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De como a bactéria da peste se

tornou letal e mudou a história do


mundo
ANA GERSCHENFELD
01/07/2015 - 08:30

Cientistas descobriram como, há pelo menos 1500 anos, o microorganismo


que provoca a temível peste bubónica deixou de ser uma gastroenterite e
tornou-se rapidamente mortífero.

Triunfo da Morte, por Pieter Bruegel, o Velho (c. 1562), Museu do Prado, Madrid DR

A inserção no seu ADN de um só gene, seguida de uma


mutação nesse mesmo gene, bastou para transformar
radicalmente uma bactéria relativamente inócua e dar
origem a outra, muito mais temível: Yersinia pestis,
causadora das grandes pandemias de peste bubónica
que dizimaram a população europeia a partir do século
VI da nossa era. Esta é a conclusão de um estudo
publicado esta terça-feira na revista Nature
Communications por cientistas norte-americanos.

A bactéria da peste é muito semelhante, do ponto de


vista genético, a uma outra bactéria, mais antiga,
chamada Yersinia pseudotuberculosis, que provoca
uma infecção gastrointestinal. E os especialistas
pensam que Y. pestis terá de facto evoluído a partir
de Y. pseudotuberculosis há entre 20.000 e 1500 anos.

A mais tristemente célebre forma da peste é a peste


bubónica, uma infecção generalizada do organismo
humano que transforma os gânglios linfáticos nos
característicos “bubões” – a marca mais aterradora
desta praga que dizimou por várias vezes as populações
da Europa durante a era cristã.

Sabe-se hoje, com base no estudo genético de Y. pestis,


que a primeira pandemia historicamente documentada
de peste bubónica foi a chamada “praga de Justiniano”.
Entre os anos de 541 e 750, a doença matou mais de
metade da população europeia e contribuiu para a
queda do Império Romano do Oriente. Mais tarde,
durante a Idade Média, uma outra grande pandemia de
peste bubónica, que ficou na História como Peste
Negra, mataria, entre 1347 e 1351, mais de 100 milhões
de pessoas. A Europa demoraria 150 anos a recuperar
da catástrofe.

Até aqui, porém, não se conheciam ao certo os


pormenores genéticos desta radical mudança bacteriana
que alterou a história mundial. Mas agora, a equipa de
Wyndham Lathem, especialista de microbiologia e
imunologia da Universidade
Northwestern,descobriu que essa evolução se processou
em duas etapas.

Numa primeira fase, a bactéria da peste a que Y.


pseudotuberculosis dera origem apenas era capaz de
infectar os pulmões das suas vítimas, provocando
pneumonias fulminantes, altamente contagiosas e
letais. Mas foi só numa segunda fase que a bactéria Y.
pestis se transformou em peste bubónica. E a sua
primeira manifestação "global", como já foi referido,
surgiu, ao que tudo indica, no ano 514.

Mais precisamente, o que estes investigadores


demonstraram agora foi que bastou que a bactéria
ancestral (e relativamente inócua) Y.
pseudotuberculosis adquirisse a dada altura um gene (e
só um), designado Pla, para a primeira e letal forma
de Y. pestis, causadora de pneumonias, emergir. E que
a seguir, bastaria uma mutação no gene Pla para
transfomar a forma pneumónica na forma bubónica da
doença.

“Os nossos resultados mostram que Y. pestis já era


capaz, numa fase muito precoce da sua evolução, de
causar graves infecções respiratórias”, diz Lathem em
comunicado da sua universidade.

Há quanto tempo terá acontecido esta primeira


alteração evolutiva? “É uma pergunta de difícil
resposta”, respondeu Lathem ao PÚBLICO por email.
“Por enquanto, apenas podemos supor que a transição
ocorreu há mais de 1500 anos” (isto é, antes do início da
praga de Justiniano).

Seja como for, os cientistas quiseram testar a hipótese,


proposta por Lathem, segundo a qual o gene Pla, que
comanda o fabrico de uma proteína de superfície da
bactéria Y. pestis, aumenta fortemente a capacidade de
a bactéria infectar os pulmões. Para isso, utilizaram a
estirpe mais ancestral, do ponto de vista genético, de
todas as estirpes de Y. pestis actuais.

Primeiro, verificaram que, embora esta estirpe ancestral


já conseguisse colonizar os pulmões de ratinhos, ainda
era incapaz de provocar pneumonias graves. E depois,
inseriram o gene Pla no ADN dessa estirpe ancestral – e
aí sim, constataram que a bactéria alterada causava nos
animais a forma pneumónica da peste. Por último,
descobriram que uma única mutação no gene Pla era
essencial para a bactéria se conseguir espalhar ao resto
do organismo, dando lugar à forma bubónica da peste.

“É provável que as bactérias já fossem capazes de


provocar peste bubónica antes da mutação no gene Pla
surgir, mas pensamos que terá sido de forma menos
eficiente”, diz-nos Lathem. “O que pensamos é que essa
mutação foi um dos principais factores que
permitiram que Y. pestis, que até lá causava epidemias
localizadas, se tornasse pandémica.”

O que é que esta descoberta implica em termos de


futuras potenciais pandemias humanas? “Acho que o
nosso estudo reforça a ideia de que pequenas alterações
genéticas podem ter um imenso impacto na capacidade
patogénica de uma bactéria”, responde-nos Lathem. “E
sugere que pequenos eventos do mesmo tipo possam ter
grande impacto noutras bactérias”.

Questionado pelo PÚBLICO acerca de perigosidade


potencial de realizar este tipo de experiências no
laboratório, Lathem responde que “é da
responsabilidade dos cientistas não inserirem dentro de
microrganismos patogénicos capacidades que possam
afectar o seu potencial infeccioso ou aumentar o
número de possíveis hospedeiros”. Contudo, acrescenta
que no estudo, não conferiram a Y. pestis "qualquer
capacidade que não tivesse naturalmente, uma vez que
todos os casos humanos de peste são causados por
estirpes portadoras do gene Pla.” E conclui: “Para além
disso, o nosso trabalho é feito em instalações de alta
segurança, sob a supervisão de múltiplas agências e
grupos – e por pessoas altamente treinadas na
manipulação adequada de Y. pestis.”

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