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Público • Sexta-feira 22 Outubro 2010 • 39

É bom não esquecermos quem nos colocou nesta situação de aflição absoluta e de saque fiscal

Mesmo repetida muitas vezes, a mentira não se torna verdade

E
ERIC VIDAL/REUTERS
m 2011 o Estado terá de pagar em juros Foi, repito, a 1 de Janeiro de 2009. Na mensagem
6326 milhões de euros. Mais 1344 milhões de Ano Novo do Presidente da República. Está lá
do que este ano. Isto significa que se o tudo, incluindo o alerta para ter em consideração
IVA aumentar dois pontos percentuais a relação “custo-benefício” nos investimentos pú-
toda a receita adicional irá para pagar blicos. Está também esta constatação importante e
apenas este peso acrescido dos juros. certeira: “A crise chegou quando Portugal regista
E por que é que o Estado vai ter de gastar esta oito anos consecutivos de afastamento em relação
José enormidade de dinheiro a mais em juros? Porque a ao desenvolvimento médio dos seus parceiros eu-
Manuel dívida pública aumentou mas, sobretudo, porque a ropeus.” Foi a década perdida.
Fernandes andámos a financiar a juros proibitivos. E por que Cavaco Silva já tinha, um ano antes (a 1 de Janei-
é que tivemos de aceitar juros tão elevados? Por- ro de 2008!) mas depois de, por altura do Natal, o
Extremo que todos desconfiam das nossas contas públicas primeiro-ministro ter celebrado o sucesso da sua
ocidental e porque o primeiro-ministro iludiu, meses a fio, política de consolidação orçamental, alertado para
anos a fio, qualquer rigor orçamental. O atraso a possibilidade de não estarmos “no caminho de
no anúncio de medidas como as que foram apre- uma aproximação sustentada ao nível de desen-
sentadas ao país a 29 de Setembro custar-nos-á, volvimento médio dos países mais avançados da
só em 2011, muitas centenas de milhões de euros. Europa” – e não estávamos. Assim como tinha feito
Provavelmente o equivalente à poupança que se sua esta dramática interrogação dos portugueses:
espera obter reduzindo os salários dos funcionários “Será que os sacrifícios da última meia dúzia de
públicos (cerca de 800 milhões de euros). anos garantem um futuro melhor?” Sabemos ho-
Estes números não são retóricos, antes repre- je que não garantiram. Alguém tratou de, para se
sentam apenas uma pequena parte, facilmente manter no poder, malbaratar o pouco que tinha
mensurável, do que todos teremos de pagar pela sido conseguido.
irresponsabilidade orçamental e pela política de prometer o contrário nos últimos O mesmo Cavaco Silva voltou a chamar a aten-
ilusões e de mentiras dos últimos anos. É bom não
Em 2011 cada português anos enquanto discutimos os deta- ção, agora a 1 de Janeiro de 2010, 271 dias antes do
nos esquecermos disto e de quem nos colocou nes- pagará, em média e a lhes do Orçamento de 2011. anúncio do PEC3, para o nosso nível de endivida-

E
ta situação mesmo quando discutimos as condições mento, pois “o tempo das taxas de juro baixas não
para a viabilização do Orçamento de 2011. preços constantes, mais 20 m 2011 teremos um Or- demorará muito a chegar ao fim”. Sabemos hoje

