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De onde vem a Oração Centralizadora? Sua fonte é a Trindade que habita dentro de nós. Está
enraizada na vida de Deus dentro de nós. Não creio que reflitamos o bastante sobre essa verdade.
Com o batismo, vem toda a presença eterna da Santíssima Trindade: Pai, Filho e Espírito Santo.
Como seres humanos, participamos da vida divina apenas por estarmos vivos, mas muito mais
pela graça. Participamos do movimento entre o Pai, que se entrega totalmente ao Filho, e o Filho,
que se dá totalmente ao Pai. Eles se esvaziam um no outro. O Espírito de amor os reconstitui, por
assim dizer, para que possam continuar a se entregar para sempre. Esta corrente de amor divino,
constantemente renovada na vida da Trindade, é infundida em nós pela graça. Sabemos isso por
nosso desejo de Deus. Por mais golpeado que seja pelas forças da vida cotidiana, esse desejo
manifesta-se no esforço que fazemos para levar uma vida de oração e uma vida de ação que seja
profundamente influenciada pela oração.
A vida trinitária manifesta-se em nós primordialmente por nossa ânsia de Deus. A Oração
Centralizadora procede da vida de Deus movendo-se dentro de nós. Por isso é trinitária em sua
origem. Seu foco é cristológico. Estabelece-nos em um relacionamento profundo com Cristo.
Iniciado na Lectio Divina (a leitura piedosa das Escrituras) e outras devoções e, especialmente,
nos sacramentos, nosso realcionamento com Cristo move-se a novas profundezas e a novos níveis
de intimidade, à medida que nos fortalecemos na prática da oração Centralizadora .
Por último, a Oração Centralizadora é eclesial em seus efeitos; isto é, une-nos com todos os outros
no Corpo Místico de Cristo e, na verdade, com toda a família humana. De fato, não existe essa
coisa de oração particular. Não podemos rezar nesse nível profundo sem incluir todos da família
humana, especialmente os muito necessitados. Também sentimos a necessidade de expressar esse
sentimento de ligação e unidade com os outros, em alguma forma de comunidade.
Vamos examinar cada um desses pontos em detalhe. A Oração Centralizadora origina-se de um
relacionamento existencial com Cristo como nosso caminho para as profundezas dos
relacionamentos trinitários. Quando participamos da Oração Centralizadora, ligamo-nos à vida
divina dentro de nós. A palavra sagrada é um gesto de consentimento à presença e à ação divinas
dentro de nós. É como se nossa vontade espiritual ligasse a tomada e a corrente (a vida divina)
que está presente em nosso organismo, por assim dizer, fosse adiante e a energia divina fluísse.
Ela já está lá esperando ser ativada. Então, enquanto comparecemos à presença da Trindade dentro
de nós, nossa oração se manifesta em relacionamento com Cristo.
Sabemos que a Lectio Divina e nossas outras práticas piedosas nos preparam para nos
relacionarmos com Cristo. Passamos por certo processo evolucionário de convivência, afabilidade
e amizade. Esta última subentende um compromisso com o relacionamento. Todos conhecem
muito bem a experiência nas quais nos relacionamos com um conhecido, cultivamos sua amizade,
passamos a conhecê-lo melhor e, aos poucos, chegamos à posição de compromisso com ele. O
compromisso é o que caracteriza a amizade. Podemos nos afastar de conhecidos casuais, mas não
da amizade depois de demonstrada, sem partir o coração de alguém, até o nosso. A amizade com
Cristo chega ao compromisso quando decidimos iniciar uma vida de oração e um programa de
vida cotidiana, talhados para nos fazer chegar mais perto de Cristo e nos aprofundar na vida
trinitária de amor.
Pe. Thomas Keating, OCSO
Este é um ponto importante. Quando rezamos, não estamos apenas diante de Cristo. O movimento
para dentro da Morada Interior Divina sugere que nosso relacionamento com Cristo é interior,
especialmente por meio de seu Espírito Santo, que habita em nós e derrama o amor de Deus em
nosso coração. Identificamo-nos realmente com o mistério pascal. Sem passar toda a vez por uma
reflexão teológica, torna-se uma espécie de contexto para nossa oração, de modo que, quando nos
sentamos na cadeira ou no chão, relacionamo-nos com o mistério da paixão, morte e ressurreição
de Cristo, não como algo fora de nós, mas como algo dentro de nós. É por isso que logo
experimentamos uma identificação com Cristo no Getsêmani e, por fim, nossa identificação com
Cristo na cruz. Em nossa perspectiva cristã, Jesus assumiu todas as consequências de nossos
pecados e nossa pecaminosidade, em outras palavras, o falso eu com o acúmulo de mágoas que
trazemos conosco desde a primeira infância e nossos jeitos imaturos de tentar sobreviver.
Enquanto estamos ali, talvez recebamos a consolação do Espírito. Mas depois de vários anos desta
oração, sempre nos achamos no deserto, porque esse é o caminho da união divina. Não há outro
meio de sarar das feridas de nossa primeira infância, a não ser pela cruz. A cruz que Deus nos
convida a aceitar é, primordialmente, a dor que trazemos conosco desde a mais tenra idade.
