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AULA 1

CULTURA RELIGIOSA

Prof. Joachim Andrade


CONVERSA INICIAL
Olá! Seja bem-vindo!

Antes de começar os seus estudos, assista ao vídeo a seguir, conheça o


professor e veja os temas que serão abordados nesta disciplina.

Introdução
A disciplina “Cultura Religiosa” apresenta o conteúdo das diversas
tradições religiosas a partir de um olhar cauteloso e crítico, incentivando
reflexões que possam ajudar na compreensão da estruturação das religiões.

De modo geral, esse ramo do conhecimento tem o objetivo de abordar um


panorama amplo das tradições religiosas, iniciando com suas origens nos
tempos antigos até a vivência de seus conteúdos nos tempos contemporâneos.

Para sobreviver nesse tempo cronológico tão extenso que, em alguns


casos, se estende em torno de três mil anos, alguns mecanismos como ritos,
festas e celebrações são utilizados. Portanto, a disciplina contempla esses
mecanismos nas diferentes tradições, denominando-os de cultura religiosa.

Nesta aula, apresentamos a diversidade geográfica como fator-chave


para a compreensão desse fenômeno, as diversas regiões geográficas e sua
influência no surgimento das tradições religiosas.

Problematização
Percebe-se que a diversidade religiosa não é algo novo no Brasil. Existem
pessoas de tradições diferentes e, atualmente na sala de aula, observamos
alunos provenientes de uma tradição específica mantendo alguns hábitos,
costumes e práticas de sua religião. Isso, muitas vezes, pode criar certo
constrangimento entre os alunos.

Como o professor deve agir quando, na sala de aula, se depara com


alunos que tratam de forma preconceituosa a religião de um colega?

E como a geografia, a condição climática e as diferentes paisagens da


natureza podem influenciar uma religião?

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Fonte: <http://www.antropofocus.com.br/blog/jairo/tag/muculmana/>

Fonte: <http://saudenegra.blogspot.com.br/2010_01_01_archive.html>

Fonte: <http://harekrishnacaruaru.webnode.com.br/o-que-e-o-movimento-
hare-krishna/>

TEMA 1 - A GEOGRAFIA COMO PONTO DE PARTIDA PARA ENTENDER O


FENÔMENO RELIGIOSO
A configuração geográfica, que é um dos pontos de partida utilizados para
compreender o fenômeno religioso, torna-se necessária para que encontremos
os fundamentos do desenvolvimento do conteúdo religioso.
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Cada região geográfica se configura por um modo próprio de se
organizar, conforme interesse e necessidade de um determinado povo. A
diversidade religiosa é o fator-chave para conhecer as suas diferentes tradições.

Fonte: <http://prlinaldojunior.blogspot.com.br/2010/09/o-deserto-tem-
provisao-de-deus.html>

A natureza se apresenta de uma forma variada. Portanto, podemos


perceber que o processo relacional do ser humano com ela também é variado.

A tradição Tamil, uma das mais antigas da Índia, contempla esse processo das
relações humanas com o meio ambiente, que poderá ser o ponto de partida para
nossa abordagem. De acordo com essa tradição, toda a Terra encontrava-se
dividida em cinco regiões: montanha, floresta, campos férteis, costa e deserto
árido. Cada tipo de terreno sustentava fauna e flora características, assim como
modos de vida e de sobrevivência próprios.

