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AULA Nº 02

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1. A PALAVRA DIREITO E SEUS DIVERSOS SENTIDOS

A palavra “Direito”, em português (como em outras línguas


latinas), é uma palavra que pode expressar diversos sentidos diferentes.
Vejamos, a partir de um caso único. Um casal discute os termos do
divórcio e da guarda dos filhos, perante o Juiz:

O Juiz, abrindo a audiência: “o direito não traz qualquer previsão


sobre como dividir os bens, a guarda dos filhos e o pensionamento. O ideal
é que vocês cheguem a um acordo. Se não houver acordo, terei eu que
fixar os termos.”

Advogado (a) da ex-mulher: “Não é direito que ela fique


completamente responsável pela guarda das crianças, pagando colégio,
plano de saúde, vestuário, tudo, e que o ex-marido pague de pensão aos
filhos apenas um salário-mínimo”

Advogado (a) do ex-marido: “Mas antes a gente entrar em


acordo sobre algo que possa ser pago direito, do que fixar um valor mais
alto que o meu cliente não terá condição de pagar, e todos os meses vai
ser aquela confusão”.

Observem que o mesmo vocábulo, “direito”, foi utilizado em


três sentidos completamente diferentes. Todos estão corretos, todos são
jurídicos de alguma forma. Mas expressam ideias diferentes entre si.
Vejamos abaixo.

2. CRITÉRIOS DE VALORAÇÃO DO DIREITO: JUSTIÇA, VALIDADE E


EFICÁCIA

Encontramos essa explicação no livro “Teoria da Norma Jurídica”, de


Norberto Bobbio, em especial em seu segundo capítulo.
Segundo o autor, a normas jurídica, e por consequência o Direito,
passam por três valorações distintas e independentes:

1) Ela pode ser justa ou injusta


2) Ela pode ser válida ou inválida
3) Ela pode ser eficaz ou ineficaz

2.1. O problema da Justiça

Vamos ao primeiro problema, o problema da Justiça. Voltemos ao nosso


exemplo acima, onde estamos em uma audiência para fixação de um
acordo (uma norma), que passará a regular as relações entre ex-
marido/ex-mulher e seus filhos:

Advogado (a) da ex-mulher: “Não é direito que ela fique


completamente responsável pela guarda das crianças, pagando colégio,
plano de saúde, vestuário, tudo, e que o ex-marido pague de pensão aos
filhos apenas um salário-mínimo”

Neste exemplo, o que ele quis dizer é que não é JUSTO que ela
acumule uma série de responsabilidades com os filhos em comum dos
dois, com uma colaboração financeira tão restrita por parte do ex-marido.

Voltaremos por várias aulas ao problema da justiça, sob a


perspectiva de vários autores diferentes. Mas precisamos de um conceito
agora sobre o tema, que sirva de ponto de partida.

Norberto Bobbio nos propõe o seguinte:

“O problema da justiça é o problema da correspondência ou não


da norma aos valores últimos ou finais que inspiram um ordenamento
jurídico”.
Assim também John Rawls, reforçando o questionamento da
popular ideia de que haveria uma única concepção possível de justiça:

“O que justifica uma concepção de justiça não é ela ser


verdadeira de acordo com uma ordem antecedente e dada para nós, mas
sua congruência com as nossas mais profundas compreensões de nós
mesmos e nossas aspirações, e nossa compreensão de que, diante da
nossa história e das tradições incutidas na nossa vida pública, é a doutrina
mais razoável para nós.” (Em “Uma Teoria da Justiça)

Em tempos tão fragmentados e individualistas que vivemos, eu


iria um pouco mais longe, para dizer também sobre valores últimos ou
finais que inspiram um grupo mais restrito, ou mesmo uma única pessoa.

Quando se analisa uma norma sob a perspectiva da justiça, o


que está se fazendo é realizar uma comparação entre algo que existe, ou
está na iminência de ser criado, e um conjunto de valores ideais. Mais uma
vez, Bobbio:

“Norma justa é aquela que deve ser; norma injusta é aquela que
não deveria ser.”

