Vous êtes sur la page 1sur 13

0 que é o retroÍuturismo?

- lntrodução aos
ltrturos virtuais'
llrr:l)uring

l!R0L0G0: ANGELUS N0VUS

O Anjo da História avança de costas voltadas ao futuro, soprado por


rrrrrr cleflagração vinda do fundo das idades. Arrastado pela tempestade
r lo "J-»'ogre sso", a sucessão dos acontecimentos lhe aparece como a con-
trrrrrlção de uma única e mesma catástrofe, testemunhada, a seus pés,
lx,r'um monte de ruínas que se elevam até o céu. Na célebre alegoria
rr rs;rirada a Benjamin por um quadro de Klee', já náo há mais tempo de

t lt'spertar os mortos, de reunir os vencidos; o Anjo mal consegue arrancar,

,lt' passagem, algum fragmento ou retalho do passado para levar consigo


('nr sua corrida desenfreada.
Do ponto de vista desse messianismo invertido, o arquivo pode ainda
.rlirrentar a paixão historicista, mas apenas com a condição de se apresen-
r;u'como intrinsecamente "irrecuperáve1", como o é, aliás, "a imagem do
l,rrssado que ameaça desaparecer com cada presente que não se reconhe-
( ('Lr como visado nela"3. O cronista gostaria que, "de tudo que alguma

vt'z adveio, nada fosse considerado como perdido para a Historia"a, mas
('l(' transforma tudo o que toca em relíquia. O arquivo se oferece então,

r 'lirdução de Paulo Neves.


, Walrer Benjamin, "Thêses sur la philosophie de l'histoire", Essais z, trad M de Candillac, Paris: De-
noê1, 1983, p r98.
r lclcm, ibidem, p r97 (tradução modificada).

1 lclcm, ibidem, p 196

209
,r('l:rrr()licanlente, como o anúncio antecipado
de uma ruína furura: ,,o FUTURISMO "BETBÔ" E "REIROFUTUBISMO"
vt'r'drrdcir. rosto da História se afasta a galope.
Não se retém o passado
s('rril() ('()lr1() uma imagem que, no instante
em que ela se deixa reconhe_ "Retrofuturismo": o aparecimento dessa palavra-valise pode ser da-
r t'r', la,q:a unr clarão que nunca se verá de ,-L
novo,,r. Se a imagem _ arquivo, tado com precisão. E atribuída a Lloyd Dunn, praticante da colagem
vt'stígi«r clu documento possui mesmo asslm uma energia de reserva,
- sonora, cofundador dos Tape-Beatles e animador da revista experimental
rrrrrn t:rrcr gia potencialmente expl0siva,
é que era nunca é simples ftaço ou tletrofutuism. um rebento neossituacionista do fanzíne PhotoStatic, cri.a-
vt'.srígi.: sua Íàitura mesma manifesta entrelaçamento
ou sobreposição de clo em 1983 nos Estados Unidos, cuja marca distintiva era apropriar-se
tt'r'p.ralidades que contraria a ideia demasiado simpres
de um passado cle um codigo visual e gráfico herdado dos anos rg5o e 196o, com seus
(r'(' sc íirrmaria após ter sido presente.
Na meada do tempo, todà arqui cntusiasmos ingênuos pela inovação tecnológica. Na mesma época, um
vr ('si,ultaneamente sobrevivência, anacronismo oferecido
ao jogo de grupo pop eletrõntco alemão, Krafrwerk, explorava imagens vizinhas, as
r.r,r.r'radas e de ffansformações das quais pode
se valer um merriarirmo clas vanguardas construtivistas dos anos rgzo, pata encenar uma música
"li'irc<;", que
cultive uma relação irônica com seu próprio projeto.
Mas, do que seria idealmente tocada por máquinas. O termo pegou. Circula há
Prrssado, o que é que pode efetivamente ser reativado, senão
precisamente alguns anos em diferentes setores da culrura contemporânea, nos cru-
' t',brião de futuro que cada um de seus estirhaços continha e ainda - zamentos das vanguardas e da cultura de massa, mas também da arte e
r-.rrr('nr? o futuro, como todos sabem, dura muito mais. portanto,
não da tecnologia, designando em realidade coisas bastante distintas que, no
st' tli'ri nada do que devia ou podia advir deve ser considerado
c1r-re
como cntanto, têm a característica comum de procederem a uma montagem
;r.rtlitLr p..'a a História, mas sim que nada do que devia
ou podia advir, temporal entre passado, presente e futuro. Diante do caráter difuso do
r rr l'r t[ » q Lrc estava por
'
r
vir, está irreversivelmente perdido. o que não im- Íênômeno, toda definição parecerá necessariamente arbitrária. Mesmo
Ilrr 'r, r'vitlt'rrtcmente, que os futuros do passado possam ser apreendidos irssim, tentemos. "Retrofururismo" indica o cruzamento de tecnologias
(f )'f() Í.lrr',s em relação ao nosso presente, nem
que baste recolocá-ros ou formas de vida "futuristas" com outras tidas como caducas ou ultra-
('n) ('('r)l
l)Jr.a tenham instantaneamente uma segunda vida. passadas; de maneira mais geral, o termo assinala a transposição dessas
Atltri unra imagem se oferece a nós, um pouco
menos sombria que tecnologias e formas de vida a suportes ou a molduras de outro tempo.
rr r;r'r. Ilc,iamin formou no núcleo
do desastre. Em verdade, o Anjo da Em todos os casos, "retrofuturismo" sugere a interpenetração de visões
I listória está de frentepara o fururo, mas, já
que o futuro não existe _pelo do futuro e de visões do passado, e a imbricação de umas com as outras.
,ão existe aindar -, ele não tem outra escolha senão fixar
'lcros o vazio Pois é evidente que as visões do futuro podem ser elas mesmas datadas;
t'rrtrcgando-se ao seu sonho desperto, impelido
às suas costas pelos futu- rra maioria das vezes o são, e é justamente aí que reside toda a questão
r-,s dc passados pelos quais se sente apenas
obscuramente visado. Numa do retrofuturismo.
vi,'iL,lte mais contemporânea, é precrso representar
o Anjo da História Observando um pouco mais de perto, duas tendências prin-
as coisas
('()rlro um automobilista: ele
não é soprado pelo vento da exprosão, não cipais se destacam. Para abreviar, haveria, de um lado, um fascínio diver-
vô sc zrcumular a seus pés
um monte de ruínas; ele roda sem visibiridade tido pelo futurismo "retrô", pelas imagens associadas às visões datadas
aLrtoestrada montanhosa, acompanhado à
"'rii
tLr passado lançados em alta velocidade e cuja
sua direita pelos futuros clo futuro; de outro, o imaginário ucrônicou dos mundos do passado,
imagem brilha por um rcpintados com as cores do futuro: um "retrô" futurizado, se quiserem.
irrstirrrte na luz dos faróis antes de desaparecer
na noite.

,, ltllrr, ilritlcnr, p ro7


6. lsto é, tal como poderia ter ocorrido, segundo o Íermo roonia, criado pelo Âlósofo Íiancês Charles
Renouvier (r8r5-r9o3). (u r )

