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Eduardo Santana cordeiro '2017 ^Eduardo Santana Cordeiro e Maria Cristina Pedro Biz

Maria Cristina Pedro Biz


(organizadores)
Gerente Editorial: Alan Kardec Pereira Editor: Waldir Pedro
Prefácio de ALEXANDRE PADILHA Capa e Projeto Gráfico: 2ébom Design
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Capa: Eduardo Cardoso Diagramação: Flávio Lecorny
Revisão: Lucíola Medeiros Brasil

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reservar a privacidade.
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

IMPLANTANDO A 131

Implantando a CIF: O que acontece na prática? /organizadores Eduardo Santana


Cordeiro e Maria Cristina Pedro Biz. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2017.
296p.: il.; 24cm

Inclui Bibliográfica
ISBN 978-85-7854-406-5

1. Saúde - Códigos numéricos. 2. Fisiologia - Códigos numéricos. I. Cordeiro,Eduardo


Santana. 11 Biz, Maria Cristina Pedro. m.Titula

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17-45332 CDD 613.012 CDU 613.012

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Direitos desta edição reservados à Wak Editora


Proibida a reprodução total e parcial.

WAK EDITORA
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edito Av. N. Sra. de Copacabana,945 — sala 107 — Copacabana
Rio de Janeiro — CEP 22060-001 -RJ
Rio de Janeiro Tels.:(21) 3208-6095 e 3208-6113 Fax (21) 3208-3918
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wakeditora@uol.com.br
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Maria Cristina Pedro biz
(organizadores)
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Prefácio de ALEXANDRE PADILHA

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editora

Rio de Janeiro
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' 2017 ^ Eduardo Santana Cordeiro e Maria Cristina Pedro Biz

IMPLANTANDO A CIF:
Gerente Editorial: Alan Kardec Pereira Editor: Waldir Pedro
O QUE ACONTECE NA PRÁTICA?
Capa e Projeto Gráfico: 2ébom Design
Capa: Eduardo Cardoso Diagramação: Flávio Lecorny
Revisão: Lucíola Medeiros Brasil

A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saú


de (CIF) é uma ferramenta fimdamental para a vida em sociedade, para
O livro foi revisado por duplo parecer, mas a editora tem a política de
reservar a privacidade.
a formulação, a avaliação, o controle e o monitoramento das políticas
públicas. Ela também se configura como importante ferramenta clínica
e pedagógica. Tendo sido publicada em 2001, após cerca de 30 anos de
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) processo de construção, e inconcebível que ela não figure, ao menos, nas
matrizes curriculares dos cursos de graduação da área da Saúde.
131
Este livro apresenta algumas experiências individuais de líderes que
Implantando a CIF: O que acontece na prática? /organizadores Eduardo Santana trabalharam na implantação da CIF nas mais diversas áreas, incluindo
Cordeiro e Maria Cristina Pedro Biz. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2017.
296p.: il.; 24cm
a previdência social, serviços especializados, universidades, entre outras.
Ele vai ajudar novos lideres a encontrarem caminhos mais curtos a partir
Inclui Bibliográfica de experiências prévias de colegas, de modo que se propicie a aceleração
ISBN 978-85-7854-406-5 da implantação dessa tão importante ferramenta para a vida humana.
1. Saúde - Códigos numéricos. 2. Fisiologia - Códigos numéricos. I. Cordeiro,Eduardo
Santana. II Biz, Maria Cristina Pedro. BI.Título.
Prof. Dr. Eduardo Santana Cordeiro

17-45332 CDD 613.012 CDU 613.012


Este livro apresenta experiências de incorporação da Classificação
2017 Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF/OMS na
formação, nos serviços e nas políticas públicas.
Direitos desta edição reservados à Wak Editora
Proibida a reprodução total e parcial. Integrante da família de classificações da Organização Mundial de
Saúde, a CIF foi publicada em 2001 com o objetivo de oferecer uma
WAK EDITORA
linguagem padrão e uma estrutura para a descrição da saúde e dos es
tados relacionados a saúde. Fornece informações de funcionalidade e
Av. N. Sra. de Copacabana,945 — sala 107- Copacabana
Rio de Janeiro — CEP 22060-001 — RJ incapacidade, permitindo mensurar as mudanças de estado relativas à
Tels.:(21) 3208-6095 e 3208-6113 Fax (21) 3208-3918 condição de saúde, classificando e descrevendo o contexto em que esses
■wakeditora@uol.com.br problemas acontecem, possibilitando o planejamento e a mensuração
da resolutividade das ações e dos serviços em saúde. Isso faz com que as
possíveis alterações de saúde nâo sejam percebidas como conseqüência
das condições do binômio saúde e doença, mas determinadas também ORGANIZADORES
pelo contexto do meio ambiente físico e social, pelas distintas percep
ções culturais e posturas diante da deficiência, pela disponibilidade de
serviços e de legislação.
O objetivo dos autores desta publicação é mostrar o potencial da
CIF como ferramenta estatística, pedagógica, de planejamento e infor
Eduardo Santana Cordeiro é fisioterapeuta formado pela Uni
versidade Santa Cecília em 2000. Sua experiência com a CIF come
mação, como norteadora de políticas públicas e, fundamentalmente,
como importante modelo de atenção e cuidado em saúde dentro de uma
çou em 2004, enquanto ainda trabalhava no Hospital Israelita Albert
perspectiva biopsicossocial. Nos relatos de cada experiência, é possível
Einstein. Sua empolgação o levou à tentativa frustrada de implantar a
CIF em seu local de trabalho naquele mesmo ano. Frustrada também
constatar a importância da abordagem multidimensional nas avaliações
funcionais nos diversos processos e o quanto isso permite transcender o
foi a tentativa de formação da sua primeira turma para um curso sobre
olhar biomédico, focado no corpo. Traz a CIF em cada relato uma base ^ CIF em 2008. Ainda assim, usando a CIF como seu objeto de uso e
para avaliações multiprofissionais, para definição de metas, gerencia
de estudos, cursou mestrado e doutorado com concentração em Epi-
demiologia na Faculdade de Saúde Pública da USP, de 2005 a 2012.
mento das intervenções e medida de resultados. Mostra a classificação
Sua orientadora havia sido a coordenadora da tradução da CIF para o
com suas múltiplas finalidades, planejada para uma ampla variedade de
Brasil, Cassia Maria Buchalla. A partir de 2009, um grande trabalho
usos nas diferentes áreas.
pessoal com a CIF se desenvolveu, ultrapassando, em sete anos, a mar
Maria Cristina Pedro Biz ca de 30 mil ouvintes em suas atividades presenciais e em plataformas
de ensino a distancia. Nesse período, publicou dois livros, sendo um
"nacional e outro para uma editora da Inglaterra, além de 23 artigos
científicos e dois capítulos em livros de outros autores, sendo todo esse
conteúdo sobre a CIF. Um aplicativo de ensino da CIF para celula
res com versões em Espanhol, Inglês e Português {JCF Educator), um
prontuário eletrônico (CIF Digital), uma revista científica (Revista
CIF Brasil) e a formação de um grupo de multiplicadores(Grupo CIF
Brasil) somam-se aos trabalhos apresentados em reuniões da Organi
zação Mundial da Saúde nas cidades de Barcelona, Helsinque e Man-
chester, como parte de sua produção científica sobre-o tema. Em todo
período, a expansão alcançou o meio político, normativo, autarquias
federais e conselhos de saúde. O uso da CIF e seu conhecimento têm
se tornado cada vez maiores, sendo esta obra mais uma contribuição
ao processo.
Maria Cristina Pedro Biz é fonoaudióloga, conselheira nacional
de saúde de 2010 a 2013, período em que coordenou o grupo de traba
SUMARIO
lho sobre a Classificação Internacional de Funcionalidade,Incapacidade
e Saúde - CIF/OMS, que deu origem a Resolução n.° 452, de 2012,
aprovada em plenária e homologada pelo Ministério da Saúde. Compôs
o grupo de coordenadores das oficinas sobre a incorporação da CIF
no sistema de informação em saúde propostas pelo Conselho Nacional
Prefácio
de Saúde, realizadas no 11° Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva da
Alexandre Padilha. 13
ABRASCO, em Goiânia, em 2015, e na 22® Conferência Mundial de
Promoção da Saúde, em Curitiba, em 2016. Essas oficinas contaram
Apresentação
com a presença de gestores, acadêmicos, entidades representativas de
Alexander Sérgio Evaso.. 23
categorias profissionais e representação de movimentos sociais, e seu ob
jetivo foi estabelecer norteadores para a incorporação da CIF na rotina
dos serviços, no modelo de atenção e cuidado e saúde e no sistema de
Capitulo 1 — Classificação Internacional de Funcionalidade,
informação em saúde. A oficina gerou dois documentos que dispõem
Incapacidade e Saúde (CIF): evidências e desafios
sobre a incorporação da CIF.
na sua implementação
Como presidente da comissão de saúde do Conselho Federal de Fo
Anabela Correia Martins e
noaudiologia, a partir de uma demanda da Agência Nacional de Saúde
Ruth Losada de Menezes 33
para o CFFa sobre dados de tempo de tratamento no processo terapêu
tico, coordenou um grupo de trabalho composto por representantes e
Capitulo 2 — Inserção da CIF na formação em fisioterapia,
expertises da Fonoaudiologia, que deu.origem em 2013 a publicações,
facUitador ou barreira?
tendo a CIF como referência: Balizadores de tempo de tratamento em
Fonoaudiologia e o Guia Norteador sobre a Classificação Internacional de Cinthia Rodrigues de Vasconcelos, Anna Paula Chagas Chaves,
Funcionalidade, Incapacidade e SaudeiCIF em Fonoaudiobgia. Vem de Carine Carolina Wiesiolek, Catharina Machado Portela,
senvolvendo trabalho de implementação da CIF na rotina de serviços de Márcia Alessandra Carneiro Pedrosa,
saúde, por meio da capacitação de profissionais e equipes, permitindo, Natália Ferraz de Araújo Malkes,
com isso, o desenvolvimento de estratégias de incorporação da classifi Rayanne Crislaynne Silva Oliveira 49
cação. É doutoranda em Saúde Interdisciplinaridade e Reabilitação pela
UNICAMP, tendo como objeto de pesquisa o processo de implemen Capítulo 3-Experiência da CIF:interação entre
tação da CIF em centros especializados de reabilitação. É colaboradora ensino e serviço
do Grupo CIF Brasil. Clarissa Cotrim dos Anjos 63
Capítulo 4- Funcionalidade, desenvolvimento humano, Capítulo 10 — O panorama de utilização da Classificação
uso estatístico e pequeno histórico de envolvimento Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde(CIF)
Eduardo Santana Cordeiro 75
no contexto da reabilitação e do cuidado em saúde —
Onde estamos?

Capítulo 5-A correlação entre a aferição e a classificação: Luciana Castaneda, Fernanda Guimarães e
o diálogo entre a CIF e os instrumentos de Shamyr Sulyvan Castro 157
avaliação psicológica
Elise Ribas Libôa 87
Capítulo 11 — O envelhecimento populacional e a importância
dos dados epidemiológicos sobre funcionalidade
Capítulo 6 — Aplicações e usos da Classificação Internacional Maria Cristina Pedro Biz 177
de Funcionalidade,Incapacidade e Saúde(CIF)
na Fonoaudiologia Capítulo 12 — Implantando a CIF: O que acontece na prática?
Fernanda Chequer de Alcântara Pinto, Maria José Ribeiro Tavares 191
Ana Maria Schiefer eJacy Perissinoto 101
Capítulo 13 — A funcionalidade humana e a educação em
Capítulo 7 — Interação entre o ensino e o serviço na gestão Fisioterapia: reflexões necessárias na contemporaneidade
de afastamentos por distúrbios musculoesqueléticos: à luz da formação na graduação
funcionalidade e incapacidade
Mauro Antônio Félix 201
Fernanda Fíávia Cockell, Mariana Chaves Aveiro e
Silvia Bonilha Bagatelli 113 ^Capítulo 14 — A aplicação da CIF na avaliação de pessoas
com deficiência para o acesso ao Benefício de Prestação
Capítulo 8-Experiência prática da Universidade Federal Continuada da Assistência Social- BPC
de Sergipe/Hospital Universitário: inclusão do modelo
MiguelAbud Marcelino 215
biopsicossocial e da CIF
Jader Pereira de Farias Neto, Géssica Uruga Oliveira, Capitulo 15 — Utilização da CIF em crianças e adolescéntes
Mylena Maria Salgueiro Santana, Andréa Costa de Oliveira e com alterações de linguagem: pesquisa e prática
Walderi Monteiro da SilvaJúnior 135 em Fonoaudiologia
Regina Yu Shon Chun,Amanda BraitZerbeto e
Capítulo 9 — Uso da CIF em uma instituição pública
Maria de Lurdes Zanolli 233
Juliana Scholtão Luna 145
Capitulo 16 — Ensino da Classificação Internacional de
Funcionalidade na pós-graduação stricto sensux relato
de experiência PREFACIO

Ruth Losada de Menezes, Anabela Correia Martins e


Maria Márcia Bachion 249

Capítulo 17- CIF e CIF-CJ em Fonoaudiologia: relato de


Cada vez mais do Curador ao Conselheiro e Cuidador: a
experiência da aplicabilidade em ambiente ambulatorial
Classificação Internacional de Funcionalidades ferramenta de
Stela Maris Aguiar Lemos, Valqutria Conceição Souza e ordenamento do registro e estimuladora de novos paradigmas
Marina de Souza Borges 265 aos profissionais e às políticas de saúde

Capítulo 18- Uso da CIF em benefícios, isenções e serviços


A vida nos propicia oportunidades que nem sempre a aproveita
federais para as pessoas com deficiência mos de imediato, mas que, ao longo da sua trajetória, sedimentamos
Wederson Santos 281 a importância daquele fato. Quando ainda estudante de Medicina
da Unicamp, no finai dos anos 80 e início dos anos 90, vivia uma
angústia. De um lado, assistir e participar de um processo inicial de
construção do Sistema Único de Saúde que, além da expansão rumo
à universalização de serviços de saúde, trouxe uma tensão paradig
mática, com o fortalecimento da atenção primária em saúde, a cria-
,çáo de equipes multiprofissionais, a reforma psiquiátrica e o ciclo de
uma rede de saúde mental substitutiva, os esforços de humanizaçáo
do cuidado hospitalar, a criação de serviços de saúde para lidar com a
resposta nacional à AIDS. Do outro, conviver com um curso de Me
dicina ainda centrado no Hospital, na doença, na visão segmentada
de departamentos e no isolamento entre as profissões de saúde, com
uma lógica de submissão de todas ao papel do médico. Esta angústia
moveu-nos, eu e vários estudantes, em torno de um movimento em
defesa da vida que construiu entidades estudantis nacionais especí
ficas de cada curso, um fórum de executivas nacionais dos cursos da
saúde, encontros e novos arranjos transdiciplinares de estudos. Com
ele, nasceu o CENEPES (Centro de Estudos em Educação e Políticas
de Saúde), uma ousadia formada por estudantes, mesmo em meio
as já consolidadas entidades nacionais de estudos, pesquisa e análise
IMPLANTANDO A CF IMPLANTANDO A CIF
O QUE ACONTECE NA PRÁTICA? O QUE ACONTECE NA PRÁTICA?

no campo do movimento de reforma sanitária, como a ABRASCO, Trazer à luz aquilo que o professor Mario Testa em "Saber em Sa-
CEBES, entidades profissionais e sindicatos. Achávamos que preci lud"(1997) como apontamento rico sobre as necessidades das aborda
sávamos de uma entidade que ultrapassasse os nossos curtos tempos gens do campo das ciências históricas e sociais, onde está a saúde, pois
de estudantes de graduação, tempo menos ainda nas entidades estu procura entender a constitucionalidade destes sujeitos epistêmicos,
dantis, para contribuir com a sistematizaçáo do que essas entidades como situação a príori de qualquer pesquisa ou produção de conheci
criavam, aprendiam, inventavam. mento. Neles, revela o quanto os sujeitos epistêmicos são subsumidos
Por uma conjunção de fatores, tivemos a honra e até "o exagero às lógicas do poder, da ideologia e dos afetos, nos distintos contextos
abundante" de ter como membros dos nossos conselhos e das reu históricos, sendo estes componentes constitutivos dos mesmos e, por
niões pensadores do movimento de reforma sanitária brasileira e do tanto, de seus modos de operarem a construção dos conhecimentos
pensamento em saúde latino-americano. Digo "exagero abundante" e suas validações. Ou aquilo que Merhy nos escreve em o "Conhecer
porque, mais de uma vez, tivemos tais pensadores disputadíssimos, militante do sujeito implicado": um sujeito epistêmico, em um sujeito
para uma longa conversa com dezenas de estudantes, podendo in ideológico, um sujeito "cultura", um sujeito "interessado", um sujeito
quirir, questionar, sugar, reconstruir conhecimentos e aprendizados implicado! Muitas vezes, sendo analisador e analisado. Os personagens
que duram até hoje. que conduziram, no âmbito do Ministério da Saúde e do Conselho
Nacional de Saúde, todo esse processo da CIF e seu esforço de norma-
Em uma dessas ocasiões, éramos pouco mais de duas dezenas
tização e publicização no Brasil são implicados e nos implicaram.
de estudantes durante longas horas com o professor Mario Testa,
conhecido sanitarista argentino, consultor por anos da OPAS, que Fui implicado ao tema, na condição de ministro da Saúde do Bra
nos reabriu definitivamente os caminhos e labirintos dos métodos sil, a partir de 2011, pelos representantes do Fórum dos Trabalhadores
de planejamento em saúde, algo extremamente decisivo para aque no Conselho Nacional de Saúde, em especial de trabalhadores da Fono
les jovens em movimento e suas entidades, e nos plantou inúmeras audiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional. Embora o Brasil, como
dúvidas e poucas certezas sobre o pensamento, sobre a construção ^País-membro da OMS, foi urgido a utilizar a CIF por força da Reso
do conhecimento e a produção em saúde. Umas das suas pitadas lução n.° 54.21/2001, da OMS,esta ainda não havia sido incorporada
foi ao comentar a análise de textos, documentos, livros, teses, pro ao conjunto do nosso Sistema Único de Saúde (SUS), compreendendo
dutos de conhecimento em geral e nos pontuava: "Sempre temos também a Saúde Suplementar.
que fazer três perguntas: Quem é o autor? O que pensa o autor? O Desde o início da minha gestão e, também, posteriormente,
que diz o autor?". como presidente eleito do Conselho Nacional de Saúde, estes seg
Aqui, portanto, quero dizer que não seria possível para eu tecer mentos pautaram tal necessidade e se dispuseram circular o País,
qualquer comentário ou impressão sobre uma obra que sistematize o que nos permitiu construir um caminhar exitoso de debate nos
todo o esforço de construção, publicidade e uso da CIF sem comen espaços do SUS, com os gestores, as instituições de formação pro
tar a importância destes autores e atores desse processo de discussão fissional, as instâncias variadas do Controle Social e todo o processo
e aprovação no Conselho Nacional de Saúde que eu presidia quando de etapas locais, estaduais e nacional da Conferência Nacional de
da Resolução n.° 452/2012 e todo o trabalho para a sua implemen Saúde em 2011. Todo esse processo era importante porque não nos
tação e uso. interessava apenas uma resolução, entre inúmeras tão importantes
resoluções do Conselho Nacional de Saúde, mas principalmente um
IMPLANTANDO A QF
IMPLANTANDO A QF
O QUE ACONTECE NA PRÁTICA?
O QUE ACONTECE NA PRÁTICA?

processo de envolvimento essencial para que não seja mais uma da Todo este debate culminou na aprovação pelo Conselho Nacio
quelas "leis para inglês ver". nal de Saúde na sua resolução de n.° 452/2012 que tenho a honra
Ao longo desse processo, foi recuperado todo o histórico desde de assiná-la, na condição de presidente do CNS, naquele momento.
a revisão da anterior: a Classificação Internacional das Deficiências, Traz considerações claras que precisam ser valorizadas para compre
Incapacidades e Desvantagens {International Classification ofImpair- endermos este processo. Destaco aqui as que considero principais:
ments, Disabilities and Handicaps — ICIDH), publicada em 1980 pela (a) a necessidade do desenvolvimento de políticas públicas em saú
OMS, passando ao processo de revisão da ICIDH que viria a dar ori de que destaquem a funcionalidade e a incapacidade humana em
gem à CIF a partir de 1993 e a aprovação na 54^ Assembléia Mundial todos os ciclos de vida, para pessoas com ou sem deficiência, e que
de Saúde, em 2011, definindo a designação de International Classifica estas tenham caráter intersetorial, em especial com a educação, pre
tion ofFunctioning, Disabilities andHealth, conhecida abreviadamente vidência social, assistência social, trabalho e emprego;(b) a transição
por ICF, Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade epidemiológica, que se configura pelo aumento da expectativa de
e Saúde CIF na Língua Portuguesa oficialmente reconhecida. A im vida e inversão da pirâmide populacional, e, consequentemente, o
portância das suas finalidades, como estabelecido pela OMS, para ser aumento das doenças crônicas não transmissíveis; (c) a necessidade
usada em vários setores: saúde, educação, segurança social, emprego, de ferramentas que contribuam na qualificação da informação para
economia, política social, desenvolvimento de políticas e de legislação melhoria do gerenciamento no Sistema de Saúde.
em geral e alterações ambientais. Da mudança paradigmática de ter Além disso, o CNS aponta que a CIF seja utilizada no Sistema
mos saído de uma classificação de "conseqüência das doenças", como Único de Saúde, nas investigações acerca do bem-estar, qualidade
era a ICIDH, a uma classificação de "componentes da saúde" (CIF), de vida, acesso a serviços e impacto dos fatores ambientais na saúde
contribuindo para uma visão ampliada de saúde. dos indivíduos; como ferramenta clínica para avaliar necessidades,
Como já afirmou em artigo específico sobre o tema, a professora compatibilizar os tratamentos com as condições específicas, am-
Cristina Biz, uma das representantes do Fórum de Trabalhadores no Con pliando a linha de cuidado; para dar visibilidade e avaliar os pro
selho Nacional de Saúde, previamente, a incapacidade começava onde a cessos de trabalho com os respectivos impactos reais das ações dos
saúde terminava: uma vez que o indivíduo tinha uma incapacidade, ele profissionais de saúde; como uma ferramenta estatística na coleta
estava em uma categoria separada. E a este paradigma conceituai que a e no registro de dados; no dimensionamento e redimensionamento
CIF oferece a diferença, evitando o reducionismo dos modelos biomédi- de serviços visando qualificar e quantificar as informações relativas
co e social, ao promover uma perspectiva integrativa, multidimensional ao tratamento e à recuperação da saúde no processo de reabilita
e universal da funcionalidade e incapacidade, onde o indivíduo interage ção; como ferramenta no planejamento de sistemas de seguridade
com o ambiente físico, social e atitudinal. A interação que a CIF oferece social, de sistemas de compensação e nos projetos e no desenvol
ao binômio saúde e ambiente apoia-se em três princípios que traduzem vimento de políticas; como ferramenta geradora de informações
a importância do ambiente na funcionalidade do indivíduo: a universali padronizadas em saúde, devendo a mesma ser inserida no Sistema
dade, onde todas as pessoas, independentemente da sua condição de saú Nacional de informações em saúde do Sistema Único de Saúde,
de ou ambiente habitual, podem ser incluídas; a abordagem integrativa, com vistas ao controle, à avaliação e regulação para instrumentali
onde ambiente e pessoa-fatores ambientais e pessoais — são integrados e zar a gestão no gerenciamento das ações e dos serviços de saúde em
considerados; a abordagem interativa, onde é reconhecido. todos os seus níveis de atenção.
IMPLANTANDO A QF IMPLANTANDO A CIF
O QUE ACONTECE NA PRÁTICA? O QUE ACONTECE NA PRÁTICA?

A CIF e todo seu processo de debate no SUS dialogam com o no exercício diário do seu trabalho, buscando sempre um cuidado
momento demográfico e epidemiológico que estamos vivendo. Aos continuado, a partir das suas necessidades, buscando uma atenção
poucos, vamos nos dando conta de que a figura do profissional de saú integral. Buscando analisar os modos de organização da atenção à
de curador é cada vez menos presente, e estamos diante da necessidade saúde no Brasil, Ayres identifica quatro eixos em torno dos quais
de um papei cada vez mais de conselheiros e cuidadores. É claro que a integralidade tem sido experimentada como movimentos recons-
isso tem uma relação direta com a nossa vida em cidade. Se ela atrai trutivos no campo da saúde: a) Eixo das necessidades — diz respeito
pessoas também com a expectativa de vida mais longa, ela ao mesmo à qualidade e natureza da escuta, ao acolhimento e à resposta a
tempo nos expõe a um conjunto de riscos e de vulnerabilidades tão necessidades que não se restrinjam a distúrbios morfológicos ou
complexas que nos traz permarientemente a perda da autonomia e, funcionais do organismo, sem descuidar deles; b) Eixo das fina
consequentemente, da saúde. lidades — remete aos graus e modos de integração entre ações de
A estimativa da OMS, por meio do seu WorlReport 2QQÍ7-2Q\7, é promoção da saúde, prevenção de agravos, tratamento de doenças
que as Doenças Crônicas não Transmissíveis(DCNTs) matam cerca de e sofrimentos e recuperação da saúde/reinserção social. Lida com a
40 milhões de pessoas por ano. noção de eficiência dos serviços e de seu acesso oportuno e conve
niente por indivíduos, famílias e comunidades; c) Eixo das articu
Os dados da Agenda Sustentável para as Américas para 2030,
lações — refere-se aos graus e modos de composição dos saberes in-
construída pelos países membros da OPAS, mostram que metade
terdisciplinares, a equipes multiprofissionais e ações intersetoriais
dos países da América Latina apresentam como indicador de natali
para criar as melhores condições a fim de oferecer resposta efetiva
dade índices menores do que 2.1 de crianças por mulher, revelando
às necessidades de saúde em uma perspectiva ampliada; d) Eixo das
o caminho para um envelhecimento expressivo. Em 2015, 14,6%
interações — problematiza a qualidade e natureza das interações nas
das pessoas de todo o mundo, maiores do que 60 anos, estão locali
práticas de cuidado, objetivando condições efetivamente dialógicas
zadas na América Latina.
entre os sujeitos participantes dos encontros relacionados à aten
O envelhecimento vem acompanhado das chamadas Doenças Crô ção à saúde, condição de realização dos eixos anteriores.
nicas não Transmissíveis(DCNT). Ainda nas Américas, as DCNTs são
O debate prévio à construção da CIF e ao seu processo de imple
responsáveis por 4 de 5 mortes. Na metade do século passado, de cada
mentação tem sido um espaço rico de qualificação da escuta, articula
mil brasileiros nascidos vivos, 150 não chegavam ao primeiro ano de
ção de saberes e do exercício multiprofissional. A sua implementação
vida, menos de 5% da população tinha mais de 60 anos. Em pouco
só reforça aquilo trazido nas diretrizes pela OMS sobre a construção de
tempo, esta realidade se transformou. Entre as pessoas com mais de 60
serviços de saúde integrados e centrados na pessoa que possam respon
anos, saímos de seis milhões, em 1975, para 14 milhões, em 2001; e va
der a desafios de saúde emergentes e variados, incluindo a urbanização,
mos para 32 milhões, em 2025,24% da população, ou seja, 45 milhões a tendência global para os estilos de vida pouco saudáveis, o envelhe
em 2050. O Brasil envelhecerá na metade do tempo em que envelheceu
cimento das populações, a dupla carga de enfermidades das doenças
a Europa. Em 2050, deveremos ter 15 milhões de pessoas com mais de
transmissíveis e não transmissíveis, as multimorbidades, o aumento dos
80 anos de idade.
custos de saúde, os surtos de doenças e outras crises de saúde.
Já muito se falou o quanto esta nova realidade exigirá exercí
O processo de construção e aprovação da CIF contribui para o
cios cada vez mais ampliados por parte do profissional de saúde
desenvolvimento de um SUS mais próximo daquilo que sempre so-
IMPLANTANDO A CIF
IMPLANTANDO A CIF
O QUE ACONTECE NA PRÁTICA? O QUE ACONTECE NA PRÁTICA?

nhamos e precisa ser registrado, e essa publicação contribui para tal. to em que o indivíduo vive. Neste sentido, também contribui para uma
E fundamentai agora que o seu uso, por parte de trabalhadores, ges abordagem apontada, desde 2008,pela Comissão sobre os Determinantes
tores e instituições formadoras e estudantes, reforce este caminho. Sociais da Saúde da OMS,de não apenas buscarmos a cobertura universal
A resolução n.° 452/2012 do CNS aponta usos fundamentais para em saúde mas também a necessidade de impactarmos sobre um conjunto
CIF no SUS e na Saúde Suplementar:(a) nas investigações para me de fatores, como renda das famílias, educação e condições de vida.
dir resultados acerca do bem-estar, da qualidade de vida, do acesso Quando o Brasil sediou a Conferência Mundial da OMS Sobre
a serviços e do impacto dos fatores ambientais (estruturais e atitudi- Determinantes Sociais da Saúde, em 2011, afirmamos que, no mundo,
nais) na saúde dos indivíduos; (b) como uma ferramenta estatística não podíamos migrar de uma situação onde lutávamos contra doenças
na coleta e no registro de dados (em estudos da população e inqué para um mundo de pessoas negligenciadas sofrendo de
ritos na população ou em sistemas de informação para a gestão); (c) doenças bem conhecidas e bem estudadas, estabelecendo relações claras
como uma ferramenta clínica para avaliar necessidades, compatibi entre determinantes sociais de saúde e a nova realidade da expansão das
lizar os tíatamentos com as condições específicas, ampliando a linha doenças crônicas não transmissíveis. Já se apresentava, naquele momen
de cuidado;(d) para dar visibilidade e avaliar os processos de trabalho to, evidencias cientificas suficientes para mostrar que é possível fazer as
com os respectivos impactos reais das ações dos profissionais de saú coisas diferentes em relação aos condicionantes sociais em saúde.
de, que atuam diretamente com a funcionalidade humana;(e) no di-
Um dos exemplos: uma revisão sistemática de evidências do
mensionamento e redimensionamento de serviços visando qualificar e
Brasil, da Colombia, de Honduras, de Malauí, do México e da Nica
quantificar as informações relativas ao tratamento e à recuperação da
rágua descobriu que as transferencias de renda condicionadas foram
saúde no processo de reabilitação e os respectivos resultados;(f) como
associadas ao aumento do uso de serviços de saúde e melhores resul
uma ferramenta no planejamento de sistemas de seguridade social,
tados de saúde (LAGARDE,2009).
de sistemas de compensação e nos projetos e no desenvolvimento de
políticas; (g) como uma ferramenta pedagógica na elaboração de pro Mais recentemente, estudo publicado no Lancet(STRINGHINI,
gramas educacionais, para aumentar a conscientização e a realização ^2017) revela que os participantes com doenças crônicas com baixo sta-
de ações sociais; (h) como uma ferramenta geradora de informações tus socioeconomico tiveram maior mortalidade em comparação com
padronizadas em saúde, devendo ela ser inserida no Sistema Nacional aqueles com alto nível socioeconomico. O baixo nível socioeconômico
de informações em saúde do Sistema Ünico de Saúde para alimentar foi associado a uma redução de um ano na expectativa de vida entre 40
as bases de dados, com vistas ao controle, à avaliação e regulação para e 85 anos, os perdedores correspondentes de anos de vida foram de O a 5
instrumentalizar a gestão no gerenciamento das ações e dos serviços anos para alta ingestão de álcool, O a 7 anos para a obesidade, 3 a 9 anos
de saúde em todos os seus níveis de atenção; e (i) como geradora de para diabetes, 1 a 6 anos para hipertensão, 2 a 4 anos para inatividade
indicadores de saúde referentes à funcionalidade humana. física e 4 a 8 anos para tabagismo atual.
Apesar de esta publicação deixar bem claro que a CIF assume uma A constituição de uma base legal e mais do que isso, de uma termi
posição neutra em relação à etiologia, de modo que os pesquisadores po nologia universal possibilita ainda mais se pensar em políticas e ações
dem desenvolver inferências causais utilizando métodos científicos ade para alem da interdisciplinaridade, permitindo construir estratégias cal
quados, uma abordagem diferente do tipo determinantes sociais de saúde, cadas no trabalho intersetorial. Neste sentido, um dos modelos exitosos
entretanto, traz uma lista de fatores ambientais que descrevem o contex- que contribuiu para embasar a proposição de Resolução pelo Conselho
IMPUNTANDOAQF

O QUE ACONTECE NA PRÁTICA?

Nacional de Saúde foi a experiência de concessão do Benefício de Pres


tação Continuada à Pessoa com Deficiência. Desde 2009, o Ministério
do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e o Ministério da Previ
APRESENTAÇÃO
dência Social vêm utilizando instrumento de avaliação para concessão Breves Considerações sobre a Análise Biopsicossocial
do benefício, que tem a CIF como base.
Que esta publicação e o seu uso, como ferramenta diária, promo Alexander Sérgio Evaso
vam outros acordos intersetoriais, garantia de direitos e defesa da vida Geógrafo.
Mestre em Geografia Humana pela USP.

Alexandre Padilha
Professor universitário do Programa Residência Multiprofissional e Medicina da
Família e Comunidade da UNINOVE. Médico pesquisador do NUMETROP/ O ser humano possui diversas interações funcionais decorrentes de
USP. Foi Ministro da Saúde entre 2011 e 2014. sua própria existência. A fluidez com que essas interações são desempe
nhadas permite compreender melhor a qualidade de vida das pessoas.
Na análise biopsicossocial, os aspectos a serem considerados estão na
pfópria composição desse termo: biológico, psicológico e social, e os
três compõem a totalidade da saúde dos indivíduos.
Pode-se entender que as interações biológicas devem ser plenas, pois
se trata das necessidades físicas e da fisiologia dos indivíduos, ou seja,
das ações que viabilizam o equilíbrio orgânico dos seres humanos. Nes
te sentido, as ações devem encaminhar um ciclo otimizado de desgaste,
reposição e manutenção da energia necessária para o cumprimento das
diversas tarefas cotidianas de um indivíduo. A nutrição adequada, as ativi
dades físicas e o sono integram esse ciclo orgânico. No entanto, sem uma
sociabilidade instigante e sem uma percepção saudável de si mesmo, um
indivíduo poderá sofrer uma decadência em suas interações biológicas.
As interações do aspecto psicológico têm a ver com os equilíbrios
mental, emocional e afetivo dos indivíduos. A percepção dos indivíduos
sobre si mesmos reflete no aspecto biológico, bem como no social. Com
o bom equilíbrio emocional e afetivo, o ser humano se encontra pronto
para se socializar, bem como para se nutrir e dormir adequadamente.
A qualidade de vida humana, em grande parte, depende da so
ciabilidade dos indivíduos nos diversos grupos em que se encontram
inseridos. A experiência do convívio e do diálogo, dentro das diversas

22 23
É
camadas de adesão possíveis para os indivíduos, enriquece e harmoniza considerar que o aspecto econômico, portanto, influencia o desempenho
o ser humano, promovendo também as suas habilidades com a comuni psicológico e social dos indivíduos, mas também o faz diretamente nos as
cação. O sentido de pertencimento de um indivíduo reflete no aspecto pectos biológicos. A riqueza de um indivíduo determina a sua capacidade
psicológico do indivíduo, em sua autoestima e, concomitantemente, de se abrigar de forma melhor e em lugares melhores, determina, poten
nos cuidados com seus aspectos biológicos. cialmente, a sua capacidade de se nutrir melhor e de forma balanceada e,
consequentemente,em sua capacidade de se recompor.
Quando o Modelo Biopsicossocial é Insuficiente Há o aspecto ambiental, que detém as forças planetárias que, em
Ainda que o modelo biopsicossocial seja robusto, incorporado in grande medida,independem da vontade das sociedades humanas.De fato,
clusive na Classificação Internacional de Funcionalidade Incapacidade regem muitas de suas ações. O calendário surgiu como desdobramento da
e de Saúde (CIF), existem outros aspectos que influem na qualidade de capacidade humana de observar (e não controlar) as marés, as cheias dos
vida humana, muitas vezes afetando o desempenho dos três aspectos rios e as fases da Lua, assim permitindo que o homem harmonizasse suas
que o configuram. primeiras tentativas de dominar a agricultura com esses ciclos naturais.
Muitos fenômenos naturais, como os solos compostos pela decomposição
O modelo biopsicossocial é um composto de interações antropo- milenar de material vulcânico, determinam a atração de atividades agríco
cêntricas, ou seja, centrado no ser humano e nas ações e reações que las e, também,de populações inteiras. Conforme a latitude que se vive no
influem de forma evidente na qualidade de vida dos indivíduos. Porém, Planeta Terra, as sociedades podem ter à disposição uma biodiversidade
existem aspectos não tão evidentes, que incidem no equilíbrio dos aspec maior e/ou diferenciada, dias mais longos e climas mais favoráveis a deter
tos biológicos, psicológicos e sociais, e nem sequer são necessariamente minadas atividades econômicas. Por conta disso, sociedades diversificadas
antropogênicos. O modelo em questão não os leva em consideração. se desenvolveram pelo mundo como resposta a esses aspectos ambientais.
A economia é um aspecto que envolve as diversas escalas da vida das No entanto, com a crescente capacidade tecnocientífica das sociedades de
pessoas, independentemente do grau de sociabilidade que elas tenham. empreender mudanças na paisagem natural a fim de atender às suas ne
De fato, boa parte da sociabilidade dos indivíduos advém de razões eco cessidades, o meio ambiente passa a oferecer novos desafios como reação:
nômicas.A economia possui normatizações e dinâmicas próprias que, cla poluição (atmosférica, da água, dos solos), intensificação de vetores de
ramente, afetam o desempenho de qualquer uma das três componentes doenças decorrentes de desmatamentos, desequilíbrios em ecossistemas.
originais do modelo biopsicossocial. As relações econômicas de um indi O aspecto biológico original do modelo biopsicossocial é pesadamente
víduo, moduladas pela sua percepção de qualidade de vida, refletem em afetado pelo aspecto ambiental, pois o meio em que se vive pode estabe
seu estado psicológico perante a sociedade. Quantas vezes ouvimos que lecer desafios(ou não)à perseverança biológica dos indivíduos. O aspecto
um indivíduo é "vencedor", "perdedor" ou "desapegado" diante de sua social é diretamente influenciado também, pois fatores ambientais contri
forma de agir perante a sua situação econômica? Ter ou não objetos mui buem na formação das sociedades, em sua estrutura de poder e, também,
tas vezes determina uma sociabilização diferenciada, influenciando dire economia. Como conseqüência do impacto no biológico e no social, o
tamente nesse aspecto. Ainda que o ideal a se pensar seja o "ser" sobre o aspecto psicológico também é influenciado.
"ter", não se pode ignorar o fato de que o mundo hoje está sob a égide de Há um aspecto que se encontra enraizado na própria origem das
uma Globalização que é movida pelo Capitalismo, e não há ser humano
sociedades humanas: uma percepção metafísica, ou seja, a fé, que even
no planeta que esteja totalmente independente de seus preceitos. Há de se tualmente serve de explicação para questões que se encontram além dos

24 25
limites de sua atual compreensão sobre o mundo e o universo. A fé dradas, e os aspectos biológicos são configurados. Neste sentido, o
pode residir somente nas leis científicas, mas também pode pressupor a prefixo "eco" engloba os aspectos ambientais, sociais e economicos. A
existência de uma força criadora, ou de um criador. Eventualmente, a partir disso, há de se destacarem dois aspectos eminentemente huma
fé pode combinar mais de uma dessas formas de percepção metafísica, nos: o psicológico e o de sua fé.
configurando visões diferenciadas de mundo. A fé configura em grande A incorporação do aspecto psicológico permaneceu em destaque,
medida as relações sociais, influenciando, sem dúvida, os aspectos psi visto que não se trata apenas dos equilíbrios mental,emocional e afetivo
cológicos dos indivíduos - pois traz consigo uma visão diferenciada de mas também do desenvolvimento da mentalidade dos indivíduos, dos
mundo e de sua ética. A fé pode configurar aspectos biológicos, como grupos e das sociedades, afetando, até mesmo, os destinos históricos
a alimentação (via costumes culinários — cíclicos ou não) e, por conse dessas instâncias humanas.
guinte, a sua recomposição física e, até mesmo, a sua saúde como um
A incorporação do termo "pistiológico" tem a ver com a fé(do Gre
todo. Nesse sentido, a socialização e a sociabilidade dos indivíduos, no
go/ihíeor = fé), seja ela na ciência, na religião ou em uma combinação de
bojo de uma fé comum a um grupo, podem ter configurações bastante
ambas, independentemente da força, ou das forças, que a desperta e de
específicas e especializadas.
haver ou não uma religião institucionalizada que a sustente. Sem dúvi
da, o aspecto pistiológico (da fé) contribui exatamente para o desenvol
Por um Modelo Mais Abrangente: Ecopsicopistiológico vimento de mentalidades, em conjunto com o psicológico, fechando,
A integração dos aspectos econômicos, ambientais e de fé, portan assim, uma definição ainda mais robusta do ser humano.
to, é indispensável a um arcabouço teórico mais completo na área da
Saúde. Com a pretensão de se acoplarem esses aspectos ao modelo de
trabalho, visto que estes já se encontram preliminarmente justificados
VERSÃO EM INGLÊS
no item anterior, propõe-se o uso de um Modelo Ecopsicopistiológico
em substituição ao Biopsicossocial. BríefConsiderations on the BiopsychosocialAnalysis
Um Modelo Ecopsicopistiológico deve ser construído de forma a lhe humãn being hcts muny junctional inteructions stemming jrom
contribuir com o enriquecimento da compreensão dos indivíduos e da his own existence. lhefluidity with which these inteructions are performed
complexidade de suas vidas e regrado na independência de impactos allows us to understand better the quality oflife ofpeople. In the biopsycho-
orgânicos como conseqüências unívocas de causas orgânicas. social analysis, the aspects that are considered are in the very composition of
Assim a proposta da palavra Ecopsicopistiológico abarca os seis the term: biological,psychologicalandsocial, meaning alithree make up the
aspectos aqui trabalhados: biológico, psicológico, social, econômico, total health ofindividuais.
ambiental e de fé. O prefixo de origem grega "eco" (derivação do ori It can be understood that the biological interactions must befull,for
ginal oikos) significa "morada","ambiente habitado" ou "família". Isso these deal with the physical needs and the physiology ofindividuais, there-
pode ser estendido à moradia da humanidade, o ecúmeno. Os seres fore, the actions that enable the organic balance ofhuman beings. In this
humanos estão indispensavelmente mergulhados em um ambiente sense, actions shouldpower up an optimized cycle ofwearing, replacement
com configurações específicas de acordo com as variáveis planetárias. and maintenance ofthe energy needed to julfill the various daily tasks of
Em decorrência dessa inserção, relações socioeconômicas são engen- an individual Proper nutrition, physical activities, and sleep are ali part

26 27
ofthis organic cycle. However, the absence ofan instigating sociability and ofan individual, modulated by their perception ofquality oflife, reflect in
without a healthy perception ofoneself an individual may suffer a decline their psychological state before the society. How many times have we heard
in their biological interactions. that an individual is a "winner", "loser" or "detached"in theface ofhis or
The interactions ofthepsychological aspect have to do with the mental, her economic situation? Having or not objects often determine a diflèren-
emotionaland affective balance ofindividuais, lheperception ofindividu tiated socialization, directly influencing this aspect. Although the ideal is
ais about themselves reflects on the biological as well as the social aspect. to think of ourselves as "being" rather than "having", one cannot ignore
^^ith a good emotionaland affective balance, the human being is ready to thefact that the world today is under the ae^s ofa Globalization that is
socialize, as well as to get nourished and to sleep properly. driven by Capitalism, and that there is no human being on theplanet that
lhe epuality ofhuman life, to a large extent, depends on the sociability is completely independent ofits precepts. Tt is necessary to consider that the
ofthe individuais in the various groups in which they are inserted. The ex- economic aspect, therefore, influentes the psychological and social perfor
perience ofliving together and ofdialogue, within the various layers ofad- mance ofindividuais, but also it aflècts directly the biological aspects. An
hesion possiblefor individuais, enriches and harmonizes the human being, individuais wealth determines his ability to get better sheltered and in bet-
also promoting bis abilities with communication. The sense ofbelonging of terplaces, also potentially determining his ability to nurture himselfbetter
an individual reflects in the psycholo^cal aspect ofthe individual, in their and in a balanced way, and consequently his ability to recover.
self-esteem, as well as in the care oftheir biological aspects. There is the environmental aspect, which brings the planetary forces,
which largely ignore the will ofhuman societies. Infact, thoseforces govem
many ofhuman actions. The calendar emerged as an unfolding ofthe hu
When the BiopsychosocialModelIs NotEnough man ability to observe(and not control) the tides,floods ofthe rivers and the
Although the biopsychosocial model is robust, incorporated into the phases ofthe Moon, thus allowing mankind to harmonize theflrst attempts
Tnternational Classiflcation ofFunctioning Disability and Health (TCP), to dominate agriculture takingadvantage ofthese natural cycles. Many nat
there are still other aspects that influence the quality ofhuman life, often ural phenomena, such as soils composed by the millenarian decomposition
aflfecting the peformance ofall three main aspects that configure it. ofvolcanic material, determine the attraction ofagricultural activities and
The biopsychosocial model is a compound ofanthropocentric interac ofentire populations. According to the latitude ofinhabitation on Planet
tions, that is, centered on the human being and the actions and reactions Earth, societies can have at their disposal a greater and / or dijferentiated
that clearly influence the qualily oflife ofindividuais. TTowever, there are biodiversity, longer days and climates morefavorable to certain economic
other aspects that are notso obvious, and these affect the balance ofbiologi activities. Because ofthis, diversifled societies have developed around the
cal, psychologicaland social aspects, nor are these aspects necessarily anthro- world as a response to these environmental aspects. However, with the soci-
pogenic. The modelin question does not take them into account. etys growing techno-scientiflc capacity to undertake changes in the natural
Economics is an aspect that involves the various scales ofpeople's lives, landscape to meet its needs, the environmentpresents new challenges as a re-
regardless ofthe degree ofsociability they have. Tnfact, much ofthe sociabil- action:pollution (atmospheric, water, soil), intensifícation ofdisease vectors
ity ofindividuais derivesjrom economic reasons. The economy has its own due to deforestation and imbalances in ecosystems. The original biological
norms and dynamics, and clearly aflèct the performance ofany ofthe three aspect ofthe biopsychosocial model is heavily ajfected by the environmental
original components ofthe biopsychosocial model. The economic relations aspect, since the environment in which one lives can establish challenges
(or not) to the biological perseverance ofindividuais. The social aspect is

28 29
directly influenced as well, because environmentalfactors contribute in the extended to the dwelling ofhumanity, which is the ecumene. Humans are
formation ofsocieties, in their structure ofpower and economy. Because of inextricably immersed in an environment, with speciflc settings according
the impact on the biological and social aspects, the psycholo^cal aspect is to planetary variables. As a result ofthis insertion, socioeconomic relation-
also influenced. ships are engendered, and biological aspects are conflgured. In this sense, the
There is an aspect that is rooted in the very origin ofhuman societ- preflx "eco" encompasses the environmental, social and economic aspects.
ies: a metaphysical perception, that is, faith, which eventually serves as Having said this, it is necessary to point out two eminently human aspects:
an explanation for questions that lie beyond the limits of their current the psychobgical and the one ofhisfaith.
understanding ofthe world and the universe. Fàith can reside only in lhe incorporation ofthe psycholoflcal aspect remainedprominent here,
scientiflc laws, but it can also presuppose the existence ofa creativeforce, since it is notstrictly the mental, emotionaland affective balance, but it also
or of a creator. Eventually,,faith can combine more than one of these encompasses the development ofthe mentality ofindividuais, groups and
forms ofmetaphysicalperception, conflguring dijferent views ofthe world. societies, ajfecting, even, the historical destinies ofthese human instances.
Faith shapes social relations to a large extent, undoubtedly influencing the lhe incorporation ofthe term "pistiological" must do withfaith (from
psychological aspects ofindividuais -for it brings with it a diflèrentiated the Greek "pisteos" =faith), be it in science, religion or a combination of
view ofthe world and ofethics. Faith can shape biological aspects, such both, regardless oftheforce orforces thatawakens it and whether there is or
asfood (via culinary customs - cyclical or not)and therefore one'sphysical not.an institutionalized religion behind that. Undoubtedly, thepistiological
composition and even one's overall health. In this sense, the socialization aspect (i.e. offaith) contributes precisely to the development ofmentalities,
and sociability ofindividuais, amid a commonfaith in agroup, may have together with the psycholo^cal, thus closing an even more robust definition
very speciflc and specialized conflgurations. ofthe human being.

For a More Comprehensive Model:Ecopsychopistiological


The integration ofeconomic, environmentalandfaith aspects are there
fore indispensable to a more complete theoreticalflamework in thefleld of
Health. With the intention oflinking these aspects to the work model, since
these are already preliminarilyjustifled in the previous item, it is proposed
the use ofan Ecopsychopistiological Model, replacing Biopsychosocial
An EcopsychopistiologicalModel must be built to contribute to the en-
rich our understanding ofindividuais, the complexity oftheir lives, and
governed by the consideration that organic impacts are not necessarily uni-
vocal consequences oforganic causes.
Ihus, the proposal ofthe word Ecopsychopistioloflcal covers ali six as
pects here considered: biological, psychological, social, economic, environ
mental and offaith. lhe Greek preflx "eco"(derivation from the oriflnal
oikos) means "dwelling", "inhabited environment"or "family". This can be

30 31
CAE I :i ';■£!!
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CLASSIFICAÇÃO INTERNACIONAL DE í

FUNCIONALIDADE,INCAPACIDADE E SAÚDE (CIF):


EVIDÊNCIAS E DESAFIOS NA SUA IMPLEMENTAÇÃO
Anabela Correia Martins
Fisioterapeuta.
Doutora em Psicóloga da Saúde. i :r; ' i
E-maib anabelacmartins@estescoimbra.pt ,M..r

Ruth Losada de Menezes


Fiiioterapeuta.
Doutora em Ciências da Saúde.
E'maiL ruthlosada@unb.br

A Organização Mundial de Saúde (OMS) tem contribuído para


conceitualizar o impacto que determinada condição de saúde gera na , 1. '

vida das pessoas (ÜSTÜN, CHATTERJI, BICKENBACH, KOS-


TANSJEK e SCHNEIDER, 2003). Atualmente, a CIF apresenta-se
como uma classificação com múltiplas finalidades, desenhada para ser
: . JI-:
vir a várias disciplinas e setores de diferentes países e culturas. É consi
derada o recurso do futuro para organizar a informação sobre a funcio
nalidade e a incapacidade. O seu principal objetivo é o de estabelecer
uma linguagem comum para descrever a saúde e os estados relacionados
com esta, para melhorar a comunicação entre os diferentes utilizadores,
tais como: profissionais de saúde, investigadores, população em geral,
incluindo as pessoas com incapacidade (WHO, 2001).
A família internacional das classificações da OMS constitui uma
ferramenta valiosa para a descrição e comparação da saúde das popu
lações em um contexto internacional (BPHTY, 2004; HEERSKENS
e VAN RAVENSBERG, 2003; WHO, 2001; SABINO et ai, 2008).
As classificações internacionais da OMS são a ICD-11 — International
Statistical Classification ofDiseases and Related Health Problems (CID-
11, em Português) e a ICF — International Classification ofFunctioning,

33
Disability and Health (CIF em Português). São classificações comple- recional, e inadequado no que concerne ao papel do ambiente na cria
mentares, propondo-se a sua utilização em conjunto; a primeira indica ção e no desenvolvimento da incapacidade (FARIAS e BUCHALLA,
o diagnóstico clínico, e a segunda, a informação adicional sobre a fun 2005; Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social [MTSS],2006;
cionalidade humana. O uso de ambas as classificações permite obter WHO, 2002b). A CIF e a antecedente ICIDH-2 foram o resultado
uma caracterização mais completa e significativa das necessidades das de um esforço que teve início em 1993 e que envolveu a participação
pessoas e das populações(WHO,2001). ativa de 1.800 experts de mais de 60 países. Em maio de 2001, na 54^
Assembléia Mundial de Saúde, que decorreu em Genebra entre os dias
A informação sobre o diagnóstico acrescido da funcionalidade for
14 a 22, a segunda edição da ICIDH marcou o final da sua revisão, ten
nece um quadro mais amplo sobre a saúde dos indivíduos ou das po
pulações. Por exemplo, duas pessoas com a mesma doença podem ter
do surgido a classificação com o título de Intemational Classification of
Functioning, Disability and Health — ICF (WTIQ, 2001).
diferentes níveis de funcionalidade, e duas pessoas com o mesmo nível
de funcionalidade não têm necessariamente a mesma condição de saúde Ao contrário do que muitas pessoas consideram, a CIF não se uti
(Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social [MTSS], 2006; SA- liza unicamente de pessoas com incapacidade, mas tem uma aplicação
BINO et ai, 2008; THREATS, 2003). Embora ambas as classificações universal. Em vez de classificar pessoas, a CIF descreve a situação de
feçam referência aos sistemas do corpo e às deficiências, a ICD-10 utiliza rada pessoa deutto de um conjunto de domínios da saúde ou outros
"deficiências" como sinais e sintomas característicos de uma condição de com ela relacionados, permitindo uma descrição de situações sobre a
saúde, ao passo que a CIF refere-se às "deficiências" como sinônimo de funcionalidade e suas restrições.
problemas (alterações) funcionais e estruturais associados à condição de Nesta classificação, a incapacidade e a funcionalidade são vistas
saúde (Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social [MTSS], 2006). como resultado da interação entre as condições de saúde (doenças, de
A CIF resultou de um longo processo de revisão da Internatio- sordens e lesões) e os fatores contextuais. Encontra-se, assim, assente
nal Classification ofImpairment, Disabilities and Handicaps (ICIDFI) em duas partes, cada uma das quais com duas componentes. A primei
(WHO,1980). Esta fornecia uma linguagem comum para descrever os ra parte - Funcionalidade e Incapacidade - consiste nas componentes
processos de incapacidade. Contudo era, ainda, muito baseada nas cau- de estruturas e funções do corpo, e atividades e participação; enquan
salidades e nos efeitos, focalizando-se muito na doença e nos aspectos to a segunda parte — Fatores Contextuais — compreende os fatores
negativos da saúde. No que toca aos conceitos, a Deficiência {impair- ambientais e os fatores pessoais. Na componente de estruturas, são
meni) ou outra condição de saúde era descrita como a anormalidade nos consideradas todas as partes anatômicas, tais como: órgãos, membros
órgãos e sistemas e nas estruturas do corpo; a Incapacidade {disabilit^ ou suas componentes, enquanto as funções são consideradas as fun
era vista como um estado do indivíduo, causada diretamente pela doen ções fisiológicas dos sistemas orgânicos, incluindo as funções psicoló
ça, caracterizada como as conseqüências da deficiência do ponto de vis gicas. Assim, as deficiências correspondem a um desvio relativamente
ta funcional, ou seja, no desempenho das atividades; e a Desvantagem ao que é normalmente aceito como um estado biomédico normal/
{handicap) refletia a adaptação do indivíduo ao meio ambiente resul padrão do corpo e das funções. Expressam também uma condição de
tante da deficiência e incapacidade (BRUNDFLAND, 2002; FARIAS saúde, mas não indicam necessariamente a presença de uma doença
e BUCHALLA, 2005; PERENBOOM e CHORUS, 2003; SABINO (exemplo: aumento da pressão sangüínea, dor ou déficit cognitivo).
etal., 2008; WTIO,2002a). O modelo da ICIDH apresentava algumas Quanto às atividades, estas são consideradas tarefas ou ações realizadas
fragilidades, como dimensões associadas à doença, ser causai e unidi- por um indivíduo - são organizadas desde as simples tarefas e ações

34 35
até as áreas mais complexas da vida, sendo incluídos itens referentes à Em suma, a incapacidade é caracterizada como a conseqüên
aprendizagem e aplicação de conhecimento, comunicação, mobilida cia ou o resultado das relações complexas entre a condição de saúde
de, cuidados pessoais, atividades e situações da vida doméstica; a par dos indivíduos e os fatores pessoais e ambientais que representam as
ticipação consiste no envolvimento de um indivíduo em uma situação circunstâncias em que o indivíduo vive. Por causa desta relação, am
da vida real. Assim, as limitações da atividade são as dificuldades que bientes diferentes podem ter impactos muito diferentes no mesmo
um indivíduo pode encontrar na execução das atividades (exemplo: indivíduo com determinada condição de saúde. Um ambiente com
dificuldades para voltar ao trabalho, ou para preencher um papel so barreiras ou sem facilitadores vai restringir o desempenho individual;
cial na família); e as restrições na participação são problemas que um outros ambientes, mais facilitadores, podem aumentar o desempenho.
indivíduo pode experimentar no envolvimento em situações reais da Deste modo, e para concluir, a CIE afasta-se da classificação de "con
sua vida quotidiana(WHO,2001; WHO,2002b). seqüências da doença" (versão de 1980), aproximando-se de uma clas
No que toca aos fatores contextuais, existem fatores ambientais, sificação de "componentes da saúde", identificando os constituintes da
que incluem atitudes sociais, características arquitetônicas, estruturas saúde, enquanto as "conseqüências da doença" focam os impactos da
legais e sociais, assim como o clima (estes podem ter uma influência po doença ou de outras condições de saúde que podem surgir como resul
sitiva ou negativa sobre o desempenho do indivíduo); e fatores pessoais: tado. Desta forma, toma uma posição neutra no que respeita à etiologia,
gênero, idade, estilos de coping, background social, educação, ocupação, permitindo aos investigadores o desenvolvimento de inferências causais
experiências atuais e passadas e outros fatores, que influenciam a forma usando métodos científicos apropriados(WHO,2001).
como a incapacidade é experienciada pelo indivíduo. Contudo, estes fa A CIE providencia uma abordagem em uma perspectiva múltipla,
tores pessoais não se encontram disponíveis na classificação (FINGER, baseada na interação de dois modelos opostos, o modelo médico e o mo
CIEZA,STOLL,STUCKI e HUBER,2006;PERENBOOM e CHO- delo social, no intuito de proporcionar uma visão coerente das diferentes
RUS,2003; WHO,2002b). dimensões de saúde, da mesma forma que permite elaborar um perfil de
Por sua vez, os fatores ambientais encontram-se organizados em funcionalidade, assumida como um processo interativo e evolutivo ou re
dois níveis distintos nesta classificação:.individual - ambiente imedia lacionamento complexo e dinâmico entre estruturas e funções do corpo,
to do indivíduo, englobando espaços, como o domicílio, o local de atividades e participação, condição de saúde e fatores contextuais.
trabalho e a escola. Inclui também as características físicas e materiais Depois desta breve, mas imprescindível, explanação conceituai, pas
do ambiente em que se encontra, bem como o contato com a família, samos a expor alguma da evidência disponível e potencialidades da CIE.
os colegas, os conhecidos e os estranhos; e social - todas as estruturas
Muitos estudos foram desenvolvidos ao longo da primeira década
sociais formais e informais, os serviços e as regras de conduta ou os
após a sua publicação; em uma pesquisa da PubMed,foram encontra
sistemas na comunidade ou cultura que têm um impacto sobre os
dos cerca de 1.156 artigos quando se utilizaram as palavras-chave in-
indivíduos. Inclui também organizações e serviços relacionados com
o trabalho, as atividades na comunidade ou nos organismos governa ternationais [Ali Fields] AND classification" [Subheadin^ OR ^'clas-
sijication^ [Ali Fields\ OR "classificatiorF [MeSH Terms]) AND Junc-
mentais, bem como os serviços de comunicação e de transporte, as
tioning [Ali Fields] AND disability [Ali Fields] AND "'health" [MeSH
redes sociais informais, as leis, os regulamentos, as regras formais e
Terms] OR "health" [AliFields]). Em abril de 2017, a mesma pesquisa
informais, as atitudes e as ideologias(WHO,2001).
revelou 2.393 publicações.

36
37
Além de poder proporcionar uma base teórica {theoreticframework) pios de como as categorias e a respectiva codificação, podem ajudar a
para a compreensão e o estudo dos domínios da saúde ou relacionados organizar informação e, consequentemente, facilitar a interpretação e o
com a saúde, assim como dos resultados e da efetividade das interven raciocínio clínico em contexto.
ções, a aplicação prática e eficaz da CIF não responde apenas às deman A CIF constitui uma ferramenta orientadora de avaliação e registro
das do setor da saúde mas também aos diversos setores de segurança da funcionalidade humana, um promissor indicador para as agências
social, educação, emprego, economia, política social, desenvolvimento e para os clientes. Paralelamente ao aumento da qualidade de trabalho
de políticas e de legislação em geral, reabilitação e até das alterações am da equipe interdisciplinar, contribui para uma maior sistematização de
bientais e tecnologias de apoio (TA)(ARTHANAT e LENKER,2004; avaliação e objetivos. Por meio da identificação das categorias da CIF
BODINE,2004; LENKER e JUTAI,2002;"WHO,2001).
na avaliação de utentes em contextos hospitalares ou comunitários, ins
Contudo,longe de estar madura, continua a carecer de contributo titucionalizados ou não, segundo a CIF, será possível criar uma base de
para a clarificação dos conceitos e das interações, que possam facilitar a apoio e linhas orientadoras que facilitem a classificação e o registro dos
sua implementação em diferentes contextos, assegurando uma melhor seus perfis de funcionalidade.
qualidade da informação interdisciplinar(WHO,2001), promovendo
abordagens efetivas e biopsicossociais.
Participação, um indicador emergente de resultados em saúde
Estabelecer ligações das componentes da funcionalidade e incapa
cidade com o conceito de qualidade de vida, também já sugerido por O desenvolvimento e a validação de instrumentos com base nas
Whiteneck (2006), e, simultaneamente, identificar e reconhecer os fa componentes da CIF têm também feito crescer o número de medidas
tores ambientais e o seu impacto na funcionalidade humana tem feito de resultados que permitem uma análise e avaliação do impacto de vá
crescer uma outra linha de investigação, não sõ porque podem influen rias ordens de fatores; destes, destacam-se os que incluem categorias da
ciar positiva ou negativamente a qualidade de vida, mas, acima de tudo, participação, um indicador de saúde e funcionalidade emergente, que se
porque estão muito associados aos resultados esperados nas abordagens relacionam com as interações e relações sociais, a educação, o emprego,
comunitárias/domiciliárias ou relacionadas com as TAs, cada vez mais a gestão do dinheiro, a vida comunitária e social.
comuns nos modelos de reabilitação, mas também cada vez mais com Atualmente, a participação do ser humano, definida na CIF como
prometidas pelos constrangimentos financeiros crescentes. o envolvimento em uma situação da vida real (WHO, 2001, p.l2),
Desde a ligação das dimensões/itens de instrumentos de avaliação é um conceito-chave nos modelos de incapacidade de vários departa
de resultados até as categorias da CIF, passando pela sistematização de mentos, institutos e centros de investigação e estatística, mundialmente
listas de categorias mais freqüentes específicas {core sets) para determi reconhecidos {Institute ofMedicine [loM], 2007; National Institute on
nadas condições (exemplo: Doença de Parkinson, Doença de Alzhei- Disability andRehabilitation Research [NIDRR],2005-2009).
mer, Osteoporose, Diabetes Mellitus, DPOC/Asma, Doença Cardíaca, Na Europa, é assumido nos pareceres e nas propostas que a partici
Artrite Reumatoide, Acidente Vascular Cerebral, Depressão etc.), áreas pação deverá ser incluída nas estatísticas comunitárias, tendo o Conse
(Ortopedia, Neurologia, Cardiorrespiratõria, Doenças Crônicas, Geria- lho da Europa publicado, recentemente, diretrizes metodológicas para o
tria) ou contextos diversos (Cuidados Continuados, Reabilitação Pro desenvolvimento de indicadores que a contemplem {Commission ofthe
fissional, Saúde Ocupacional, Fisioterapia etc.) são apenas alguns exem- European Communities, 2007).

