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Antropélogos vao ao cinema - observacées sobre a constituigao do filme como campo* Rose Satiko Gitirana Hikiji Mestranda em Antropologia/USP, Bolsista da FAPESP, Pesquisadora do GRAVI Resumo: Este artigo tem como objetivo a identificagao e andlise dos principais trabalhos ntropol6gicos que tm como objeto filmes “de fiegio”, Procura responder & pergunta pela existéncia de uma especificidade do olhar antropol6gico sobre o cinema. A preocupago advém da dificuldade observada - ¢ vivida - pela pesquisadora em encontrar informagies sistematizadas sobre metodologias antropol6gicas para andlises filmicas, bem como exem- plos de pesquisas jé realizadas. O que se apresenta aqui ¢ fruto, sobretudo, de um levanta- ‘mento bibliogréfico. No material encontrado, destaca-se a experiéncia pioneira de um gru- po da Columbia University, que, entre 1947 ¢ 1953, elabora uma série de andlises de filmes ‘no contexto mais amplo dos “estudos de cultura a distancia”. Recentemente, a reflexao a partir do cinema (¢ sobre 0 cinema) volta a ganhar espago no Ambito da Antropologia, com as criticas e problematizagdes colocadas pelas etnografias experimentais. Assim, sem pre~ tender-se cxaustiva, esta pesquisa revela a cxisténcia de uma pequena histéria da antropo- logia do cinema ¢ identifica alguns preceitos metodol6gicos e préticas interpretativas que podem ser levadas em conta pelos antropélogos que se aventuram no campo das imagens. U srmos: Antropologia Visual, cinema, andlise filmica. Cinema e antropologia nascem quase simultaneamente e, no decorrer deste sécu- lo de existéncia, cruzam-se em diversos momentos e influenciam-se mutuamente. As imagens projetadas sobre a grande tela fascinam antropélogos. Alguns perce- bem 0 potencial de comunicagdo — e, por que nao, de sedugiio — da imagem ci- nematogréfica e decidem fazer da pelicula etnografia. Hoje, a maior parte da pro- dugio no campo da Antropologia Visual discute justamente o fazer do filme etnografico, a utilizagao das imagens produzidas ¢ a importancia do registro imagético no trabalho de campo’. Mas o século XX revela, além do antropélogo- cineasta, 0 antropélogo-espectador. Este vé o cinema nao como meio mas, objeto da pesquisa. Diante da imagem, dedica-se & decifraco. Identifico-me com este, que toma o cinema como “campo”, passivel de observacio e interpretacio antro- poldgica*. Portanto, neste artigo, procurarei responder a pergunta pela especificidade do olhar antropolégico diante do objeto-cinema. Para tal, partirei da observagaio de algumas das primeiras “etnografias filmicas” chegando a experiéncias mais recentes, 91 oO O Q = & << CADERNOS DE CAMPO PRIMEIROS ENCONTROS A primeira sesso piiblica do Cinématographe Lumiére ocorre em 28 de dezem- bro de 1895, com a exibicio do filme L’entrée en gare de la ciotat, dos irmaos Lumiére. Como nota o antropélogo e cineasta Marc-Henri Piault (1995: 23), os primeiros filmes j4 eram etnoldgicos: imagens como as saidas de fabricas (em La Sortie des Usines Lumiere) ou as tefeigdes de criangas (em Goitter de bébé) redescobriam 0 cotidiano, com seus gestos, costumes e valores. No mesmo ano, mas ainda sem a cdmera de cinema, Félix Louis Regnault, membro da Sociedade de Antropologia de Paris, realiza cronofotografias “étnicas”, de movimentos corporais de integrantes dos grupos Peul, Wolof, Diola e Madagascan. Ele ird propor, em 1900, a criagdo do Primeiro Museu Audiovisual do Homem (ROUCH, 1995). Os primeiros filmes em que a temitica é 0 “outro” datam de 1897 e sao, segundo Jordan (1995), filmes “sem pretensio etnogréfica” e mais interessados em divulgar 0 exético. No entanto, a parceria entre antropologia e cinema aparecer em seguida. Em 1898, so realizados os primeiros filmes etnogréficos, “pensados como documentagao audiovisual para a pesquisa de campo” (ibidem: 15), duran- te a Cambridge University Expedition to Torres Straits, organizada por A. C. Haddon, da qual participaram C.G. Seligman e W.I. Rivers, entre outros pesqui- sadores. Em 1901, a Companhia de Edison faz um acordo com o Bureau of American Ethnology para filmar os trabalhos, distragGes e as ceriménias dos Pueblo € outras tribos, , no mesmo ano, W. B. Spencer filma as