íl íl l,r,r I llrlllllt,|rr/ lltltrÍllr.,lr.rí) lrlltr), vrll,l,,


Elie Duríng 211
Assir', pri'rciro havcria um movimento
clc antecipação retrospectiva,
()' (l(' "r'('tl'ocipação"z: trata-se de
considerar o futuro do ponto de yista
listados Unidos. Aliás, foi de forma muito literrl tltrt' l (,n)l)r.(.sir Wcsrirr
rlo 1u1r111!p, cle reencenar, de reproduzir, glr<luse quis dar, nessas duas ocasiões, publicidadc mr-rndial à sua marca,
dereativar o futuro tal como o
p.dia in-raginá-10n. pois há uma história das projeções
rr;rssrrtl. cnt:errando em cápsulas feitas de metal especial uma seleção de objetos
futuristas
. tlt' strrrs r,itologias, como indica o título de uma .rporiçio Iulgados representativos da época e de seus sonhos, em atenção à huma-
organizad.a
1rt'1, lrrstitrrr<r Smithsonian rriclade futura. Ernry39, a cápsula continha obras de Thomas Mann e de
no começo dos anos rggo: yesterdays bmor_
rirr'ç l()s,rnanhãs de ontem]. o Íuturo Albert Einstein, mas também um exemplar da revista Lif, amostras da
tem uma história., po.a".r,o,
r;rrrrlrí'rrr tr,r passado. Devaneios futuristas irnprensa popular (revistaspulp e outras), um telefone, uma máquina fo-
e pitorescos de welrs ou de
f ú'r'rrc; projeros grandiosos imaginados pelos
r'rlir » t«rgráfica etc. O caráter trivial do conteúdo dessa cápsula do tempo vinha
arquitetos visionários
,rr Pt'l«rs clcscnhistas de quadrinhos: o futuro é urbano. ;rssim desmentir o dispositivo espetacular empregado para o restante da
É Gotham ciry,
rrr:rs r,rrbórr a Moscou dos construtivistas, t'xposição; alguns verão aí, talvez, o ponto de real ao qual se prende final-
a Tóquio dos metaboristas, a
llr';rsílirr clc oscar Niemeyer, Manhattan rnente a fabulação futurista, assim como o enternecimento ligeiramente
sob o domo geodésico de Buck-
r,irrsrc'Fuller. cidades futuras cobertas t'r»rdescendente diante dessas imagens ou "cenas da vida futura" (como
de domos de cristal, atravessadas
(''r t()(l()s os sentidos por carros voadores tlizra o escritor Georges Duhamel). O interesse pela extrapolação futu-
e dirigíveis (vejam a aberrura
tlrr Íilrrrc Fuga no século xx,r). Cidades reais lista é sempre tingido de um pouco de nostalgia; exprime preocupação
também, enfeitadas de vez
.rrr tJrrurrdo por l0ucuras arquitetômcas (' mesmo cuidado particular pelos futuros caducos ou natimortos, cuja
que testemunham a paixão do
Irrrrrrrr tlu clual se alimentava, ainda possibilidade mesma, parece, deveria ser salvaguardada de uma maneira
há cinquenta anos, a ceÍtezade um
(
rrr ')"r('ssí ) rt'crorógico em princípio indefinido na ou de outrae. Não há dúvida alguma de que muiros arrisras contemporâ-
América de Eisenhower
( ,l''s r'rrtlt., ncos encontram aí o meio de driblar o imperativo que lhes é feito, tanto
'
''Japão e na china do boom econõmico. Eis o que o futuro
|nrlr'ttrt t.t sitlo sc o passado tivesse sabido traduzirna
reaháade
hoje como sempre, de ser absolutamente modernos'o.
a fôrça
Pr'' rPttlso|rl tllin-raginação dos homens. Mas, também, Isto quanto ao primeiro movimento: o fururo do passado recolhido
eis o que éramos
( :rr);rz('s tlt' irraginar, eis o futuro no qual tínhamos a pclo presente, arquivado e, por que não, refabulado numa atmosfera de
força de acreditar.
Ntrrrrrr v.ia me.os fantasmagórica rrostalgia divertida. Mas "retrofuturismo" designa também, num segun-
e mais nitidamente tecnorógica, pen-
s(''r()s igu:rrmenre nas imagens de trens tl<l sentido, o movimento inverso; não do passado para o futuro, mas do
monotrirho de alta r"roád.d., d.
('ilr'r'()s com rodas esfericas
e de aviões-foguetes, que alimentam
I Lrturo para o passado. Trata-se, dessa vez, de reconstruir o passado à luz
a paixão
Íi'tichista do colecionador. Mesmo clo futuro, de imaginar, em suma, um passado alternativo, uma ucronia,
.rr", se parecem com astronaves
",
cliscos voadores: vejam a casa "Futuro", irrterpolando o futuro no passado. Para isso, basta retrojetar em tempos
'tr de Matti Suuronen. os re-
('r.s()s digitais e da internet permitem clistantes certos elementos tecnológicos do nosso presente ou de um fu-
documentar tudo isso: permitem
('rrtr'(,v(.r um gigantesco
arquivo do futuro, como mosffa, por exemplo, turo pressentido. Í) a operação sugerida pelo gênero de flcção científica
o
rrl('r'('sric crescente peras "time capsules" (cápsulas srcampunk, um primo distante do cyberpunk, que deve seu nome a um ro-
do tempo; rr* grà.rd",
('xl)()siçõcs universais do nrance célebre de Bruce Sterling e William Gibson, A maquina diferencial.
século xx, em particular dr 1939. d. i9oa.ro,
^s I)ublicado em r99o, esse romance desenvolve narrativamente a hipótese
i
scgundo a qual o computador teria nascido um século antes, em plena
,, I ( r l(,r rrrr ) int rocltrzido por
Arnauld pierre
tLt tt em
c'tt Futur
rulilr onlmfur:
onléib art conteruPortítr eL rétrociPatíot, Pais,
M r,), /or2,
I) rL) lnglaterra vitoriana, dos poderes combinados da máquina a vapor e da
x Srrlrrt.ss.rt'rr'rjrizabeLrrF cuffey,Rerro:ThecurtoíReviral,universjryofchicagopress,zoo6
t.r,gcral,simonReynolds, popCulture,sAddictiontoitsOmpast,Novayork: sobre
,r Arnauld Pictre, Futur antérietÍ, op cit, p 48
l:,,:,,,,, Faber&Fabeq
rrr Vt'r iguaJmcnte:Rétroítturkfre,steanpunbetarchéomodsnisme.Catalogued,el'expositíonFútrofiéiilrà
Irt gtbrie rlu jorr Agnàs B. à Pais, àu z4 mars au z6 mai, Paris: Le mot et le rcste, zorz

I I rlrtr' r' o t)ltÍrlitlII,,trto? lIlrrlllr,.r,,rr,, lilir(r,, vtllr,r,,

Elíe During 213


r)rii(r'i,:l ,ógica de charles Babbage.
os computaclores soltam fumaça Irrgrrr suspenso entre as chegadas e as partidas, cntr'(' viirirrs tlcslirrirçl»cs,
r'rrrr«r krcomotivas; são transportados
em estojos de couro e de madeira,
t',rrr bcrr>s fechos de cobre. Esse princípio rrrrrs também entre vários tempos ou ritmos dc ativiclaclc. O saguão do
de hibridação pode ser estendi_
tlrr a t<rclos os tipos de tecnologias. ,r('r'()porto contemporâneo organiza a coexistência das lit.rhas futuristas,
A série revi atd, romances de sucesso (lu(: cvocam velocidade e fluidez, e traços anacrônicos das culturas ver-
de
's('()rt wcsterfeld, misrura aos combates de trincheiras primeira Guerra
da rrrrculares: pubirlandês,bistrô parisiense com sanduíche de baguete, lojas
Mt,clial exércitos de cyborgs e máquinas
do futuro. Artistas, grafistas e rlt' cartões-postais e de suvenires kitsch, torre Eiffel de plâstico, foie gras
t'stilistas trabalham hoje dentro
desse espírito, o que mostra qJ"
putrk t, mais que um subgênero
r rrro*_ c rnacarrão... Claro que os aeroportos mudaram. Mas o tratamento que
da ficçãà científica .orrt.*pàrânea, um
vt'rdadeiro estiro, no sentido em que lrrctlues Tati reserva a esse tipo de espaço, no final dos anos 196o, tem
se fara de estiro art noi,eau, po?
ou rrru valor perfeitamente atual. A operação consiste em extrair daí uma
ttrt dlco' citemos, no cinema, a série
de adapraçõ es de sherrock Hormes,
rr)as também t'spécie de quintessência que se coloque verdadeiramente fora do tempo,
um filme como Ás ayentura.s de Rocketeer,
que encena as ()Ll que pelo menos pertença a uma temporalidade flutuante. Na mesma
irvcnturas de um "homem a propulsão,,
num cenári o art déco,ou ainda a r»r'clem de ideias, e ainda ernPlaytime, a cena do drugstore instalado num
si'ric televisiva The wird wide weste,
honra seja feita, o inesquecível firme
llrazil, de Terry Gilliam realizado b:rirro moderno, às portas de Paris, oferece o tipo daquilo que Deleuze
, em r9g5.
chamou de "situações ópticas e sonoras puras". O retrofuturismo nos
Na prática, é claro, as duas linhas não
cessam de se misrura r. starwars,
p.r tlir um pouco de tempo em estado puro: essa é uma das pistas que as
exemplo, se apresenta como um fllme
arqueo ou paleofuturista: a r'onsiderações a seguir querem trilhar.
\r(tcc-opera intergaráctica (típica
da primeira orientação do retrofuturis_
rrr«r) funde-se ali com grandes
temas mitológicos imemoriais (cavaleiro,
t'it',r clo Graal etc.), em cenários que A NOSTATGIA DO PRESENTE
evocam às vezes os tempos medie-
vuis (procedimento típico da
segunda orientação). As duas orientações
rrrarcrializam num objeto emblemático,
se De maneira geral, o que caracteriza o retrofuturismo é manterjuntas
que resume toda a ambivalência
tlcssa construção retrofuturista: tlr-ras orientações contrárias, a ponto de torná-las indiscerníveis. De fato, o
o famoso sabre d,eruz.segundo o
mesmo rrrcaísmo como sobrevivência do passado numa visão presente do futuro
princípio, os desenhos animados do japonês
Miyazaki, como o casrcro ani- nho é separável do arcaísmo dessa visão do futuro ela mesma, enquanto
mado' procedem a uma mistura de
retrô Meiji e de máquinas do futuro,
sobre um fundo de pós_apocalipse. produzida pelo passado ou cuja extinção se pode antecipar. O futurismo
Esse tipo de anárise tem a vantagem
lctrô e o retrô futurizado são como o avesso e o direito. E é certamente
de não encerrar muito rapi- ('()m essa ambivalência que jogam os artistas e os criadores quando se
clamente o fenômeno retrofuturista
numa perspectlva que veria nele ,rpoderam deliberadamente do tema retrofuturista.
apcnas um efeito de cenário, um
código visual de estilo. ou uma questão
()s filmes de Assim, as roupas desenhadas por Courrêges, Pierre Cardin ou Paco
Jacques Tati, Mon oncle e principalme nte playtime,
põerr. llabanne nos anos 196o são, ao mesmo tempo, a projeção visionária de um
litcralmente em cena a interpenet."çao
. mesmo a sobreposição de dois lr,rturo em que a humanidade viveria em casas-bolas e se sentaria em
tc'l,pos, de dois estados da sociedade
francesa. Me.rcrone-os, para abre-
viar, :r sociedade dos anos r95o e a poltronas-bolas, e uma reapropriação brincalhona do tema já datado da
que se anuncia com a construção
lrrrirro La Défense, em paris, nos anos do cra espacial, antecipando assim em algumas dezenas de anos o olhar di
rgTo_rggo. Sob esse aspecto, as
t'r'r'r:rs cle aeroporto, no começo vcrtido que os contemporâneos dos anos 2ooo dirigiriam a suas criações.
de praytime, são particularmente inte-
r'('ssantcs, porque o aeroporto A alta-costura e o design de vanguarda juntam à antecipação dos modos de
é de todos os lugares o mais claramente
"rrrr. Iugar", vida fufuros o comentário irônico que denuncia a paixão futurista como
no sentido em que o entende o antropólogo
Marc Augé: não uma pose, uma atitude, um simples efeito de estilo.