Essas regiões condicionavam os modos como as pessoas viviam e as


emoções que expressavam. Partindo dessas contingências, cada região elabora
um universo cultural que favorece um gênero especial de relação amorosa, um
estilo musical particular, e até mesmo os aspectos da divindade. Por exemplo:
as montanhas promovem a união entre os amantes; as regiões florestais
encorajam a vida em comunidade; os campos férteis fornecem, ao mesmo
tempo, o contexto para a infidelidade e para o enfado; a região costeira evoca a
separação do amante distante e o deserto aponta para as dificuldades
encontradas pelos casais em fuga, separados de seus pais.
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O desenvolvimento da cultura nos mostra que cada uma dessas regiões abrigou a
civilização desde tempos imemoriais e que o ser humano era obrigado a manter
contato com todas elas, o que, por sua vez, possibilitou a elaboração de distintos
conteúdos: religioso, cultural, moral e social, além de cosmovisões distintas e
relações de parentesco específicas. Um olhar minucioso sobre cada uma dessas
regiões apresentará as diferenças nítidas que existem entre elas.

O deserto, por exemplo, devido à dureza da vida cotidiana, falta de


vegetação, escassez de comida, medo dos ataques do eventual inimigo e a
própria instabilidade provocada pela amplidão geográfica, exige a elaboração de
uma cultura nômade que busca estabilidade.

Essa realidade levou os nômades a elaborarem um conteúdo religioso


que apresenta Deus como transcendente, distante e extremamente exigente de
fidelidade e submissão de seus fiéis. O sofrimento cotidiano levou o ser humano
a considerar o céu azul como morada de Deus, um lugar de tranquilidade. No
deserto, o tempo é linear, a Lua é o elemento masculino e o Sol é feminino. A
vida após a morte é sustentada pela crença na ressurreição, pois não há retorno
ao sofrimento do cotidiano.

A terra fértil, por outro lado, oferece plena abundância de vegetação, água
e comida. A tendência é de fixação geográfica e os seres humanos possuem
mais tranquilidade e paz. A vegetação permanente e a produção agrícola
possibilitaram a construção de um universo religioso em que o divino é
concebido como imanente e próximo, exigindo dos homens uma relação
harmônica. O tempo é cíclico, o Sol é masculino e a Lua é feminina. A morte não
é definitiva, pois o retorno é possibilitado pela crença na reencarnação – a
abundância da terra atrai o retorno.

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O modo de sobrevivência nas regiões montanhosas dependia dos rebanhos (gado
ou ovelhas) nas estepes e/ou do cultivo de algumas árvores frutíferas. Essas
regiões privilegiam o aspecto romântico nas relações humanas – o Sol e a Lua,
brilhando soberanos e ocultando-se entre as montanhas, assemelham-se aos
amantes em jogos eróticos.

As regiões litorâneas ofereciam fartura alimentar, que era obtida desde


que ultrapassados os perigos do mar. Também evocavam, cotidianamente, a
divindade da esperança – nos cardumes, no retorno para casa – e a saudade
dos que ficaram em terra ou seguiram para as águas. A partir disso, percebe-se,
nesse ambiente, certo apego à divindade para invocar proteção frente aos
perigos. Observamos, nos cantos das religiões afro-brasileiras, muitas
referências à “Luanda” (“Terra de Origem”), assim como referências às imagens
marítimas. Em Portugal, é poderoso no imaginário popular o mito de Dom
Sebastião, que voltará pelo mar.

As florestas ofereciam a fartura da comida das árvores frutíferas e, ao


mesmo tempo, a ameaça constante dos animais selvagens. A densidade, as
sombras e a riqueza de sons evocavam certa crença na existência de espíritos
florestais e elaboravam uma convivência harmônica nascida do medo que esses
seres inspiravam.

No planeta Terra, há outros tipos de ambientes – como as regiões frias da Sibéria,


o gelo da Groenlândia e os altiplanos da Bolívia e da Patagônia – que também
engendraram religiosidade.

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Sugiro que você visite diversos tipos de regiões geográficas, como terra fértil,
deserto, montanhas, floresta e litoral. Essas visitas podem ser realizadas por meio
de alguns livros de Geografia, História ou através dos diversos sites sobre o
assunto. Ao observar essas regiões, reflita sobre como é a geografia dos lugares
que deram origem às diversas tradições religiosas.