Voltemos ao caso sob o estudo. O advogado da ex-mulher


manifesta-se: a) primeiramente, no sentido da incompatibilidade da
proposta posta sobre a mesa com o ideal sua cliente havia pensado sobre
o assunto; b) para escapar de uma acusação de subjetividade, vemos que
ele se alonga no exemplo, para buscar demonstrar a incompatibilidade do
proposto com um padrão mais amplo do que seria aceitável socialmente
para a criação de filhos de pais separados.

Vamos pensar em outros casos, adotando este padrão? Lembre-


se do critério posto acima, para que a discussão seja resumida à ideia de
justiça.

Sugestões: a) possibilidade ou não do ex-presidente comparecer


ao velório do seu irmão falecido;
b) hipóteses de vingança privada;
c) idade mínima para se aposentar;
d) outros temas que vocês queiram discutir.

2.2 O problema da Validade


Disse o Juiz, em nosso exemplo de partida:

“o direito não traz qualquer previsão sobre como dividir os bens,


a guarda dos filhos e o pensionamento. O ideal é que vocês cheguem a um
acordo. Se não houver acordo, terei eu que fixar os termos.”

O que ele quis dizer aqui com a palavra “Direito”?

Ele quis afirmar que o Estado Brasileiro não tem uma norma
obrigatória, previamente definida, para tratar do mérito do assunto
“divisão de bens e guarda de filhos na separação”. A única norma que
EXISTE sobre o assunto é deixar o tema ao acordo dos ex-cônjuges, em um
primeiro momento. Caso a indeterminação prossiga, ele está autorizado
pelo Estado Brasileiro a criar a norma que passará a EXISTIR para tratar do
assunto.

O problema da validade é a o problema da existência de uma


regra de conduta, criada pelo Estado (pelo menos neste momento
histórico atual) para tratar de determinado assunto, independentemente
de qualquer juízo sobre a justiça do seu conteúdo.

Enquanto para julgarmos a justiça de uma norma é preciso


compará-la com um valor ideal, para examinarmos sua validade realizamos
investigações empírico-racionais (baseadas na observação da realidade).
Basicamente, são três as operações:

a) A autoridade que criou a norma tinha o poder legítimo de


emanar normas jurídicas, ou seja, normas de comportamento?

Em Estados Democráticos de Direito, este poder deriva do texto


constitucional (fonte da legitimidade), e é atribuído ao Poder Legislativo.
No caso que estamos estudando, o Legislativo “cede” este poder, neste
assunto específico, aos próprios interessados para se autorregularem, ou,
em caso de insucesso, ao Poder Judiciário. Estudaremos este padrão e
suas exceções em uma segunda etapa de nosso curso.

b) A norma está em vigor?


A norma, para ser válida, não pode ter sido revogada (expressa
ou tacitamente) por outra ordem estatal legítima sobre o mesmo assunto.

c) A norma é compatível com as normas hierarquicamente


superiores?

Os sistemas de validade de normas costuma-se organizar


hierarquicamente, tendo como ponto culminante a Constituição. Desse
modo, a validade de uma lei depende de sua compatibilidade com o texto
da Constituição. De um decreto ou contrato, de sua compatibilidade com o
texto da Constituição e da Lei.

2.3 O problema da eficácia

O problema da eficácia de uma norma jurídica é o problema de


ser ou não seguida pelas pessoas a quem é dirigida, e, no caso de
violação, ser imposta por meios coercitivos pela autoridade que a
evocou.

Voltemos à resposta do advogado do ex-marido:

“Mas antes a gente entrar em acordo sobre algo que possa ser
pago direito, do que fixar um valor mais alto que o meu cliente não terá
condição de pagar, e todos os meses vai ser aquela confusão”.

A palavra “direito” nesta frase é sinônimo de eficácia. Discute-se


a etapa posterior à fixação da norma válida (também já superada a
discussão sobre a justiça), e esgrime-se um argumento que alguns
poderiam considerar cínico, mas que na prática jurídica não pode ser
desconsiderado.