Nossas feridas, nossas limitações, nossos defeitos de personalidade, todos os danos que as pessoas
nos causaram desde o início da vida até agora e nossa experiência pessoal da dor da condição
humana como a experimentamos individualmente - essa é nossa verdadeira cruz! É isso que Cristo
nos pede para aceitar e deixá-lo compartilhar. Na verdade, em sua paixão, ele já experimentou
nossa dor e a fez sua. Em outras palavras, simplesmente entramos em algo que já aconteceu, a
saber, nossa união com Cristo e tudo o que isso significa, o fato de tomar sobre si toda a nossa
dor, nossa ansiedade, nossos temores, o ódio de nós mesmos e nosso desânimo. Tudo está incluído
implicitamente em seu grito na cruz: "Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?" Essa é a
grande pergunta. Eis o filho de Deus, o amado que devemos ouvir - Cristo, que baseou toda a sua
missão e todo o seu ministério em seu relacionamento com o Pai - e tudo desapareceu. Seus
discípulos fugiram. Sua mensagem foi esfrangalhada. Ele foi condenado pelas autoridades
religiosas e romanas. Humanamente falando, nada restou de sua mensagem. Contudo, este é o
momento de nossa redenção. Por que? Porque seu grito na cruz é nosso grito de uma desesperada
alienação de Deus, erguido no dele e transformado em ressurreição. Enquanto estamos ali,
aguentamos até o fim e deixamos a dor brotar, percebemos que Cristo está sofrendo em nós e nos
redimindo. A Oração Centralizadora converge para o centro do mistério cristão, que é a paixão,
morte e ressurreição de Cristo. Toda a vez que aceitamos uma nova luz em nossa fraqueza e
impotência, estamos em um lugar mais íntimo com Cristo. Ter o lugar mais baixo é estar no lugar
mais alto na visão de Deus. Não sei dizer por que é assim. Talvez seja apenas o jeito que Deus é.
Em sua paixão, Cristo é o maior mestre de quem Deus é. Humildade pura. Altruísmo total. Serviço
absoluto. Amor incondicional. O significado essencial da Encarnação é que este amor é totalmente
disponível. A Oração Centralizadora é simplesmente um método humilde de tentar ter acesso a
essa infinita bondade, renunciando a nós mesmos. O consentimento à presença e ação de Deus
nada mais é que submissão e confiança. Note como cada uma das virtudes teologais corresponde
a cada um dos contextos sagrados. Pomos nossa fé na Morada Interior Divina da Trindade. Pomos
nossa esperança na paixão, morte e ressurreição de Cristo e confiamos completamente nossa vida
a ele. Suportanto o despertar gradual do autoconhecimento, pela paciência, expressamos nosso
amor de Deus em grau eminente.
Há outro aspecto do contexto no qual rezamos. Quando estamos aos pés da cruz, identificando-
nos com o homem na cruz que suportou todas as consequências de nossa alienação pessoal de
Deus, somos curados de nossas feridas emocionais e das mágoas que possamos ter infligido em
nossa consciência. Por intermédio de momentos de ressurreição interior, pode surgir um avanço
para a ressurreição permanente, quando o falso eu finalmente desaparece, dando-nos a liberdade
habitual dos filhos de Deus.
A união com os outros acontece quando o amor do Espírito derrama-se em nosso coração.
Sentimos que fazemos parte de nossa comunidade, da família humana, do cosmo. Sentimo-nos
em casa no universo. Sentimos que nossa oração não é apenas uma viagem particular, mas tem
efeito significativo no mundo. Derramamos no mundo o amor que o Espírito nos dá na oração.
Pleiteamos a misericórdia divina para aquelas partes do mundo que estão sendo arrasadas pela
guerra e pela violência. Compartilhamos os sentimentos de Deus, que sofre onde quer que haja
sofrimento. O que é tão terrível sobre guerra e violência é Deus estar sendo arrasado. Deus
identifica-se tanto com nossa vida e com nossa sorte que Jesus pôde dizer: "o que fizestes a cada
um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes". Essa violência tem de ser
reparada. É um desequilíbrio que precisa do tipo de amor que nasce no silêncio interior à medida
que renunciamos a nós mesmos e deixamos que Deus seja Deus em nós.
O grande privilégio dos contemplativos é sermos convidados primeiro a partilhar de nossa
redenção, aceitando nossa alienação pessoal de Deus e suas consequências em toda a nossa vida
e, então, a nos identificarmos com a compaixão divina na cura do mundo por meio dos gemidos
do Espírito dentro de nós. Os "gemidos inefáveis" do Espírito, como Paulo os chama, são nossos
desejos de trazer a paz e o conhecimento do amor de Deus ao mundo. O amor que é a fonte desses
desejos está de fato, sendo projetado no mundo e está, secretamente, curando suas feridas. Não
conheceremos os resultados de nossa participação na obra redentora de Cristo nesta vida. Uma
coisa é certa: unindo-nos ao Crucificado, unimo-nos a todas as outras pessoas, passadas presentes
e futuras.
Na Oração Centralizadora, então, a humanidade de Cristo não é ignorada, como alegam alguns
críticos, mas sim afirmada da maneira mais positiva e profunda possível. A Oração Centralizadora
pressupõe uma fé viva que a humanidade sagrada de Jesus contém a plenitude do Ente Supremo.
Cristo nos conduz ao Pai, mas ao Pai como Ele o conhece. Em virtude da morte sacrificial e da
ressurreição de Cristo, pela graça, participamos da divindade de Cristo. Somos convidados a
cultuar o Pai em espírito e verdade, o que é seguir Cristo ao seio do Pai, onde, como Eterno Filho
de Deus, ele se entrega à fonte divina da qual ele emerge - e à qual retorna - eternamente, no amor
do Espírito Santo.
(trecho extraído do livro "Intimidade com Deus", Pe. Thomas Keating, OCSO, ed. Paulus, 1999.
- cap. 3, p 38ss:)
PERGUNTAS MAIS FREQUENTES EM RELAÇÃO À PRÁTICA DA ORAÇÃO
CENTRANTE
A Tradição nos ensina que alguns dos frutos da oração e união com Deus, de viver no Reino de
Deus, são dolorosos. Sentimos a dor do mundo, de nossos irmãos, de todas as criaturas de modo
mais agudo. A dureza do coração se dissolve e ficamos mais sintonizados com a Presença de
Deus, e o Cristo sofredor no mundo à nossa volta.