TEMA 2 - FUNDAMENTOS UNIVERSAIS DO FENÔMENO RELIGIOSO


Apesar da nossa afirmação sobre a diversidade geográfica que
influenciou o surgimento das diversas tradições religiosas e apresentando
conteúdo religioso diverso, dois aspectos são comuns para todas as tradições
religiosas mesmo que existam diferenças entre elas. São eles: a experiência da
solidão e a experiência do conflito. A própria condição humana exige que haja
esses dois elementos para o desenvolvimento do conteúdo religioso.

A experiência da solidão
Uma das primeiras percepções da condição humana é a da solidão.
Nascemos sozinhos, crescemos na multidão (e, ainda assim, sozinhos),
adoecemos, envelhecemos e morremos sozinhos. Como nos lembra o Budismo,
ninguém pode substituir a doença, a velhice e a morte de cada um. Citando a
obra “The politics of experience” de R. D. Laing (1967), Kapferer afirma que:

A fenomenologia considera a solidão como base fundamental da


existência humana, direciona sua atenção numa forma analítica para os
processos dos quais os indivíduos superam ou transcendem sua solidão
no mundo e vêm a partilhar sua experiência com os outros. (KAPFERER,
1986, p. 188).

De modo geral, sabemos que é impossível vivenciar a experiência do


outro. Todas as culturas oferecem aos indivíduos diversos mecanismos para
viver sua experiência compartilhada com os demais. A cultura media as
experiências dos indivíduos, conferindo-lhes caráter universal, ou seja, os

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indivíduos vivenciam sua experiência pessoal e ela é refletida na cultura. Desse
modo, paradoxalmente, percebe-se que:

A tua experiência se transforma na minha, eu vivencio minha experiência


de ti. As expressões reveladas na tua face, no gestual organizador do
teu corpo através do encontro de nossos olhares, são experimentadas
através do meu corpo e minha situação. (KAPFERER, 1986, p. 189).

Nota-se um movimento de ir e vir dinâmico, constante e consistente, que leva os indivíduos a


produzirem experiências admiráveis e serem admirados por elas, manifestar calma ou indiferença,
alegria, tristeza, orgulho ou humilhação.

A experiência da solidão e o desejo de sair dela induzem o indivíduo a


procurar os meios dentro de uma dada cultura. A solidão também pode ser
interpretada como a ausência do outro – procuro o outro para preencher minha
experiência da ausência. Percebemos aqui mais uma faceta do diálogo: a de
rota de fuga da solidão. Para isso, a cultura coloca à disposição do indivíduo
diversos mecanismos: amizades, relações, casamentos e outros métodos. Na
esfera religiosa, também podemos aplicar essa definição do diálogo como
oposto à solidão.

O indivíduo experimenta a ausência da divindade e a preenche com


oração, ritos e outros meios. Assim, a resposta à solidão sempre é um
movimento em direção ao outro, quer estejam os interlocutores na mesma esfera
(relação intersubjetiva), ou em planos diferentes (relação homem-divindade).

Fonte: <http://fmlima.blogspot.com.br/2010/07/solidao-e-solitarios.html>

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A experiência da dualidade ou do conflito

O ser humano não é uma ilha. Para que haja uma convivência harmônica
entre os seres humanos são estabelecidas regras, que podem ser de dois tipos:
sociais ou individuais. As regras sociais são baseadas nos conceitos de
obrigações e proibições. O surgimento da dualidade ou conflito está ligado à
quebra dessas regras, sejam individuais ou coletivas.

A sociedade ou a comunidade punem o indivíduo quando este quebra


uma regra coletiva, e ele, quando viola uma regra individual, procura redimir sua
culpa através de ritos ou outros meios. Um exemplo da transgressão de uma
regra coletiva é o terrorismo, que quebra a regra universal do respeito à vida
quando desconsidera o valor (ou reduz a importância diante de outros valores)
da vida humana.