38 39
Em Portugal, o Programa Nacional para a Participação dos Cida MINS, 2002) ou mesmo da promoção da saúde e prevenção de con
dãos com Necessidades Especiais (Resolução do Conselho de Ministros, dições secundárias associadas às doenças crônicas.
2002) e o 1° Plano de Ação para a Integração das Pessoas com Deficiên Várias investigações mostraram que as pessoas com incapacida
cias ou Incapacidade (Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social de experienciam barreiras à participação em vários domínios da vida:
[MTSS], 2006) também explicitam esse interesse, estando a participa reduzidas oportunidades de emprego (CARPENTER, FORWELL,
ção relacionada com a capacidade da pessoa em ser ativa e um membro JONGBLOED e BACKMAN,2007; KENNEDY,LUDE eTAYLOR,
contribuinte na sociedade. 2006), restrições no suporte social e nas regras familiares {National
Segundo a CIE, os fatores ambientais,e pessoais (contextuais) in Spirial Cord Injury Statistical Center [NSCISC], 2006; NOREAU e
teragem com a condição de saúde, influenciando as componentes da FOUGEYROLLAS, 2000), restrições nas atividades de lazer e recre
funcionalidade humana(WHO,2001), nomeadamente a participação ação (KENNEDY e ROGERS, 2000) e falta de transportes acessíveis
social (DUMONT, GERVAIS, FOUGEYROLLAS e BERTRAND, QOHNSON,GERHART,MCCRAY,MENCONI e WHITENECK,
2004; FOUGEYROLLAS, TREMBLAY, NOREAU, DUMONT e 1998; COX,AMSTERS e PERSHOUSE,2001;WHITENECK,ME-
STONGE,2005; NOREAU e FOUGEYROLLAS, 2000; NOREAU, ADE, DIJKERS, TATE, BUSHNIK e FORCHEIMER, 2004). Con
FOUGEYROLLAS e TREMBLAY,2003). tudo, associam freqüentemente estas restrições a fatores ambientais.
Apesar de Harris e Eng (2003) recomendarem que se consideras • O instrumento Perfil de Atividades e Participação relacionadas
sem as atividades e a participação como o foco principal dos progra com a Mobilidade (PAPM) é um exemplo de um questionário que
mas de reabilitação e de Cummins (2002) até ter apresentado um mo serve para avaliar os resultados de intervenções que envolvam tecno
delo conceituai alternativo à CIE, em que a participação social tem um logias de apoio (TAs) para a mobilidade em termos do desempenho
destacado papel como medida de resultado, tem-lhe sido dada pouca de atividades e participação relacionadas com a mobilidade, também
atenção. Especialmente nas pessoas com incapacidades moderadas e pode ser usado em pessoas que ainda não usem esse tipo de TAs, mas
graves, permanecem limitações nas atividades da vida diária após a alta. onde se perspetive a sua utilização em um futuro próximo. No caso de
Muitas vezes, as atividades realizadas fora de casa, relacionadas com um utilizador de TAs para a mobilidade, permite-nos conhecer a sua
o trabalho, a recreação ou as interações sociais, apresentam restrições perspetiva relativamente à efetividade das TAs que usa no que diz res
ainda mais graves e com forte impacto na QV(HOROWITZ,2002; peito à sua performance. Com uma estrutura simples, o questionário
POUND,GOMPERTZ e EBRAHIM, 1998; RIMMER,2006; VIK, apresenta 18 itens (categorias da componente atividades e participa
LILJA e NYGARD,2007). ção da CIE) relacionados com atividades e participação que pressu
põem mobilidade ou concretamente sobre mobilidade cuja consistên
Segundo dados da UnitedNations Statistics Division [UNSD],em
cia interna foi de 0,951 (a de Cronbach), e muito boas propriedades
2005, apenas três países, em um conjunto de 31, recolhiam informa psicométricas relativas à validade de conteúdo (2,2% efeito chão; sem
ção sobre as atividades e a participação das pessoas com incapacidade
efeito teto), validade de critério (HAQ-DI e MOS SF-36) e validade
com finalidades estatísticas (MARTINHO e BANDA, 2005), o que
de construção (PATRÍCIO e MARTINS,2005).
não deixa de ser sintomático do longo caminho que ainda se tem para
percorrer. Em uma perspectiva construtiva, o outcome participação Mais recentemente, este instrumento foi validado para a população
social pode ser um desafio para as áreas, como a reabilitação (CUM- adulta a residir na comunidade, confirmando apropriadas proprieda-

41
40
des psicométricas(MARTINS, 2016). Nesse trabalho que teve como Registros eletrônicos incorporando a CIF
objetivo encontrar uma medida de participação social que medisse o
perfil de participação que mais se aproxime da realidade de cada indi A implementação da CIF nos países membros da OMS, embora
víduo, comparou-se o questionário PAPM com outros questionários esteja a acontecer de forma gradual, ainda é prejudicada pela lentidão
com os mesmos itens, mas com opções de respostas do WHODAS
da disseminação do conhecimento sobre ela. Mesmo com centros for
II, MDS ou PROMIS. Os resultados do coeficiente alfa de Cronbach
madores nos diversos países, ainda há uma carência e uma falta clara de
sistematização na sua aplicação. Contudo, em todo o mundo, os siste
dá-nos segurança para afirmar que as medidas utilizadas têm eleva
da consistência interna {<x Cronbach>0,90), dando-nos a garantia da mas de informação e registro em saúde centrados na pessoa e nas suas
dimensões da funcionalidade são cada vez mais usados para tomadas de
consistência dos instrumentos. Observa-se que, em média, os resulta
decisões rápidas e concentradas entre utentes, profissionais e serviços.
dos obtidos por meio do PAPM são inferiores aos obtidos por meio
dos outros três questionários aplicados. Em média, o perfil de parti O diagnóstico clínico, por si só, não prevê as necessidades terapêu
cipação medido pelo PAPM situa-se no intervalo de O (sem restrição/ ticas, o nível de cuidados e os resultados da sua aplicação e não fornece
limitação) a 1 (ligeira restrição/limitação), ao contrário dos restantes dados que permitam avaliar a extensão da incapacidade e o seu impacto
questionários que apresentam resultados no intervalo de 1 (restrição/ na capacidade e no desempenho da pessoa. Para os fisioterapeutas, com
limitação ligeira) a 2(moderada restrição/limitação). Estes resultados competências centradas na análise e avaliação de todas as componentes
demonstram que um questionário de participação social, que inclua a de "funcionalidade, a CIF representa uma ferramenta primordial, em
opção não se aplica e em que o respondente é capaz de selecionar e uma perspectiva emergente e atual, nomeadamente na determinação de
avaliar apenas as atividades que são do seu interesse e que se aplicam um diagnóstico funcional.
ao seu dia a dia, produz resultados diferentes, podendo responder à Atualmente, em Portugal, existem orientações da Administração
questão orientadora da investigação positivamente.Também nos mos Central do Sistema de Saúde(ACSS) e dos Serviços Partilhados do Mi
tra que, quando os respondentes são obrigados a graduar dificuldade nistério da Saúde (SPMS) para a utilização da ICF nos Sistemas de
na realização de tarefas que não são do seu interesse, a tendência é para Classificação de Doentes (SCD). Simtdtaneamente, a atual Tabela Na
apontarem que apresentam mais dificuldade. cional de Funcionahdade, publicada em 2014 pela Direção Ceral da
Este instrumento tem sido utilizado em Portugal em estudos sobre Saúde (DCS),é outra evidência recente da aplicação da CIF no âmbito
o impacto das TAs na participação social dos seus utilizadores(MAR das doenças crônicas, que se veio juntar ao Decreto-Lei n.° 3/2008, de
TINS,PINHEIRO,FARIAS,JUTAI,2016),a relação entre capacidade 2008, que introduziu a substituição da necessidade de um diagnóstico
funcional, fatores pessoais e participação social(GUAPO e MARTINS, médico ou psicológico na elegibilidade de alunos para a Educação Es
2016), a relação entre as características habitacionais, o historiai de que pecial, pela descrição de um perfil de funcionalidade baseado em uma
das e a participação dos adultos residentes na comunidade(MALEIRO avaliação biopsicossocial mediada pela utilização da CIF.
e MARTINS,2016) e a relação entre a participação social e o risco de Em outra perspectiva, os registros eletrônicos são um desafio
queda na população adulta com mais de 50 anos (Projeto FallSensing) e para os profissionais de saúde em nível mundial. Com a mudança de
no idoso com hipertensão(PINHEIRO,LEMOS,OLIVEIRA, MELO paradigma em saúde, a CIF é reconhecida como a forma de organi
e MARTINS,2017). zação do conhecimento, centrado no utente e indispensável em um
sistema de qualidade.

42 43
o Modelo de Avaliação da Funcionalidade é um instrumen estruturais e funcionais, limitação de atividades, restrições na participa
to baseado no esquema de interação das componentes da CIF e ção social e fatores contextuais); avaliar as necessidades de intervenção
no ciclo de intervenção de Granlund (identificação e explicação adequada para responder aos problemas identificados, recorrendo a mé
dos problemas, explicação dos problemas, definição de objetivos, todos e técnicas específicos, assim como a novas abordagens, incluindo
planeamento da intervenção/procedimentos e avaliação de resulta as TAs, apoios educativos e/ou sociais etc.; registrar a funcionalidade/
dos); produto de alguns meses de trabalho, cuja concessão surge da incapacidade de determinada pessoa, utilizando os qualificadores gené
extensa pesquisa, formação {workshops e outros eventos sobre CIF ricos ou específicos, por meio de programas educacionais na formação
internacionais), parceria e colaboração em projetos internacionais, graduada, pós-graduada e contínua.
concretarriente com o University ofMünich - WHO Collaboration
Project, e da colaboração de 4l fisioterapeutas dos Serviços de Me
dicina Física e Reabilitação dos Hospitais Fernando Fonseca, na Leituras recomendadas
Amadora e S. Teotônio, em Viseu, e outros em Prática Privada, Arthanat. S. & Lenker,J. A.(2004). Evaluatingthe ICFas a Frameworkfor ClinicaiAssessment ofPersons
que, em uma primeira fase, aplicaram o instrumento nos locais forAssistive Technology Devices Recommendation. Paper presented at the 10''' Norrh American Collabo-
onde exerciam, deramfeedbacks sucessivos, contribuindo para uma rating Center on 1CF> Conference on ICF, Halifax, NS.

versão já apresentada e discutida internacionalmente, que, neste Bodine, C.(2004). Development ofan Assistive Technology Outcomes Measurement System Utilizing
the International Classification of Functioning (ICIDH-2/ICF)._Paper presented at the IO'*" North
momento, além de estar a ser aplicada em contextos clínicos vários, American Collaborating Center on ICF, Conference on ICF, Halifax, NS.
serve de base ao modelo de raciocínio clínico e tomada de decisão, Bphty, W.(2004). The International Classification of Functioning, Disability and Health (ICF); Appli-
nomeadamente de fisioterapeutas em contextos de reabilitação e cation to physiotherapy. Nexo ZealandJoumal ofPhysiotherapy, 1 (32), 1-2.
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O processo de Fisioterapia deve documentar os problemas,,a sua
Carpenter, C., Forwell, S. J., Jongbloed. L. E. & Backman. C. L. (2007). Community participation
explicação, o diagnóstico, as metas a atingir e o plano de interven after spinal cord injury. Archives ofPhysicalMedicine Rehabilitation, 88,427-433.
ção e deve, simultaneamente, estar adaptado aos paradigmas atuais Commission of the European Communities (2007). Communication from the Commission to the
de saúde e funcionalidade. As estratégias para melhorar a utilidade do Council,the European Parliament, the European Economic and Social Committee and the Committee
modelo para a pratica clinica incluem um software baseado em ICF, o of the Regions - Situation of disablcd people in the European Union: the European Action Plan 2008-
2009. Brussels: CEC.
smartherapy®. O relatório que é emitido, após o seu preenchimento,
Cox, R. J., Amsters, D. I. & Pershouse, K. J. (2001). The need for a multidisciplinary outreach
ajuda a comunicação entre os utilizadores e permite reconhecer pa service for people with spinal cord injury living in the community. Clinicai Rehabilitation, 15,
drões ao longo do tempo (MARTINS, 2014; MARTINS,SANTOS, 600-606.

FERREIRA, MENDES, ALCOBIA, 2014). Uma versão gratuita em Dumont, C., Gervais, M., Fougeyrollas, P. & Bertrand, R. (2004). Towards an Explanatory Modei
Português, Espanhol e Inglês para investigação e ensino em Fisiotera of Social Participation for Adults with Traumatic Brain Injury.J Head Trauma Rehabilitation, 19(6),
431-444.
pia está disponível sob pedido aos autores.
Farias, N. & Buchalla, C. M.(2005). A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade
Em suma, podemos afirmar que, para que a aplicação e generaliza e Saúde da Organização Mundial da Saúde: Conceitos, Usos e Perspectivas. Revista Brasileira de Epide-
ção da CIF sejam uma realidade, é fundamental adquirir competências miologia, 8(2), 187-193.

para identificar os conceitos e a terminologia veiculados aos modelo e à Finger, M., Cieza, A., Stoll, J., Stucki, J. & Huber, E.(2006). Identification ofIntervention Categories
for Physical Therapy, Based on the International Classification of Functioning, Disability and Health:
classificação; distinguir e relacionar as componentes da CIF (alterações a Delphi Exercise. Physical Therapy,9(86), 1203-1220.

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maio, 2006. Website: http://vvww.who.int/director-general/speeches/2002/english/200204l8_disabili- Fisioterapeuta. Doutora em Nutrição.
tytrieste.html.
Anna Paula Chagas Chaves
World Health Organization. (2002b). Towards a Common Language for Functioning, Disability and Fisioterapeuta.
Health. Geneva: World Health Organization. Mestre em Neurociências.

Carine Carolina Wiesiolek


Fisioterapeuta.
Doutora em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento.
Catharina Machado Portela
Terapeuta OcupacionaL
Especialista em Neuropsicologa Clinica.

Márcia Alessandra Carneiro Pedrosa


Fisioterapeuta. Doutora em Ciências da Saúde.

Natália Ferraz de Araújo Malhes


Fisioterapeuta.
Mestre em Saúde da Criança e do Adolescente.

Rayanne Crislaynne Silva Oliveira


Estudante de Graduação em Fisioterapia.

Novo paradigma na formação do profissional de saúde tem sido


identificado a partir de uma necessidade de mudança no modelo de
atenção e assistência à saúde, bem como, diante da inadequação das ins
tituições de Ensino Superior (lES) em responder às demandas sociais.
O modelo de abordagem biopsicossocial destaca os componentes de
saúde integrados aos níveis corporais e sociais. Sendo assim, olhar para
a pessoa com deficiência se daria na dimensão biomédica, psicológica
(individual) e social. Nesse modelo, as dimensões interagem entre si e
são influenciadas pelos fatores ambientais(BISPO JR, 2009; CYRINO
eTORATELLES-PEREIRA, 2004).

48 49
Buscando essa adequação ao novo, já pode ser observada a imple Ocupacional buscaram elucidar por meio das suas experiências profis
mentação de novas dinâmicas curriculares na graduação de bacharel em sionais ou de formação se a inserção da CIF na formação do bacharel
Fisioterapia. As lES têm sido estimuladas a modificarem seu caminho na em Fisioterapia seria identificada como uma barreira ou facilitador.
direção de um ensino que, dentre outros atributos, estime a equidade e a
Autores destacam que a reabilitação dentro de uma compreensão
qualidade da assistência e a eficiência e relevância do trabalho em saúde
abrangente estrutura-se sobre um conhecimento fundamental das di
(BISPO JR,2009; CYRINO e TORATELLES-PEREIRA,2004).
mensões biológica, psicológica e social, bem como dos determinantes da
Diante desta nova perspectiva, identifica-se a Classificação Interna funcionalidade humana e incapacidade(STUCKI et aL, 2008). A CIF
cional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde(CIF) como aliada para foi elaborada partindo da necessidade de uma classificação que abordas
o desenvolver desse novo paradigma. É necessário que a mudança seja se assuntos relativos à funcionalidade, ou seja, que complementasse a
pautada no reconhecimento de que condições de saúde e doença são Classificação Internacional de Doenças(CID),já que esta dispõe apenas
determinadas por um contexto ambiental, social, cultural, bem como as doenças e suas causas, sem registrar o impacto destas condições na
promovidas por adequada legislação e disponibilidade de serviços de vida do paciente(ANDRADE et ai, 2009).
atenção e assistência à saúde (FARIAS e BUCHALLA,2005).
A visão de integralidade da CiF desempenhando um papel facilitador
Neste contexto, é possível destacar o quanto a CIF pode ser útil no processo de formação do fisioterapeuta é reconhecida nos discursos:
na formação profissional e prática clínica dos profissionais da saúde,
em especial o fisioterapeuta, que trabalha diretamente com os aspectos Ela tem uma proposta ampla na qual se quebra o paradigma do
funcionais, já que ela auxilia o profissional desde a avaliação inicial até modelo médico, no qual o paciente é uma patologia e passa a ter
a evolução clínica do paciente (BUCHALLA, 2003; SAMPAIO et ai, uma visão muito mais ampla como a influência do meio ambiente,
2005; SAMPAIO e MANCINI,2007). do meio social na vida do paciente, abrindo um leque muito maior
de possibilidades de avaliação e reconhecimento para tratamento e
Partindo desse pressuposto, a CIF destaca a funcionalidade como prevenção de doenças...
um componente da saúde que pode ser facilitada ou não pelos fatores (Acadêmico, 5°período, lESprivada)
ambientais e pessoais dos indivíduos. Esta visão ampliada das dimen
sões da saúde visa exceder o modelo estritamente médico, de relação Na minha prática clínica, como preceptora, eu trabalho em uma
causai linear, que caracteriza a incapacidade como um problema direta instituição que preza por assistência, ensino e pesquisa. Eu tive a
mente relacionado a uma doença ou trauma ((SAMPAIO et ai, 2005; oportunidade de trabalhar com a CIF na nossa avaliação interdisci-
TOLDRÁíftí/., 2014). plinar. Era uma avaliação que fazia tanto a fisio como a fono e a TO,
e a gente tinha os códigos para utilizar...
Existem muitos desafios nesse processo de mudança, dentre eles,
(Docente e Preceptor de lES privada)
estão a dificuldade em romper com modelos de ensino tradicional e a
postura de transferência de informações para formar profissionais com Ela foi oficializada pela Organização Mundial da Saúde e é algo que
capacidades para lidar com as relações humanas no cuidado à saúde não é restrito a um profissional de saúde classificar e documentar
(BARBA,2012). estatisticamente, que, no caso da CID, é o médico, mas, na CIE..,
Como protagonistas do cuidado à saúde, discentes, docentes e pro qualquer profissional de saúde pode fazer, desde um médico, um fi
sioterapeuta, até um assistente social, e outros profissionais de saúde.
fissionais orientadores/preceptores dos cursos de Fisioterapia e Terapia

50 51
e não so da area da saúde..., outros profissionais também podem uti ...eu só sei que realmente é uma classificação internacional de fun
lizar esses dados, tudo isso vai englobar a funcionalidade humana... cionalidade e que eu acredito que deve funcionar como indicador de
(Acadêmico, 6°período, lESpública) saúde, né? que deve dar classificações para aqueles pacientes sobre a
funcionalidade dele, sobre o quadro de saúde, a incapacidade, o grau
A CIF é um facilitador, uma forma universal de todos os profis da incapacidade ...subentendo que seja isso... Eu não tive explicação
sionais entenderem o quadro do paciente e atuarem sobre ele, por sobre, e só o que sei sobre isso é isso...
exemplo, um arquiteto ou engenheiro vai saber o que é barreira ou
(Acadêmico, 9°período, lESprivada)
facilitador para ele, um fisioterapeuta vai saber a dificuldade dele ou
a facilidade de realizar uma atividade que ele consegue fazer...
Essa visão ampla e global, com um olhar além das dificuldades, com
(Acadêmico, 9°período, lESpública)
enfoque em potencialidades, considerando aspectos pessoais e ambien
tais que possam influenciar a funcionalidade das pessoas, já está prevista
Ao se classificarem a funcionalidade e a incapacidade de todo e nas competências das habilidades profissionais das Diretrizes Curricula
qualquer indivíduo utilizando a CIF, que trata à luz do modelo biopsi- res Nacionais(DCN)do Curso de Fisioterapia(BRASIL, 2002).
cossocial, estruturas e funções do corpo, atividades e participação, bem
Ainda não tive oportunidade de ter uma experiência real, viva. Mas,
como fatores ambientais e pessoais, possibilitam que o profissional de
ela é muito abordada na disciplina de Políticas de Prevenção onde
saúde, inclusive o fisioterapeuta, tenha uma visão holística do ser huma
a gente estuda o indivíduo e os acometimentos que podem afetá-lo
no no que concerne às suas práticas profissionais. e como a gente pôde tratar, prevenir e fazer com que esse indiví
duo seja independente e tenha uma imagem corporal legal diante da
Por enquanto, eu ainda não consegui colocar como conteúdo, né,
sociedade. A CIF também é discutida em Fundamentos e ação de
dentro do cronograma, mas eu ministro fisioterapia neurológica...
saúde quando a gente fala de prevenção...
Então sempre que eu estou falando de algum paciente, de uma for
ma de tratamento ou sobre como eles devem visualizar o paciente, eu (Acadêmico, 1°Período, lESprivada)
sempre tento utilizar a nomenclatura da CIF. Mostrar para eles que, Nas disciplinas de práticas clínicas, mostro para os alunos que te
antigamente, a fisioterapia via muito o "fortalecer um quadríceps", mos uma capacidade facilitadora de fecharmos o diagnóstico ciné-
era muito músculo, muita estrutura, muita articulação. E aí passa tico-funcional dos nossos pacientes quando aplicamos a CIF com
mos a ver mais a função, trabalhar um quadríceps para ele passar do eles. E importante que todos os docentes comecem a utilizar esta
sentado para o de pe. Mas eu peço a eles que vejam ainda um pouco ferramenta em suas disciplinas... A CIF é fácil de ser usada e de ser
mais. O que este paciente vai fazer com esta atividade de passar de aplicada, basta treinamento...
sentado para o de pé? Então ele vai utilizar isto onde? Para ir para
uma igreja, para ele voltar da faculdade, para ele ir à escola? Como o (Docente de lESprivada)
profissional vai conseguir levar esse paciente a esta participação? Essa
é uma forma que eu sempre passo para eles... Farias et ai(2005) destacam que a CIF apresenta certo grau de difi
(Docente e Preceptor de lESprivada) culdade em sua utilização, e isso decorre do fato de ser uma classificação
recente, complexa e que sua aplicação requer um tempo maior que a
própria consulta, além dos aspectos inerentes a mudanças de conduta
por parte dos profissionais da área da saúde.

52
53
Embora a CIF seja considerada um instrumento de grande impacto ... Na minha prática como docente, eu ainda não consegui colocá-la
na forma de classificar as condições de saúde, ainda há muita resistência como conteúdo para ministrar em uma aula. Mas, eu estou minis
para sua adesão e aplicação, e isso se deve a inúmeros fiitores, como o alto trando fisioterapia neurológica, então sempre que eu estou exempli
nível de complexidade de compreensão, análise e aplicabilidade dos resul ficando aos alunos a forma como a gente deve ver o paciente, a forma
tados ou, até mesmo, por falta de conhecimento (SILVA et ai, 2012). como a gente deve tratá-lo, eu sempre tento utilizar a nomenclatura
de estrutura e função, de atividades e participação, para que eles
Ela não é aplicada em nenhuma disciplina minha... alguns profes possam ir ouvindo e ficarem familiarizados com a nomenclatura,
sores mencionam, né, o código CIF, mas não se aprofundam... Eu para que, no futuro, quando eles forem olhar algum artigo, eles não
identifico que eles não detêm o conhecimento a ponto de ensinar achem "Ai meu Deus, eu nunca vi isso! O que é isso? ...
ou pelo menos, tirar algumas dúvidas, ou explicar de forma resu (Docente e Preceptor de lESprivada)
mida sobre a CIE...

(Acadêmico, 6°período, lESprivada) A diversidade de recursos da CIF se traduz na dificuldade de uso


Hoje eu vejo a CIF como uma barreira na formação profissional, apesar completo. Na sua utilização, têm sido identificados alguns equívocos que
de ela ter sido criada como uma fecilitadora, criando uma linguagem levam, por vezes, ao seu uso inapropriado, a aplicações incompletas, com
universal de funcionalidade... porém,pela não uniformidade em estudar simplificação e má compreensão da sua complexidade,sobretudo,quando
e ver esse conteúdo dentro da graduação, acaba que isso debca o aluno e ela é utilizada como um instrumento de avaliação e não como um sistema
o futuro profissional perdido na hora de aplicar essa classificação... de classificação. Este fato foi identificado nos discursos abaixo:
(Acadêmico, 8°período, lESprivada)
Quando é bem aplicada por profissionais que sabem utilizar e têm
...Em 2016, ministrei uma aula em uma pós-graduação e me surpre conhecimento, é um avanço. Agora, quando é aplicada de forma er
endi lendo sobre o tema de que,em países, como os Estados Unidos, rônea, cria uma barreira para os alunos que estão aprendendo e pode
é muito comum a preocupação dos terapeutas na participação social. criar uma dificuldade posteriormente...
Isso me chamou muito a atenção, porque não é muito a nossa prá (Acadêmico, 10°período, lESprivada)
tica, a gente ainda pensa muito na tarefa, na atividade do passar do
sentado para o de pé, no manipular objetos. Mas o que é que o in Na graduação, a CIF deveria ser utilizada desde o inicio da graduação,
divíduo vai fazer com isso? O que é que isso vai mudar na vida dele? porque acaba que a gente tem uma grande quantidade de docentes,
E os artigos mostravam muito que isto deve ser uma preocupação uma diversidade muito grande de disciplinas, porém o mais importan
na reabilitação física, não se preocupar só com estrutura, mas sim ir te que a gente busca... que o fisioterapeuta busca... seja na prevenção
além, na participação. ou na reabilitação... é a função do paciente, que acaba sendo esquecida
(Docente e Preceptor de lESprivada) nesse processo, ou então acaba tendo falas diferentes para isso, e não
se chega a um consenso, e até de discentes mesmo quando vai discutir
Por ela dar uma visão global do paciente, acho muito interessante em atividades que têm de ser realizadas entre períodos diferentes, não
aplicá-la, porém, na prática, a dificuldade é por conta do tempo que chega a esse consenso porque cada um pega da maneira como enten
é necessário para realizá-la. de, e a gente não tem algo para a gente seguir fielmente.
(Preceptor de lES Privada) (Acadêmico, 10°período, lESprivada)

54 55
o Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (CO- Funcional, por meio de planejamento e ações visando gerar maior su
FFITO), em 2009, por meio da Resolução n.° 370 que dispõe sobre a porte para estudo e capacitação com a CIF.
adoção da utilização da CIF por fisioterapeutas e terapeutas ocupacio-
nais, devendo ser utilizada como ferramenta de uso profissional. Ainda Após Oficina introdutória à CIF, projeto do CREFFITO 1, minha
nessa resolução, recomenda-se que essa classificação seja empregada nas visão mudou... Eu tinha outra visão de avaliação. Se o paciente me
graduações, extensões e pos-graduações da área, sendo inserida como informasse um problema eu iria pensar em resolver isso de forma
instrumento na prática profissional por meio de treinamentos especiali local. Mediante o que me foi passado, a minha função como fisiote-
zados ou como conteúdo básico na formação profissional. rapeuta não é só focar no local da dor do paciente mas também achar
a causa do problema, de forma que eu possa tratar e prevenir. A CIF
Além do COFFITO, o Conselho Nacional de Saúde (CNS), por me dá oportunidade de fazer uma avaliação muito mais detalhada.
meio da Resolução n.° 452/2012,também estabeleceu a CIF no âmbito
(Acadêmico, 5°período, lESprivada)
do Sistema Único de Saúde (SUS), cujo objetivo é a concretização do
modelo do SUS,tanto no campo das práticas de saúde como no campo ...inclusive recentemente eu convidei um dos membros da Comissão
da formação profissional. de Saúde Funcional do CREFFITO 1 para ministrar uma palestra
Apesar da existência de normatizações sobre a inserção da CIF na na faculdade onde eu trabalho exatamente para abrir mais os hori
formação profissional, ainda identifica-se a necessidade de uma for zontes dos estudantes para que eles, ao se depararem com um conte
mação rigorosa e adequada sobre a CIF, que incorpore aspectos téc údo quando estiverem lendo algum artigo, estudando algo, eles não
desconheçam aquele assunto.
nicos e éticos, como forma de evitar aplicações não compatíveis com
suas finalidades. (Docente e Preceptor de lESprivada)

Basta uma breve e superficial investigação sobre o emprego da te


mática nas Instituições de Ensino Superior (lES) e em serviços públicos O profissional formado e atuante no conceito biomédico ne
e particulares nos quais estes profissionais estão inseridos, para identifi cessita abrir-se para esta nova perspectiva de mudança conceituai,
car após esses anos, que atualmente esta realidade ainda está em proces reconhecendo que existe uma complexa interação dos vários fa
so de construção. tores desde o nível fisiológico ao social (STUCKI et ai, 2008).
A Saúde Funcional abrange o estado de bem-estar do sujeito, nas
E quando a gente chega aos estágios e encontra alunos de outras
coletividades ou enquanto pessoa, no desempenho das atividades
instituições, a gente percebe muito isso, percebe essa diferença de
fala, de classificação, não tem aquela comunicação que possa ser en e na participação social, visando ao exercício da funcionalidade
humana e cidadania.
tendida por todos...
Ao se refletir sobre todos os aspectos levantados neste capítulo,
(Acadêmico, 10°período, lESprivada)
faz-se necessário chamar a responsabilidade para as estratégias de edu
cação continuada e/ou permanente ao profissional/acadêmico que
A estratégia de conscientização, sensibilização e capacitação dos atua com a funcionalidade humana.
profissionais e estudantes de Fisioterapia e Terapia Ocupacional foi ado
tada pelo CREFFITO-1 dentro da sua jurisdição na comissão de Saúde

56 57
Na verdade, e uma classificação internacional de funcionalidade. É Eu considero a CIF na formação profissional, na teoria, como um
só o que sei sobre a CIF... porque eu não tive esse contato na gradu facilitador, mas, na prática em si, eu noto uma dificuldade. Eu acho
ação... ainda não tive... nem tive oportunidade de fazer curso de ca que existem barreiras, porque é algo que não é tão simples. É neces
pacitação, apesar de ser oferecido por alguns locais... e aí eu também sário um estudo mais aprofundado, não só na questão teórica, para
não busquei., eu errei nisso... o aluno buscar, se informar, mas também na questão prática... para
(Acadêmico, 9°período, lESprivada) ser promovido em sala de aula... para ser promovido nas práticas...
nos atendimentos... e bem mais aprofundado... porque muitas vezes
... eu acho que a CIF é um instrumento importante, que ele tem de o conhecimento, assunto, por ser um pouquinho complexo, quando
existir e que a gente precisa conhecer. Eu, por exemplo, não tenho o aluno vai estudar, vai buscar em casa, ele sente dificuldade com
domínio para falar ou aplicar a CIF, precisaria de alguém que me alguns termos, com alguns conceitos, com a aplicabilidade em si,
instruísse e me orientasse para que conseguisse prosseguir no uso, porque no livro em si, na apostila, na política da OMS,ela define,
mas eu acho que é um instrumento de extrema importância. mas ela não chega a mostrar uma funcionalidade. Por exemplo, o
(Docente e Preceptor de lESprivada) modelo que o profissional pode utilizar, então, é algo que é para
facilitar, mas, ao mesmo tenipo, encontra essa dificuldade.
No meu primeiro contato com a CIF,eu a considerei como uma bar
(Acadêmico, 6"período, lESpública)
reira devido a complexidade dos seus codigos, porém, com os cursos
e estudos, ela vai se tornando um facilitador na nossa prática... Hoje
eu enxergo a CIF de forma essencial para meu dia a dia na profissão. Apesar de todas as barreiras explicitadas ao longo desse capítulo,
Não so na minha, mas, por exemplo, se eu tenho um paciente e constata-se que os aspectos considerados como facilitadores são inúme
preciso encaminhar para um TO, e bem mais simples eu qualificar ros e sempre presentes nos discursos de alunos, docentes e profissionais
a situação funcional do paciente para que outro profissional possa da Fisioterapia. Esses pontos positivos motivam profissionais e gestores
tomar ciência do caso e assim ampliar a codificação caso seja preciso de serviço de saúde a implantarem e implementarem estratégias para a
um atendimento em conjunto. Hoje, ainda não é fácil para eu rea utilização da CIF na rotina de suas atividades.
lizar a classificação, mas acredito que, com o tempo e a prática, irei
me familiarizar ainda mais com os codigos, tornando a aplicação da Em 2012, visando à adequação do serviço diante da Resolução n.°
CIF ainda maior na minha prática profissional. 452/2012 do CNS,o Centro de Reabilitação e Medicina Física Prof.
Ruy Neves Baptísta do Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando
(Acadêmica, 7°período, lESprivada) Figueira — IMIP,em Recife, iniciou a capacitação de seus profissionais
de saúde para a utilização da CIF por meio de cursos com especialistas,
Na area clinica, a CIF se propõe a servir de modelo de atendimento visando ajustar as avaliações existentes e já utilizadas no local.
multidisciplinar, entretanto, devido a sua complexidade, observa-se a As reuniões clínicas e científicas passaram a ser direcionadas ao esmdo e à
dificuldade de uso completo da mesma.Dessa forma,autores já conside elaboração de um consenso na codificação das avaliações interdisciplinares
ram como proposta de solução para facilitar sua aplicação instrumentos já existentes para equivalência dentro das categorias da CIF. O processo
que se proponham a resumir a classificação. Nessa perspectiva, a OMS durou cerca de cinco meses, e, então, desde janeiro de 2013 até o presente
propôs uma lista genérica criada a partir da CIF, contendo as condições momento,o Centro de Reabilitação IMIP utiliza suas avaliações interdis
mais importantes a serem levantadas durante a atenção ao paciente. ciplinares para a admissão de pacientes neurológicos, adulto e infantil, no
serviço, toda respaldada na CIF com códigos e qualificadores.

58 59
Houve incentivo e estímulo da gestão à transposição deste desafio e Leitura recomendada sobre o tema
mobilização por parte de toda a equipe de reabilitação que identifi
cou como uma mudança importante e necessária ao serviço. O ob ANDRADE.P. M.O.,FERREIRA,E O., HAASE.V. G.O uso da CIF através do trabalho interdisd-
jetivo ainda em andamento deste Centro de Reabilitação é adequar pUnar no AVC pediátrico: relato de caso. Contextos Clínicos, v. 2(1), pág. 27-39,2009.
todas as avaliações existentes de todas as especialidades de saúde den BARBA, P. C. S. D., SILVA. R. R,Joaquim, R. H. V. T.& Brito. C. M.D. Formação Inovadora em
Terapia Ocupacional. Interne, v. 16, p. 829-42, 2012.
tro da CIF, ja tendo acontecido com a avaliação específica do setor
de Terapia Ocupacional Adulto em 2017 e, em andamento, com a BISPO JÚNIOR, J. P. Formação em fisioterapia no Brasil: reflexões sobre a expansão do ensino e os
modelos de formação. História, Ciências, Saúde — Manguinhos, Rio de Janeiro. v.l6, n.3, jul.-set.
avaliação especifica da Fisioterapia Neurofiincional, que se encontra 2009, p. 655-668.
na foe de ajustes com os profissionais responsáveis. BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES de
(Profissional do serviço de neurologia adulto) 19.02.02. Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Fisioterapia. Brasília; 2002.
BUCHALLA, C. M. A. Classificação Internacional de Funcionalidade. Incapacidade e Saúde. Acta
Fisiatr. V. 10(1), pág. 29-30, 2003.
Assim, percebe-se que, apesar de todas as recomendações advin CYRINO. E. G., & TORATELLES-PEREIRA, M. L. Trabalhando com estratégias de ensino-apren-
das da Organização Mundial de Saúde, do Conselho Nacional de Saúde dizado por descoberta na área da saúde: a problematização e a aprendizagem baseada em problemas.
e do COFFITO, ainda se faz necessária uma garantia de que a saúde Caderno de Saúde Pública, v. 20, p.780-78, 2004.

funcional seja prioridade na rotina do fazer fisioterapêutico e que a CIF CONSELHO FEDERAL DE FISIOTERAPIA E TERAPIA OCUPACIONAL.Resolução n." 370,de
6 de novembro de 2009- Da adoção da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e
seja adotada como instrumento classificatório para esse fim. Saúde (CIF) da Organização Mundial de Saúde por Fisioterapeutas e Terapeutas Ocupacionais. Diário
Oficial da União; 2009.
Medidas de educação permanente deverão ser estimuladas, não
so para os profissionais de serviço mas também e principalmente para CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE. Resolução n.° 452, de 10 de maio de 2012. Da adoção da
Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde(CIF)da Organização Mundial de
os profissionais que estejam atuando na docência, pois, apenas dessa Saúde no Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União; 2012.
forma, a formação de recursos humanos em Fisioterapia terá, em seu FARIAS, N.; BUCHALLA. C. M. A classificação internacional de funcionalidade, incapacidade e
processo de construção do saber, um olhar transversal sobre a funcio saúde da organização mundial da saúde: conceitos, usos e perspectivas. Revista brasileira epidemiolo-
nalidade humana, onde a CIF assumirá o seu papel de facilitadora gia. São Paulo, junho. V 8. n2, 2005.
nesse processo de formação para uma abordagem cinético-funcional, SAMPAIO.R. E, MANCINI. M.C.GONÇALVES, G. G. P., BITTENCOURT, N.F.N., MIRAN
DA.A.D.,FONSECA,S.T. Aplicação da Classificação Internacional de Funcionalidade.Incapacidade
em uma perspectiva biopsicossocial. e Saúde(CIF) na prática clínica do Fisioterapeuta. Rev. Bras. Fisioter. v. 9, n. 2, pág. 129-136, 2005.
SAMPAIO, R. E, MANCINI, M.C Tecendo uma rede de usuários da CIF. [Editorial]. Rev. Bras.
COLABORADORES:Aline Ferreira Vasconcelos, Aline Renata de Farias Fisioterapia, v. 11(4), pág. 245-331, 2007.
Fragoso, Amanda Priscila Ferreira de Carvalho, Amauri José Cordeiro SILVA, D.A. S.; PEREIRA,I. M.M.;ALMEIDA, M. B.; SILVA, R.J. S.; OLIVEIRA,A. C. C. Estilo
Júnior, América deAraújo Palmeira, Cinara Bezerra, Clarissa Pessoa Lopes, de vida de acadêmicos de Educação Física de uma universidade pública do estado de Sergipe, Brasil.
Fabtola Barbosa de Melo, Gabriela Ingrid Ferreira do Nascimento, Gabriel Rev. Bras. Ciênc. Esporte, Florianópolis, v. 34 (1), pág. 53-67, 2012.
Glavão Mergulhão,Júlio Líenrique Policarpo, Luciana Bezerra dos Santos STUCKI ,G.: REINHARDT, J.D.; GRIMBY, G.; MELVIN, J. O desenvolvimento da "Pesquisa
em Funcionalidade Humana e Reabilitação" a partir de uma perspectiva abrangente. ACTA FISIATR
Cardozo, Sinticjue Rodrigues, Pollyanna da Costa Lima Crasto de Moraes. 2008; 15(1): 63-69

TOLDRÁ, R. C.; SOUTO, A. C. E Cad. Ter. Ocup. UFSCar, São Carlos, v. 22, n. 2, p. 347- 359,
2014.

60 61
CAP.
íT!!]
:f|:
EXPERIÊNCIA DA CIE:INTERAÇÃO ENTRE ENSINO E
SERVIÇO

CLirissa Cotrim dos Anjos


Fisioterapeuta.
Especialista em Fisioterapia NeurojUncional.

■j 'iPi:
A minha formação acadêmica consiste na graduação em Fisiote
rapia pela Universidade de Ciências da Saúde do Estado de Alagoas
(UNCISAL), em 2003. Tenho especialização em Docência do Ensino
Superior pelo Centro Universitário Cesmac, em 2004, e em Ciências da
Saúde pela UNCISAL, em 2008. Tamhém sou especialista em Fisiote
rapia Neurofúncional em criança e adolescente pela Associação Brasilei
ra de Fisioterapia Neurofúncional (ABRAFIN) com o Conselho Federal
de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO) e, atualmente, mes-
tranda do Mestrado Profissional de Ensino na Saúde pela Faculdade de
Medicina da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).
Neste capítulo, vou contar um pouco da minha trajetória profissio
nal e dos desafios para a implantação da Classificação Internacional de
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) na Fisioterapia.
Depois de passar pela Associação de Pais e Amigos dos Excepcio !■

. '• . i:
nais (APAE), onde tive a oportunidade de trabalhar com o púhlico do
Sistema Único de Saúde (SUS) e ajudei a estruturar os setores de Fisio
terapia, sendo coordenadora e responsável técnica até o ano de 2014,
pude incluir na minha bagagem a grata experiência de trabalhar em
uma equipe interdisciplinar em nível de média complexidade, desen
volvendo, na prática, a integralidade e a resolubilidade por meio da re- y
ferência e contrarreferência realizada, informalmente, entre os membros ; ;ji
desta equipe. Ao mesmo tempo, iniciava a minha carreira docente no
Centro Universitário Cesmac nas disciplinas de Fisioterapia PediátricaI ,?

63
e II e como convidada pela Coordenação do Curso de Fisioterapia para apenas no uso de fóruns de discussão e me questionava: Como eu iria
ser membro do Colegiado do Curso a partir de 2011. debater algo que nem sabia direito o que era?
No meu caminhar, fiz parte do grupo de trabalho da Hanseníase, No entanto, a tendência era que o assunto fosse sendo dissemi
por meio.de.convênio entre o Ministério da Saúde e a UNESCO, de nado e, assim, cada ano que passava,.mais se ouvia falar sobre a CIE
senvolvendo atividades sempre voltadas para a área de saúde coletiva, Falava-se muito na teoria, mas, na prática, não sabíamos utilizá-la e
com ênfase em vigilância epidemiológica e atenção básica. muito menos conhecíamos pessoas que a utilizava para que pudésse
Depois, fui a busca de novos desafios e descobertas e pude vivenciar mos seguir como referência.
a experiência de ser fisioterapeuta da UNCISAL, ingressando por meio No ano de 2014, a minha necessidade de conhecer e me apropriar
de concurso público, trabalhando na antiga Cfinica Escola de Fisioterapia da CIF ficou cada vez mais evidente e necessária, e a busca por estudos
e atuando no ensino e na assistência como preceptora de estágio no Setor e capacitações na área me interessava intensamente. Só, em 2016, con
de Pediatria, que faço ate os dias de hoje. Em 2016, ingressei na mesma segui realizar um curso presencial da CIF, o que me fez refletir e mudou
instituição, por meio de concurso público, como docente na área de Saú totalmente a minha forma de pensar diante do meu paciente.
de da Criança, no qual para as aulas práticas da disciplina, instituímos um
Apesar de estar envolvida na assistência e no ensino, a CIF sempre
novo cenário de prática para os discentes que foi o voltado para a promo
foi sendo deixada em segundo plano, em virtude das várias demandas e
ção de saúde e prevenção de doenças, na área da criança.
conteúdos curriculares a serem lecionados. Com o curso da CIF, come
Atualmente, sou coordenadora da Reabilitação do Centro Especia cei a mudar a minha própria história profissional.
lizado em Reabilitação(CER)111, desempenhando as funções de gestão
Naquele ano, ocorreram simultaneamente vários fóruns para discu
no tocante à organização do serviço e produtividade do SUS. Hoje,
tir as novas diretrizes curriculares do Curso de Fisioterapia, e a temática
posso dizer que estou muito envolvida com o processo de formação
CIF foi a grande estrela na maioria das discussões.
do fisioterapeuta, voltada para a promoção da saúde e a prevenção de
doenças, pesquisando a prática e buscando melhores métodos para isso, Naquele momento,os profissionais da área já entendiam que não dava
o que configura um grande desafio, visto que a nossa profissão carrega mais para negar a existência da classificação. E mais... passaram a reconhecer
ainda um grande estigma reabilitador. a importância dela desde o ensino até a assistência propriamente dita.
Mas, você deve estar se perguntando: Quando a CIE chegou à Essa discussão ainda perdura, mas parece que vem ganhando mais
minha vida? força com a implantação da política do Ministério da Saúde por meio
do Programa Viver Sem Limites, em que propõe a implantação dos
Em meados de 2007, quando estava ainda no Ministério da Saú
Centros Especializados em Reabilitação, que foram espalhados pelos
de, na area técnica da Hanseníase, pouco se falava sobre a Classificação
estados brasileiros. Diga-se de passagem, que esta política trouxe uma
Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) e vê-la
outra discussão, visto que, nessa idéia, o foco está na deficiência, mas,ao
implantada era algo que parecia ser bem distante da realidade local.
mesmo tempo, todas as diretrizes apontam a necessidade do uso da CIF
Só quase três anos depois, fiz o meu primeiro curso on-line sobre a nos serviços, o que, em minha opinião, trata-se de um contraponto, já
CIF, por um convênio com uma universidade do Sul do País. Para mim, que a CIF com o seu modelo biopsicossocial está voltada não para a
na época, a metodologia adotada não foi proveitosa porque se baseava doença mas sim para as pessoas.

64 65
Diante do cenário exposto, tanto os serviços e centros especializa pois muitos ainda ficaram de fora do processo de capacitação. Tenho a
dos como as próprias Instituições de Ensino Superior passaram a dis esperança de que, após essa capacitação gratuita ofertada, possamos ter
cutir de forma mais intensa o uso e a importância da CIE Acredito que mudanças na prática dos processos.
isso tenha se dado por dois motivos: o primeiro, porque muitos desses Creio que os serviços prestados devem ser.os melhores, e que isso
profissionais ouviram falar que ela era positiva e importante para o apri seja bom tanto para os profissionais como para os pacientes beneficia
moramento do trabalho; e o segundo, porque "alguém" falou que seria, dos. É preciso, inclusive, sempre fazer uso dos melhores instrumentos
em algum momento, obrigatório o seu uso no serviço. Pois bem... estes
para embasar o processo avaliativo e, consequentemente, obter um
dois aspectos mencionados, na prática, parecem ser verdadeiros quando
bom plano terapêutico. Esse é o pressuposto básico de todo serviço de
falamos sobre a implantação da CIF no serviço.
Fisioterapia. Foi a minha inquietação sobre a realidade na prática pro
A CIF é de extrema importância no cenário da atividade fisiotera- fissional que me trouxe a necessidade do uso da CIF tanto no serviço
pêutica porque traz o foco biopsicossocial na amação do profissional, com como no ensino.

a adoçáo de modelo multidimensional de funcionalidade e incapacidade


É impressionante a conclusão a que chego! Independentemente do
para todas as áreas, não apenas da dita "Reabilitação". Além disso, há a
serviço que se atue (intermunicipal, especializado, serviço ligado à insti
obrigatoriedade dela em todos os serviços, conforme determinado pelo tuição de ensino), todos caem na primeira dificuldade de uso da CIF: o
Programa Nacional de Avaliação dos Serviços de Saúde (PNASS). Esse
profissional e a equipe do serviço desconhecem ainda a importância do
aspecto e, muitas vezes, o que leva os profissionais a buscarem um conhe
uso da classificação no serviço.
cimento mais aprofundado sobre a classificação,já que, na maioria dos ca
sos, não recebem este conhecimento durante a formação na graduação. Como atuo em um serviço que está vinculado a uma Instituição
de Ensino Superior, consigo vivenciar os dois lados - no ensino e no
Dessa maneira, o profissional inserido na assistência possui duas op
serviço. Enxergo que, em ambos, muitos profissionais que compõem a
ções: buscar cursos sobre a CIF para se capacitar, por conta própria, ou equipe de trabalho não conhecem e, muitas vezes, até criticam o uso da
aguardar que as secretarias de Saúde (municipais e/ou estaduais), o Minis
classificação na prática da profissão por ignorância.
tério da Saúde ou os órgãos de classe os ofereçam gratuitamenre.
Outro aspecto é que há profissionais que até querem usar, querem
A meu ver, já que tem de capacitar os profissionais, o mais correto
aprender e até entendem a importância da CIF, mas não conseguem
seria que os cursos fossem oferecidos pelo setor público, gratuitamente,
utilizá-la por total insegurança. Porém, a estes digo: "Para se colocar a
porque, afinal, se eles querem que a classificação seja implantada, nada
CIF em prática, épreciso praticar!". Pode ser que, em alguns momentos
mais justo que eles ofereçam condições para que os profissionais estejam
isso seja difícil em alguns serviços, devido à demanda, à estrutura física
preparados para atuarem.
e ao número de profissionais reduzidos, mas é preciso insistir!
Em 2016, o Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupa-
E importante mencionar que esse entrave poderia ser evitado se as
cional proporcionou a mais de nove mil profissionais o Curso On-line
instituições de Ensino Superior adotassem de fato o ensino da classifi
da CIF. Resta agora esperar que esses mesmos profissionais capacitados
cação internacional em suas matrizes curriculares. Com essa ação, no
passem a usar a classificação na prática dos serviços oferecidos.
próprio momento de formação, de construção de um profissional, ele
Há, ainda, nesses desafios para a implantação da CIF, a dificul teria este conhecimento adquirido na base, o que traria maior segurança
dade de estimular alguns profissionais para o processo de capacitação, na hora que fosse se deparar com a prática profissional.

66 67
Destaco ainda que o ideal era que isso náo se aplicasse apenas ao Por isso, é tão importante o papel do gestor do serviço. Se ele não
Curso de Fisioterapia (minha formação acadêmica) mas também a tiver o entendimento claro e objetivo da importância do seu uso, ela não
todas as profissões da área de saúde. E preciso que seja desmistificada tem como ser implantada efetivamente.
a visão de que só precisam da Classificação Internacional de Fun
cionalidade, Incapacidade e Saúde os profissionais que atuam com
a reabilitação (Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional). Um exemplo da prática com a CIF
Todos os profissionais da saúde precisam conhecer e usar urgente Até pouco tempo, eu era aquela profissional que estudava, dedica-
mente a classificação, afinal o paciente deve ser visto como um todo va-me ao atendimento dos meus pacientes da melhor maneira possível,
e não de forma compartimentada. reconhecia a importância da CIF, mas estava na estatística dos profissio
Atualmente, a questão do ensino da CIF ainda acontece de forma nais que não a utilizavam.
pontual, superficial e, muitas vezes, o professor que ministra o conteú No entanto, havia uma inquietação, um incômodo, e eu sentia que
do não tem experiência prática na CIF. Isso dificulta muito o processo estava faltando algo. Como eu também atuava no ensino, comecei a me
de implantação. Aliás, se a CIF não é ensinada na graduação (que é o perguntar como eu podia exigir que meu aluno saísse capacitado para o
formador de profissionais), como poderemos exigir que a mesma seja mercado de trabalho,falando que a CIF é importante e necessária, se eu
utilizada na prática profissional? como docente não dava condições para que ele aprendesse e a usasse nas
Acontece muito também do profissional se capacitar, mas, no en suas atividades práticas profissionais?
tanto, o serviço no qual ele atua não fornece condições para que a CIF Quando me capacitei o suficiente, dei início à implantação da CIF
seja colocada em prática. Portanto, a sua implantação não ocorre e vol no serviço. E mais uma lição tirei: não adianta fazer o melhor curso se
ta-se ao ponto inicial de discussão. não estivermos decididos a colocar em prática o que foi aprendido.
Esse aspecto parece ser bem comum. No contexto da reabilitação, Desta forma,apesar das dificuldades e dos obstáculos e de ouvir muitas
por exemplo, em alguns serviços em especial, a demanda é grande, a vezes dizerem que há anos se feia na CIF, mas nunca se conseguiu colocá-la
cobrança maior ainda e, muitas vezes, as condições de trabalho não são em prática, continuo firme no meu propósito e deixo aqui o reforço para
as melhores. Então, mais uma vez, volta a pergunta: Como usar a CIF que quem embarcou nessa viagem não desista na primeira dificuldade.
no serviço diante desse contexto?
Mesmo que o caminho não tenha sido tranqüilo, penso que não
Poderia listar vários motivos para se usar a CIF no serviço, mas posso deixar essa semente que foi plantada morrer! Fui e vou atrás desse
irei destacar apenas um: com a CIF, os profissionais poderão ter uma desafiador desejo. Estudei e me apropriei do assunto, e os frutos come
linguagem padronizada, a qual poderá comparar caso a caso com base çaram a aparecer.
nas pessoas e não apenas nas doenças. Isso para mim faz uma grande
diferença. Então, acredito que o que falta é esse real entendimento do No período inicial, muitas dúvidas surgiram, mas sempre tive a
seu uso e da sua importância para os serviços e para a implementação sorte de ter profissionais que foram fundamentais para que essa minha
de políticas públicas mais eficazes e efetivas. Além disso, é preciso semente germinasse. Aprendi que temos de nos juntar com pessoas que
manter a equipe motivada para atuar com a CIF ou com qualquer nos somam e que nos incentivem a ser melhores. Com isso, posso dizer
instrumento que fortaleça o trabalho desenvolvido. que muitas vezes uma palavra de incentivo pode fazer toda a diferença.
Torne-se uma "IFC:EducatorW

68
69
Depois do pontapé inicial, todos os meus passos passaram a ser vol ficou muito mais claro de observar a interferência dos fatores ambientais
tados para a CIF (trabalhos, conversas, grupo de estudos). Milhões de para a evolução da síndrome na criança.
idéias surgiram, mas sempre via que era preciso manter em mim a clare
Essa experiência pode ser conferida no artigo intitulado "O uso da
za de que a implantação não ocorreria de uma hora para outra. Sempre CIF como proposta para"o acompanhamento das crianças com Síndro
via que era preciso tempo, planejamento, organização e dedicação. me Congênita do Zika Vírus: Relato de um caso", publicado no ano de
Em todo esse período, por vezes solitário, mas persistente, tentei 2016 na Revista CIF Brasil, no qual, a partir dele, foi possível verificar
por várias vezes envolver outros profissionais próximos a mim no pro uma forte interferência dos fatores ambientais na evolução do estado de
cesso, mas infelizmente isso não aconteceu. Acreditava e acredito que saúde da criança.
esse conhecimento não pode parar e ficar só para mim! Esse relato pode ter sido considerado como um ponto de partida
Comecei de forma simples, principalmente,,porque eu estava em para verificar a interação entre a lista resumida de categorias da CIF
um centro de referência para o atendimento das crianças acometidas como um recurso para classificar essas crianças.
com a Síndrome Congênita do Zika Vírus (SCZV). Foi a partir dessa Ganhei,com isso, mais um aprendizado e deixo aqui mais uma lição
situação nova da SCZV que vi a oportunidade para a prática do uso da neste texto: registre sempre o que você faz! Compartilhe as experiências
CIF no serviço. Mas, por que escolhi fazer isso com essas crianças?
com o uso da CIF, só assim é que podemos nos ajudar como profissio
Na verdade, escolhemos a Classificação Internacional de Fimciona- nais da área, disseminando informação e conhecimento tão importan
lidade. Incapacidade e Saúde porque nos deparamos com uma enorme tes para o fortalecimento da classificação na nossa prática profissional.
dificuldade de encontrar instrumentos que classificassem a gravidade das Posso dizer que isso ocorreu um pouco comigo! Após a publicação desse
mesmas. Então, durante as avaliações das crianças, deixamos os instru artigo, pude constatar que vários profissionais perceberam que esse seria
mentos padronizados já bem reconhecidos de avaliação do desenvolvi um caminho a ser seguido.
mento e passamos a recorrer aos exames clínicos neurológicos básicos Chegar a esta conclusão não foi simples nem foi fácil! A primeira
(exames de reflexos, avaliação de tònus, amplitude de movimento entre vez que a usamos na prática, a CIF parecia muito confusa. Mas, à me
outros), visto que os instrumentos de avaliação que tínhamos disponíveis dida que fomos entendendo e nos apropriando dela na prática profis
não estavam sendo suficientes para poder chegar a uma conclusão sobre
sional, ela passou a ser como qualquer outro procedimento utilizado
aspectos, tais como: O quão graves essas crianças com SCZV são? O que
no nosso dia a dia. O processo de implantação precisa ser iniciado,
ajuda no tratamento? O que está atrapalhando no seu tratamento?.
mesmo que não se tenham as melhores condições e que se possuam
Diante desses questionamentos, só a CIF pode me dar essa respos inúmeras dificuldades.
ta. Eu já tinha feito uso de todos os métodos avaliativos, agora eu pre Foi a partir desta experiência bem-sucedida com o Zika que pas
cisava classificar o resultado que tinha encontrado e que nenhum outro
samos a inserir a CIF no setor que eu atuava. Inicialmente em poucos
instrumento estava conseguindo fazer de forma clara. Foi só com a CIF
pacientes... devagar... mas nunca parando!Tocando sempre em frente!
que isso foi possível!!
Não posso deixar de falar em um aspecto de extrema importância
Por meio da utilização da CIF, pudemos comparar a mudança de para que conseguíssemos esse avanço no uso da CIF no meu trabalho —
estado de funcionalidade/incapacidade da criança ao longo do tempo o envolvimento dos alunos em todo o processo.
e, consequentemente, verificar a evolução do paciente. Com o seu uso,

70 71
U i^ue MCviM I c(.c rrvMixv.M{

A partir desse momento, comecei, como docente, a trazer mais a partir dessas informações, terem a real dimensão da situação de fun
temática para as discussões, para a teoria(agora com propriedade) e para cionalidade e incapacidade das pessoas. Isso permitirá a tomada de
a tão sonhada prática. Estando em uma instituição de Ensino Superior, medidas adequadas para atender à população de acordo com a sua
a melhor "arma"'çvaz. combater a desinformação foi despertando o inte real necessidade. Com certeza, será um grande avanço e, a meu ver,
resse pela informação. E isso foi feito! Uma semente foi plantada e hoje não está longe de acontecer!
está gerando muitos frutos. Outro aspecto importante de mencionar refere-se às possibilidades
Agora, consigo reunir um grupo de alunos que se interessam por de capacitação de profissionais. Por pertencer ao Core Team da CIF, pro
conhecer mais sobre a CIF; alunos que entenderam que, sem esse co pus duas possibilidades de cursos presenciais para as equipes dos servi
nhecimento eles não terão um diferencial; despertei em profissionais a ços em Alagoas. As duas propostas estão em análise por seus gestores, e,
minha inquietude, e, que agora estão buscando dentro de sua realidade caso as mesmas ocorram, um grande passo no processo de implantação
obter conhecimentos sobre a CIE Um grande passo foi dado! da CIF no Estado será dado.

Com a atividade prática, a partir desta experiência, acredito que Neste ano de 2017, ingressei no Mestrado Profissional em Ensino
o entendimento sobre o uso da CIF no serviço passou a ser mais fácil. da Saúde pela Faculdade de Medicina(Famed) da Universidade Federal
Antes, percebia que os alunos só viam um monte de categorias e não de Alagoas (UFAL), cuja minha dissertação de mestrado irá envolver a
entendiam a aplicabilidade disso. Agora, eles enxergam a necessidade de temática do ensino da Classificação Internacional de Funcionalidade,
aprenderem e praticarem, inclusive, como diferencial competitivo. Incapacidade e Saúde (CIF) nos cursos de graduação em Fisioterapia.
Atualmente,faço parte de um grupo de profissionais que compõem Inicio mais um desafio sobre o tema e acredito que, apenas com
o chamado Core Team da CIF. Esse grupo tem como grande missão dis essa vontade de mudança de cenário e com persistência, conseguiremos
seminar o conhecimento sobre a classificação, fazendo com que o tema mudar a realidade da implantação da CIF nos serviços.
seja incluído nas matrizes curriculares da graduação e pós-graduação, Finalizo meu relato, destacando que a Classificação Interna
por meio da inclusão de conteúdo dos cursos já oferecidos. cional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) precisa estar
Precisamos avançar mais, ainda, no desenvolvimento de sistemas de in mais presente nas universidades públicas ou privadas para que saia
formação para as instituições e os municípios fazendo uso da CIF. O uso de mos da contramão que estamos hoje, que é a enorme necessidade de
sistemas informação com a CIF ainda não é minha reahdade, por exemplo. capacitação de profissionais, para a utilização da CIF. Acredito que,
Posso dizer que o máximo a que cheguei foi no uso do Prontuário Eletrôni se investirmos no ensino da CIF na graduação, os relatos de experi
co da CIF CifDistai"), mas que também está em fase de aprendizado. ência de implantação trarão boas histórias para se contar e grandes
resultados serão colhidos.
A compreensão da importância de desenvolver um sistema de in
formação para a CIF vem da minha experiência na área técnica da Han- Assim, prefiro acreditar que, por meio de um sonho, é que as coisas
seníase. Na época, utilizávamos um aplicativo chamado "Hanswin", e poderão se tornar realidade. Será que seria sonhar ver a CIF implantada
por que não vislumbrar a existência de um futuro "CIFWin"? em todos os serviços? Não sei, mas acredito que, para que esse sonho
Acredito que, com a existência de um sistema de informação passe a se tornar realidade, precisaremos que cada um comece a fazer o
capaz de codificar as categorias da CIF, os profissionais poderão, a seu. Eu já comecei, e você?

72 73
CAP. :iii;

FUNCIONALIDADE,DESENVOLVIMENTO HUMANO,
USO ESTATÍSTICO E PEQUENO HISTÓRICO DE
ENVOLVIMENTO

Eduardo Santana Cordeiro


Fisioterapeuta,
Doutor em Saúde Pública.