Em outros termos, o advogado do marido sugere que não


adianta formular-se em mesa de audiência uma norma de grande justiça,
atribuir-se validade a ela pela homologação judicial do acordo, mas não se
conseguir implementá-la a cada mês, quando do vencimento de cada
obrigação mensal de pensionamento.
O que está subentendido é que o Poder Judiciário não terá
recursos físicos para impor esse cumprimento, ainda que justo e válido.
Pode ser que ele tenha em mente considerar fácil ocultar bens, pode ser
que ele simplesmente pense nas dificuldades cotidianas dos processos em
curso no Poder Judiciário. Mais sofisticadamente, ele pode estar contando
com o machismo da sociedade, lembrando que poderá postergar (ou até
evitar completamente) a sanção máxima de sua prisão por falta de
pagamento de pensão, pelo consenso social de que se trata de algo
demasiadamente drástico para a situação.

O fato é que a realidade “trabalha” de alguma forma em favor


do seu argumento, e ele lembra aos demais envolvidos (a sua ex-mulher,
mas também ao juiz do processo) que as coisas podem não ser tão fáceis
assim, se ele decidir não colaborar na etapa subsequente à decisão.

A medida da eficácia de uma norma é a proporção pela qual ela


é seguida espontaneamente pelos seus destinatários. As razões pelas
quais uma norma é mais ou menos seguida pertencem ao campo de
conhecimento da sociologia do direito.

Aqui, limitamo-nos a lembrar que algumas são seguidas


facilmente de modo espontâneo (pensem na proibição de se fumar em
lugares fechados), outras demandam intensa ação estatal repressiva
(pensem nas vagas no trânsito destinadas a idosos e deficientes, placas
constantemente desrespeitadas, não obstante a atuação policial).

E, em casos extremos, algumas normas são completamente


ignoradas (raramente pela sociedade como um todo – mais comumente
por grupos delimitados).

Vamos pensar em alguns casos assim?

3. A independência dos critérios

3.1. Uma norma pode ser justa, sem ser válida.


Há todo um conjunto teórico, denominado genericamente de
“Direito Natural” (há várias subdivisões sob este rótulo) que formula em
seus tratados um sistema de normas, baseados apenas em valores que
reputa que deveriam ser observadas pelos homens apenas e tão somente
por isso, independentemente de sua acolhida por qualquer Estado
Soberano.

Um exemplo disso, talvez o mais consensual, seria o “Direito à


Resistência”, ou seja, a norma de que as populações podem e devem
resistir, com todos os meios possíveis, a governos opressores.
Rarissimamente acolhida de modo expresso, é praticamente a base do
contrato social que funda o próprio ordenamento jurídico, como veremos
daqui a algumas aulas.

3.2 Uma norma pode ser válida, sem ser justa

Não precisamos ir muito longe para termos exemplos disso.


Vocês mesmo já devem ter estudado no curso de Direito diversas regras
que fogem aos seus respectivos ideais de justiça, ou até mesmo a critérios
mais amplos de avaliação de justiça. Mas que são válidas, pois atendem
todos os critérios estudados acima.

Exemplos históricos muito nítidos desta diferença são as normas


dos Estados Modernos que tratavam da escravidão ou autorizavam a
discriminação social. Ou que, como no Brasil, até 1962, “devolviam” a
mulher maior de idade à condição de relativamente incapaz por ocasião
do seu casamento.

3.3 Uma norma pode ser válida, sem ser eficaz

Historicamente, o caso mais clamoroso é o da proibição de


bebidas alcoólicas nos Estados Unidos. Essa proibição constou do próprio
texto da Constituição Americana. E hoje sabe-se que não houve nenhuma
redução do consumo de bebida alcoólica durante o período, não obstante
intensa repressão estatal.
O Brasil também tem várias normas assim. Pior, estamos
paulatinamente enfrentando situações em que territórios inteiros estão
sendo excluídos, pelo poder militar de traficantes e milícias, da eficácia de
determinadas normas.