Íl rlttr, r r tlltí,lilllillttrrri/ lttlrrrfi tr,rrr,rr., lullrr,, vlll,l,


Elie During 215
I kric, r-lrI Íôttigraíô con-ro
l]cn Sandle r reali za paraas revistas
muiro fortemenre marcadas peto
de r-noda rlrrhistoria". Mas o procedimento mesmo do "simulacro" é interessantc
::l]:: ::Jlf,<tomésrrca design e peta
pcll maneira como consegue tornar a interpolação das épocas quase
,r,só,cro*o,,o.'rTfi:T::"X,i:JTlffi:::"Í,l'#ffi rrrrpcrceptível, para melhor intensificar a nostalgia sentida em relação
tlt' i'dccidível. Esse uruverso intimista e ao mesmo tempo
l';X*; .r un1 presente invadido por eflúvios do passado, ou que se recupera ele
rr'tiíiciar é espantosam ente perfeitamente prriprio na forma da retrospecção. Existe aí algo de análogo à "lembrança
contemporôneo,como gostam
rrr's tlc rrcsrSn. sentimos
de dizeros críti_ t k r presente" descrita por Bergson: o recobrimento imediato da percepção
obscuramente que ere busca dizer arguma coisa de
rrrr'sr, f uturo' de um futuro que teria poaao, que poderia l)r'csente por sua própria lembrança, a recuperação do presente como pas-
ser o nosso. Não
lrii rlÍrvida alguma d. qrr. prrt. srrclo - como o passado que ele já ê".Da formação dessa imagem virtual,
do frrcí.rlorrrscitado pelo
r'rrtltrz urn sendmento do mesmo seriadoMa,men
lr:rnhada numa atmosfera de passado genérico, os programas de trata-
dpo. A despeito do extremo
cuidado de nrcnto digital de fotografi.a, como Hipstamatic ou Instagram, oferecem
't',lismo e de fideridade histórica ,, .*p..rrão da textura de uma época _
lrtó rlesmo a escolha de relógios r ma analogia concreta quando dão instantaneamente a uma fotografia a
."r.r", r

,rcmbros de uma agência de " rlLralidade ou a tonalidade de fotografia de época, amarelecida pelos anos,
publicidar.
anos 1960 procede, em realidade,
;:i.Trr: ff ilffirrl*T: rl rraneira das velhas polaroide. O efeito Instagram consiste em produzir
do mesmo fascíniopelo caráterirrealdes_
sc passado que imaginamos
facilmente em preto e branco tlc imediaro um ersatz de cápsula do tempo, um pseudoarquivo do presen-
ou na distância
..cromo.. l(', um vintage instantâneo. A polaroide tradicional já obtinha, por meios
inscriro ,,", i*"g..,,
rcvistaLife, e d,a
ili.:l:'*::ff.:J::;ótino :rnalógicos, essa inscrição fotográfica de uma lembrança do presente. Mas
,,rssacro,.,,.i*p,r,3HJ.TL::,""T',';::Í:J:ilJ_T:::,'.,'J.T:: r r lnstagram enfraquece o punctumfotográfico caro a Roland Barthes, ou,

t'c.ltômico e liberação dos costumer, r r r ais precisamente, retira-lhe a ponta e o faz flutuar numa temporalidade
é ...,rp..rdo aqui com a cor
gosto do presente, como eo scm referência. O afeto próprio ao "isso foi" fotográfico a ideia de que o
um presente alter
,osà-o, a ponto de recobri-lo.
clo' é uma proposição do
o universo or"ff:;#:i:,:::ffi[::; (lue se apresenta em imagem é irremediavelmente findo, passado se dilui
-
rruma duração vaga, indeflnível, que vem engrossar o presente colando-
presente. Não são os lançadores
clirão o contrário. Aliás, reencontramos de modas que
se nele. É um presente imediatamente transfigurado, não na distância
,nr, afeto típico do fi1me de
reconstituição histórica, ou
do
..filme "
de nosralgla,,, andirado po*an.
brumosa da lembrança, mas em seu equivalente perceptivo, que o estilo
-fameson no caso embremático d,e corpos
ardentes,filme de Lawrence lrolaroide rnateriahza aqui, com sua pátina típica: qualidade degradada,
da. realizado em r9go. Nesse filme, Kas_ «-ores enfraquecidas, efeitos de saturação ou de solarização etc. O afasta-
.ry" se passa numa cidadezinha
da Flórida do final dos anos "çao nrento irreversível, o processo de decantação da lembrança, tudo isso nos
r97o, apoucas horas de Miami,
para evitar os sinais que poderiam tudo é feito c dado de uma sôvez sob a forma de uma cápsula do tempo instantânea,
dar
ao espectador uma rigação
contemporaneidade, rudo no com a ('omo se diz do café instantâneo, que poupa o lento trabalho de perco-
fllme está banhado numa atmosfera ..anos
1930" arém do tempo histórico rear". lação de um bom café espresso. Envelhecimento acelerado, retrospecção
o conjunto ..o adquire assim
"'pata
charme e a distância de uma brilhante rrrrtecipada. O Instagram substitui o "isso foi", ou sua transposição no
rniragem,,,,.
o procedimento traduz, segundoJam.rorr, ..declínio Ír-rturo anterior ("isso terá sido"), por algo corno urnimperfeito do presente:
o de nossa his_ "isso era agora". É uma qualidade difusa, mas evidente, que se liga agora
roricidade, de nossa capacidade
vivida de fazer advamente a experiência
ilo presente. O que queremos fixar é aquilo que, do presente, é imedia-
r r lrredricJameson, Le postmode
paris: Écore
*",.,",.i.,.J,I'.::!.i:::.,:::,;ueduc^pitaLismet,rdrf trad francesa F. Noveltry rz FlenriBetgson,LesoutnirdupftsntetlafausseÍecornoissdnce,Paris:PressesUniveÍsitairesdeFrance,
2012.