Por conseguinte experimentamos:
- Maior sensibilidade às injustiças no mundo.
- Maior desejo de nos arriscarmos pelos outros, e pelo amor do Reino de Deus.
Os frutos da Oração Contemplativa são a realização das Bem-aventuranças. E elas falam de
felicidade num sentido contrário aos valores do mundo.
Ao nos desarmarmos, tornando-nos mais vulneráveis ao sofrimento em nós mesmos e nos outros,
encontramos a verdadeira felicidade.
Podemos fundamentar nossa prática da OC e estender os Frutos em nossa vida diária com algumas
das seguintes sugestões:
-Prática de pelo menos dois períodos de OC, de vinte minutos cada,
diariamente.
- Participar de um grupo de suporte à OC.
- Prática regular de leitura espiritual, incluindo a prática da Lectio Divina.
- Continuar a ler e aprender sobre a prática da oração contemplativa,
incluindo livros escritos pelo padre Thomas Keating, Basil Pennington e Fr.
Menninger. Ver indicação bibliográfica nesse site.
- Prática da Atenção/Intenção - como ensinadas pelo padre Keating que é dar
nosso consentimento de estar com Deus, de amar e servi-lo na vida diária e
trazer nossa atenção à Presença de Deus em tudo o que fazemos.
- O uso da frase da oração ativa na vida diária. Isto é bem explicado no livro
"Open Mind, Open Heart", do padre Keating. Aconselha-se a tomar uma
frase de cinco a nove palavras da Escritura e usá-la durante todo o dia para
se retornar à atenção e ao consentimento da Presença de Deus e manter uma
ligação com o silêncio interior, especialmente em momentos em que as
emoções nos afligem. (Oração de Jesus)
Por exemplo, a do peregrino russo: "Senhor Jesus Cristo, Filho de Davi, tende
compaixão de mim, pecador", pode ser uma.
A Prática de Boas-Vindas do livro "Open Mind, Open Heart", de Thomas Keating, OCSO, é a
aplicação da Oração Centrante e a ação transformativa do Espírito Santo em nossa vida diária.
Foi formulada pela saudosa Mary Mrozowski, do "Contemplative Outreach". Na prática da OC,
aprendemos experimentalmente que nossa verdadeira identidade se encontra na Presença de Deus,
que nossa vida verdadeira está na Vida de Deus e sua Ação dentro de nós. Aprendemos que os
distúrbios emocionais e comentários de nossa mente reforçam o sofrimento em nossa vida e
necessitam, por isso de compaixão e aceitação e precisam também ser trazidas a Deus para que a
paz seja encontrada. Uma maneira de se fazer isso é a prática de "Boas-Vindas". A prática é
simples e direta mas necessita um grande coração e bastante Fé.
Quando nos tornamos conscientes de emoções aflitivas, pensamentos ou comentários da mente:
Passo 1: Concentre-se e esteja Presente: à energia do sentimento, pensamento, emoção, sensação
corpórea, comentário. (Sem se identificar com eles, consentir neles ou ser levados por eles). (Em
suma, atenção ao momento presente, à emoção ou sentimento, aqui e agora, do jeito que ela é.
Perceber que eu não sou minhas emoções, sentimentos, etc. Eu observo, mas não sou aquilo que
observo. - nota da tradutora)
Passo 2: Dar as boas-vindas, verbalizar internamente sua intenção de entregar, devolver, esta
experiência aflitiva ao Espírito Santo, na totalidade do Cristo. Sendo gentis com nossa
humanidade, damos as boas-vindas à experiência, oferecendo-a em compaixão, por amor à
Presença e Ação de Deus dentro de nós. Mais uma vez, como na prática da OC, damos nosso
consentimento à Presença e Ação de Deus em nós, para curar e solucionar este sentimento,
pensamento, emoção, sensação ou comentário.
Passo 3: Desapegar-se. Desapegamo-nos de nossos desejos desordenados a resultados ou
escapismos.
Expressamos internamente o seguinte:
"Desapego-me de meu desejo por Poder e Controle";
"Desapego-me de meu desejo por Estima e Afeição";
"Desapego-me de meu desejo por Sobrevivência e Segurança";
"Desapego-me de meu desejo ou insistência em mudar a situação que dá origem às emoções
aflitivas (pensamento, sentimento, sensação, comentário, ou evento)."
Esta prática pretende nos ajudar diretamente a redirecionar nossas necessidades inapropriadas a
Deus, para além dos programas emocionais que criamos para nós, ainda numa tenra idade, talvez
a partir de nossa necessidade naquela época, ou pela falta de amor apropriado em nossa criação,
mas que mesmo assim alimentam nosso sofrimento e senso de separação neste momento de nossas
vidas.
Obviamente, há outras circunstâncias, em que esta prática não é apropriada, ou em que nos
sentimos esmagados, tais como circunstâncias abusivas ou perigosas, ou em que o simples
sentimento, ou a lembrança se tornam muito pesados. Em tais casos, a prática da oração ativa ou
"guarda do coração" (oração de Jesus), pode ser mais apropriada. Esta prática é pensada para nos
ajudar no desapego, em Deus, quando mais necessitamos, e facilitar a abertura ao Amor de Deus
e da Graça para nos trazer a transformação e libertação daqueles obstáculos à uma resposta plena
ao amor de Deus.
É importante nisso tudo estar compromissado com uma disposição para o amor compassivo em
relação às feridas de nossa humanidade. Compaixão conosco mesmos!
