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DOI: 10.1590/1807-57622013.

0007

ALMEIDA FILHO, N. O que é saúde? Rio de Janeiro: Editora

livros
Fiocruz, 2011.

Alan Camargo Silva1


Jaqueline Ferreira2

Naomar Monteiro de Almeida Filho, problematização eminentemente


médico, mestre em Saúde Comunitária filosófica, no texto emerge um debate
e doutor em Epidemiologia, possui amplo, plural e profícuo acerca da
uma larga experiência acadêmico- necessidade de reflexões em torno de
profissional, sendo autor de uma série aspectos teórico-metodológicos que
de livros-texto e inúmeros artigos subsidiam a noção ampliada de saúde.
primordialmente voltados às questões Assim, no primeiro capítulo,
de saúde-doença. Renome nos intitulado Saúde como Problema, o 1,2
Doutorando em
Saúde Coletiva, Instituto
âmbitos nacional e internacional, autor já anuncia que “[...] a saúde é de Estudos em Saúde
dentre outros motivos, Almeida Filho é um problema simultaneamente Coletiva (IESC),
Universidade Federal do
reconhecido por se distanciar da filosófico, científico, tecnológico, Rio de Janeiro. Avenida
racionalidade metodológica político e prático.” (p.15). Por meio de Horácio Macedo, s/n,
quantitativista tão hegemônica na uma breve discussão Próximo a Prefeitura
Universitária da UFRJ,
ciência moderna e que, histórico-etimológica, Almeida Filho Ilha do Fundão, Cidade
inevitavelmente, repercute na Saúde problematiza o conceito saúde e aponta Universitária. Rio de
Janeiro, RJ, Brasil.
Coletiva. Esta característica está a polissemia do termo “doença”3 na 21941-598.
expressa na robustez teórica e análise literatura. Carvalho (2005) aponta que alan10@zipmail.com.br
crítica da forma com que aborda o os estudos concernentes à saúde-
pequeno livro O que é Saúde? doença em uma perspectiva histórica
O que é Saúde? destaca a lacuna exigem a análise dos seus próprios
epistemológica que cerceia o processo conceitos e seus limites.
de (re)construção histórica do campo O autor ainda argumenta que o
da Saúde Coletiva. Com base no conceito saúde-doença deve ser 3
No texto, os significados
contexto sanitário, o autor discute entendido como um problema dos termos pathology,
sobre as diversas tensões que filosófico e científico. Tendo em vista disease, disorder, illness,
sickness e malady são
atravessam a definição conceitual do os grandes autores de distintas escolas esclarecidos.
fenômeno saúde-doença, objeto este de pensamento, pode-se registrar que
que não deve ser explicado somente a saúde, pelo seu caráter 4
Minayo, Hartz e Buss
pelo referencial biomédico, clínico e/ multidimensional, relacional e holístico, (2000), e Seidl e Zannon
ou epidemiológico, mas conceitualmente4, por vezes, é (2004) discutem alguns
aspectos conceituais e
compreendido, também, pela sua reconhecida como um fenômeno, uma metodológicos referentes
complexa totalidade constituída de metáfora, uma medida, um valor ou à qualidade de vida e à
saúde.
influências sociais, políticas, uma práxis.
institucionais e ideológicas. Embora o Nesse contexto, o segundo
título da obra indique uma capítulo, com o título Saúde como

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LIVROS

Fenômeno, aponta que tal conceito é população. No entanto, Almeida Filho


visto como um fato, um atributo, uma lembra que a abordagem
função orgânica ou uma situação social, epidemiológica da Saúde Coletiva é
envolvendo determinados juízos de uma aproximação dos potenciais riscos
valor na medida em que pode ser à saúde, uma vez que definir grupos
definido negativa ou positivamente. de (não) doentes é uma complexa
Negativamente, a saúde significaria tarefa pela presença de distintas
ausência de doenças, riscos, agravos e condições sociais, políticas e 5
Abordagens
incapacidades; positivamente, econômicas5 que envolvem os econométricas da saúde
em que economistas
denotaria desempenho, indivíduos. avaliam certos marcadores
funcionalidades, capacidades e No quarto capítulo, Saúde como para mensurar os impactos
sociais das patologias
percepções. Ideia, delineia-se a crescente ainda são discutidas no
À luz de aspectos necessidade de se definirem, texto (ver Almeida Filho,
sócio-históricos, de maneira densa, objetivamente, os conceitos de saúde 2000).