0 rlue é o reúoÍuturism0? _ lnúodução


aos futuros virtuais

Elie During
I

tirnr(:,rc apropriável sob a forma de imagemJembrança.


um suvenir do nr('rrto fâmiliar dos planos temporais (passado, pr('s('nt(', ltrlrrnr) tprc tlit
l)l'csclltc, portanto. Como se diz: suvenir de paris, suvenir
de Nova york.
Na vcrdade, é ainda mais complicado. srurs referências à nossa situação histórica.
A lembrança do presente des_
('r'rta p()r Bergson mobiliza Esse fenômeno, para dizer de maneira simples, seria o de om retro-
apenas a forma pura do p"rr"do, um
passado retrofuturismo se distingue pela capacidade de
rismo do presente. Esse
gt'rrórico que é o índice da lembrança litt il
pura contemporânea da percepção.
Mas, r-r, caso do vintage instantâneo, (r
l)r'esente carregar uma imagem dele mesmo comofuturo; mas também,
não se trata de qualquer passado.
() passado é inteiramente datáver: sirrrultaneamente, como passado: passado desse futuro que ele carrega e
corresponde justamente à idade de
.,urr cla poraroide. o ponto de referência l'tarda, passado que remete, certamente, a um passado mais profundo,
se situa em alguma parte entre
()s ar10s 1960 e os anos ,r Lrm passado imemorial do qual nosso presente seria como a projeção
rggo. De modo que, desse ponto de
vista, nao é o sonho desperto.
il llnagem que reflui ao passado indefinido , rr,r
para alcançar de forma ante-
cipr:rda as relíquias do passado (papéis Graças a um curioso movimento de torção sobre si do presente, a
amarerados, cores enfraquecidas);
ar contrário, é antes a época particular r'orrsciência se apoia no passado para pro1etar no pÍesente um espectro
à qual associamos essa qualidade
filtográfica, são os anos polaroide ()Lr um fantasma do futuro, verdadeiramente Unheimlich [inquietante].
no presente, qrr"..flr"- o qual aparece
de repente como o futuro um futuro IilLr dispóe assim um circuito paralelo ao tempo histórico. É como se
- possíver - daquele p"rr"do. portan-
t(), o que a magia do meio digital lrouvesse um futuro do passado que acompanhasse a cada instante a per-
efema é uma estranha conversão, uma
rrrrr-a imperceptível dos tempos ('('pção presente. Não é a lembrança do presente que Bergson descrevia,
em favor da qual o presente é repetido
,r lcmbrança imediata que acompanha virtualmente cada percepção: é o
r)()r'L'na espécie de futuro virtual. A tonalidade geral da
imagem, sua
;r;ilirra, abrem uma temporalidade fictícia que visa nosso l)r'csente duplicado pela projeção de um futuro do passado que, a rigor.
presen te como
lirturo, scgundo um movimento de futurização que nio pode ter outro conteúdo senão o próprio presente. É esse caso puro
se di..r"_"rrr. tlrrc o efeito Instagram ilustra: o presente como remanência ou eco ate-
rr. 1'lcrngnle do passado, na capacidade desse "poà
passado de nos divisar,
rtrado do passado na forma genérica do futuro. Haveria assim uma ante-
P,r'assim dizer, peras costas- divisar nosso presente como seu futuro,
rrr, Íuturo que teria ainda o gosto e a cor t ipação ou uma projeção do presente, um eco futuro do presente, como
daquele passado. Não é mais
o presenre visto como passado (o imperfeito lrÍr, segundo Bergson, uma lembrança do presente. O presente poderia
do presente); é o presente
visto como fumro, pelos olhos de certo scr antecipado ao mesmo tempo em que é vivido; poderia ser apreendido
pass"do, qu. insiste ,.
cstranhamente no núcleo mesmo de nossa " irolorg"
contemporaneidade.
t'omo porvir, projetado ao mesmo tempo em que se faz - mas projetado,
.lt' certo modo, às nossas costas, como o eco de um tempo findo.
n lrurulçÃo RETRoFUTUBtsTA
O FIM DA UTOPIA

.lô,ciaEsses exemplos permitem agora precrsar uma intuição. Â ambiva_


Admitamos que essas formulas têm algo de misterioso. Pode-se tentar
do retrofuturismo, como dissemos, se deve
ao dupro circuito que
cle institui: do passado em direção ao t'sclarecê-las evocando outro exemplo tirado do livro deJameson, no capí-
futuro e do futuro em direção ao
passado' Passadização do rrrkr intitulado, justamente, 'A nostalgia do presente". Esse exemplo difere
fuuro, futurização do passado. ora, dois
,l.vlmentos, aparentemente tão distintos por
esses
st'nsivelmente do de um filme de nostalgia e de moda "retrô". Baseia-se
suas orientações respecti-
v.s, poderiam em realidade ser uma coisa nurÍr romance de Philip K. Dick intirulado O homem mais importante do
só. Ou, o que dá no mesmo,
t'sscs movimentos talvez sejam apenas tttunclo, publicado em 1959, e cujo argumento lembra um pouco o do
efeitos de perspectiva sobre um
ÍLnômeno mais fundamental cuja característica Íilrnc de Kasdan, mas com a diferença de um detalhe de orientação. De
é perrurbar o escalona-
Í;rt«r, dessa vez a açáo parece se desenrolar claramente numa cidadezinha

l) Ílttr lr 0 il)lilllUltil|;Irrr? llrtlrrfir(,rrr,rr, lltl[il,, viltl,l.,


Elie During 219
ll() Íillill tl.s lltt.s l()5o M:ls, r)unrir v('rll
Ilrurr() r(.1)r(.st'rrt:rtivlt tllr tr.lttliçlirr , rrrr l,, ,s lrrttrrrs ir-rritginaclos pcla
Íicção científica buscant sempre Íàzer
l)'ll'lll()l(''l t'ttt-ltt'tlltclrt poI t)ich, uur ac[rnrulo clc clcllrlhcs rbcr.r.arrtt,s l, "o
lt.v.r , rr, rssr ) I)r('s('nt(: passado particular de uma epoca ainda por vir", "o
, lt'i1.t'a col'llprccrtdcr. qlrc o qr-radro é, em realiderdc,
o de um simulut.r.. l,,r r f i rt r r r prrssackr de um mundo futuro". A ficção científica passadiza o
r
trrnccbiclo cm D97, ou seja, no futuro (em ;

relação à época em quc () |'rr


.,( ill(', rreclera
sua obsolescência. Mas ao mesmo tempo encoraja uma
rr'r1()r' cscrcvia).
Jameson identifica no romance de Dick um .,excesso rrrt,rrrt'Ílcxiviclade patológica que é o avesso da atrofia da imaginação
crt.
l.tltro anterior", isto é, uma estratégia de desfamiliarização
passa que f r( )l)r(':r. 'lj'ata se, em suma, de drarnatizar nossa incapacidade de imagi
pcla "apreensão do presente como passado
de um futuro ..pecifi.o,, ,. c_l r r,rr o I trtLrro trabalhando essabarreira ideológica pelas bordas, através da
Íirruro é evidentemente aqui um pretexto:
desempenh" ro io,,^.r.. ,r_ r rr r,rt;io dos possíveis, mobilizando, se necessário, os recursos da ucronia
Prrpcl inteiramenre secundário, a questão sendo produzir
uma descriçã, ,, l,r lristólria conjectural.
rrrirximamente "rearista" do presente
no modo da lembrança ou da re St' a evocação do impulso futurista dos tempos passadcls é algo mais
t',rsriruição' Aos olhos de
Jameson, porém, essa estratégia falha. Âliás, ,1r rt' snrples efeito de estilo, um cenário para novas fábulas, se não se res-
cla está esrruturalmente ligada à descrição
do passado como presente, que r,rrrgt' sirnplesmente à denúncia um pouco boba das derivas totalitárias
cra o procedimento característico do
filme
de nostargia. trrtr.o anterior ,l,r rrtopia, gênero do qual se vale a ficção científica distópica, é que não
c passado composto (com o presente)
testemunham, cada um à sua ma- , \r,u)ros reduzidos à constatação tristonha de nossa dificuldade presente
r1e1ra,.nossa incapacidade de alimentar um verdadeiro projeto utopico. ,1,'sirnplesmente desejar o futuro. No retrofuturismo, na atração pitores-
Lí ainda o que sLrgereJamcson num outro
li. , ,r ('xcrcida pelas "cenas da vida futura", há algo mais que um sintoma de
. sp e ciarmen t",ro . upít.,ro intitula do " r..- J. ?ilrT: " {rZ{"i^*!i;
i,ragine the future?"'a' cclmpreende se l)r('scntismo" como mal do século'ti
aí que a ficçao científica, em suas E evidente que a reciclagem nostálgica das visões passadas do futuro
,rientações mais recentes, sobretudo
em sua tendência retrofuturista tr,rrluz algo mais que um julgamento distanciado sobre o futurismo. O
cmbora -fameso, não a considere com
esse nome _, é o sintoma de rllloluturismo não se contenta em ver no Íüturismo "retrô" a expres-
nma mutação de nossa relação com
o tempo histórico em geral. o orhar s,ro dc uma adesão ingênua ao grande relato da modernidade, ao mito
distante, ao mesmo tempo irônico e ,rostálgico,
voltado às figuras do pas_ ,kr progresso como convergência feliz do desenvolvimento técnico e do
sado, não traduziria apenas uma desilusão
ante os ideais tecnocientíficos projcto político. Tampouco se contenta em apontar os indícios perturba-
do progresso, ou uma desconfiança rnte
as derivas totalitárias da imagi- ,lores de seu avesso distópico, o pressentimento inquieto das sociedades
nação utópica- A ficção científica exprimiria,
mais funcramentarmente, totalitárias e das catástrofes por vir. Seria passar ao lado da torção que o
algo de nossa relação com o futuro em
gerar e da nossa incapacidade de r('t-rofuturismo submete à consciência histórica constr-uindo um híbrido,
.limentar um verdadeiro projeto utópico.
Assim comprcendida, a ficção rnla quimera histórica de um novo tipo: os futuros paralelos ou virtuais.
científica não é uma máquina «Je produzir "imagens"
do futuro e isso li disso que devemos falar agora.
v'rle cvidentemenle para as imagens retrofururistas
-, mas antes uma
rnáquina para nos desfamiliarizar, uma
máquina para reestrutufar nossa FUTUROS FLUTUANTES
rclação com o próprio presente em nós,
remetendo a imagem do nosso
prcsente à de um "longínquo passado
de um mundo futuro,,,5. Nesse A análise deJameson é corrd.uzida com muita força, mas conseguiria
explicar os aspectos mais interessantes do fenômeno retrofuturista, espe-
r3 lrrcdric-Janreson, Le postmoLlertisru...,
op. cit., p. 396
r4 li.clricJarreso'' Archeologits oJ thefuture. Londrcs;
cialmente em sua expressão na ficção científica? Seu diagnóstico não faria
verso, zoo5; tracr liancesa,4rchdoio,E
l'L'nttr tycc Ia sciencc es du rutur t.
fi.tior, paris: Max Milo. zoog
llrcclric Janesorr, pcnser ayec la science-fctioa, ()p
cir, p r9 16 Ver François Ha*og, Ré§m d'hitoicité: Ítrésilttne et expfr.mes dutmp\ Paris: Seuil, zoo3.
I