O livro "Intimidade com Deus" de Thomas Keating, da ed. Paulus, aprofunda a questão dos nosso
programas emocionais para a felicidade, desembocando nos centros de energia por controle, auto-
estima, segurança, que em si são coisas boas, mas que devem estar equilibrados. O livro "Mente
Aberta, Coração Aberto " é ainda mais abrangente, editado pela Loyola.
por Bill Ryan - tradução de Jandira Pimentel
Orações de Perdão
Para rezarmos bem, precisamos antes ser capazes de perdoar e sermos perdoados. Jesus nos diz
para deixarmos nossa oferta sobre o altar e irmos antes nos reconciliarmos com nossos irmãos e
irmãs, conosco mesmos, muitas vezes. Precisamos experimentar a Cura e Libertação de nossos
pecados, traumas, sofrimentos. Sentimentos aos quais nos apegamos e justificamos nossa
infelicidade. Jesus é a Luz do Mundo. Sempre perdoava os pecados àqueles que O buscavam ou
buscavam curas e milagres. No entanto, só Deus, só o Espírito Santo, pode nos conceder essa
grande graça. Precisamos nos dispor para ela, abrir nossos corações e desejar verdadeiramente
nos libertarmos do sofrimento. Muitas doenças, o câncer principalmente, alergias, problemas
digestivos, tem origem na falta de perdão, nas emoções negativas que acumulamos dentro de nós.
A Oração Centrante promove e facilita a "descarga do inconsciente", como a chama o padre
Thomas Keating, levando-nos à tomar conhecimento de muitos traumas, muitas situações que nos
levaram ao estado atual. Porém, podemos dar uma "mãozinha" ao Espírito Santo, nos dispondo e
facilitando essa Cura, que sem dúvida Deus quer nos conceder.
Desejo a todos e todas uma boa "terapia no Espírito": Leiam devagar, saboreiem esses momentos,
que podem se diários, em busca do perdão de que tanto necessitamos para viver na fraternidade,
no amor, sermos felizes, sermos mais humanos. Lembremo-nos de que nossa conversão, nossa
volta para Deus tem de ser diária. Todos os dias nos afastamos d'Ele, todos os dias devemos voltar
à Casa do Pai. A Casa do Pai é o nosso coração. Nele, Ele espera constantemente por nós.
Padre William Meninger, OCSO, monge trapista, americano, esteve entre nós recentemente,
dando retiro sobre a oração centrante e palestras sobre o ‘Processo do Perdão’. Ensinou-nos nas
palestras sobre o processo do perdão, entre outras coisas, que, se temos alguma coisa para
perdoar, devemos fazê-lo e que sem dúvida, o maior beneficiado nesses casos é quem consegue
perdoar. Que em casos de termos uma grande dificuldade em perdoar, e ele contou vários casos
sobre isso, se pelos menos formos capazes de rezarmos por nós mesmos, já teremos dado um
grande passo. Se fizermos isso diariamente, com o passar do tempo seremos capazes de perdoar.
Perdoar não é esquecer. Não se pode esquecer uma ferida. Jesus se orgulha de suas chagas e não
quer se esquecer delas, pois é sua prova de amor por nós. Releiam os textos da Ressurreição!
Que nós também devemos nos orgulhar de nossas chagas, pois é nossa parte na Redenção. A
pessoa que nos magoou, feriu, nem precisa saber que a perdoamos. Não precisamos nos
relacionar com ela, como em casos em que a pessoa foi molestada sexualmente, ou de grandes
traumas. Mesmo que a pessoa a quem devemos perdoar já tenha falecido, ainda assim podemos
e devemos perdoar. Muitas curas acontecem em nossa saúde quando perdoamos de verdade.
Ensinou o exercício abaixo, que deveríamos fazer sempre:
1. Traga à mente - o mais viva e realisticamente que puder - alguém (vivo ou morto) que ame
você ou a quem você ame. Torne a captar e até intensifique o seu sentimento por essa pessoa.
Diga-lhe o quanto a(o) ama, o quanto deseja que ela seja feliz, o quanto você é grato(a) a ela,
por tudo. Faça a Oração da Compaixão por ela (texto abaixo).
2. Escolha uma pessoa que lhe seja indiferente - estranha, ou até desconhecida. Peça permissão
à primeira pessoa acima, mentalmente, para partilhar seu amor com essa segunda pessoa, que
lhe é indiferente. A pessoa, viva ou morta, concordará porque se trata de uma coisa boa. E
também porque cremos na “Comunhão dos Santos”, não é? Partilhe com essa pessoa o
sentimento e a qualidade do amor que você tem pela pessoa amada, acima. Fale-lhe desse amor,
envolva-a nesse amor, etc. Em seguida, faça a Oração da Compaixão por ela.
Mesmo que voce nao consiga perdoar na primeira vez, vá repetindo o exercício outras vezes, até
conseguir perdoar. Que possamos rezar o Pai Nosso, como Ele nos pede: "Pai, perdoai as nossas
ofensas, assim como nós perdoamos aos que nos têm ofendido!"
O primeiro livro do padre William Meninger traduzido para o português, “O Processo do Perdão”,
que trata desse tema em mais profundidade, acaba de ser lançado pela editora Santuário, e se
encontra à venda nas Paulinas/Paulus, etc.
"Durante anos trabalhando no ministério da oração contemplativa e como diretor espiritual, recebi
um grande número de consultas sobre a relação entre doença mental e a prática da oração
contemplativa e a experiência transformativa decorrente da última. Além de ser um professor de
oração contemplativa e diretor espiritual, sou conselheiro clínico e trabalhei no campo da saúde
mental por trinta anos, (nos EUA) muito desse tempo em clínicas mentais comunitárias. Passei
também grande parte desse tempo trabalhando tanto com desordens mentais de maior
complexidade, como as de caráter transitório ou distúrbios emocionais.