A dicotomia geopolítica atual resulta na existência de dois grupos


populacionais distintos convivendo no mundo dentro de uma supos
ta relação de cooperação. No entanto, as diferenças são claramente
observadas e expressas pelos divergentes graus de funcionalidade, em
amplo espectro, quando comparadas as populações da região Norte
com as da região Sul do planeta. A funcionalidade em amplo espectro
inclui o desempenho e a Capacidade para aprendizagem, planejamen
to pessoal, comunicação, mobilidade, autocuidados, vida doméstica,
interações sociais, trabalho, emprego, educação e lazer, além da rela
ção de tais aspectos com os fatores ambientais. Este artigo introduz a
Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde
(CIF) como uma ferramenta que pode auxiliar os países do Sul a se
desenvolverem nos padrões dos países do Norte, por meio da avalia
ção, monitoramento, controle e mudanças relativas às barreiras e aos
facilitadores ambientais.

Nas diversas faces da vida humana, a relação entre indivíduo e am


biente deve ser cada vez mais estudada, já que o fato de haver muitas
pessoas expostas a riscos, mesmo que baixos, pode resultar em muitos
casos de adoecimento, morte ou perda da funcionalidade. O inverso
também pode acontecer quando riscos ambientais são altos, mas poucas
pessoas estão expostas a ele.
A relação do indivíduo com o seu ambiente também pode ser vista
em seu aspecto positivo. A aprendizagem, a aplicação do conhecimento.

75
a comunicação, a mobilidade, os costumes para o cuidado pessoal, o Mapa 1 - Países centrais e países periféricos
panorama da vida doméstica, as interações interpessoais, o desenvolvi
mento no trabalho e na educação e, até mesmo, o lazer são aspectos da Países centrais e periféricos
vida humana que podem ser influenciados pelos fatores ambientais, tais
como: o ambiente tecnológico, o ambiente físico, o ambiente natural, o / / -
ambiente social e o ambiente político. /
n -ir -4-
As relações entre a sociedade e seu contexto influenciaram o de
senvolvimento de todos os povos. É sabido que os países da região Norte
do planeta, identificados no Mapa 1 como países centrais, se desenvol
veram ao longo da História por diversas razões, entre elas, as influências vc»,ia

PIB (?oorj
ambientais. O clima temperado e a escassez de recursos naturais fez Pafses
(billiõas dé dólares)

com que os habitantes dessa região desenvolvessem maior capacidade de Estados Unidos
Japão
13811
4376
planejamento, monitoramento e controle, além de ações, tais como: a Alemanha 3297
China 3280
busca por diminuir as barreiras e criar facilitadores no ambiente. Isso se França 2562

deu de varias maneiras, incluindo os aspectos relacionados à promoção Brasil


Rússí^
1314
1291
da funcionalidade humana, como, por exemplo, a proteção do desem Austrália
África CO Sul
821
277
penho humano e do estímulo à participação social. Por outro lado, o
clima tropical e a abundância de recursos naturais fizeram com que, SVoífd Fank.Obtido em;<vAvw.vvoddbonkx}rg>.Elaborado pelos autores.

historicamente, o ambiente não fosse uma preocupação na maior parte


dos países periféricos, ou seja, os da região Sul do planeta. A escassez O cenário de divisão atual
de recursos cruciais a humanidade e a ascensão de novos países indus
trializados possibilitam analises segundo um modelo geopolítico, cujo Atualmente, os blocos econômicos e o desenvolvimento do co
principal contraste a ser estudado é o existente entre o Norte e o Sul. mércio entre as nações expressam uma subordinação dos países peri
féricos aos países centrais. A estratégia de cooperação entre os países
centrais acaba por se tornar uma estratégia de competição contra os
países periféricos, que, por sua vez, tornam-se dependentes economi
camente. Isso causa impactos negativos em diversos setores dos países
periféricos,já que a falta de recursos financeiros termina por aumentar
a desigualdade social e diminuir o acesso equilibrado aos serviços es
senciais, como Saúde e Educação com profissionais bem preparados, o
que, sem dúvida, influencia no desempenho humano das gerações fu
turas. Como resultado, o desenvolvimento intelectual, físico e social,
seja no sentido funcional ou de desempenho e capacidade, acaba por
ser também prejudicado quando comparado ao nível dos países cen
trais. A tendência é que tenhamos um futuro marcado por um mundo
76
77
cada vez mais dividido e dominado pelos países centrais, os quais náo Figura 2 — Barreiras de mobilidade no Brasil
terão interesse em estratégias de cooperação com os países periféricos,
a menos que esses se preparem para tal desafio.
Um dos primeiros passos que podem ser dados para tal preparação
é a estruturação de um estudo a cerca do estado de funcionalidade das
populações de todos os países, incluindo os da região central e os da
região periférica, de acordo com a presença ou ausência de barreiras e
de facilitadores ambientais. Esse diagnóstico pode ajudar o desenho de
ações que potencializem e protejam a funcionalidade humana.
Há uma ferramenta que foi publicada pela Organização Mundial
da Saúde (OMS) em 2001 e pode auxiliar na geração de dados sobre
a funcionalidade humana em larga escala. Trata-se da Classificação In
ternacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIE). Essa fer
ramenta apresenta a situação das pessoas diante do ambiente em que
vivem, por meio de um sistema de códigos. A finalidade principal é Âs figuras 1 e 2 apresentam distintas situações relativas às políticas
fazer um diagnóstico situacional de funcionalidade, indicando quais al de mobilidade e acessibilidade comparando a Finlândia com o Brasil.
terações ambientais podem facilitar o desempenho humano e, como A falta de conhecimento faz com que o país latino-americano encare
conseqüência, o desenvolvimento da sociedade. a presença da deficiência como uma doença, a pessoa com a deficiên
cia como um doente e a necessidade de tecnologias de acessibilidade
Figura 1 - Facilitadores de mobilidade na Finlândia
como algo especial e não habitual. Tal interpretação incorreta dada aos
termos relativos à funcionalidade humana resulta em políticas retró
gradas, que prejudicam o desempenho humano e apenas aurnentam
as desigualdades sociais.
O mesmo ocorre nas políticas que regem os benefícios previden-
ciários. Mesmo em 2016, 15 anos após a publicação da CIE, o siste
ma permanece permeado por conceitos que isolam a Classificação Es
tatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde
(CID)como a mais importante ferramenta para determinar quem deve
ou não receber benefícios previdenciários. Isso faz com que os recursos
financeiros públicos sejam disponibilizados mais facilmente para pesso
as com determinados diagnósticos, como amputação de membros ou
outras partes do corpo, e menos facilmente para pessoas com doenças
raras, exigindo meios judiciais complementares.

78 79
Considerações finais ICF WIN-S-ICF Tab Win-based System
Dentro desse contexto, a CIF é uma ferramenta capaz de codificar It is known that information about death, about diseases and about
essas diferenças por meio da classificação da situação das pessoas em re health interventions are not enough to a complete diagnosis ofthepopu-
lação ao estado das funções e estruturas do corpo, da capacidade e do lation health status. People are submitted to a large number ofenviron-
desempenho para atividades e participação social, dos fecilitadores e das mentfactors, including, technologies, ecological, social andpolitics barriers
barreiras ambientais. Ela pode ser usada por profissionais de saúde, por orfacilitators. Body structures and bodyfunctions determinate the human
profissionais da área social, bem como pelo próprio público em geral para capacity to learn, to communicate, to move out, to take care about the own
um autorrelato. Já existem meios de aplicação da ferramenta em larga es body, to take care about home, to interact with other people, to study, to
cala, porém há a necessidade de maior conhecimento pelos profissionais. tvork and to havefim. But, only the relationship between body and envi-
O uso da CIF em larga escala, a consolidação e o tratamento esta ronmentalfactors can, infiact, determinates the human performance. Jhis
tístico dos dados e a construção de indicadores específicos podem subsi is what tums the disability experiente a truthfiact in people lifie. Everybody
diar políticas públicas intersetoriais para o desenvolviniento ambiental will have any disability experiente while live. Then, the humanfiunctioning
em todos os quesitos, incluindo o tecnológico, o arquitetônico, o de re evaluation, monitoring and control are an essential point to the real com
lacionamentos humanos, o atitudinal, o de sistemas e o de serviços. Tais plete health information system.
políticas serão muito relevantes aos países da região Sul, podendo torná- 'lhe Intemational Classifiication ofFunctioning, Disability and Heal
los mais parecidos com os da região Norte. Essa aproximação poderá th (ICF) is the tool to describe de human fiunctioning including the rela
alterar o rumo das relações entre esses países, que hoje são marcadas pela tionship between body and environment. It is necessary to create a way to
competição, quando podem ser marcadas pela cooperação. use ICF easily, collect data aboutfiunctional health status ofthe population
Dessa forma, queremos desenvolver um aplicativo eletrônico de and show them throw health indicators. Jhis paper will show, step by step,
utilização da CIF em duas versões: uma para uso profissional e outra how to make it true.
para uso do público geral. Esse aplicativo deve ser, em segunda ordem, To get ICF into a health information system,first, we have to present
capaz de consolidar os dados de determinada população, permitindo a ICF to health professionals. lhe ICF must be applied in primary carejust
tabulação e analise dos dados segundo indicadores predeterminados, because we must have information about ali the population. Everybody is
servindo como fonte de diagnóstico para elaboração, monitoramento e at risk to develop some king ofdisability. In the other hand, it is very impor-
controle de políticas públicas. tant to know the leveis ofpopulationfiunctioning not only thefirequency of
disabilities in the population.
O texto, a seguir, foi escrito para ser submetido a uma revista
internacional. Ele descreve, com mais detalhes, o conteúdo do artigo We have many possibilities using ICF, but to collect data have to be
intitulado "CIF-WIN-S", publicado na Revista CIF Brasil em 2016. an easyform. Then, the example ofthe annex 9firom ICF is a good way to
Este livro se configurou como uma melhor opção para tal publica make it easier. Health professionals must create aform with the main cate-
ção, que tem ligação com o livro "UsingICF: a toolfor obtaining data. goriesforprimary care. It cannot be a core set based on diseases, butjust like
onfunctionality". the ICF sugestions. Core sets based on diseases are not according the biop-
sychosocial and spiritual model because they make people understand that
fiunctioningproblems are always consequences ofdiseases, what is not true.

80
81
lhefirststep is to turn theICFknown by the healthprofessionals ofpri- Um pequeno histórico pessoal de envolvimento
mary care. It can be dane using online courses,for exampíe. Afier training,
A CIF veio ao meu encontro em janeiro de 2004 por intermé
they have to create the easyform. lheform should contain variables such as
dio de uma terapeuta ocupacional chamada Júnia Cordeiro, que era
neighborhood, gender, age, ICF categories, ICF qualifiers and others that
coordenadora da sua área no hospital onde eu trabalhava na época, o
are necessary, according to models aíready described in previous studies.
Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE). Foi um e-mail informando
For the tabuíation, there is an option called TabWin, an old app used sobre a versão brasileira da CIF, que acabava de ser lançada. Por coinci
for health statistics, available at http://datasus.saude.gov.br/download-do- dência, havia uma revista com a mesma notícia na mesa de passagem de
tabwin. This qpplication is based on data basefiles (".dbf"). To get the .dbfi plantão, onde toda a equipe se reunia pela manhã. Era impossível uma
ali ofthe classified cases must be into an excelplan. It has to be one person apresentação daquelas não chamar a atenção. A compra imediata do
registered per line and one variable per column. Jhen, eachform written livro foi inevitável.
by the health professionals must be on the data bank, using an excelplan.
A tentativa de implantação no setor de internação traumato-or-
When the bank is ready, the excelfile (".xlsx") must be converted to a ".dbf"
topédica ocorreu logo nos meses seguintes, por minha "conta e risco".
to be read by the TabWin.
Somando-se a isso, o convite para a Profa. Dra. Cássia Maria Buchalla
If the TabWin is installed in a machine, it uses the ".dbf" bank as vir à instituição e iniciar um processo de implantação mtdtiprofissional
a search source to create definition files and other bankfiles. So, the users foi úma idéia da coordenadora, Fátima Gobbi, ainda naquele ano. Am
can get information about how often is an ICF code per neighborhood, per bas as tentativas foram frustradas.
gender, per age orper other variables chosen. It is enough to provide health
Ao mesmo tempo, a percepção de que a CIF deveria ser um tema
indicator about humanfunctioning.
central para o iminente mestrado era clara. Nenhum avanço na tentati
The configured TabWin to ICF data is now called ICFWIN-S:ICF va na Medicina Preventiva da USE Nenhum avanço na Reumatologia
TabWin-based System. The toolcan be used by health systems and managers da USP... Até que, por intermédio do Prof. Dr. Moisés Goldbaum, em
to provide information that can be used in publicpolicies. uma conversa informal de "desabafo pelas quedas", veio o encaminha
The TabWin is afree application and the epidemiological use ofICF mento para a Faculdade de Saúde Pública (FSP/USP) e o primeiro en
is needed. Ifwe did not come to a statistic approach ofhumanfunctioning, contro com Cássia Buchalla em 27 de janeiro de 2005, dando início a
we are going to lose the main goal ofiCF existence. So, the researchers must uma relação de professora e aluno que duraria pouco mais de sete anos
start the route that will make possible the human functioning protection a partir dali, incluindo o período de mestrado e doutorado, ambos os
and the humanfunctioningpromotion. programas com a CIF sendo tema central.
Foi em 2005 que as coisas começaram a dar certo. Em abril, um
congresso no Brasil me permitiu conhecer Alarcos Cieza, uma pesquisa
dora internacional sobre o assunto. Em julho, Heloisa Dinubila foi mi
nha professora no primeiro Curso da FSP/USP sobre a CIF. Em agosto,
o comitê de ética do HIAE aprovava meu projeto de implantação da
CIF, e a primeira reunião com os fisioterapeutas do hospital foi realiza
da. Fátima Gobbi comentou que gostaria que eu liderasse a implantação

82
83
da CIF no hospital. Em setembro, o projeto inicial se dividiu em dois: functionality, alguns artigos, a revista científica CIF Brasil, os aplicativos
um para a aplicação no ambulatório e outro para a aplicação no setor ICFEducator ç, CIF Digital, ultrapassando 30 mil ouvintes em seis dife
de internação. Tudo isso aconteceu no período do ingresso no mestrado rentes países após mais sete anos.
e, embora o Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional
A experiência mais completa foi no Município de Barueri/SP que,
da 3^ Região (CREFFITO 3) não tivesse me recebido, a Universidade
além da implantação no Centro de Saúde Funcional, teve a CIF incor
Paulista (UNIP) de Santos, coordenada por Erik Oliveira Martins, já
porada ao Núcleo de Informações em Saúde (NIS) com componentes
tinha alunos pesquisando sobre a CIF em seus Trabalhos de Conclusão
para tabulação e geração de indicadores para o planejamento.
de Curso. Foram os meus primeiros alunos formais com os quais com
partilhei tudò o que sabia até aquele momento sobre a classificação. A CIF permanece com seu processo de expansão cada vez mais
forte e consistente, caminhando para um futuro no qual todas as
O uso no Einstein aumentava e, mesmo sendo um projeto-piloto,
informações de saúde terão alguma ligação com ela, seja uma de
era muito produtivo. Apareceu a oportunidade de escrever um capítulo
pendência direta, alguma relação causai ou de associação, o que vai
em um livro que seria lançado pela instituição. Meu tema foi CIF, mas
representar um avanço jamais visto nas políticas, nos sistemas e nos
não tive noticias sobre a eventual publicação desse livro. Por outro lado,
serviços de saúde.
uma palestra para toda equipe de fisioterapeutas e terapeutas ocupacio-
nais do hospital foi feita ainda naquele ano. Foi a minha primeira vez.
Graças a insistência, ao final de 2005, consegui publicar uma matéria
jornalística sobre a CIF na revista do CREFFITO-3.Tive ainda respostas
positivas dos CREFFITOs 5,7 e 11, porém, ainda sem progressos.
Em agosto de 2006, os trabalhos desenvolvidos no Einstein foram
apresentados no Congresso Mundial de Saúde Pública no Rio de Janei
ro/RJ, o que reforçou o processo de implantação, chegando bem per
to de deixar de ser um "piloto" para se tornar uma realidade. Não sei
explicar ao certo o que impediu o avanço, mas cumpri todas as fases e
aguardei por muito tempo, sem resposta. Fui demitido em 2008, sem
implantar a CIF naquela instituição. Esse período também marcou a
defesa do Mestrado e, em seguida, o humilde começo dos cursos inde
pendentes da CIF. Minha primeira turma não teve inscritos o suficiente
e, ainda em 2008, acabei dando o meu primeiro curso na Universidade
Santa Cecília de Santos aos meus próprios professores da faculdade. Daí
por diante, foram muitos cursos presenciais, o apoio ao desenvolvimen
to da Política Nacional de Saúde Funcional (junto com Ana Cristhina
de Oliveira Brasil), a plataforma on-line, o Manual de utilização da CIF
em Saúde Funcional, o livro JJsing ICF: a. toolfor obtaining data on

84
85
A CORRELAÇÃO ENTRE A AFERIÇÃO E A
CLASSIFICAÇÃO: O DIÁLOGO ENTRE A CIE E OS
INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA
Elise Ribas Libôa
Psicóloga.
Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano.

No âmbito da Sociologia e Filosofia, sáo intensamente discutidas


questões relativas ao desenvolvimento da civilização. Indagações acerca
de quem somos, para onde vamos e qual o sentido da vida guiaram es
tudiosos na formulação da idéia, como defendida por James Lovelock
na "Hipótese de Gaia" (1979), de que todos os organismos vivos fazem
parte de um sistema macrobios, no qual unidades funcionais individuais
estão diretamente conectadas, a despeito de variantes de espaço e tem
po. O planeta é tido, a partir deste entendimento, como uma imensa
associação biológica favorável a todas as partes que o compõem, con
servando uma atmosfera propícia por meio de mecanismos de retroa-
ção. Qualquer interferência em um componente do todo influenciará
inevitavelmente a harmonia do conjunto. Nesta concepção, explicita-se
a interdependência dos microrganismos no macrossistemct. O sistema —
civilização/sociedade - deve ser uniformemente justo e acolhedor para
todos seus componentes, a fim de se autogerir e adaptar particularida
des de funcionamento, e assim viabilizar a participação ativa de todos
os microssistemas no macrossistema, potencializando desta maneira seu
desempenho e performance.
Diante desta concepção, o desenvolvimento de uma sociedade/
civilização harmônica implica o cuidado com seus frágeis. O conceito
de sociedade vem do Latim, da palavra societa, que representa a asso
ciação amistosa de seres. Com isso, entende-se sociedade como um
conjunto de seres que convivem de maneira organizada. Dentro disso,
pressupõe-se a diversidade dentre os seres, requerendo, conquanto,

87
iguais variabilidades de organização para assegurar a porção amistosa A eleição dos instrumentos a serem utilizados na avaliação psico
da convivência em sociedade.
lógica varia de acordo com a necessidade da averiguação. Aspectos que
A construção da sociedade perpassa pela busca de compreensão da podem ser elucidados por meio dos instrumentos se referem à persona
relação entre o ser humano e sua historia — passado, presente e futu lidade, funcionamento cognitivo, intelectual e emocional, entre outros.
ro. Nessa saga, as contribuições da Psicologia tornam-se essenciais para O processo de avaliação evidencia aspectos psicológicos de naturezas
uma resoluta percepção sobre o ser humano, suas características e suas diversas, e seus resultados destinam-se à criação de hipóteses de funcio
relações intrapessoais, interpessoais e com o ambiente. namento psíquico.
Segundo consta no documento encaminhado pelo Conselho Fede Ainda segundo o Conselho Federal de Psicologia,
ral de Psicologia ao Ministério do Trabalho, as atribuições do psicólogo
os resultados das avaliações devem considerar e analisar os condicio-
abarcam, se não todas, as áreas mais essenciais à vida humana.
nantes históricos e sociais e seus efeitos no psiquismo, com a finali
O Psicólogo, dentro de suas especificidades profissionais, atua no âm dade de servirem como instrumentos para atuar não somente sobre
bito da educação,saúde, lazer, trabalho, segurança,justiça, comunida o indivíduo, mas na modificação desses condicionantes que operam
des e comunicação com o objetivo de promover, em seu trabalho, o desde a formulação da demaiida até a conclusão do processo de ava
respeito à dignidade e integridade do ser humano.(CFP, 1992) liação psicológica.(CFP, 2007)

A fim de desenvolver seu trabalho, de acordo com princípios técnicos Destaca-se assim a importância da contexmalização das características
e éticos, o psicólogo pode se utilizar de instrumentos de avaliação psicoló individuais aferidas nas avaliações psicológicas, em processos históricos e
gica, visando melhor compreender o indivíduo e, por conseguinte, adotar sociais, os quais são influenciados e influenciam mutuamente o desenvolvi
estratégias de intervenção adequadas às caraaerísticas individuais de rada mento do indivíduo. Desta forma, faz-se necessário estabelecer tuna cone
quadro clínico. De acordo com Weschsler {apudVADlUriK, NORONHA xão entre informações coletadas em instrumentos de avaliação e a classifica
e FAGt^N, 2007), a avaliação psicológica "tem porfinalidade obter maior ção destas na participação e atividade do indivíduo na sociedade.
conhecimento do indivíduo, do grupo ou situações, afim de atingir os objetivos Informações resultantes do processo de avaliação psicológica
definidos e, assim, auxiliar em processos de tomada de decisões". indicam o perfil ou desempenho do indivíduo, a ser posteriormente
Segundo o manual de avaliação psicológica do Conselho Federal de comparado com a "norma". Esta, por sua vez, é a compilação de análises
Psicologia, a avaliação psicológica oferece subsídios à atuação do psicó estatísticas de resultados de um grupo normativo. Com isso, pode-se
logo em diferentes áreas. levantar a reflexão se todos os indivíduos, com suas diferentes caracterís
ticas, estariam representados dentro deste grupo normativo; a qualquer
A avaliação psicológica é um processo técnico e científico realizado modo, obtém-se do processo de avaliação uma análise comparativa en
com pessoas ou grupos de pessoas que, de acordo com cada área do
tre indivíduos, evidenciando aspectos mais ou menos freqüentes dentro
conhecimento, requer metodologias específicas. Ela é dinâmica, e se
daquela população.
constitui em fonte de informações de caráter explicativo sobre os fenô
menos psicológicos, com a finalidade de subsidiar os trabalhos nos di A interpretação dos resultados das avaliações pode, contudo, ser
ferentes campos de atuação do psicólogo, dentre eles, saúde, educação, ampliada do âmbito clínico para um modelo biopsicossocial, no qual
trabalho e outros setores em que ela se fizer necessária.(CFP,2007) serão considerados fatores individuais e suas correlações com o meio cir-
cundante. A partir deste entendimento, afasta-se do modelo médico, de

89
fô -.
culpabilizaçâo do indivíduo pelas dificuldades e limitações, e adota-se Autismo e suas implicações
uma perspectiva de responsabilização do contexto por suas restrições de
Determinados quadros clínicos podem ser mais ou menos afetados
atividade e participação. Diagnósticos em si não são fetores limitantes,
pelo ambiente. No caso do diagnóstico de Transtorno do Espectro do
mas podem impactar a vida da pessoa, caso não haja a compreensão das
Autismo (TEA), a interação indivíduo versus ambiente é determinante
características individuais e suas correlações intrapessoais, interpessoais
para o desenvolvimento do quadro e seu prognóstico. A pessoa com au
e com o ambiente.
tismo pode experienciar mais leves ou mais intensos comprometimen
Em consideração à necessidade de reconhecimento do papel de tos do quadro a depender das adaptações e estimulações ambientais.
cisivo de fatores ambientais nas atividades humanas, a CIE (Classifica
O TEA foi inicialmente descrito por Eugen Bleuler, em 1911, e,
ção Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde) foi criada
apesar de componentes importantes se manterem presentes na carac
pela Assembléia Mundial de Saúde e, posteriormente, reconhecida pela
terização do autismo até hoje, desde esta primeira descrição, a com
Organização Mundial de Saúde(OMS)com o objetivo de unificar, in
preensão do quadro foi se moldando em consonância com achados
ternacionalmente, informações da área médica e demais áreas da saúde
científicos. Atualmente o autismo é compreendido como condição de
e classificar a influência de fatores ambientais na (d)eficiência e (dis)
múltiplas causas, na qual fatores biológicos e relacionais (contextuais)
funcionalidade dos indivíduos. Este instrumento propôs uma profunda
estão em constante interação e em conjunta influência no desenvolvi
reformulação na compreensão da condição humana, acrescendo à des
mento do indivíduo.
crição de base etiológica das doenças a compreensão dos níveis de (dis)
funcionalidade e (in)capacidade do indivíduo. Apesar da ausência de números precisos, sabe-se que a inci
dência do TEA também teve, desde a sua primeira descrição, um
O diagnóstico puramente médico náo consegue, de maneira isola engrandecimento expressivo, retirando-o do rol de condições raras.
da, prever a necessidade de serviços de apoio, o nível de cuidados Diante deste cenário, a compreensão deste quadro clínico, alinhado
a se dispensar, as conseqüências de natureza funcional do diagnós às adaptações sociais pertinentes e acolhedoras, se reflete em ações
tico, entre outros. Fatores incapacitantes de um diagnóstico náo profícuas e imprescindíveis.
estão limitados exclusivamente às condições de saúde, mas sim às
questões interativas entre as características de um quadro clínico Nas classificações internacionais atuais - DSM-V e CID-10, nas
(diagnóstico) e as características do contexto global na qual a pes quais constam descrições médicas (etiológicas) de doenças e con
soa está inserida, desvelando desta forma aspectos da incapacidade dições de saúde, buscou-se dar maior reconhecimento à dimensão
de foro interno, do indivíduo ou de foro externo, do ambiente. psicogenética do quadro, reagrupando os distúrbios do autismo e
(SNRIPD,2005 apudUS^ÔA,2015) ampliando o espectro, caracterizado dentro dos distúrbios do neuro-
desenvolvimento. A conclusão diagnóstica de autismo baseia-se no
Com o enfoque voltado à funcionalidade dos indivíduos, as condi preenchimento de determinados critérios que resumidamente são:
ções de saúde são colocadas em pé de igualdade, reconhecendo-se aspec ter apresentado desenvolvimento atrasado ou atípico; apresentar
tos de (dis)funcionalidade e (in)capacidade como experiências inerentes perturbações características no funcionamento nas áreas de intera
à vida humana. Desta forma, consideram-se tais aspectos em sua relação ção social, comunicação e comportamento repetitivo e/ou hiperfo-
com o ambiente, passível de implementar condições facilitadoras ou cado. Mais detalhadamente descrito em Jorge (2003), o autismo é
barreiras para a atividade e participação do indivíduo. compreendido como

90 91
... uma síndrome comportamental, de causa orgânica e comprome Entretanto, apesar dos avanços da ciência, a avaliação clínica ainda
timento neuropsicológico, caracterizada basicamente por déficit na representa papel determinante na composição do diagnóstico do au
interação social recíproca, déficits de linguagem e alterações no com tismo, haja vista que exames físicos ainda mostram-se inconclusivos
portamento e na capacidade imaginativa. Considera que o processa isoladamente, devendo ser combinado com informações advindas de
mento da informação-de um indivíduo autista esteja comprometido,
observações e metodologias clínicas, para compor assim uma investi
em maior ou menor grau, nas três instâncias: percepção sensorial
(visual, auditiva, olfativa, gustativa e tátil-cinestésica), elaboração do gação integral do indivíduo. Para tanto, faz-se necessário um processo
pensamento (operações mentais), expressão motora e verbal (praxias mirltidisciplinar e multidimensional, qualificado, cauteloso e responsá
e linguagem) — em uma mescla que determina maior ou menor fun vel para se levantar o histórico do indivíduo, realizar observações com-
cionalidade no seu ambiente social. portamentais e investigações clínicas a fim de se chegar ao diagnóstico
de TEA. Diferentes áreas clínicas podem contribuir com o seu saber
Evidencias cientificas assinalam a existência de indicadores gené em um processo diagnóstico. Geralmente, profissionais envolvidos nes
ticos relacionados ao autismo, e em laboratório, foi possível reverter te processo são: psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e
características neurofuncionais típicas do quadro, prenunciando a pos neuropediatras ou psiquiatras.
sibilidade de modificabilidade de componentes cerebrais e do sistema
Visando promover uma melhor caracterização do quadro, a uti
nervoso central. Acerca disso, Jorge (2012) sumariza informações so lização de instrumentos e protocolos de aferição das particularidades
bre achados e pesquisas científicas na área da genética do TEA.
e comprometimentos do TEA auxilia profissionais a terem compreen
Do ponto de vista genético, apesar de ainda não estar oficializado são fundamentada e definida de cada caso, guiando, assim, a eleição
um marcador biológico para o diagnóstico efetivo de autismo,existe e adoção de intervenções e adaptações terapêuticas individualizadas e
a divulgação de estudos recentes acerca de um comprometimento mais indicadas. Acerca disso, Jorge (2010) ressalta da importância da
do cromossomo 5, mais especificamente no gene CDHIO, que se utilização de instrumentos na avaliação do indivíduo com TEA e lista
mostrou ativo no córtex frontal em desenvolvimento, podendo ser as principais escalas.
responsável pelos problemas na linguagem, no julgamento social
e em raciocínios complexos, comuns aos autistas (FAPESP,2009). ... é preciso salientar o papel das escalas de avaliação de autismo
Porém, assim como este, muitos outros estudos genéticos já vêm como instrumentos complementares aos critérios contidos nos sis
sendo desenvolvidos, inclusive no Brasil, no Centro de Estudos do temas classificatórios ClD-10 ou DSM-IV-TR. Dentre as mais co
Genoma Humano, com investigações de três genes de susceptibi- nhecidas citam-se a ChildhoodAutism RatingScale(CARS),^.Autism
lidade ao autismo(CEGH,2009). Cavalheira, Vergani e Brunono Behavior Checklist(ABC) e a Autistic Diagnostic Interview — Revised
(2004) já haviam comentado sobre a existência de mais 10 genes (ADI-R), tanto para a prática clínica quanto para pesquisas na área
relacionados a esse transtorno, considerando que provavelmente (TREVARTHEN & cols., 1998; MARTOS, 2002; GADIA, TU-
não houve apenas um padrão hereditário, mas uma interação entre CHMAN & ROTTA, 2004). Instrumentos como esses cumprem
múltiplos genes, haja vista a variedade no fenótipo autista, com o papel de oferecer o grau de comprometimento, ou a caracteriza
manifestações mais ou menos acentuadas nos comprometimentos ção mais aprofundada do comportamento do indivíduo autista, nas
característicos do quadro. áreas afetadas por este transtorno, para esclarecimento diagnóstico,
orientação à intervenção ou avaliação do processo interventivo. São,
portanto, de extrema necessidade para uso clínico. Sampedro (2006)

92
93
defende a necessidade do uso das escalas, tanto para os pais compre motricidade, imitação, emoção, contato, comunicação, regulação e cog-
enderem o comportamento que seu filho vem manifestando, quanto nição. Cada item é quantificado em uma escala de 1 a 5 pontos, na qual
para os profissionais conhecerem melhor o indivíduo que irão ajudar um ponto é atribuído no caso do comportamento descrito não ter sido
e, assim determinarem, com precisão as estratégias de intervenção
observado; dois, se o comportamento está presénte, mas é raro ou pouco
paracada caso.
intenso; três, se o comportamento é suficientemente presente e intenso;
Inúmeros instrumentos e protocolos na área da Psicologia podem quatro, se o comportamento é freqüente e intenso; e cinco, se o compor
ser utilizados no processo de avaliação, a depender da demanda e dos tamento é muito presente e intenso.
aspectos a serem investigados. Além dos instrumentos supracitados, ou
tros podem ser igualmente utilizados para verificações de áreas específi Correlação EFC-R e CIF
cas do desenvolvimento e funcionamento do indivíduo com TEA. Em
Lisboa (2015),em caráter de pesquisa,foram utilizados dois instrumen Seguindo a referência de valores standards da população (curva
tos para aferição de competências cognitivas e comportamento adap- normal), tomou-se por base uma relação percentual para estabelecer
tativo de um sujeito com autismo; foram estes: a Escala de Avaliação correlação entre os resultados possíveis da EFC-R e os qualificadores
Funcional dos Comportamentos(EFC-R)e a Escala de Comportamen da CIF.

to Adaptativo Vineland (VABS). A posteriori, estes instrumentos foram


correlacionados com a Classificação Internacional de Funcionalidade,
Equivalência EFC-R e CIF (resultados quantitativos e
Incapacidade e Saúde (CIF), a fim de se compreender os impactos das classificações)
competências cognitivas e níveis de comportamento adaptativo, na ati
vidade e participação do indivíduo, em outras palavras, em sua autono
mia e independência. mm Percentual

!jÍntLTViilo'dosffl «Referência b
População'

Escala de avaliação Funcional dos Comportamentos(EFC-R) Ia 1,2 0-4% Nenhuma deficiência 0

1,3 a 2 5 - 24% Deficiência ligeira 1


Meticulosamente elaborada na França por Catherine Barthelémy 2
2,1 a 2,9 25-49% Deficiência moderada
e seus colaboradores, a EFC-R oferece resultados em perfil gráfico, evi
Deficiência grave
denciando áreas do funcionamento psicológico e funcional mais bem 3 a 4,7 50 -95% 3

desenvolvidas ou as mais fragilmente estruturadas. De uso preferencial 4,8 a 5 96 -100% Deficiência completa 4

do psicólogo, mas sem validação nacional expressiva ou reconhecimento


pelo SATEPSI (Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos), a EFC-R
deve ser usada apenas por profissionais especificamente treinados para o
uso do instrumento e exclusivamente em caráter de pesquisa.
A EFC-R é composta por 55 itens, subdivididos em 11 domínios
de funções cognitivas, a saber: atenção, percepção, associação, intenção,

94 95
Equivalência EFC-R e CIF (Funções e Domínios) 383 itens, subdivididos em quatro domínios, a saber: comunicação,
habilidades de vida cotidiana, socialização e habilidades motoras.
Funções Cognitivas
EFC-R
A coleta de informações para o preenchimento deste instrumento
é feita em entrevistas com pais ou responsáveis e/ou profissionais
Funções do Corpo - Funções mentais específicas - Funções da envolvidos com o caso (professores/terapeutas).
ATENÇÃO
Atenção (bl40)

Funções do Corpo- Funções mentais específicas - Funções da


Os resultados deste protocolo elucidam aspectos relacionados à
PERCEPÇÃO independência pessoal e social dos indivíduos, desde a infância até a
Percepção (bl56)
vida adulta, estimando seus níveis de desenvolvimento e de compor
Funções do Corpo - Funções mentais específicas - Funções
ASSOCIAÇÃO tamento adaptativo.
Cognitivas de nível superior (bl64)

Funções do Corpo - Funções mentais globais - Funções


INTENÇÃO
Psicossociais globais (bl22)
Correlação VABS e CIF
Funções do Corpo - Funções mentais específicas - Funções
MOTRICIDADE
Psicomotoras (bl47) Conforme descrito anteriormente, a VABS oferece resultados
Atividades e Participação - Aprendizagem básica - Imitar quantitativos de níveis de comportamento adaptativo por meio de uma
IMITAÇÃO
(dl30) correlação entre valores dos escores padrões (standard score) e escores
Funções do Corpo - Funções mentais específicas - Funções brutos (raw scorè). Tabelas da população americana são utilizadas para a
EMOÇÃO
Emocionais (bl52) obtenção dos resultados, haja vista que não foram realizados estudos de
Atividades e Participação - Interações e relacionamentos
validação deste instrumento para a população brasileira.
CONTATO
interpessoais (d7) Os resultados possíveis de nível adaptativo na VABS são: alto,
COMUNICAÇÃO Atividades e Participação - Comunicação (d3) moderadamente alto, adequado, moderadamente baixo e baixo. Em
investigações de comportamento adaptativo de indivíduos com algum
Funções do Corpo - Funções mentais globais - Funções
COGNIÇÃO diagnóstico e/ou distúrbio do desenvolvimento anunciado, os níveis
Intelectuais (bll7)
de comportamento adaptativo alto ou moderadamente alto têm me
Funções do Corpo - Funções mentais globais - Funções do
REGULAÇÃO
temperamento e da personalidade (bl26)
nor probabilidade de serem atingidos. Dessa forma, excluem-se es
ses níveis na correlação entre os instrumentos VABS e CIF, conforme
apresentado nas tabelas abaixo.
Escala de comportamento adaptativo Vineland
Vineland Adaptative Behavior Scale(VABS)
Vastamente utilizada para mensuração e avaliação de compor
tamento adaptativo, exclusivamente em caráter de pesquisa, a VABS
avalia a capacidade de autonomia e autossuficiência do indivíduo
em diversos campos do funcionamento. Esta escala é composta por

96
97
Nível adaptatívo correspondente aos escores padrões Correspondência domínios Vineland e classificação CIF
Nível Adaptativo Escores Padrões

Alto (High) 131 a acima de 160 Domínio Comunicacional Capítulo 3- Comunicação


Moderadamente Alto (Moderately Low) 116 a 130 Domínio de Atividades de Vida Cotidiana Capítulo 5- Autocuidados
Adequado (Adequaté) 85 a 115
Capítulo 7 - Interações e relacionamentos
Domínio de Socialização
Moderadamente Baixo (Moderately Low) 70 a 84 interpessoais

Déficit Leve {MUd 50-55 a


Baixo {Low)
Déficit) aproximadamente 70

Déficit Moderado
Conclusão
35-40 a 50-55
{Moderate Déficit)
Diante das considerações expostas, evidencia-se a contribuição ex
Déficit Severo {Severe
20-25 a 35-40 pressiva do uso de instrumentos específicos em avaliações diagnosticas e
Déficit)
de desenvolvimento humano. Por meio de resultados destes protocolos,
Déficit Profundo
Abaixo de 20 ou 25 podem ser delineadas conclusões diagnósticas, determinação da severi
{Profound Déficit)
dade de um quadro clínico e estabelecimento de estratégias de interven
ção apropriadas a cada casó.
Equivalência VABS e CIF A correlação apresentada entre instnunentos quantitativos-EFC-R e
VABS e qualitativo - CIF proporciona a mensuração de efeitos dos meios
i . ; Escala yineía/id de Comportamento Adaptivo'
físicos, social e político na vida do indivíduo.Em posse de informações desta
' Nível Adaptativo ' ; / Escores Padrões : :' namreza, podem-se realizar a avaliação e o monitoramento de intervenções;
Nenhuma
a elaboração de legislações e políticas sociais voltadas ao atendimento de
Adequado {Adequate) 85 a 115 0
deficiência necessidades individuais e inclusão de todos os indivíduos irrestritamente
Moderadamente Baixo
70 a 84
Deficiência em todas as esferas da sociedade; a elaboração e implantação de programas
1
{Moderateiy Low) ligeira de habilitação e reabilitação funcional; e o apoio a reformas sociais na edu
Déficit Leve {Mitd 50-55 a Deficiência
Baixo {Low)
2
cação, no mundo do trabalho e no bem-estar social.
Déficit) aproximadamente 70 moderada
Déficit Moderado Deficiência Cientes e conscientes de dados como estes, ajustamentos sociais são
35-40 a 50-55 3
{Moderate Déficit) grave passíveis de serem pensados e implementados em prol do acolhimen
Déficit Severo Deficiência to e valorização da diversidade humana. Desta maneira, retomando o
20-25 a 35-40 4
{Severe Déficit) completa
conceito de macrobio de James Lovelock, estaremos contribuindo para
Déficit Profundo Deficiência
{Profound Déficit)
Abaixo de 20 ou 25
completa
4 a construção de uma sociedade harmônica, plural e justa, que preveja
adaptações de funcionamento e organização, sensíveis ao acolhimento
das particularidades micro do sistema macro.

98
99
Princípios de emparia e respeito ao próximo, tão particulares
aos seres humanos, deveriam, nesta perspectiva, ser adotados, como
filosofia regente da sociedade. Exatamente estas particularidades tor
nam o ser humano um ser social, oferecendo-lhe a oportunidade de APLICAÇÕES E USOS DA CLASSIFICAÇÃO
perceber o outro como parceiro social, assim constituindo a sociedade INTERNAaONAL DE FUNCIONALIDADE,
e constituindo-se também com ela, por mútua influência. Sob esta INCAPACIDADE E SAÚDE (CIE) NA FONOAUDIOLOGIA
ótica, o ser humano se torna humano ao considerar a humanidade do
outro ser, vivenciando como pessoal a experiência de desfavorecimen- Fernanda Chequer de Alcântara Pinto
Fonoaudiôloga.
to social para outrem. Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana

A filosofia por trás da inclusão - escolar, social e laborai - segue Ana Maria Schiefer
estes mesmos princípios. A inclusão escolar seria, por exemplo, dentro Fonoaudiôloga.
Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana.
deste panorama, uma filosofia social que ofereceria embasamento e
sustentação ao ensino reflexivo e eficaz, que pormenorizasse o sistema Jacy Perissinoto
Fonoaudiôloga.
educacional com o intuito de atender às necessidades, especiais ou Pôs-doutora em Psicolinguistica
não, de todos os alunos.

Podendo ser considerada utópica, romântica ou inatingível por


alguns, a filosofia por trás dos conceitos de sociedade, do macro- A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade
bio e da inclusão converge, enaltecendo o caráter imprescindível da e Saúde — CIF foi criada em 2001 pela Organização Mundial de
convivência harmônica e amistosa entre os seres. Podendo ainda ser
Saúde (OMS) para descrever os estados e as condições relacionadas
considerada impraticável, impossível e inviável por alguns, o conte à saúde. E uma ferramenta que não classifica pessoas, mas sim des
údo discutido no presente capítulo elucida caminhos possíveis para creve a situação de cada indivíduo dentro de uma ampla gama de
a identificação e classificação de condições humanas e conseqüente domínios, deixando de considerar a doença como ponto principal
previsão de adaptações e adequações ambientais pertinentes a cada de partida, tornando os demais aspectos, as funções e estruturas do
caso, que visem tornar a sociedade amplamente irrestrita à atividade corpo, as atividades e participação, os fatores ambientais e pessoais
e participação de todos, a despeito de características e particularida como influenciadores do estado de saúde apresentado em um dado
des individuais.
momento e circunstância.

A classificação permite que o profissional que tem acesso se aproprie


do perfil de funcionalidade, incapacidade e saúde do sujeito, servindo
como ferramenta para descrição e comparação de dados da saúde em ní
vel local, nacional e internacional, sendo neutra em relação à etiologia,
pois é aplicável a todas as pessoas(OMS,2003).
Em outras palavras, a CIF estimula o trabalho intersetorial e a de
pendência entre as especificidades de cada área, deslocando o foco para
100
101
M Mk.
o ambiente,em vez da doença,como central para o desenvolvimento de Sendo a Fonoaudiologia uma das áreas da saúde que busca o bem-
ações de intervenção e prevenção. estar global do sujeito, de forma individual e social, desempenhando
Seu uso é complementar ao da Classificação Internacional de Doen suas atividades e participação na sociedade de forma plena e funcional,
ças (CID), e os usuários são estimulados a utilizar esses dois membros da é de fundamental importância iniciar a adoção desses conceitos instituí
família de classificações internacionais da OMS em conjunto. As informa dos pela CIF,já que o panorama de pesquisas e estudos mostra que este
ções sobre o diagnóstico e sobre a funcionalidade fornecem uma imagem é o caminho para uniformizar a codificação de diagnósticos funcionais
mais ampla e mais significativa de saúde das pessoas ou da população, que e de condições de saúde (doenças).
pode ser utilizada para propósitos de tomada de decisão. Para a aplicação prática deste modelo, devemos realizar a anamnese
A CIF é dividida em duas partes, a primeira sobre funcionalidade e e avaliação fonoaudiológica padrão, A partir disso, codificar os acha
incapacidade que trata das funções e estruturas do corpo (suas integridades dos, por meio da escolha de uma categoria de qualquer um dos níveis
ou deficiências), das atividades e participação (entre adequações e limita apresentados e acrescentar um qualificador, que nos dará a magnitude
ções/restrições), e a segunda que trata dos fatores contextuais, entre eles os do problema. Vale ressaltar que cada constructo possui as suas especi-
ambientais(que serão barreiras ou facilitadores) e os pessoais(não classifica ficidades - por exemplo, em atividades e participação, será destacado
dos). A lista de fatores ambientais descreve todo o contexto no qual o indi o qualificador de desempenho e capacidade e, em fatores ambientais,
víduo vive e a influência que tem sobre todos os demais aspectos descritos. o de barreiras ou facilitadores. Além disso, salienta-se que um mesmo
indivíduo pode apresentar vários códigos (categoria alfanumérica + qua
Segundo esse modelo,a incapacidade é resultante da interação entre a
lificador) pela classificação.
disfúnçáo apresentada pelo indivíduo (orgânica e/ou da estrutura do cor
po), da limitação de suas atividades e da restrição na participação social, Desse modo, o código gerado seria lido e interpretado pelo demais
e dos fatores ambientais que podem atuar como facilitadores ou barreiras profissionais usuários da classificação e, assim, poderia ser definido o qua
para o desempenho dessas atividades e da participação(OMS,2003). dro geral de saúde do indivíduo, considerando todos os aspectos da sua
funcionalidade, incapacidade e interferência dos fatores ambientais.
Desta forma, esse guia pode nortear a avaliação multidisciplinar, re
sultando em possibilidades de respostas e achados não antes conhecidos Sob este modelo, o fonoaudiólogo deve considerar a saúde como
e explicações para situações como do porquê pessoas com a mesma do resultado de condições sociodemográficas, compreendendo o usuário
ença podem ter diferentes níveis de funcionalidade e duas pessoas com de forma integral, garantindo-lhe proteção, promoção e recuperação de
o mesmo nível não têm necessariamente a mesma condição de saúde. sua saúde(ALMEIDA e FURTADO,2006).
A inclusão de fatores contextuais(ambientais e pessoais) é significante
na perspectiva fonoaudiológica por três motivos: primeiro, é reconhecido
APLICAÇÕES NA CLÍNICA FONOAUDIOLÓGICA
o papel das diferenças nas experiências pessoais dos indivíduos. Segimdo,
Sabe-se que o diagnóstico não é um preditor completo para de em uma perspectiva terapêutica, esta dimensão é potencialmente útil em
finição de conduta, procedimentos, comparações e previsões de alta, termos de explicação de como alguns indivíduos têm mais benefícios com
incluindo retorno ao trabalho e mesmo integração social. Portanto, a a intervenção do que outros. Por último, salienta a importância da inte
utilização deste tipo de modelo facilitará atitudes de gerenciamento e ração entre as dimensões e os fatores contextuais (ambiental e pessoal) na
planejamento de saúde. experiência da incapacidade(STEPHENS e KERR,2000).

102
103
Neste cenário, valoriza-se a importância da relação entre o desempe Mesmo assim, na Fonoaudiologia, ainda são escassas as pesquisas
nho e o contexto no qual o indivíduo vive, formando a interação de fato que se voltam à utilização da CIF como instrumento para classificar d
res pessoais e ambientais. Assim, a atenção à saúde poderá ser vista em sua ou auxiliar o acompanhamento fonoaudiológico (JELSMA, 2009).
magnitude e de acordo com cada região(ARAÚJO e BRASIL, 2014). Entretanto, observamos na literatura que instrumentos têm sido
Além disso, a utilização da CIF apresenta uma série de vantagens, criados com base nos princípios da classificação, para nortear e dire
tais como: padronização da terminologia; melhora da comunicação en cionar o olhar clínico para domínios de grande importância e que não
tre os profissionais; aprimoramento e comparações dos dados; identifi podem mais ser negligenciados. Dentre os instrumentos criados com
cação da natureza e magnitude do complexo multifatorial envolvido nas base no modelo CIF, destacamos:
condições de saúde(GAIDHANE et ai, 2008). - PEDI: este instrumento foi criado com o propósito de avaliar as
A respeito da implantação e operacionalização da CIF, uma recente capacidades funcionais e o desempenho típico em crianças jovens
revisão mostra que somente 26% das publicações estão relacionadas com com limitações funcionais. Informa o perfil funcional de crianças
a clínica e/ou reabilitação, o que dificulta a coleta de dados sobre a saúde entre seis meses e sete anos e seis meses de idade, em três níveis de
da população dentro dos sistemas de informação (CERNIAUSKAITE função: autocuidado, mobilidade e função social. O perfil funcio
et al., 2009). nal documentado avalia as habilidades disponíveis no repertório da
Sabe-se que alterações no processo de desenvolvimento da co "criança para desempenhar atividades e tarefas de sua rotina diária;
municação afetam a inserção social da criança e do adolescente, seu bem como o seu nível de independência ou a quantidade de ajuda
aprendizado escolar e, em indivíduos adultos, sua integração na vida fornecida pelo cuidador; e as modificações do ambiente utilizadas
profissional. Assim, emergem desafios para a atuação do fonoaudiólo- no desempenho funcional. Este instrumento foi traduzido e adap
go, como o da produção de evidências confiáveis sobre os processos de tado para o Português brasileiro por Mancini e Haley, 2005.
aquisição, desenvolvimento e abrangência da linguagem. Como recur - OASES-A (YARUSS e QUESAL, 2004): este instrumento foi
so para o enfrentamento de tais desafios, estão a elaboração, o reconhe criado com base nesta construção teórica, descrevendo o transtorno
cimento e a utilização de procedimentos para a coleta e interpretação de fala- Cagueira- por meio da experiência do próprio indivíduo
de informações sobre a forma, o conteúdo e o uso da linguagem, que que a manifesta, destacando que os fatores internos e/ou externos
possam ser incorporados na prática clínica de modo eficiente e efetivo influenciam e são integrados como componentes da saúde, assim
(PERISSINOTO e ÁVILA, 2014). como as reações negativas afetivas, comportamentais e cognitivas,
Neste sentido, o Conselho Federal de Fonoaudiologia, em 2013, as limitações na participação de atividades da vida diária e o impac
agrupou as categorias da CIF de forma a torná-la mais adequada aos to negativo na qualidade de vida. Este instrumento foi traduzido e
objetivos de estudos epidemiológicos e para a avaliação assistencial à adaptado para o Português brasileiro por Bagatto et ai, 2010.
saúde, com o objetivo de auxiliar o fonoaudiólogo nas ações relacio -SPAAC(MCLEOD,2003): este questionário foi elaborado para
nadas com os Distúrbios da Comunicação Humana. O guia norteador obter informações sobre crianças com dificuldades de fala. As
elaborado está disponível de forma gratuita, on-line e não substitui a pessoas são encorajadas a usar as perguntas para aumentar sua
classificação da CIF como um todo, pois foram incluídas apenas as ca compreensão das crianças, tanto do ponto de vista individual
tegorias relacionadas à área. como no contexto em que vivem, isto é, abrangendo as categorias

104 105
de atividade e participação, meio ambiente e fatores pessoais da estão envolvidos com a classificação. Foram encontradas as categorias
Classificação Internacional de Funcionalidade, Deficiência e Saú mais freqüentes entre todos os domínios: bl76 (funções mentais para a
de (ICF)(OMS,2001). seqüência de movimentos complexos), d310(comunicar e receber men
- FOCUS(THOMAS-STONELL et al., 2010): é um questioná sagens orais), d330 (falar) e e4l0 (atitudes individuais de membros da
rio criado para avaliar o impacto da fala e linguagem sobre a capa família próxima). Os componentes mais freqüentes foram função do
cidade de comunicação da criança pré-escolar e sua participação corpo e atividades/participação, o menos freqüente os fatores ambien
na comunidade. tais e a estrutura do corpo. Como conclusão, verificou-se ser possível a
identificação de itens da CIF, relacionados à funcionalidade, por meio
- ICS(MCLEOD et al., 2012): é um questionário elaborado com
dos relatos da anamnese fonoaudiológica(PINTO et aí., 2016).
o objetivo de fornecer uma estimativa da inteligibilidade de fala de
crianças com dificuldades de comunicação dentro de um contex Em pesquisa realizada por Ostroschi et al.(2014) com dois grupos
to, com sete diferentes parceiros de comunicação identificados pela de indivíduos de 4 a 18 anos: com e sem alterações de linguagem e fami
CIF (já traduzido para Português brasileiro e disponível de forma liares, entrevistados separadamente, observamos que os achados eviden
gratuita on-linè). ciam diferentes percepções e repercussões na participação e funcionali
dade para cada um dos grupos estudados e seus familiares. Observamos
Entre estes instrumentos citados, é importante ressaltar que o PEDI assim que a percepção dos conceitos de saúde está sendo investigada a
vem sendo estudado principalmente por profissionais da Fisioterapia e partir do sujeito e a sua relação com o meio. Diante disso, é necessário
Terapia Ocupacional, mas não na Fonoaudiologia, embora um de seus o conhecimento acerca da funcionalidade em fala e linguagem a partir
componentes fale sobre as funções sociais. O OASES-A,traduzido para da idade pré-escolar.
dez idiomas, é utilizado na clínica fonoaudiológica no atendimento de
Em estudo de Guedes (2011) verificou-se que a utilização da CIF
indivíduos adultos que manifestam gagueira. Os demais questionários
como ferramenta proporcionou uma linguagem comum à descrição de
estão sendo pesquisados internacionalmente, porém alguns estudos bra
diferentes patologias, permitindo comparações que anteriormente não
sileiros começam a despontar com as suas aplicações.
poderiam ser realizadas facilmente, sendo possível perceber o quanto os
pacientes estão suscetíveis aos fatores ambientais, permitindo que dife
ESTUDOS PRELIMINARES NA ÁREA rentes pessoas pudessem compreender todo o processo, favorecendo a
mudança de procedimento de forma clara e objetiva.
Com base na classificação da CIF, propostas de seleção de categorias
Estudo foi realizado por Pereira etal.(2011),com o objetivo de iden
relevantes para a área fonoaudiológica, incluindo a anamnese, avaliação
tificar as categorias da CIF para a classificação da funcionalidade da po
e conduta, definição de momentos de alta e evolução terapêutica a par
pulação com mais de 65 anos de idade. Foram pesquisados artigos cientí
tir dos qualificadores pré e pós intervenção, vêm sendo investigadas.
ficos publicados, e as categorias identificadas distribuíram-se do seguinte
Com o objetivo de selecionar as categorias da CIF (de segundo ní modo: 83 categorias do componente de funções do corpo, em 12 artigos;
vel) mais relevantes presentes na anamnese fonoaudiológica (por meio 30 categorias do componente de estruturas do corpo, em 7 artigos; 82
de perguntas semidirigidas aos indivíduos), um estudo foi elaborado categorias do componente de atividades e participação, em 16 artigos; 57
visando conhecer os direcionamentos e questionamentos realizados que categorias do componente de fatores ambientais, em 15 artigos.

106
107
Romano e Chun (2014) em estudo das condições linguístico-cog- das interseções com o meio ambiente, educação, trabalho, lazer, acesso
nitivas de crianças usuárias de comunicação suplementar e/ou alternati aos serviços de saúde, atendimentos e evoluções no tempo(CNS,2012;
va pontuaram que a utilização da CIF possibilitou a análise das particu CFFa, 2013).
laridades do desempenho/funcionalidade e a participação das crianças
Na atividade do fonoaudiólogo, registros sistemáticos sobre cada
em diferentes momentos, situações e contextos, mostrando que a fun
indivíduo são enfatizados(GAIDHANE et ai, 2008;JELSMA,2009),
cionalidade de um indivíduo em um domínio específico é resultante da
e o uso da CIF favorece a análise dos transtornos da comunicação e seus
interação entre condição de saúde e fatores contextuais. Os resultados
impactos sobre a pessoa e a sociedade (GUEDES, 2011; ARAÚJO e
evidenciam, assim, a utilidade dos componentes da CIF, nos domínios
BRASIL, 2014).
da linguagein, no âmbito da Fonoaudiologia.
Esmdo realizado por Araújo (2014), que teve por objetivo a constru
ção de uma lista de categorias da CIF, consideradas as mais relevantes para o CONSIDERAÇÕES FINAIS
esclarecimento das condições de funcionalidade de pacientes, na área da Fo
noaudiologia, contou com as seguintes categorias: bl40 (funções da aten Portanto, a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapa
ção), bl44 (funções da memória), b230(funções auditivas), b250(funções cidade e Saúde (CIF) pode auxiliar o fonoaudiólogo na construção de
gustativas), b310 (funções da voz), b330 (fluência e ritmo da fala), b5101 referenciais quanto à incidência, prevalência e comorbidade dos Distúr
(deglutição), b730 (funções da força muscular), b735 (funções do tònus bios da Comunicação Humana,com impacto em ações de planejamen
muscular), d350 (conversação), d550 (comer) e d560 (beber). to das intervenções nas políticas públicas, nas áreas sociais e de saúde.

Com o objetivo de elaborar um plano terapêutico fonoaudiológico A sua relevância e disseminação de uso são cada vez mais pesquisadas
norteado pela CIF, Chun e Dallaqua (2015) enumeraram os seguintes e, portanto, reconhecidas no cenário fonoaudiológico, que deve ampliar
achados nos quadros analisados: bl67 (funções mentais da linguagem), sua visão e atuação, favorecendo o bem-estar dos indivíduos, garantindo
bl76 (funções mentais de sequenciamento de movimentos complexos), que aspectos não antes considerados sejam atualmente reconhecidos e tra
b330 (funções da fluência e do ritmo da fala), d220 (realizar tarefas múl balhados, buscando uma prática voltada para aspectos de funcionalidade
tiplas), d3I0 (comunicação-recepção de mensagens orais), d 315 (comu- e reconhecendo o importante papel do meio ambiente.
nicação-recepção de mensagens não verbais), d330 (falar), d350 (conver Desta forma, teremos facilidades na identificação do problema e
sação), d345 (escrever mensagens), d360 (utilização de dispositivos e téc na sua recuperação, com um olhar holístico do indivíduo, deixando de
nicas de comunicação), d750 (relações sociais informais), d760 (relações considerá-lo um corpo doente. Além da complementação do nosso olhar,
familiares), d9I0 (vida comunitária), d920 (recreação e lazer), eI25 (pro consideramos essencial para a comparação de indivíduos em nível local
dutos e tecnologias para a comunicação), e3I0 (família nuclear), e3I5 e até internacional a identificação de aspectos de funcionalidade e inca
(família ampliada), e320 (amigos). Entretanto, salientaram que outros pacidade de um grupo de pessoas ou região, possibilidade de adequar o
itens poderão ser agregados de acordo com as condições de cada caso. serviço clínico diante de suas características, julgar a necessidade de outros
Assim, podemos considerar que, na atuação fonoaudiológica em profissionais, melhora da distribuição de verbas e políticas de saúde.
pesquisa, prevenção, avaliação e terapia (Lei n.o 6.965/ 1981), a CIF Para tornar seu uso mais efetivo, além das listas a serem criadas,
tem inserção no mapeamento amplo da condição de cada indivíduo. arquivos e documentos eletrônicos podem ser feitos para medir a evo
lução de um paciente, comparando resultados pré e pós-procedimentos
108
109
terapêuticos, no qual deve-se completar com o qualificador em questão, Leitura recomendada
definindo o perfil de funcionalidade do ponto de vista fonoaudiológico.
1. Araújo ES, Brasil ACO.Descaminhos da rede de atençáo às pessoas com deficiência. Revista Cientí
Tabelas também poderiam ser elaboradas, com as categorias para que os fica CIF Brasil. 2014; l(l):5-9.
códigos sejam fechados, colocando os qualificadores em forma numéri 2. Araújo ES. Manual de utilização da CIF em Saúde Funcional. São Paulo: Editora Andreoli, 2011.
ca ou com outras marcações predefinidas.
3. Araújo, ES. Uso da CIF no SUS: a experiência no Município de Barueri/SP. Revista Científica CIF
Neste sentido, ainda há um longo percurso pela frente, pois toda a Brasil. 2014; 1(1):10-17.

importância da classificação esbarra na sua complexidade e pouca disse 4. Bragatto EL; Osbornb E; Yaruss JS; Quesal R; Schiefer AM; Chiari BM.Versão brasileira do pro
tocolo Overall Assessment of the Speakers Experience of Stuttering - Adults (OASES-A). Soe. Eras.
minação nos cursos de graduação, principalmente nos da área da saúde, Fonoaudiol. São Paulo. 2012;.24(2): 145-151.
sendo necessário que os profissionais busquem cursos extras para melhor 5. Campos GWS. Humanização na saúde: um projeto em defesa da vida? Interface Comunic Saúde
compreendê-la. Além disso,os sistemas não apresentam uma noméncla- Educ. 2005;9(17):398-400.
tura adequada para que o profissional possa colocá-la em prática. 6. Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde para a Família de Classificações Interna
cionais (org.); Coordenação da tradução de Cássia Maria Buchalla. CIF: Classificação Internacional
de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo. 2003.
Conclusão 7. Cerniauskaite M,Quintas R, Boldt C, Raggi A, Cieza A, Bickenback JE, et ai Systematic literature
review on ICF from 2001 to 2009: its use, implementation and operationalization. Disabil Rehabil.
Os profissionais da área da saúde com acesso à Classificação In 2011; 33(4): 281-309.
ternacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF têm uma 8. Chun RYS, Dallaqua GB. Plano Terapêutico Fonoaudiológico (PTF) Norteado pela CIF para Afòsi-
ampliação do olhar e do cuidado com a saúde do indivíduo, permitindo cos utilizando Comunicação Suplementar e/ou Aumentativa. In: Planos Terapêuticos Fonoaudiológicos
(PTFs). Pró-Fono (org.). 2015 2 vol.
que a assistência e outros níveis de atuação sejam realizados da melhor
maneira possível. Entretanto, na clínica, as aplicações e os usos por esses 9. CNS, Conselho Nacional de Saúde. Ministério da Saúde. CNS defende inclusão de Classificação
Internacional no SUS. Brasília. 2012 Maio.
profissionais, inclusive da Fonoaudiologia, ainda são incipientes.
10. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Guia Norteador sobre a Classificação Internacional de Fun
cionalidade e Incapacidade/ CIF em Fonoaudiologia. 2013 1 ed.
11. Franco MLZ. Família em fonoaudiologia [dissertação]. São Paulo (SP): Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo; 1992.