Almeida Filho pondera que a saúde e de doença. Aponta-se que a


pode ser entendida por meio de um construção de modelos linguísticos ou
equilíbrio em que haveria uma simbólicos referentes a tais constructos
regulação para um padrão normal de está ligada a dispositivos ideológicos.
adaptação bioecológica; como função, Desde meados do século XX, teorias
na medida em que o resultante da socioantropológicas relativas à saúde
saúde seria provindo de uma buscam compreender o complexo
manutenção entre o organismo doença-moléstia-enfermidade
(interno) e o ambiente (externo); como engendrado por aspectos psicossociais
mera ausência de doença, no sentido e culturais. Carvalho e Luz (2009)
de neutralizar agentes patológicos; ou, discutem sobre a importância
ainda, como processo mais amplo da interpretativa dos significados e dos
resultante de diferentes aspectos sentidos atribuídos à saúde-doença,
determinantes no defeito, lesão, falta pelos sujeitos, para o desenvolvimento
ou déficit em organismos vivos. da prática profissional.
No terceiro capítulo, Saúde como À esteira dessa discussão,
Medida, a análise gira em torno, aproximando-se das explicações
especificamente, das possibilidades e interdisciplinares de cunho não
limites do tratamento quantitativo biológico, resumidamente, Almeida
bioestatístico do fenômeno saúde no Filho resgata os clássicos pensamentos
plano individual e singular. Os aspectos de antropólogos do ensino médico que
de mensuração constitutivos da objetivavam dar ênfase aos fatores
abordagem clínica da saúde devem ser socioculturais que atravessam o
relativizados na medida em que podem fenômeno saúde-doença. Distanciando-
existir indivíduos funcionais e se do pensar e do agir em saúde
produtivos com uma série de sintomas, pautados na racionalidade médica
e outros com limitações e sofrimentos ocidental, de modo aprofundado, o
sem evidência clara de doença. Assim, autor esclarece os avanços dos
o estado ou grau de saúde é pressupostos teóricos (microssociais)
multidimensional, tornando difícil a que sustentam a teoria semiológica e as
elaboração de instrumentos para medir análises (macrossociais) das relações de
o completo bem-estar físico, mental e produção calcadas em dimensões de
social, noção esta divulgada pela poder sócio-históricas, políticas e
Organização Mundial de Saúde. econômicas.
O aporte clínico contribui, Saúde como Valor, título do quinto
substancialmente, para a abordagem capítulo, indica a possibilidade da
epidemiológica ao identificar casos de concepção de saúde configurar-se
(não) doença em dada amostra ou como um valor de uso, de troca e de

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vida. Conceber a saúde em si, no sentido de saúde, ontológicas ou dinâmicas, reguladas pela