Doença Mental
Até recentemente, os seres humanos não haviam compreendido as causas da doença mental.
Agora se sabe que muitas formas das principais doenças mentais são distúrbios cerebrais. Isto
inclui o Transtorno Bipolar, Depressões Profundas, Desordens Esquizofrênicas, Distúrbio do
Pânico e outros. As principais desordens mentais são causadas por desequilíbrio na química
cerebral. Em tempos mais antigos, porque essas doenças não eram compreendidas e eram
atribuídas a possessões demoníacas, doenças espirituais ou de algum outro tipo. Isto se deu com
grande dano às pessoas mentalmente doentes, que eram vítimas do medo e da incompreensão. Em
nosso tempo muitas pessoas, não todas, já descartaram a teoria de forças demoníacas como causa
de doença mental ou emocional. Contudo, há outras noções causais mais sutis e igualmente
perigosas, que permanecem em nosso sistema de crenças, sugerindo que a doença mental, na
verdade, qualquer doença, pode ser um sintoma de desarmonia espiritual em nosso
relacionamento com Deus ou com nosso próprio ser mais profundo.
Essas idéias que a doença tem uma relação causal com a saúde espiritual ou harmonia, causam
um grande desserviço a pessoas com doença mental ou outra doença física. (Por favor, notem que
eu digo *outra* porque as principais doenças mentais *são* doença física no cérebro.) Em toda
minha vida conheci entre meus amigos, em meu círculo de professores e companheiros espirituais,
e em minha própria família, excelentes praticantes de oração e meditação, muitas pessoas boas e
amáveis, que eram afligidas por formas variadas de distúrbios mentais ou emocionais. Estes
distúrbios aconteceram através de fatores desvinculados do amadurecimento espiritual ou a
resistência da pessoa. Na maior parte dos casos era por herança ou predisposição genética.
Acrescentemos que pesquisas recentes com o cérebro (imagem PET) revelam mais ainda sobre
as áreas do cérebro afetadas por uma forma particular de doença mental e o correspondente
desequilíbrio químico que ocorre.
Muitos de nós, sem uma reflexão profunda, adotamos uma forma de pensar inconsciente, mágica,
otimista, de que podemos de alguma forma ser menos vulneráveis às doenças e aflições, se formos
espiritualmente maduros ou espiritualmente sintonizados, ou se de alguma forma estamos em
maior harmonia com Deus. No tempo de Jesus, aqueles que eram leprosos, ou que tinham aflições
ou doenças mentais eram marginalizados e acreditavam estarem sendo punidos por Deus. As
curas realizadas por Jesus, além da cura física em si, eram mais no sentido de tirar aquelas pessoas
do isolamento e envolvê-las no abraço da comunidade humana.
No mais profundo de cada um de nós há um medo da doença, da perda do controle e da morte.
Entre as nossas mais profundas e arraigadas motivações, que estão ligadas aos nossos desejos de
segurança, é a crença errônea de que podemos estar seguros, salvos, invulneráveis, (num sentido
físico e psicológico) se de alguma forma, estivermos bem com Deus. Essas crenças ilusórias,
geralmente aparecem de modo destrutivo. Relembro com tristeza amigos meus, pais de uma
criança morrendo de câncer, que começaram a ser evitados pelos vizinhos cristãos e seus filhos.
Eles ouviam afirmações insinuando, que, por exemplo, eles não deviam estar agindo corretamente
com Deus, para uma situação tão aflitiva estar acontecendo em sua família. Lembro-me dos
comentários ferinos ouvidos por minha esposa, tanto ditos pelo capelão fundamentalista, e por
um terapeuta da 'Nova Era', de que devia haver alguma coisa errada em nossa família, para que
nosso filhinho de um ano estivesse morrendo de leucemia. Numa hora em que famílias e pessoas
mais precisam de apoio da comunidade eles geralmente enfrentam esquivamento, isolamento, e
culpa da parte daqueles que atribuem causas espirituais para aflições naturais da humanidade.
Vulnerabilidade e Força
Em nossa cultura somos viciados por uma quase obrigatoriedade em sermos saudáveis e estarmos
no controle. Frequentemente ainda tentamos colocar nossas práticas espirituais a serviço dessa
ilusão tão destrutiva. Se refletirmos sobre os Evangelhos, na mensagem de Jesus nas Bem-
Aventuranças, torna-se claro que é através da nossa aceitação da vulnerabilidade e nossa radical
entrega a Deus, que nos abrimos a um relacionamento íntimo com o Bem-Amado. Tentativas
fúteis de proteger nosso 'eu' e estratégias de invulnerabilidade são claramente destinadas ao
fracasso. Esta afirmação e aceitação de nossa humanidade e fragilidade é o meio pelo qual nos
abrimos a uma maior confiança e dependência de Deus. É pela nossa humanidade e consequente
fragilidade que chegamos à Comunhão com Deus, não pela negação ou escapando para a ilusão.
Somos vasos de barro contendo a Água Viva, somos lâmpadas acesas que brilham com a Vida de
Cristo, se nos entregarmos sem reservas ao Divino. As feridas psicológicas inconscientes e não
curadas de toda uma vida afetam sim, nossa capacidade de sermos esse vaso aberto à Vida Divina
dentro de nós. Mas é através de nossa prática de auto-entrega, desejo, e compromisso, que estas
feridas são oferecidas ao Amor de Cristo e à cura. Desse modo nossa confiança na ação de Deus
dentro de nós, se aprofunda, e nossa capacidade de ser um instrumento do amor de Deus a serviço
dos outros se expande. Isto não significa necessariamente que nossas aflições são tiradas de nós.
Isto pode significar que aprendemos a usar nossas aflições humanas e vulnerabilidades para
aprofundar nosso enraizamento em Deus e nossa busca de refúgio nele apenas, mais do que em
nossas ilusões, invulnerabilidade e bem-estar.