12. Gaidhane AM, Zahiruddin QS, Waghmare L, Zodpey S, Goyal RC, Johrapurkar SR. Assessing
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13. Guedes, ZCFC. A Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF) a Serviço da Fonoaudiolo


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14. Jelsma J. Use of the International Classification of Functioning, Disability and Health: a literature
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15. Mancini MC e Haley SM. Inventário de avaliação pediátrica de incapacidade (PEDI)- manual da
versão brasileira adaptada. Editora: UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais. 2005.
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liability of a subjeccive rating measure. Journal of Speech, 648 Language, and Hearing Research.
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110
111
17. McLeod S. Speech Participation and Activity of Children (SPAA-C)(version 2.0). Developed by
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Internacionais, org.: coordenação da tradução Cássia Maria Buchalla). São Paulo: Editora da Universi
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GESTÃO DE AFASTAMENTOS POR DISTÚRBIOS
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Fernanda Flãvia Cockell
20. OMS, Organização Mundial de Saúde."WHO - World Health Organization. Towards a Common Fisioterapeuta. Pós-doutora em Sociolo^a.
Language for Functioning, Disahility and Healrh - ICF. Genebra; 2002.
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Fisioterapeuta. Doutora em Fisioterapia,
Functioning, Disahility and Health: ICF. Geneva: WHO;2001.
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jetos interdisciplinares de pesquisa, ensino e extensão na área de saúde
IQ, Silva HJ. Tomé MC (organizadores). Tratado das Especialidades em Fonoaudiologia. 1 ed. São do trabalhador. O estágio acontece na Prefeitura Municipal de Santos
Paulo/SP. Guanabara Koogan, 2014. (PMS), no Departamento de Gestão de Pessoas e Ambiente de Tra
25.Pinto FCA,Scbiefer AM,Perissinoto J. Proposta de core ser a partir da anamnese em Fonoaudiolo balho (DEGEPAT), contribuindo com parte das ações desenvolvidas
gia pela Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) / Tese (Mesrrado) pelo "Programa de promoção à saúde e qualidade de vida dos servidores
- Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Programa de Pós-Graduação em
Distúrbios da Comunicação Humana. São Paulo, 2015. municipais - Comviver". Nos últimos seis anos, foram realizadas ofici
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suplementar e/ou alternativa segundo componentes da CIF. Distúrb Comun, São Paulo 2014- de prevenção, capacitação em ergonomia, avaliações e laudos técnicos
26(3): 503-518.
ergonômicos em diversas secretarias.
27. Stephens D, Kerr P. Auditory Disablements: an Update. Audiology 2000; 39:322-332.
Um programa de atenção àsaúde do trabalhador precisa coletar,agregar,
28.Thomas-Stonell NL,Oddson B,Robertson B,Rosenbaum PL. Development ofthe FOCUS(Focus
on the Outcomes of Communication Under Six), a communication outcome measure for preschool sistematizar, analisar e tornar disponíveis as estatísticas sobre as condições e
children; Developmenral Medicine & Child Neurology. 2010: 52: 47-53; necessidades de saúde visando à promoção e proteção da saúde(TOGNA,
29.Yaruss JS, Quesal RW.Overall Assessment ofthe Speakers Experience ofStuttering(OASES): docu- 2010). Dados disponíveis da PMS mostram que, entre os 11.080 servi
menting multiple outcomes in stuttering treatment J Fluency Disord. 2006;31(2): 90-115. dores, foram contabilizadas 5.519 licenças médicas em 2014, sendo 702
(12,72%) por doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjtmtivo,
códigos M00-M99, segundo a Classificação Internacional de Doenças e
Problemas Relacionados à Saúde (CID-10).

112
113
Osdados epidemiológicos do DEGEPAT são todos baseados na CID- Articulação ensino-serviço: o modelo biopsicossocial e
10 e, portanto, na doença, sendo possível apenas contabilizar o número espiritual e suas contribuições na gestão de afastamentos
de afestamentos e de perícias por doença, o tempo total de licença médica
e os dias não trabalhados por cada ano,gerando informações importantes O "Programa de gestão de afastamentos por licença médica" é
sobre a patologia, porém, incompletas em relação aos determinantes das desenvolvido por equipe multiprofissional da PMS, composta por
condições de funcionalidade(ARAÚJO; BUCHALLA,2013). médico, enfermeiro, assistente social e psicólogo. O servidor com
afastamento médico superior a 90 dias é acolhido no momento da
Araújo e Buchalla (2013) mostram a importância da utilização
da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e perícia, o prontuário é analisado e, em seguida, o caso discutido en
Saúde (CIF) nos procedimentos de avaliação e de intervenção no tre os profissionais, a fim de conhecer com profundidade a causa do
afastamento desde seu início. Antes de passar pela perícia médica,
campo da Saúde do Trabalhador, servindo como "ferramenta para
ações estratégicas visando melhorar a produtividade, a eficiência do o servidor conversa com a equipe para orientação, início do acom
trabalho e o direcionamento dos recursos financeiros" (ARAÚJO; panhamento e levantamento de suas necessidades sociais, laborais e
BUCHALLA,2013, p.2).
psicológicas. O perito avaliará o caso, podendo o tempo da licença
ser prorrogado, assim como encaminhar para a readaptação ou apo
A CIF e a CID pertencem à família das classificações internacio sentadoria, e a equipe multidisciplinar indicará medidas em prol da
nais desenvolvidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), sendo sua retuperação/reabilitação.
complementares, permitindo, respectivamente, o diagnóstico de fun
Entre as diversas medidas adotadas, está o encaminhamento de parte
cionalidade/incapacidade e o diagnostico de doenças. Na prática, o uso
conjunto das duas classificações em saúde do trabalhador ainda é restri dos casos afastados por DMEs para os estagiários de Fisioterapia. A atenção
to, depende de sua aceitação pelos profissionais de saúde, trabalhadores ao servidor é individual,com a elaboração de uma proposta de acompanha
e gestores, seja pelo desconhecimento de seus usos (CIEZA; STUCKI, mento e integral. São observados os múltiplos fatores do processo saúde-
2004), seja pelas dificuldades para aplicação prática (SABINO, COE doença-cura, tendo como princípios norteadores o modelo biopsicossocial
LHO; SAMPAIO, 2008), mas, principalmente, pela centralidade do e espirimal proposto pela CIF e as contribuições do campo da saúde do
modelo biomédico nas perícias. trabalhador para a Fisioterapia do trabalho(COCKELL,2013).
Semanalmente, são realizadas desde 2015 de quatro a cinco ava
As parcerias realizadas entre o DEGEPAT e o estágio de Fisiote
rapia do trabalho da Unifesp permitiram que parte dos casos afastados liações fisioterapêuticas no DEGEPAT. Duplas ou trios de estagiários
por distúrbios musculoesqueléticos(DMEs)passe a contar com infor colhem informações mais detalhadas sobre a história da moléstia atual
mações sobre a funcionalidade. Após 18 meses da articulação ensino- e incapacidades. Uma ficha geral, baseada no checklist da CIF (OMS,
serviço, é possível avaliar as possíveis contribuições da proposta, pen 2003b) norteia o início da anamnese, com informações sobre; dados
sar as possibilidades de inserir a CIF na rotina do serviço e apontar as gerais do servidor, diagnóstico médico, informações de saúde (incluin
principais dificuldades.
do história da moléstia atual e pregressa), trabalho (condições de traba
lho, tarefas, rotinas e relações interpessoais), queixas do servidor. Escala
Visual Numérica (EVN) para dor, limitações de atividade, restrições
de participação, barreiras e/ou facilitadores dos fatores ambientais. O
tempo entre cada avaliação é de duas horas.

114 115
Após realizar a avaliação postura], podem ser necessários testes especí códigos relacionados a uma doença, sendo, portanto, um retorno ao
ficos para avaliar as fimçóes e estruturas corporais, seguindo o protocolo da modelo biomédico de entendimento da funcionalidade humana.
previdência social(BRASIL,2012).Ao final da avaliação cinético-fimcional,
a dupla/trio de estagiários fica responsável pela construção do formulário
de Resoluções de Problemas {JRehabilitationProblem-Solvin^ - RPS-form, Avaliando a prática: métodos e estratégias
baseado nas categorias da CIF e na percepção do indivíduo acompanhado Foi realizada uma pesquisa retrospectiva, exploratória-descri-
(EBERHARDT;GREINER,2008). tiva para a busca de informações em todos os prontuários fisiote-
O uso clínico do RPS-Form (STEINER et ai, 2002) na Fisiote rapêuticos, compreendendo o período de fevereiro de 2015 a julho
rapia fornece uma linguagem comum e um quadro conceituai que, de 2016. Foram analisadas as fichas de 44 servidores municipais
de acordo com Allan et ai. (2006), transcende as fronteiras disci- afastados por problemas DMEs, a percepção dolorosa por meio
plinares tradicionais. O RPS-form direciona os encaminhamentos da Escala de dor visual numérica (EVN), os questionários HAQ
necessários para cada caso, pensando nos serviços ofertados na rede aplicados em 2016 (n=26) e os encaminhamentos realizados, in
publica e privada de saúde da região, bem como nas demandas, in- dependentemente do tempo de afastamento, função exercida ou
comorbidades.
capacidades, barreiras e desejos individuais. Quando o caso estiver
finalizado, o servidor retorna ao serviço para receber as orientações, A sensação de dor foi inicialmente avaliada pelo EVN de fácil
os encaminhamentos e as guias. aplicação e compreensão, variando de O a 10, sendo O "ausência de
Em 2015, a dupla de estagiário deveria selecionar pelo menos dor" e 10 a "pior dor possível". Na CIF, a sensação de dor é codificada
um questionário de funcionalidade e/ou de qualidade de vida para pelo código "b280", descrito como "sensação desagradável que indica
aplicar com o servidor. A proposta de não determinar previamen lesão potencial ou real em alguma estrutura do corpo"(OMS,2003a).
te qual questionário seria utilizado tinha como objetivo avaliar as Uma vez que uma deficiência esteja presente, o nível de dor apontado
habilidades e competências da dupla no diagnóstico e nas escolhas na escala numérica pelo servidor pode ser graduado em termos de
dos instrumentos apropriados para cada caso. Contudo, houve uma gravidade utilizando-se o qualificador genérico da CIF, que ocupa a
grande variedade de questionários utilizados, dificultando a compa posição do dígito após o ponto.
ração dos resultados. No projeto, a CIF norteia todos os testes clínicos e funcionais realiza
Em 2016, optou-se por incluir como obrigatório, além da ficha ge dos, permitindo o preenchimento do RPS-form (STEINER et ai, 2002)
ral, o questionário Health Assessment Questionnaire(HAQ). A inserção com as queixas do servidor e com a avaliação da equipe de Fisioterapia,
do FlAQna rotina do estágio deve-se à facilidade e rapidez do seu uso, sobre suas incapacidades (deficiências na função e/ou estrutura, limitações
podendo ser autoaplicável, facilitando sua futura inclusão em todos os de atividade e restrições de participação) e fatores contextuais (barreiras e
casos afastados por CID-M geridos pelo programa de gestão de afasta facilitadores ambientais e fatores pessoais). Cada código da CIF recebe um
mentos. Continuam a utilizar ainda outros instrumentos já validados qualificador, que indica a magnitude do nível de saúde(OMS,2003a).
e traduzidos para o Português e para a cultura brasileira que permitam O HAQ foi desenvolvido por Fries í-í iz/.(1980) e validado para o
criar regras de relacionamento com a CIF, conhecidas como 'Hinkage' Português por Ferraz et aí. (1990), sendo implantado em estudos sobre
(ARAÚJO,2008). Cabe destacar que não são utilizados coresets da CIF, trabalhadores, envelhecimento normal, apesar do seu uso mais freqüen
pois tais listas são formadas por uma seleção de uma lista mínima de te ser com adultos e crianças com doenças reumáticas(BRUCE;FRIES,
116
117
2003). É composto por 20 questões divididas em oito categorias: vestir- Os casos acompanhados
se e arrumar-se; levantar-se; comer; caminhar; higiene pessoal; alcance; Foram avaliados 44 servidores estatutários (n=44), sendo 18
força de preensáo e atividades usuais. Para cada uma dessas categorias, acompanhados em 2015 e 26 no primeiro semestre de 2016. Para
o trabalhador indica o grau de dificuldade em quatro possíveis respostas análise, foram incluídos todos os casos, sendo 28 mulheres (64%) e
que vão de "nenhuma dificuldade = O" até "incapaz de fazê-lo = 3". A
16 homens (36%), com alguma queixa relacionada às funções neuro-
média aritmética do maior escore de cada categoria gera o índice de musculoesqueléticas e aos movimentos, de acordo com a classificação
Incapacidade (HAQ-ID), classificado em: "Incapacidade leve" (ID de
da CIF (byiO a b799). Apenas um dos casos estava relacionado a um
O a 1); "Incapacidade moderada"(ID > 1 a 2) e "Incapacidade grave" acidente do trabalho.
(HAQ > 2 á 3). Cabe destacar que a falta de definições sobre o termo
disability faz como que o termo "HAQDiasability Index" seja traduzido O tempo médio de vínculo com a Prefeitura foi 14,6 anos(DP=9,9),
como índice de deficiência, cabendo a CIF nortear, segundo Di Nubila com oito servidores ainda em estágio probatório por não terem contabili
e Buchalla(2008), o entendimento dos conceitos deficiência ou incapa zado três anos trabalhados. Do total, 39(89%)foram encaminhados pela
cidade, erroneamente, considerados como sinônimos. equipe e cinco (11%) procuraram por conta própria.
Para o cálculo das estatísticas de absenteísmo, foram considerados As características principais aparecem na Tabela 1. A idade média
os 12 meses antecedentes a cada avaliação. Foram incluídos para cálculo foi de 51 anos (DP=10), variando entre 31 e 68 anos. Em relação ao
o mês da avaliação e os 11 meses anteriores, com informações sobre dias estado civil, 20 servidores(45%) vivem em algum tipo de união conju
afastados e causas de cada afastamento (códigos da CID, acidente de gai. O intervalo dos 50 aos 59 anos foi a faixa decenal que apresentou o
trabalho ou acompanhamento de dependente). maior número de servidores, totalizando 19 (43%). Os graus de instru
ção que concentraram o maior número de trabalhadores foram o nível
Os dados referentes ao número de dias afastados e EVN de 26
médio completo, com 12(27%)e o nível superior completo, com 50%
trabalhadores acompanhados em 2016 não apresentaram distribuição
do total, contabilizando servidores graduados com os pós-graduados.
normal por meio do teste de Shapiro-Wilk. Dessa forma, para avaliar
a correlação entre as variáveis, optou-se pelo teste não paramétrico de Em relação às atividades ocupacionais, há uma diversidade de car
Correlação de Spearman. Os dados foram apresentados em mediana, gos, com maior número de profissionais envolvidos em atividades de
quartis (25%-75%), mínimo e máximo. Foi considerado um nível de ensino e educação, sendo oito professores adjuntos (18%), quatro pro
significância de 5%. fessores de educação básica(9%) e um de educação infantil (2%).

Os dados coletados foram organizados em uma planilha em Excel, Quanto às percepções individuais da dor, o grupo apresentou
e os resultados foram expressos pela estatística descritiva em freqüência no EVN (O a 10) a intensidade média de 7,97 (DP=1,97), sendo
absoluta e relativa, sendo apresentados por meio de tabelas e figuras. O a sensação de dor (b280) considerada grave para 23 casos (52%) e
projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição deficiência completa (b280.4) para 17 servidores. Todos faziam uso
onde foi realizada a pesquisa(CEP: 0056/2016). freqüente de medicamentos para dor, nem sempre prescritos pelos
médicos que os acompanhavam.

118 119
Tabela 1 Características sociodemográficas e clínicas dos servidores Inspetor de Alunos 1 2%
Jardineiro 1 2%
Características n=44 %
Motorista 2 5%
Sexo Oficial de Administração 4 9%
Feminino 28 64% Professor Adjunto (I e II) 8 18%
Masculino 16 36% Professor de Educação Básica (I e II) 4 9%
Estado civil Psicóloga 2%
1
Solteiros 10 23% CIF — b280 Sensação de Dor
Casados/União estável 20 45% b280.1 Deficiência ligeira 0 0%
Divorciados/separados 11 25% b280.2 Deficiência moderada 4 9%
Viúvos 3 7% b280.3 Deficiência grave 23 52%
Idade b280.4 Deficiência completa 17 39%
30 - 34 anos 1 2%
35 - 39 anos 7 . 16% Fonte; Os autores com dados dos prontuários de fisioterapia 2015 e primeiro semestre 2016
40 - 44 anos 4 9%
45 - 49 anos 4 9%
50 - 54 anos 9 20% Os dados de absenteísmo mostram que, no período de 12 me
55 - 59 anos 12 27% ses anteriores a cada avaliação, foram contabilizados 6.979 dias
60 - 64 anos 4 9%
de afastamentos, sendo 4.665 dias (66,8%) classificados como
65 - 69 anos 3 7%
Nível de instrução CID-M. Do total, 19 servidores (43%) tiveram afastamento mé
Fundamental incompleto 3 7%
dico superior a 90 dias, fazendo parte do programa de gestão de
Fundamental completo 2 5% afastamentos por licença médica da Prefeitura, totalizando, juntos,
Ensino médio incompleto 2 5% 6.019 dias não trabalhados (86,2%).
Ensino médio completo 12 27%
Superior incompleto 3
Na tabela 2, estão listadas as dez principais patologias entre os ser
7%
Superior completo 9 20%
vidores acompanhados pela Fisioterapia. A coluna vertebral foi uma das
Pós-graduação 13 30% estruturas mais atingidas, sendo classificados como CID M51 "outros
Ocupação transtornos de discos intervertebrais" (22,2%), CID M 54 "dorsalgia"
Ascensorista 1 2%
(9,1%) e CID M50 "transtornos dos discos intervertebrais" (4,2%).
Assistente Social 3 7%
Auxiliar de Bibliotecário 1 2%
Auxiliar de Enfermagem 3 7%
Auxiliar de Serviços Gerais 5 11%
Cozinheiro 5 11%
Educador infantil 1 2%
Enfermeira 1 2%
Farmacêutico 1 2%
Guarda Municipal (I e II) 2 5%

120
121
Tabela 2- Distribuição das doenças dos servidores em relação aos capítulos da Tabela 3- Distribuição das variáveis EVN,ID-HAQ,Total de dias afastados e Dias
CID-10 — últimos 12 meses afastados por CID-M,segundo a Mediana, Quartis e valores mínimo e máximo.

Subgrupos CID-10 Dias afastados (n = 44) Percentual Quartil 1 Quartil 3


Variável (n=26). Mediana Mínimo Máximo
(25%) (75%)
M51 - Outros Transtornos de
Discos Intervertebrais 1.550 22,2%
EVN 8 6 10 4 10

M54 - Dorsalgia 635 9,1% ID-HAQ 1,3125 0,750 1,625 0,250 2,375

Ml9 - Outras Artroses 420 ' 6,0% Total de dias


47 21 259 0 366
afastados
S6l - Ferimento do punho e da
344 4,9%
mão Dias afastados por
20 5 90 0 366
CID-M
M17 - Gonartrose (artrose do
joelho) 329 4,7%

G56 - Mononeuropatias dos A Tabela 4 apresenta o Coeficiente de Correlação de Spearman e


membros superiores 311 4,5%
o valor de p entre as variáveis ID-HAQ e EVN com total de dias afas
M50 - Transtornos dos Discos tados-e dias afastados por CID-M.O ID-HAQapresentou correlação
292 4.2%
Cervicais significativa moderada com o número de dias afastados por CID-M,
M15 - Poliartrose 227 3,3%
e a EVN não apresentou correlação significativa com o número de
Fio - Transtornos mentais e
dias afastados. Entretanto, observou-se uma correlação significativa
comportamentais devidos ao 217
entre ICF-HAQe EVN (R=0,59 e p=0,01).
3,1%
uso de álcool

M65 - Sinovite e Tenossinovite Tabela 4 — Inter-relações entre as variáveis EVN e ID-HAQ com total de dias
212 3,0%
afastados e total de dias afastados por CID-M pelo Coeficiente de Correlação de
Demais CID M 1.000 14,3% Spearman (R) e valor de p.
Outros códigos (excluindo
1.442 20,7% Variável Total de dias afastados (n=26). Dias afastados por CID-M
CID M)
R=0,26 R=0,27
Total (CID-10 A00aZ99) 6.979 100% EVN
/>=0,20 ;-=0,17
R=0,37 R=0,47
ID-FIAQ
Dos 26 servidores que responderam HAQem 2016, 15 (57,7%) /'=0,06 ;>=0,016*
apresentaram "incapacidade moderada" (ID > 1 a 2), 1(3,8%) "in
capacidade grave"(ID > 2 a 23) e os demais "incapacidade leve"(ID Cada servidor recebeu encaminhamentos individuais, por vezes,
de O a 1). A Tabela 3 mostra a distribuição dos dados em mediana, demandando visitas aos locais de trabalho, sendo preciso elaborar,
quartis, mínimo e máximo para as variáveis HAQ-ID,EVN,total de além do RPS-form, laudos fisioterapêuticos justificando a antecipa
dias afastados e dias afastados por CID-M.
ção da readaptação, embasando o diagnóstico e as restrições a serem

122 123
ponderadas. Um exemplo foi sugerir que o local do trabalho fosse d510 (lavar-se)/
proximo a residência de um servidor, uma vez que,entre as limitações d5102 (secar-se)
1-2 3 0 1-2 0 1-2 1-2 0 0 0 1-2

encontradas, estavam o uso de transportes públicos, manter-se em pé d5101 (lavar o


e segurar a barra do ônibus. Dez deles(23%)foram readaptados pela corpo)/d4105 1-2 4 O 4 1-2 3 3 1-2 3 1-2 3
Prefeitura para outros cargos, dependendo da função exercida ante (curva-se)
riormente, das incapacidades e barreiras presentes. d4l03 (sentar-se) 1-2 3 O 1-2 1-2 1-2 1-2 O 0 1-2 0
Na tabela 5, podem-se observar as incapacidades avaliadas pelo d4452 (alcançar)/
HAQ,pontuadas de O a 4 conforme qualificadores da CIF e os diver d430 (levantar e 3 4 0 3 0 3 1-2 1-2 3 1-2 3
sos encaminhamentos realizados. Foi escolhido o código CID M51 transportar objetos)
para ilustrar a diversidade encontrada, tanto por se tratar da princi d4300 (levantar) 1-2 4 1-2 4 O 3 1-2 1-2 3 3 3
pal causa de afastamentos, totalizando 11 servidores acompanhados d4450 (puxar) 1-2 3 O" 1-2 O 1-2 1-2 0 0 0 0
em 2016, quanto por ser o código que mais afastou os 44 servidores d4453 (rodar ou
acompanhados, conforme dados da Tabela 2. torcer as mãos ou os 1-2 O O 1^2 O 1-2 0 0 3 0 1-2
braços
Tabela 5 — Limitações de atividade, dor e encaminhamentos realizados para os casos d4402(manipular) 1-2 0 0 0 0 1-2 0 1-2 0 O O
avaliados em 2016 afastados por CID M51.
d6200 (comprar)/
CASOS AFASTADOS POR CID M51(n=ll). d860 (transações 1-2 3 0 1-2 0 1-2 0 O O O 3
bancárias simples)
01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11
d540 (vestir-se) / d4701( utilizar
d5402 (calçar)
1-2 3 0 3 0 3 1-2 0 1-2 0 0 transporte 1-2 3 O 1-2 1-2 1-2 0 O O 1-2 1-2
motorizado privado)
d5100 (lavar partes
do corpo)
1-2 3 0 3 0 1-2 0 1-2 0 0 1-2 d6402(limpar a
habitação)/ d6505
d4l04 (pôr-se em pé) 1-2 3 1-2 3 3 3 3 0 1-2 1-2 0 (cuidar das plantas 3 4 0 1-2 3 3 1-2 1-2 3 1-2 3
d4l00 (deitar-se) 1-2 3 1-2 1-2 1-2 3 0 1-2 3 1-2 1-2
de interior e de
exterior)
d550 (comer) 1-2 3 0 1-2 0 3 0 0 0 0 0
ENCAMINHAMENTOS
d560 (beber)/ d4400
1-2 1-2 0 0 0 1-2 0 0 0
(pegar) 0 0 Prática de atividade
C ■ ■ J X X X X X - - - X X -
d598 (autocuidados, risica orientada

outros especificados 1-2 1-2 0 1-2 0 1-2 0 0 0 0 1-2


Terapia Manual-
. X - - X X X - X - - X
— abrir caixa de leite) Usteopatia
d450 (andar) 1-2 3 0 1-2 0 1-2 1-2 0 1-2 0
Palmilhas —
0 X ~ ^ — ^
podoposturologia
d4551 (subir/descer) 1-2 3 0 3 1-2 3 1-2 0 3 3 0
Termoterapia (bolsa
, X X - - X - - - - - -
quente)

124
125
Práticas integratlvas e As contribuições da CIF e as dificuldades enfrentadas
complementares x X X X

(acupuntura, ioga) Os servidores afastados do trabalho por DMEs apresentam dife


rentes características, exercem cargos e funções variadas na Prefeitura
Pilares X
e condições socioeconòmicas distintas, que não podem ser resumidas
Hidxoginástica/ apenas às suas deficiências na função e na estrutura, nem relacionadas
Natação
ao número de dias afastados.
Caminhada
Entre as diversas estruturas corporais, os códigos CID-10 relacio
RPG
X - - - X
nados com a coluna vertebral foram os mais freqüentes (CID M51,
Dança X - X - - CID M54, CID M50), sendo responsáveis pelos maiores índices de
Treino de mecânica
X X X
absenteísmo entre os casos acompanhados. Resultados semelhantes fo
corporal ram encontrados com servidores estaduais, no entanto, com predomí
Escola de coluna nio do CID M54,seguido de M51(VIVOLO,2014). Um mesmo ser
Fisioterapia Serfis X X vidor pode receber códigos diferentes a cada afastamento, dependendo
Psicologia X X
do especiahsta que o avaliou ou do quadro clínico momentâneo, por
vezes-, classificados como CID M51 - "outros transtornos dos discos
Neurologista X
intervertebrais" ou CID M54 — Dorsalgia. Cabe aqui destacar que,
Readaptado
ainda que as "mononeuropatias dos membros superiores" sejam clas
sificadas como CID G56, podem ser, segundo a literatura, ter relação
Entre as principais dificuldades dos servidores afastados por CID com transtornos cervicais(DE-LA-LLAVE-RINCON, 2011).
M51,estão agachar-se(d4l05)ou tomar banho de banheira(d5101), As avaliações realizadas pela fisioterapia permitem identificar e
curva-se para pegar roupas no chão (d4300),fazer tarefas como varrer valorar o grau de funcionalidade. A singularidade fica evidente quan
(d6402) ou cuidar de um jardim (d6505) e levantar o braço e pegar do são comparados os resultados do HAQ de 11 servidores com o
um objeto de 2,5kg acima da cabeça (d430/ d4452). Consideram as mesmo diagnóstico médico CID M51. A diversidade observada de
tarefas de levar até a boca um copo ou xícaras cheios (d560) e abrir monstra que a funcionalidade de um indivíduo em um domínio espe
torneiras com menor limitação (d4402). A análise dos prontuários cífico é uma interação ou relação complexa entre a condição de saúde
revela a variedade de encaminhamentos realizados para os casos em e os fatores contextuais (fatores ambientais e pessoais). É importante
licença médica por CID M51,sendo os mais comuns a indicação de ressaltar que a avaliação não se restringe apenas aos códigos avaliados
prática de atividade física orientada, de práticas integrativas comple pelo HAQ,sendo apresentados para efeitos de comparação.
mentares e de terapia manual.
As percepções individuais da dor, ainda consideradas pela maio
ria dos servidores como deficiências graves ou completas não apresen
taram correlação com os dias afastados. Por outro lado, o ID-HAQ
apresentou correlação significativa com os dias de afastamento por
CID-M. Quando o único sinal de deficiência se apresenta como dor.

126
127
alguns trabalhadores parecem postergar um tratamento adequado. A realizaram várias sessões de Fisioterapia ou outros tratamentos de
dor como sinal de alerta passa a ser reconhecida quando se apresenta saúde, sem observarem melhora do quadro, muitas vezes, restritas
incapacidade, representada por limitação das atividades ou restrição a recursos eletro-termo-foto terapêuticos. Apesar das fortes evidên
na participação, a partir da qual iniciam o acompanhamento de saú cias cientificas sobre os benefícios da cinesioterapia individual e/ou
de. Observamos também uma correlação significativa entre ID-HAQ em grupo, sob a supervisão de um terapeuta ou executados em casa
e EVN, corroborando que a dor é crescente, de acordo com agrava (BRONFORT et ai, 2012), da associação da terapia manual e da
mento da incapacidade. prática educativa nas algias da coluna vertebral (PUENTEDURA;
Após a construção do RPS-form, a equipe pode decidir pela ela FLYNN, 2016), tais tratamentos não são adequadamente ofertados
boração de laudos ergonômicos, sendo realizadas visitas aos postos na rede de saúde do município ou, quando disponíveis, não são co
de trabalho ou perícias para a readaptação dos servidores incapazes bertos pelo plano de saúde, como, por exemplo, tratamentos como
de permanecer nas mesmas funções. Cabe aos estagiários referenciar osteopatia, pilates, RPG e cinesioterapia em grupo.
os servidores para outros profissionais de saúde, orientá-los quanto Os resultados comprovam que, apesar de a CID ser o "padrão
às possibilidades de tratamento, entender as demandas individuais, internacional para propósitos epidemiológicos gerais e administra
confeccionarfolders com orientações, bem como pensar junto com os tivos da saúde", seu uso concomitante com a CIF, seguindo as re
trabalhadores estratégias para reduzir as barreiras existentes e ampliar comendações da OMS (Dl NUBILA e BUCHALLA, 2008), for
os facilitadores. Em alguns casos, foi necessário contrarreferenciar nece informações mais detalhadas sobre a saúde dos trabalhadores
para equipe local o diagnóstico encontrado e os encaminhamentos, afastados por DMEs, sendo uma ferramenta importante na gestão
demandando reavaliações e novas hipóteses diagnósticas. de afastamentos e no acompanhamento longitudinal. Um servidor
Os encaminhamentos realizados devem ser pensados levando em continuará apresentando, por exemplo, o diagnóstico nosológico de
conta o diagnóstico fisioterapêutico, os desejos individuais de cada Espondiliteancilosante"(CID M54), mesmo após retornar ao traba
servidor, o nível socioeconômico e as distâncias de deslocamento. lho, independentemente das melhoras na funcionalidade e qualidade
Atualmente, e possível encaminhar os servidores para as atividades de vida proporcionada por tratamentos adequados.
físicas ofertadas pela Prefeitura, como hidroginástica, alongamento, O uso da CID e da CIF contribui com as periciais geradas nos
dança, ginástica localizada, entre outros. O programa conta com al afastamentos do trabalho, corroborando com as tomadas de decisões,
gumas vagas para pilares com aparelhos reservadas ao programa de seja para a continuidade do afastamento, para a adequação da carta
gestão. Na rede de saúde publica, os estagiários buscam serviços de de restrições ao trabalho do servidor ou mesmo para a indicação da
especialidades que ofertem praticas integrativas complementares, necessidade de readaptação antes do período protocolar de dois anos,
como acupuntura e ioga, bem como atendimentos de saúde oferta para os casos não relacionados a acidentes de trabalho.
dos pelas instituições publicas e privadas da região, como a escola de
coluna, Hidroterapia, Fisioterapia e Psicoterapia. É evidente que a integração entre serviço e ensino na gestão de
afastamentos minimiza as dificuldades encontradas na utilização da
A maior dificuldade e conseguir tratamentos gratuitos adequa CIF na rotina dos serviços, seja pela sua complexidade ou pelo tempo
dos, capazes de atuar nas múltiplas causas de seus problemas e não, necessário para sua aplicação. O uso da CIF iniciou como parte das
somente, nos seus sintomas, uma vez que muitos dos servidores já ações ofertadas pelo estágio, sendo possível, por meio dos resultados

128
129
encontrados, mostrar a importância de romper com o modelo biomé- em 2016, denominada "a cozinha e o movimento em equilíbrio: vi
dico na gestáo de afastamentos, trazendo o desafio de continuar com vências e percepções corporais". Foi elaborada pelos estagiários após
o projeto, independentemente da articulação com a universidade. visitarem duas cozinhas, entrevistarem os trabalhadores e pensarem
Do ponto de vista prático, a aplicação da CIF requer um tempo na mecânica corporal favorável e factível para cada ação e possibili
muitas vezes maior do que a consulta realizada no serviço, sendo viá
dades reais de redução dos danos. Os resultados serão apresentados
vel dentro do modelo pedagógico de ensino do estágio, mas requer ou aos gestores da Secretaria de Educação, podendo, quem sabe, nortear
intervenções no trabalho e nos ambientes de trabalho.
tras estratégias para sua ampliação. Entre as propostas, está a inserção
do questionário HAQ nas perícias médicas dos servidores afastados por Outro desafio será contar com toda a equipe multiprofissional,
CID M, devido aos resultados encontrados nesse esmdo. Como acon pois, para que a proposta seja inserida na rotina, será preciso lidar
tece com qualquer instrumento, o HAQ tem limitações, não captando como aspectos inerentes às mudanças de conduta por parte dos pro
questões relacionadas às funções, às estruturas, aos fiitores ambientais ou fissionais da área da saúde, ainda restritos ao modelo biomédico, as
à qualidade de vida percebida. A princípio, foram testados outros ques sim como a necessidade de modernizar o aplicativo e os bancos de
tionários, incluindo a lista proposta por Araújo e Buchalla para fisiotera dados para o registro, acompanhamento e controle digital das solici
pia do trabalho (2013), mas não teríamos equipe suficiente ou ficaríamos tações de afastamentos, incluindo o grau de funcionalidade.
ainda restritos a um pequeno percentual dos casos de DMEs.
Resta a dúvida se o questionário HAQserá aplicado em todos os Considerações finais
casos que se afastarem ou apenas naqueles cujos afastamentos sejam
superiores há 90 dias. Para responder à tal questão, está sendo realiza O uso do modelo da CIF e da teoria biopsicossocial e espiritu
da outra pesquisa para comparar a qualidade de vida e funcionalidade al como ferramenta clínica e pedagógica no estágio de Fisioterapia
dos servidores afastados há mais de 90 dias, confrontando o grupo do trabalho mostrou a complexidade do processo de funcionalidade
com afastamentos esporádicos, para nortear o início do uso do HAQ e incapacidade humana e permitiu a reflexão sobre os limites e as
em 2017. A princípio, será possível avaliar o índice de funcionalida dificuldades na gestão de afastamentos por DMEs, principalmente,
de, acompanhar a progressão dos casos e identificar algumas incapa- se restritos apenas a doença. Os resultados confirmam que apenas o
cidades comuns para cada uma dos CID M. Se os resultados forem diagnóstico etiológico e o número de dias afastados não conseguem
positivos, pode-se ampliar para os periódicos, pensando na prevenção auxiliar a gestão de afastamentos na redução de danos e seqüelas por
de DMEs e não somente na prevenção de agravos. DMEs e nas ações de promoção à saúde e prevenção.
Uma das possibilidades é pensar como a equipe pode acompa Se, por um lado, estar no DEGEPAT aproxima os estagiários dos
nhar servidores que ainda não se afastaram do trabalho, por meio de casos já com incapacidades graves, afastando-os da prática diária em
inquéritos por secretarias ou na página do servidor. Como exemplo, ergonomia, por outro, permite conhecer os itinerários terapêuticos,
podemos citar o caso das cozinheiras que, após o levantamento dos as singularidades dos casos e os múltiplos fatores influenciadores da
índices de absenteísmo, foi possível aplica com todos os trabalhado funcionalidade humana. Permite conhecer a linha de cuidado em
res (n = 333) o HAQ e o Questionário Nórdico de Sintomas Oste- saúde do trabalhador, o papel ampliado da Fisioterapia do trabalho,
omusculares. Os resultados subsidiaram uma das oficinas da SIPAT
das redes de saúde e as dificuldades e potencialidades do trabalho
multiprofissional.

130 131
A identificação dos problemas e das necessidades dos trabalha Leituras recomendadas
dores é o primeiro passo na gestão de afastamentos. A diversidade
de itinerários terapêuticos comprova os limites do modelo biomédi- ALLAN; C.M.; CAMPBELL, W.N.; GUPTILL, C.A.; STEPHENSON, EE; CAMPBELL, K.E. A
Conceptual model for interprofessional education: The International Classification of Functioning,
co na redução dos índices de absenteísmo por DMEs. Informações Disability and Health (ICF). Journal ofInterprofessional Gare. v.20, n.3, p. 235-245,jun. 2006.
precisas e consensuais são necessárias para o planejamento, tomada E. S. A Classificação Internacional de Funcionalidade,Incapacidade e Saúde(CIF)em Fisio
de decisões pelos gestores, demandando uma linguagem comum na terapia; uma revisão bibliográfica. 2008. 117f. Dissertação (Mestrado em Epidemiologia) - Faculdade
equipe multiprofissional, que pode ser obtida a partir do uso da CIF de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, 2008.

e, obrigatoriamente, deverá ser inserida no serviço a partir de 2018 ARAÚJO,E. S.; BUCHALLA C. M.Utilização da CIF em Fisioterapia do trabalho: uma contribuição
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para avaliação dos casos aposentados por invalidez.
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do trabalhador e traz embasamentos científicos para a política do (LER), distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (Dort)/ Ministério da Saúde,Secretaria de
Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador. — Bra
"Programa de gestão de afastamentos", bem como um olhar am sília: Editora do Ministério da Saúde, 2012.
pliado para o "Programa de promoção à saúde e qualidade de vida BRONFORT, G.; EVANS, R.; ANDERSON, A.V.; SVENDSEN, K.H.; BRACHA, Y.; GRIMM,
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Estado da Saúde de São Paulo, 2014.

Neste capítulo, apresentaremos a experiência acerca das formas


como a Classificação Internacional de Funcionalidade - CIF foi
abordada na Universidade Federal de Sergipe e seus componentes,
particularmente no Flospital Universitário de Aracaju (HU) e no
Grupo de Pesquisa e Extensão em Funcionalidade Humana — GPE-
FH. Incluiremos, aqui, os problemas encontrados pelos quais foram
pensadas soluções que necessitavam do uso da CIF para sua reso
lução. Para melhor entendimento do leitor, o capítulo foi dividido
em Ensino, Pesquisa, Extensão, Assistência e Gestão, entretanto é
importante ressaltar que boa parte das abordagens relatadas é trans
versal a estas temáticas.

134 135
-ali
ENSINO meio da modificação das categorias e dos qualificadores utilizados,
A necessidade de inclusão da CIF no conteúdo abordado na gradu quantificando-se a funcionalidade dos pacientes de acordo com os
ação em Fisioterapia surgiu a partir da limitação dos alunos na avaliação instrumentos e métodos de avaliação utilizados pelos alunos. Com
da funcionalidade dos pacientes. Com a utilização de instrumentos de o objetivo de aprimorar o critério de alta, a CIF também foi adicio
avaliação padronizados, não se conseguia dar visibilidade a diversos obs nada como possibilidade de traçar metas e verificar o momento ideal
táculos, que não físicos, pelos quais os indivíduos ali tratados passavam. de alta terapêutica para o paciente, sendo construído um instrumen
Neste momento, não sabíamos se a diretriz de tratamento organizada to de autorrelato a partir da CIF, de perguntas e respostas, como um
dos recursos utilizados como critério de alta(FIGURA 1).
pelo aluno tinha, de fato, foco no objetivo funcional do paciente, uma
vez que não eram considerados na avaliação os aspectos relacionados a

a fatores ambientais, pessoais e de atividade e participação. Tentando •c


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entender melhor essas limitações, implementou-se inicialmente a CIF VOCÊ APRESENTA DIFICULDADE PARA: u
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no estágio supervisionado de ortopedia, quando, gradualmente, a cada R

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turma de discentes que entravam, novas idéias e possibilidades foram a

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agregadas, com base em discussões entre alunos e professores, como (1155-Inlciiir e concluir n execuçüo de uinn tnrera
dI550-Adquirir novas competências que sejam fáceis de manusear,como utilizar um
0

0
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2
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3 4
forma de tornar a prática mais completa e fundamentada. O principal aparato para alimentar-se.
dl551 - Adquirir novas competências que sejam complexas de realizar como aprender a 0 1 2 3 4

objetivo desse aprendizado é que os alunos possam fundamentar-se no jogar xadrez ou utilizar uma ferramenta de construção
(1210-Realtznr tarefa únlcn

modelo teórico da CIF, possibilitando uma abordagem mais ampla em d2100 - Realizar um tarefa simples,como fazer a cnma nu ler um livro
d2101 -Realizaruma tarefa mais complexa,composta de mais de um elemento,como por
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suas avaliações e elaboração de suas condutas, tendo como foco princi exemplo arrumar os móveis da casa
(1240-Lidar com o esti es.se e ouü as e.\Í2êncÍas nsicolÓ2ica.s advindas das tai-efas dióilas
pal da intervenção o objetivo funcional que o paciente entende como d2401-Enfrentar o estresse,a pressão ou a urgência para realizar tarefas
Mudar e manter a posição do corpo (d410-d429)
0 I 2 3 4

mais importante e, que, a partir da classificação da condição de saúde d410 Mudar a po.sÍcão básica do coido
d4100 Deitar-se
0 1 2 3 4
0 1 2 3 4
de seus pacientes, possam comparar resultados de intervenções, o per d4101 Agacbar-se
d4102 Ajoelliar-se
0 1 2 3 4
0 1 2 3 4
fil de funcionalidades ao longo do tempo. A avaliação fisioterapêutica d4103 Sentar-se
d4104 Pôr-se em pé
0 1 2 3 4
0 1 2 3 4
pode então agregar pontos normalmente não investigados, tais como: d4105 Curvar-se 0 1 2 3 4
d4106Mudaro centro de gravidade do corpo 0 1 2 3 4
aspectos ambientais, de atividade e participação, transporte, políticas d415 Manter a posição do corpo 0 1 2 3 4
d4150 Permanecer deitado 0 1 2 3 4
públicas e acesso a serviços, todos contemplados pela CIF. d4151 Permaneceragachado 0 1 2 3 4
d4152 Permanecer ajoelhado 0 1 2 3 4

Tendo em vista esta nova perspectiva de avaliação, foi construído


Figura 1. Instrumento de autorrelato como critério de alta tetapêutica.(Quadro
um checklist em ortopedia baseado no perfil de pacientes atendidos. Próprio-GPEFH)
Ainda que resumido, os discentes apresentavam dificuldade para sua
utilização, tendo em vista que eram dez páginas e, naquele momento No sistema da Universidade, os alunos fazem permuta de estágios;
inicial, os alunos ainda não tinham habilidade para seu uso. Pensan após passarem pelo estágio de ortopedia com essa nova visão da CIF, a
do nisso, sistematizou-se um inquérito de perguntas que norteava demanda de uma avaliação mais completa chegou ao estágio de cardior-
o uso do checklist, pelo qual eram planejadas metas de tratamento respiratória, construída de forma similar à citada anteriormente, mas
fisioterapêutico, relatórios de alta, incluindo-se tabelas baseadas na agora para os ambientes de enfermaria e UTI. Seu uso tornou-se extre
CIF que comparavam a avaliação inicial e final dos pacientes, por mamente viável e aceitado tanto pelos alunos como pelos profissionais

136 137
que ali já trabalhavam, motivo pelo qual, nos dias de hoje, a ficha já foi PESQUISA
validada e implementada como parte do serviço do Hospital Universi
No âmbito da pesquisa, o Grupo de Pesquisa em Funcionalidade
tário da UFS.
Humana (GPEFH) tem desenvolvido estudos com a inserção do con
Entretanto, no decorrer desse processo, onde novos alunos chega ceito biopsicossocial e da CIF em condições de saúde diversas, resumi
vam ainda desconhecendo a CIF e sua aplicabilidade e apresentavam das no Quadro 1.
conceitos vagos sobre o que se tratava, tornou-se o ponto limitador de
sua implementação. Pensando em resolver esse problema de forma an
Quadro 1: Principais linhas de pesquisa do GPEFH com inserção da CIF
tecipada, surgiu a idéia de uma disciplina optativa sobre a CIF, estimu
lando os alunos a conhecerem o instrumento de forma mais detalhada, - Construção e validação de
Exemplo:
no que diz respeito ao modelo, à estrutura e sua aplicação prática. Para instrumentos de avaliação
Associação da
abranger não só os alunos da graduação mas também outros profissio Ciências do funcional baseados na CIF
Funcionalidade, Saúde e
nais e discentes de pós-graduação envolvidos nas atividades da univer funcionamento - Epidemiologia funcional/
Incapacidade com avaliação
sidade e do estado, foram ofertados cursos de formação sobre a CIF, humano Mapeamento do perfil funcional
funcional em idosas em dois
- Avaliação do impacto funcional
com a mesma proposta e conteúdo da disciplina. O curso é dividido em diferentes treinamentos
de situações de saúde
teoria e prática, sendo que, nesta última, as atividades são adaptadas a
depender do público-alvo, que consistem em classificação de casos clí - Avaliação de programas de
nicos, correlação de instrumentos e teste de avaliação de cada área com intervenção em reabilitação
Exemplo:
a CIF, entre outras demandas que venham a ocorrer durante o curso, - Avaliação de tecnologias em
Análise da funcionalidade
saúde
permitindo uma maior interação e aprendizagem dos envolvidos. antes e depois de dez sessões
Ciências da - Avaliação de serviços de saúde
de fisioterapia em indivíduos
Concomitante a estes episódios, foram realizados, juntamente reabilitação (Políticas e legislação de saúde, a
com diferentes graus de
com a Comissão de Saúde Funcional do CREFFITO 7, quatro Fó economia de reabilitação)
osteoartrose de joelho
runs de Saúde Funcional, envolvendo discentes, docentes e profissio (**ProJetos que vão desde
estudos controlados aleatórios a
nais convidados. Estes eventos objetivavam aumentar a visibilidade
estudos observacionais)
acerca da CIF e os projetos que vinham sendo desenvolvidos sobre
o tema, como forma de que mais pessoas se interessassem pelo uso - Desenvolvimento de
Exemplo:
da classificação. Para construção da programação, buscou-se convidar protocolos de gestão
Programa de triagem e
profissionais renomados e com vasto conhecimento sobre o assunto - Gestão da qualidade da
Administração e intervenções funcionais
e abordar diferentes temas sobre a CIF, permitindo demonstrar suas reabilitação
gestão: dos pacientes admitidos no
- Desenvolvimento de sistema de
possibilidades de uso e suas bases legais. Além disso, o evento con ambulatório de fisioterapia
informação para sistematização
tou com a apresentação de trabalhos científicos em formato de pôster, da aplicação da CIF
do HU
como forma de expor os trabalhos que vinham sendo realizados, o que
foi fundamental para que os participantes dos congressos pudessem se
inteirar melhor sobre o assunto.

138 139
EXTENSÃO barreiras ambientais e outras necessidades que, porventura, venham a
Entendendo que o modelo linear de educação pouco propicia a aparecer ao longo do acompanhamento destes no programa desenvol
interação da graduação com a comunidade que vive ao seu redor, difi vido no hospital. A finalidade deste projeto é fazer com que os alunos
cultando o preparo dos alunos para lidar com as demandas e necessida levantem as principais questões de saúde consideradas importantes para
des do SUS. Para que haja um maior envolvimento do discente com a todos aqueles sujeitos envolvidos nesta nova situação de saúde.
comunidade e suas reais demandas, o GPEFH desenvolve ações de ex
tensão voltadas para as necessidades da comunidade local, com base no
modelo biopsicossocial e na CIE, englobando perspectivas de avaliação ASSISTÊNCIA E GESTÃO DO HOSPITAL
e tratamento com seu embasamento.
UNIVERSITÁRIO DE SERGIPE

Nesse sentido, criou-se um projeto de extensão para triagem do flu Mantendo a idéia de que a CIE pode melhorar o ambiente em saúde,
xo de recebimento dos pacientes no ambulatório de traumato-ortopédi- pensa-se em sua aplicação não só de forma prévia à saída daquele futuro
ca, inserindo alunos de graduação nesse acolhimento. A proposta é que profissional do ambiente acadêmico mas também sua aplicação na assis
os alunos de graduação envolvidos identifiquem os diferentes graus de tência e gestão dos serviços em saúde de modo geral.
comprometimento da funcionalidade e como podem ser atendidas de Para facilitar a implementação do uso da CIE na Unidade de Reabi
mandas previas, antes mesmo de o indivíduo ser inserido no programa litação, ferramentas para documentação/registro baseadas na CIE foram
de reabilitação. Para isso, construiu-se uma ficha de avaliação, baseada desenvolvidas para utilização na prática clínica. A parceria da Unidade
em diversas discussões do grupo acerca das categorias que seriam abran de Reabilitação com o Departamento de fisioterapia permitiu a co
gidas, que, ao final de sua construção, conseguiu envolver tanto fatores laboração de professores e graduandos no processo de construção de
físicos como biopsicossociais. instrumentos de avaliação de funcionalidade para condições específicas
Como forma de acompanhar o desenvolvimento dos pacientes de saúde e na capacitação dos profissionais.
em protocolos de tratamento predeterminados, dois projetos de ex
tensão foram criados para duas diferentes demandas da comunidade Serviço Hospitalar — UTI e Unidades de internamento
local: osteoartrose de joelho e lombalgia crônica. Nestas propostas,
são codificados instrumentos considerados padrão-ouro para avaliação Um modelo de assistência baseado na funcionalidade, onde
desses sujeitos, assim como são utilizados os qualificadores da CIE, fatores psicológicos, sociais e ambientais, por exemplo, podem in
para graduar o nível de funcionalidade encontrada. Aqui, objetiva-se terferir em diferentes áreas que, somadas, alteram positivamente
analisar o impacto dos fatores descritos pela CIE sobre a saúde fun o resultado clínico da tomada de decisão. Isto pode ser levado em
cional do indivíduo durante todo o momento de acompanhamento consideração nas situações em que o paciente é acompanhado a
destes indivíduos no programa de reabilitação. longo prazo, como em hospitais de alta complexidade. Em um am
biente hospitalar, em que o paciente tem contato com diversos
Em uma visão de acompanhamento não só do paciente mas tam profissionais da saúde, o acompanhamento de sua evolução funcio
bém das famílias envolvidas, o GPEEH também vem buscando o mape nal ao longo do tratamento pode ajudar tanto a melhorar o mape
amento das barreiras naqueles indivíduos que convivem com a Microce- amento desse resultado quanto a melhorar a unificação e troca de
falia. Os discentes sao orientados a avaliar domínios como função física. informação entre os profissionais ali inseridos.

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141
ré ;sí¥-
Nesse sentido, a implementação do instrumento de avaliação fun SISTEMA DE INFORMAÇÃO:AVALIAÇÃO E
cional baseada na CIF nos serviços de fisioterapia(UTI e Unidades de MAPEAMENTO FUNCIONAL BASEADO NA CIF
Internamento) tem permitido o mapeamento do perfil funcional dos Com a experiência nesses dois anos de implantação da CIF no
pacientes atendidos nestes serviços e, assim, possibilitado a criação e Hospital Universitário de Sergipe, percebeu-se a necessidade de de
monitorização de indicadores de gestão e assistência em saúde. senvolvimento de mecanismos que facilitem a utilização sistematiza
O instrumento de avaliação foi desenvolvido para facilitar e pro da da CIF na prática clínica de fisioterapeutas e outros profissionais
mover o uso da CIF na prática clínica por profissionais de serviços de da equipe multidisciplinar. Desta forma, em parceria com o Setor de
reabilitação no ambiente hospitalar, procurado identificar os aspectos Gestão de Processos e Tecnologia da Informação, está em andamento
de funcionamento mais relevantes para os pacientes. um novo projeto que tem como produto um sistema informatizado
para avaliação e mapeamento funcional baseada na CIF auxiliando os
profissionais a introduzir, de forma sistematizada, a CIF na sua prática
Serviço Ambulatorial clínica e de gestão.
Em fase de implantação, está sendo testado no ambulatório de Fi A produção de sistemas de informação para auxiliar na organização
sioterapia um protocolo de triagem de pacientes com disfunçóes mus- dos serviços de saúde é prerrogativa reconhecida. A Política Nacional de
culoesqueléticas baseado na CIF e associado a um serviço de acolhimen Informação e Informática em Saúde (PNIIS), aprovada na 12^ Confe
to, objetivando tornar o processo de triagem dos pacientes mais ágil e, rência Nacional de Saúde(CNS), realizada em 2003, busca desenvolver
consequentemente, reduzir as filas de espera e ainda tornar a priorização uma política de informação e comunicação articulada, no intuito de
do serviço mais condizente com as reais necessidades dos perfis funcio ampliar a informação para contribuir com o direcionamento e a melho
nais dos pacientes. ria dos serviços de saúde (BRASIL, Ministério da Saúde, 2016).
No serviço de fisioterapia traumato-ortopédica, os indicadores de
funcionalidade baseados na CIF estão sendo utilizados para monitori
CONSIDERAÇÕES FINAIS
zação dos resultados alcançados com as intervenções e a monitorização
da qualidade do serviço prestado. Apesar da extensão de categorias da CIF e da dificuldade de aplica
Ações com o intuito de mapeamento do perfil funcional e monito
ção na prática clínica, é notório que a inclusão do modelo biopsicossocial
sob a perspectiva da CIF é necessária nos serviços. Para isso, necessita-se
rização dos indicadores de funcionalidade também estão sendo realiza
de uma interação entre ensino, pesquisa, extensão, assistência e gestão.
das no serviço de reabilitação multiprofissional de crianças com micro-
Dessa forma, em se tratando do HU Aracaju e da realidade da UFS, o
cefalia (Fisioterapia e Fonoaudiologia).
envolvimento de alunos de graduação, pesquisa, extensão e profissionais
do Hospital em parceria com o Grupo de Pesquisa e Extensão em Funcio
nalidade Humana- o GPEFH têm sido facilitadores para essa interação.
Com isso, a CIF pode ser disseminada de forma transversal pelos diferen
tes âmbitos da Universidade, tornando-a atemporal às necessidades que
apareceram e aquelas que estão por vir.

142 143
Leitura recomendada
1. WORLD HEALTH ORGANIZATION. Intemational Cla^sification ofFunctíoning,Disability
and Health:ICF. World Health Organization, 2001.
2. Organização Mundial da Saúde, Direção Geral da Saúde. Classificação Internacional de Funciona USO DA CIF EM UMA INSTITUIÇÃO PÚBLICA
lidade,Incapacidade e Saúde: CIF. Lisboa: WHO;2004.
3. SOUZA, Elenilton Correia de; FARIAS NETO,Jader Pereira de; GRIGOLETTO, Marzo Edir da
Silva. Functional rraining and intemational classification offúnctioning: an approach. RevisU Brasi Juliana Schoítão Luna
Fiúoterapeuta. Mestre em Saúde Coletiva
leira de Cineantropometria & Desempenho Humano, v. 18, n. 4, p. 493-497, 2016.
4. DE FARIAS NETO,Jader Pereira et d. Aplicação da cif e sua correlação com instmmentos de ava
liação em ortopedia durante prática supervisionada em fisioterapia aplicada a ortopedia. Cadernos de
educação,saúde e fisioterapia, v. 2, n. 3, 2015.
5. DE FARIAS NETO,Jader Pereira etd. Correlação da cif a instrumentos de avaliação em ortopedia:
um esmdo piloto. Cadernos de educação,saúde e fisioterapia, v. 2, n. 3,2015. Decorridos mais de 15 anos de sua publicação pela OrganÍ2ação Mun
6. FARIAS NETO, J. P.; GRIGOLETTO, M. E. S. ; SILVA JÚNIOR, W. M.; SOUZA, E. C. ; dial da Saúde, fez-se ainda extremamente útil e necessária a discussão sobre
SANTANA, M.M.S. Associação da fimcionalidade, saúde e incapacidade com avaliação fimcional eni os vários aspectos e desafios que envolvem a operacionalização da Classifica
idosas em dois diferentes tipos de treinamento. Motricidade (Santa Maria da Feira), 2016. ção Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF).
7. NETO, Maurício Lima Pedroso et d. Constmção de um core ser da cif para mieloradiculopatia
esquistossomótica a partir de protocolo de avaliação adaptado. Cadernos de educação,saúde e fisio- Internacionalmente são maiores os avanços nesse sentido, mas no
terapia, v. 1, n. 1, 2014. Brasil, apesar de reconhecida importância, o uso da CIF ainda é in
8. DE BRITO,Rafael Sousa etd.Intervenções llincionais em pacientes com mielorradiculopatia esquistos- cipiente e são necessários esforços para superarmos os obstáculos que
somótica do Município de Umbaúba/SE. Cadernos de educação,saúde e fisioterapia, v. 1, n. 1, 2014. aparecem na prática e adotarmos definitivamente a classificação.
9. DE FARIAS NETO,Jader Pereira et d. Classificação do estado de saúde de sujeitos com mielorra
diculopatia esquistossomótica no Estado de Sergipe. Cadernos de educação, saúde e fisioterapia v. Em um momento em que a expectativa de vida é alta e o en
l,n. 1,2014. velhecimento populacional se faz cada vez mais presente na popula
10. SILVA, Bmbara Nívia de O. et d. Aplicação da classificação internacional de funcionalidade, inca ção brasileira, torna-se urgente repensar as ações de saúde de forma a
pacidade e saúde em Unidade de Terapia Intensiva Cardiotorácica. Fisioterapia Brasil, v 17 n 2 p promover um envelhecimento saudável e com maior funciondidade
107-118,2016. '
possível aos indivíduos.
11. DE FARIAS NETO,Jader Pereira et d. Impactos da aplicação de um check list da classificação
internacional de funcionalidade incapacidade e saúde no estágio supervisionado de traumato-ortopedia Para isso, são necessárias estratégias voltadas não só ao controle e
da Universidade Federal de Sergipe. Cadernos de educação,saúde e fisioterapia, v. 1, n. 1, 2014.
manejo de doenças, mas condutas específicas e direcionadas às conse
12. DE AI^ÚJO,Eduardo Santana de. A Classificação Internacional de Funcionalidade,Incapaci qüências advindas das disfunçóes crônicas, altamente prevalentes nos
dade e Saúde (CIF) em fisioterapia: uma revisão bibUográfica. 2008. Tese de Doutorado. Universi
dade de São Paulo. Faculdade de Saúde Pública. Departamento de Epidemiologia. dias de hoje, bem como aos efeitos do envelhecimento populacional,
13. DE ARAÚJO,Eduardo Santana; MAGGI,Luís Eduardo; REICHERT,Tatiana Tanaka. CIF NOS de preferência iniciando as intervenções bem antes do aparecimento
SISTEMAS MUNICIPAIS DE SAÚDE. Revista CIF Brasil, v. 3, n. 3, 2015. das limitações.
14. DE ARAÚJO, Eduardo Santana. HEALTH INDICATORS ABOUT FUNCTÍONING AND
DISABILITY. Revista CIF Brasil, v. 1, n. 1, p. 27-33, 2014.
Pautada no modelo biopsicossocial da OMS, a CIF se constitui
em um instrumento capaz de classificar de forma integral a saúde
de cada indivíduo e contribuir de maneira essencial com o planeja
mento de ações efetivas e atualizadas para esse contexto. Foi criada
144
145
para complementar as informações obtidas com a Classificação In e se definindo na limitação das capacidades e/ou da participação social,
ternacional Estatística de Doenças (CID) e oferecer uma visão mais influenciada pelos fatores ambientais.
completa sobre a saúde das populações.
O ambiente é definido como o meio no qual cada indivíduo está in
De escopo amplo e aplicabilidade em inúmeras áreas, sua utilização serido, incluindo o local onde mora, onde trabalha, os serviços aos quais
propõe uma mudança na forma de definir, planejar e promover a saúde. tem acesso, as pessoas com quem se relaciona, entre outros. Considerado
Reunindo os diferentes aspectos relacionados à funcionalidade dos in extremamente importante, o meio ambiente é proposto pela CIF como
divíduos, a CIF estende o olhar para os fatores que externamente, mas influenciadores da funcionalidade, podendo ser a chave para a recupera
de forma importante, influenciam esse construto. ção parcial ou total da limitação do indivíduo no seu contexto de vida.
Para uma atenção integral, é preciso saber mais que o diagnóstico Talvez seja esse o primeiro obstáculo a ser superado quando se de
e conhecer também o estado de saúde das pessoas. Saber como estão vi cide utilizar a CIF. Assimilar esses conceitos significa ampliar o conhe
vendo, em que condições e com quais limitações. A implantação da CIF cimento, muitas vezes aprendido sob o enfoque do modelo biomédico,
é parte essencial dessa trajetória e é fundamental para dar qualidade às no qual ainda se baseiam muitas formações, e que limita a forma de
informações obtidas, enriquecendo a forma de se abordarem as questões entender a incapacidade, vinculando-a aos processos de adoecimento
de funcionalidade e incapacidade, estendendo a atenção para o ambien ou à presença de doenças. Como conseqüência, direciona-se um inves
te, para a sociedade, para as oportunidades de acesso, para as políticas timento incessante pela cura do indivíduo, desperdiçando esforços e
públicas e para todos e quaisquer fatores que diretamente se relacionem recursos que poderiam ser destinados à modificação dos fatores contex-
com a presença ou não de uma limitação. tuais, potencialmente capazes de promover a participação do indivíduo
A sua implantação significa mais do que disponibilizar um instru a despeito de sua deficiência ou limitação.
mento para classificar afecções ou para classificar as incapacidades, mas Ultrapassando esse modelo, pode-se pensar a incapacidade, par
representa uma proposta de rediscutir o modelo de saúde vigente sob tindo do meio ambiente, analisando quais fatores podem contribuir
uma ótica ampliada e contemporânea capaz de atender às necessidades para que determinado indivíduo passe a realizar determinada atividade,
que já se fazem presentes. utilizando-se de recursos ou oportunidades de acesso.
Faz-se necessário entender e diferenciar bem os conceitos a partir Os fatores ambientais são determinantes na participação social, ou
da CIF. A funcionalidade é vista como inerente a qualquer indivíduo seja, na realização das atividades de vida, como trabalhar, estudar, rela-
e definida sob um enfoque positivo na capacidade e na participação cionar-se, entre outras. É o ambiente que promove a realização adequada
dos indivíduos em suas diversas situações cotidianas. Esta participação das atividades à medida que está adaptado ao indivíduo com limitação
é necessária para uma vida com qualidade e influenciada de maneira e à medida que oferece tecnologia, serviços e apoio de forma igualitária
positiva ou negativa pelo meio ambiente no qual cada um está inserido, e integral à população. O ambiente adequado pode reduzir ou eliminar
independentemente da presença de qualquer doença. Já a incapacidade em grande parte os problemas relacionados às incapacidades, indepen
tem um sentido negativo comparada à funcionalidade. Também anali dentemente dos diagnósticos e das deficiências prevalentes.
sada de forma desvinculada da doença, é vista como uma condição uni
versal que pode afetar a saúde de qualquer pessoa em qualquer momen Nesse sentido, a CIF se aplica a diferentes contextos e realidades,
to da vida, tendo ou não relação com alguma patologia ou deficiência dando visibilidade à diversidade de fatores que podem estar envolvidos
com a presença de uma limitação funcional.
146
147
Dentro de uma instituição publica, seu uso pode ter grande rele principalmente, a mudanças no ambiente de trabalho, sem as quais se
vância na geração de informações que demonstrem a situação de saúde torna improdutiva a maioria das intervenções.
de seus trabalhadores. Área importantíssima da saúde coletiva, a saúde
do trabalhador vem ainda se estruturando em nosso país. Atribm'da ao Setores de reabilitação ocupacional e de segurança do trabalho po
Sistema Único de Saúde (SUS), é uma área que vem caminhando de for dem se beneficiar grandemente do uso da CIF codificando informa
ma lenta, tentando se estabelecer definitivamente como direito e fimcio- ções relacionadas à funcionalidade dos indivíduos, levando em conta
nar com plenitude. A vigilância ainda é muito aquém do que seria ideal, o ambiente, que precisa ser considerado para uma reinserção funcional
principalmente em regiões mais distantes dos grandes centros do país, e adequada e duradoura.
o trabalhador se vê suscetível ao adoecimento,sem possibilidade de inter Além disso, as informações obtidas servirão como um parâmetro a
venções adequadas em tempo e em condutas, tendo de se responsabilizar cada reavaliação, em que se podem evidenciar os avanços ou retrocessos
pela sua.recuperação e reinserção funcional. surgidos ao longo das intervenções cada vez que se classifica a situação
Nesse âmbito, a utilização rotineira da CIF pelos setores encarre de saúde de um trabalhador específico. Por essas informações disponibi
gados de assistir os trabalhadores pode tornar visíveis informações es lizadas pelos códigos, podem-se periodicamente reorganizar e atualizar
senciais para a melhora no planejamento e na execução de ações de as propostas, os objetivos e as condutas traçados inicialmente.
proteção, prevenção e promoção de saúde dessa população. É relevante frisar que os dados a respeito da funcionalidade, ob
Diagnósticos de doenças ocupacionais, como, por exemplo, as tidos com a CIF, poderão ser compartilhados entre profissionais, ser
Doenças Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (Dorts) e os viços e pesquisadores, já que os códigos são padronizados e unificam
comprometimentos mentais como a Depressão, vêm acometendo de a linguagem relacionada à funcionalidade. Mais importante ainda é
forma epidêmica os trabalhadores, situação evidenciada claramente que isso poderá ser integrado aos sistemas de informação e eviden
pelo aumento da prevalência dessas doenças percebido por meio dos ciar um panorama da situação de saúde laborai em nosso país, possi
sistemas de informação, obtida com o uso da Classificação Estatística bilitando análises estatísticas e construção de indicadores, essenciais
Internacional de Doenças. para o sucesso das ações nessa ou em qualquer área de interesse.
A partir disso, e necessário saber como intervir nessa realidade, São claros os benefícios que serão obtidos no campo da saúde do
e a CIF pode disponibilizar as informações complementares acerca de trabalhador quando a CIF estiver definitivamente integrada. No en
como cada trabalhador está vivenciando, doente ou não, o dia a dia no tanto, para alcançar o efetivo uso da classificação, algumas dificuldades
ambiente de trabalho.
devem ser superadas, e a troca de experiências se faz fundamental para
acelerar esse processo.
Por meio dos dados gerados com o uso das duas classificações de
referencia da OMS,CIF e CID, sera possível acompanhar a situação de Ainda existe muito desconhecimento acerca da importância
saúde de cada trabalhador ao longo de sua permanência no trabalho. Des e, até mesmo, da existência da classificação por parte de gestores,
de sua admissão até o processo de aposentadoria, será possível identificar profissionais de saúde, da educação, da área social, enfim, das equi
precocemente qualquer dificuldade ou alteração que venha a ocorrer an pes em geral. Principalmente nas regiões mais distantes dos gran
tes, apos ou independentemente da instalação de uma patologia, possi des centros, faz-se necessário um trabalho inicial de apresentação e
bilitando a elaboração de medidas efetivas direcionadas ao indivíduo e. divulgação da classificação.