3.4 Uma norma pode ser eficaz, sem ser válida

Há muitas normas sociais que são seguidas espontaneamente ou


pelo menos habitualmente – são eficazes, sem que sejam incorporadas de
qualquer forma pelo Estado.

As mais evidentes são as normas de boa educação e vestuário


médio, que, embora seguidas, não se tornaram parte de nenhum
ordenamento jurídico

3.5 Uma norma pode ser justa sem ser eficaz

Muitas vezes escutamos a expressão: “não há justiça neste


mundo!”.

Trata-se da afirmação de que o padrão de justiça da pessoa,


tenha ou não guarida estatal, não encontra realização nos fatos. Mas, que
os envolvidos têm este padrão ideal de direito em mente, fazendo que
exista a norma justa, mas sem eficácia.

3.6 Uma norma pode ser eficaz sem ser justa

O fato de uma norma ser amplamente seguida não demonstra


sua justiça.

Pensemos, por exemplo, em normas de conduta obedecidas por


uma comunidade amedrontada pelo tráfico de drogas/milícia.

Historicamente, temos ainda o exemplo da escravidão dos


negros no Brasil, que não era regulado em nenhuma norma válida, mas
amplamente praticado até 1888.
4. Uma última palavra sobre a eficácia – o Realismo Jurídico

Na sequência do nosso curso, estudaremos longamente os tópicos


Justiça e Validade, temos reservados à Filosofia do Direito por seu caráter
mais abstrato, com teorizações de pretensão universalista, ou seja,
independente da sociedade em que sejam discutidas.

Como visto acima, a questão da eficácia jurídica é normalmente


atribuída à Sociologia do Direito, por ser um estudo que depende mais da
compreensão da própria sociedade que recebe a norma do que da norma
em si, ou de seus fundamentos.

Mas para que o tema não fique completamente descartado de


nosso Curso, passamos a um estudo breve da corrente de pensamento
jurídico que eleva a questão da eficácia ao ponto mais alto do estudo, o
Realismo Jurídico.

Por essa corrente, mais importante que estudar os ideais de Justiça


que inspiram o homem, ou os ordenamentos jurídicos constituídos, é
estudar a realidade social na qual o direito se forma e se transforma e as
ações dos homens que fazem e desfazem, com seu comportamento, as
regras de conduta que nos governam. Como as normas interagem com
todos os demais fenômenos psíquicos e físicos do tempo e do espaço.

“Como todas as outras ciências sociais, a ciência do direito tem que


ser, em última análise, um estudo dos fenômenos sociais, a vida de uma
comunidade humana; e a tarefa da filosofia do direito deve consistir na
interpretação da vigência do direito em termos de efetividade social, isto
é, de uma certa correspondência entre o conteúdo normativo ideal e os
fenômenos sociais.”1

Suas teses principais são:

a) A coincidência entre validade e eficácia: o apelo ao costumeiro


faz com que comportamentos obrigatórios acabem ganhando

1
Alf Ross, em “Direito e Justiça”, p. 95. Edipro, 2ª ed. Bauru (SP), 2007
sanção dos agentes estatais. Não existe uma ideia de validade a
priori;

b) O juiz é um criador do direito, descobrindo regras na realidade


social. Ou seja, ele verifica no caso concreto quais são as regras
sociais eficazes, e lhes atribuiu validade, ou seja, força coativa:

B1) dando cumprimento à consciência jurídica popular, segundo


uma das correntes. “O direito é vigente, porque é aplicado”;
B2) dando a chancela dos tribunais ao direito, reconhecendo-o
como vigente. “O direito legislado é meramente uma profecia
daquilo que os tribunais farão”

c) O juiz (a pessoa física de cada juiz, hábitos e ideias) é objeto de


extenso estudo, tanto maior conforme sua posição hierárquica
no sistema jurídico. Procura-se, a partir disso, prever o que estes
juízes decidirão nos casos futuros.

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