E
por cento em impostos do çamento condicionado que já chegou ao fim.
m 2011 cada português pagará, em média à batalha por contas pú- Não é pois aceitável o discurso sobre a impre-
e a preços constantes, mais 20 por cen- que pagava quando José blicas equilibradas pois visibilidade do que sucedeu com “os mercados”
to em impostos do que pagava quando isso é “absolutamente nos últimos meses. Bastava ter tido o cuidado de
José Sócrates chegou ao poder. Esta es-
Sócrates chegou ao poder indispensável para defender o ouvir os avisos do Presidente – ou de tanta e tanta
timativa grosseira, que fiz utilizando os crescimento do produto e do em- gente que ainda foi mais clara e mais dura – para
números da Pordata e o relatório do Orçamento prego”, disse no Parlamento o primeiro-ministro. saber que a nossa política orçamental tinha de ser
de 2011, é o retrato fiel do que foi, nestes anos, a A 30 de Setembro. Depois de, finalmente, ter sido credível (e não a trapalhada que tem sido, sobretu-
política de “consolidação orçamental”: no essen- obrigado a enfrentar a realidade. Depois de anos do em 2009 e 2010). Ou para prever que os juros
cial, cobrar mais impostos. Do lado das despesas, de cegueira – e de uma cegueira perigosa e autista, iriam subir. Preferiu-se, em contrapartida, criticar
as poucas poupanças que tinham sido feitas no própria dos cegos que não querem ver. os “bota-abaixistas” e essa opção custará anos de
quadro de decisões ainda tomadas no tempo de Porém, ao contrário do que sugere, não era neces- sofrimento económico ao país. Isto apesar de – é
Luís Campos e Cunha como ministro das Finanças sário ter chegado ao fim de Setembro para constatar bom ter memória – também em Janeiro de 2009
foram completamente malbaratadas em 2009 por o óbvio. Ou mesmo esperar pelo fim de Agosto, al- a Standard&Poor’s ter baixado pela primeira vez
obra e graça de um eleitoralismo que implicou um tura em que o ministro das Finanças disse ter acor- o rating da República na sequência da aprovação
aumento irresponsável dos funcionários públicos, dado para o problema. No dia 1 de Janeiro de 2009, do orçamento demencial para esse ano, sinal de
acordos com as muitas corporações que tratam o há quase dois anos, alguém sublinhou que “Portugal que não foi só em 2010 que “os mercados” come-
Estado como coisa sua e uma mão-cheia de benes- gasta em cada ano muito mais do que aquilo que çaram a castigar Portugal num “ataque especula-
ses sociais que já tiveram de ser retiradas quase produz”, não podendo continuar “a endividar-se no tivo ao euro”.
na totalidade. estrangeiro ao ritmo dos últimos anos”. Na mesma Basta de propaganda e de falta de memória. Pelo
O que se passou prova que Passos Coelho teve altura esse responsável sublinhou como era, e é, que é bom não nos esquecermos mesmo disto tu-
razão quando, recentemente, disse que, “quan- “importante a credibilidade que merece a nossa do. Afinal de contas, as mentiras, mesmo quando
do os impostos aumentam, nunca mais voltam a política interna, as perspectivas futuras do país, a repetidas muitas vezes, não se transformam em
descer”, e que “a promessa do Estado de reduzir confiança que o exterior tem em nós”. verdades. Jornalista (twitter.com/jmf1957)
a sua despesa é sempre uma falácia”. Temos tido
essa experiência com o IVA – que começou a 16
por cento e querem que salte agora para 23 por
cento – e também com o IRS. Durante muitos anos
Merkel, o multiculturalismo e a intolerância dos tolerantes
foi sendo possível alimentar a voracidade crescen-
te do “monstro” apenas por via do aumento da a Angela Merkel disse o óbvio: a força política da Alemanha um conseguiram bons resultados
eficiência fiscal; porém, conforme o número dos tentativa de criar uma sociedade debate que, decorrendo nas eleitorais em países tão tolerantes
que escapam ao fisco foi diminuindo, só restou aos multicultural na Alemanha “falhou margens dos grandes partidos, como a Holanda, a Dinamarca
governantes aumentarem as taxas dos impostos. redondamente” – e isso foi suficiente poderia degenerar. ou a Suécia. Recomendo por
Numa altura em que o país deixou de crescer, esta para que de imediato a apodassem É, de facto, tempo de abordar sem isso a leitura de um interessante
contribuição dos cidadãos e da economia para o de racista, fascista ou mesmo medos o problema da integração artigo de Cas Mudde, autor de
sorvedouro público tornou-se insustentável. nazi. Sucede que uma sociedade dos imigrantes islâmicos – ou um estudo sobre o populismo
As propostas do PSD para o IVA e para o IRS onde apenas 14,5 por cento dos da falta de integração. É tempo radical de direita na Europa, em
são por isso muito razoáveis, pois visam tornar jovens de origem turca nascidos na de perceber que a abordagem que este defende que a ascensão
transitório o aumento de impostos e evitar os no- Alemanha se consideram alemães multicultural não só falhou como desses partidos não radica num
vos aumentos que virão a seguir se não se alterar é uma sociedade onde o modelo é errada, pois leva a tolerar o ressurgimento do nacionalismo
o rumo das políticas públicas. Isto porque a má- de integração multicultural não intolerável, isto é, implica aceitar racista, antes numa reacção dos
quina do Estado e a lógica reivindicativa dos mui- funcionou. os hábitos pré-modernos vigentes tolerantes à intolerância que sentem
tos interesses e corporações são, por definição, Ao enfrentar o problema de nessas comunidades, a começar existir no seio das comunidades
insaciáveis. Só impedindo o Estado de colectar frente, em vez de se refugiar no pelo estatuto da mulher. É preciso de imigrantes islâmicos (http://
mais impostos se consegue obrigar os governos a politicamente correcto, Merkel uma abordagem diferente que terá www.opendemocracy.net/cas-
tomarem medidas para reduzir a receita. É bom mostrou, mais uma vez, que tem de passar, também, por perceber a mudde/intolerance-of-tolerant).
não nos esquecermos disto, assim como de toda coragem e sabe falar claro. Mais: verdadeira natureza dos partidos Comunidades que são, muitas vezes,
a actual voracidade fiscal e de quem nos andou a trouxe para o interior da maior anti-imigração que recentemente especialmente intolerantes.

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