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Apesar de 15 anos de sua publicação e do envolvimento constante Além disso, à primeira vista, a utilização da CIF em sua forma com
do Brasil em pesquisas com a OMS para sua tradução e implantação, pleta demanda muito tempo para a avaliação, e não favorece uma pa
muitos profissionais ainda desconhecem essa ferramenta. É preciso, pri dronização entre seus usuários,já que o número de códigos gerados para
meiramente, trazer ao conhecimento das equipes a sua existência. um mesmo indivíduo pode ser muito grande e variar de um profissional
A CIF é de acesso livre, disponibilizada no site da OMS,juntamen para outro. Isso desfavorece um dos intuitos da classificação que é servir
te com um material autoexplicativo que aborda o processo histórico da como referência para melhorar a comunicação e a troca de informação
sua criação até a definitiva publicação. O conteúdo da classificação é entre os profissionais de diferentes áreas, nos diferentes serviços e em
disponibilizado, composto pelas categorias e por uma explicação deta diferentes regiões e países.
lhada sobre a forma correta de sua utilização. A forma de se contornar essa dificuldade decorrente da extensão da

O que se vê na prática, porém,é que a leitura desse material é na maio classificação já vem sendo discutida há alguns anos e é bem apresentada na
ria das vezes insuficiente para esclarecer de forma satisfatória os leitores que literatura científica e nos treinamentos envolvendo a utilização da CIF.
pretendem utilizá-la, seja com objetivo científico ou técnico, o que acaba Trata-se da utilização da classificação a partir de listas resumidas
por desacelerar o seu processo de implantação. Sendo assim, para aqueles baseadas na CIF, internacionalmente conhecidas como "core sets\ que
que querem se aprofundar e tornar real o uso da CIF é interessante e até po reúnem um número mínimo de categorias para classificar a função de
de-se dizer recomendável, um treinamento específico, em forma de cursos determinado grupo de pessoas.
ou oficinas, para que se compreenda exatamente a proposta da rlassifirarãn Apesar de parecer limitante utilizar apenas segmentos da CIF, a
e torne-se clara a melhor forma de operá-la. opção pelas listas reduzidas é a forma plausível para que se saia da te
Essa necessidade é facilmente justificável e decorre em grande par oria e se efetive a prática entre os profissionais nos diferentes serviços.
te da complexidade da CIF. Com alto poder descritivo, a classificação Se bem elaboradas, e de preferência baseadas em áreas de atuação,
torna-se extensa e de difícil operacionalização à medida que reúne inú essas listas podem ser extremamente abrangentes, direcionadas a um
meras categorias que podem ser indicadas para descrever a situação de número grande de pessoas com situações de saúde diversas, além de
saúde de um mesmo indivíduo. Em sua totalidade, são mais de 1.400 poderem ser facilmente operadas por diferentes profissionais em dife
categorias que podem descrever a funcionalidade de uma pessoa e os rentes contextos e propósitos.
fatores a ela relacionados. Essas categorias detalham as funções e estru Para a saúde do trabalhador, já existem alguns trabalhos nacionais
turas corporais, relacionam as atividades que podem ser realizadas no que propõem listas resumidas para uso nessa área e vários estudos inter
cotidiano e apresentam os fatores ambientais que podem estar vincula nacionais que relatam os benefícios dos dados fornecidos pela classifica
dos à presença de uma limitação, influenciando de forma negativa ou ção quando utilizada por meio dos core sets.
positiva a execução de alguma atividade.
Elaboradas por áreas de atuação, as listas resumidas são genéricas,
Esse processo de escolha entre as categorias ante a classificação com podendo ser utilizadas no acompanhamento de diferentes trabalhado
pleta, após a avaliação de um indivíduo, é a primeira fonte de dúvidas. res e reunindo categorias de interesse de uma equipe multiprofissional,
Como manejar e escolher entre tantas categorias de forma a não perder onde cada um seleciona o que é relevante na sua especialidade e no
o propósito de cada avaliação e, ao mesmo tempo, não deixar de regis contexto de trabalho que executa.
trar informações relevantes sobre aquele indivíduo?

150 151
Sendo assim, essa estratégia de utilização da CIF pode ser aplica Outro ponto que merece atenção nesse processo de operacionalização
da quando se pensa na realidade de um serviço em particular, como, da CIF é a utilização dos qualificadores propostos para a codificação. A
por exemplo, um ambulatório, um hospital, um centro de reabilitação, escolha das categorias que retratam a situação de saúde de cada indivíduo
entre outros. Adaptada a realidade de cada um, a elaboração de listas deve ser sucedida da colocação de um qualificador para cada uma delas
resumidas viabiliza a utilização da classificação. Um treinamento prévio para que se tornem um código propriamente dito. Os qualificadores é que
aos profissionais facilita o manuseio do instrumento, e o conhecimento vão informar a quem lê como está a funcionalidade daquele indivíduo sob
de cada um sobre a sua área e sua demanda é suficiente para se iniciar e determinado aspecto. Vão quantificar o grau de comprometimento nas
promover esse processo.
diversas categorias evidenciando a gravidade do caso.
Cientificamente existe uma metodologia adequada para a elabora Os qualificadores variam para cada componente da classificação e,
ção de um core set, que se dá por meio de um processo de consenso entre em relação à magnitude do comprometimento, vão de zero (nenhum
profissionais especialistas em determinada área, que conhecem a fundo problema) a quatro (problema completo). Para o componente ativida
a classificação e que trabalham com o intuito de reunir as categorias des e participação, os qualificadores são o de desempenho e o de capa
mais relevantes a determinados grupos de pessoas, que servirão para uso cidade. Possíveis dúvidas podem aparecer na hora da escolha do que
comum por diferentes profissionais, sendo aplicável ao maior número melhor expressa a extensão da limitação detectada.
de pessoas possível. Essas listas são então validadas para diferentes po
pulações por meio de projetos de pesquisas, para tornarem-se de uso Geralmente as dúvidas em relação aos qualificadores aparecem quan
rotineiro em diferentes regiões e países com o intuito de gerarem dados do se quer mensurar o comprometimento das funções corporais ou o grau
para serem comparados mundialmente. de limitação de atividades que requerem, por exemplo, força muscular,
amplitude de movimento, percepção espacial, entre outras. A escolha de
Já existem vários core sets elaborados, inclusive adaptados para o Brasil, um qualificador que seja fidedigno ao grau de comprometimento de de
sendo a maioria deles facilmente encontrada e disponibilizada na literatura terminada pessoa, algumas vezes, não é tão simples.
cientifica. No entanto, vários deles foram pensados reunindo característi
cas comuns a determinadas doenças de forma a serem aplicados em pa Para tornar mais autêntica a escolha do qualificador, pode e de
cientes reunidos por uma patologia em comum. Apesar de propiciarem a ve-se lançar mão do uso de instrumentos de avaliação disponíveis
operacionalização da CIF, o que é positivo, têm a desvantagem de analisar dentro de cada área de atuação, que já trazem propostas de mensura-
a funcionalidade partindo da doença, impossibilitando o uso para pessoas ção de determinado construto, entre eles a funcionalidade. Alguns,
que apresentem limitações não decorrentes dessas condições, o que de certa inclusive, são de uso rotineiro e já se apresentam reconhecidos cien
forma limita a abordagem da classificação. tificamente como válidos para utilização em determinadas popula
ções, o que facilita a publicação de resultados em pesquisas, quando
Core sets genéricos e, portanto, não relacionados diretamente a esse também é o objetivo.
doenças são mais interessantes por serem aplicáveis a uma maior di
versidade de pessoas e por preservarem o princípio do modelo biopsi- Dito isso, é importante destacar a necessidade de se reconhecer a
cossocial que desvincula a funcionalidade da condição de saúde, atri CIF como uma ferramenta de classificação e não de avaliação. Detalhe
buindo aos fatores ambientais a maior responsabilidade na determina esse que gera dúvidas quando se apresenta a classificação. A CIF bem
ção da limitação. como a CID são instrumentos para classificar a saúde. Não substitui
nem tem o propósito de avaliar o indivíduo. Ambas classificam o que foi

152
153
levantado após o exame ou avaliação de uma pessoa. A CID classifica o Esse é o grande propósito da CIF: identificar as atividades e a parti
diagnóstico, e a CIF, a situação de saúde. cipação que estão limitadas por determinada pessoa, ou grupo de pesso
Na área da saúde do trabalhador, experiência já abordada neste ca as, e demonstrar o quanto o ambiente influencia nessa limitação. Sendo
pítulo, existem instrumentos de avaliação criados especificamente para assim, os domínios de atividade/participação e do meio ambiente se
determinar a capacidade de trabalho e que podem ser associados ao uso fazem essenciais, com menos relevância para os domínios de função e
da CIF, com as devidas adaptações que são necessárias, já que a maio estrutura corporal.
ria dos instrumentos utilizados no dia a dia dos profissionais não foram Na prática, com a classificação, entender essa relação auxilia no
construídos baseados na classificação. Dessa fiDrma, a sua utilização não entendimento dos conceitos de capacidade e desempenho que são os
é uma via direta para a codificação. Em algumas situações, será preciso construtos relacionados aos componentes de atividade e participação.
agregar um conjimto de instrumentos para que se contemplem todas as
Pode-se resumir que a capacidade de cada indivíduo está relaciona
categorias que se considerou relevante em determinado caso. Isso, porém, da às suas estruturas e funções corporais, que devem estar normais, ou
já pode ser pensado quando se elaboram as listas, e as propostas de novos
melhor dizendo, adequadas, para que ele realize suas atividades básicas
instrumentos que ja estabeleçam uma conexão com a CIF são bem-vindas
sem necessitar de auxílio. Já o desenipenho, que é a realização das ati
e incentivadas para facilitar sua utilização.
vidades em um contexto social, corno, por exemplo, no ambiente de
Quando os instrumentos de avaliação disponíveis não forem trabalho, pode ser mantido a despeito de uma alteração estrutural ou
suficientes para quantificar o comprometimento de determinada ca funcional se o ambiente for facilitador e oferecer o recurso, a acessi
tegoria, a informação observada e recebida do indivíduo avaliado é bilidade, a equipe de saúde ou qualquer outra forma de auxílio para a
suficiente para a escolha do qualificador. O indivíduo examinado execução de determinada atividade.
pode responder o quanto considera alterada determinada função, ou
No caso do uso da CIF como instrumento de classificação em ava
determinada atividade, e apontar o qualificador que melhor indica a
liações periódicas de trabalhadores em instituições públicas, pode-se
magnitude do comprometimento. Isso é totalmente aplicável, tam
focar na avaliação do desempenho e vigilância dos fatores ambientais,
bém, quando se analisam os fatores ambientais que atuam como bar
já que são pessoas que, a princípio, têm suas funções e estruturas preser
reiras ou facilitadores de determinada atividade. Os mesmos devem
vadas partindo-se do fato de que estão trabalhando. Não é primordial
ser elencados pelo próprio indivíduo avaliado, que é quem indicará
focar na avaliação de função, estrutura e capacidade e, sim, no desem
o quanto atrapalham ou podem contribuir para que ele realize de
penho das atividades fins e em como o ambiente vem interferindo para
terminada atividade. Os codigos devem então corresponder ao com
que esse desempenho se dê da melhor ou pior forma.
prometimento observado no momento da avaliação, representando
uma fotografia da condição de saúde da pessoa naquele momento. Por esse enfoque, podem-se elaborar listas resumidas mais objetivas,
que informem o que é primordial e que sejam passíveis de avaliação. Com
E interessante nesse processo interligar os fatores ambientais rela
os dados gerados, pode-se. ao longo do tempo, levantar um diagnóstico
cionados a cada categoria comprometida no domínio de atividades e
situacional dos ambientes de trabalho e das principais limitações apresen
participação de forma a estabelecer a ligação entre a limitação de função
tadas pelos trabalhadores durante a atividade laborai. Consequentemente,
e a interferência do ambiente,seja facilitando ou atuando como barreira
melhora-se a elaboração das estratégias de intervenção, promovendo a oti
para aquela função.
mização dos recursos e gerando mudanças verdadeiramente eficazes.

154 155
o ambiente laborai e onde, geralmente, se passa a maior parte do
tempo durante a vida, ficando clara a importância em se investir nesse
campo.É preservando e garantindo a saúde e a qualidade de vida no tra
balho que teremos uma sociedade envelhecendo de forma mais saudável e O PANORAMA DE UTILIZAÇÃO DA CLASSIFICAÇÃO
mais funcional, diminuindo a ocorrência de aposentadorias precoces e de INTERNACIONAL DE FUNCIONALIDADE,
pessoas aposentadas em dependência constante dos sistemas de saúde. INCAPACIDADE E SAÚDE(CIE) NO CONTEXTO DA
Para isso, e preciso promover as mudanças na organização dos pro REABILITAÇÃO E DO CUIDADO EM SAÚDE - ONDE
cessos de trabalho reconhecendo as dificuldades relacionadas ao indiví ESTAMOS?
duo e ao ambiente e intervindo precocemente para minimizar a ocor
rência de limitações ao longo do tempo. A classificação da funcionali Luciana Castaneda

dade é de extrema importância para evidenciar as necessidades e guiar o Fisioterapeuta.


Doutora em Saúde Pública e Meio Ambiente.
planejamento e a execução das ações.
Fernanda Guimarães
Esses foram alguns dos aspectos considerados importantes na prática Fisioterapeuta. Doutora em Saúde Coletiva.
com a CIE Nessa e em outras areas, pode-se concluir que seu uso tem uma Shamyr Sulyvan de Castro
gama enorme de aplicações e deve-se encontrar a melhor forma de utilizá-la Fisioterapeuta. Doutor em Saúde Pública.
de acordo com a necessidade e os objetivos de cada setor.
Seus dados trarão ao conhecimento a situação de saúde das pessoas,
servindo como comunicação padronizada e unindo várias áreas de inte Por que utilizar a CIF?
resse, como a saúde, a educação, a assistência social, a previdência social, Ao longo de 16 anos de implementação da CIF, muito se avançou
os gestores, entre várias outras. no reconhecimento de sua relevância e necessidade. Porém, muitos são
Esse será o caminho trilhado a partir da utilização da CIE Setores os desafios no que se refere à sua utilização nos níveis macro, médio e
atuando de forma interdisciplinar e multiprofissional, com possibilida micro de assistência à saúde. A utilização da CIF no campo da Reabili
des de oferecer à população uma atenção integral, incluindo a adequa tação possui relevância em diversos aspectos, dentre os quais abordare
ção do ambiente entre suas prioridades e tornando possível a construção mos alguns a seguir.
de uma sociedade verdadeiramente inclusiva.
1. Unificação da lingriagem
Ao longo dos anos, observamos que a definição de conceitos, como
funcionalidade, incapacidade e deficiência, pode ser extremamente
distinta entre os profissionais de saúde. Se perguntarmos sobre esses
conceitos aos profissionais envolvidos no Cuidado em Saúde em uma
reunião de equipe multiprofissional, por exemplo, provavelmente en
contraremos como resposta definições distintas para um mesmo con-

156
157
ceito, caso esses profissionais ainda náo tenham tido contato com a CIE mento terapêutico individualizado, possibilitando a escolha de interven
A ambigüidade nesses conceitos, que sáo elementos-chave para o campo ções apropriadas que contemplem a perspectiva do paciente. Desta for
da reabilitação, traz à tona a dificuldade em se estabelecer uma linguagem ma, é possível gerenciar diferentes raciocínios colaborando para a mesma
comum para a descrição das práticas profissionais. A falta de uma termi atividade e estabelecer o mesmo objetivo para diferentes intervenções.
nologia comum pode constituir uma barreira para a comunicação íHprI
da equipe. Nesse contexto, a CIE é apontada como uma ferramenta com
grande capacidade de facilitar o fluxo de comunicação entre os profissio 3. Sistemas de informação: geração de dados epidemiológicos
nais da equipe multidisciplinar, já que favorece uma linguagem unificada de funcionalidade e incapacidade
e padronizada para descrever os componentes de saúde. A utilização da Algumas perguntas norteadoras podem iniciar o debate sobre a in
CIE como uma ferramenta para unificação da linguagem nas equipes de serção de dados de funcionalidade e incapacidade nos sistemas de in
reabilitação tem sido apontada como promissora na melhoria do processo formação em saúde. O que teria de tão importante nas informações
de comunicação, esclarecendo os papéis da equipe, proporcionando, as sobre funcionalidade e incapacidade que justificasse o ônus referente ao
sim, maior colaboração entre os profissionais e melhor entendimento da aumento de recursos que teria de ser dedicado para a coleta sistemática
contribuição de cada serviço, aumentando a qualidade deles. desse tipo de informação? Informações de funcionalidade são essenciais
para os cuidados em saúde?
2. Elaboração de planos terapêuticos individualizados A produção de informações de saúde relacionadas à funcionalidade
Considerando os diferentes níveis de atuação dos sistemas de saúde tem um grande potencial para a construção de estratégias voltadas à me
(macro, médio e micro), a utilização dos componentes da CIE para a lhoria das condições e práticas de saúde. Entretanto, embora haja um es
elaboração de planos terapêuticos individualizados se insere no microní- forço tecnológico para a construção de sistemas de informação em saúde,
vel de atuação. A CIE tem sido proposta como uma possível ferramenta a baixa utilização do conhecimento por parte dos profissionais de saúde e
estrutural para organizar e direcionar a prática clínica, podendo ser útil de suas respectivas instituições reforça a gestão pulverizada das informa
nos seguintes aspectos: 1) facilitar o raciocínio clínico e permitir es ções. Podemos citar como alguns dos desafios relacionados à produção
colhas terapêuticas apropriadas; 2) identificar as reais necessidades dos e a gestão da informação sobre funcionalidade e incapacidade: a falta de
indivíduos para determinar os objetivos do tratamento e orientar os integração entre as informações produzidas; sistemas de informação de
planos de intervenção; 3) avaliar os resultados das abordagens terapêu sarticulados, desintegrados ou inexistentes; produção de informação du
ticas utilizadas; 4) auxiliar a padronização dos processos de avaliação; 5) plicada, fragmentada e redundante; dificuldades de acesso; disseminação
colaborar para a elaboração de programas e estratégias terapêuticas; 6) das informaçõesh A utilização integrada de bases de dados secundários e
mensurar as intervenções; 7)fortalecer a prática baseada em evidências; primários poderia ser uma saída para potencializar a utilidade dos dados e
8) adequar condições de atenção às necessidades dos pacientes; 9)verifi- assim contribuir para uma cultura de registro de dados que não somente
car a necessidade de recursos para melhorar aspectos específicos da fun os de mortalidade e relacionados a estatísticas hospitalares, ampliando,
cionalidade destes indivíduos; 10) evitar a duplicação de intervenções. desta forma, a possibilidade do escopo de análises de dados de incapaci
dade e o seguimento longitudinal das coortes estudadas.
O modelo de entendimento da funcionalidade proposto pela CIF
facilita o raciocínio clinico de cada profissional e contribui para o planeja- A melhoria da qualidade das informações dos sistemas de informação
em saúde se traduz por meio de diversas iniciativas, tais como: padroniza-
158
159
çáo das terminologias utilizadas, facilidade de acesso às informações, dis população coloca em evidência a necessidade de uma abordagem centrada
seminação dos processos envolvidos na elaboração dos indicadores, assim no indivíduo no que toca aos cuidados de saúde. Esse tipo de abordagem
como os esforços para a produção e análise dos dados. No entanto, muitas necessita obrigatoriamente da colaboração dos sujeitos (usuários) no pro
vezes, a continuidade do processo de melhoria dos sistemas de informação cesso de construção das narrativas sobre os problemas de saúde e o impac
em saúde e afetada por fatores econômicos,políticos, logísticos e pela falta to desses problemas na funcionalidade.
de capacitação dos profissionais de saúde. Especialmente nos países em A perspectiva de utilização da CIE como ferramenta norteadora das
desenvolvimento, esse fato pode contribuir para uma fragmentação dos avaliações que levem em conta a percepção dos sujeitos, volta-se para
dados que compõem os sistemas de informação em saúde.
uma produção subjetiva que permeie as práticas de reabilitação e que
Sugerimos como propostas para a inserção da CIE nos sistemas de não se restrinja, apenas, a instrumentos estruturados que conduzam a
informação a saúde, o apoio técnico à organização regional dos sistemas expressões de caráter exclusivamente numérico. A utilização quantitati
de informação, a melhoria do acesso aos profissionais de saúde, a padro va da CIE {Checklist, Core Sets, WHODAS ou instrumentos específicos
nização da linguagem utilizada pelos distintos setores de documentação e desenvolvidos baseados na CIE) se estrutura na inclusão de informa
a revisão dos indicadores de morbidade. A viabilidade das propostas está ções em saúde que possibilitem expressões objetivas, ressaltando que
intimamente relacionada a capacitaçao dos profissionais e técnicos que essa diferenciação não assume necessariamente posições dicotômicas e,
trabalham nos diferentes ambientes de saúde. Além disso, a geração de sim, complementares, visto que ambos os planos, subjetivo e objetivo,
dados primários de funcionalidade e a incapacidade por meio de inquéri reproduzem dimensões inerentes a fenômenos sociais complexos, como
tos de saúde são uma importante fonte de dados populacionais. As infor a funcionalidade, incapacidade e saúde.
mações geradas pelos inquéritos têm a capacidade de gerar sistemas mais Ao se levantarem tais questões, a idéia não é de exclusão de uma das
responsivos e centrados na percepção da população sobre o impacto do polaridades tampouco defender o predomínio de uma sobre a outra, mas
processo de saúde/doença na funcionalidade e incapacidade^. No entan
sim sugerir uma concepção ampliada dos processos de avaliação e cons
to, um grande desafio para os sistemas de informação de saúde é o reco
trução de planos terapêuticos, visando ao rigor no emprego dos conceitos
nhecimento por parte dos profissionais de saúde que atuam no ambiente e na seleção de estratégias adequadas. Sugerimos estratégias de utilização
clínico sobre a importância no registro e na documentação dos dados. da CIE em reabilitação que, ao abordar a noção de cuidado, se funda
mentem em duas proposições que ultrapassem o caráter e âmbito técnico
FORMAS DE UTILIZAÇÃO DA CIE NO CENÁRIO DO do atendimento: a integralidade^ que propõe um olhar ampliado sobre
CUIDADO EM SAÚDE o sujeito e cuidado, expressando-se na necessidade de múltiplos olhares
sobre um determinado objeto (como a inserção das equipes multiprofis-
1. Utilização qualitativa: modelo de entendimento da funcio
sionais na reabilitação), e a humanização"^ que se relaciona ao plano das
nalidade
relações intersubjetivas que se processam nas práticas sociais, inclusive nas
Os modelos de avaliação tradicionais no campo da reabilitação, em de saúde,fundamentando a capacidade de o profissional de saúde realizar
sua maioria, focalizam de maneira, se nao exclusiva, muitas vezes acentu o uso de tecnologias leves em suas práticas profissionais, como diálogo,
ada as dimensões e os aspectos objetiváveis e passíveis de quantificação, escuta atenta e construção de projetos terapêuticos singulares. Tais práti
excluindo a dimensão intersubjetiva, característica propriamente huma cas podem ser mais facilmente construídas utilizando a CIE como ferra
na. No entanto, o caráter multifatorial dos atuais problemas de saúde da menta de referência. Isto não significa abrir mão das práticas tradicionais

160 161
e já consolidadas de avaliação e condução terapêutica que fazem parte do no Brasil e, além de disponibilizar os códigos preestabelecidos, tam
escopo e das rotinas em reabilitação, mas sim de fazer um exercício de se bém apresenta campos para coleta de informações sociodemográfica,
pensar o que está sendo avaliado (funções do corpo, estrumras do corpo, de saúde, de fatores contextuais e de identificação do sujeito entrevis
atividades e participação, fatores ambientais ou pessoais) e se o que está tado/avaliado^. Este instrumento é dividido em partes que abordam
sendo avaliado é relevante de acordo com a percepção do avaliado. "deficiências das funções do corpo" (parte Ia), oferecendo possibili
Vale um exercício de reflexão como profissional de reabilitação; te dade de uso de qualificadores. As opções para essa qualificação são
nho incluído o enfoque e a perspectiva do paciente e sua experiência "O Nenhuma deficiência — significa que a pessoa não tem problema";
sobre funcionalidade e incapacidade, além das condições ambientais em "1 Deficiência leve - significa um problema que está presente menos
seu entorno no meu projeto terapêutico? Se sim, como posso fazer para que 25% do tempo, com uma intensidade que a pessoa pode tolerar
melhorar minhas praticas? Se não, como posso fazer para incluir essa e que ocorre raramente nos últimos 30 dias"; "2 Deficiência modera
abordagem em minhas práticas? Nesse sentido, podemos partir do pres da — significa um problema que está presente em menos que 50% do
suposto que a informação proveniente do sistema alfariumérico da CIF tempo, com uma intensidade que interfere na vida diária da pessoa e
é passível de desagregação, podendo ser transformada em questionários, que ocorre ocasionalmente nos últimos 30 dias"; "3 Deficiência grave
entrevistas e afins, podendo ser considerada como uma linguagem onde - significa um problema que está presente em mais que 50% do tem
os textos elaborados dependam do usuário, de sua criatividade, bom po, com uma intensidade que prejudica/rompe parcialmente a vida
senso e orientação acadêmica. diária "da pessoa e que ocorre freqüentemente nos últimos 30 dias"; "4
Deficiência completa - significa um problema que está presente em
O discurso de que a CIF é difícil de ser utilizada por conter mui
mais que 95% do tempo, com uma intensidade que prejudica/rom-
tos códigos não sustenta sua não utilização. A incorporação da CIF de
pe totalmente a vida diária da pessoa e que ocorre todos os dias nos
forma qualitativa no cenário da reabilitação como modelo de enten
últimos 30 dias"; "8 Não especificado - significa que adnformação é
dimento da funcionalidade não depende de nenhum código e sim da insuficiente para especificar a gravidade da deficiência"; "9 Não apli
reflexão de cada profissional de saúde em querer avançar em sua prdxis cável - significa que é inapropriado aplicar um código particular (por
no sentido do cuidado integral e humanizado.
exemplo b650 Funções de menstruação para mulheres em idade de
2. Utilização quantitativa da CIF pré-menarca ou pós-menopausa"^. A parte Ib do instrumento agrupa
as "Deficiências das estruturas do corpo" e, além dos qualificadores já
Sob a perspectiva de implementação do uso da CIF na prática clí apresentados, também disponibiliza um segundo qualificador, baseado
nica, algumas dificuldades já foram apontadas na literatura, sendo uma na natureza da alteração: O Nenhuma mudança na estrutura; 1 Ausên
delas a demora na aplicação da classificação^ Com o objetivo de facilitar a cia total; 2 Ausência parcial; 3 Parte adicional; 4 Dimensões aberran-
aplicação da CIF, alguns instrumentos relacionados a ela foram propostos tes; 5 Descontinuidade; 6 Posição desviada; 7 Mudanças qualitativas
pela OMS. Destaca-se aqui a checklist, os core sets e o WorldHealth Orga- na estrutura, incluindo acúmulo de líquido; 8 Não especificada; 9
nization Disability Assessment Schedule —WHODAS. Não aplicável. A parte 2 envolve as limitações de atividade e restrições
A checklist consiste de uma lista resumida com um total de 128 de participação, apresentando um primeiro qualificador, relacionado
categorias de primeiro e segundo nível, de aplicação genérica para co ao desempenho, e um segundo qualificador, relacionado à capacidade,
leta de dados sobre funcionalidade®. A lista já foi traduzida para uso ambos com as mesmas possibilidades de respostas apresentadas para a

■ ■sl
162 -;.3 163
parte Ia. A parte 3 consiste nos fatores ambientais, com qualificadores O outro instrumento proposto pela OMS é o WHODAS.Diferen
relacionados a barreiras (O nenhuma barreira; 1 barreira leve; 2 barrei temente dos outros dois, que são listas resumidas de códigos da CIF, o
ra moderada; 3 barreira grave; 4 barreira completa) ou facilitadores (O WHODAS não é um instrumento constituído de uma lista de códigos,
nenhum facilitador; +1 facilitador leve; +2 facilitador moderado; +3 são 36 perguntas distribuídas em seis domínios (cognição, mobilidade,
facilitador considerável; 4+ facilitador completo)^. autocuidado, relações interpessoais, atividade de vida, participação). O
Relatos de uso da checklist da CIF envolvem a descrição médica,fun instrumento apresenta três versões, segundo a quantidade de questões
cional, social e de fatores contextuais de crianças em atendimento odon- que podem ser usadas: 36, 12+24 e 12 questões; além disso, pode ser
tológico®; identificação de problemas em pacientes com doenças crôni ministrado por entrevistador, autorrespondido e aplicado ao proxy, e os
cas^; verificação da qualidade de vida em pacientes com câncer terminal'"; questionários e o manual já foram traduzidos para uso no Brasil'". Este
aferição da funcionalidade entre pacientes de acidente vascular cerebral instrumento permite a produção de escores que variam de O a 100 para
em tratamento de reabilitação", em pacientes soropositivos'^, com epi- cada domínio, além de um escore total, sendo que quanto maior for o
lepsia'^, miastenia grave'"' e com enxaqueca'^, entre outros. A checklist escore, pior será a funcionalidade'". Possibilidades de uso no ambiente
apresenta uma vantagem principal que é seu caráter genérico, permitindo clínico já têm sido publicadas como a avaliação da funcionalidade em
que seja aplicada em grupos com diferentes condições de saúde, garantin associação com doenças mentais^"; avaliação funcional de idosos^'; e afe
do por de comparação do perfil funcional entre diferentes grupos. rição da funcionalidade em grupos com doença pulmonar obstrutiva
Outro instrumento proposto pela OMS é o core set, que também é crônica, insuficiência cardíaca e acidente vascular cerebral^^.
uma lista resumida de codigos alfanuméricos, orientados para condições Dessa forma, as três ferramentas apresentadas {checklist, core sets e o
de saúde especificas'". Ja foram publicados cor^reírpara diversas condições WHODAS) mostram-se como ferramentas capazes de avaliar a funcio
de saúde, como condições musculoesqueléticas (por exemplo, espondili- nalidade em ambiente clínico, instrumentalizando os profissionais de
te anquilosante, dor difusa, dor lombar, osteoartrite, osteoporose, artrite saúde no processo de avaliação funcional do seu paciente. A determina
reumatoide), condições cardiopulmonares (por exemplo, isquemia car ção da ferramenta mais adequada para cada paciente deverá ser conside
díaca, obesidade, diabetes, doença pulmonar obstrutiva crônica); e con rada e avaliada de acordo com as características de cada paciente. Cada
dições neurológicas (por exemplo, acidente vascular cerebral, depressão, um dos instrumentos apresentados podem ser passíveis de críticas por
transtorno bipolar, lesão medular, trauma cranioencefálico). Uma meto- apresentarem pontos fracos. O profissional de saúde deve ter em mente
dologia padronizada foi proposta e publicada para que a criação de core a otimização do processo de avaliação funcional para que a ferramenta
sets seja normatizada e reproduzida da forma recomendada pela OMS'^. selecionada seja adequada aos objetivos clínicos propostos e se preste ao
A quantidade de códigos por core sefwz.úí na dependência da condição de acompanhamento da evolução clínica de seu paciente.
saúde. Considerando sua recente proposição, a maioria das publicações a
respeito dos core sets diz respeito ao seu processo de criação. Experiência 3. Unindo a teoria à prática- utilização da CIF no cuidado em
de aplicação no ambiente clinico ainda carece de maior divulgação cien saúde individual
tifica, mas podemos citar como exemplo a avaliação da funcionalidade Ao longo dos anos,o conhecimento sobre a CIF tem aumentado gra-
e de fatores ambientais em pacientes com dor lombar'". Os core sets são dativamente, porém se percebe a dificuldade dos profissionais em saber
instrumentos com grande potencial de uso, entretanto ainda precisam ser como aplicar e de que forma utilizá-la na prática clínica. A inclusão da
explorados com mais profundidade no ambiente clínico. abordagem biopsicossocial nas práticas dos profissionais de reabilitação é
164
165
fundamental para que estes tenham a possibilidade de elaborar um proje lacional e prevalência elevada de doenças crônicas não transmissíveis), é
to terapêutico individual, integral e humanizado. cabível imaginar que intervenções no âmbito da reabilitação devem levar
Para entender como a CIF pode colaborar na prática clínica, vale em consideração a variável tempo no planejamento das ações. O acompa
discorrer sobre alguns aspectos. Atualmente, há um esforço contínuo nhamento longitudinal da saúde dos usuários de saúde se relaciona inti
para criar diretrizes práticas baseadas em evidências para o manejo de mamente à reorientação dos sistemas de saúde.
indivíduos com incapacidades. A CIF pode auxiliar neste processo, à
medida que auxilia no estabelecimento das relações entre limitações de Vamos a alguns exemplos práticos de utilização clínica da CIF
atividades e deficiências de funções e estruturas corporais, o que é es
a) Utilização qualitativa com o modelo de interação dos
sencial no processo diagnóstico e na determinação do prognóstico e de
conceitos — exemplificando
um plano de tratamento. Portanto, após a avaliação do indivíduo, co
nhecendo suas deficiências, limitações, restrições e fatores do contexto, O preenchimento do modelo de interação dos conceitos (Figura 1)
cabe estabelecer as relações entre estas variáveis para identificar as inter pela equipe multiprofissional de reabilitação, descrevendo as associações
venções mais apropriadas, considerando o que o indivíduo considera ser e inter-relações entre os componentes, pode funcionar como um mo
mais significativo e relevante para o seu dia a dia. delo de referência para as escolhas terapêuticas e o desenvolvimento de
estratégias preventivas.
Historicamente, nossas práticas remetem ao modelo biomédico, dan
do pouca importância aos aspectos biopsicossociais; concentramos nossas Figura 1. Modelo da interação dos conceitos da Classificação Internacional de
atenções às funções e estruturas corporais, deixando de lado os outros Funcionalidade, Incapacidade e Saúde.
aspectos da funcionalidade, em especial a influência dos fatores contex-
tuais. As intervenções não devem objetivar somente a normalização das Condição de Saúde
deficiências nas funções e estruturas do corpo. A orientação é que os pro
fissionais procurem solucionar os problemas com modificações feitas na
base das condições de saúde, fatores pessoais e ambientais, contribuindo
para a redução das limitações às atividades e restrições à participação. É Funções/Estnjturcs
Corporais
Atividades Participação
possível ainda estabelecer as limitações e deficiências primárias e secundá
4
rias, analisando o paciente por uma perspectiva holística, tendo em vista
que, embora a condição de saúde possa permanecer a mesma ao longo do Fatores Ambientais Fatores Pessoais
tempo,a experiência que os indivíduos têm em relação à funcionalidade e
a incapacidade pode mudar. Portanto, é importante modificar a terapêu
tica e os objetivos propostos de acordo com novas análises entre os com Fonte: Adaptado de OPAS/OMS,2003
ponentes, ao longo do tempo. Tudo isso proporciona a identificação de
diferentes estágios de funcionalidade, possibilitando traçar estratégias em
conjunto com o paciente, de acordo com o nível de funcionalidade, em Para exemplificar, pensemos em um caso clínico de um paciente
determinado ponto do tempo. Considerando o atual panorama demográ hipotético:
fico e a carga de doenças da população brasileira (envelhecimento popu-
166
167
Caso Clínico: indivíduo do sexo feminino, 54 anos de idade, viú Figura 2. Classificação hipotética de um indivíduo vítima de Acidente
va, pintora profissional, vítima de Acidente Vascular Encefálico (AVE
Vascular Encefálico.
~ CID-10: 164), ha seis meses. Segundo a avaliação da equipe de re
abilitação, apresenta no momento deficiências em algumas funções Condição de Saúde
Acidente Vascular Encefálico - CID 10:164
e estruturas do corpo, tais como: diminuição da força muscular em
hemicorpo direito, aumento do tônus muscular em membros supe V

rior e inferior direitos, redução da mobilidade articular do tornozelo Deficiências —s Limitações às Atividades Restrições à Participação
força muscular,tônus,
direito, alteração do equilíbrio corporal e redução da sensibilidade ao mobilidade articular, equilíbrio
Comer
vestir-se
Trabalhar
Sair com amigos
tato, alem de distúrbios do sono, dificuldades de concentração, me corporal,sensibilidade ao tato,
sono,concentração, memória,
lavar-se
Andar
mória, expressão da linguagem oral e regulação das emoções. Algumas linguagem, regulação das
emoções,
Ler
Escrever
de suas atividades encontram-se limitadas, tais como: comer, vestir-se, hemicorpo direito,
tornozelo direito
Conversar
Realizar tarefas domésticas
lavar-se, andar, ler, escrever, conversar e realizar tarefas domésticas.
Apresenta marcha domiciliar com auxilio de bengala. A marcha co i

munitária esta prejudicada por morar em área acidentada com grande Fatores Ambientais
Fatores Pessoais
bengala, ladeiras,
quantidade de ladeiras. No momento, deixou de trabalhar como pin recursosfinanceiros,
Mulher
54 anos
órtese,filha,
tora. Devido a falta de remuneração, depende da ajuda financeira da serviços de saúde,
Viúva
Pintora

família, que auxiliou comprando sua bengala e órtese para o membro transporte público
Motivada

inferior direito. Recebe cuidados de sua filha, que a encoraja a prosse Fonte: Autoral.
guir com o tratamento. Encontra-se em tratamento em um centro de
reabilitação, nos setores de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Psicologia, Analisando a situação descrita acima, podemos perceber que di
mas apresenta muitas faltas por falta de transporte público adequado, versas alterações decorrentes da doença podem comprometer os fun
o que ocasiona também dificuldades para sair com os amigos. Ainda ções e estruturas corporais e limitar as atividades diárias dos indivíduos.
assim, encontra-se motivada e colabora com o tratamento. Porém, observamos que a doença em si não é a única responsável pelo
Demonstraremos no quadro abaixo a classificação deste indivíduo, panorama da funcionalidade do indivíduo, sendo os fatores contextuais
seguindo o modelo da interação dos conceitos: (ambientais e pessoais) de extrema importância dentro deste contexto.
Alem disso, algumas alterações e dificuldades podem não ter nada a
ver com a doença, sendo decorrentes exclusivamente do contexto que
cerca o indivíduo. No exemplo clinico dado, podemos refletir: Quais
componentes interferem realmente nas limitações às atividades.' Quais
deficiências interferem em quais atividades? E que fatores ambientais
interferem nesse processo como facilitadores e barreiras? Qual a impor
tância dos fatores pessoais no processo terapêutico?
É importante que cada profissional da equipe multiprofissional, após
fazer sua avaliação, preencha o modelo e faça a análise da inter-relação
168
169
entre todos os seus componentes, a fim de traçar os objetivos e elaborar
CASOSCUNICOS
um plano terapêutico adequado. Cada profissional pode fazer sua análise
individualmente, mas é também importante uma análise em equipe. O
preenchimento do modelo pela equipe possibilitará compreender e definir
CID -10
as atribuições de cada um,colaborando para a elaboração de programas e
estratégias terapêuticas, identificando as reais necessidades do indivíduo.
Será que os serviços propostos sáo suficientes? No exemplo dado,a equipe
poderia considerar quais profissionais seriam mais adequados para amar
em cada alteração e como um trabalho conjunto poderia ser elaborado.
O quadro abaixo pode ser incorporado à ficha de avaliação ou ao
prontuário do paciente, para utilização de toda a equipe:

b) Utilização quantitativa com o modelo da tábua de códigos


Pensando no âmbito da construção, estruturação e/ou aprimoramen
tos de sistemas de informação em saúde, o modelo abaixo de descrição
quantitativa da CIF pode ser utilizado para a codificação das informações
presentes no modelo de interação dos conceitos (Figura 2). Esse modelo
é denominado tábua de códigos e pode ser utilizado com esse objetivo. 1. Dezesseis anos da CIF - Onde estamos?
Foram desenvolvidos aplicativos da CIF que estão disponíveis para smar- Embora desde sua publicação a CIF venha sendo apontada como
tphone e que permitem uma busca mais rápida da informação dentre os um padrão global de abordagem da funcionalidade e incapacidade no
quase 1.500 códigos presentes na classificação. macronível, sua aplicação clínica envolve questões mais complexas. A
inserção da CIF nos ambientes clínicos tem sido incentivada pelas po
O PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO DA CIF NA tenciais contribuições para a definição de objetivos, avaliações e dire
REABILITAÇÃO cionamento na atribuição dos profissionais que compõem as equipes
multiprofissionais de reabilitação.

Diagnóstico Médico Cid-10 CiF

b s d e-i- e-

Qualificadores

170
171
Na medida em que a viabilidade de aplicação da CIF no microní- 2. Desafios para a implementação da CIF
vel vem sendo amplamente discutida nos últimos 16 anos, a questão
Os desafios de utilização da CIF se relacionam a dificuldades ope
importante é se a implementação da CIF implica mudanças na prática
racionais intrínsecas à classificação, como ambigüidade dos termos ati
organÍ2acional e na estrutura do trabalho das equipes de saúde fun
vidades e participação, propriedades psicométricas fracas dos qualifica-
cional. O que se observa é que a CIF tem sido um "mito estrutural" e
dores e falta de um referencial teórico para os fatores pessoais. Soma-se
assim permanecerá enquanto houver a dissociação entre a apresentação
a essas dificuldades apontadas o fato da implementação da classificação
e prática. No entanto, proporcionar mais liberdade e flexibilidade no
ser volunrária.
seu processo de implementação pode garantir siia disseminação, uma
vez que normas abstratas tendem a ser implementadas mais facilmente A tomada de decisão clínica no âmbito da reabilitação é um processo
do que normatizaçóes concretas e engessadas. complexo,incerto, avaliativo, científico e que requer um esforço contínuo
para fornecer as melhores práticas para os usuários de saúde^^. Algumas
A dissociação do modelo de entendimento da funcionalidade ba-
perguntas que envolvem decisões clínicas permeiam esse debate:
sedo na CIF e do sistema de classificação alfanumérico da classifica
ção pode facilitar a sua adaptação e implementação. A disseminação do • Quem precisa de tratamento e por quê?
sentido lato do termo BIOPSICOSSOCIAL parece o caminho para a • Quais são os resultados esperados da intervenção?
garantia da incorporação da CIF na prática organizacional do trabalho
• Como os resultados devem ser medidos e documentados?
na reabilitação.
• Que intervenção, orientações, serviços e número de atendimentos
Muito se avançou na relevância e necessidade de discussão sobre
são necessários para atingir estes resultados?
funcionalidade e incapacidade no macronível, no entanto a inserção da
CIF no micronível de assistência a saúde depende necessariamente de • Como deve ser medido o sucesso da intervenção?
escolhas profissionais individuais e decisões idiossincráticas. Novos ins
trumentos de avaliação baseados na CIF podem e devem ser desenvol É consenso que a CIF é a ferramenta ideal para o suporte a tais
vidos e testados. A experiência adquirida com base em tais investigações perguntas. Apontamos em nossas explanações, que a resposta a tais
poderá servir para o aprimoramento de orientações globalmente aceitas^ questões supracitadas poderão ser mais facilmente elucidadas à medida
Atualmente, a CIF é mais um exemplo típico de uma norma global dis que a classificação seja colocada em prática e que os profissionais de
sociada da prática clínica. reabilitação possam apontar seus campos de atuação e alcance. Não pre
tendemos com a presente proposição, que se abandone os modelos de
avaliação já urilizados na prática e sim que se debata a inclusão da CIF
nos cenários de assistência à saúde, pois, de tal forma, o maior beneficia
do sera o foco de todo esse debate central: o usuário de saúde.
A utilização e difusão de uma classificação com objetivos tão amplos
como a CIF depende da aceitação e divulgação pelos profissionais de saúde
e de características de facilidade de aplicação e praticidade. Por isso, vale res
saltar que ela ainda encontra-se em processo de construção, porém avança
em direção a consolidação de seu uso na área da reabilitação.

172
173
Dessa forma, a discussão da melhoria das práticas em reabilitação Leitura recomendada
não se resume somente a investimentos em tecnologia. Faz-se importan
1. Stucki G. Strengthening Rehabilitation in Health Systems Woridwide by Integrating Informa-
te o reconhecimento do papel que a tecnologia pode desempenhar, no tion on Functioning in Nacional Health Information Systems. Am J Phys Med Rehabil. 2016 Dec 15.
entanto o desempenho e a eficácia das práticas não se resumem a uma 2. Castro SS, Castaneda L, Araújo ES, Buchalla CM.Functioning assessment in Brazilian health sur-
questão de tecnologia exclusivamente. No que toca a CIF, o investi veys: discussions about InternationalClassifícation of Functioning, Disability and Health-based tools.
Rev Bras Epidemiol. 20l6;19(3):679-687
mento em sistemas de informação de saúde com dados de incapacidade
gerados nos diferentes níveis de assistência clínica (baixa, média e alta 3. Pinheiro R & Mattos R. Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde. Rio de Janei
ro: UERJ,IMS: ABRASCO.2006. 184p.
complexidade), os programas de capacitação pára os profissionais de
4. HumanizaSUS: Política Nacional de Humanizaçáo: a humanizaçao como eixo norteador das práticas
saúde e a eminente inserção temática da CIF nos cursos de graduação de atenção e gestão em todas as instâncias do SUS / Ministério da Saúde, Secretaria Executiva, Núcleo
em saúde podem ser uma saída para o aumento da responsividade da Técnico da Política Nacional de Humanizaçáo. — Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
classificação no campo da reabilitação. 5. Wiegand NM, Belcing J, Fekece C, Gutenbrunner C, Reinhardt JD. Ali talk, no action?: the glo
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2014;171(8):818-820. mográficas e sociais em todo o mundo. A transição demográfica e epi-
71. VEIGA, Bruna; PEREIRA, Rita Aparecida Bernardi; PEREIRA, Adriane Miró Vianna Benke and demidlógica traz uma experiência nunca antes vivida pelas sociedades
NICKEL, Renato. Evaluation of fiinctionality and disability of older elderly outpatients using the - nunca vivemos tanto! - que impõe a necessidade de alinhar pensa
WHODAS 2.0. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2016; 19(6):1015-1021.
mentos no sentido de assegurar o envelhecimento saudável, respeitando
22. de Pedto-Cuesta J, Alberquilla Á, Virués-Ortega J, Carmona M, Alcalde-Cabero E, Bosca G,
López-Rodríguez F, García-Sagredo P, García-Olmos L, Salvador CH,Monteagudo JL. ICF disabili todas as fases do ciclo da vida com vistas à saúde, participação e seguran
ty measured by WHO-DAS II in three community diagnostic groups in Madrid, Spain. Gac Sanit. ça dos indivíduos, cujo resultado final deverá ser promover vida longeva
2011;25 Suppl 2:21-8. e saudável. Se, por um lado, envelhecer é uma importante conquista
23. Atkinson HL, Nixon-Cave K. A tool for clinicai reasoning and reflection using the internatio social, por outro, aponta oportunidades e desafios aos sistemas e às po
nal classification offunctioning, disability and health (ICF)framework and patient management mo-
del. PhysTher. 2011;91(3):416-30.
líticas públicas, que deverão refletir sobre as possibilidades de as pessoas
permanecerem autônomas pelo maior tempo possível.
Além da transição demográfica das últimas décadas, temos uma
transição epidemiológica que reflete a alteração do padrão das doenças
e das causas de morte, conseqüentes de mudanças sociais, como a urba
nização, o consumo e os hábitos de vida.
No contexto epidemiológico, a tendência global para os países em
desenvolvimento, e no Brasil isso já é realidade, é para o aumento das
doenças crônicas e degenerativas, como as doenças cardiovasculares, as
doenças oncológicas, as demências e as diabetes. Para a população idosa,
importa ainda considerar o risco de maior interação de comorbidades
crônicas versus infecciosas.

176 177
Este cenário exige planejamento do envelhecimento das popula concorrem para as modificações da funcionalidade da população idosa,
ções centrado em ações e estratégias de manutenção e promoção da saú quer na ausência, quer na presença de doença aguda ou adquirida, será,
de de idosos, minimizando riscos e maximizando oportunidades. Vários nos próximos anos, um desafio de todas as áreas do conhecimento. Se
documentos de diversas organizações internacionais dispõem sobre o gundo Raty(2003), a mensuração dos níveis de graus de funcionalidade
assunto partindo dessa perspectiva e apontam a necessidade de um pro oferece uma forma conveniente de comparar o impacto de diferentes
cesso interativo, em que as mudanças se entrecruzam e se refletem na tipos de doença nas diferentes populações, em distintos momentos. A
vida dos indivíduos, das sociedades e dos países, exigindo modificações mensuração também fornece informações importantes sobre a necessi
e adaptações individuais, sociais e organizacionais. dade de assistência em cuidado pessoal, na habilidade de viver de forma
No Brasil, dentre as legislações, o Estatuto do Idoso (Lei Federal n.° independente e no prognóstico.
10.741) é sem dúvida uma importante conquista na garantia de direitos Para a Saúde Pública, considerar a funcionalidade dos indivíduos e
e reforça a necessidade de análise dos processos de forma interativa. Diz das populações como uma variável fundamental do seu estudo será de
em seu artigo 3° terminante para sua intervenção. Inclui a necessidade de reproduzir as
E obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder limitações nas atividades dos indivíduos e quantificar a necessidade de
Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação equipamentos, serviços e sistemas, o modelo de atenção e cuidado em
do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao saúde e a formação profissional, que deverão assegurar o direito à equani-
esporte, ao lazer, ao trabalho, a cidadania, à liberdade, à dignidade, midade, integralidade e universalidade pressupostos pelo SUS.
ao respeito e à convivência Familiar e comunitária. Os processos de avaliação e de intervenção na assistência em saúde
Isso nos impõe considerarmos a multidimensionalidade desse pro atuais são o paradigma do determinismo biológico, ao centrarem-se qua
cesso que estamos vivendo, sendo necessário, mas não menos difícil, se exclusiva ou preferencialmente nas alterações das funções fisiológicas,
englobar os diversos fatores implicados: os socioeconômicos, comporta- observando-se uma negligência importante relativa aos fatores contextu-
mentais, psicossociais e genéticos, e a autonomia que proporcionarmos ais, ambientais e pessoais. Para enfrentar esses desafios, é necessário que
aos indivíduos em termos de educação e saúde. Ações e estratégias, nesse a pesquisa interdisciplinar respeite a diversidade e a beterogeneidade dos
sentido, serão decisivas na garantia de assegurar os direitos conquistados. idosos, do processo de envelhecimento; que haja responsabilização dos
gestores públicos e poHticas que favoreçam um ambiente conceituai e di-
mensionalmente abrangente, promotores de um envelhecimento ativo e
Dados sobre funcionalidade
saudável, com vistas à singularidade da velhice.
Um das agendas da Saúde Publica neste contexto deverá ser o res
peito à diminuição das desigualdades sociais da saúde, que tendem a se Segundo o Relatório Mundial sobre a deficiência publicado pela
Organização Mundial de Saúde, em 2011, o envelhecimento global
acentuar com o aumento da idade. Os ganhos alcançados com longevida
de foram, em muito, o resultado das diversas intervenções da Saúde Pú tem grande influência sobre as tendências relativas às deficiências
porque há maior risco de deficiência entre os idosos. O documen
blica/Coletiva. E dela, também, a responsabilidade nas intervenções que
surgem com as dinâmicas do envelhecimento, cujas estratégias e ações to reitera que o ambiente tem enorme efeito sobre a prevalência e
extensão da deficiência e sobre as desvantagens que as pessoas com
devem se centrar na manutenção e promoção da saúde dos grupos mais
deficiência enfrentam. As pessoas com deficiência e os domicílios
velhos. Nesse sentido, conhecer os mecanismos e os componentes que
178
179
com algum membro com deficiência enfrentam as piores realida as necessidades de serviços de saúde do indivíduo, o cuidado neces
des econômicas e sociais se comparados às pessoas sem deficiências, sário, ou seja, ter a classificação de um diagnóstico estabelecido pela
segundo o relatório. E ainda afirma que precisam ser desenvolvidas CID não reflete as conseqüências deste na vida das pessoas e não traz
melhores determinações sobre o ambiente e seus impactos nos dife o impacto que o ambiente causa na efetiva participação do indivíduo
rentes aspectos da deficiência, pois isso facilitará a identificação de na sociedade. É necessário analisar, para que se possa intervir, como
intervenções ambientais de baixo custo. o meio ambiente, o contexto, se relaciona com o estado de saúde do
Segundo Araújo e Biz(2016), o diagnóstico situacional e o planeja indivíduo, não somente na oferta de rede de assistência mas também
mento são dois passos essenciais para o bom desenvolvimento da gestão como acolherá suas condições de saúde. Os indicadores clássicos como
estratégica em Saúde. A idéia principal do diagnóstico é, tão somente, co as taxas de mortalidade por causa específica e os indicadores de mor-
nhecer as condições de saúde de determinada população, bem como co bidade (prevalência da doença) tornaram-se insuficientes para avaliar
nhecer o desempenho da assistência e os fatores determinantes por meio o bem-estar, o estado de saúde e a necessidade de serviços pelo fato de
dos chamados indicadores de saúde. Nesse sentido, as informações sobre não refletirem com precisão a saúde e a situação de morbidade. Os fa
funcionalidade e fragilidade são fundamentais. Informações sobre o esta tores físico, estrutural, pessoal, ambiental e participativo do indivíduo
do funcional são cada vez mais reconhecidas como uma parte importante estão interligados e necessitam, portanto, ser considerados. Não pode
da estrutura dos sistemas eletrônicos de informação em saúde. A maior mos considerar saúde sem levarmos em conta todos esses fatores.
parte dos inquéritos de saúde ou dos censos é deficitária no que diz res A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e
peito a esses dados e também na uniformização dos conceitos, sendo este Saúde — CIF/OMS tem exercido papel primordial e central nesse senti
ultimo aspecto primordial para a comparação epidemiológica, sobretudo do. Por trazer o estado de saúde conceituado de uma forma muito mais
para a detecção precoce dos grupos ou populações em risco. Segundo abrangente, os fatores contextuais ultrapassam a sua importância como
Lima (2010), a percepção da qualidade das informações se traduz por determinantes do estado de saúde e passam a ser considerados não só
meio de diversas iniciativas, como padronização das terminologias, facili como uma mudança do lócus da incapacidade mas também reconhece
dade de acesso às informações, disseminação dos processos envolvidos na a possibilidade de ser considerado o próprio lócus da intervenção e, por
elaboração dos indicadores, produção e análise dos dados. isso, da funcionalidade (BIZ, 2016).
É sabido que pessoas com a mesma condição de saúde podem Produzida pela Organização Mundial de Saúde e aprovada em As
apresentar diferentes graus de funcionalidade e incapacidade, ao passo sembléia Mundial de Saúde em 2001, a Classificação Internacional de
que pessoas com diferentes condições de saúde podem experimentar o Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF concebe um novo olhar
mesmo grau de fiincionalidade e incapacidade. A OMS conceitua que para os conceitos de saúde,funcionalidade e incapacidade. A publicação
estes fenômenos, além de multifatoriais, são influenciados pela con da Organização Mundial da Saúde(OMS),por considerar as atividades
dição de saúde, pelos recursos (econômicos e habilidades pessoais) e, e a participação social que o indivíduo que apresenta alterações de fun
também, pelo ambiente onde está inserida. A deficiência é complexa, ção e/ou da estrutura do corpo pode desempenhar, traz o contexto am
dinâmica, multidimensional e questionada. A Organização traz estu biental, onde as pessoas vivem como um importante determinante da
dos que mostram que o diagnóstico etiológico/nosológico, classifica funcionalidade e da incapacidade dos indivíduos e colocam em questão
do pela Classificação Internacional de Doenças - CID, não nos traz as idéias tradicionais sobre a saúde e a doença.
dados funcionais, não prevê, por exemplo, o tempo de hospitalização,
180
181
A classificação trabalha com qualificadores que especificam a exten tem possibilitado avanços positivos no enfrentamento destes desafios, já
são ou magnitude da funcionalidade ou incapacidade naquela categoria, atestados por vários países.
ou a extensão na qual um fator ambiental é um facilitador ou uma bar
reira. Um problema pode significar uma deficiência, limitação, restrição
ou barreira, dependendo do constructo. Essa perspectiva trazida pela Modelo de atenção e cuidado em saúde
CIE faz com que as possíveis alterações não sejam percebidas como con A Classificação foi aceita por 191 países, entre eles o Brasil, em
seqüência das condições do binômio saúde e doença, mas determinadas 2001,como a nova norma internacional para descrever e avaliar a saúde
também pelo contexto do meio ambiente físico e social, pelas distintas e a deficiência. Os conceitos apresentados na classificação introduzem
percepções culturais e posturas diante da deficiência, pela disponibili um novo paradigma para pensar e trabalhar a saúde e a doença, a de
dade de serviços e de legislação. Previamente, a incapacidade começava ficiência e a incapacidade. Este modelo de entendimento da funciona
onde a saúde terminava: uma vez que o indivíduo tivesse uma incapaci lidade é mais dinâmico e compatível com a complexidade do conceito
dade, ele estava em uma categoria separada. É a este paradigma concei de saúde. O modelo biomédico explica a deficiência ou doença na base
tuai que a CIF oferece a diferença, promovendo uma perspectiva inte- de desvios da norma de variáveis biológicas mensuráveis, constituindo o
grativa, multidimensional e universal da funcionalidade e incapacidade, único critério para a sua definição, em que a doença ocorre como pro
onde o indivíduo interage com o ambiente físico, social e atitudinal. blema biológico e a saúde como ausência de doença. Já o modelo social
A interação que a CIF oferece ao binomio saúde e ambiente apoia-se de incapacidade considera como um problema, criado pela sociedade e,
em tres princípios que traduzem a importância do ambiente na funcionali basicamente, como uma questão de integração plena do indivíduo na
dade do indivíduo; a universalidade, onde todas as pessoas independente da sociedade. Neste sentido, a incapacidade não é um atributo individual,
sua condição de saúde ou ambiente habitual podem ser inclm'das; a abor mas o resultado de um conjunto complexo de condições, muitas criadas
dagem integrativa, onde ambiente e pessoa — fatores ambientais e pessoais pelo ambiente, cuja resolução requer uma ação e uma responsabiliza
sao integrados e considerados^ a abordagem interativa, em que são reco ção social, com vista, sobretudo, às modificações ambientais necessárias
nhecidas a mulüdimensionalidade e a complexidade do fenômeno. para a plena integração das pessoas com incapacidade em todas as áreas
Por meio de uma linguagem padrão para a descrição da saúde e dos sociais. Deste princípio, emerge uma questão atitudinal ou ideológica,
estados relacionados a saúde, a CIF se estabelece como uma ferramenta que exige mudanças sociais e políticas, traduzida em uma questão de
direitos humanos, como traz Fontes (2014).
estatística e de gestão da informação para estudos populacionais como
um instrumento de pesquisa para medidas de resultados da qualidade A Classificação torna-se, assim, uma importante base conceituai
de vida e de planificação e avaliação clínica; como contribuição nos para a mensuração e formulação de políticas públicas para saúde e inca
desenhos curriculares e educacionais, tornando-se um importante ins pacidade, possibilitando coordenar e integrar os conceitos de funciona
trumento para a avaliação das condições de vida e para a promoção de lidade/incapacidade em todos os níveis de decisão política e em todos
políticas de inclusão social. Alias, e ai onde se encontra seu mais impor os setores.

tante uso: uma ferramenta de planejamento e política para a tomada A CIF tal como ela é, com sua hierarquia de classe e suas definições,
de decisões, pois o modelo biopsicossocial de funcionalidade e incapa ajuda a padronizar as informações de estado funcional no sistema de
cidade permite a descrição da experiência completa de saúde das pes informação em saúde.
soas. A adoção desse modelo biopsicossocial operacionalizado pela CIF
182 183
A CIF e uma classificação e não um instrumento de avaliação, uma A CIF possibilita a construção progressiva de escalas que clarifi
vez que não estabelece os limites de quem é ou não pessoa com defi quem o fenômeno saúde-doença-fúncionalidade-cuidado. Promove a
ciência. Define incapacidade como uma condição mais abrangente que mudança de uma abordagem baseada nas doenças para uma abordagem
deficiência, consistindo em um termo genérico que inclui deficiências, que prioriza a funcionalidade como um componente da saúde, além
limitações de atividades e restrições à participação. O termo incapacidade de considerar o ambiente como facilitador ou como barreira para o de
indica principalmente os aspectos negativos da interação entre um indiví sempenho de ações e tarefas, pois a funcionalidade tornou-se o ponto
duo com uma determinada condição de saúde e seus fatores contextuais central para avaliação e determinação de condutas. Fornece informações
— fatores ambientais ou pessoais —, envolvendo uma relação dinâmica. A de funcionalidade e incapacidade associadas aos estados de saúde, per
CIF, portanto, transformou-se de uma classificação de "conseqüência da mitindo mensurar as mudanças de estado relativas à condição de saúde;
doença (ICIDH/versão de 1980)tm. uma classificação de "componentes da classifica e descreve o contexto em que esses problemas acontecem, o
saúde . Os componentes da saúde" identificam o que constitui a saúde, que possibilita o planejamento, a organização e a efetiva resolutividade
enquanto as "conseqüências" se referem ao impacto das doenças na con das ações e dos serviços em saúde. Os ambientes onde as pessoas vivem
dição de saúde da pessoa. Deste modo,a CIF assume uma posição neutra têm um efeito enorme sobre a prevalência e extensão da deficiência.
em relação a etiologia de modo que os investigadores podem desenvolver Mensurar essas interações pode dar origem a informações úteis sobre se
inferencias causais utilizando métodos científicos adequados. devemos focar o indivíduo (prover um dispositivo assistivo), a sociedade
De maneira similar, esta abordagem também é diferente de uma (implementar leis contra a discriminação) ou ambos.
abordagem do tipo "determinantes da saúde" ou "fatores de risco".
No caso da deficiência, essa pode ser parte ou uma expressão de uma
condição de saúde, mas não indica necessariamente a presença de uma Normatizaçáo e uso da CIF
doença ou que o indivíduo deva ser considerado doente. Dentro desse Ciente da necessidade de se conhecer o que acontece com o usuário
contexto, a saúde é vista como um recurso para a vida ao se enfatiza após o diagnóstico de saúde e entendendo a CIF como uma ferramenta
rem os recursos sociais, pessoais e a capacidade física. Essa multidire- capaz de estabelecer o diálogo entre as diversas políticas de saúde e seu
cionalidade trazida pelo modelo da CIF, em que os fatores ambientais, potencial para transposição de um paradigma no modelo de atenção e
sociais e pessoais não são menos importantes que a presença de doença cuidado em saúde, o Conselho Nacional de Saúde publicou, em 2012,
na determinação da função, da atividade e da participação, traz im uma resolução que versa sobre o tema. A Resolução n.° 452/12 do Con
portante diferencial no modelo de atenção e cuidado em saúde, possi selho Nacional de Saúde dispõe que a Classificação Internacional de Fun
bilitando desenvolver estratégias e ações de enfrentamento ao processo cionalidade, Incapacidade e Saúde — CIF seja utilizada no Sistema Único
de envelhecimento populacional. de Saúde, inclusive na Saúde Suplementar.
A CIF complementa os indicadores que tradicionalmente tem seu Com a Resolução n.° 452, aprovada em plenária do Conselho
foco em óbitos ou morbidades. Segundo a OMS, a CID-10 e a CIF Nacional de Saúde e homologada pelo Ministério da Saúde, temos a
são complementares: a informação sobre o diagnóstico acrescido da instância máxima do controle social exercendo uma de suas principais
funcionalidade fornece um quadro mais amplo sobre a saúde do indi funções: a de propor estratégias em políticas de saúde.
víduo ou populações. Um dos modelos exitosos que contribuiu para embasar a proposi
ção de Resolução pelo Conselho Nacional de Saúde foi a experiência de
184 -J
185
concessão do Benefício de Prestação Continuada à Pessoa com Defici Considerações Finais
ência. Desde 2009, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate "i-'!
Contudo, é necessário que novas normas, diretrizes e legislações r
à Fome, Ministério da Previdência Social, vem utilizando instrumento
dispondo sobre o uso da CIF sejam estabelecidas. Pouco avançamos
de avaliação para a concessão do beneficio, que tem a CIF como base.
na incorporação da Classificação nos serviços, no desenvolvimento de Mt
A construção do novo Modelo de Avaliação da Pessoa com Deficiência
instrumentos incorporados à rotina de trabalho, na criação de banco de :r:, í
partiu da necessidade de realizar estudos visando propor parâmetros, pro
dados, na incorporação ao sistema de informação em saúde.
cedimentos e instrumentos de avaliação das pessoas com deficiência para
o acesso de forma equânime ao BPC, uma vez que o Brasil não dispunha Discutir questões que envolvem a inclusão e participação social, aten J' I
de metodologia unificada para a classificação de deficiências e avaliação ção e cuidado se tornará cada vez mais premente conforme a demografia da
de incapacidades com vistas ao acesso aos distintos serviços, programas e sociedade muda e a população envelhece. Necessitamos de dados confiáveis
benefícios garantidos pelas políticas públicas. e comparáveis sobre a saúde de indivíduos e populações, incluindo determi
nar a saúde geral das populações, a prevalência e a incidência de condições
A partir do Decreto n.° 6.214, de 26 de setembro de.2007, o con
não fetais, medir necessidades de cuidados de saúde e o desempenho e efe
ceito de incapacidade passou a considerar atributos da pessoa com de
tividade dos sistemas de cuidados de saúde.
ficiência os fatores ambientais. A avaliação da deficiência e do grau da
incapacidade incorporou como base a Classificação Internacional de De acordo com Di Nubila (2008), as avaliações funcionais não po
Funcionalidades, Incapacidade e Saúde- CIF, da Organização Mundial dem continuar sendo realizadas apenas sob o olhar biomédico e focado
da Saúde - OMS e composta por avaliação médica e social. O instru no corpo, e a CIF se apresenta como uma ferramenta mais adequada e
mento, além de trazer uma forma mais judiciosa no processo de avalia abrangente para uma abordagem biopsicossocial. A autora pontua que r.,.