Í) r;Lrc ti o retroÍuturismo? lntrodução


aos Írltur0s vírtuais
Elie During zzl
p()uc()-caso da to,alidadc punk r;uc adquire
com ricquência, na prática, a r,r ,ur()s scguintcs, tendo em vista, para começar, a exposição de 1964. Os
sr-rp()sta nostalgia retroÍuturista? De
fato, diz-se que o futuro .rão
() clue efa porque não somos mais capazes de pensar -ris e rcl:rlos clc antccipação mais recentes não necessitam mais que alguns anos
e de viver à altura de ,L'st'paração com o presente para compor as histórias de um "futuro
visão do fururo, porque não somos mais capazes
'rrr:r de acreditar nele.
Scgundo a poderosa imagem de Walter Benjamin já ;'rr'rxirrro" ("anottoo distantíuture"). Ao que se pode acrescentar: quando
evocada, o Anjo da .r t'volução tecnológica torna sensível o fato de o futuro se anunciar real-
I Iistória avança de costas viradas ao fururo,
soprado e projetado por uma rr r('ntc diferente do presente, abre-se também a possibilidade de contornar
rlcllagração que vem do fundo das idades. Mas, justam.r,.,
.r* melan_ strr inrperativo imaginando linhas de evolução denalxezamuito distinta.
c«rlia tendencial da consciência histórica
não é senão uma dimensão do I )t'ssc ponto de vista, o retrofuturismo ativo, assumido, apârece como
Íi'rrôrrre no. Ela não devefazer esquecer
o carâterbicoreur erítdicode uma rrrr rir variedade da contrautopiaío contexto particular da revolução digital.
r'trrrsciência histórica q,e remont, 0 tempo
e redtivo, graças aos recursos
lr ncssa perspectiva que convém considerar um movimento geralmente
tlt' trrna imaginação informada, possíveis residuais
e futuros natimortos ,rss«rciado ao retrofuturismo: a corrente "re\onics", adepta da reciclagem
rro clomínio das técnicas ou das formas culrurais
em geral. t lirrtiva, que afirma, no espírito da revista Make e do Faça você mesmo, a
Não é inútil dar aqui arguns eremenros de conrexto
histórico. o retro- vorrtade de retraduzir tecnologias contemporâneas em materiais pobres
Ír-rturismo emerge nos anos rgzo e no começo
dos anos r9go, no momento orr obsoletos. Voltaremos mais adiante a esses aspectos do fenômeno.
prccrso em que as perspectivas de abundância
e de progresso econômico
c social indefinido aparecem cada vez mais bloquera^. Certamente não se pode criticar Jameson por não evocar tudo isso:
S o fim da era lrrr 1982, quando ele publica seu texto sobre a imaginação do futuro, o
t'spacial, da reestruturação dos projetos da
Nese, dos dois choques perro-
gi'rrcro cyberpunk era balbuciante e mesmo a palavra "retrofuturismo"
lilLros e suas consequências, mas também
do advento do ciberespaço no .rincla náo fora inventada. Mas os limites da análise, ou seu alcance crítico,
I'gar do espaço, fonte de novos temores e de novos
fantasmas. Sob esse st' dcvem claramente a um postulado fundamental relativo ao próprio fu-
rspccto, o afeto nostálgico do "retrô" cumpre
uma função mais positiva, t rrro. É a ideia de que o bom paradigma para abordar a questão do futuro,
fazer ouvir uma reivindicação de arcaísmo
'a<t
acompanhada de uma von- .lir nossa relação com o futuro, do modo de existência e de presença do
tade de bricolagem, de livre apropriação
das tecnologias de ponta. É o que
íuluro, é o da utopia. Ora, nessa perspectiva, que é a da teoria crítica e
rcsta do espírito do punk no steampunk: conecta-se
o computador a uma tlos estudos culturais, o fururo é imediatamente indexado aos atos de uma
rrrziquina a vapor ou a um ftator, como
num projeto do artistaJeremy t.onsciência (individual ou coletiva) que define o futuro segundo o modo
Deller. De maneira geral, é interessante obs...rr"
.,r. ,
""r^"^1,. tl<r projeto. Quando não é trMalmente o que sero - presente em reserva,
punlc (steampunk, diÃelpunk, ctockpunk)
"tradicional" (isto é,
dos ;ffi::: ffi:::'.:lã:: suspenso à condição de sua reahzação, de sua efetuação -, o futuro é des-
tradicionalmente futurista) apenas exprime,
numa tlc o início compreendido como um conjunto de representações, de cren-
,r dcm particular, um fenômeno mais geral.
o escritor de fic ão científica práticos capazes de infletir a evolução histórica de uma
llrian Aldiss explicava que a ficção científica se ç:rs, de motivos
torna possível somente a sociedade ou, ao contrário, de paralisá-la. Ele é o que projetamos: uma
partir do momento em que as mudanças de fundo
de uma sociedade são t'xpressão do estado presente de nossas expectativas, de nossos desejos,
capazes de ser vividas no espaço de uma
única vida humana ou de uma
tlc nossas capacidades de crer, de esperar, de assumir um destino coletivo
úrnica geração. Essa ligação entre a aceleração
vivida das transformações t'tt:. Ora, desse ponto de vista, como já assinalava Santo Agostinho, não
sociais e o desenvolvimenro da ficção científica
como gênero é inquestio_ hir senão o presente: "o presente do presente, o presente do passado, o
nável. Aliás, é impressionante que o horizonte
temporal da antecipação futuro".
tcr.rda, aqui como alhures, a se encurtar. l)r'csente do
o futuro projetado pela exposição
rrriversal de ry3g jánão ultrapassava o século Quer o imaginemos como um existente em reserva (um possível)
xx: projetava-se nos cinquen- ()Lr como uma realidade simplesmente projetada (um projeto), o futuro