Um exemplo de quebra da regra individual é o sentimento interior de


culpa por ter praticado um ato sexual fora dos padrões estabelecidos pela
sociedade como lícitos ou moralmente aceitáveis (fazer sexo com uma prostituta
ou com uma mulher casada que não seja a sua própria, por exemplo). Enquanto
a sociedade estabelece o diálogo do antagonismo ou do acordo (punição e
reconciliação com o grupo), o indivíduo estabelece o diálogo consigo mesmo,
através de ritos ou formas de austeridade (confissão, autopunição e expiação da
falta).

Fonte: <http://portuguesbrasileiro.istockphoto.com/stock-photo-3098073-
sullen-couple-sitting-on-couch.php>

Durkheim (1989) observa que “[...] (os fenômenos religiosos) pressupõem


uma divisão bipartida do universo conhecido e conhecível em dois gêneros que
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compreendem tudo o que existe, mas que se excluem radicalmente” (Durkheim,
1989, p. 72). Acompanhando o raciocínio de Durkheim, a filosofia chinesa
também afirma que uma lei de opostos governa o universo. Todas as coisas
trazem os dois polos em si e, se assim não fosse, a existência não seria
possível. Segundo essa tradição, o mundo é resultado de um jogo dinâmico de
dois princípios, antagônicos e complementares: Yin e Yang.

Todas as condições estão sujeitas a se transformarem em seus


opostos. Todos os opostos que alguém experimenta (saúde e
doença, riqueza e pobreza, poder e submissão) podem ser
explicados em referência ao domínio temporário de um princípio
sobre o outro. Uma vez que nenhum princípio domina eternamente,
isso significa que todas as condições estão sujeitas à transformação
em seus opostos. (IRMÃ CECÍLIA, 2004).

Essa dualidade também pode ser vista na análise proposta por Hertz no
início do século XX (1909), quando ele investigou as diferentes características
dos lados direito e esquerdo do cérebro e seu significado nas diversas culturas.
O argumento de Hertz era de que os lados direito e esquerdo poderiam ser
associados de forma consistente com o sagrado e o profano. A preeminência da
mão direita indica que ela é usada para os ritos e as execuções das tarefas
puras. As tarefas impuras são deixadas para a mão esquerda, que também é
associada aos atos de lidar com os demônios, feitiçaria e magia. Nas religiões
afro-brasileiras, por exemplo, as entidades de caráter moral ambíguo,
superficialmente associadas ao mal, são chamadas “da esquerda”.

Nos campos moral e espiritual, a experiência da dualidade é expressa sob


diversas formas, como culpa, ignorância, impureza, maldade, imprudência ou
quebra de regras e tabus. Como afirma Burkert (1996):

Começa com a falta ou o erro original, quer a infração de um tabu,


quer a violação da lei, da ordem ou da moralidade, quer apenas
alguma ação precipitada e imprudente; explica como, em
consequência, o mal se manifesta; depois, descreve o modo como foi
finalmente ultrapassado, através dos meios apropriados. (BURKERT,
1996, p. 151).

Essa busca dos meios apropriados indica que o indivíduo está pronto
para iniciar um processo de reparação para estabelecer a paz e harmonizar-se
com a experiência da dualidade. Esse conflito experimentado constantemente na

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vida cotidiana é visto como o principal bloqueio para se chegar a uma união com
o divino. O Hinduísmo enfatiza que a dualidade é resultado de maya, a
ignorância, e pode ser superada com o conhecimento correto ou o serviço
devocional; o Taoísmo ensina que o conflito surge devido à falta de equilíbrio
entre os elementos opostos (Yin e Yang). O Budismo, por sua vez, aponta o
desejo como causador do conflito; o Islã, a infidelidade.