ção e concessão, reforça a importância de instrumentos de avaliação que a tendência atual é que a CIF se torne a base para avaliações multi-
profissionais, na definição de metas, gerenciamento das intervenções e
.

possibilitem estabelecer mensuraçóes com base no estado de saúde e de


forma interdisciplinar, pois agregou à avaliação o profissional Assistente medida de resultados.
Social, não ficando mais apenas sobre a responsabilidade do profissional Mantemos ainda um enraizamento poderoso no que diz respei
médico, a avaliação e a concessão. A resposta foi vista como positiva to à dialética do modelo biomédico, tanto no que se relaciona com a
inclusive pelos profissionais. Um dos importantes efeitos positivos dessa formação quanto na ação das nossas práticas profissionais. Admitir e
mudança no modelo de concessão foi a diminuição da judicialização na agir de forma equitativa e dinâmica com todas as dimensões que hoje
concessão de benefícios. H conhecemos da funcionalidade torna-se um importante exercício para
A CIF também consta do roteiro de itens de verificação do Progra gerir e colocar em prática o cuidado em saúde, que acolha o processo r '
ma Nacional de Avaliação dos Serviços de Saúde - PNASS, do Minis de envelhecimento em sua plenitude. O olhar sobre risco de alterações
tério da Saúde na avaliação dos Centros Especializados em Reabilitação da funcionalidade deve ser o foco da nossa prática, levando-nos a pen
(CERs). Os serviços devem apresentar documento comprobatório de sar em ações e estratégias que possibilitem potencializar as atividades ' í -Z
uso da classificação. funcionais dos sujeitos, diminuindo suas limitações e alavancando sua ■."1
■s > participação social e cidadania. Possibilita pensarmos e efetivarmos um
modelo de atenção e cuidado que considere os aspectos biológicos e
sociais do indivíduo, porém sendo classificados juntos, compreendendo

186
187
ambos os aspectos como determinantes do estado de saúde do indi Leitura Recomendada:
víduo. A estrutura proposta pela CIF possibilita constituir uma lin
1. Araújo, ES; Biz, MCP - O planejamento em saúde na prática. Revista Científica CIF Brasil. 2016-
guagem universal, possibilita pensar em políticas e ações para além 5(5):24-30.
da interdisciplinaridade, permitindo construir estratégias calcadas no 2. Biz, MCPB. Oficinas sobre a incorporação da Classificação Internacional de Funcionalidade, Inca
trabalho intersetorial. pacidade e Saúde, CIF/OMS, no sistema de informação em saúde: A Resolução 452/12 do Conselho
Nacional de Saúde como norteadora da discussão.
http.//www.revistacifbrasil.com.br/ojs/index.php/CIFBrasil/article/view/40 Acesso 07/05/17
3. Brasil. Estatuto do Idoso. Lei Federal n.° 10.741
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/Ll0.741.htm. acesso 07/05/17
4. Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome.Avaliação de pessoas com deficiên
cia para acesso ao Beneficio de Prestação Continuada da Assistência Social.
http://www.mpgo.mp.br/portalweb/hp/4l/docs/avaliacao_das_pessoas_com_deficiencia_-_bpc.pdf
acesso 14/04/17

5. Brasil. Programa Nacional de Avaliação dos Serviços de Saúde, PNASS. Ministério da Saúde, 2015
http://ponalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2015/junho/24/Rela—-o-de-Documentos-para-Visita-
de-Avalia—-o—Centro-Especializado-em-Reabilita—o-CER-.pdfacesso 07/05/17
6. Conselho Nacional de Saúde. Resolução 452/12 http://conselho.saude.gov.br
7. Dl Nubila,H.B.V; Buchalla, C.M O papel das Classificações da OMS - CID e CIF nas definições de
deficiência e incapacidade, São Paulo, 2008
8. Fontes, AP; Fernandes, AA; Botelho, MA. Funcionalidade e incapacidade: aspectos conceptuais, es
truturais e de aplicação da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF).
Publicado na Rev Port Saúde Pública. 2010;28:171-8
9. Lima, CR de A. Gestão da qualidade dos dados e informações dos sistemas de informação em saúde:
subsídios para a construção de uma metodologia adequada ao Brasil. 2010. 156f. Tese (Doutorado em
Saúde Pública) -Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 2010.
10. Organização Mundial de Saúde. Relatório Mundial sobre a deficiência. http://www.pessoacomdefi-
ciencia.sp.gov.br/usr/share/documents/RELATORIO_MUNDIAL_COMPLETO.pdf
11. Organização Mundial de Saúde(OMS). CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Inca
pacidade e Saúde. Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde para a Família de Classifica
ções Internacionais, org.; coordenação da tradução Buchalla, C.M.j. São Paulo: Editora da Universida
de de São Paulo — EDUSP,2015

12. Raty, S.; Aromaa, A.; Koponen, P. Measurement of physical fimctioning in comprehensive na-
tional health surveys - ICF as a framework. Oakland: National Public Health Institute, 2003. 171
p.https://www.researchgate.net/profile/Paeivikki_Koponen/publication/265745038_Measure-
ment_of_physical_fimctioning_in_comprehensive_national_health_surveys_-ICF_as_a_framework/
links/54a2518a0cG56bf8baf8083.pdfacesso 07/05/17.

188
189
IMPLANTANDO A CIF: O QUE ACONTECE NA
PRÁTICA?

MariaJosé Ribeiro Tavares


Terapeuta OcupacionaL
Especialista em Saúde Pública.

Falar da CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade, Inca


pacidade e Saúde) é discorrer de algo complexo, sistêmico, dinâmico,
trabalhoso e, ao mesmo tempo, apaixonante, envolvente e que nos faz
refletir sobre o olhar de nossas profissões, na forma de avaliar e de tra
çar um plano terapêutico com o paciente/cliente/usuário, objetivando
de forma mais clara e diretiva a funcionalidade do sujeito. Afinal, de
que funcionalidade estamos falando? A CIF discute alguns conceitos,
como Funcionalidade, Capacidade, Desempenho,Atividade, Participa
ção, Fatores Ambientais, e ver que cada um deles está intrinsicamente
relacionado ao processo de reabilitação e ao contexto de vida do sujeito,
para quem está inserido na reabilitação, mas considerando que a.CIF
focaliza na funcionalidade e incapacidade classificando os estados de
saúde e os relacionados a saúde, baseado no modelo biopsicossocial, e
que qualquer pessoa pode ter sua funcionalidade alterada, em qualquer
momento da vida, e apresentar níveis de funcionalidade e incapacidade
permanente ou temporária.
No período de formação profissional, discutimos imensamente so
bre a Reabilitação, o olhar para o cliente após a avaliação e pensar que
abordagem utilizar, que material seria necessário para usar no processo
de Reabilitação (reinserção), seja na intervenção com uma pessoa com
alteração neurológica, reumatológica, traumato-ortopedia, saúde mental,
entre outras(mesmo tendo de fazer tudo isso, pois a CIF não é avaliação e

191
náo dispensa as avaliações inerentes a cada profissão), mas estou refletindo de Terapia Ocupacional fez o seguinte relato: "A maior dificuldade que
sobre o olhar multifatorial, sobre o contexto de vida dessa pessoa, de suas encontrei ao estudar a CIF está relacionada com afalta de contato prévio na
relações sociais, familiares, ambientais (barreiras e facilitadores) e de como graduação. Quando estudo sobre classificação de doenças, medidas defiincio-
utilizar esses dados como ferramenta estatística e como possibilidade de nalidade ou outros modelos de quantificações de dadospara avaliações, auto
ser determinantes para planejamento das ações de saúde, do ambiente, da maticamente se entende a sua aplicabilidadeporquepreviamente eujá havia
Seguridade Social etc. estudado esses tipos de avaliações. A CIFpor ser um instrumento de classifica
A CIF vem em processo de solidificação desde os meados dos anos ção exige um debruçarfocado nos termos e nos classificadores. Esse raciocínio
70, passando por nomenclaturas e discussões para sua melhor utüização. épresente em outros instrumentos, o que acaba sendo um agentefacilitador,
Chega ao século XXI com a atual denominação de Classificação Interna porém, quando não se tem contato prévio com esse recurso, até mesmo a sua
cional de Funcionalidade Incapacidade e Saúde. Na Resolução da OMS aplicação se compromete. Estudo a CIE hoje para poderfazer uso dela em
n.° 54.21/2001, 191 estados membros adotaram a então Classificação, ba futuros encaminhamento, laudos e controle de tratamento, entendendo que a
seados no Modelo Biopsicossocial. O Conselho Federal de Fisioterapia e uniformização de termosfavorece o meufazer enquanto terapeuta ocupacio
Terapia Ocupacional em 2009 adota a Classificação por meio da Resolução nal. Ter a compreensão de que o indivíduo épermeado por diversos contextos
n.° 370, de 06/11/2009. Em 2012, o Conselho Nacional de Saúde(CNS) e que eles interferem no seu desempenhofacilita ouso da CIF. Dessa maneira,
por meio da Resolução n.° 452, de 10 de maio de 2012 institui o uso da utilizar^ essa classificação no meu cotidiano profissionalfacilita e ajuda-me na
CIF no Sistema Único de Saúde (SUS), inclusive na Saúde Suplementar. interpretação de dados com os outrosprofissionais envolvidos com o cliente".
Nesse contexto legal de validação da CIF, cursos, oficinas, encontros presen Outras situações apontadas na oficina com o enfoque da dificul
ciais ou on-line vêm acontecendo no esforço de que a Classificação possa se dade são quanto as condições de trabalho, pois grande parte das pes
difundir, e sua utilização nos serviços torne-se familiar, corriqueira. Neste soas que passaram pelas oficinas relatou que, na maioria dos serviços
inmito de colaboração, a CIF BRASIL(Programa HODU-CIF BRASIL) públicos, as condições de trabalho são precárias, como, por exemplo,
tem por missão disseminar o conhecimento da CIF, bem como objetivá-la prontuário eletrônico ou computador à disposição do serviço para
incluir nas grades curriculares dos cursos de graduação e pós-graduação e realizar um encaminhamento/laudo adequado. FIá serviços que não
ainda desenvolver sistemas de informações em Instituições e Municípios. É possuem nem banheiro adaptado. Neste caso, até a avaliação da capa
dentro desse contexto de disseminação da CIF que trago relatos e experiên cidade para determinadas atividades do dia a dia fica comprometida
cia de discussões em oficinas com profissionais da área de reabilitação. Os no processo de avaliação. Estes questionamentos foram discutidos e
questionamentos citados são reais e colaboram na discussão crítica sobre a nos ajuda a pensar o quanto precisamos da CIF para melhor planejar
dificuldade de utilização da CIF e suas nuances. e colaborar no processo de estruturação do ambiente, melhorando a
Ao questionar os profissionais durante a realização da oficina, sobre qualidade de vida das pessoas. Precisamos da apropriação da classifi
a resistência em utilizar a CIF, as respostas mais imediatas são quanto cação para validar as recomendações legais como a Resolução do CNS
à dificuldade de classificação e "para que usá-la se não vou utilizar seus que coloca a CIF dentro do Sistema Único de Saúde e, assim, cobrar
dados para adivulgação". Se for encaminhar um relatório a outro colega dos gestores sua implantação nos serviços. Mostrar para as pessoas, in
ou mesmo a uma Instituição/Órgão, provavelmente estes não terão co clusive as que estão sendo avaliadas, que a CIF por ser uma ferramenta
nhecimento. Por que utilizar se não há pagamento pelo Sistema Único de de classificação norteia várias possibilidades de cuidado com o outro,
Saúde(SUS) tampouco pelos Planos de Saúde? Nesta oficina, um aluno na sua interação com o ambiente. Para os profissionais, a identificação

192
193
de como o uso da CIF pode enriquecer suas avaliações e intervenções, res externos (ambiente padrão), enquanto o desempenho tem a influência
como pode ser uma ferramenta riquíssima nas perícias judiciais, na do ambiente. Se a capacidade é maior que o desempenho, é porque algo
avaliação no INSS, no planejamento Urbano, norteando, assim, um no ambiente constitui barreira. Sendo assim, podem-se ter qualificadores
caminho para futuras intervenções. diferentes para capacidade e desempenho. Em um exemplo clássico, uma
Em continuidade, na oficina realizada para profissionais, como fisio-
pessoa pode ter capacidade normal para deambular dentro de casa, porém
seu desempenho está comprometido ao andar na rua, em decorrência das
terapeutas e terapeutas ocupacionais (sendo o público que, no momen
barreiras ambientais,como calçada com obstáculos, buracos,rua muito mo
to, se interessou pela oficina, porém esta foi aberta para qualquer pessoa
e de diversas áreas que tivesse interesse no uso da CIF) que atuam em
vimentada, entre outros fatores. A capacidade está relacionada às funções e
área, como de perícia judicial, reabilitação física, saúde mental e saúde
estruturas do corpo, enquanto o desempenho com os fatores ambientais.
Estes fatores podem ser identificados como fàcilitadores ou barreiras; o ôni
pública, vários questionamentos foram elencados, e, também, surgiram
diversas dúvidas (e com eles a "dor de cabeça") na tentativa de entender
bus lotado constitui irnia barreira para o usuário. Caso este fosse adaptado
e garantisse a segurança e boa acomodação do indivíduo, seria considerado
e visualizar os códigos da CIF nos relatórios a serem constrm'dos. Outros
um facilitador.
questionamentos, como classificar o Desempenho e a Capacidade e os
fatores ambientais, são os maiores. Como diferenciar um e outro e como Para entendermos melhor a aplicação da CIF, apresento outro caso
quantificar? Afinal, capacidade e desempenho não são sinônimos? Como, hipotético e adaptado que realizei em uma oficina sob a orientação do
por exemplo, consigo quantificar o quanto a vibração (e255) pode ser Dr. Ricardo Lopes, terapeuta ocupacional, e que utilizo de forma bem
prejudicial ao sujeito? Neste caso-, como qualifico a capacidade ou o de prática para discussão de caso clínico. Vamos, a partir dos códigos, pen
sempenho? O usuário pode ter o desempenho prejudicado e a capacidade sar na classificação. Jéssica, 32 anos é acompanhada por um serviço de
normal? Observa-se que é um verdadeiro dilema quando pensamos em saúde mental por apresentar transtorno mental severo. Tem CID F20,
aplicar na prática esses conceitos. Um questionamento chamou bastante de acordo com a avaliação psiquiatra. Após a avaliação para classificar
a atenção em um exemplo hipotético de uma pessoa que apresenta uma o estado de saúde utilizando a CIF, obtiveram-se as seguintes informa
limitação de amplitude de movimento de ombro, diminuição de força ções: bllO.2; bll4.1; bl 17.1; bl30.4; bl34.3; bl40.1;bl44.1; bl52.4:
muscular e um comprometimento da função manual para a função de bl56.2; bl64.1; bl67.1; d220.3;d510.3 d570.4; d640.4; d660.4
preensão em membro superior direito(MSD),considerando ainda como d710.3; d720.4 ;d730.2; d740.4; d750.2; d760.4; d770.4; d820.3
lado dominante deste indivíduo. Esta pessoa tem a necessidade de pegar d830.4; d850.4; d860.4; d870.4; d910.3; d920.4; d930.1; ellO.2
um ônibus para ir ao centro de tratamento e aí não consegue lugar para e310.3; e320.3; e325.4; e330.4; e355+2; e4l0.4; e420.3; e450+4:
sentar e precisa segurar-se para não cair. A questão foi o que eu vejo ou e460.4. Então vamos descrever separadamente as funções do corpo, do
avalio? Para as atividades mais corriqueiras, a pessoa consegue realizar as mínio (participação e atividade) e os fatores ambientais. Para as funções
tarefas, como alimentar-se, vestir-se, tomar banho,sacar dinheiro no ban e estruturas, utilizaremos o termo deficiência; para a atividade e parti
co, mesmo com certo grau de dificuldade. Tem capacidade de pegar o cipação, utilizaremos limitação e restrição do desempenho, respectiva
ônibus, porém não consegue usá-lo adequadamente porque sua função mente; e para os fatores ambientais, barreiras ou facilitadores.
manual e a força muscular estão comprometidas. O que qualificar? A ca bllO.2- deficiência moderada das funções mentais (consciência);
pacidade? O desempenho? Quem está mais comprometido? bl 14.1- deficiência leve das funções mentais relacionadas à orientação;
Vamos lembrar que capacidade é avaliada sem a interferência de fato- bll7.T deficiência leve das funções intelectuais; bl30.4- deficiência

194 195
completa das funções mentais das funções da energia e de impulso; cívica relacionada a vida comunitária; d920.4- limitação grave no de
b 134.3- deficiência grave das funções mentais relacionada ao sono; sempenho da vida comunitária, social e cívica relacionada à recreação
b 140.1-deficiência leve das funções mentais relacionada à atenção; e ao lazer; d930.1- restrição leve no desempenho da vida comunitária,
bl44.1- deficiência leve das funções mentais da memória; bl52.4- de social e cívica no âmbito da religião e espiritualidade; ellO.2- barrei
ficiência completa das funções emocionais; b 156.2- deficiência mode ra moderada no uso de produtos e tecnologia relacionada ao consumo
rada das funções mentais relacionada às funções da percepção; b164.1- pessoal; e310.3- barreira considerável relacionada ao apoio e relaciona
deficiência leve das funções mentais relacionadas às funções cognitivas mento da família imediata; e320.3- barreira considerável relacionada
superiores; b 167.1- deficiência leve das funções mentais relacionada às ao apoio e relacionamento com os amigos; e325.4-barreira completa
funções mentais da linguagem; d220.3- restrição grave das tarefas e de relacionada ao apoio e relacionamento com conhecidos, companheiros,
mandas gerais ao realizar tarefas múltiplas; d510.3- restrição grave no colegas, vizinhos e membros da comunidade; e330.4-barreira completa
desempenho do cuidado pessoal ao lavar-se; d570.4- restrição completa relacionada ao apoio e relacionamento com pessoas em posição de au
no desempenho do cuidado pessoal ao cuidar da própria saúde; d640.4- toridade; e355+2- profissionais de saúde como apoio e relacionamen
restrição completa no desempenho da vida doméstica das tarefas do to servindo como facilitador moderado; e4l0.4- barreira completa nas
mésticas; d660.4- restrição completa no desempenho da vida domés atitudes individuais de membros da família imediata; e420.3- barreira
tica ao ajudar os outros; d710.3- restrição grave no desempenho das considerável nas atitudes individuais com amigos; e450+4- profissionais
relações e interações interpessoais básicas; d720.4- restrição completa de saúde como facilitador completo referentes às atitudes individuais;
no desempenho das relações e interações interpessoais relacionadas às e460.4- barreira completa nas atitudes sociais.
interações complexas; d730.2- restrição moderada no desempenho das
relações e interações interpessoais nas relações com estranhos; d740.4- Após descrever separadamente o que significa cada código, vemos
restrição completa no desempenho das relações e interações interpes com clareza os maiores pontos de dificuldades/limitações da pessoa e
soais nas relações formais; d750.2- restrição moderada no desempenho assim compreender com totalidade seu grau de funcionalidade. A par
das relações e interações interpessoais nas relações sociais informais; tir daí, conseguimos formular pareceres/laudos para encaminhamentos
d760.4- restrição completa no desempenho das relações e interações a diversos setores e/ou serviços. Descrevi de forma sucinta um laudo
interpessoais referentes as relações familiares; d770.4- restrição comple para o INSS para fins de perícia considerando os dados obtidos pela
ta no desempenho das relações e interações interpessoais nas relações CIE Este laudo é apenas ilustrativo e exemplificativo, não constituindo
íntimas; d820.3- restrição grave no desempenho das áreas principais como modelo único a ser seguido.
da vida relacionada à educação escolar; d830.4- restrição completa no Apos avaliação do estado de saúde de Jéssica, 32 anos, em acompa
desempenho das áreas principais da vida relacionada à educação supe nhamento no serviço de saúde mental, segue o laudo conforme a CIE,
rior; d850.4- restrição completa no desempenho das áreas principais para fins de perícia do INSS.
da vida no âmbito do trabalho remunerado; d860.4- restrição com Jéssica apresentou deficiência grave das funções mentais relaciona
pleta no desempenho das áreas principais da vida no âmbito das tran das ao sono; deficiência completa das funções emocionais; deficiência
sações econômicas basicas; d870.4-restrição completa no desempenho moderada relacionada à consciência e percepção; deficiência leve das
das áreas principais da vida relacionada à autossuficiência econômica; funções de orientação, intelectuais, atenção, memória,linguagem e fun
d910.3- limitação grave no desempenho da vida comunitária, social e ções cognitivas superiores, assim como restrição grave no desempenho

196
197
do cuidado pessoal ao lavar-se, nas interações interpessoais básicas; res DIRETO NA CIF. Dessa forma, quando vamos avaliar o qualificador,
trição completa no desempenho da vida doméstica ao ajudar os outros, devemos pensar no tempo de comprometimento no período de 30 dias,
bem como nas relações de interação interpessoal complexa, nas relações como segue no exemplo:
formais, familiares e nas íntimas; barreira completa nas atitudes sociais, . O-(0% -4%)- 1,2 DIAS.
porém tem como facilitador completo as atitudes individuais dos profis
. 1- (5%-24%)- 1,3 a 2 DIAS.
sionais de saúde, o que sugere que Jéssica mantenha-se ligada ao serviço
de saúde para trabalhar as demandas identificadas e, para isso, necessita .2-(25% -49%)- 3 a 14,7 DIAS.
de afastamento das atividades laborais. . 3-(50% -94%)-l4,8 a 28,2 DIAS.
O relatório final pode ser realizado em formato de tabela, o que fa .4-(95%- 100%)- 28,3 a 30 DIAS.
cilita mais a compreensão. Mas, é indispensável colocar as legendas dos .8- não especificada.
qualificadores, pois é por meio dos qualificadores que identificamos os .9-não se aplica.
níveis de funcionalidade e/ou incapacidade. A CIF é composta por inú Os qualificadores da CIF podem ser usados para descrever firequência,
meras categorias, que descrevem aspectos da funcionalidade humana duração ou localização, além de fetores ambientais relevantes e outras infor
classificadas entre componentes, como Funções do corpo. Estruturas do mações(manual prático da CIF,2013). Como segue abaixo:
corpo. Atividade, Participação e Fatores Ambientais, sendo consideravel
mente difícil englobar todos os itens na avaliação (meio impraticável) e, _xxx.O: não há problema: A pessoa não tem nenhum problema em
para isso, objetivando mais a sua utilização, foram desenvolvidos core sets nenhuma ocasião ou apenas muito raramente.
da CIF, que nada mais é que categorias da CIF mais direcionada e signi . _xxx.1: problema leve: O problema está presente menos do que
ficativa à funcionalidade para determinadas condições de saúde. Isto não 25% do tempo, com uma intensidade tolerável, e ocorreu apenas rara
significa reduzir a CIF ou subutilizá-la, mas direcioná-la ao uso clínico em mente nos últimos trinta dias.
questão. Existem alguns core sets desenvolvidos, a exemplos de lombalgia, . _xxx.l: problema moderado: O problema está presente entre 25% e
depressão, câncer de mama, acidente vascular cerebral, entre outros. 50% do tempo,com uma intensidade que às vezes interfere na vida diária.
A CIF se aplica a todas as pessoas, em diferentes situações de vida, . _xxx.l: problema grave: O problema está presente entre 50% e
com incapacidade permanente ou temporária, seguindo uma linguagem 95% do tempo,com uma intensidade que ocorre freqüentemente e par
unificada, padronizada e uma estrutura para a saúde e os estados relacio cialmente altera a vida diária.
nados à saúde. Os questionamentos relativos às dificuldades em sua uti
lização perpassam pela questão dos qualificadores, de como vou atribuir . _xxx.l: problema completo: O problema está presente mais do que
o grau de dificuldade ou deficiência, se é leve, moderada, grave, enfim, 95% do tempo,com uma intensidade que altera totalmente a vida diária.
assim como na participação e atividade. Como dizer, por exemplo, que Dessa forma, fica mais fácil entender sobre a magnitude dos
uma pessoa tem restrição grave no seu desempenho? Baseada em quê? qualificadores e pensar no raciocínio clínico. Podemos discorrer de
Cada profissional pode achar dentro da sua ótica que a restrição ou a inúmeros exemplos e assim classificá-los, porém nenhum será igual
limitação não seja tão grande assim. E aí como unificar esse qualificador? ao outro, pois pessoas com a mesma doença não têm necessariamen
Nesse contexto, a OMS (2001) atribuiu como base consensual o TEM te o mesmo nível funcional, assim como duas pessoas com o mesmo
PO LIMITE DO QUALIFICADOR DE TRINTA DIAS PARA USO nível funcional não têm a mesma doença. São situações que vemos

198 199
cotidianamente no acompanhamento aos clientes. Muitas vezes, não
I
nos dávamos conta ou talvez não entendêssemos o porquê dessas
questões. Com a CIF, isso fica mais claro e mensurável. Segundo
o Prof. Ms Mario Batisti em seu vídeo sobre a CIF (https://www. A FUNCIONALIDADE HUMANA E A EDUCAÇÃO
youtube.com/results?searcb_query=cif+ com+prof+mario+batisti), EM FISIOTERAPIA: REFLEXÕES NECESSÁRIAS NA
onde faz uma comparação sobre os modelos biomédicos e o biopsi- CONTEMPORANEIDADE A LUZ DA FORMAÇÃO NA
cossocial: "para o modelo biomédico o indivíduo é um corpo com GRADUAÇÃO
funções e fisiologia somado as alterações anatômicas", enquanto, no
modelo biopsicossocial, é um corpo com suas estruturas anatômi
Mauro Antônio Félix
cas, suas funções e fisiologias em confronto com o meio ambiente Fisioterapeuta.
(produtos, tecnologia, leis, família...). No modelo biopsicossocial, Mestre em Antropolo^a Social.

a classificação pode iniciar de qualquer ponto, seja dos fatores am


bientais, do desempenho, das funções e estruturas do corpo e não,
obrigatoriamente, da doença (modelo multidirecional).
A profissão de fisioterapeuta continuamente desenvolve-se fomen
Este capítulo versa acerca de discussões e experiência prática sobre a tando *a necessidade de refletir sobre a formação, em especial a gradu
CIF, como forma de estimular os leitores a incorporar a classificação nos ação. No Brasil, vivemos um momento de transição na educação em
seus processos de trabalho. Para tanto, finalizo os relatos com uma expe Fisioterapia com a revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais que de
riência exitosa baseada nos cursos que fiz on-line pela CIF BRASIL, pre verá orientar e avançar na qualificação do processo de desenvolvimen
sencial com Dr. Eduardo Santana Cordeiro e Dr. Ricardo Lopes Corrêa to de competências profissionais. Porém, dentro deste processo, várias
e pelos colegas que, em sua prática diária, usam a CIF e pelo trabalho Instituições de Ensino Superior têm contribuído com inovações, sejam
extensivo dos Órgãos de Classes, Ministério da Saúde, Conselho Na nas estratégias de ensino e aprendizagem, por meio de metodologias
cional de Saúde, Associação Brasileira de Saúde Coletiva(ABRASCO), ativas, ou na discussão e implementação do olhar diante das questões
Instituições de Ensino Superior (lES), que adotaram a CIF e colaboram fundantes da Fisioterapia, por exemplo, a concepção do Objeto de Es
para a sua disseminação e para a melhoria de um país mais justo e com tudo e, consequentemente, as questões cinético-fimcionais que envol
menos desigualdades sociais. vem a profissão. Este trabalho, em formato de relato de experiência,
visa refletir sobre o processo de formação na graduação em Fisioterapia
da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS sob a luz da
funcionalidade humana.

APRESENTAÇÃO DA TEMÁTICA
Ao refletirmos sobre o conceito de saúde, podemos fazer um rá
pido retrocesso temporal ao período após a Segunda Guerra Mundial,
na qual surge a Organização Mundial de Saúde e cunba-se na segunda

200 201
metade do século XX o conceito de "Estado de Bem-Estar" {WellFair aspectos da vida por meio da perspectiva de saúde, podemos entender
Staté)(NOGUEIRA, 2001). Concepção esta que recebe influências que tudo que envolve o sujeito condiciona seus aspectos, ou seja, a saú
das cartas e declarações internacionais em saúde e culmina no enten de é determinada socialmente. Consideremos o exemplo descrito por
dimento de que a vida, por meio da perspectiva da saúde, é determi Rosemberg e Minayo (2001) no texto "A Experiência Complexa e os
nada socialmente(BRASIL,2002a). A Comissão Nacional dos Deter Olhares Reducionistas" em que o contexto cultural, social, econômico
minantes Sociais de Saúde descreve os determinantes sociais de saúde molda as condições de saúde de uma usuária (paciente), bem como as
como "fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicoló questões descritas na Carta de Ottawa (BRASIL, 2002a), na qual des
gicos e comportamentais"(BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007). creve a saúde como indissociável de desenvolvimento social;(c) por fim,
Ao considerarmos esta concepção de vida diante da epistemologia ao considerarmos a vida por meio do olhar do objeto de estudo da Fisio
da Fisioterapia, devemos ponderar sobre o Objeto de Estudo da profis terapia, necessariamente devemos associar os aspectos objetivos e sub
são, o Movimento Humano(REBELATO,BOTUME,1999). Parto do jetivos dos seres humanos, ou seja, não podemos nos limitar ao torque,
entendimento que, muito antes de um objeto de estudo moldar o ponto ao tônus, à força muscular, à capacidade ventilatória, à força de ejeção
de vista, é o ponto de vista que molda o objeto (SAUSSURE, 2003, p. do coração... Devemos também considerar as concepções de corpo, os
15 apudUíCFBDA,2010). valores, os significados, os modos de vida, a cultura...(ARAÚJO,2010;
KUNZ, s.d.). No todo, para sermos fisioterapeutas, devemos conside
O Movimento Humano por inúmeras vezes foi relegado apenas
rar uma abordagem humanizada, centrada no usuário, considerando
diante de seus aspectos objetivos definidos nas ciências naturais. Uma
as dimensões a partir do objeto de estudo da profissão (REBELATO,
autora que muito colaborou para isso foi Sahrmann (2014)ao descrever
BORUMÉ, 1999; BRASIL, 2009; MEHRY,2007).
o objeto de estudo da Fisioterapia como o Sistema de Movimento, por
vezes entendido equivocadamente pelos profissionais como apenas os Em 2001, a OMS propôs a Classificação Internacional de Fun
sistemas orgânicos. Se estamos abordando a vida de um ou mais sujei cionalidade, Incapacidade e Saúde (ICF). Nesta perspectiva, podemos
tos, será que o olhar do fisioterapeuta é reduzido apenas a seus aspec perceber a direta relação entre as funções e estruturas do corpo com
tos biomédicos? Entendo que, ao considerarmos a vida das pessoas, na a atividade e participação, denominando funcionalidade. Para se ter
perspectiva do Movimento Humano, devemos olhar tanto os aspectos funcionalidade (completa), será considerada a influência do contex
objetivos, oriundo das ciências naturais, quanto os subjetivos, oriun to de vida, seja do ambiente físico, social e atitudinal, bem como a
dos das ciências sociais e humanas. Isso se justifica por três motivos: presença ou não de distúrbio ou doença. Ainda, dentro das questões
(a) pela concepção de vida como algo indissociável das dimensões que contextuais, devem-se respeitar os fatores pessoais que compõem o su
compõem o set humano, ou seja, os aspectos biológicos, psicológicos, jeito.(CIF, 2015). Nesta perspectiva, pode-se perceber a relação direta
sociais e espirituais. Utilizo a alegoria do pintor e svi2.godê (objeto segu- entre a funcionalidade e os determinantes sociais de saúde, na qual a
tado na mão com cores primárias e secundárias). Ao jogar as cores na idéia de integralidade do Ser (humano) é representada por meio do
tela com seu pincel, molda-se uma pintura como única, na qual as cores Objeto de Estudo da Fisioterapia.
ao se misturarem tomam novas formas, texturas e cores, por excelência, Ao considerarmos a vida das pessoas, o fisioterapeuta tendo o Mo
inseparáveis. Deste modo, todo ser humano é dotado de um corpo físi vimento Humano como objeto abotdará a funcionalidade por meio dos
co, um corpo psíquico, um corpo social e um corpo espiritual reunido seus aspectos cinético-fúncionais(BRASIL, 1969). Esta abordagem terá
em um único ser indissociável(HELMAN, 1994); (b) ao olharmos os diferentes exterioridades, pois, na práxis fisioterapêutica, suas ações di-
202
203
versificaráo conforme o nível de Atençáo à Saúde do Sistema Único de novo Campus Unisinos Porto Alegre incorpora a experiência adquirida no
Sau.de(SUS)e, mais especificamente, as Redes de Atençáo à Saúde, seja Campus Unisinos São Leopoldo.
na abordagem (individual e coletiva) ou na gestão do sistema e serviços
(MENDES,2011).
A proposta da formação em Fisioterapia na Unisinos está apoiada na
legislação vigente, cumprindo as Diretrizes Nacionais Curriculares para
Neste contexto, o processo de formação em Fisioterapia inicia no graduação em Fisioterapia(BRASIL, 2002b; BRASIL,2009) e a Resolu
encontro do professor com o aluno, por vezes, nestes, há um usuário/ ção COFFITO n.° 370(COFFITO, 2009). Apoia-se na formação pro-
paciente. Ao longo deste processo, o educando incorpora a forma de blematizadora, tornando o aluno ativo no processo formativo, inovando
pensar, de comunicar, de agir, apreendendo o hahitus profissional (FÉ- há 12 anos com práticas assistidas por meio do Ensino-Serviço-Comuni-
LIX,2006). O principal norteador desta etapa de formação profissional dade(MITRE et ai, 2008; ALBUQUERQUE,2008).
deveria ser o Objeto de Estudo da profissão, pois as atividades acadê
micas que desenvolvem esta temática normalmente são relegadas a um Como estratégia de interpretação dos dados, por tratar-se de um
segundo plano. Isso se deve principalmente por dois motivos: centrali- relato de experiência, busquei livremente descrever os fatos relacionan-
dade das ações em saúde em aparatos tecnológicos e o foco na patologia do-os com a proposta de formação em Fisioterapia na UNISINOS na
e nao na funcionalidade, descentrando o objeto de estudo da Fisiotera perspectiva da funcionalidade humana.
pia, ao mesmo tempo que o reduz aos aspectos oriundos das ciências
naturais, em especial, ao corpo biológico. FORMAÇÃO EM FISIOTERAPIA A LUZ DA
A problemática norteadora para discussão centra-se na relação FUNCIONALIDADE HUMANA
da formação profissional com a funcionalidade humana. Para tal, obje A Fisioterapia, apesar de possuir recursos que datam a Antigüidade,
tivei:(a) relacionar o objeto de estudo da Fisioterapia e a funcionalidade tem seu surgimento dentro de princípios do projeto de Modernidade,,
humana; e(b) refletir sobre a formação em Fisioterapia correlacionando com base em conceitos, como cientificidade, desenvolvimento social,
com a funcionalidade humana. melhoria da vida das pessoas. Latour (2011) em seu livro "Jamais Fo
mos Modernos" aponta que a sociedade, apesar de buscar e dizer apoiar-
CAMINHAR METODOLÓGICO
se nos princípios de Modernidade, no dia a dia e em especial na ciência,
constrói elos com base em outros valores, como, por exemplo, de proxi
Este estudo foi descrito como um relato de experiência, no qual apre midade (rede), de valores sobre os objetos e sujeitos (simetria).
sento o universo de pesquisa, o Curso de Bacharelado em Fisioterapia da
Universidade do Vale do Rio dos Sinos — UNISINOS. Este curso iniciou A Fisioterapia foi constituída e apoiada nos princípios da Moder
suas atividades em 2002 e completou 15 anos em 2017. Como proposta nidade, buscando em argumentos, em especial, científicos oriundos das
de formação, a integralidade, a humanização e o cuidado são norteadores, ciências naturais que, ao longo do processo formativo, incorporou co
proporcionando formação nos três níveis de Atenção à Saúde. Hoje o nhecimentos cartesianos e biomédicos centrando-se nos aspectos bio
Curso de Fisioterapia do Campus Unisinos São Leopoldo está no proces lógicos da vida, relegando as dimensões humana e social para segundo
so de revisão do Projeto Político-Pedagógico, sendo a segunda (re)análise plano (OLIVEIRA, 2002).
e avanço na proposta de processo formativo em Fisioterapia. Ressalto, Dewey propôs uma formação com base em três elementos interli
ainda, que a formação em Fisioterapia no processo de expansão com o gados: o conhecimento, a habilidade e a atitude como necessário para a

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205
formação profissional, os quais Perrenoud (2000)e Perrenoud e colabo se apresentava com fragilidades, visto que, ao avaliar o aluno, centrava
radores (2002) descrevem que as instituições formadoras devem desen sua atenção quase que exclusivamente na função e/ou na estrutura
volver competência,sendo estas constituídas pela capacidade do sujeito- do corpo. Raramente apresentava a atividade e participação com ele
educando em mobilizar recursos (conhecimentos, habilidades, atitudes) mento do processo de cuidado e, em nenhum momento, considerava
para resolver situações (simples e complexas). Diante dessa proposta, os fatores contextuais, sejam os fatores do ambiente físico, social e
questiona-se sobre as bases para formação dos profissionais de Fisiote atitudinal, bem como fatores pessoais como elementos importantes de
rapia, assumindo o conceito de competência como um dos elementos avaliação, diagnóstico e intervenção fisioterapêutica.
centrais desta discussão, aliado ao Objeto de Estudo da profissão e a A partir desta constatação, o Colegiado Docente e a Coordena
perspectiva de integralidade da atenção à saúde, oriunda da concepção ção do Curso propõe uma mudança na formação por meio da pri
de saúde como determinada socialmente. meira revisão do Projeto Político-Pedagógico. Em 2010, incorporou
Refletindo sobre a Fisioterapia, devemos inicialmente entender a Resolução COFFITO n.° 370/2009, que dispõe sobre a adoção da
o que é um Objeto de Estudo para então compreendermos como o ICF por fisioterapeutas.
desta proflssão se constitui. Um Objeto de Estudo é edificado pelo Para tal, a formação dos professores na Unisinos compreende um
olhar que o constrói, ou seja, em que contexto este objeto está, quais processo aos moldes da teoria de Aprendizagem Organizacional em que
elementos o constituem e o moldam. Semelhante ao processo de cons há um processo de desenvolvimento dos docentes em modo contínuo
trução de uma pesquisa, o qual reflete sobre o objeto de pesquisa para (MOURA,2009), o qual demanda a partir de 2011 uma reconfigura-
estudá-lo, visto tratar-se de um recorte empírico para a delimitação do ção. Inicia-se com a capacitação de todo o corpo docente da temática
estudo (VICTORA, KNAUTH,HASSEN,2000). Funcionalidade Humana a partir da perspectiva da ICF. Esta sensibi
Deste modo, o campo da saúde considera a integralidade do ser lização possibilitou repensar o fazer do fisioterapeuta em todas as ati
humano que habita um determinado contexto sociocultural (CA vidades acadêmicas, criando, assim, o cenário ideal para aprofundar a
MARGO JR., 2003). Por sua vez, a Fisioterapia possui o Movimento formação em Fisioterapia com base no Movimento Humano, centrado
Humano como determinador de seu objeto que, na esteira do cam na abordagem integral do cuidado em saúde, seja do indivíduo ou das
po da saúde, por vezes, aborda apenas os aspectos biológicos do ser coletividades, com base na funcionalidade humana.
humano como foco de sua atenção. Ao olharmos o que constitui o
Objeto de Estudo, perceberemos ao menos duas perspectivas sobre
o mesmo objeto: uma formada pelos aspectos do mundo natural, e
outra, que contempla as questões subjetivas do ser humano oriundas
das ciências sociais e humanas, ambas inseparáveis, pois respeita-se a
perspectiva de simetria.
Um dos disparadores desta reflexão foi um Trabalho de Conclu
são de Curso que analisou a funcionalidade a partir da interpretação
das avaliações realizadas na abordagem fisioterapêutica na Atenção
Primária à Saúde. Este trabalho demostrou que o processo formativo

206 207
IMAGEM 1: Representação Gráfica da Relação entre Funcionali Imbuídos da necessidade de desenvolvimento de competências
dade Humana e Fisioterapia. docentes, esta etapa abordou outras dimensões como o conceito de
VIDA 1
competência centrado na idéia de Perrenoud (2000), bem como na
busca de estratégias de ensino e aprendizagem que fomentem o aluno
InUrdclo entre
como sujeito ativo deste processo (MITRE et ai., 2008). Este cená
lógico
Fomudo
rio posto possibilitou o debate dos docentes sobre o saber-fazer do
pelo AmUente Sodal

I Espiritual
fisioterapeuta em especial os aspectos que envolvem o Diagnóstico
.Impadados pelos
em Fisioterapia também denominado de Diagnóstico Cinético-Fun-
cional.(DAZA LESMES, 2007). Ainda, ocorreram vários encontros
BloftieiCdnBj
Determineines Sodals de Saúde)
EduestSo FTslcaJ dos docentes com o intuito de alinhamento de competências entre as
Atenção h Saúde
Políticas Públicas como
Resposta Governamental En%magemJ distintas atividades acadêmicas, possibilitando um crescente de com
OrganitaçSo do
Sistema da Saúda
Segundo
MATTOS
Integrelldade Aobordada pelas
prorissSes da saúde Fisioterapia Ojeto de Estudo
plexidade nas relações de aprendizagens significativas, bem como me
Rdaçso
Terapeuta-Padente
Fonoaudiologla J lhor estruturação do saber-fazer fisioterapêutico nos distintos níveis
[Movimento Humano^ de Atenção à Saúde do SUS.
Hedldna Veterinária

Nutrição

Odontologia 1
Assim, a formação diante do saber-fazer do fisioterapeuta está em
(aênda Naturais] f Clinclas Sodals e HumanãT)
PsicologiaJ consonância com os direcionadores da Word Confederation for Physicaí
Terapia Ocupadonal j Objeto de Trabalho
Therapy(WCPT) que, em seu Glossário e Guide Lines, propõem que o
Serviço SodaT] ^
fisioterapeuta ao realizar seu diagnóstico considere os elementos da ICF
[Fundonalidade ^ (WCPT, 2014; WCPT, s.d.). Na esteira desta reflexão, possibilitou a
reconfiguração da abordagem individual, contemplando um olhar com
o aprofundamento da integralidade do sujeito-usuário, pois descentra-
X X
se do corpo biológico e abordam-se os aspectos da funcionalidade hu
^GraduaçSoj [Pós-GraduatFo J mana. Isso gerou a qualificação do raciocínio cinético-funcional dos
alunos, pois contempla as questões do corpo e da estrutura do corpo,
I Lato ScL I tornando maior a precisão na avaliação e intervenção das disfunções,
aliado ao respeito da atividade e participação das pessoas considerando
e intervindo nos aspectos físicos, sociais e atitudinais que favorecem ou
dificultam na realidade de suas vidas. Deste modo, potencializam a vida
e geram (re)inserção social dos sujeitos-usuários.
Fonte: Elaborada pelo autor.
Por fim,agora em 2017, com o processo de revisão do Projeto Po-
lítico-Pedagógico, urge a necessidade de aprofundar os aspectos que,
apesar de abordados ao longo da formação, ainda se apresentam como
desconectos, o trabalho em equipe e a abordagem coletiva. Estes têm fra
gilidade na dificuldade de um olhar comum,porém, com à proposta de
208
209
Funcionalidade Humana na perspectiva da ICF, produz a possibilidade O contexto da Unisinos por meio da estratégia de práticas assistidas
do alinhamento na abordagem coletiva amparada pelo Projeto Terapêu no formato Ensino-Serviço-Comunidade possibilitou um cenário con
tico Singular e Projeto Terapêutico Coletivo (ALLAN; CAMPBELL; dizente com a necessidade da experimentação e inovação na formação
GUPTILL, 2006). Possibilitam-se intervenções com maior clareza das em Fisioterapia. Obviamente muito ainda temos a avançar e ainda apre
atuações profissionais na perspectiva de campo e núcleo (CAMPOS, sentamos fragilidades no desenvolvimento de competência discentes,
2000) e (re)configura-se um novo sentido à Funcionalidade Humana. mas, por termos nosso Objeto de Estudo como direcionador, confiamos
Por fim, considero que a estratégia de Ensino-Serviço-Comunidade fa no trabalho em desenvolvimento.
vorece o alinhamento de competências pelos docentes bem como o de-
senvolvimerito delas com os alunos(PIZZINATO,2012).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Fisioterapia apresenta-se na contemporaneidade como uma das
Profissões da Saúde que buscam em suas abordagens do ser humano um
trabalho interprofissional. A ICF vem como grande possibilidade deste,
em especial pelo resgate da integralidade da atenção à saúde que considera
os determinantes sociais de saúde. Deste modo, produz mais cuidado em
saúde e, principalmente, gera a (re)inserçáo social das pessoas.
Nesta perspectiva, o que tange à Fisioterapia diante da funcionali
dade humana está diretamente ligado ao Objeto de Estudo da profissão,
o Movimento Humano. Este considera tanto os aspectos objetivos, vin
culado às ciências naturais, quanto os subjetivos, próprio das ciências so
ciais e humanas. Assim, o fisioterapeuta ao realizar a gestão ou atenção à
saúde contemplará integralidade, com clareza do seu saber-fazer (objeto
de trabalho) e a necessidade da interprofissionalização do cuidado.
Então, a perspectiva da Funcionalidade Humana produziu um (re)
pensar a formação em Fisioterapia na Unisinos, de modo que contem
plasse todos os aspectos propostos na ICF com o olhar cinético-fúncio-
nal. O processo de implementação é longo, mas, a partír destas reflexões
expostas neste relato de experiência, o qual sempre foi entendido como
complexo e, por isso, jamais deveria ser visto como mais um "conteúdo" a
ser ministrado em uma atividade acadêmica, porém, como norteador de
todo o processo formativo em Fisioterapia, optou-se pela implementação
gradual, produzindo resultados frutíferos.

210 211
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sado em :5 de abril de 2017 talício, que garante o pagamento mensal de um salário mínimo à pessoa
31. SAHRMANN, S. A. The HumanMovement System: our professional identity. PhysTher.(94), idosa, com 65 anos ou mais, e à pessoa com deficiência de qualquer idade,
2014.
que comprovem não possuir meios para prover a própria manutenção,
32. REBELATTO, José Rubens; BOTOMÉ, Silvio Paulo. Fisioterapia no Brasil. São Paulo. 2.ed. nem tê-la provida pela família. Integra a Proteção Social.Básica no âmbito
Editora Manole, 1999.
do Sistema Único de Assistência Social — SUAS. Destina-se a brasileiros
33. VICTORA, Ceres Gomes; KNAUTH, Danieia Riva; HASSEN, Maria de Nazareth. Pesquisa
Qualitativa em Saúde: uma introdução ao tema. Porto Alegre:Tomo Editora, 2000.
natos ou namralizados ou a pessoas com nacionalidade portuguesa, que
34. WCPT. World Confederation for Physical Therapy. Guidelines. (s.d.). Disponível em: <http://
comprovem residência no Brasil, cuja renda familiar per capita familiar
www.wcpt.org/node/29664>. Acessado em: 13 de abril de 2017. seja inferior a um quarto do salário mínimo.'
WCPT. World Confederation for Physical Therapy. Glossário. Version 2.1, July 2014. Disponível em:
<http://www.wcpt.org/glossary>. Acessado em: 13 de abril de 2017. Não pode ser acumulado com outros benefícios da Seguridade So
cial ou de outro regime, exceto benefícios de assistência médica, pensões
especiais de natureza indenizatória e rendimentos decorrentes de estágio
supervisionado e aprendizagem.^
O ingresso no mercado de trabalho com encerramento do benefício
não impede nova concessão desde que atendidas às demais condições. E
também possível solicitar a suspensão do benefício diante do estabele
cimento de alguma relação trabalhista ou atividade empreendedora re
munerada, com possibilidade de retorno, uma vez extinta essa condição.
Tal qual as inovações relativas ao estágio supervisionado e aos contratos

214 215
de aprendizagem, a atual legislação criou condições para a inclusão no As informações do Cadastro Único são utilizadas para registro
mercado de trabalho, permitindo ao benefício deixar de ter um fim em si da composição do grupo familiar e da renda mensal bruta familiar,
próprio, o que torna compreensível a retirada do conceito de incapacida que servem de base para o cálculo da renda mensal familiar per capi
de para a vida independente e para o trabalho do texto original da LOAS ta (RMFPC).' Para esse cálculo, considera-se como grupo familiar o
-pela-Lein.° 12.470/11.
conjunto de pessoas composto por requerente, cônjuge, companheiro,
O BPC e demais,serviços, programas e projetos de assistência social companheira, pais e, na ausência de um deles, pela madrasta ou pelo
são financiados pelo Fundo Nacional de Assistência Social — FNAS, padrasto, pelos irmãos solteiros, filhos e enteados solteiros e menores
instituído pela Lei n.° 8.742/93. O Fundo é gerido pelo Ministério do tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.^
Desenvolvimento Social e Agrário — MDÍSA (nova nomenclatura desde Para reconhecimento do direito ao benefício às pessoas idosas,
2016), como órgão responsável pela coordenação da Política Nacional levam-se em conta a idade e a RMFPC. A pessoa com deficiência,
de Assistência Social, sob a orientação e o controle do Consellio Nacio
além da análise da RMFPC, é submetida à avaliação médica e so
nal de Assistência Social - CNAS.
cial, conforme a legislação vigente^, cujo conteúdo detalharemos
Compete ao MDSA a implementação, coordenação-geral, regula neste capítulo.
ção, financiamento, monitoramento e avaliação da prestação do benefí Especificamente no que se refere ao reconhecimento do direito
cio, sem prejuízo das iniciativas compartilhadas com Estados, Distrito
às pessòas com deficiência, o Decreto n.° 8.805/2016 estabeleceu
Federal e Municípios, em consonância com as diretrizes do SUAS e da
que "na hipótese de ser verificado que a renda familiar mensal per
descentralização político-administrativa prevista na Constituição Fede capita não atende aos requisitos de concessão do benefício, o pedido
ral e na Lei Orgânica da Assistência Social.'
deverá ser indeferido pelo INSS, sendo desnecessária a avaliação da
Ao Instituto Nacional do Seguro Social — INSS compete a ope- deficiência"} Por meio da Ação Civil Pública n.° ACP-5044874-
racionalização do beneficio, que consiste em receber o requerimento, 22.2013.404.7100/RS, com abrangência para todo o país, o INSS
conceder, cessar e suspender o beneficio, realizar a avaliação social e foi condenado a "deduzir do cálculo da renda familiar, para fins de
médica, realizar a revisão, gerar crédito e controlar o pagamento.' verificação do preenchimento do requisito econômico ao benefício de
Os Centros de Referência em Assistência Social - CRAS, como prestação continuada do art. 20 da Lei n.° 8.742/93, as despesas que
orgãos gestores locais da Política de Assistência Social, representam uma decorram diretamente da deficiência, incapacidade ou idade avançada,
das principais portas de entrada para requerentes/ beneficiários e seus com medicamentos, alimentação especial,fraldas descartáveis e consul
familiares, tendo como atribuição orientá-los sobre o acesso ao benefí tas na área de saúde, requeridos e negados pelo Estado", e assim está
cio, assim como lhes assegurar acesso aos demais serviços da rede socio- procedendo.
assistencial e a outras políticas públicas. A atual sistemática de avaliação de pessoas com deficiência para
Para a concessão do benefício, é necessária a, inscrição no Cadastro acesso ao benefício resultou de um processo que acompanhou a evolu
Único de Programas Sociais do Governo Federal(CadÚnico) e no Cadas ção do ordenamento jurídico, normativo e conceituai sobre a matéria, à
tro de Pessoas Físicas - CPF.''' qual não nos ateremos neste capítulo.