[] (lle ó 0 retroÍuturjsmo? - lftrodução aos futuros viÍtuais


Elie During 223
i' scrrr;'r'c rlt'tCInrirraclr) c()nr() pr.cscntc por vir.. li t.sslr strbor.clirraçao
a<r No irrcor.rsciente de urma sociedade flutuam assim concreções de futu-
l)r.s(',1(', t',r.no firi sugeridcl ,a primeir-a partc, lcva irclutavelmertc a
r r, linlras dc f uturização errantes, liberadas da ordem linear dos presentes
tlt'svrrlr»r'izar'<> Íuturo como um modo do
irrear. Mas tudo muda se, ao srrr't'ssivos. Sempre ligadas por algum tênue fio ao processo histórico,
r',rrl'i.r., r)os preocupamos com o modo de existência
singular do fu- clirs rlcrivam à medida que se distancia a perspectiva de sua realtzação. O
rrr'()' ,i.r ,rcclicla em que ele implica mais que o
simples fato de não ser tliligível, objeto retrofuturista por excelência (vejam o de Panamarenko),
,irrtlrr () Í.turo, de certo modo, não nos espera: ele jâ é ativo, e de mil st'r'il uma metáfora bastante boa disso, assim como as estruturas infláveis
rrrrrrrt'i'irs, prr'a além das representações que fazemos
dele, para além t'rn geral. Esses futuros flutuantes - no limbo, de certo modo nem por
tl:rs ;r.rrt'ssrrs c dos temores. o retrofuturismo
ilustra isso de inúmeras isstl estão totalmente desativados. Mesmo furtivos, estão carregados de
l,r ,rrs: . lirturo é uma força insinuante que não cessa de desfazer a
Lrrna energia de reserva. Seu modo de presença admite intensidades va-
rl, Prcsente. Não estamos condenados a definir o futuro ora
t vitlr:rrr i:r
ririveis e, para disseminar seus efeitos, apenas esperam que os divisemos
( ,'r() ,,1 ilr.xistente, um presente por vir, ora como a forma assumida
tlcliberadamente sob a forma do projeto.
1r.lr r t ,rr j.rt<l dc nossos projetos. Entre um estado de
coisas objetivo mas
rrrtl.t.l',rilrarl«t (o que será mas que não se conhece,
o prar.rrr. por vir) MUNDOS PABALELOS
(' r,r ('srir(l() clc coisas determinado mas
subjetivo (uma representação,
,,r r)r'()r('r(), .rll :rto intencional), não há o que escolher. o futuro pode
Em suma, o futuro não está diante de nós como o que ainda não
:r'r ,lr;r'riv( ) (' (l('lcrminado, contanto que o relacionemos
à sua operação i'. Ele não é anterior, é contemporâneo ao presente. Pelo menos, é a
lrril|'r r,r rrrrrrI t('rr)Po rnais desprendido que o de nossos calendários ou de
pcrspectiva aberta pelo futuro do passado. Seu modo de existência é, de
,..\s,r t rirrrit rrs históricas. sob a paris de Haussmann,
Benjamin descobria ccrto modo, paralelo ao do presente. É preciso, num primeiro momento,
,()s ,rr)s r()20 u l)aris de Baudelaire, mas também
a de Granville e Dau_ tcntar ouvi-lo, literalmente. Como escreve William Gibson: "Thefuture is
, r('r ('rr ri('r.r.s nl.,mentos visionários, isto é, o futuro
daquela paris: toda ilreadyhere- justnot evenly distibuted" . O futuro já está aí, apenas não está
,.r:r (.struLiÍicação de imagens, de
devaneios, de fantasmagorias que um
rlistribuído de forma homogênea. Com o risco de agravar o paradoxo,
,lhrr. rrtc'rto pode captar na ordem das representações,
mas também na poderíamos completar essa fórmula precisando que, se o futuro já está
crrll,r'n material e nos processos históricos. o presente
encerra, assim, no irí, é porque ele ainda está aí, sob a forma de um enxâme de futuros pro-
t'strrckr dc sobreposição, propostas de futuros disjuntivos ligados a passa- pr-rlsados pelas épocas passadas. A citação de Gibson adquire um relevo
tl«rs clcprofundidade diferente. cada exposição universal
recapitura a seu particular se remontarmos ao que constitui, certamente, uma das fontes
,r,cl«r ,s futuros de todas as outras, acrescentando-lhes
o seu. Esse tema primitivas do gênero steampunk: um conto publicado em r98r, retomado
tlu sir.*rhaneidade do não simultâneo é bem conhecido,
como o é o da rra coletânea BurningChrome e intitulado "O continuum de Gernsback"
i,agc,r dialética - imagem explosiva, monragem de tempos disjuntivos.
(The Gernsback continuum), em homenagem a Hugo Gernsback, criador
l,i,,ritcrno-nos a reter a seguinte ideia: o que vare
para sobrevivências de Amazing Stoies, a primeira revista de ficção científica'7. O conto de Gi-
rr'caicas ou estados anacrônicos da imagem
deve valer também para fu_ bson desenvolve a hipótese clássica de mundos ou de histórias paralelas,
trrros do passado, considerados não apenas como
resíduos pitorescos de introduzindo a possibilidade - não menos clássica - de interferências, de
proictos e de sonhos abandonados, mas como indícios
de ,ma presença curto-circuitos ou de efeitos de sobreposição na trama do tempo. Mas o
.ll'tiva, de uma atividade surda e conrínua de interpolação
do proprio lchado consiste em ligar esse tema batido a uma questão que tem a ver
t('r1po' Esse tempo espera, ele também, seu modo
gramatical: não o fu- com a história das formas arquitetônicas, com seus efeitos de latência e
l Lrro anterior (future perfect, em inglês),
mas o fururo anterior do passado
(pa st future perfect) .
r7 William Cibson, ButningChrome, Londres: HaÍper Voyager, 1995

(l rlile é 0 retr0futurismo?
- lntroduÇâ0 a0s futuros virtuais
E ie During 225
dc s«lbr.cvivôncia. 'lj.atlr-st., ruiris
l)r.(.(.rslrrlcr)tc, cic unr cstilo arquitetôrri_ documentaria alguns aspectos da arquitetura norte-america-
c, bcrn ide,tificado h<rjc, quc r('rr Ix )ri(.1rrlcntc
aficionados . ,.r. .rpi.iaristas:
scLrs
. cstilo coogie. Esse estilo neo-art déco, amplamente n,r tkrs anos r95o - os "fantasmas semióticos" ("semiotic ghosts") de um
praticado nos sonh<l futurista bruscamente interrompido - adquire um caráter aluci-
anos rg50 na costa oeste dos Estados
Unidos, na região a. lo, Angeres,
distingue-se do estiro anos r93o (o rrrrtrilio à medida que progride, o personagem principal sendo assaltado
streamrJne Modern) por uma mudança
de paradigma tecnológico: o impurso ;rol visões de um mundo paralelo no qual o futuro sugerido pelo estilo
não é mais fornecido pela evoca-
l{rrygun teria efetivamente se reahzado. O livro que deve resultar dessa
ção do barco ou do avião a hélice, mas do foguete.
Estamos.ta Upo." ,u r('portagem fotográfica intitula-se, no conto, The Airstream Futuropolis:
conquista espacial, na era do átomo,
do Sputnike das primei.", .,rr"g".r, 'l'hc tomorrow that neyer wa.s. E é seu editor que introduz a expressão Ray-
espaço' As formas são enfáticas,
'o arrojadas, .rp"t".orrr-ente angu-
gLrn Gothic. As alucinações do fotógrafo acabam por desaparecer, mas
l.sas; há um gosto pelos arcos
de concreto, pelas luzes ,r realidade alternativa, por um momento entrevista, continua a se ma-
clc neon' pelo vidro' pero cromo ".raopo.r"rrres
combinado aos mareriais plàsticos
e às rriÍêstar à maneira de fenômenos entópticos, sob a forma de fragmentos
cores vivas' A exposição universal
de Nova york, em 1964, mostra ainda
cssa tendência associada aos incertos que persistem no campo periférico da visão. Na pura tradição
cafés de beira de estrada ou aos
rerminais tl<r fantástico, tal como o define Tzyetan Todorov, a história permanece
de aeroporto. pense-se, por exemplo,
no Theme Building do aeroporto
de Los Angeles, com seu aspecto sLrspensa entre duas leituras possíveis, a do realismo e a do maravilhoso,
de disco voador. A ideia do futuro
apregoada pero estilo Googie certamente ir que atribui ao fotógrafo um episódio psicótico (alucinação) e a que vê
nunca se realizou, mas mesmo (:rÍr sua aventura uma profecia fantástica, uma revelação inquietante da
nssim tinha bastante existência
ou consistência na época para se inscrever
c()ncretamente na paisagem urbana irrstabilidade intrínseca da realidade, sua capacidade de fazer existir fora
de cidades como Lo, Angeres e
sua das consciências os fragmentos de um inconsciente histórico que reproduz
pcriferia, e para definir o que é visto
hoje como a épocad. or.ã do
d.esign
retrofururista, depois recicrado nos ir história oficial - inconsciente neofascista, no caso, como o sugerem
galanteios irônicos da arquitetura
pós-moderna. Observemos, aliás, as alusões repetidas à arquiterura monumental de Albert Speer. Não é
gu, ã caso do estilo Googie r. rpr..rr,,
ao dos criadores da alta-costura indiferente, por certo, que o personagem principal seja um fotógrafo:
evocados anteriormenr.. i qrr. .rr.
lo' justamente pof se apresentar ir primeira revelação de outra América, no entanto contemporânea, re-
"rti-
como tal, não se define como retrofutu-
rlsta por um efeito de, retrospecção, compensa longas horas passadas a examinar a superfície de um prédio
na perspectiva de um presente que
lhe sucede; define-se desde o início zi espera do momento propício, da exposição ao sol que darâ a melhor
dessa maneira. Sua dimensão ..retrô,,
é de certo modo assumida no distribuição de sombra e de luz. A um desvio do olhar, um grande objeto
seio
um retrofuturismo sem retrospecçã voador faz de repente sua aparição, propelido por 12 potentes motores.
lôi preciso que William Gibson _ Mais tarde, é uma cidade inteira que se revela por alguns instantes no
o
(rue introduziu mais retrovisor do veículo, com seus templos dourados, zigurates, estradas de
tarde o gênero steampunk com Bruce
Sterring - se cristal suspensas no ar, o rumor incessante dos girocópteros riscando o
illteressasse pero caso para que
essa tendência maneirista da
alrlerlcana encontrasse sua designação
,rqrriàtu." céu. Dessa Futurópolis, a arquitetura Raygun ou retrofuturista oferece,
exata. De fato, deve_se .la , .*_
pressão "Raygun Gothic", que de certo modo, a maquete ou o modelo reduzido, do mesmo modo que
se "
pode compreender riterarmente
o górico (da era da) arma a laser.
como o fllme Blade Runner, realizado por Ridley Scott na mesma época, oferecia
de Los Angeles uma variante como em anamorfose, ao mesmo tempo
Qual a relação entre a história de ficção científica poricrônica
e esse distópica e estranhamente plausível.
.aso arquitetônico? Basta nos reportarmos
à sinopse: ,,o continuum de
(lcr:nsback" conta de Essa maquete faz entrever uma patologia temporal de um tipo par-
que maneira uma reportagem fotográfica
que su_ ticular, com a qual os leitores de Philip Dickjá estão familiarizados. Não