Enquanto para o Budismo é possível alcançar o nirvana por meio da


cessação dos desejos, para o Islã o caminho da redenção reside na fé
inabalável em Alá. A tradição mítica judaico-cristã afirma que foi quando o
homem comeu o fruto da árvore que estava no meio do Jardim do Éden que o
conflito teve início, e que a forma de resolvê-lo está nas palavras do escritor
inglês C. S. Lewis em uma carta ao monge Bede Griffiths, na qual afirma:
“Quando tudo é dito (e verdadeiramente dito) sobre as divisões do Cristianismo,
resta pela misericórdia de Deus uma base comum imensa. Basta distanciar-se
daquela árvore que se encontra no meio do jardim” (LEWIS apud BOULAY,
1998, p. 80).

Leia o poema “Solidão”, de Fátima Irene Pinto, para refletir sobre a condição
humana. Disponível em:
<http://pensador.uol.com.br/frase/MTcxNjU1/>

TEMA 3 - SER O DIVINO, OUVIR O DIVINO


Um dos elementos mais importantes no desenvolvimento da tradição
religiosa é a exploração dos sentidos. Observamos que a terra fértil enfatiza o
”ver”, e o deserto, o “ouvir”.

Nascidos no deserto, o Judaísmo, o Cristianismo e o Islã dão ênfase ao


firmamento e localizam Deus nos céus distantes, chamando-o “Transcendente”.
Os homens do deserto têm medo de Deus, dos espíritos e de todas as forças
compreendidas como sobrenaturais. E porque querem que eles lhes sejam
favoráveis ou neutros, respeitam todos para não desagradar ninguém.

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A existência do nômade nessa região é penosa e solitária e está
severamente subordinada ao destino. Portanto, procura incessantemente a
proteção do Divino que se encontra no céu azul e se estende sobre ele para
poder enfrentar o terrível deserto que está aos seus pés.

Pela própria mobilidade do solo, a região desértica não dá a oportunidade


de construção de edifícios religiosos; mesmo se isso fosse possível, eles
estariam sujeitos à inclemência da areia levada pelo vento, que tudo varre e
encobre.

Já a cosmovisão do deserto firmou-se mais na palavra e na poesia, pois


ele não fornece uma diversidade de imagens. Toda esperança de vida, então, é
investida ao céu, mesmo que ele seja azul ou estrelado. O desenvolvimento da
espiritualidade dessas tradições religiosas se inicia no ato de ouvir, exatamente
porque o ser divino é considerado como palavra.

Nesse caso, alguém tem que falar e outro tem que ouvir. Falar e ouvir – a
intersubjetividade –, aliás, são coisas de grande valor em um meio no qual os
indivíduos possuem poucos vizinhos e um grande número de inimigos em
potencial.

A espiritualidade é elaborada a partir da fala e da escuta. O divino fala de


diferentes maneiras. No caso do Judaísmo, o “Torah” é visto como divino
ensinamento dado por Javé a Moisés no encontro no Monte Sinai; o Cristianismo
considera a Bíblia como a palavra de Deus, e o Islã considera que o próprio Alá
escreveu o Alcorão no coração de Maomé.

As regiões férteis, por sua vez, ofereciam uma condição excelente de


estabilidade, convidando à fixação geográfica. Havia uma possibilidade de
construção de algo a partir das rochas e do barro, e também sobre as próprias
rochas e no solo firme. Notamos que os hindus e os chineses aproveitaram sua
sabedoria para construir os templos e as imagens das divindades. As tradições
indiana e chinesa consideram o divino mais imanente do que transcendente,
pois Deus é visto na beleza da natureza, proporcionando mais contemplação e
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meditação. Ao contrário do que ocorria no deserto, o ser humano de terras mais
generosas investiu mais na visão do que na audição.

As teologias originárias da terra fértil são expressas mais pela imagem,


que é o principal elemento da espiritualidade. É provável que essa seja a mais
antiga simbolização humana da presença do divino: o “ver” carrega consigo uma
expressão popular hindi (língua nacional da Índia): Darsan déna e darsan léna
(“ver a divindade e ser visto por ela”).