livros
encarnar um ideal utópico positivista de estado ou negatividade ou pela positividade, aplicadas ao
situação ótima do ser humano, já foi ampla e indivíduo ou ao coletivo, de base biológica ou
criticamente discutido ao longo de décadas, sociocultural [...]” (p.125) ainda são insuficientes
sobretudo a partir das denúncias concernentes às para contemplar uma noção ampliada do conceito
desigualdades e iniquidades em saúde. de saúde, haja vista seus aspectos
Mediante distintas contribuições de matrizes multidimensionais, complexos, articulados e
conceituais e teórico-metodológicas relativas às dinâmicos. O autor considera a possibilidade de
teorias da justiça, por meio de uma abordagem construir uma concepção holística da saúde.
ampla, o autor confronta diferentes propostas de Baseando-se nas premissas teóricas relativas à
minimizar as desigualdades e iniquidades sociais noção filosófica e científica elaboradas por
que interferem (in)diretamente no “valor” saúde Georges Canguilhem, e nos pensamentos
dos indivíduos. Na direção do trabalho de Vieira epistemológicos vinculados às abordagens acerca
da Silva e Almeida Filho (2009), os autores da complexidade das questões constitutivas da
elucidam, brevemente, os pressupostos saúde, desenvolvidos por Juan Samaja, o capítulo
epistemológicos e as teorias sociais relativas aos indica alguns modos de entender tal constructo.
conceitos de desigualdade e diferença que, Almeida Filho faz um balanço crítico acerca de
constantemente, obscurecem o de igualdade e diferentes discursos contemporâneos responsáveis
equidade, que, por consequência, conectam-se à por determinados problemas teóricos que
dimensão da atenção-cuidado. obstaculizam conceber a saúde (ou, na
Em seguida, no sexto capítulo, intitulado perspectiva do autor, as várias “saúdes”) como um
Saúde como Campo de Práticas, tendo como “[...] objeto plural, mutante, relativo e não
ponto de análise o viés histórico-epistemológico, ontológico [...]” (p.138).
de modo objetivo, argumenta-se que os campos Portanto, mais do que uma pergunta a ser
de saberes são atravessados por certos paradigmas respondida, sobretudo de forma unívoca, o título
coexistentes em constante tensão, atingindo, do livro lança diversas questões ainda a serem
inevitavelmente, os setores das práticas. De modo debatidas no campo da Saúde Coletiva brasileira.
preliminar e genérico, o autor apresenta o que se Há uma significativa inconsistência epistemológica
entende por “paradigma” e por “campo social”, a e conceitual que abrange os referenciais teórico-
fim de, no segundo momento, relacionar tais metodológicos relacionados à saúde, sobretudo
conceitos aos saberes e práticas em saúde. pelo fato de o diálogo entre os saberes
Almeida Filho problematiza as diferentes disciplinares ainda ser desarticulado, como
acepções do termo “paradigma” e seus usos exposto em Almeida Filho (2005). A produção
ideológicos no “campo” da Saúde Coletiva. acadêmica parece se prender a modelos que
No Brasil, tal campo vem se consolidando em ainda enfatizam as análises biomédicas da saúde-
diferentes espaços acadêmico-profissionais e se doença no nível individual em detrimento do
fundamentando por meio de diferentes áreas do coletivo – denúncia esta constantemente realizada
conhecimento, o que exige, de acordo com o por filósofos e cientistas sociais.
autor, práticas transdisciplinares, multiprofissionais, Por fim, vale frisar que, embora este livro seja
interinstitucionais e transetoriais. Mais que considerado sintético em seu conteúdo, tal obra
fundamentar as estratégias de prevenção, pode ser entendida como um grande vulto no
proteção, promoção (sentido restrito) e campo da Saúde Coletiva. Torna-se indispensável
precaução, para se propor um quadro a leitura deste excitante texto, para se pensar o
paradigmático de síntese acerca do complexo processo saúde-doença de modo amplo na
promoção-saúde-doença-cuidado, é mister produção acadêmica e na intervenção profissional,
minimizar a práxis hegemônica da Saúde Coletiva seja na interface com a subárea das Ciências
voltada ao plano individual e mecanicista. Humanas e Sociais, na Epidemiologia e na Política,
No último capítulo, Saúde como Síntese, Planejamento e Administração.
emerge a ideia de que “[...] teorias restritas de

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LIVROS

Referências
ALMEIDA FILHO, N. Transdisciplinaridade e o
paradigma pós-disciplinar na saúde. Saude Soc.,
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CARVALHO, M.C.V.S.; LUZ, M.T. Práticas de saúde,
sentidos e significados construídos: instrumentos
teóricos para sua interpretação. Interface (Botucatu),
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MINAYO, M.C.S.; HARTZ, Z.M.A.; BUSS, P.M.
Qualidade de vida e saúde: um debate necessário.
Cienc. Saude Colet., v.5, n.1, p.7-18, 2000.
SEIDL, E.M.F.; ZANNON, C.M.L.C. Qualidade de vida
e saúde: aspectos conceituais e metodológicos. Cad.
Saude Publica, v.20, n.2, p.580-8, 2004.
VIEIRA DA SILVA, L.M.; ALMEIDA FILHO, N.
Eqüidade em saúde: uma análise crítica de conceitos.
Cad. Saude Publica, v.25, supl.2, p.217-26, 2009.

Recebido em 28/03/13. Aprovado em 07/04/13.

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