de esfera(s) de juridicidade na modernidade periférica. Nesse contexto, a cidadania surge como topos simbólico do discurso constitu-
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cionalista. Do lado dos “donos do poder", as declarações constitucionais de
Nesse contexto de falta de direitos congruentemente generalizados, ou, no mí- direitos de cidadania desempenham o papel de um álibi (Neves, 1994, pp. 37-40
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nimo, topicamente congruentes, não é possível a construção e ampliação da e 92-5). O Estado e os respectivos legisladores ou governantes apresentam-se,
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cidadania. Esta significa exatamente a integração jurídica igualitária na socie- retoricamente, identificados com os valores da cidadania, sendo atribuídos à
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i_ dade, implicando direitos neutralizadores das eventuais desigualdades econô- "sociedade" os obstáculos da sua não-realização. Do lado dos críticos do sta-
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-1.
micas e políticas. Se isso não ocorre, prevalecem as relações de subcidadania tus quo, a declaração de direitos de cidadania serve como referencial simbóli-
e sobrecidadania destrutivas da identidade do sistema jurídico. co do discurso pela transformação das relações reais de poder. Ao proporem
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e defenderem textos constitucionais com elencos mais abrangentes de direitos
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FUNÇÃO Porínco-siusóucà DA DEcuuuçÃo coNsrmJc1oNA¡. DE Dmmos fundamentais, justificam simbolicamente ao público sua atividade no sentido
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1
FUNDAMENTAIS NA EXPERIENCIA yuitímca BRASILEIRA da conquista da cidadania. De ambos os lados, a cidadania enquanto topos
simbólico permanece como algo do discurso. E tanto mais dela se fala na esfe-
1
Já observei anteriormente que para a conquista e ampliação da cidadania não ra política, quanto mais se intensificam os obstáculos à sua realização.
é suficiente a adoção da semântica valorativa dos direitos humanos no texto
l
constitucional, na forma de direitos fundamentais. À realização da cidadania Em certa medida, o discurso simbólico da cidadania serve para encobrir o fato
é imprescindível a concretização das normas constitucionais referentes aos di- de que os problemas estruturais da subintegração e sobreintegração na socie-
reitos fundamentais. dade, ou seja, as situações de subcidadania e sobrecidadania, estão indisso-
ciavelmente vinculados às posições e relações dos respectivos agentes políti-
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Na experiência jurídico-política brasileira, a ampliação dos dispositivos consti- cos. O álibi simbólico do “discurso cidadão'' transfere para um outro os obstá-
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tucionais concernentes aos direitos fundamentais não teve grande relevância culos à cidadania e dificulta, de certa maneira, o desenvolvimento de uma au-
266 267 É
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toc;-ífica efetiva de indivíduos e grupos a respeito de suas posições nas tela- NOTAS:
ções de sobrecidadania e subcidadania. Nessa perspectiva, 0 topos simbólico
~ 1. Acompanhando-o, ver Bendix (1969, pp. 92 e ss.).
e ideológico “cidadania” pode servir mais à manutençao do status quo do que
Werle (1982, pp. 5 e ss.) defende a limitação do conceito de juridificação ao aumento
à integração jurídica generalizada e igualitária na sociedade, isto é, atuar con-
de leis e decretos em um determinado periodo. Contra essa posição, ver Voigt (1983,
tra a própria realização da cidadania.
pp. 18 e ss.;, considerando os “aspectos qualitativos" da juridificação.
Sobre a distinção entre liberdades negativas e positivas, ver Passerin D'Entrèves (1969,
CONCLUSÃO
pp. 249-73).
Assim sendo, justifica-s-e a crítica de Nahamowitz (1985, esp. p. 42) a Teubner e Vlfill-
No âmbito das Ciências Sociais e dos estudos jurídicos com pretensão socioló-
ke, na medida em que estes, em uma tentativa de unir a ética do discurso haberma-
gica que se vêm desenvolvendo correntemente no Brasil, liá uma tendência
siana à teoria dos sistemas de Luhmann, tiraram conseqüências neoliberais da con-
a contrapor-se um Estado forte, orientado no legalismo, à fragilidade da “so-
cepção de juridificação de Habermas (Teubner e Willke, 1984, pp. 24 e 29; 'l`eul~ner,
ciedade civil" e da cidadania. A essa compreensão do problema subjaz a idéia 1982, pp. 26 e ss. e 41-4), o qual modificou mais tarde a sua posição (Teubner, 1989,
equivocada de que a ordem jurídica estatal, também no caso brasileiro, auto- pp. 81 e ss. e 85 e ss.).