Reencarnação e ressurreição
Outro elemento importante, quando se fala sobre semelhanças, se refere
aos conceitos de ressurreição e reencarnação. O deserto promove o medo do
desconhecido e o sofrimento diário no processo de transumância. O
desenvolvimento da ideia de três arcanjos, Gabriel, Miguel e Rafael, aparece no
contexto desértico. O anjo Gabriel oferece a consolação, dando as boas notícias
e elaborando a esperança de vida; o anjo Miguel oferece a proteção perante o
inimigo encontrado nos deslocamentos; e o anjo Rafael é símbolo da cura.
Aparentemente, Rafael era um “Elemental”, ou divindade primitiva associada aos
cactos, planta típica do deserto no qual se encontram as serpentes venenosas e
as picadas eram comuns. O remédio imediato para essas picadas era seccionar
o cacto e aplicar o suco no lugar afetado. Esse ser, mais tarde, foi anexado ao
panteão dos anjos protetores.

A experiência empírica da aridez do deserto deve ter influenciado


fortemente a construção do conceito de ressurreição. Uma sensação de não
voltar mais ao ‘deserto de lágrimas’ foi embutida na mente humana e,
posteriormente, transformada em doutrina. Toda a tranquilidade é vista no céu
azul e estrelado. Lá é o lugar do divino, e o desejo de estar lá, definitivamente,
era o que o homem do deserto queria. A ideia de ressurreição provém da
cosmovisão vertical do deserto.

A partir de suas experiências agrícolas, a China e a Índia elaboraram


conceitos religiosos como a reencarnação e a teoria do carma do Hinduísmo,
duhkha e samsara, do Budismo, e o caminho natural das religiões chinesas.
Nessas tradições não existe espaço para os anjos, pois não há necessidade de
transumância; não existe o inimigo desconhecido, portanto, não há necessidade
de consolação, proteção e cura. No lugar de anjos, temos os espíritos, sejam da
natureza ou dos mortos, para auxiliar ou interferir na vida cotidiana.
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A compreensão do conceito da reencarnação se encontra na experiência
da fartura e tranquilidade da região fértil. Recursos naturais atraentes, como rios,
montanhas, flores e frutas criam desejos de permanência e apego ao lugar. A
partir desse sentimento, foi elaborada a mentalidade de “vale a pena voltar de
novo para esse lugar sob condições diferentes”. Essa mentalidade,
posteriormente, recebeu uma complexa conotação espiritual, que o Hinduísmo
elaborou a partir do conceito do carma: essa volta pode ser vista como castigo
por ações negativas praticadas na vida anterior ou como benção pelas boas
ações realizadas. A ideia de reencarnação provém da cosmovisão circular das
regiões férteis.

Entreviste seus familiares e amigos para saber quais são as suas crenças sobre a
vida após a morte.

TEMA 4 - APROFUNDAMENTO: DIVERSAS IMAGENS E MODELOS DO


PLURALISMO RELIGIOSO
As pessoas tentam entender e explicar o pluralismo religioso, suscitando
várias imagens e modelos. Tomemos esses modelos para observar até que
ponto são adequados. Alguns diriam que a Realidade Suprema é a mesma,
embora seja chamada de nomes diferentes. Os hindus chamam Deus de Ishwar;
os muçulmanos invocam Alá. Os cristãos falam de Javé. Todavia, esses nomes
referem-se a uma única e mesma realidade, a saber, Deus. Eis uma imagem
atraente, porém bastante simplista.

A base da religião sobre a qual ela chama Deus não é a mesma. O nome
de Deus talvez seja, com frequência, indicativo da região linguística em que a
religião se originou. Mas o nome não aponta a natureza atribuída a Deus, a
finalidade da salvação que se vislumbra e o caminho proposto para que se atinja
a finalidade. É esse o material normal da religião.