0 (lr0 é 0 retroÍuturismo? lntrodução


aos tutur0s virtuajs
Elie During
ó a melancolia do presente contemplado
na perspectiva do futuro anre- -BETBONICS" E "BETRO GAMING"
rior'; é a paranoia de um futuro
virtual contemporâneo do presente num
nr,,do pararelo' ora, esse procedimento ficcional nos permite
caprar l{epetimos, o futuro não é anterior ao presente, como futuro do pas-
ao vivo o modo de operação
do rerrofuturismo. O que initerpretávamos
csponraneamente como um efeito s;rtlo, é contemporâneo ao presente. Tal seria a conjectura de Gernsback
de transposição do passadà ,o fotr.o,
ou do fururo ao passado, aparece agora (ou cle Gibson). Aliás, ela encontraria uma aplicação direta em registros
sob sua yerdadei raluz.o retro-
futurismo não é mais uma qualidad" qr. se
lrt'rn diferentes, como o das técnicas, por exemplo. Um estudo atento
atribui, retrospectivamenre,
a certos aspecros do imaginário tecnológico tlt»s pontos de desligamento entre linhas de evolução tecnológica põe em
ou político do passado. Não
'sc reduz mais a uma remontagem pitoresca
cvidência um fato que Mcluhan teorizou: o aparecimento e a difusão de
dos estiros em que as épocas
sc rnterpenetram. un1 rlovo meio revelam com frequência, ao mesmo tempo, a especifici-
o retrofuturismo é uma fantasmagori"
ào p..r.rrt",
rrão um devaneio sobre o passado. tlrrde e a persistência obtusa de um meio antigo (a fotografia no cinema,
E essa fantasmagoria é efetiva; não
é o cinema na televisão, o telefone na era da internet etc.). Não por acaso
uma simples projeção, mas uma
tendência objedva que opera no núcreo
mesmo do presente. llruce Sterling, coautor de A maquina diferencial, está na origem do Dead
Quanto aos futuros que lançam até nós suas linhas
de desenvolvimento paralelas, Mcdia Project: esse projeto, lançado ernrg95, buscava constituir na inter-
pode-se atriüuitos a fenômenos de anacro_
nismo ou de sobreviv^ nct um vasto arquivo dos meios de comunicação residuais, acometidos de

- "i, ffi ;H T::*: :'J"H:


o obsolescência pelo progresso técnico'8. Os exemplos são muitos. Sterling
e ss en ci ar : p
são ainda plenamente ativos,
o.
i:ffi.: ::iT ffJIi: ci ta, indiscriminadamente, o fenacistoscópio'n, o telharmonium fprimitivo
embora em graus de intensidade variáver;
se são presentes, é de fato instrumento musical eletrônico], o rolo de cera de Edison [precursor do
enquanto frtrÃr, e isso apesar de
trazerem vinil], o estereoscópio, o telefone Hirmondo, as inúmeras variantes da
necessariamente a marca do passado,
e apesar d" o p.a.arte não poder
se relacionar a eres diretamente larlterna mágica, o sistema de troca de informação por tubos pneumáti-
como a seu próprio futuro, que de toda
maneira não existe. Deve-se concluir c<rs... O projeto, que devia culminar na edição do Dead Media Handbook,
daí que eles são de direito disponí-
vers' portanto suscetíveis de ser rrão sobreviveu mais que alguns anos, o que não deixa de ser irônico. Al-
incorporados ao processo de reaTização
pelo qual o futuro a cadainstante gumas centenas de páginas de notícias e de documentação, reunidas pelo
se cànstitui no presente.
Se o futuro não e rneio um tanto antiquado da mailing lisf, testemunham, mesmo assim,
maràmanei."r.,*'::;L::'"'r:'J;T1;:":l#::?:lT j:,?: o interesse que lhe deram alguns apaixonados pela história das técnicas.
hipótese de Bergson Sterling via no projeto Dead Media uma maneira de aclimatar o antigo
-mesmo tempo quea percepção,
a.o
como seu duplo
virtual, se o passado gênero da pintura das vaidades aos novos formatos do ciberespaço. Sua
não é o preserrr. q,r. passou, se é algo
mais que uma ir.rtenção, claramente apregoada, era lançar uma advertência aos tecnó-
espécie de pele morta do presente,
um resíduo da passagem do tempo,
se a rigor, enfim, ele nunca foi presente, Íilos e incitá-los a um exercício de melancolia por antecipação: chegará
deve-se dizer amesma coisa do
f uturo, simetricamente. o dia em que o computador pessoal e a própria internet nos parecerão
o futuro goza deum modo de existência sui gene-
ns' Ainda que nunca se rearizasse rleios rústicos, gastos e cobertos de pátina, como os objetos WabiSabi
num presente, ele já existe plenamente
como futuro do passado; ele atua (lue osJaponeses tanto prezaÍn.
desde agora, e o que chamamos
lirturo - o futuro do presente arimenta-se n,sso
- de todos os futuros do passa-
tl<>' clos quais talvez não
seja mais que a sedimentação ou o precipitado.
rs Disponível em: <http: w.deadmedia org>
re lnsrrumento com desenhos de um mesmo objeto, em posiçôes ligeiramente diferentes, distribuídos
por uma placa circular ljsa. Quando essa placa gira diante de um espelho, cria-se a ilusáo de uma ima-
g('nr cm orovimento (N r)