As principais desordens mentais são distúrbios do pensamento e das emoções. A origem desses
distúrbios é o desequilíbrio ou disfunção de certos neuro-transmissores do cérebro. Esses neuro-
transmissores mediam as sinapses no cérebro que regulam o funcionamento da mente, corpo e
das emoções. A medicação psiquiátrica em graus variados é uma tentativa de corrigir esses
desequilíbrios. Nos últimos trinta anos, a eficácia dessa medicação aumentou de tal maneira, que
muitos dos sintomas dessas desordens já podem ser controladas, particularmente as desordens do
humor, tais como Transtorno Bipolar e Depressões Profundas. Os resultados podem variar mais
com desordens do pensamento, tais como Esquizofrenia ou outras formas de psicoses. Geralmente
se pensa que pessoas com distúrbios mentais podem praticar formas de oração contemplativa sem
efeito colateral, quando os sintomas estão controlados. Nos casos em que os sintomas não podem
ser controlados, particularmente quando há evidência dos mesmos, tais como psicoses (delírios
ou alucinações), ou distúrbios de humor extremos (mania ou depressão profunda), formas de
oração contemplativa apofáticas (sem palavras, silenciosa), podem ser contra-indicadas e se
tornar difíceis ou impossíveis, por causa da interferência do sintoma com o processo da oração.
Nesses casos, outras formas de oração e devoção devem ser recomendadas.
"Noite Escura"
Resumindo
Deve-se afirmar claramente e inequivocamente que não há relação causal entre doença mental e
desenvolvimento espiritual ou por falta dele. Estas doenças ocorrem independentemente de nossa
prática e desenvolvimento espiritual. A vida espiritual pode ajudar uma pessoa a enfrentar ou
suportar com mais coragem e liberdade um distúrbio mental, tanto quanto ajudaria em qualquer
outra forma de doença física, mas a aparência do transtorno tem sua etiologia em nossa disposição
genética, nossa bioquímica, e não nossa vida espiritual. Isto é verdade quanto a distúrbios do
cérebro e também quanto a outras desordens física, como Diabetes, Mal de Parkinson, Lupus ou
qualquer outra doença crônica ou aguda.
Se uma pessoa que pratica Oração Contemplativa, Oração Centrante, Oração do Coração, como
sua principal prática, tiver também uma doença mental tal como o Transtorno Bipolar ou
Depressão Profunda, a coisa mais importante a fazer é seguir fielmente a prescrição médica
psiquiátrica e outras intervenções psicoterapêuticas, para controlar os sintomas da desordem, do
mesmo modo que um diabético faz uso da insulina e outros medicamentos para tratar sua
desordem física. No campo espiritual uma disciplina de uma prática de oração intensa irá ajudar
essa pessoa a refugiar-se na Comunhão íntima com Deus, estejam os sintomas presentes ou
ausentes. A uma pessoa que busca a Deus seriamente, deve ser dito que ela pode ter um distúrbio
mas ela não é um distúrbio (em sua identidade) e ela deve refugiar-se no Coração de Cristo apenas,
como a origem de sua identidade verdadeira e sua essência como Filho/Filha de Deus. Nossa
caminhada para a transformação e crescimento no amor e compaixão, é aprender a usar as aflições
humanas como passagens para a prática de um profundo refúgio no santuário interior do Reino
de Deus, dentro de nossos corações, no centro de nosso ser. Não temos escolha quanto ao
sofrimento que a vida nos traz. Mas, temos uma escolha quanto a responder com desespero e
aflição, ou se vemos nossas aflições e vulnerabilidades como meios para uma busca de maior
refúgio no amor indestrutível e infalível da vida de Cristo em nós."
Palestra por Reverenda Cynthia Bourgeault, da Igreja Episcopal dos EUA, autora de “Centering
Prayer and Inner Awakening”- 24/01/05, aos monges trapistas do Mosteiro “Our Lady of the Holy
Spirit” (Conyers, Georgia, USA)
O DESAFIO DA LINGUAGEM - O resgate da oração contemplativa, que virou sinônimo de
meditação, tornou-se uma estrada difícil de se trilhar no Cristianismo Ocidental. As categorias
onde se pode situá-la - após os séculos 16 e 17, após Teresa de Ávila e João da Cruz e toda a
experiência interpretada, são de difícil tradução e classificação.
Muitos mestres, e penso que Thomas Keating é o exemplo clássico aqui - compreenderam de
maneira muito clara e perspicaz, que esse processo de apenas nos sentarmos e meditarmos,
contém algo crucial e essencial ao coração da prática espiritual cristã, presente desde o seu início.
Mas nunca houve muitas expressões adequadas para expressar esse “algo”.
Acredito que muitos problemas que essas pessoas tem com a meditação, como prática Cristã ,
está no âmbito da linguagem - a nomenclatura. Sempre que se começa a falar sobre oração de
esvaziamento e quietude, ou então de se iniciar a prática da meditação (sem passar antes pelos
passos da oração mental ou ‘oratio’), vamos ter pessoas enlouquecidas dizendo, “Isto não se
parece com nada que tenhamos aprendido!”. E toda sorte de problemas.
Queria muito saber se haveria pontos de partida mais amigáveis, compatíveis com o Cristianismo,
realmente sérios e inegociáveis, para a compreensão da meditação dentro de um contexto
teológico Cristão.
Penso que a Oração Centrante se presta muito bem a essa abordagem teológica, provavelmente
melhor do que qualquer outra forma meditativa disponível hoje em dia, dentro da esfera das
práticas Cristãs.