reproduz-se consistentemente por meio da legalidade generalizada das ativi-
Sobre a concepção de “lealdade das massas” no welfare state, ver Nan' e Offe (1975).
dades dos seus agentes. Ao contrário, é exatamente o pressuposto jurídico mí-
Na linha de Offe, Preuss (1989, p. 2) refere-se à “domesticação da luta de classes por
nimo de construção da cidadania, a legalidade como generalização includente meio da juridificação da luta trabalhista". A noção de “lealdade das massas" está es-
do Direito, que está ausente. Nas relações de poder, generaliza-se então a ile- treitamente vinculada à concepção de Bendix (1969, p. 89) de que as lutas das :nas-
galidade da práxis dos agentes estatais, grupos sociais e indivíduos, privile- sas nos países ocidentais desenvolvidos se arientaram, antes, pela busca de integra-
giando, sobretudo, a sobrecidadania e prejudicando os subcidadãos. ção (“participação") no sistema do que por uma “nova ordem social", podendo ser
caracterizadas como expressão de um espírito conservador. Crítico em relação à con-
Parece-me claro que, em tal contexto de ausência de autonomia operacional cepção de "lealdade das massas”, Luhmann (1981b, p. 10) enfatiza a constante mu-
da ordem jurídica estatal, não cabe falar de Estado forte contrapondo-se à cons- dança das motivações dos indivíduos no Estado de Bem-Estar.
trução da cidadania. O Estado é permanentemente bloqueado pelos particula- ' 6. Quanto à reconstrução sociológica, ver, sobretudo, Luhmann (1987b); Haferkamp e
rismos dos interesses econômicos e políticos concretos, a partir tanto dos pri- Schmid (1987); Baecker et aih' (1987, esp. pp. 394 e ss.). Para a crítica à recepção
vilégios da sobrecidadania quanto das premências da subcidadania. Não se científico-social do conceito de autopoiese, Bühl (1989), com referência especial ao
constrói de forma consistente a própria identidade de uma esfera do Estado paradigma luhmanniano (pp. 229 e ss.); e em uma perspectiva mais abrangente so-
em contraposição aos particularismos privados; isso porque não ocorre a fil- bre a teoria sistêmica de Luhmann, Krawietz e Walker (1992). Para a leitura crítica
a partir da teoria do discurso, ver Habermas (1992, pp. 573 e ss.; 1988a, pp. 30 e ss.;
tragem constitucional e legal das interferências da economia e do poder na ação
1988b, pp. 426 e ss.). Definindo a autopoiese como paradigma ideológico conserva-
estatal. Assim sendo, os códigos generalizados “dinheiro” e “poder” não ape-
dor, Zolo (1986). Em outro contexto, ver Neves (1992b).
nas condicionam o Direito, sobrepõem-se-lhe destrutivamente.
"Desenvolvimentos externos" - enfatiza Teubner (1982, p. 21) - “não são, por um
lado, ignorados, nem, por outro, convertidos diretamente, conforme o esquema
Portanto, a conquista e ampliação da cidadania, no caso brasileiro, passa pela
'estímulo-resposta', em efeitos internos". Nesse sentido, adverte o mesmo autor: “Au-
construção de um espaço público da legalidade que, de um lado, promova a
tonomia do Direito refere-se à circularidade de sua auto-reprodução e não à sua in-
identidade do Estado perante os interesses privados e, de outro, possibilite a dependência causal do meio arnbiente" (1989, p. 47).
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integração jurídica igualitária de toda a população na sociedade.
Observe-se que prefiro os termos ”subcidadão" e ”sobrecidadão" do que as ex-
pressões “cidadãos de primeira, segunda e terceira classes" (Velho, 1980, p. 362;
(Recebido para publicação em novembro de 1993) Weffort, 1981, pp. 141-4), que podem levar à idéia equivocada de que só os subin-
tegrados são carentes de cidadania. Por outro lado, a distinção conceitual que
proponho, embora análoga, se diferencia nitidamente dos conceitos antropológi-
cos de subcidadão e supercidadão a que se refere Dalviatta (1991, p. 100), asso-
ciando o primeiro ao espaço sem direitos da "rua" e o segundo à esfera dos
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privilégios (”direitos sem deveres") domésticos (”universo da casa"). Parece-me ex-
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