lrltr,r rrr,trlrl r, lorlrrr ,rtr


Elie During 229
Nrrrrrlr vt'ilt [rt,rrr rrrt,rros rnt,lirnt.rjlit.:r (.
nl.us t.x1.rt.rj1111.11111, insPir.aclu dlflceis de consertar, e os fóruns na internet regurgitam de mensagens de
Pt'1, t'sPít'it, "ljrrçlt vtlcô rrr('snl() , o Ílr()vrnrcrt() I(ctr.()lrics
rcúrrc alici,
rrrrtl's clc ccluipanrentos tinLage e apaixonados .jogadores desamparados, possuidores de jogos que não podem mais fazer
por bricoragem. A ide ia é f'uncionar por falta de monitor. O grande interesse da exibição vetorial
rf irr)r'()pnar-se criativamente dos
meios obsoletos, fazendoda restauração,
tirr *'t:iclagem e da hibricração uma
em monitor de coordenadas x-y é que ele permite, quando dois pontos
norma construtiva. Essa variedade do
srt'an4tunk (cujo emblema histórico, são dados na lista de comando (dois pares de coordenadas do ttpo x,y),
rembremos, é o computador a va_
traçar imediatamente a linha fosforescente que liga um ao outro, como se
1r,r) r.ros interessa mais pero movimento de "retroizaçao,,
.rà qual arrasta houvesse umpincel eletrônico. Os adeptos do desenho vetorial conhecem
:rs tccnologias contemporâneas,
do que por sua tentativa de ressuscitar,
as vantagens desse procedimento, que garante uma expressão de extrema
rrt'.iante remendos e enxertos, objetos e
dispositivos técnicos que pa- clarczaem todas as escalas. É que o programa não recombina maispixels,
rt't'iam relegados ao museu dos Dead
Media. A pulsão pareontológica e
rr't;r-rivista do coleciona dor-brícoreuré,
mostrados na tela segundo um procedimento de varredura linha a linha;
de fato, contrariada por uma forma
tlr arte bruta ou de primitivismo tecnologico ele combina diretamente elementos lineares, vetores de hy. Traçados
que é o verdadeiro lugar em detalhe, combinados em figuras poligonais, eles se destacam sobre o
da operação r:etrofuturista. Essa
contratendêrrci" ," exprime, em particu-
lar, pelo fato de as tecnorogias avançadas
fundo negro da tela com uma intensidade, flúdez, grau de clareza e de
serem mobil izadasfora de seu
precisão inigualáveis. Ern vez de inscrever na tela cada pixel, renovando
cmprego usual, de maneira mais simplificada,
reduzidas, em suma, ao a imagem trinta vezes por segundo, o feixe eletrônico traça diretamente
cstado de protótipos. Não se trata de
voltar aos velhos amprificadores, ou
as linhas úteis e deixa repousar o resto no escuro. Donde abeleza gótica
rlc conectar o ipod num sistema desse
tipo, mas de uttlizar,por exemplo,
r capacidade de cálculo de um computador de do estilo "filar", com seu grafi.smo ao mesmo tempo depurado e exube-
última g..iao para ani_ rante. Os objetos se deformam, se desfazem e se mútiplicam à vontade,
nrar uttl Jogo como pong videogame
fantigo da Ataril num oscitscópio. riscam a noite como nuvens de vaga-lumes. O acréscimo de "cenários"
o Íàscínio atr-ral pelo retro-gaming,no domínio vídeojúdico,
certamente recortados diretamente na superfície da tela, de tramas plásticas translú-
se explica em parre pelo encanro particular
do row-f- (ou do row-res rbai- cidas, de filtros e de espelhos, de luzes negras ou fluorescentes, intensifica
xa resolução l), mas pode-se ver aí,
mais profundamente, a expressão de
o espetáculo e faz pensar nos jogos de tiro eleffomecânicos dos parques
uma vonrade de transformar um meio .,frio,,
(como o t.l.ár. ,r, ,, de diversões e dos fliperamas, ou ainda no pseudo-3o ligeiramente alu-
mensagens via internet) num meio "quenre"
(como o rádio ou o vídeo cinatório do estereoscópio. Compreende-se que, quando surgiram no
c^'t streaming), ou seja, de liberar a energia
de reserva das tec,ologias mercado no final dos anos tg7o, osjogos vetoriais tenham se imposto
tultrapassadas no centro mesmo dos
dispositivos mais contemporâneos.
rapidamente como o necplus alüra: esses jogos eram os verdadeiros jogos
Os jogos yetoriais (ttector games), desenvolvidos
entre ry77 e ryg5, de_ do futuro. Se tomarem a hipótese retrofuturista a sério, é preciso afirmar
[i'em uma idade de ouro do videogame, sua
idade arcaica ou neolítica que eles ainda o são.
n-rais do que pré-histórica (pois
a hisrória dos videogames remonta
mais Claro, a glória dos jogos vetoriais não terá durado aparentemente
rrcrma, âos anos 196o),", abrangendo
ao todo quarenta jog os _
4z,para ser mais de cinco anos. Na prática, jogo vetorial morreu há muito, arrastado
o
t'xato' Entre os mais cércbres, podemos
citar stmwars, Battrezone,'Tempest
t>t Asteroids' Essa espécie dificil de proreger pela onda pop e coloista de Mario Bros e seus alegres comparsas, defi-
está hoje em via de extinção
.k'vido à rarelação dos monitores x_v rtipo nitivamente suplantado pelo console de sala e pelo monitor de imagem
osciloscópio) que lhes serviam
tlc: snporte: esses monitores, especiarmente
matricial. O fato, no entanto, é que esses jogos, cada vez mais dificeis de
frágeis, sãá cada vez mais encontrar, continuam exercendo um poderoso fascínio que vai müto
além da nostalgia do ex-combatente. Fascínio que se deve à capacidade
rr Iilic During, ''Elogc du sryle vectorier", voir
bsjctuvideo,paris: Bayard. zorz
que esses jogos possuem - e filmes como Tron, que retomam seus códi-

I) r I 0 é o relrofuturismo? ntrOduÇãoa0s
futur0s virtuais
Elie During 231
B()s I)it i'l)()(-rt rlt'sttgt'r'ir', n() lrr('s('nl(. rurr lrrlrrro grossivt'l rlu('ni() cstjt
( ()nrl)l('lirnr('lrt('ril()r't(), r.||nil liillt,t tlt'lrrlrr|rz,rq.t() (lU(' r'()nl llUa I pcrsiStil'
n() n[r('l('() nrcsr-lro clcl atual. I clcssc ponto dt'visLx quc col-!vém, Íalvez,
t.orrsitlt'r'rrr hojc os jogos vetoriais: nrenos por sua capacidade de nos re- DesprogramaÍ o Íuturo'
vt'lrrr rrrrr cstado originário do videogame que por seu potencialucrônico.
David LaPoujade
( lr »rr r s('gLrilrte consequência: não é certo que a morte nafural dos jogos
vclorirris rcnha eliminado a tendência profunda do videogame que se ma-
rrilt'strrvl :rtr:rvés deles. Outros dispositivos estão sendo inventados neste
nr()nr('nt(). I3astapensar ernChildof Eden, a ópera sinestésica realtzadapor
'li'tstryir Mizuguchi, o autor deRez:. ali reencontramos, numa encenação
t;rrc lrt'ira o kitsch, todos os elementos do estilo gótico e linear dos antigos
ir rgos vctoriais. Mais que um piscar de olho aos aficionados do gênero, é

rr l)r()va de que o fururo do jogo vetorial o futuro que era ou podia ser
"O futuro não é mais o
o tlclc - continuou a levar uma existência surda e paralela ao longo dos O que Valéry quer dizer quando afirma:
analisar o papel
;il1()s rL)c)o c 2ooo. tlue era"? Que sentido dar a essa frase célebre? Não vou
explorar os paradoxos que se
que essa frase desempenha em Valéry nem
do seu contexto e tentaÍ
POB UM RETBOFUTURISMO OBJETIVO p.rde.ia tirar dela. Ao contrário, vou separá-la
o pensamento' para a vida'
compreendê-la como uma propos içáo para
As obscrvações precedentes, a despeito de seu curso meandroso, ti- para nós, hoje, aqui . O que quer dizer afirmar hoje que o futuro
"go,"' pelo menos duas coisas: ou que
rr l rr rr r 1.x
»r' íirralidade, no fundo, introduzir uma ideia bastante simples em não é mais o que era? Pode querer dLer
de uma novidade radical
scrr plincípio: o retrofuturismo pode ser considerado uma propriedade o futuro oferece daqui por dát'tt possibilidades
rrlrsoluta, e não um efeito de perspectiva temporal ligado ao enraizamen- sem precede.r,.r, q,r"," ioesperadas'
que modificam não apenas o futuro'
ou' ao conttário' que o
to l.ristórico da consciência num presente necessariamente transitório. rn", p.op.ia ideia que podemo s fazer do futuro;
" o preenchíamos no passado
'li'irtâ-se, em suma, de defender
a hipótese de um retrofuturismo objetivo, futuro se esvaziou das pàssibilidades com que
vazio - ou melhor' samrado de
[)()r'telnto não nostálgico, um pouco à maneira como Stendhal podia dizer e se apresenta a nós d-esesptrad'mente
É nesse sentido
tlc Sh:rl<espeare que ele era, já em sua época, plenamente romântico, e uma realidade que aniquila todas as nossas esperanças'
não e mais o mesmo' é
"fi- à"' utopias"' Se o futuro
iss() antes mesmo do aparecimento do romantismo histórico. Do mesmo que nos falam do
esvaziou de todas as utopias que o povoavam'
nroclo, pode-se dLer que um estilo arquitetônico, um filme, um romance, forqrr. seu horizonte se
no§sas esperanças' no segundo
unr projeto de artista, é retrofuturista nele mesmo, pela maneira como Se, no primeiro caso, o futuro ultrapassa
rlssLrme o presente com seus futuros virtuais. O retrofuturismo não se ele deixou de ser uma razào de ter esperança'
a frase de Valéry tem por objeto
|ccluz a esse movimento segundo o qual o presente se volta com nostalgia Seria um erro, porém, acreditar que
oLL condescendência às antecipações formadas pelos homens do passado: ofuturo.Elanadadizsobreofuturo,apesardasaparências'Então'do
como uma espécie de ava-
clc pode ser produzido diretamente no presente, em consideração - por que ela fala? EIa se apresenta antes de tudo
talvez aideia mesma de futuro não seja
outra colsa
rluc não? - de tempos futuros. liação do presente;

r Tradução de Paulo Neves

233
t) que é 0 relrofuturismo? Introdução aos futuros virtuais

Vous aimerez peut-être aussi