Intenção e Disponibilidade. Na Oração Centrante, como nos ensinam as instruções, não se fica
tentando concentrar a mente, como na repetição de um mantra, continuamente. Também não é
um processo de auto-consciência, como na prática Budista - como quando se fica consciente de
um pensamento ou emoção emergindo, e se observa o processo inteiro e algumas vezes se rotula
o mesmo: “pensamento enraivecido”, ou “pensamento sensual”. A Oração Centrante não faz isso.
Na Oração Centrante iniciamos com a “intenção”, mais do que “atenção”. Thomas Keating
enfatiza isto sempre. A nossa intenção é estarmos completamente abertos a Deus - completamente
disponíveis. Tão profundamente como se pode ser aberto interiormente: mais profundo do que o
nosso pensar, mais profundo do que nossas emoções, mais do que sua própria estória, seus sonhos,
suas visões.
As palavras “disponível” e “vazio”não são sinônimas. Quando se diz, “Meu objetivo é esvaziar-
me”, você está num jogo da linguagem - e numa impossibilidade. Mas, estar “disponível”, é
realmente abrir nosso coração ao amor. Penso que nos colocamos a caminho com o pé direito na
Oração Centrante, se falarmos do objetivo como sendo uma profunda disponibilidade. Mais
profunda do que as coisas que determinam nosso senso usual de ser.
Mas, naturalmente, “a estrada que leva ao inferno está cheia de boas intenções.” Na Oração
Centrante, pode-se ter a intenção maravilhosa de estarmos profundamente disponíveis, mas, e
daí? Sentamo-nos em oração e dizemos, “Vou estar profundamente disponível a Deus. Vou me
abrir a Deus. Aqui estou Senhor. Preencha-me. Esvazie-me. Faça o que quiseres comigo.” Então
você se senta. Antes que se passem trinta segundos você já está pensando: “Será que guardei as
chaves?” Ou, “Isto já é contemplação?” A mente começa a viajar. Apenas isto. Esta é a natureza
da mente humana.
O ACORDO. Na Oração Centrante, a maneira como se coloca a intenção é o modo como gosto
de chamar, um pequeno “acordo”. E o acordo é este: “Quando percebemos que estamos pensando,
simplesmente deixamos que o pensamento se vá.” Não porque pensar seja algo ruim, mas porque
dentro dessa oração, o deixar que os pensamentos passem é o símbolo do ‘deixar nossas próprias
coisas’ e retornar àquela aberta e imediata disponibilidade.
Digo que o objetivo não é sentarmo-nos munidos com arma e munição e tentarmos abater todos
os pensamentos assim que surgem. E encare isto: Na Oração Centrante passamos algum tempo
sonhando acordado. Faz parte dela. Mas quando se tem um pensamento e algo nos recorda isso
(e misteriosamente isso acontece!), deixamos que ele se vá. Para mim, esse “deixar ir” é a essência
absoluta do método da Oração Centrante.
KENOSE. O que esse ‘deixar ir’, desapegar, "Ele, existindo em forma divina,
largar, realmente significa, quando visto não considerou como presa a agarrar o ser
teologicamente, é ‘kenose’ na forma igual a Deus,
meditativa. Sim, kenose, como descrita por São mas despojou-se,
Paulo em seu Hino aos Filipenses, 2, 6-9. A raiz assumindo a forma de escravo
teológica da Oração Centrante está na teologia e tornando-se igual ao ser humano.
da Kenose - da completa auto-doação no amor. Aparecendo como qualquer homem,
humilhou-se, fazendo-se obediente
Chamo essa oração de “Campo de Treinamento até a morte - e morte de cruz!
no Getsemâni”. O que fazemos, pensamento, Por isso, Deus o exaltou acima de tudo
por pensamento, por pensamento, por e lhe deu o Nome que está acima de todo
pensamento, é, estamos praticando. “Não a nome." (Fil, 2,6-9)
minha vontade, mas a Vossa, Ó Senhor!” A
cada vez que nos desapegamos de um
pensamento e deixamos que ele se vá, e fazemos
este gesto internamente, livremente, isto se
torna um símbolo de nossa vontade de
deixarmos nossas ‘coisas’ e estarmos
totalmente abertos e disponíveis a qualquer
coisa que Deus tenha em mente. Nos
entregamos num nível verdadeiramente
profundo.
GANHAR OU GANHAR. Isto faz da Oração Centrante uma situação de ganhar ou ganhar. A
natureza sagrada desta oração - o lugar sacramental nela - não é alcançado através da tentativa de
manter sua mente num estado único de consciência, em nenhum estado alterado de consciência.
O objetivo não é tentar e atingir a alegria. Não é buscar atingir coisa alguma. Os momentos de
sacralidade nesta oração vêm quando algo em nós compreende - e isto se dá de um modo
engraçado - “Ó, estou pensando...” e desejamos que isto se vá, como símbolo de “Não a minha,
mas a Vossa Vontade seja feita, Ó Senhor.”
Vejo a oração operando completamente sob o emblema da Kenose. Quando praticada desse modo,
as perguntas se dissolvem: “Isto é Cristão?”, Pode apostar que é Cristã! É segura e pode ser
praticada até por iniciantes. Quem disse que é necessário ser “avançado”, para entregar nosso
coração a Deus?
Sempre digo às pessoas que esta oração é uma situação de ganhar ou ganhar, porque quando nos
sentamos para meditar e a mente se aquieta imediatamente, ótimo. Já tivemos essa experiência,
seguramente. Se nos sentamos e nossa mente se assemelha a uma dessas máquinas de fazer
pipoca, “pop, pop, pop, pop” - um pensamento após o outro - e ainda estamos fazendo o melhor
que podemos para deixar os pensamentos irem, então estaremos praticando a Oração Centrante.