cerim6nias dos aborige- nes australianos. Esta lista poderia continuar e, sem diivida, passar por Flaherty (que, se- gundo Rouch fazia etnografia sem o saber), pelo proprio Rouch e chegar aos dias atuais'. Mas a pergunta que pretendo responder aqui é outra. Diante desta eviden- te potencialidade do cinema para o registro das “singularidades e diferengas do outro” (MONTE-MOR, 1995, grifo da autora), quando e de que forma a antropo- logia percebe o filme enquanto produto cultural, que veicula representacdes e va- lores do grupo que o produziu e também daquele para o qual é destinado? Em sua comunicagio apresentada A Société de Psychologie em maio de 1934 sobre as técnicas corporais, Marcel Mauss j4 via no cinema um espago de representaco e divulgaco de tragos culturais. Uma espécie de revelacdo me veio no hospital. Bu estava enfermo em Nova Torque. Per- ‘guntava-me onde ié vira senhoritas caminharem como minhas enfermeiras. Tinha tempo para refletir sobre o assunto e, afinal, descobri que fora no cinema. Ao voltar a Franga, observei, sobretudo em Paris, a freqiiéncia desse passo; as mocinhas eram francesas andavam também daquela maneira. De fato, as modas do caminhar americano, gragas 0 cinema, comegavam a chegar até nés. (..) Existe, portanto, igualmente uma educa- io no andar. (MAUS, 1974: 213-4) 92 Apesar da “revelagdo” no hospital, Mauss, que estimulou seus alunos a “filmar todas as técnicas corporais” (ROUCH, 1995: 85), nao aprofundou as pos- sibilidades da andlise antropolégica de filmes j4 existentes, tais como os que 0 ilu- minaram em sua descoberta da existéncia da “educago no andar”. PRIMEIRAS ANALISES FILMICAS: 0 OUTRO/INIMIGO NA TELA O estudo antropolégico dos feature films* tem inicio nos BUA durante a II Guerra Mundial (WEAKLAND, 1995). 0 objetivo do governo americano era mobilizar © conhecimento dos cientistas sociais para que estes desenvolvessem uma andlise das sociedades estrangeiras, que previsse 0 comportamento de seus membros nas batalhas. Curiosamente, tal como o préprio inicio da disciplina, impulsionado pelo interesse colonizador europeu, a andlise fflmica antropol6gica seria estimulada pelo interesse norte-americano na compreenso do outro, que devia ser conquistado, ou derrotado. E por que o filme? A resposta € quase dbvia. Na guerra, o trabalho de campo nao era possivel e outros meios tiveram que ser explorados, como as entre- vistas com estrangeiros habitantes dos BUA, a andlise de varios materiais escritos — histérias, novelas... e, em particular, 0 estudo de filmes produzidos pelas socie- dades em questdo, principalmente as inimigas Alemanha e Japio. Em comum, além do contexto da guerra, a maioria das andlises desta época tem a marca da Escola Hist6rico-Cultural Norte-Americana. A obra de Ruth Benedict, Patterns of culture, pioneira no campo dos estudos de cultura e perso- nalidade, inspira varias das andlises filmicas realizadas neste perfodo. A busca pelos “padres culturais”, pela compreensao do comportamento humano moldado pe- las tradigdes (BENEDICT, 1934: 1), pelos tragos psicol6gicos das culturas, pelo etos de um povo seré a ténica dos trabalhos produzidos pelo grupo Columbia University Research in Contemporary Cultures. Inaugurado pela propria Benedict —e prosseguido por Mead — o grupo trabalhou entre 1947 e 1953, envolvendo cerca de 120 pessoas, provenientes de 14 disciplinas e 16 nacionalidades (MEAD. & METRAUX, 1953: 6). O livro organizado por Margaret Mead e Rhoda Métraux The study of culture at a distance (ibidem) é a principal publicago desta pesquisa e inclui, em um capitulo especifico sobre andlise filmica, estudos de Martha Wolfenstein, Jane Belo, Geoffrey Gorer, Vera Schwarz, Gregory Bateson, John Weakland, além de artigos das préprias organizadoras. Antes mesmo da formaco deste grupo — cujos trabalhos analiso em seguida —, Benedict, na obra O crisdntemo e a espada (1988), publicada origi- nalmente em 1946, utiliza-se da andlise filmica e da discussio de filmes com seus informantes no seu estudo da cultura japonesa. Assistindo a filmes produzidos no Japiio — de propaganda, hist6ricos e sobre a vida contempordnea em Téquio e nas 93 vaococinema ec Ani ARTIGOS

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