216
217
As versões dos instrumentos de avaliação Implantada a partir do segundo semestre de 2015, com o objeti
Desde a implantação do modelo biopsicossodal, existiram três ver vo de alinhar os instrumentos de avaliação aos termos adotados pela
sões dos instrumentos de avaliação, sempre destinadas a duas faixas etá legislação, alterada desde 2011. Essa versão também acolheu inúmeras
rias distintas - 16 anos ou mais e menores de 16 anos: contribuições para ajustes e aprimoramentos oriundas dos avaliadores,
sobretudo durante capacitações realizadas entre 2012 e 2014.
• Inversão (Portaria Conjunta MDS/INSS n.° 1/2009)' Alinhou-se o entendimento em torno da concepção ampliada de
Elaborada antes de 2007, conforme publicação oficial à época*^, deficiência proposta pela Convenção da ONU,visto ter status de emen
foi aprovada e implantada apenas no segundo semestre de 2009. Aten da constitucional, em consonância com a nova redação dada à LOAS
dendo ao estabelecido por Ação Pública do Acre^ e pelo Decreto n.° pela Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência - LBI2. Para
6.214/2007, rompeu paradigmas ao implantar a avaliação biopsicos- evitar a divergência de entendimentos ocorrida na segunda versão dos ins-
social, em substituição ao modelo anterior, essencialmente biomédico, trtunentos, a nova versão passou a adotar, sempre que possível, a termino
reducionista e pautado no autocuidado, conforme estabelecia o Decreto logia autoexplicativa "alterações em funções e/ou estruturas do corpo", em
n.° 1.744/1995®. Apesar dos avanços, manteve-se alinhada à exigência substituição ao termo "impedimentos".
legal de incapacidade para a vida independente e para o trabalho, como Em essência, o artigo 20 da Lei ri.° 8.742/1993 e o artigo 16 do
critério para acesso ao benefício.
Decreto-n.° 6.214/2007 e suas respectivas atualizações balizam bem
• 2® versão (Portaria Conjunta MDS/INSS n.° 1/ 2011)' o processo de avaliação em curso, embora seus parágrafos evidenciem
também claramente as dificuldades decorrentes das divergências de tra
Incorporou todas as sugestões de ajustes e aprimoramentos pro dução da CIF e da Convenção da ONU.
postas pelos avaliadores, sobretudo no que se refere à avaliação de
crianças de tenra idade, tomando por base a CIF para crianças e jo Embora não seja o objetivo deste capítulo aprofundar a discus
vens, em sua versão original em Inglês'®. Sem atentar para a divergên são sobre esta matéria, abordada em diferentes momentos por vários
cia de traduções, mesclou a terminologia adotada pelas versões em autores"-'®-'^-''''^, sugerimos abaixo uma sistematização para facilitar o
Português da CIF e da Convenção da ONU. Instituiu a aferição da entendimento:

duração dos efeitos dos impedimentos, demarcado em dois anos como CIF CONVENÇÃO DA ONU
critério de acesso, o que foi logo em seguida consolidado pelas Leis n.°
12.435/2014 e n.° 12.470/2011. Seu objetivo era aferir a deficiência e Deficiência Impedimento Alteração na Fimçáo
o grau de incapacidade, visto que a avaliação ainda se pautava na inca (restrita ao corpo) (restrito ao corpo) e/ou na Estrutura do
Impairment Impairment Corpo
pacidade para a vida independente e para o trabalho, critério alterado
poucos meses depois, com a promulgação da Lei n.° 12.470/2011,
Limitações de
que passou a exigir a avaliação da deficiência e o grau de impedimen Incapacidade
Deficiência
Atividades e Restrições
to, tal qual persiste até o presente. (com concepção ampliada) à Participação
Disabiliíy
Disability vivenciadas
• 3^ versão (Portaria Conjunta MDS/INSS n.° 2, de 30 de março
de 2015)" Fonte: Adaptado de Marceiino, M. A. in Savaris J.A., 2014'^

2l8 219
Definições que norteiam o atual processo de avaliação Cada componente é composto por um conjunto de domínios e
Pessoa com deficiência: aquela que tem impedimento de longo unidades de classificação pré-selecionados e descritos conforme a CIF,
prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em enriquecidos por exemplos contidos na própria classificação ou propos
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação tos como aprimoramento pelos profissionais avaliadores de todo o país,
plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais desde 2009.
pessoas.^ A avaliação biopsicossocial é feita pelo assistente social e perito mé
Impedimento de longo prazo: aquele qiie produza efeitos pelo dico do INSS, tendo como objetivo chegar a um qualificador final para
prazo mínimo de dois anos. cada componente avaliado.
A avaliação da deficiência e do grau de impedimento tem por No modelo vigente, a avaliação social precede à avaliação médica.
objetivo:'®
I. Identificação do Avaliado
I. comprovar a existência de impedimentos de lòngo prazo de na A folha de rosto é preenchida automaticamente pelo sistema, a par
tureza física, mental, intelectual ou sensorial; tir de informações constantes no CNIS (Cadastro Nacional de Infor
II. aferir o grau de restrição para a participação plena e efetiva da mações Sociais), contemplando todos os dados relativos à identificação
pessoa com deficiência na sociedade, decorrente da interação dos do avaliado.
impedimentos a que se refere o inciso I com barreiras diversas; e
II. Avaliação Social
III. o benefício poderá ser concedido nos casos em que não seja
possível prever a duração dos impedimentos [...], mas exista a pos O assistente social avalia cinco domínios do componente de
sibilidade de que se estendam por longo prazo. Na hipótese prevista "Fatores Ambientais" e quatro domínios do componente de "Ativi
[...], os beneficiários deverão ser prioritariamente submetidos a no dades e Participação".
vas avaliações social e médica, a cada dois anos. Inicialmente o profissional preenche campos específicos relativos à
cobertura previdenciária e à(s) deficiência(s) informada(s) pelo avalia
A avaliaçao social e medicc-pericial de pessoas com deficiência do, seu acompanhante ou seu representante legal, identificando quem
para acesso ao BPC
prestou tal informação. Em seqüência, descreve a história social, cuja
finalidade é registrar todos os elementos relevantes para conhecimento,
Os instrumentos de avaliação correspondem aos Anexos I e II da análise e interpretação das situações vivenciadas pelo avaliado em seu
Portaria Conjunta MDS/INSS n.» 2/2015." Apesar de extensos em cotidiano, sempre na perspectiva do direito à participação plena e efeti
sua estrutura, dispensam um manual de utilização, por serem autoins- va na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas.
trutivos.
No componente"Fatores Ambientais",o assistente social qualifica,
Destinam-se a avaliação de pessoas com deficiência com 16 anos ou em cada unidade de classificação e respectivo domínio, a intensidade
mais (Anexo I) e menores de 16 anos (Anexo II), ambos contemplan das barreiras enfrentadas pela pessoa com deficiência. Originalmente,
do os componentes de "Fatores Ambientais", "Funções e Estruturas do a CIF qualifica nesse componente tanto barreiras como facilitadores,
Corpo" e "Atividades e Participação". porém, na avaliação para fins do BPC, qualificam-se apenas as bar-
220
221
reiras existentes, sendo os facilitadores considerados como potenciais - Domínio "bl - Funções mentais"
redutores das barreiras correspondentes.
- Domínio"b2-Funções sensoriais da visão"
O assistente social considera a extensão e freqüência das barreiras
- Domínio "h2- Funções sensoriais da audição"
enfrentadas pela pessoa com deficiência em seu ambiente de vida, repre
sentadas por obstáculos físicos, sociais e de atitudes vivenciados em seu - Domínio "b2 - Funções sensoriais adicionais e dor"
cotidiano, avaliando os seguintes domínios: - Domínio "h3-Funções da voz e da fala"
- Domínio "ei — Produtos e tecnolo^íí' - Domínio "b4-Funções do sistema cardiovascular"
- Domímo "e2 — Condições de habitabilidade e mudanças am - Domínio "b4 — Fimções do sistema hematológico"
bientais"(*)
- Domínio "h4 — Fiinçõp.s do sistema imnnológico"
(*) Domínio da CIF com denominação adaptada para atender aos - Domínio "b4 — Funções do sistema respiratório"
objetivos do instrumento.
- Domínio "hS -Funções do sistema digestivo"
- Domínio "e3 —Apoio e relacionamentos"
- Domínio "b5 — Funções dos sistemas metabólico e en-
- Domínio "e4- Atitudes" dócrino"
- Domínio "e5 — Serviços, sistemas e políticas" - Domínio "b6 — Funções geniturinárias e reprodutivas"
A avaliação do componente de "Atividades e Participação" pelo as - Domínio "b7-Fimções neuromusculoesqueléticas e relacio
sistente social contempla quatro domínios e também precede à avalia nadas ao movimento"

ção médico-pericial. Será detalhada em conjunto, mais adiante. - Domínio "bR — Funções da pele e estruturas relacionadas"

Nesses domínios, o perito médico avalia e qualifica a intensidade


III. Avaliação Médica das "alterações" constatadas. Na atual versão dos instrumentos de ava
Inicialmente o perito médico registra o diagnóstico principal e diag liação, evitou-se utilizar o termo "impedimento", cuja compreensão foi
nóstico secundário (obrigatório só a partir da 3^ versão, em 2015), codifi- prejudicada na versão anterior, em razão da divergência de tradução do
cando-os pela Classificação Internacional de Doenças(CID-10). termo "impairmenf pela CIF e pela Convenção da ONU.®
Em seguida, descreve a história clínica e o exame físico, com base Nos domínios em que não existem alterações, o perito assinala
nos elementos de convicção obtidos pelo exame clínico, exames comple- obrigatoriamente um campo no qual registra se essa inexistência foi por
mentares, relatórios médico-hospitalares e outros e, na seqüência, avalia ele constatada ou se não existem elementos de convicção para avaliar
14 domínios, desmembrados dos oito domínios originais da CIE Cada (Exemplo: evidências clínicas, resultados de exames complementares,
domínio é composto por uma ou mais unidades de classificação, cujo laudos médico-hospitalares, entre outros).
objetivo é servir de guia para o profissional, com vistas à qualificação do Além da avaliação de Funções do Corpo, o perito médico obri
domínio correspondente. gatoriamente responde a três quesitos, cujas regras estão explícitas nos
próprios enunciados, conforme se seguem:

222
223
S/'í
AVALIADO ''°'^°'"'°EM
DO QUE AS ALTERAÇÕES OBSERVADAS QUEFUNÇÕES
CONFIGURAM MAIORES LIMITAÇÕES E RESTRIÇÕES AO
DO CORPO? e médico-pericial, por não atendimento ao previsto no artigo 20, §§
I I Não 2° e 10 da Lei n.° 8.742/93 e alterações posteriores, que define pessoa
I I resposta anrmatha a este quesUo Implicará a elevação do qtialificador finalde Funções do Corpo em um nrvet
(de N para L, deLmsM deMoaraG.de G oam ce c nermanere mmn ri
com deficiência para acesso ao benefício.
Assinale abaixo a(3) Estrirtura(s) do Corpo que conligura(m) tal condição;
Estruturas do sistema nervoso Estruturas do sistema respiratório
Em caso de resposta intermediária, indicando não ser possível pre
Estruturas do olho Estruturas do sistema digestivo ver, prevalecera o resultado técnico da avaliação social e médico-pericial
Estruturas do ouvido

Estruturas relacionada à vez e á fala


Estruturas do sistema metabóllco e endócrino
Estruturas do sistema genlturlnário e reprodutivo
e, se houver concessão, o benefício será marcado para revisão prioritária
Estruturas do sistema cardiovascular Estruturas relacionadas ao movimento em dois anos.
Estruturas do sistema imunciõgico Pele e estruturas relacionadas

Descreva, caso Já não o tenha feito na história clínica ou no exame físico:

IVi Atividades e Participação nas Avaliações Social e Médica


®°U ESTRUTURAS DO CORPO CONFIGURAM PROGNÓSTICO
No componente de "Atividades e Participação", qualifica-se o grau
A resposta afirmatt/a a este quaslto Implkarà a elevação do qualilicadorPnal de Funções do Corpo em um nível(de W para L
de Lpara M, de M para G, de G para_ç e C permanece como C), de forma não cumulativa, casoJá teníia havido elevação neto
quesito anterior. * r
de dificuldade da pessoa com deficiência para a execução de inúmeras
I I Não
atividades e participação social, na perspectiva do direito à igualdade de
I I Não é possível prognosticar
condições com as demais pessoas. Essa avaliação é feita separadamente,
com qualificações parciais atribuídas por cada profissional (assistente
1—3 Sim. Descreva,caso Já não o tenha feito na história clínica ou no exame físico; social e perito médico) e uma qualificação final que corresponde à mé
dia dos qualificadores atribuídos aos nove domínios, calculada automa
CONSIDERANDO AS B/^íREIRAS APONTADAS NA AVALIAÇÃO SOCIAL E OS ASPECTOS CLÍNICOS AVALIADOS É ticamente pelo sistema.
MENOS DE DOl^^A^^ ALTERAÇÕES EM FUNÇÕES E/OU ESTRUTURAS DO CORPO SERÃO RESOLVIDAS EM
(Conskíerartambém o tempo pregresso jà v/vencàc/o com tal quadro, as possbilidades de acesso ao tratamento necessário e
a pardclpaçao plena e efebva na sociedade em Igualdade de condições com as demais pessoas).
Para a qualificação de "Atividades e Participação", a história social
\ I Não e os qualificadores atribuídos aos "Fatores Ambientais" são fundamen
□ Não é possível prever, mas os efeitos podem se estender por dois anos ou mais. tais, assim-como os "Fatores Pessoais" que, embora não qualificados, são
( I Sim. Neste caso, Justifique: também considerados.

A avaliação é efetuada de forma diferenciada conforme a faixa etá


ria, com qualificação do grau de dificuldade experimentado pela pessoa
Neste ultimo quesito, além dos condicionantes expressos ante com deficiência no respectivo domínio. Avalia o desempenho para a
riormente, o sistema emite um alerta sempre que tiver sido assinalada realização de atividades e participação social, considerando o requerente
resposta afirmativa no quesito sobre Prognóstico Desfavorável" e/ou em seu ambiente habitual de vida.
quando tiver sido atribuído qualificador grave (3) ou completo (4) em Pela proposta original dos instrumentos de avaliação, esta etapa de
Funções do Corpo pelo perito e qualificador grave (3) ou completo (4) veria ser feita conjuntamente pelos dois profissionais. Diante da carência
em Fatores Ambientais pelo assistente social. de pessoal e sobrecarga de agendas, acabou tendo de ser avaliada separa
A resposta afirmativa a esse ultimo quesito requer justificativa damente, cabendo quatro domínios ao assistente social (d6, d7, dS e d9),
técnica bem fundamentada pelo perito médico, pois implica indeferi que os avalia primeiro, na seqüência da avaliação dos "Fatores Ambien
mento do pleito, independentemente do resultado da avaliação social tais", e cinco domínios ao perito-médico (dl, d2, d3, d4 e d5), logo após
avaliar o componente de "Funções do Corpo".
224
225
No instrumento de menores de 16 anos, os citados domínios e as - Domínio "d5- Cuidado pessoal"(avaliação de requerentes com
respectivas unidades de classificação têm diferentes pontos de corte para três anos ou mais).
avaliação e qualificação, conforme a faixa etária.
A fim de se obterem maiores subsídios para a avaliação, o assis
Especificamente nessa terceira versão dos instrumentos, foram tente social e o perito-médico do INSS podem solicitar informações
acrescidas duas colunas aos nove domínios de "Atividades e Participa sociais ou médicas aos profissionais assistentes nas áreas afins, através
ção" para que o avaliador possa sinalizar a dependência total ou parcial de formulários oficiais intitulados "Solicitação de Informações Sociais —
de terceiros nas unidades de classificação em que julgar pertinente, o SIS" e/ou "Solicitação de Informações ao Médico Assistente - SIMA",
que poderá contribuir para orientar políticas públicas a partir do resgate deixando pendente a conclusão da avaliação até o retorno dos dados
de tais informações. complementares solicitados.

DOMÍNIOS DE"ATIVIDADES E PARTICIPAÇÃO" V. A Qualificação das Unidades de Classificação, Domínios e


AVALIADOS PELO ASSISTENTE SOCIAL
Componentes nos Instrumentos de Avaliação.
- Domínio "d6— Vida domésticd'(avaliação de requerentes com As unidades de classificação de cada domínio configuram-se como
sete anos ou mais). um roteiro, no qual são destacados os principais itens a serem conside
- Domínio "d7 — Relações e interações interpessoais" (avaliação rados pelos avaliadores.
de requerentes a partir de um ano). São qualificadas com valores de O a 4 pontos, conforme o grau de
- Domínio "d8 — Áreas principais da vida"(avaliação de requeren comprometimento, onde O = Nenhum (O a 4%), 1 = Leve (5 a 24%),
tes com seis meses ou mais). 2 = Moderada (25 a 49%),3 = Grave (50 a 95%)e 4 = Completa(96
- Domínio "d9 — Vida comunitária, social e cívica" (avaliação de a 100%).
requerentes com três anos ou mais). Embora não computados pelo sistema, os qualificadores atribuídos
às unidades de classificação servem de base para que o avaliador atribua
DOMÍNIOS DE"ATIVIDADES E PARTICIPAÇÃO" os qualificadores mais apropriados aos domínios correspondentes, esses,
avaliados pelo PERITO-MÉDICO sim, utilizados pelo sistema para chegar ao qualificador final de cada
- Domínio "dl — Aprendizagem e aplicação de conhecimento" componente (Fatores Ambientes, Atividades e Participação e Funções
(avaliação de requerentes com seis meses ou mais). do Corpo).

- Domínio "d2 — Tarefas e demandas gerais" (avaliação de reque O cálculo dos qualificadores finais é feito pelo sistema corporativo
rentes com seis meses ou mais). informatizado do INSS e varia para cada componente, conforme regras
preestabelecidas.
- Domínio "d3 — Comimicaçáo"(avaliação de requerentes a partir
de um ano). Para os componentes de "Fatores Ambientais" e "Atividades e Par
ticipação", o qualificador final eqüivale à média dos qualificadores atri
- Domínio "d4- Mobilidade" (avaliação de requerentes com seis buídos pelos avaliadores aos respectivos domínios. Para evitar números
meses ou mais). fracionários, o sistema efetua operações matemáticas que ajustam os va-

226 227
lores médios obtidos, de modo que o qualificador final de cada compo Lei n.° 8.742/1993, que define pessoa com deficiência para fins de
nente seja um número inteiro (O, 1, 2, 3 ou 4), convertido para a letra acesso ao BPC.
correspondente(N,L, M,G ou C).
A concessão ou o indeferimento do benefício está ainda na de
Na versão atual, quando algum domínio do componente de "Ativi pendência do atendimento ao.§3° do mesmo artigo 20 da Lei n.°
dades e Participação" deixa de ser avaliado em razão de a faixa etária do ^•742/1992, relativo a renda mensal familiar per capita, inferior a um
avaliado estar abaixo do ponto de corte, o sistema atribui automatica quarto do salário mínimo, ressalvadas as determinações de Ação Civil
mente qualificação máxima para o domínio, traduzida como dificuldade Pública em curso, abordada anteriormente neste capítulo.
completa (qualificador 4 = C), o que eleva a média do qualificador final
do componente. Especificamente em crianças com menos de seis meses
de idade, nas quais todos os domínios de "Atividade e Participação" estão VII. Quesito sobre a Causa da Deficiência
inibidos, o qualificador final do componente assume automaticamente o Trata-se de quesito cuja resposta está a cargo do perito médico,
valor máximo (4 = dificuldade completa). com o objetivo de identificar a(s) causa(s) da deficiência, sem qualquer
Para o componente de "Funções do Corpo", a regra estabelecida a impacto sobre o resultado da avaliação. O interesse dessa apuração é
partir da terceira versão dos instrumentos de avaliação é que o qualifi estatístico, epidemiologico e gerencial. Poderá ser de utilidade como
cador final corresponde ao maior qualificador atribuído a qualquer dos indicador para orientar políticas públicas.
domínios avaliados, de bl a b8. Esse qualificador pode ser majorado em Causa da Deficiência
um nível (de N para L, de L pará M,de M para G, de G para C, ou C
permanece como C), de forma não cumulativa, caso tenha havido res I I I I Complicações no parto | |Doença | |Dependência química [ |v
posta afirmativa ao quesito sobre "Alterações na Estrutura do Corpo que □ Acidente de TrabaihoIDoença Ocupaclonal ou Relacionada ao Trabaiho"
acarretem maiores limitações ou restrições ao avaliado" e/ou ao quesito I I Acidente de Trânsito | | Acidente de outra nal.ire.a | | Ignorada
sobre "Prognóstico desfavorável". □ Outra causa. Especifique: 1" ~
Inclusive na condição de aprendiz ou eslagiàrío.

VI. Resultado da Avaliação


Uma vez estabelecida a combinação final de três qualificadores dos VIII. Campo Específico sobre Risco e Proteção Social
componentes de "Fatores Ambientais", "Atividades e Participação" e
Funções do Corpo , nesta ordem, o sistema confronta com as combi Este campo foi inserido na segunda versão dos instrumentos em
nações listadas na "Tabela Conclusiva de Qualificadores" (Anexo IV da 2011 e mantido na terceira versão em 2015, tanto na avaliação social
Portaria Conjunta MDS/INSS n.° 2/2015), concluindo o processo de quanto na avaliação medico-pericial. Nele os avaliadores podem sinali
avaliação técnica. zar situações que demandem acompanhamento prioritário pelos Cen
tros de Referencia da rede do SUAS, independentemente da concessão
A combinação de qualificadores associada à resposta ao quesito ou indeferimento do benefício.
sobre a "Perspectiva de resolução das alterações em Funções e/ou
Estruturas do Corpo" implicam o preenchimento ou não preenchi
mento dos requisitos estabelecidos pelos artigos 20, §§ 2° e 10, da

228
229
Risco e Proteção Social Leitura recomendada
I I CASO SEJAM OBSERVADOS INDÍCIOS DE RISCO SOCIAL QUE DEMANDEM ACOMPANHAMENTO
prioritário (violência fisica e/ou psicológica, abandono familiar, abusos e/ou exploração sexual, crianças e/ou 1. BRASIL, MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E AGRÁRIO,INSTITUTO NA-
adolescentes fora da escola, exploração de trabalho infantil, entre outros), ASSINALE E DESCREVA ABAIXO PARA
POSTERIOR ENCAMINHAMENTO:
CIONAL DO SEGURO SOCIAL. Portaria Conjunta MDSA/INSS n° 1, de 3 de Janeiro de 2017.
Regulamenta regras e procedimentos de requerimento, concessão, manutenção e revisão do Benefício de
Descreva:
Prestação Continuada da Assistência Social - BPC. Diário Oficial da União, Brasília, DF,4 jan. 2017.
I I na AUSÊNCIA DE PROTEÇÃO SOCIAL, FAMILIAR E/OU COMUNITÁRIA, ENTRE OUTRAS, ASSINALE E
DESCREVA ABAIXO,PARA POSTERIOR ENCAMINHAMENTO: 2. BRASIL. Lei n.° 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com
Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Diário Oficial da União, Brasília, DF,7 jul. 2015.
3. BRASIL. Decreto n.° 8.805, de 7 de julho de 2016. Altera o Regulamento do Benefício de Prestação
Continuada, aprovado pelo Decreto n.» 6.214, de 26 de setembro de 2007. Diário Oficial da União,
Brasília, DF,8 jul. 2016.
4. BRASIL. Lei n.° 12.435, de 6 de julho de 2011. Altera a Lei n.° 8.742,de 7 de dezembro de 1993,que
Considerações Finais dispõe sobre a organização da Assistência Social. Diário Oficial da União, Brasília, DF,7jul. 2011.
A expertise adquirida por todos os envolvidos com o processo de 5. BRASIL. MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE À FOME; INS
TITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL. Portaria Conjunta MDS/INSS n.l, de 29/5/2009 -
desenvolvimento, implantação e realização das avaliações de pessoas Institui instrumentos para avaliação da deficiência e do grau de incapacidade de pessoas com deficiência
com deficiência no modelo biopsicossocial para acesso ao BPC, base requerentes ao Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social-BPC conforme estabelece o
ado na CIF e em consonância com a Convenção da ONU,é valiosa e artigo 16,§ 3°, do Decreto n.° 6.214, de 26/9/2007, alterado pelo Decreto n.° 6.564, de 12/9/2008.
Diário Oficial da União, Brasília, DF,2jun. 2009.
sem precedentes.
6. GOMES, A.L. et al. Avaliação de pessoas com deficiência para acesso ao Benefício de Prestação
O conteúdo dos instrumentos de avaliação, fruto de contribuições de Continuada da Assistência Social: um novo instrumento baseado na Classificação Internacional de
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e
peritos médicos e assistentes sociais de todo o país, com larga experiência nes Ministério da Previdência Social. Brasília, DF: MDS/MPS,2007, 192p.
sa modalidade de avaliação, consdtui-se rico material de referência.
7. MINISTÉRIO PÚBUCO FEDERAL;DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO.Ação Civil Pública
Toda a informação produzida pelas avaliações encontra-se registra n.° 2007.30.00.00204-0. Seção Judiciária do Estado do Acre, 11/04/2007. Disponível em: http;//www.
ac.trfl.gov.br/noticias/2007/not04-12.pdf. Acesso em: 23 jan. 2012.
da nos sistemas corporativos informatizados das instituições envolvidas,
8. BRASIL. Decreto n.° 1.744, de 8 de dezembro de 1995 - Regulamenta o benefício de prestação
representando também um rico acervo a ser explorado, com potencial continuada devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso, de que trata a Lei n." 8.742, de 7 de
para estudos, pesquisas e como instriunento de gestão. dezembro de 1993, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF,II dez. 1995.

Tendo em vista a determinação da Lei Brasileira de Inclusão da 9. BRASIL; MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE À FOME;INSTI
TUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL.Portaria Conjunta MDS/INSS N° 1, de 24 de maio de
Pessoa com Deficiência^ de que compete ao Poder Executivo a criação 2011. Estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da
de instrumentos para avaliação da deficiência, cujos princípios estabe deficiência e do grau de incapacidade das pessoas com deficiência requerentes do Benefício de Prestação
Continuada da Assistência Social, revoga com ressalva a Portaria Conjunta MDS/INSS n.° 1, de 29 de
lecidos são análogos aos da CIF e da Convenção da ONU,esperam-se maio de 2009,e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF,26 maio 2011.
avanços, com os quais os instrumentos de avaliação do BPC certamente
10. WORTH HEALTH ORGANIZATION. International Classification of Functioning, Disability
poderão contribuir. and Health - Children and Youth Version (ICF-CY). WHO,2007. Disponível em: http://apps.who.
int/ classifications/ icfbrowser/DefauIt.aspx. Acesso em 20 jan. 2011.
Equiparação de direitos e oportunidades, independência, autono
11. BRASIL; MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE À FOME;INS
mia e protagonismo de pessoas com deficiência é o grande objetivo, TITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL.Portaria Conjunta MDS/INSS n.° 2,de 30 de março
sempre contando com representações dos próprios, em defesa de seus de 2015. Dispõe sobre critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médica da pes
interesses e necessidades. soa com deficiência para acesso ao Benefício de Prestação Continuada. Diário Oficial da União, Brasília,
DF,9 abr, 2015, retificada Diário Oficial da União 1 jul. 2015.

230 231
V^rUL

12. Sassaki RK Inclusão. Construindo uma sociedade para todos. 7ed. Rio de Janeiro: WVA.Editora: 2006.
13. Diniz D,Medeiros M,Squinca F. Reflexões sobre a versão em Português da Classiflcaçâo Internacio
nal de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. Cad. Saúde Pública 2007; 23(10):2507-2510.
14. Di Nubila HBV Aplicação das classificações CID-10 e CIF nas definições de deficiência e incapacidade.
[Tese]. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo; 2007. Disponível em: http:// UTILIZAÇÃO DA CIF EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES
www.teses.usp.br/teses/ disponiveis/6/6l32/tde-09042007-15l313/pt-br.php. [acesso em 2011 dez, 15]. COM ALTERAÇÕES DE LINGUAGEM:PESQUISA E
15. MARCELINO,MA.& Dl NUBILA,H.B.V. A Classificação Internacional de Funcionalidade,In
capacidade e Saúde CIF) e Potenciais Aplicações em Saúde do Trabalhador. /«: MENDES,R. Patologia
PRÁTICA EM FONOAUDIOLOGIA
do Trabalho. Rio de Janeiro: Atheneu, 2013, Vol 1 p.293-324.
16. MARTINS, A.C. & ARAÚJO,E.S. Deficiência não é incapacidade: o que isso significa? Rev. CIF Regina Yíc Shon Chun
Brasil. 2015;3(3):18-27. Fonoaudióloga. Pôs-Doutora em Lingüística.
17. IvíARCELINO, MA. Avaliação de pessoas com deficiência para acesso ao Benefício de Prestação
Amanda BraitZerbeto
Continuada da Assistência Social — BPC. In'. SAVARIS,J.A.(Coord.) Curso de perícia judicial previ- Fonoaudióloga.
denciária. 2.ed. Curitiba: Auteridade Editora, 2014. Doutora em Ciências da Saúde da Criança e do Adolescente.
18. BRASIL. Decreto n.° 7.617> de 17 de novembro de 2011. Altera o Regulamento do Benefício de
Prestação Continuada, aprovado pelo Decreto n.° 6.214, de 26 de setembro de 2007. Diário Oficial da Maria de Lurdes Zanolíi
Médica. Doutora em Pediatria,
União, Brasília, DF, 18 nov. 2011.(Endnotes)

Em revisão da literatura internacional, Paiva-Alves et d. (2016) en


contraram que os estudos acerca da Classificação Internacional de Funcio
nalidade, Incapacidade e Saúde — versão para jovens e crianças — CIF-CJ
(WHO, 2007; CCOMS, 2011), derivada da Classificação Internacional
de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde em função das especificidades de
crianças e jovens e incorporada em versão atualizada da CIF (CCOMS,
2015),em sua maioria são: de autoria coletiva, das áreas de Educação e Saú
de, estudos descritivos de mapeamento de escalas motoras e de desempenho
infantil, programas de saúde e de educação ou voltados a determinadas pa
tologias. As autoras indicam que os estudos mostram a importância do uso
da CIF-CJ na prática clínica, sendo que não encontraram esmdos acerca de
sua viabilidade até 2013 (período estudado). Concluem que há carência de
instrumentos baseados na CIF-CJ para avaliar o desenvolvimento infantil.
Os itens adicionais da CIF-CJ deveriam ser incluídos na CIF em
seu processo de atualização pela Organização Mundial de Saúde(OMS)
até 2015: "A proposta de fusão da estrutura básica da CIF e da CIF-
CJ terá implicações importantes não apenas para sua classificação e sua

232
233
manutenção, mas também para aumentar a cobertura e o uso da CIF A opção pela CIF(CCOMS,2003 e 2015) decorre de sua aborda
na transição ao longo da vidd^(CCOMS,2015, p.308, itálico da publi gem biopsicossocial em consonância com os pressupostos da Promoção
cação). Mais informações a respeito dessa atualização podem ser encon de Saúde, tendo em vista a atenção integral e humanizada à saúde de
tradas no site da OMS; http://www.who.int/classifications/icfupdates/ crianças e adolescentes. A Promoção da Saúde visa ao favorecimento da
en(CCOMS,2015, apresentação). qualidade de vida das pessoas e das populações por meio de ações volta
A CIF engloba todos os aspectos da saúde humana e se aplica a das a melhorar as condições ambientais, sociais, culturais, econômicas e
todas as pessoas e não apenas àquelas com incapacidades, tendo uma políticas, criando mecanismos que reduzam as situações de vulnerabili
aplicação universal {op.cit.). dade e incorporem a participação e o controle social na gestão das polí
ticas públicas (BRASIL, 2010). Portanto, a Promoção de Saúde trata-se
Na Fonoaudiologia no cenário nacional, são ainda mais escassas as de estratégia importante na atenção e no cuidado de crianças e adoles
publicações e os relatos de experiências com a CIF-CJ ou com a CIF, sen cente com alterações de linguagem, população-alvo deste capítulo.
do encontrados poucos trabalhos em periódicos como os de Morettin et
aí. (2013), Pommerehn et ai. (2016) e Santana e Chun (2017). As alterações de linguagem de crianças e adolescentes apresentam
implicações biológicas e ambientais e resultam em vulnerabilidade em
Desde 2008,temos realizado estudos com a CIF e a CIF-CJ no âm diversas esferas do seu cotidiano, tais como; restrição em atividades de
bito da Fonoaudiologia no Departamento de Desenvolvimento Huma brincar e/ou conversar, impacto nos relacionamentos interpessoais, di
no e Reabilitação (DDHR) da Faculdade de Ciências Médicas(FCM) ficuldades em realizar tarefas do dia a dia e lidar com o estresse (MA-
da Universidade Estadual de Campinas — UNICAMP, Campinas, São RKHAM e DEAN, 2006; MCCOMARCK et aL, 2010; MCLEOD
Paulo, tanto na graduação de Fonoaudiologia quanto nos Programas de et ai, 2014; MCALLISTER, COLLIER e SHEPSTONE, 2013). As
Pós-graduação stricto e lato sensu, resultando em diversos trabalhos de sim, essas crianças e esses adolescentes podem sofrer frustração por não
Iniciação Científica,Trabalho de Conclusão de Curso, Mestrado e Dou conseguirem se comunicar como gostariam, ter redução de qualidade
torado. Foram publicados três planos terapêuticos fonoaudiológicos, um de vida, além de se sentirem excluídos nos ambientes que freqüentam
norteado pela CIF para pessoas com afasia que utilizam a Comunicação (MARKHAM e DEAN,2006).
Suplementar e/ou Alternativa(CHUN e DALAQUA,2015)e dois pela
CIF-CJ com indivíduos com alterações de linguagem e seus familiares Considerando-se que os modos de funcionamento e de repercussão
(CHUN e ZERBETO,2015; CHUN e OSTROSCHI, 2015). das alterações de linguagem são diferentes para cada criança e adolescente
e que,"para facilitar o estudo dos determinantes ou dos fatores de risco, a
Este capítulo aborda parte da experiência prática de uma das pes CIF inclui uma lista de fatores ambientais que descrevem o contexto em
quisas desenvolvidas, como Doutorado (ZERBETO, 2017), por uma que o indivíduo vive"(CCOMS,2015, p.l7), justifica-se a importância
das autoras sob a orientação das demais signatárias e da vivência clí da utilização da CIF no âmbito da Fonoaudiologia, sendo que, nos estu
nica dos casos estudados em acompanhamento na Fonoaudiologia do dos desenvolvidos, tendo em vista a atenção à saúde desse grupo popula
Centro de Estudos e Pesquisas em Reabilitação Gabriel O. S. Porto cional(OSTROSCHI,2016; ZERBETO,2017), foi utÜizada a CIF-CJ
— CEPRE/DDHR/FCM da UNICAMP em parceria com o Programa (CCOMS,2011), pois ainda não havia a atual versão de 2015.
de Pós-Graduação em Saúde da Criança e do Adolescente da mesma
Faculdade nessa e em outra pesquisa de doutorado utilizando-se a CIF- A CIF interessa à área da saúde, e, aqui particularmente à Fono
CJ (OSTROSCHI,2016). audiologia, por possibilitar o estudo de fatores ambientais e pessoais.

234 235
no caso das alterações de linguagem, como abordado por vários auto A experiência com a CIF-CJcom crianças e adolescentes com
res (MCLEOD, 2006; THREATS, 2008; DEMPSEY e SKARAKIS- alterações de linguagem
DOYLE, 2010) e reafirmado nos diversos estudos desenvolvidos por
este grupo de pesquisa como demonstram resultados de Santana e Chun A inspiração para os estudos com a CIF-CJ por nosso grupo de
pesquisa foi o trabalho desenvolvido pela pesquisadora Dra. Sharyn-
(2017) e, no caso da CIF-CJ, trabalhos de Ostroschi et al. (no prelo)
com os familiares de crianças e adolescentes com alterações de lingua ne McLeod, fonoaudióloga e docente na Charles Sturt University na
Austrália, e foi uma das colaboradoras no desenvolvimento da CIF-
gem e de Zerbeto (2017), tomado por base neste capítulo, dentre outros
trabalhos de conclusão de curso, iniciação científica e de mestrado que CJ (WHO, 2007). Segundo Paiva-Alves et al. (2016), McLeod foi
não serão aqui abordados.
pioneira na Fonoaudiologia ao publicar um artigo utilizando a versão
beta da CIF-CJ no estudo de caso de Jarrod, um menino de sete anos
Ao se operacionalizar essa abordagem biopsicossocial por meio da com fala ininteligível(MCLEOD,2006). Ao classificar a funcionali
CIF e da CIF-CJ, possibilita-se enfatizar a identificação das experiências e dade de Jarrod nos quatro componentes da CIF-CJ, McLeod (2006)
das necessidades reais das pessoas e, na população-alvo aqui em questão, obteve elementos para propor mudanças que otimizassem a interação
pode fornecer subsídios acerca das condições das crianças e dos adolescen de Jarrod com seus professores e colegas no ambiente escolar, bem
tes com alterações de linguagem para otimização de sua funcionalidade como para decisões políticas e sociais em serviços direcionados para as
e participação (ZERBETO, 2017). A CIF-CJ contempla componentes crianças com alterações de linguagem.
importantes a serem observados no acompanhamento fonoaudiológico,
por possibilitar a caracterização das dificuldades de linguagem e seu im Os resultados de McLeod(2006) abriram possibilidades para fono-
pacto nas relações sociais e atividades cotidianas de crianças e adolescen audiólogos que atuam na perspectiva biopsicossocial e que, ainda, não
tes(MCCOMARCK etal, 2010; SIMEONSSON,2003;THREATS e utilizam a CIF como ferramenta que possibilita acompanhar o indiví
"WORRALL,2004;THREATS,2006; DEMPSEY e SKARAKIS-DOY-
duo de forma ampla nessa abordagem, que abrange não só os aspectos
LE, 2010; ZERBETO,2017).
biomédicos mas também psicológicos e sociais, em que cada um atua
e sofre interferência do outro e todos são influenciados pelo ambiente,
A CIF (CCOMS,2003 e 2015) introduz uma mudança de para como explicam Ferreira et al. (2014). Questões que interessam aos nos
digma na Saúde, do modelo biomédico para um modelo biopsicossocial, sos estudos e prática em Fonoaudiologia e que apresentam consonância
integrando a funcionalidade e a incapacidade humana (Dl NUBILA e com os pressupostos da Promoção da Saúde na Atenção à Criança e ao
BUCHALLA,2008; FERREIRA ^/., 2014). Adolescente, o que nos aproximou da Pediatria Social (ZANOLLI e
A CIF, apesar de sua significativa contribuição da atenção à pessoa MERHY, 2001) e com as teorias enunciativas-discursivas que funda
em sua integralidade e, não somente, em seus aspectos biológicos, tem mentam nossa atuação em linguagem.
sido mais utilizada no meio científico em pesquisas, e ainda pouco utiliza A leitura e análise da trajetória dos trabalhos realizados por
da na prática clínica(BJÕRCK-ÂKESSON etal, 2010). O fato de a CIF McLeod e colaboradores (MCLEOD, 2004; MCLEOD, 2006;
ser pouco utilizada na pratica clinica pode estar relacionada ao pouco co MCLEOD e THREATS, 2008; MCLEOD et al., 2014) motivaram
nhecimento dos profissionais da sua aplicação em uma abordagem biopsi estudos utilizando a CIF-CJ em crianças e adolescentes com alte
cossocial como base conceituai, alem da complexidade e grande extensão rações de linguagem em pesquisa de iniciação científica (FRARE e
da CIF que podem dificultar sua utilização no contexto clínico. CHUN,2014) correlacionada ao estudo de Zerbeto (2017) e de seus

236
237
familiares(OSTROSCHI etal., no prelo). Destes trabalhos, em seus A prática em fonoaudiologia e em pediatria norteadas pela integralidade
períodos de desenvolvimento,foram publicados Planos Terapêuticos trouxe importante subsídio para a escolha dos domínios. Para a seleção
Fonoaudiológicos (PTFs) norteados pela CIF-CJ voltados aos fami dos domínios, foram considerados os aspectos biológicos e ambientais
liares de crianças com paralisia cerebral (CHUN e OSTROSCFíI, em três componentes da CIF-CJ: Funções do Corpo, Atividades e Par
2015) e com crianças que são vistas como gagas (CHUN e 7.F.R- ticipação e Fatores Ambientais(ZERBETO, 2017). Note-se que, caso
BETO, 2015), parte da população estudada por Zerbeto (2017). fosse necessário, os domínios poderiam ser modificados. Contudo, se
Tais publicações podem auxiliar a prática e pesquisa de profissionais mostraram suficientes para os propósitos do estudo.
interessados em utilizar a CIF-CJ nesses grupos populacionais. É importante ressaltar que não se trata aqui de uma proposta de do
A utüizaçâo da CIF-CJ como base conceituai e sua aplicação em mínios fechada, mas que possa servir de referência àqueles que se inte
crianças em acompanhamento fonoaudiológico forneceu subsídios no ressarem em utilizá-la com esse mesmo público-alvo. Portanto, podem-
desenvolvimento do PTF das crianças vistas como gagas {op.cit.) para se acrescentar ou excluir domínios que forem pertinentes conforme a
apresentação de uma proposta de intervenção terapêutica usuário cen população em que for aplicada. Em nossa experiência, procurou-se não
trada em uma perspectiva de atenção humanizada (BRASIL,2010) por abranger um número muito grande de domínios que possa dificultar
entendermos que a gagueira apresenta questões biopsicossociais envol sua utilização e implementação em função do tempo necessário à ob
vidas. Nesse texto, são apresentadas sugestões de objetivos e estratégias tenção dos dados. Segue quadro de domínios da CIF-CJ aplicáveis a
para essa intervenção. crianças e adolescentes com alterações de linguagem.
Segue uma breve descrição da experiência de utilização da CIF-
CJ baseada na pesquisa de Zerbeto (2017). Neste capítulo, apresen Quadro 1: Domínios da CIF-CJ aplicáveis a crianças e adolescentes com
tam-se os processos de seleção de domínios da CIF-CJ e dos qualifi- alterações de linguagem
cadores, além de exemplificar o uso de qualificadores e de descrição
qualitativa dos domínios. DOMÍNIOS DA CIF-CJ APLICÁVEIS NAS ALTERAÇÕES DE LINGUAGEM
(Elaborado por ZERBETO,CHUN,ZANOLLI- UNICAMP,2017)
Eunçóes do Corpo
Sugestão de domínios da CIF-ÇJaplicáveis a crianças e
bll7 Funções intelectuais
adolescentes com alterações de linguagem
bl67 Funções mentais da linguagem
Para selecionar os domínios da CIF-CJ, úteis para a caracterização b230 Funções auditivas
da linguagem e funcionalidade de crianças e adolescentes com altera b320 Funções de articulação
ções de linguagem, Zerbeto (2017) realizou extensa revisão da literatu b330 Funções de fluência e do ritmo da fala
ra, analisando componentes e domínios mais utilizados e suas descrições
Atividades e Participação
qualitativas, vantagens e dificuldades de sua aplicação.
d230 Realizar a rotina diária
Para construção do quadro com os domínios selecionados, consi
d240 Lidar com o estresse e outras exigências psicológicas
derou-se também a experiência clínica com essa população, dado nosso
d310 Comunicar e receber mensagens orais
interesse em abranger aspectos contextuais (pessoais e ambientais), ge
d330 Falar
ralmente, ausentes nos instrumentos de avaliação de linguagem formais.

238 239
d350 Conversação grupo com desenvolvimento típico de linguagem.A entrevista possibili
d710 Interações interpessoais básicas tou que os grupos relatassem suas percepções de suas falas no dia a dia.
d730 Relacionamento com estranhos Para as entrevistas, elaborou-se um roteiro com questões norteado-
d750 Relacionamento sociais informais ras a partir do Speech Participation and Activity ofChildren — SPAA-C
d760 Relacionamentos familiares (MCLEOD,2004) e da descrição de inclusão e exclusão dos domínios
d880 Envolvimento em jogos ou brincadeiras da CIF-CJ,sendo que algumas das questões da entrevista foram traduzi
Fatores Ambientais das para o Português e outras foram acrescentadas(ZERBETO,2017).
e4l0 Atitudes- individuais dos membros da família próxima Foram realizadas entrevistas individuais com cada criança ou adolescen
e420 Atitudes individuais dos amigos te videogravadas com o consentimento dos responsáveis e dos adoles
Atitudes individuais de conhecidos, pares, colegas e membros da comunidade centes, para transcrição e qualificação pelos domínios da CIF-CJ.
e580 Serviços, sistemas e políticas relacionados com a saúde
Qualificação da linguagem das crianças e dos adolescentes
e585 Serviços, sistemas e políticas relacionados com a educação
utilizando-se a CIF-CJ
Fonte: Zerbeto (2017)
A qualificação dos domínios da CIF-CJ foi realizada de forma in
dividualizada, considerando as informações coletadas e seguidas as re
Formas de obtenção de dados para qualificação dos domínios comendações da CIF (CCOMS, 2011 e 2015) relativas às definições,
da CIF inclusões e exclusões de cada domínio no caso das crianças e dos adoles
Pelo fato de a CIF ser uma ferramenta de classificação, não de ava centes com alterações de linguagem (ZERBETO,2017).
liação, não são preestabelecidos os meios que os profissionais podem Acredita-se que os qualificadores têm sido pouco utilizados nas pes
utilizar para caracterizar e avaliar os domínios. Portanto, pode servir de quisas de linguagem, possivelmente pela dificuldade de quantificar/clas-
referencia para qualificação de aspectos observados na prática clínica sificar os domínios segundo os percentis como recomendado pela CIF
com a vantagem de não ser de uma forma padronizada. (CCOMS,2011 e 2015) conforme discutem Dalaqua (2014) e Zerbeto
Segundo a CIF(CCOMS,2011 e 2015), podem ser utilizadas di (2017). Algims componentes, como Atividades e Participação e Fatores
versas fontes para analise e classificação por meio de qualificadores, tais Ambientais, não são simples de terem o grau de severidade caracterizado
como: prontuários,instrumentos de avaliação do profissional, percepção em percentis, pois sofrem influências culturais, econômicas,sociais, sendo
ou informações de familiares, professores, amigos e outros atores sociais complicado estabelecer critérios universais do que seria um problema ou
envolvidos, como no caso de crianças em seguimento fonoaudiológico. um costume da população estudada. Por exemplo, como quantificar di
McLeod (2006) apresenta um roteiro norteador de perguntas para esse ficuldades em domínios como lidar com o estresse; relacionamento com
fim com diferentes fontes, embora não descreva como classificou os da familiares, conhecidos e amigos; atitudes individuais de membro da famí
dos obtidos. lia próxima ou amigos, dentre outros?
No caso de Zerbeto (2017), uma vez que o foco foi obter as impres A falta de parâmetros (além das porcentagens) para estabelecer o
sões acerca das falas e dos impactos das alterações de linguagem, foram grau dos qualificadores nos domínios referentes a Atividades e Partici
realizadas entrevistas com crianças e adolescentes com alterações e outro pação e Fatores Ambientais torna mais complexa a utilização da CIF nas

240 241
alterações de linguagem. Entende-se que náo há uma regra a ser seguida Cada escolha de qualificador foi realizada individualizadamente por dois
quando se trata de qualificadores de domínios, principalmente naqueles pesquisadores e confirmada pelas orientadoras, por se tratar de pesquisas
que sofrem grande influência cultural como nos componentes de Ativi (CHUN e FRARE,2014;ZERBETO,2017), considerando-se a percep
dades e Participação e Fatores Ambientais. Entretanto, isso náo significa ção da criança e a forma como o domínio impactou sua funcionalidade
que não há formas de utilizar qualificadores nesses componentes. O na análise das entrevistas gravadas e transcritas.
profissional pode utilizar sua experiência clínica e o conhecimento de
Segue trecho da entrevista de uma criança de cinco anos:
aspectos ambientais e atitudes que interferem na comunicação e partici
pação das crianças e dos adolescentes para uso dos qualificadores. "Porque tem vezes que ela só briga muito comigo. E não
entende o que eufalo".
O uso dos qualificadores é válido por proporcionar uma linguagem
padronizada na caracterização da dificuldade que o indivíduo apresenta "Porque assim... eles enchem meu saco enchem e eu não
nos aspectos abordados em cada domínio,facilitando, assim, a comuni consigo dormir".
cação entre os profissionais. O profissional ao utilizar os qualificadores,
também,facilita a comparação de dados entre serviços, países e tempo e Este trecho de discurso em que a criança fala da irmã e dos outros
proporciona um esquema de codificação para os sistemas de informação evidencia o impacto da sua fala para ela e para os outros. Outras infor
de saúde, como ressaltado na CIF(CCOMS,2011 e 2015). mações do prontuário e da entrevista indicavam sua participação restrita
nas atividades escolares e familiares que envolvessem conversas, por suas
Além disso, pode-se realizar uma descrição qualitativa associada aos dificuldades articulatórias que prejudicavam a inteligibilidade de fala e,
qualificadores que permite fornecer mais detalhes e informações em de muitas vezes, a compreensão pelos outros no domínio d550- conver
terminado domínio, contribuindo para sua melhor caracterização. Esse sação. Conforme seu relato na escola, os colegas "faziam piadas e imi
tipo de descrição facilita a troca de informações entre profissionais e a tavam seu jeito de falar", o que lhe gerava receio em conversar com os
tomada de decisões com maior conhecimento do caso. Devido a esses outros. Neste exemplo, diante das dificuldades da criança em participar
motivos, recomenda-se a utilização dos qualificadores e da descrição de conversas e seu impacto para ela, foi qualificada como 3 — dificulda
qualitativa ao se utilizar a CIF. de grave, neste domínio.
Exemplos de caracterização de domínios de crianças e
adolescentes com alterações de linguagem Exemplo 2:Domínio- d730 Relacionamento com estranhos
Seguem exemplos de como foram caracterizados alguns domínios Neste foi perguntado como se sentiam quando conversavam com
do componente de Atividades e Participação de crianças e adolescentes estranhos e por que se sentiam dessa maneira. Segue trecho de depoi
com alterações de linguagem. mento de um adolescente de 15 anos.

Exemplo 1:Domínio d350 — Conversação "Me sinto triste. Porque eu não conheço, e vai que ele me zoa".

Para que as crianças e os adolescentes falassem sobre suas percepções Além disso, referiu que evita contato com estranhos para não se
neste domínio, foi perguntado: Com quem gostavam de conversar ou expor a situações que não se sinta confortável, como, por exemplo,
não e por quê? e se conseguiam ou não iniciar e manter uma conversa. comprar ingressos no cinema e pedir comida em restaurantes. Por ou
tro lado, relatou que o atendimento fonoaudiológico o está ajudando
242 243
a enfrentar essas situações e procura não limitar suas atividades pelo de desse grupo. Além disso, permite uma linguagem padronizada que
receio de ser julgado por sua fala. A análise global levou-o a qualificar favorece a comunicação e troca entre os profissionais de saúde e o uso
este item como 2 — dificuldade moderado. nas pesquisas.

Exemplo 3:Domtnio — d730Relacionamento com estranhos O estudo de Zerbeto (2017) também mostrou a aplicabilidade
CIF-CJ em crianças e adolescentes com desenvolvimento típico de
Segue trecho de fala de uma criança de oito anos. linguagem, trazendo importante subsídios para intervenção fonoau
Normal. Porque ele pode ser meu amigo". diológica tanto para o profissional quanto para a família que traz de
mandas, dúvidas e angústias ao procurar ajuda especializada. Consi
Ela acrescentou que outra criança estranha poderia se tornar sua derando-se que essa ferramenta permite a descrição das condições de
amiga, sendo qualificada como O — nenhuma dificuldade, já que não se saúde desde nenhuma até um grau de dificuldade completa, pode ser
evidenciou dificuldades nesse domínio na sua percepção. útil na promoção da saúde e nas diversas fases do seguimento clínico,
A entrevista possibilitou espaço para as crianças e os adolescentes ex ou seja, na avaliação, no diagnóstico e no acompanhamento da crian
pressarem suas percepções e, associado à análise dos prontuários, podem ça e do adolescente em sua singularidade.
se caracterizar os domínios por meio dos qualificadores e das descrições Procuramos apresentar aqui nossa experiência com a CIF e mostrar
qualitativas dos casos estudados. Note-se que, como havia outro estudo aqui sua aplicabilidade que, a nosso ver, abre novas possibilidades na
em paralelo com os familiares utilizando-se a CIE, todos os dados contri prática e na pesquisa em Fonoaudiologia, Pediatria e outras áreas en
buíram para uma intervenção fonoaudiológica mais eficaz. volvidas com Atenção da Criança do Adolescente em uma perspectiva
Zerbeto (2017) aplicou essas mesmas perguntas para crianças e integral e humanizada.
adolescentes com desenvolvimento típico de linguagem, o que permitiu
comparar e reafirmar os resultados encontrados.
OBSERVAÇÃO IMPORTANTE AO LEITOR: A CIF-CJ FOI
EXTINTA EM 2015 PORQUE SUAS CATEGORIAS FORAM
Possibilidades e aplicabilidade da CIF na prática clínica e na INCORPORADAS A VERSÃO ATUALIZADA DA CIF, NO
pesquisa MESMO ANO.

Se, de um lado, a CIF apresenta limitações e aspectos que difi


cultam sua implementação por ser extensa, complexa e, ainda, pouco
conhecida e utilizada na prática clínica e de pesquisa, por outro lado,
possibilita a abordagem centrada na pessoa, um olhar para as questões
de participação e funcionalidade, além da patologia.
A CIF apresenta componentes importantes para a caracterização de
domínios de fala e linguagem, incluindo aspectos ambientais e sociais
em que as crianças e os adolescentes estão imersos e se dá a linguagem,
possibilitando identificar/qualificar suas repercussões na atenção à saú

244
245
Leitura recomendada 15. Markham C, Dean T. Parents' and professionals' perceptions of Quality of Life in children with
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Ruth Losada de Menezes
Fisioterapeuta. Doutora em Ciências eia Saúde.

Anabela Correia Martins


Fisioterapeuta.
Doutora em Psicolo^ da Saúde.

Maria Márcia Bachion


Enfermeira. Doutora em Enfermagem.

No ambiente cotidiano de trabalho, os profissionais da área da saú


de utilizam uma linguagem de especialidade (GARCIA, NOBREGA,
2009), que é aquela empregada entre membros especialistas de uma
determinada comunidade técnico-científica, padronizada, do ponto de
vista conceituai, para que os objetivos da mensagem emitida possam ser
atingidos de forma rápida, precisa e confiável entre os interlocutores.
Neste tipo de linguagem, cada termo tem seu significado estabelecido,
referindo-se a um objeto único, específico, que foi incorporado durante
o processo de socialização profissional (GALVÂO,2015).
A Organização Mundial de Saúde(OMS)propõe um modelo para
abordagem da funcionalidade humana, a fim de proporcionar uma lin
guagem unificada e padronizada de terminologias para descrição da saú
de e dos estados relacionados com a saúde. Trata-se da Glassificação In
ternacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF),ferramenta
epidemiológica, de uso em pesquisa, na prática clínica e em políticas
sociais(OMS,2015).
A idéia de desenvolvimento da CIF partiu da necessidade de co
brir, a princípio, as conseqüências das doenças, que eram fenômenos

248
249
náo alcançados pela Classificação Internacional de Doenças (CID) da A segunda sessão refere-se a fatores contextuais, englobandofatores
OMS. Trata-se de um processo amplamente divulgado, avaliado e re ambientais(environmentfactors) representados pela letra minúscula "e",
visado (OMS, 2002; OMS, 2015; BUCHALLA, 2003; NORDEN- além de fatores pessoais que não são passíveis de classificação pela ferra
FELT, 2003; FARIAS; BUCHALLA, 2005; CIEZA et ai, 2009). A menta(OMS,2015).
CIF foi desenvolvida a partir da "Classificação Internacional das Defi
Conforme a estrutura da CIF, a incapacidade é resultante da inte
ciências, Incapacidades e Desvantagens"(CIDID), publicada em 1980
ração de vários fatores, entre eles: a disfimção (deficiência), a própria
(ou Intemational Classification ofImpairments, Disabilities and Handi-
limitação na execução de atividades, a limitação da participação social e
ICIDH), em caráter experimental, para propósitos de teste, que
dos fatores ambientais; já a funcionalidade é explorada em seu aspecto
incorporava categorias que correspondiam às conseqüências duradouras
positivo, embora a classificação permita que se avaliem os graus de per
das doenças(OMS, 1989).
da funcional(ARAÚJO,2010).
O sistema de classificação da CIF é hierárquico (Quadro 1), dividi
A CIF é composta por listas de classificações para cada um dos
do em duas partes: a primeira é referente aos componentes que incluem
componentes (funções do corpo, estruturas do corpo, atividades e
funções e estruturas do corpo, representados respectivamente pelas letras
participação e fatores ambientais), para os quais existe uma lista de
minúsculas "b"Junções do corpo (hody) e "s"estruturas do corpo (structu-
capítulos e, dentro de cada capítulo, há uma lista de códigos ge
rè), e informações de atividade e participação (disability), representadas
néricos'(categorias), que se dividem em outros códigos detalhados
pela letra minúscula "d".
(categorias detalhadas). No sistema alfanumérico utilizado, as letras
Quadro 1. Conceituaçóes e terminologias dos componentes relatados na CIE são utilizadas para denotar os seus componentes e são seguidas por
Funções do corpo "b" Atividade
um código numérico que começa com o número do capítulo (um
Componentes Fatores
Estruturas do corpo "s" "d"
Participação dígito), seguido pelo segundo nível (dois dígitos) e o terceiro e quar
Ambientais "e"

Funções do corpo são to níveis (um dígito cada) (OMS, 2015). A CIF apresenta 1.454
as funções fisiológicas Atividade é categorias abordando de forma completa a funcionalidade humana,
dos sistemas do corpo a execução
Participação Compreende os tornando-a uma classificação extremamente abrangente. A OMS re
éo fatores externos
(incluindo as funções de tarefas comenda, ainda, que, a cada categoria da CIF, seja associado um
Definição envolvimento do meio
mentais). realizadas no
Estruturas do corpo são dia a dia de numa situação ambiente onde qualificador que reflita o impacto da condição de saúde sobre o as
as partes anatômicas do um indivíduo. da vida social. a pessoa vive. pecto específico da funcionalidade(OMS,2015).
corpo.
Os conceitos apresentados na CIF introduzem um novo paradigma
FUNCION/VUDADE para pensar e trabalhar a deficiência e a incapacidade. Não somente per
Aspecto Integridade Funcional cebidas como conseqüência das condições do binômio saúde e doença
Positivo e Estrutural
Atividade Participação Facilitadores
mas também determinadas pelo contexto do meio ambiente físico e so
tímtmINCAPAC IDADl cial, pelas distintas percepções culturais e posturas diante da deficiência,
Aspecto
Deficiência
Limitação da Restrição da Barreiras/ pela disponibilidade de serviços e de legislação (Figura 1).
Negativo Atividade Participação Obstáculos

(Fonte: Adaptado de OMS,2015; ARAÚJO,2010)

250 251
integrante da "Eamília de Classificações Internacionais da OMS",
Condições de saúde
(transtorno ou doença) CIE, ainda encontra-se restrita a estudiosos da área da Medicina de
reabilitação, áreas específicas como saúde do trabalhador e, também,
fundamentando uma legislação inclusiva(BUCHALLA,2003).
Funçõese Anuidades Participado
Eslmturas do coipo O Conselho Nacional de Saúde(CNS) aprovou, em maio de 2012, a
f J Resolução n.° 452 para que o Ministério da Saúde inclua a CIE no Sistema
Único de Saúde(SUS) e também na Saúde Suplementar(BRASIL,2013)
Fatores
como geradora de indicadores da funcionalidade humana. A CIE deverá
Fatores
ambientais pessoais ainda ser utilizada nas investigações de resultados sobre bem-estar, qualida
de de vida, acesso aos serviços e impacto dos fetores ambientais na saúde das
Figura 1. Interações entre os componentes da CIF pessoas(MINISTÉRIO DA SAÚDE,2015).
Fonte: OMS,2015.
No Brasil, algumas medidas na área de normativas poderão contri
Em um contexto de envelhecimento populacional, temos aumento buir para a disseminação do uso da CIE. Uma norma estabelecida pelo
da prevalência de doenças crônicas e incapacitantes e uma mudança Conselho Eederal de Eisioterapia e Terapia Ocupacional aborda sobre o
de paradigma na saúde pública. As doenças crônicas não transmissí uso da-CIE por profissionais fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais
veis diagnosticadas em um indivíduo idoso, geralmente, não admitem (Resolução COEEITO n.° 370/2009). O mesmo conselho, recentemen
cura e, se não forem devidamente tratadas e acompanhadas ao longo te, ofereceu um curso de atualização sobre a CIE, de forma gratuita, aos
dos anos, tendem a apresentar complicações e seqüelas que comprome profissionais, por meio de plataforma de ensino a distância.
tem a independência e a autonomia do idoso(MENEZES,MARTINS,
Outra importante iniciativa no cenário nacional são as atividades
2016). A saúde, nesta circunstancia, não é mais medida pela presença
ou não de doenças, e sim pelo grau de preservação da capacidade fun do Grupo CIE Brasil que tem a missão de disseminar o conhecimento
cional (RAMOS, 2003; MENEZES, MARTINS, 2016). A intenção sobre a CIE, por meio de diferentes estratégias, sendo elas: cursos pre
da OMS com o uso da CIE, em conjunto com outras classificações da senciais e a distância, desenvolvimento de manuais e aplicativos (CIE
BRASIL, 2017).
organização, e favorecer o entendimento sobre a saúde da população, de
acordo com as necessidades atuais(ARAÚJO,2010). Oficinas para reflexão, análise, discussão e decisões sobre a incorpo
ração da CIE/OMS no sistema de informação em saúde brasileiro vêm
Como a CIE e uma classificação específica de funcionalidade e
incapacidade, as condições que passaram a existir devido à transição sendo promovidas em importantes espaços, entre eles, o 11° Congresso
da Associação Brasileira de Saúde Coletiva(ABRASCO)em 2015 e a 22^
epidemiológica, estando elas diretamente relacionadas com a presença Conferência Mundial de Promoção da Saúde da União Internacional para
de doença ou não, podem ser identificadas e monitoradas pelos profis
sionais envolvidos. A unificação da linguagem é o principal ponto que a Promoção da Saúde e Educação (UIPES) em 2016. A partir destas ofi
estimula os profissionais a utilizar a CIE (ARAÚJO,2010). cinas,foram estabelecidas estratégias que fundamentaram as atividades de
todos os atores envolvidos, sendo eles: gestores públicos dos diversos seto
Lançada em 2001 pela OMS(OMS,2003) e aprovada para uso res, instituições de ensino e academias, órgãos reguladores e movimentos
internacional durante a 54=^ Assembléia Mundial da Saúde, a nova sociais. Neste contexto, representa um desafio sistemas de informação que

252
253
harmonizem o uso da CIF não só com a CID(ESCORPIZO etai,2013) OBJETIVO
mas também com qualquer outro sistema de classificação ou linguagem
Realizar um relato de experiência acerca do ensino da CIF e da re
especial da prática, tais como: as taxonomias CIPE- Classificação Inter
construção dos conceitos de fimcionalidade e incapacidade por alunos
nacional para a prática de Enfermagem (TOSIN et 2015), NANDA
I - taxonomia de Diagnósticos de Enfermagem da Nanda International de pós-graduação stricto sensu, na área da saúde, em duas disciplinas dis
tintas, uma na Universidade de Brasília (UnB) e outra na Universidade
(HERDMAN,2013), a Classificação dos Resultados de Enfermagem -
Federal de Goiás(UFG).
NOC(MOORHEARS et aí., 2010) e Classificação das Intervenções de
Enfermagem - NIC (Bulechek, 2010).
Nestas oficinas,foram estabelecidos três eixos temáticos,sendo um METODOLOGIA
deles a "Formação e educação permanente". Destacaram-se como pro Trata-se de um relato de experiência de docentes de duas dis
duto final: 1) a necessidade de padronização de alguns termos, devido ciplinas optativas presenciais de pós-graduação, sendo elas: "Enve
à divergência conceituai de documentos traduzidos para o Português, lhecimento e Saúde" da Pós-Graduação em Ciências e Tecnologias
sugerindo os seguintes termos: funcionalidade {functionin^-, alteração em Saúde (Universidade de Brasília) com 60 horas aula, ofertada
da função e estrutura do corpo {impairment)-, incapacidade-deficiên- professores da área de Fisioterapia, e "Funcionalidade humana na
cia-imitações de atividades e restrição da participação {disahility)-, 2) a perspectiva multidimensional e sistemas de classificação" da Pós-
necessidade de se fazer um levantamento sobre o que já existe para o Graduação em Enfermagem (Universidade Federal de Goiás) com
ensino da CIF, para que, a partir disso, seja realizado um mapeamen 30 horas aula, oferecida por professores da área de Enfermagem e
to e levantamento das necessidades existentes; 3) a recomendação a Fisioterapia, totalizando um número de 11 participantes nas duas
todos os profissionais de saúde, entidades representativas, instituições turmas. As atividades de ensino foram desenvolvidas no segundo
de ensino, órgãos governamentais dos diversos setores colaborativos, semestre de 2014 e primeiro semestre de 2017, respectivamente.
que aprendam, incorporem os princípios e ensinem sobre a CIF; 4) a
deliberação de formação de um grupo de trabalho entre o Conselho
Nacional de Saúde e o Departamento de Gestão da Educação na Saú RESULTADOS
de (DEGES) do Ministério da Saúde com o objetivo de trabalhar na
obtenção de alguns produtos, sendo um deles uma pesquisa sobre o Atividades propostas para as duas disciplinas
ensino da CIF (BIZ, 2016). No momento inicial, foram realizados o aprofundamento teórico
Apesar de todo esse esforço, muito há de se percorrer para que esta e as discussões envolvendo tópicos, como breve histórico das classifica
classificação seja utilizada de forma sistemática nos serviços de saúde. ções de deficiência e incapacidade; princípios básicos da CIF; impacto
Um dos desafios a serem superados é a formação dos profissionais da da classificação da deficiência na legislação nacional; aplicação da CIF
area da saúde, com o proposito de formar uma linguagem comum em diferentes contextos; processo de codificação e orientação na aplica
relacionada à saúde, funcionalidade e incapacidade humana. ção da CIF na prática em saúde.
Após essa fese introdutória, as disciplinas tiveram percursos diferentes.