Se nos sentamos e estamos com uma terrível dor de cabeça e quase não podemos nos concentrar
em nada, e pensamos, “Meu Senhor amado, hoje estou um farrapo diante de Vós”, e ainda assim
tentamos deixar esse pensamento passar, então estamos praticando a Oração Centrante. É uma
situação de ganhar sempre. Quando a luta com os pensamentos ocorre de maneira acidentada,
então se obtém um bom exercício aeróbico para os 'músculos da entrega'.
O gesto de ‘deixar ir’. Há umas duas vantagens nessa abordagem. Uma é prática e a outra é
teológica. A prática é que há cem por cento de chances de se levar a prática dessa meditação para
nossa vida diária. Tento mostrar às pessoas que esse gesto de ‘deixar ir’, praticado por algum
tempo na Oração Centrante, é apenas isto - um gesto interior. Não é uma atitude. Quando se deixa
que um pensamento se vá, algo realmente acontece dentro da estrutura física de nosso corpo; algo
vai sendo liberado. Com o tempo e perseverança na prática, começamos a perceber gradualmente
que podemos enfrentar as situações da vida com o mesmo gesto interior com o qual praticamos a
Oração Centrante. Antes de ficarmos irados e reagir, ou ficarmos magoados ou feridos, podemos
apenas ‘deixar ir’.
Algumas vezes a “palavra sagrada” pode simplesmente surgir e nos ajudar. Como parte do
método, a Oração Centrante ensina as pessoas a usar o que chamamos de “palavra sagrada” ou
“palavra de oração”, como meio de nos ajudar a deixar que os pensamentos passem. Pode ser uma
palavra como “Abba”, “Jesus”, “Luz”, etc... (Uma pequena palavra de uma sílaba ou duas, no
máximo). Ou uma palavra que seja próxima de uma atitude que gostaríamos de trazer para nossa
oração, como “Paz”, “desapego”, “aqui”, etc... Trabalhamos com essa palavra. Não é um mantra
como no sentido clássico do termo, porque não a repetimos seguidamente, como ponto focal de
nossa atenção. Ela apenas é usada quando algo em nós se torna consciente de que estamos
pensando, para nos ajudar a deixarmos esse pensamento passar e a realmente nos lembrar o que
pretendemos, estando assentados aqui.
O que começa a acontecer é que a ‘palavra’ aparece borbulhando em você, também no meio dos
seus afazeres diários. Lembro-me de uma vez em que eu me apressava para pegar um vôo. Estava
atrasada, no meio de um congestionamento. Pude compreender que não haveria meio de eu pegar
aquele avião. Eu estava ficando mais e mais irritada. De repente, não sei de onde, surge esta
palavra: “coração”. Minha palavra sagrada: “coração”. Era, “ok, deixe que passe. Meu
aborrecimento não vai fazer com que o tráfego se mova mais rapidamente. Tudo o que vai fazer
é tirar-me para fora da lembrança de Deus.”
Modelar o gesto e a palavra ajuda-nos a fazer esta fiel conexão entre o que fazemos no tempo da
oração e o que fazemos no tempo da vida. Penso que esse é o aspecto prático. Não acontece
automaticamente, mas ele fornece uma base sólida para ajudar as pessoas a compreenderem que
a atitude de “auto-entrega” é na verdade, oração na ação.
Eu diria que nossa tradição, Judaico-Cristã, e particularmente, nossa herança Cristã, está
profundamente baseada nesse “Deixe ser, deixe ir, deixe ser”. Isto é lugar e o modo onde a
criatividade do amor pode vir à tona. Isto é o segredo, esta é a maneira pela qual a luz se faz:
“deixe ser”.
Penso que é onde devemos trazer as pessoas para meditar, na tradição cristã - deixemos que
comecem praticando sobre a bandeira da ‘kenose’, compreendendo que o que estão fazendo ao
meditar na Oração Centante é aprender o gesto sagrado, aquela atitude sagrada do “Deixe ser,
deixe ir, deixe que Deus permaneça”. Então vamos poder levar este mesmo gesto para a vida e
praticá-lo na vida, e iremos permitir que o mesmo gesto nos conduza à Presença. A grande dança
da criatividade divina inicia seu bailado dentro de nós, quando podemos relaxar nessa atitude de
‘deixar ir’, deixar que tudo passe.
Porque meditação? Pratico a Oração Centrante porque ela foi a primeira prática que realmente
quebrou a minha ‘casca’ e me permitiu iniciar a imitação de Cristo a partir de dentro, e não mais
de fora. Se ela pertence ou não, à história real de nossa tradição meditativa Cristã - e eu acho que
não - penso que ela é tão profundamente teológica e são tão verdadeiros os seus frutos, que ela
pode ser recebida com alegria dentro do conjunto das práticas transformacionais mais
genuinamente cristãs.
Quando as pessoas me perguntam, “Por que você medita?” Não respondo que é “Bem, porque ela
controla minha pressão alta”, ou “Porque ela me deixa mais calma e tranquila.” Nem mesmo digo
que é porque o silêncio é mais agradável a Deus, porque eu realmente não penso que isso seja
verdade. O que a meditação faz é que ela muda a nossa maneira de pensar. Geralmente, dentro do
Cristianismo, quando se fala em mudar nossa mente ou revestirmo-nos uma nova mentalidade,
falamos na verdade de mudar o conteúdo daquilo que pensamos. Então, passamos de pensamentos
retorcidos, egoístas, para pensamentos bons e piedosos. Mas o que quero dizer é que a meditação
muda nossa maneira de pensar - o filtro real, as lentes pelas quais percebemos a realidade. Ela
muda no sentido de ficarmos mais capazes de viver o extraordinário paradoxo, o paradoxo
salvador da vida Cristã. Para mim, meditação é basicamente o pensamento místico cristão
fundacional.