254
255
Disciplina "Envelhecimento e Saúde" final da disciplina, que também constou de submissão e apresentação
No segundo momento, a disciplina desenvolveu-se no Centro de um trabalho científico na 22® Conferência Mundial de Promoção da
Multiprofissional do Idoso do Hospital Universitário de Brasília(CMI- Saúde da União Internacional para a Promoção da Saúde e Educação
HUB). O local trata-se de um serviço ambulatorial, onde são desen (UIPES), realizada em Curitiba, Paraná, no ano de 2016, relatando a
volvidas atividades de ensino, pesquisa e extensão com foco no aten experiência "Utilização da Classificação Internacional de Funcionalida
dimento de idosos (e seus familiares), especialmente com demências, de, Incapacidade e Saúde como ferramenta de aprendizagem".
principalmente a Doença de Alzheimer, sendo referenciado como um
centro de referência especializada nesses casos.
Disciplina "Funcionalidade humana na perspectiva
O atendimento e feito por uma equipe multiprofissional composta multidimensional e sistemas de classificação"
de profissionais da Medicina especializada em Geriatria, da Farmácia,
da Odontologia, da Nutrição, do Serviço Social, da Psicologia, da Te No segundo momento, nesta disciplina, passou-se a adotar exer
cícios teóricos e casos reais em busca da reflexão sobre os conceitos de
rapia Ocupacional, da Fisioterapia e da Enfermagem. Os quatro alunos
funcionalidade e incapacidade baseados no modelo de raciocínio pro
de pós-graduação stricto sensu (um biólogo e três fisioterapeutas) foram
posto pela CIF. O ensino e a exploração da codificação também foram
convidados a participar como ouvintes e observadores nas atividades de
incentivados por meio de ligação do conteúdo de diversos instrumentos
acolhimento desenvolvidas pelos profissionais do local.
de avaliação em saúde com a CIF, de acordo com as linking rules(CIE-
O acolhimento e a primeira consulta que ocorre após o processo da ZA et ai, 2005). No terceiro, momento, discutiram-se os resultados das
triagem, momento em que ocorrem entrevistas realizadas pelos profis ligações entre os instrumentos e a CIF, realizaram-se os devidos ajustes e
sionais com os familiares e a pessoa idosa(em conjunto e separadamen orientações quanto às implicações do significado desse tipo de atividade
te), a fim de identificar suas demandas e conhecer o contexto no qual aos discentes.
se inserem. Cada profissional tem seu momento de avaliação específica,
e, ao final, os profissionais reúnem-se para discutir os casos acolhidos, Como estratégia de avaliação final individual da disciplina, foi pro
posta a escolha de um instrumento de avaliação em saúde consolidado
momento em que cada profissional apresenta sua avaliação, baseado em
sua especialidade, e, assim, define-se em conjunto o direcionamento a em pesquisas nacionais, sua exploração de conteúdo, ligação com a CIF e
ser dado ao paciente. discussão quanto aos domínios e componentes da CIF explorados no re
ferido instrumento. Esta atividade foi apresentada em forma de relatório
Cada aluno teve a oportunidade de acompanhar diferentes idosos escrito e apresentação oral para avaliação final.
nas diversas entrevistas, avaliações e discussões multiprofissionais sob
uma perspectiva ampla que considera, além de sua condição de saú
de, os aspectos biopsicossociais envolvidos no processo saúde-doença. DISCUSSÃO
Acompanharam todo atendimento coletando dados que permitissem O estudo da CIF na disciplina "Envelhecimento e Saúde" foi uma
identificar a funcionalidade, as incapacidades, os fatores pessoais e am experiência extremamente valiosa e facilitada, uma vez que, no cenário
bientais, para descrever e classificar o idoso de acordo com a CIE do CMI-HUB,assim como em qualquer local onde se aplica abordagem
Posteriormente, os dados coletados foram categorizados e qualifi gerontológica, o olhar sobre a pessoa idosa normalmente é sob uma pers
cados usando a CIF e apresentados em forma de relatório para avaliação pectiva multidimensional de avaliação, com abordagem multidisciplinar

256
257
ou interdisciplinar, além de ser valorizada a prevenção das incapacidades A utilização inapropriada da CIF pode gerar incompreensão de sua
associadas ao envelhecimento. Todas estas condições favoreceram a per complexidade, comparando-a a um instrumento de avaliação (LEO-
cepção dos pós-graduandos acerca do modelo multidirecional proposto NARDI et ai, 2005). A proposta do ensino da codificação na disciplina
pela classificação como modelo de fimcionalidade. de "Funcionalidade humana na perspectiva multidimensional e siste
Considerando o envelhecimento populacional brasileiro, torna-se mas de classificação", realizando o linking com instrumentos específicos
primordial conhecer e utilizar a CIF, pois a funcionalidade humana sofre de avaliação, foi apenas para aproximar os alunos da codificação, incen-
influência direta das doenças crônicas e de fatores contextuais negativos tivando-os a superar o modelo reducionista biomédico e enfatizando a
representados pelas barreiras ambientais (ARAÚJO, 2011). Os dados importância do modelo biopsicossocial determinante da funcionalidade
epidemiológicos fornecidos com a utilização uniformizada da CIF são e incapacidade, no qual inclusive os fatores ambientais são valorizados.
valiosos para a elaboração do planejamento e a resolubilidade das ações Muito além da codificação, ficou evidente para os participantes a refle
e dos serviços em saúde (CIF). xão e análise sobre o significado de funcionalidade e seus determinantes;
para eles, isso foi um estímulo para o despertar da importância de ava
O uso da CIF está previsto para ser empregado em diversas áreas, liação dos fatores pessoais e ambientais, tanto quanto para as estruturas
tais como: na clínica, em estatística, na educação, na previdência social, e funções do corpo. Como reflexões dos alunos, ao final do processo
na medicina ocupacional, nas políticas públicas, com a vantagem de se ensino-aprendizagem, foi relatado em consenso o quanto essa transfor
obterem dados a respeito da funcionalidade e incapacidade homogêne mação de paradigma impactaria em suas práticas profissionais a partir
os(BUCHALLA,2003).
desta disciplina.
As disciplinas de pós-graduação foram estruturadas para um nú Mesmo executando com êxito a codificação durante as atividades
mero reduzido de alunos com atividades propostas envolvendo todo propostas nas duas disciplinas, os participantes questionaram a aplicabi
o grupo ou pequenos grupos (duplas), visando a um maior impacto lidade da CIF na prática, considerando a complexidade e quantidade de
na aprendizagem e nas discussões. A integração dos alunos nas duas aspectos contemplados na classificação. Porém ao serem apresentados a
disciplinas foi notada durante todas as atividades propostas, com a diferentes core sets ■vaSiáz.àos (LIMA et ai, 2008; BUCHALLA, CAVA
vantagem da utilização de uma linguagem comum entre as formações LHEIRO, 2008), vislumbraram sua praticidade nos diferentes contex
acadêmicas (enfermagem, fisioterapia e ciências biológicas). tos de práticas, houve expectativas positivas quanto ao futuro emprego
Todos os participantes da disciplina "Envelhecimento e saúde" destas listas resumidas.
tiveram contato prévio com a classificação, porém apresentando O termo core set advém da língua inglesa e pode ser traduzido
conhecimento superficial, ao contrário dos participantes da segun como "conjunto principal" ou "itens essenciais", referindo-se ao con
da disciplina. Ao final das duas disciplinas, foi possível perceber o junto de categorias da CIF que descreve de forma típica a funcionali
despertar dos pós-graduandos para a importância da classificação, dade das pessoas com uma determinada condição de saúde. A proposta
assim como suas potencialidades para ser empregada em diversas dos core sets da CIF é de considerar apenas aquelas categorias que são
áreas e com diferentes objetivos. A integração dos alunos foi nota típicas e significativas de uma determinada condição de saúde, servin
da durante todas as atividades propostas, com a vantagem da uti do de guia durante a avaliação multiprofissional. São instrumentos em
lização de uma linguagem comum entre as formações acadêmicas desenvolvimento, existem ponderações quanto à possibilidade do seu
(enfermagem, fisioterapia e ciências biológicas). uso representar um retorno ao modelo biomédico de compreensão da

258 259
tl ^ut: AV.UNIt(.t: NA KKAIltAí
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funcionalidade, porém constituem importante estratégia que favorece KAMITSURU, 2015; MOORHEAD et ai, 2010; BULECHEK,
a implementação e disseminação do uso da CIF, com a finalidade clí BUTCHER, DOCHTERMAN, 2010), o que, por um lado, pode
nica e de pesquisa(RIBERTO, 2011). facilitar a compreensão da CIF, mas, por outro, demandará esforço
Nas duas disciplinas ministradas, a área-de formação dos pós-gradu- para visualização do uso integrado destas classificações específicas
andos foi diversificada, sendo que, na disciplina de "Envelhecimento e com a CIF.
Saúde", dos quatro participantes, apenas um não era graduado em Fisio Uma característica básica implícita no processo de trabalho em
terapia e,sim,em Ciências Biológicas; e, na disciplina de "Funcionalidade Enfermagem é a individualização dos cuidados e o envolvimento dos
humana na perspectiva multidimensional e sistemas de classificação", dos pacientes, assim como de seu contexto de vida (FLORIN et ai, 2013).
sete participantes, apenas um não era graduado em Enfermagem e, sim, A CIF vem ao encontro desta abordagem profissional, uma vez que
em Fisioterapia. A formação profissional dos discentes deve ser conside apresenta em seu modelo o componente contextual que inclui os fatores
rada ao se propor uma atividade de formação e qualificação profissional ambientais e pessoais.
envolvendo a temática proposta, uma vez que diferentes grupos podem Atualmente,não existe terminologia multiprofissional para os cui
exigir uma metodologia de ensino diferente(LEONARDI et ai, 2005).
dados de saúde(FLORIN et ai, 2013), porém a CIF traz uma perspec
O planejamento de uma disciplina para público multiprofissional tiva favorável para emprego comum de uma classificação cujo enfoque
requer mais conhecimento sobre cada área de formação discente, a fim principal é o da funcionalidade e incapacidade do indivíduo, em uma
de contemplar exemplos e casos de diferentes interesses, visando à apren perspectiva positiva, desmistificando o enfoque negativo relacionado à
dizagem significativa. A construção da segunda disciplina foi realizada deficiência (PENKAL, 2014).
por um corpo docente multidisciplinar (Enfermagem e Fisioterapia),
diferente da primeira disciplina, que foi proposta por docentes fisiote- O processo de formação do profissional de saúde deve munir-se do
rapeutas; isso demandou algumas atitudes como a escuta e a disponibi novo modelo que reflete uma mudança de paradigma sobre a geração de
lidade para o trabalho interdisciplinar. É sabido que a interdisciplinari- deficiências e incapacidades (ARAÚJO, 2011). A visão ampla e global
dade acena para a compreensão integral do ser humano(MOTTA et ai, proposta pela CIF propiciará uma linguagem compartilhada, que ultra
2007), o que converge com o modelo de funcionalidade proposto pela passa os limites profissionais. A estrutura conceituai da classificação é
OMS, constituindo-se a CIF uma importante ferramenta na prática holística e inclusiva, além de propiciar oportunidades para os profissio
colaborativa interprofissional, oferecendo oportunidades para os profis nais de saúde aprenderem com e sobre outra ótica profissional, que não
sionais aprenderem com e sobre a atuação de um profissional de outra a sua(GAMARA,2014).
área(GAMARA,2014). Embora lançada em 2001, a CIF é uma classificação em pleno
É sabido que os profissionais da área específica de reabilitação desenvolvimento e apenas será aprimorada à medida que for utiliza
(exemplo: Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Fonoaudiologia) e saú da(BUCHALLA, 2003). Para tanto, sua inclusão como conteúdo nas
de do trabalhador estão mais próximos da classificação internacional matrizes curriculares de graduação e pós-graduação, especialmente dos
de funcionalidade e de sua proposta de linguagem, porém outras cursos de saúde, deve ser discutida e considerada.
áreas como a Enfermagem apresentam aproximação com outras ter
minologias padronizadas, que descrevem diagnósticos, intervenções
e resultados de Enfermagem (TOSIN et ai, 2015; HERDMAN,

260 261
cr V^UE MCCriM ■ CCC I>ÍM ri\MllCMf
o QUE ACONTECE NA PRATICA?

CONSIDERAÇÕES FINAIS Referências


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até o melhor que se sabe, não há pesquisas sobre modelos ou métodos BUCHALLA,C.M.;CAVALHEIRO,T. R:A Classificação Internacional de Funcionalidade,Incapaci
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riências documentadas de ensino da CIF, na pós-graduação aradêmiVa^ BULECHEK, G.M.; BUTCHER H.K.; DOCHTERMAN J.M. Classificação das Intervenções de
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nos reservamos a possibilidade de apresentar algumas sugestões nesse
GAMARA,A. M. C. S. Oficina de educação incerprofissional para a residência multiprofissional. Ca
campo que não são hierárquicas, exceto a primeira: 1) iniciar a aborda dernos de educação,saúde e fisioterapia, v. l,n. 1, p. 17-34, 2014.
gem na disciplina com ênfase no modelo de funcionalidade proposto CIF Brasil, [acesso em 2017 Mai 20]. Disponível em: URL: http://www.cfa.org.br/servicos/news/cfa-
pela CIF e estrutura da classificação; 2) discutir as possibilidades de news/dica-de-leirura

complementar a avaliação em saúde, nas diferentes áreas do saber, acres CIEZA et aL ICF linking rules: an update based on lessons learned. Joumal of Rehabilllation Medi
centando domínios previstos na classificação; 3)implementar avaliações cine, V. 37, n. 4. p. 212-218, 2005.
clínicas com perspectivas expandidas pela incorporação de domínios da CIEZA, A. et ai lhe International Classification ofFunctioning, Disability, and Health could be used
CIF;4) propiciar a realização de linking&nx.ie.instrumentos de avaliação to measure functioning. Joumal of Clinicai Epidemiology, v. 62, n. 9, p. 899-911, 2009.

consagrados nas diferentes profissões e a CIF, de modo a evidenciar os COFFITO Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional. Resolução n.® 370, de 6 de no
vembro de 2009 [acesso em 2017 Mai 20]. Disponível cm: URL: http://www.crefito8.org.br/site/Iegis-
domínios contemplados e analisar a necessidade de acrescentar outros lacao/cofíito/Resolucao%20COFFlTO%20370_09.html
instrumentos, para ampliar o escopo da compreensão da condição de ESCORPIZO, R. et ai HarmonizingWHCs International Classification of Diseases (ICD) and
saúde da pessoa; 5) aproximar os modelos conceituais e referenciais te International Classification ofFunctioning,Disabili^ and Health (ICF): importance and methods
óricos das diferentes profissões com a CIF, buscando evidenciar áreas to link diseasc and functioning. BMC Public Health, v. 13, n. 1, p. 742, 2013.
de convergência ou complementaridade; 6) realizar ensaios de aproxi FARIAS, N.; BUCHALLA,C. M.A classificação internacional de funcionalidade,incapacidade e saúde
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TOSIN, M. H.S. et al. Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem - CIPE®: aplicação à
de tempo de tratamento em Fonoaudiologia" que apresenta a CIF
realidade brasileira. Revista Brasileira de Enfermagem, v. 68, n. 4, p. 730-731, 2015- como componente para sua estruturação ao discutir e recomendar a

264 265
necessidade da definição de tempo na atenção fonoaudiológica em Estudos nacionais utilizando a CIF^ e a CIF-CJ^ no escopo da
diferentes condições de saúde^. Fonoaudiologia têm aumentado nos últimos anos, contudo a produ
Outra recomendação que é fundamental levar em conta ao discutir ção científica em termos quantitativos ainda está aquém da realizada
a CIF no âmbito.da Fonoaudiologia é a Resolução n.° 452 do Conselho por outros profissionais de saúde, sobretudo fisioterapeuta e terapeuta
Nacional de Saúde (CNS), de 2012, que determinou o uso da CIF no ocupacional. Ao observar apenas parte das pesquisas publicadas,®"'^ fica
Sistema Único de Saúde(SUS)incluindo a Saúde Suplementar^. A reso evidente a diversidade de possibilidades para o uso da classificação na
lução reafirma que é imperativo o desenvolvimento de políticas públicas assistência e na pesquisa em Fonoaudiologia.
em saúde que considerem a funcionalidade e a incapacidade humana
nos diferentes ciclos de vida para pessoas com ou sem deficiência. A Contexto
resolução aponta ainda que a CIF deve ser usada como ferramenta esta
tística, clínica, de planejamento, pedagógica e geradora de informações Assim, o presente relato de experiência apresenta os resultados
padronizadas em saúde. parciais de duas pesquisas realizadas segundo as recomendações para
uso da CIF e da CIF-CJ em Fonoaudiologia e no âmbito do Sistema
A incorporação do uso da perspectiva do modelo multidimensional
Ünico de Saúde e realizadas no Hospital das Clínicas da Universida
nos diferentes ciclos de vida no âmbito do trabalho do fonoaudiólogo
de Federal de Minas Gerais - HC/UFMG. Trata-se de um hospital
deve considerar a Classificação Internacional de Funcionalidade, Inca
universitário e público, referência no atendimento aos pacientes com
pacidade e Saúde para Crianças e Jovens (CIF-CJ) que teve sua versão
condições de saúde de média e alta complexidade. Neste cenário, bus
em Português publicada em 201Ú.
cando a investigação da aplicabilidade da CIF e CIF-CJ em serviços
A CIF-CJ inclui nas descrições das categorias os aspectos do desen de Fonoaudiologia foram conduzidas duas pesquisas: a primeira refe
volvimento essenciais para o diagnóstico e acompanhamento de crian rente aos aspectos funcionais de adultos e idosos atendidos no setor de
ças e adolescentes com distúrbios da comunicação. Nessa medida, vale audiologia e a segunda direcionada à caracterização de crianças e ado
destacar a inclusão de quatro temas específicos nos ciclos da infância e lescentes vinculados ao ambulatório de avaliação fonoaudiológica.
da adolescência: "A criança no contexto da família", pois a funcionali
Vale esclarecer que a construção das pesquisas foi motivada em
dade da criança depende das interações dela com a família/cuidadores
grande medida pela necessidade de estudar a viabilidade da incorpora
dentro de seu contexto ambiental; "Atrasos no desenvolvimento" que
ção da CIF na prática assistencial. Assim, os estudos foram conduzidos
podem manifestar-se em cada domínio e serem influenciados por fato
de forma independentes e em dois espaços ambulatoriais bem estrutu
res, tais como o ambiente; "Participação", diante da gama de situações
rados e com necessidades de respostas específicas aos usuários do com
de vida que são específicas dos anos do desenvolvimento; e "Ambientes"
plexo hospitalar.
que vão se modificando ao longo dos anos e dos estágios de vida.
Vale destacar que, em 2015, a Classificação Internacional de Funcio
nalidade'^, Incapacidade e Saúde foi reeditada com a incorporação da versão
anterior da CIF-CJ,após recomendação do Grupo de Referência para Fun
cionalidade e Incapacidade e aprovação na Reimião Anual da Rede da Fa
mília de Classificações Internacionais da Organização Mundial da Saúde.

266 267
i^uc I CV.C NM rrtMiieMf

Estudo I: Classificação Internacional de Funcionalidade, A escolha dos qualificadores para a classificação foi realizada se
Incapacidade e Saúde em adultos e idosos usuários de um gundo os dados obtidos nas entrevistas (contextos de uso da audição,
serviço de audiologia'^ queixas auditivas e CCEB), nas respostas aos instrumentos HHIA ou
Foi realizado um estudo observacional descritivo e transversal com HHIE e resultado da avaliação auditiva.
amostra probabilística, com o objetivo de descrever aspectos da funcio Nos resultados do componente de Funções do Corpo,foi observa
nalidade e incapacidade relacionados à audição e aos fatores sociodemo- do que das quatro categorias selecionadas, a maior parte das deficiências
gráficos de 114 usuários de Aparelho de Amplificaçâo Sonora Individu de bl560 — Percepção auditiva e b230 — Funções auditivas foram clas
al (AASI), atendidos em um Serviço de Atenção à Saúde Auditiva, por sificadas como leve ou moderada (Figura 1).
meio da CIF. Fundamentaram a seleção das categorias dos componentes
de Funções do Corpo, Atividades e Participação e Fatores Ambientais
utilizados na pesquisa:
bl560- Percepção auditiva
• Core set da CIF para perda auditiva''^;
•Instrumentos de avaliação da restrição à participação auditiva He-
aring Handicap Inventory for Adults- HHIA^^'"^ e Hearing Han- b230- Funções auditivas
E3 Nenhuma Deficiência

dicap Inventory for the Eiderly- HHIE'^ '17.18 @ Deficiência Ligeira


■ Deficiência Moderada
O estudo foi realizado conforme as seguintes etapas: Q b235-Funções vestibulares ■ Deficiência

a Deficiência Completa
1. pesquisa de campo: entrevista com os participantes para a ob
■ Não especificada
tenção de informações referentes às queixas auditivas e relaciona b240-Sen$açõesassocoadasà
das à audição, aplicação do instrumento Critério de Classificação audição e à função vestibular

Econômica Brasil(CCEB)" para a caracterização sociodemográfica


e para a avaliação da restrição à participação auditiva foram utiliza O 20 40 60 80 100
Freqüência{%)
dos o HHIA/ HHIE;
2. obtenção do resultado da avaliação auditiva (audiometria tonai Figura 1. Distribuição das categorias do domínio de Funções do Corpo
liminar);
3. análise dos instrumentos utilizados na pesquisa de campo para
posterior utilização da CIF; Em relação às Atividades e à Participação, foram contempladas dez
4. uso dos qualificadores para a classificação das 20 categorias sele categorias, das quais foi utilizado o qualificador nenhuma dificuldade para
cionadas. a maioria das classificações de d315 — Comunicar e receber mensagens
não verbais, d330- Falar, d350- Conversação, d750- Relacionamentos
sociais informais e d760 — Relacionamentos familiares (Figura 2).

268
269
d 115- Ouvir el25-Produtos e tecnologias para
a comunicação
d310- Comunicar e receber
mensages orais
d315-Comunicar e receber
e250- Som
mensagens nãoverbais
.^iNenhumfadlitador
d330- Falar S Facilitador leve
u
E3 Nenhuma Dificuldade e310- Família próxima E3 Facilitador moderado
•S d350-Conversação
■ Facilitador considerável
VI

.s DDificuldade Ligeira
o d360-Utilizado de dispositivos e de
■ Dificuldade Moderada ■ Facilitador completo
» técnicas de comunicação
n
8320-Amigos Nenhuma barreira
^ d730-Relacionamentocom ■ Dificuldade Grave
estranhos Barreira leve
■ Dificuldade Completa
d750- Relacionamentos sociais
E Barreira moderada
informais
e355-Profissionais de saúde
■ Barreira grave
d760* Relacionamentos familiares
■ Barreira completa

d920-Recreação e lazer eSSO-Servíços,sistemas e políticas


relacionados com a saúde
20 40 60 80 100

Frequênda{%) Q 10 20 30 40 50 60

Freqüência {%)

Figura 2. Distribuição das categorias do domínio de Atividades e Participação


Figuxa 3. Distribuição das categorias do domínio de Fatores ambientais

Dentre as seis categorias descritas em Fatores ambientais, e250 - o estudo reforça a importância de não considerar que a deficiência
Som, relacionado ao ruído ambiental, foi considerado uma barreira e a incapacidade resultam somente das condições de saúde. Os dados evi
classificada em maior parte como leve e moderada. O qualificador el25 denciaram que, embora a maior parte dos participantes apresentasse defi
— Produtos e tecnologias para a comunicação, relacionado ao uso do ciência na percepção auditiva e nas funções auditivas, essa deficiência não
AASI, foi classificado em maior parte como um facilitador leve e com atuou como um fator limitante no desempenho da maioria das atividades
pleto, respectivamente. Já os qualificadores e320 — Amigos, e-310 — Fa e participações avaliadas. Também se observou que o uso do AASI, as
mília próxima, e355 — Profissionais de saúde e e580-Serviços, sistemas relações familiares, com amigos e profissionais e políticas de saúde foram
e políticas relacionados com a saúde foram para a maioria facilitadores considerados fatores ambientais facilitadores.
completos (Figura 3). O uso da CIF permite averiguar como as influências ambientais e
comportamentos podem repercutir na percepção do estado de saúde.
Deste modo, o conhecimento de fatores associados à perda auditiva é de
suma importância para a compreensão de como o indivíduo lida com as
possíveis dificuldades auditivas. Esse entendimento deve ser considerado
pelos profissionais de saúde durante a criação de estratégias terapêuticas

270 271
e no acompanhamento do sucesso das intervenções. Assim, a CIF é uma com base na própria classificação da Organização Mundial de Saúde
importante fonte de auxílio para a otimização dos resultados na prática para crianças e jovens', em conjunto com o "Guia norteador sobre a
clínica assistencial. Classificação Internacional de Funcionalidade e Incapacidade/CIF em
Fonoaudiologia", emitido em 2013 pelo CFFa^. Dessas, 29 estavam en
Estudo II: O uso da classificação internacional de
tre as Funções do Corpo, 80 eram das Atividades e Participação e 59
funcionalidade, incapacidade e saúde para crianças e pertenciam aos Fatores Ambientais.
jovens (CIF-CJ) na avaliação fonoaudiológica em ambiente
ambulatorial^" Os 180 relatórios selecionados foram lidos, sendo sua análise reali
zada conforme as etapas;
Trata-se de um estudo do tipo observacional descritivo transversal,
que foi realizado com análise retrospectiva de dados secundários e teve 1. identificação de conteúdos que remetessem às categorias pré-
como objetivo caracterizar o desempenho em aspectos fonoaudiológicos selecionadas determinando a presença destas;
de pacientes entre 5 e 16 anos segundo as categorias da CIF-CJ. A coleta 2. aplicação dos qualificadores nas categorias presentes, sendo estas
teve como referência prontuários de pacientes avaliados no período entre determinadas como ".0 - sem alteração" ou ".8 - existe alteração,
2010 a 2014 em um serviço ambulatorial em avaliação fonoaudiológica mas não foi especificada a intensidade".
da rede pública de saúde da cidade de Belo Horizonte. Foram incluídos
prontuários pertencentes a pacientes da referida faixa etária, que reali Como resultado, foi observado que, das 168 categorias elencadas in-
zaram avaliação fonoaudiológica de forma completa cujos relatórios de cialmente, 65 foram identificadas nos relatórios. Em relação às Funções do
anamnese e avaliação estivessem disponibilizados de forma integral nos Corpo, 13 itens foram contemplados, sendo as categorias bl67- funções
prontuários. Foram excluídos aqueles com avaliações incompletas, ou de mentais da hnguagem e b320 — funções da articulação as referidas na maior
pacientes com questões como perda auditiva em qualquer grau, deficits in parte da população com a existência de deficiências (Figiua 4).
telectuais e transtornos globais do desenvolvimento, condições essas que
poderiam influenciar diretamente nos aspectos de funcionalidade e inca Funções do Corpo
pacidade. Foram excluídos, ainda, os prontuários com relatos restritos nas bl40- Funções da atenção
bl44- Funções da memória
descrições dos achados de anamnese e avaliação, impedindo uma análise bl56 - Funções da percepção
padronizada dos resultados. Então, de 1.032 pacientes convocados para D
bl63- Funções cognitivas básicas
bl64 - Funções cognitivas de nível superior
avaliação entre 2010 e 2014, 180 prontuários foram considerados como li
bl67 - Funções mentais da linguagem 125
um "padrão ouro" em uniformidade nas descrições contidas nos relató bl72- Funções de cálculo
rios, sendo estes utilizados como a amostra do estudo. Vale ressaltar que, b230- Funções auditivas
b310- Funções da voz
nas etapas de delineamento, coleta e análise dos dados, ainda não estava b320- Funçõesdaarticuiação
disponível a versão de 2015'' com a incorporação de CIF e CIF-CJ. As b330 Funções da fluência e do ritmo da fala
b440- Funções respiratórias
sim, a versão utilizada foi a CIF-CJ em Português publicada em 201H. bSlO- Funções de ingestão

Para realizar a caracterização dos aspectos fonoaudiológicos, 168 O 20 40 60 80 100 120 140

categorias dos componentes de Funções do Corpo, Atividades e Partici Número absoluto

pação e Fatores Ambientais, em segundo nível, foram pré-selecionadas Figura 4. Freqüência de alterações em categorias das Funções do Corpo

272 273
Para as Atividades e a Participação, foi opção que todas as categorias Já dentre o componente de Fatores Ambientais, foram descritas 18
pré-selecionadas pudessem ser descritas em relação tanto ao qualificador categorias, sendo a e425 - atitudes individuais de conhecidos, pares,
de Desempenho quanto ao de Capacidade. Foi verificada como resulta colegas, vizinhos e membros da comunidade e a e4l0 - atitudes indi
do nos relatórios a descrição de 34 categorias. As referidas como na qual viduais de membros da família próxima/imediata as descritas na maior
existia dificuldade em maior freqüência foram dl45- aprender a escrever parte dos relatórios como Barreiras (Figura 6).
— Capacidade e dl70- escrever — Capacidade (Figura 5).
dllO-Observar-Desempenho 27
Kasjagi 26
dll5-Ouvir-Capaddade 11 Fatores Ambientais
O
dl30-Imitar ■ Capacidade O p1
el25-Produtosetecnotogiasparaacomunicação IMi 7
Q 4
dl31- Aprender por meio de atividades com... O i «
29 el40- Produtos e tecnologias para atividades..
!i
dl37- Adquirirconceitos-Capacidade 37 !^
eElO-Família próxima/Imediata ; O
d 140- Aprendera ler-Capacidade 105

dl45 - Aprender a escrever - Capacidade


e320-Amigos Im 5
■ t
jO
dlSS - Adquirir competências/habilidades-... O e355-Profissionais de saúde ■ 1
2Q2' m 3
dl61- Dirigira atenção - Capacidade
e410- Atitudes individuais de membros da família... I
dl66- Ler - Capacidade
e420'Atitudes individuais de amigos 1
dl70 - Escrever • Capacidade 134
e530- Serviços,sistemas e políticas relacionados.. 1 13 i
dl72- Caicuiar-Capacidade

dl75-Resolverproblemas-Capaddade B 4
eSSO'Serviços,sistemas e políticas relacionados.,i
I m 10 20 40 60
I d210-Reaiizarumaúnícatarefa-Capacidade O
Número absoluto
[, d2S0- Gerenciar o próprio comportamento -... Qiss ii
i
' d310- Comunicarerecebermensagensorais-... a 3
'3 Figura 6. Freqüência de alterações em categorias dos Fatores Ambientais
d325- Comunicare receber mensagens... c
E

d330-Falar-Capacidade B 4

d345-Escrevermensagens-Capacidade
Eaaa is
31
Para as Funções do Corpo, um artigo da literatura internacional
d350-Conversação-Capacidade 12
03 que propôs um checklist para descrever crianças com fissuras lábio-pa-
dSSO-Comer-Capacidade
B 6
O
latinas^'foi o que apresentou maior número de categorias semelhantes
dSSO-Beber-Capacidade
B 4
O
às verificadas neste estudo, cinco no total. Tal fato se deve à necessidade
d640- Realização dastarefasdoméstícas-...
KKjew^ 25
39 de uma abordagem ampla da funcionalidade em ambos os casos, tanto
pjtaaa^ji 27
d720• Interações interpessoais complexas -... o pelo perfil generalista do cenário do estudo II quanto pelas possíveis
d760-Reladonamentosfamiliares-... 15 | alterações correlacionadas que podem estar presentes em pacientes com
B3
d820-Educação escolar-Desempenho 34 fissuras lábio-palatinas.
D
d880 - Envolvimento em jogos ou brincadeiras... D
1 2
Em relação ao componente de Atividades e Participação, mais de
d930-Religiãoeespiritualidade-Desempenho BSS 11

20 40 60 80 100 120 140 160


30 categorias foram descritas no presente estudo. Elevado número de
Número absoluto categorias foi também verificado em outras publicações utilizando a
Figura 5. Freqüência de alterações em categorias de Atividades e Participação

274 275
CIF e a CIF-CJ^'^' Foi verificado ainda que, para os componentes de Ambos os estudos conseguiram identificar as alterações nas cate
Funções do Corpo e Atividades e Participação, categorias relacionadas gorias selecionas, entretanto, para o uso de todos os qualificadores, se
com queixas de linguagem, aprendizagem ou escolares foram descritas gundo o orientado na CIF e CIF-CJ, a pesquisa de campo mostrou-se
com elevada freqüência como alteradas (Figuras 4 e 5). Uma vez que mais favorável. O contato direto com o paciente diminui as chances
tais questões são freqüentes no público que demanda acompanhamento de informações relevantes, que podem não estar descritas nos prontu
fonoaudiologico, a CIF-CJ pode fornecer informações relevantes nesses ários e não sejam utilizadas para a classificação. No caso do estudo II,
aspectos, possibilitando, inclusive, a comparação dos qualificadores em cuja descrição dos aspectos fonoaudiológicos avaliados foi obtida em
situação pré e pós-intervenção. prontuários, a opção se deu por enfocar apenas nos qualificadores que
Já para os Fatores Ambientais, aproximadamente, um terço das definiriam a existência ou não de alterações/barreiras/facilitadores sem
categorias pre-selecionadas foram descritas. Outras pesquisas sele especificar o grau destes, semelhante à proposta de inserção da CIF em
cionaram como relevantes 25 e 20^° categorias dentro deste com sistema público de informação^^.
ponente como as mais relevantes para caracterizar sua população de Também é possível destacar que, na análise do componente de
estudo. O alto número verificado reforça o quanto os fatores con- Fatores Ambientais, no estudo I, a presença da família, descrita pela
textuais podem afetar os aspectos de funcionalidade e incapacidade categoria e310, e dos amigos, categoria e320, foi considerada como fa-
dos indivíduos^ e exercem influência sobre as características dos pa cilitador. Já no estudo II, as categorias e425, referente às atitudes indivi
cientes atendidos. duais de conhecidos, e e4l0, relativa às atitudes de membros da família
Verifica-se, portanto, que O elevado número de categorias dos próxima, foram consideradas como barreira. Tais resultados reafirmam
componentes de Funções do Corpo, Atividades e Participação e Fato que a CIF e a CIF-CJ são instrumentos que permitem a análise das
res Ambientais, observado no estudo II e também na literatura prévia, particularidades do contexto de vida do indivíduo ou de determinado
reflete a diversidade de condições de saúde e características funcionais grupo, independentemente de se tratarem de crianças e adolescentes ou
que podem estar presentes na população entre 5 e 16 anos encaminha adultos e idosos. Reforça-se, com isso, que a caracterização dos aspectos
da para avaliação fonoaudiológica e que podem ser descritas utilizan ambientais é de grande relevância independentemente da faixa etária,
do a CIF-CJ. uma vez que estes podem influenciar diretamente nas questões apresen
tadas por pacientes com alterações fonoaudiológicas.
Considerações Finais Ressalta-se também que o uso das classificações de forma com
pleta é sempre o mais indicado. Contudo, a extensão dos documentos
Na comparação entre os estudos apresentados, um maior número
pode ser considerada como um fator dificultador para o uso sistemá
de categorias foi verificado no estudo II. Tal fato se deve pela maior
tico por fonoaudiólogos na prática clínica. Uma forma de superar tal
gama de possibilidades que o próprio documento da CIF-CJ de 2011
questão pode ser por meio de pré-seleções de categorias, tal como o
apresenta quando comparado à CIF, promovendo uma descrição mais
realizado em ambos os estudos, gerando listas mais direcionadas às
fidedigna dos aspectos referentes ao processo de desenvolvimento in
demandas clínicas específicas dos serviços, tais como: audição, motri-
fantil. Outra razão para tal resultado se deve ao ambulatório, cenário
cidade orofacial, voz, linguagem, disfagia etc.
do segundo estudo, ter um perfil generalista, recebendo pacientes com
diversos tipos de queixas fonoaudiológicas. Enfim, por meio dos dados verificados nos estudos I e II, foi possível

276 277
descrever um relato real da aplicabilidade da CIF e da CIF-CJ na prática Leitura recomendada
clínica assistência! e ambulatória! para caracterização de pacientes com
1. ASHA: American Speech-Language-Hearing Association [Internet], Scope of practice in speech-
questões fonoaudiológicas. Os resultados dos estudos mostraram que a language pathology. Rockville, 2016'.[citado 20 Jul 2016]; Disponível em: http://vvww.asha.org/policy/
criação de listas para o uso da CIF e CIF-CJ é viável. Fazendo uso de am SP2016-00343/

bas as classificações, múltiplos aspectos puderam ser estudados em uma 2. Conselho Federal de Fonoaudiologia [Internet]. Guia norteador sobre a Classificação Internacional
perspectiva biopsicossocial e da fimcionalidade no contexto assistência!da de Funcionalidade e Incapacidade/CIF em Fonoaudiologia. Brasília, 2013.[citado 20 jul. 2016]; Dis
ponível em: http://www.fonoaudiologia.org.br/publicacoes/GUIA%20PRATICO%20CIF.pdf
fonoaudiologia em um hospital de ensino.
3. Conselho Federal de Fonoaudiologia [Internet]. Balizador de tempo de tratamento em Fonoaudiolo
gia. Brasília, 2013. [citado 20 jul. 2016]; Disponível em:http;//www.fonoaudiologia.org.br/publicaco-
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OBSERVAÇÃO IMPORTANTE AO LEITOR: A CIF-CJ FOI 4. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução n.® 452, de 10 de maio de 2012.
EXTINTA EM 2015 PORQUE SUAS CATEGORIAS FORAM Utilização da Classificação Internacional de funcionalidade, incapacidade e Saúde - CIF no Sistema
INCORPORADAS À VERSÃO ATUALIZADA DA CIF, NO Único de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.

MESMO ANO. 5. Organização Mundial de Saúde (Brasil). CIF-CJ: Classificação Internacional de Funcionalidade, In
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2015:39(2):470-7. ferência de renda às pessoas com deficiência na extrema pobreza. Além
disso, no mesmo mês, foi publicado um Decreto Presidencial para um
Grupo Interministerial analisar todas as formas diferenciadas de avaliar
a deficiência para conceder benefícios no âmbito do governo federal,
com vistas à elaboração de um modelo único, sendo orientado pela CIF.
Essas duas frentes instauradas em 2007 orientariam todo o debate do
uso da CIF em benefícios, isenções e serviços do âmbito federal para as
pessoas com deficiência na próxima década. A materialização legislativa
desse feito foi o artigo 2° assinalado na Lei Brasileira de Inclusão (Esta
tuto da Pessoa com Deficiência), Lei n.° 13.146, de 2015, que estabele
ceu os princípios da CIF para orientar, a partir de janeiro de 2018, todas
as formas de avaliação da deficiência, quando fossem necessárias, para o
reconhecimento de direitos a essa população.
Esse movimento inovador e desafiante para as políticas públicas
se deu em função, principalmente da Convenção sobre os Direi
tos das Pessoas com Deficiência, aprovada em Assembléia Geral das

280
281
Nações Unidas em 2006. A Convenção, dentre várias novidades e públicas ao estabelecer prazo para que elas se adaptem de acordo com o
mudanças paradigmáticas para a proteção dos direitos das pessoas estabelecido nesses dois documentos internacionais.
com deficiência, trouxe uma nova forma de compreender e descrever
O objetivo desse relato de experiência é apresentar e discutir
a experiência da deficiência. Para superar a hegemonia biomédica de
uma década de debates e tomadas de decisão na gestão pública-fe
discurso de autoridade sobre a deficiência prevalente por séculos, a
deral, bem como analisar os principais movimentos no âmbito do
concepção de deficiência da Convenção busca compreendê-la como
governo federal desde 2007, para se utilizar da CIF em 28 políti
um fenômeno multidimensional de causalidade social, estruturada
cas públicas para as pessoas com deficiência, dentre elas, benefícios,
por valores culturais, políticos e de saúde. A deficiência teria causa-
isenções federais, gratuidades, serviços e equipamentos públicos que
lidades sociais porque sociedades tratam as pessoas de forma distin
buscam promover a equiparação de oportunidades às pessoas com
ta por experimentarem diferenciados impedimentos corporais, tais
deficiência. Durante dez anos, houve quatro movimentos principais
como alterações físicas, mentais, sensoriais e intelectuais, isto é, a
em torno do uso da CIF para orientar todas as políticas públicas e
deficiência deixa de ser entendida como um atributo individual liga
sociais do governo federal: 1. as duas ações já mencionadas do ano
do às concepções de anormalidade dos corpos, para se transformar
de 2007; 2. o uso da CIF na avaliação dos requerentes com defici
em uma questão pública, originada por contextos poucos sensíveis à
ência da aposentadoria da Lei Complementar de 2013; 3. os debates
diversidade corporal, que levam as pessoas com deficiência a experi
entre os Poderes Legislativo e Executivo que deram origem à LBI em
mentarem restrição de participação social na sociedade.
2015 e 4. a publicação do Decreto Presidencial, em abril de 2016,
A Convenção transformou-se em um dos documentos internacio que criou o Comitê de governança da Avaliação Unificada da Defi
nais mais importantes para assegurar os direitos humanos das pessoas ciência. Houve avanços, persistem lacunas e ainda se apresenta um
com deficiência. As concepções trazidas na Convenção materializaram conjunto de desafios complexos a serem enfrentados. As concepções
um debate internacional de mais de três décadas, em que deslocou o de e abordagens da CIF possuem estreito diálogo com os princípios e
bate público sobre as demandas por justiça e equiparação de oportuni as diretrizes da Convenção, em um marco de promoção dos direitos
dades às pessoas com deficiência. Durante o final dos anos 1970, movi humanos das pessoas com deficiência. Essa premissa deve ser o pon
mentos políticos e acadêmicos começaram a reivindicar novas posturas to de partida para enfrentar os persistentes desafios envolvidos na
e abordagens sobre o corpo deficiente, o que mudou definitivamente a elaboração, gestão e operacionalização de políticas públicas para as
compreensão do que significava uma pessoa viver com deficiência. Tais pessoas com deficiência no país.
reivindicações deram origem a um movimento denominado modelo so
cial da deficiência. Foram as idéias desse modelo social que estiveram As experiências da CIF no BPC e na Previdência para pessoas
por trás da elaboração e publicação da CIF, em 2001, e também inspi com deficiência
raram e originaram as novas concepções da Convenção,de 2006. Como Em 2001,a Organização Mundial de Saúde publicou a CIF. Depois
no Brasil a Convenção foi incorporada ao marco jurídico brasileiro com de duas décadas de debate internacional e amadurecimentos do modelo
status de emenda constitucional, a força normativa dela é capaz de al social da deficiência, enfim um catálogo internacional das famílias de
terar profundamente as compreensões internas sobre a deficiência no classificação da OMS passou a considerá-lo. Assim, a deficiência pela
marco jurídico, político e social. Dessa forma, a LBI, sancionada em
CIF manifesta-se nas dimensões das Estruturas e Funções do Corpo,
2015, vinculou os avanços da CIF e Convenção a todas as políticas mas também dos Fatores .Ambientais, e, principalmente, no desempe-

282
283
nho das Atividades e na restrição da Participação. Na CIF, não há pre Bolsa Família, o BPC é visto como estruturante da política de assistência
ocupações etiológicas para se chegar à caracterização das deficiências, social e responsável por grandes avanços na redução da pobreza e combate
pois a mesma visa avaliar contextos universais de estados e condições à desigualdade no país.
de saúde. A CIF caracteriza as deficiências não pela análise das causas
O caso do BPC é importante para analisar os desafios de implan
delas, mas pela análise das manifestações verificáveis em nove domínios
tar as diretrizes do modelo social na perspectiva da Convenção e da
principais da vida relacionados à saúde (1. aprendizado e aplicação dos
LBI. Antes mesmo de adotar o conceito da Convenção, em 2011, a
conhecimentos; 2. tarefas e demandas gerais; 3. comunicação; 4. mobi
legislação do benefício assistencial já utilizava as diretrizes da CIF, des
lidade; 5. cuidado pessoal; 6. vida doméstica; 7. interações e relaciona
de 2007, para avaliar as pessoas com deficiência requerentes da prote
mentos interpessoais; 8. principais áreas da vida; e 9. vida comunitária,
ção social. Em 2007, após mais de dez anos utilizando-se de diversos
social e cívica) e o modo como as conseqüências observáveis desses do
modelos distintos de avaliar as pessoas com deficiência, o MDS — ór
mínios impactam no desempenho de determinadas atividades, levando
gão responsável pela gestão do benefício assistencial — decidiu adotar
à restrição na participação social.
a CIF no momento pericial para a concessão do benefício, a fim de
Dessa forma, a deficiência passa a ser caracterizada como restrição incorporar a perspectiva biopsicossocial, substituindo a hegemonia
de participação social porque o princípio de funcionalidade da CIF ava biomédica no processo de avaliação das deficiências para a concessão
lia as situações relacionadas à saúde em um continuum, isto é, todos os do benefício não contributivo. Desse modo, quando houve a ratifica
estados e as condições de saúde globais podem ser avaliados pela CIF: ção da Convenção da ONU com status constitucional no Brasil, em
a caracterização universal vai desde uma situação de interação positiva 2008, o funcionamento do BPC já estava mais sensível à incorporação
(funcionalidade) entre Estruturas e Funções do Corpo com Fatores Am dos princípios da Convenção e do modelo social da deficiência. Desse
bientais- ou seja, que não levam à restrição na participação social- até modo, aperfeiçoar a caracterização do público-alvo de uma política é
situações de interação negativa (como incapacidades, doenças crônicas uma necessidade constante em qualquer política pública e, no caso do
debilitantes ou deficiências), cuja relação entre Estruturas e Funções do BPC, não é diferente. O processo de avaliação das deficiências para a
Corpo e Fatores Ambientais resulta no não desempenho de atividades e concessão do benefício assistencial já passou por diversas melhorias
a conseqüente restrição na participação social. Desse modo, os cinco fa desde 2007 e, em 2015, chegou a sua terceira versão dos instrumen
tores ambientais (1. Produtos e Tecnologias; 2. Apoios e Relacionamen tos de avaliação, o que denota o quanto a implantação dos princípios
tos; 3. Ambiente natural; 4. Atitudes; e 5. Serviços, Sistemas e Políticas) biopsicossociais são desafiantes e os ajustes contínuos necessários.
passam a ser decisivos para influenciar a caracterização da deficiência na
Outra política que passou a adotar o conceito de pessoa com de
perspectiva da funcionalidade como disposta na CIF.
ficiência de acordo com o que estabelece a Convenção e, portanto, em
Uma das primeiras políticas que adotou na íntegra o conceito de conformidade com o paradigma do modelo social, foi a de Previdência
pessoa com deficiência da Convenção de 2006 foi a política de assistên Social. Isso se deu por meio da avaliação da aposentadoria por idade ou
cia social, por meio do BPC. Criado em 1993, o BPC é um dos maiores tempo de contribuição das pessoas com deficiência em razão da publica
programas de transferência de renda do Brasil e é responsável pela garan ção da Lei Complementar n.° 142, de 2013. A LC n.° 142, de 2013 teve
tia de um salário mínimo mensal a mais de 3,1 milhões de pessoas idosas o objetivo de oferecer tratamento diferenciado às pessoas com deficiência
com 65 anos ou mais e pessoas com deficiência que não tenham meios de no momento da requisição da aposentadoria, ao estabelecer que, se as do
prover sua sobrevivência, nem de tê-la provida pela família. No Programa Regime Geral de Previdência Social forem consideradas com deficiência

284
285
leve, moderada ou grave, elas se aposentarão, respectivamente, dois, seis diretrizes e os conceitos da CIF. Para os assistentes sociais, o esforço está em
ou dez anos mais cedo, quando comparado às pessoas sem deficiência. utilizar-se dos instrumentos baseados na CIF como intermediações técnico-
De acordo com o que estabelece o artigo 5° da Convenção, com operativas para se alcançar a relação entre questão social e fimcionalidade,
"as medidas específicas que forem necessárias para acelerar ou alcançar para a devida caracterização da deficiência.
a efetiva igualdade das pessoas com deficiência não serão consideradas Para a avaliação dos requerentes do BPC,foram elaborados instru
discriminatórias", a LC n.° 142, de 2013 buscou aperfeiçoar a política mentos para a perícia médica e para os assistentes sociais que deveriam
previdenciária, por meio do princípio da equidade, voltada para as pesso materializar tais premissas. Após a formação de Grupos de Trabalho
as com deficiência. Além disso, passou a incorporar as diretrizes tanto da para elaborar o processo de avaliação, a perícia médica passou a ava
Convenção quanto da CIF ao processo de avaliação dos requerentes da liar os comprometimentos que existem nas Estruturas e Funções do
proteção previdenciária. Como estabelece a Portaria Conjunta n.° 01, de Corpo, além da análise das restrições enfrentadas pelos requerentes do
2014, a avaliação da deficiência para os requerentes da aposentadoria da BPC no desempenho de suas Atividades e Participação na sociedade.
LC n.° 142 é realizada pela perícia médica e pelo serviço social do INSS, Por sua vez, os assistentes sociais avaliariam os Fatores Ambientais e
a fim de caracterizar a deficiência e os impedimentos de longo prazo, também itens específicos sobre as restrições nas Atividades e Participa
além de estabelecer a gradação das deficiências em leve, moderada e grave, ção. No caso da aposentadoria das pessoas com deficiência, a avaliação
como prevê a lei. Assim como no caso do BPC, na LC n.° 142, busca-se é realizada com base no índice de Funcionalidade Brasileiro (IFBr) e
garantir a interdisciplinaridade como uma diretriz a ser considerada no ambos os profissionais avaliam as mesmas 41 Atividades e Participa
processo de avaliação das deficiências. ção dispostas no instrumento.
O decreto publicado em novembro de 2014, garantindo o início Ao somar os comprometimentos nas Estruturas e Funções do Cor
das avaliações das pessoas com deficiências requerentes da aposentado po às barreiras enfrentadas nos Fatores Ambientais, às restrições no de
ria baseada na Convenção e CIF, especificou que, pelo período de dois sempenho de Atividades e na Participação, o processo de avaliação bus
anos, o processo de avaliação das pessoas com deficiência passaria por ca recuperar a categoria funcionalidade que é central na compreensão
acompanhamentos e aperfeiçoamentos, com o objetivo de aprimorar, da deficiência na perspectiva da CIF. Isto reforça que a deficiência não
sobretudo, o instrumento utilizado no processo de avaliação. O pro pode ser descrita como equivalente apenas ao comprometimento bioló
cesso de aprimoramento constante do instrumento de avaliação diz res gico, como é na perspectiva única do saber biomédico,ou seja, do corpo
peito,sobretudo, às formas de gradação das deficiências, mas também às deficiente como corpo anormal. A categoria de funcionalidade permite
melhorias necessárias para promover a interdisciplinaridade no processo contextualizar os impedimentos corporais (lesões e/ ou alterações nas
de avaliação, o que pode fortalecer em grande medida os princípios do funções e estruturas corporais) nos ambientes em que as pessoas vivem
modelo social dispostos tanto na CIF quanto na Convenção. para avaliar o grau de restrição de participação social em função das
Por sua vez, a avaliação da deficiência nas políticas de Assistência Social barreiras enfrentadas por elas. Desse modo, a interdisciplinaridade tem
e Previdência exige um esforço teórico-metodológico importante dos pro melhores condições para executar avaliações que descrevam a deficiência
fissionais avaliadores. No caso dos médicos peritos é o esforço de alcançar a como ausência da funcionalidade.
relação entre o processo de saúde-deficiência e as manifestações verificáveis A experiência acumulada nos sistemas de avaliação da deficiência
na dinâmica da vida do segiuado ou do solicitante do BPC, utilizando as para o BPC e para a aposentadoria da LC n.° l42 é imprescindível para

286 287
os desafios de utilizar a CIF para todas as políticas públicas brasileiras que já o utiliza. Mas, para as demais políticas públicas, a validação do
para dar cumprimento, a partir de 2018, ao que estabelece o artigo 2° IFBr ocorrerá ao longo dos anos de 2016 a 2018. Como todo instru
da LBI. O processo de caracterização da deficiência para a concessão do mento de avaliação precisa de aperfeiçoamentos constantes, um dos
BPC possui grandes avanços no que diz respeito à avaliação das barreiras principais pontos a ser objeto de apreciação para melhoria do IFBr diz
enfrentadas por uma pessoa com deficiência. Por outro lado, o sistema de respeito exatamente a como as barreiras e os fatores ambientais devem
avaliação das deficiências para a LC n.° 142 possui uma estrutura arrojada ser avaliados durante a aplicação do instrumento.
de caracterização da funcionalidade, tendo como centralidade a avaliação
do desempenho de atividades e análises sobre a restrição na participação A LBI e o Modelo de Avaliação Unificado da Deficiência
social. E da soma dessas duas experiências que o processo de avaliação Com a sanção da LBI e o disposto no artigo 2°, o uso da CIF nas po
das deficiências para dar cumprimento ao disposto na LBI pode tirar ins líticas públicas brasileiras ganhou novo impulso. As experiências do BPC,
pirações e aprendizados para as demais políticas públicas no país. da LC n.° 142, de 2013, e a publicação do IFBr tendem a estabelecer um
caminho mais seguro para o uso de forma padronizada e com segurança
O índice de Funcionalidade Brasileiro -IFBr
técnica da CIF no processo de reconhecimento de direitos das pessoas
O IFBr foi resultado de um trabalho iniciado em 2007 no âmbito do com deficiência. No entanto, os desafios são grandes. Atualmente,26 po
governo federal. Desde 2007, o governo federal brasileiro tem ações para líticas públicas do governo federal se utilizam apenas de laudos médicos
criação de novas formas de avaliar a deficiência em uma perspectiva que para caracterização da deficiência para reconhecer direitos a esse públi
considera os princípios do modelo social. Por meio da publicação do De co. A transição de um modelo exclusivamente biomédico para o modelo
creto Presidencial, de 26 de setembro de 2007,foi instituído um Grupo de biopsicossocial e multiprofissional é tanto necessária quanto complexa.
Trabalho Interministerial com o objedvo de avaliar o modelo de classifica
Em janeiro de 2016, entrou em vigor a LBI, Lei n.° 13.146, tam
ção e valoração das deficiências utilizado no Brasil e definir a elaboração e
bém conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência. Especifica
a adoção de um modelo único para todo o país. Após os trabalhos do GT,
mente no artigo 2°, a LBI traz novas formas de avaliação da deficiência
foi publicado em 2013 o índice de Funcionalidade Brasileiro — IFBr, com
e estabelece que o Poder Público criará novos instrumentos de avalia
o intuito de ser utürzado em todas as políticas públicas brasileiras voltadas
ção da deficiência, de acordo com novos critérios da Convenção sobre
para as pessoas com deficiência. O IFBr é composto por 4l Atividades e
os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU e da CIF da OMS.
Participação de acordo com a CIF, além de contar com uma métrica para
Os princípios estabelecidos no artigo 2° foram resultado de um amplo
pontuação das Atividades de acordo com a Medida de Independência Fun
debate entre o Poder Legislativo, Executivo Federal e sociedade civil,
cional - MIE A MIF gradua a realização das atividades a partir de uma
especificamente pessoas com deficiência, a respeito de como a nova le
avaliação da situação de dependência da pessoa para realizá-las.
gislação deveria abordar a avaliação da deficiência de acordo com o novo
O IFBr e utilizado desde 2014 para aplicação da aposentadoria às • paradigma social, bem como estabelecer diretrizes para instrumentos
pessoas com deficiência. Para dar aplicação ao estabelecido no artigo 2° de avaliação. Ao final, a expectativa era de que o IFBr, já publicado em
da LBI, o governo brasileiro passará a utilizar o IFBr para todas as suas 2013 por iniciativa do governo federal e utilizado a partir de 2014 na
políticas publicas que materializam direitos as pessoas com deficiência, legislação previdenciária, pudesse ser o instrumento a ser aperfeiçoado
a partir de 2018. O IFBr ainda não teve finalizada a fase de validação para todas as políticas quando precisassem de avaliação e caracterização
cientifica. Esse trabalho esta mais avançado na política previdenciária. da deficiência no processo de reconhecimento de direitos.

288
289
o governo federal possui 28 políticas públicas voltadas para as pes Em 2013, foi publicado, após consultoria contratada por esta Se
soas com deficiência, são elas: cotas no ensino superior e técnico, co cretaria Nacional, o índice de Funcionalidade Brasileiro (IFBr), um ins
tas no serviço público, cotas no mercado de trabalho, isenções federais trumento de avaliação da deficiência de acordo com CIF a ser utilizado
(IPI, lOF, isenção de imposto de renda e restituição prioritária do IR), pelas diversas políticas brasileiras. Naquele mesmo ano, a política de
passe-livre interestadual, habitação acessível, meia-entrada, vagas em previdência passou a se utilizar do IFBr para avaliação da deficiência
estacionamentos, aposentadoria da Lei Complementar n.° 142/2013, dos requerentes da aposentadoria da LC n.° 142/2013 do RGPS. Com
pensionista com deficiência, pensão por talidomida. Benefício de Pres a entrada em vigência da LBI, o objetivo é se utilizar do IFBr para todas
tação Continuada, auxílio-inclusão. Residências Inclusivas, Centros- as demais políticas públicas voltadas para as pessoas com deficiência.
dia. Serviço de Reabilitação Profissional, Serviço de Reabilitação em Está estabelecido no artigo 2° da LBI que a criação de novos instru
Saúde, Educação Inclusiva/Atenção Psicopedagógica, benefícios do ser mentos de avaliação da deficiência deve ocorrer até janeiro de 2018.
vidor com deficiência (redução da jornada, redução da jornada para Para cumprir este objetivo, a Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa
acompanhar dependentes, avaliação funcional para investidora de car com Deficiência articulou a publicação do Decreto Presidencial sem
go, viagens com acompanhantes, aposentadoria antecipada e pensionis número, de 27 de abril de 2016, que criou o Comitê de Avaliação Uni
ta com deficiência do servidor público) e saque do FGTS para compra ficada da Deficiência. Este Comitê Interministerial tem o objetivo de
de órteses e próteses. São benefícios, serviços, gratuidades, programas, realizar a gestão e propor as diretrizes de construção do Modelo Ünico
equipamentos públicos e isenções das políticas da assistência social, pre de aWiação da deficiência para dar cumprimento à LBI. O Comitê tem
vidência, saúde, educação, trabalho, transporte, cultura, isenções de im representação de todos os órgãos da Administração Pública Federal que
postos federais, dentre outros, criados nos últimos 30 anos no país. têm,em suas atribuições, políticas para as pessoas com deficiência.
Atualmente, além de se basear quase que exclusivamente no modelo O Comitê fora instalado em novembro de 2016, já realizou cinco
médico para caraaerizar a deficiência (das 28 políticas, apenas duas se uti reuniões e possui reuniões mensais, sendo coordenadas pela Secretaria
lizam da CIF em avaliações multiprofissionais), cada poHtíca possui uma Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Além do trabalho do
forma de avaliar a deficiência, o que gera atrasos e itinerários repetidos das Comitê, a Secretaria Nacional contratou a Universidade de Brasília, por
pessoas com deficiência a equipamentos públicos para terem sua deficiência meio de uma carta-acordo, em conjunto com a Organização dos Esta
reconhecida para ter acesso a seus direitos. O modelo amai provoca desgas dos Ibero-Americanos, para realizar a validação técnico-científica do IFBr
tes as pessoas com deficiência pelas repetidas idas a órgãos ou setores dife para todas as políticas públicas federais. O IFBr possui validação técnico-
renciados para terem seus direitos reconhecidos, o que impacta financeiro científica apenas para a política de previdência social e é preciso ter a vali
e operacionalmente também em todas as políticas pelo grande volume de dação para todas as demais políticas que se utilizarão do índice.
requerimentos e avaliações. Desde 2007, o Brasil tem iniciativas para criar
Ainda este ano, o IFBr terá início a seu processo de validação
um modelo unificado de avaliação da deficiência. O Modelo Único é uma
técnico-científica para cada uma das 27 políticas que passarão a uti
proposta do governo federal capitaneada pela Secretaria Nacional dos Di
reitos da Pessoa com Deficiência do Ministério dos Direitos Humanos para lizá-lo a partir de 2018. A experiência do IFBr na política de Previ
realizar, de forma unificada e padronizada, as avaliações da deficiência para dência Social servirá de ponto de partida, no entanto cada setor do
concessão de benefícios, serviços e isenções às pessoas com deficiência, em governo federal precisa validar o IFBr de acordo com os objetivos
uma avaliação multiprofissional, biopsicossocial e interdisciplinar. específicos de cada uma das políticas para as pessoas com deficiência.
Após o IFBr validado, o passo adiante será elaborar e implementar
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f 'i

o Modelo Unificado de Avaliação da Deficiência que congregue em


um único fluxo todos os processos de requerimento e reconhecimen Conheça também da
to de direitos das 28 políticas publicas do governo federal para as
pessoas com deficiência. WAK Editora
Considerações Finais
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e a EM BUSCA DA TRANSFORMAÇÃO - a Filosofia
pode mudar sua vida
Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde ■Em Buscada
inovaram sobremaneira no modo de compreender a deficiência. Essa TRflnSFORÍTlfiÇflO
Waldlr Pedro
mudança foi resultado de reivindicações das próprias pessoas com de ISBN; 978-85-88081-82-6
ficiência que alegavam ser insuficiente o modelo médico para caracte
rizar a deficiência para fins, por exemplo, de.materialização de políti
cas publicas. Levar a serio o conceito de deficiência da Convenção e a
perspectiva biopsicossocial de funcionalidade da CIF é levar a sério a
compreensão da deficiência no arcabouço dos direitos humanos. Du
rante muito tempo, o modo como a sociedade buscava coletivamente
responder as necessidades das pessoas com deficiência não se dava pela AUTOGESTÃO - Desenvolvendo talentos para
gerir escolas, empresas
via da promoção dos direitos, mas pela lógica da caridade e da filantro
Desenvolvendo tolcntos para gerir
pia. E recente o movimento em direção à promoção dos direitos como Dirceu Moreira Escolas. Empresas a Instituições

uma prerrogativa de todos os governos e as sociedades na busca da li ISBN: 978-85-7854-215-3


berdade as pessoas com deficiência e promoção da igualdade entre esse
publico e as pessoas sem deficiência. No caso brasileiro, essa mudança
de atenção as necessidades das pessoas com deficiência data do final dos
anos 1980. Desse modo, o uso do IFBr como uma forma padronizada
para avaliar a deficiência de acordo com a CIF, principalmente em um
modelo unificado de operacionalização e gestão das 28 políticas, trará
enormes benefícios as pessoas com deficiência, o que pode contribuir JOGOS PARA GESTÃO DE PESSOAS - Maratona
para a desafiante tarefa de promoção da autonomia dessas pessoas. JOGOS PARA para o desenvolvimento organizacional
GESTÃO DE PESSOAS
Beatriz Acampora e
João Oiiveira

ISBN; 978-85-7854-304-4

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