Além do mais, em algumas religiões, certos nomes de Deus podem se


referir aos acontecimentos históricos ou míticos específicos, fundadores da

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religião. É o caso, por exemplo, dos nomes Rama e Krishna. Não são simples
nomes e evocam uma história.

Portanto, compreender as várias religiões em termos dos diversos nomes


que dão a Deus, todas se referindo à mesma realidade, é uma maneira bem
simplista e nominalista. É uma visão que não leva a sério o pluralismo religioso.

Outra maneira de justificar o pluralismo religioso é aceitar o fenômeno da


religião, mas relativizar seu papel no alcance da finalidade suprema. Alguns
diriam que o que importa é a moral ou dharma (lei, dever). A ortopráxis, ou ação
correta, é mais essencial para a vida da pessoa do que a ortodoxia ou crença
correta. O imperador Asoka parece ter adotado essa abordagem. Ele nomeou
funcionários especiais em seu reino para a promoção do dharma.

O dharma foi considerado a essência de todas as religiões. As diferenças


religiosas são, portanto, superficiais. Embora se esteja livre para seguir qualquer
religião, esta não deve servir de base para nenhum sentimento de superioridade.
Swami Vivekananda diz: “Não é o homem que crê em alguma coisa, mas o
homem que faz a vontade do Pai Celeste é quem está correto. Sobre essa base
– ser correto e agir correto – o mundo inteiro pode se unir” (VIVEKANANDA, s/d.
p. 273).

É verdadeiro que certos princípios morais básicos são comuns a todas as


religiões. A ação correta é o que importa na vida prática. Todavia, essa postura
não se volta realmente para a questão do pluralismo religioso. A melhor crítica
dessa postura é a experiência indiana. Uma moral prática, elaborada com base
em um ideal socialista democrático, está disposta na Constituição e no conjunto
das leis. Essa situação comum básica, entretanto, não conseguiu eliminar as
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várias leis pessoais aplicáveis aos grupos religiosos, não eliminou as tensões
religiosas e nem incentivou a tolerância. É uma abordagem que diz aos fiéis que
a visão básica que lhes inspira à ação correta é na verdade pouco importante e
secundária. Ela evita os problemas do pluralismo religioso e torna a tolerância
uma mera atitude pragmática de sobrevivência.

Semelhante relativização das religiões pode ocorrer quando as reduzimos


a expressões limitadas e racionais, embora a religião verdadeira seja algo de
outra ordem, a saber, da experiência e da intuição. O prof. S. Radhakrishnan
(1927) registra:

Embora crenças intelectuais arraigadas separem uma religião da


outra, o hinduísmo não se atribui tais limites. O intelecto está
subordinado à intuição, o dogma à experiência, a expressão externa
à visão interna. A religião não é aceitação de abstrações acadêmicas
nem celebração de cerimônias, mas uma espécie de vida ou ex-
periência. Ela é percepção da natureza da realidade (darsana) ou
experiência da realidade (anubhava). (RADHAKRISHNAN, 1927, p.
13).

Essa comunhão é alcançada no nível de experiência e intuição que está


acima e além do nível racional do pluralismo religioso. É uma visão que pode
estar, e frequentemente está vinculada à concepção de (unidade) sobre a
Realidade Suprema, para além de todo nome e forma, que se busca conceber
através do jnana ou conhecimento experiencial. É uma visão que relativiza as
percepções religiosas. Há muita verdade nela. Porém, ela não descobre a
unidade e a tolerância no nível religioso, mas em um nível mais elevado
(intuição) e diferente (experiência). Mais uma vez, o problema é desviado de seu
próprio nível.

Um modelo popular de descrição da variedade e inter-relacionamento das


diferentes religiões é o dos muitos rios que chegam no mar. Swami Vivekananda
(s/d. p. 390) registra:

Assim como os muitos rios que têm suas nascentes em diferentes


montanhas rolam terra abaixo, tortuosos ou retilíneos, e por fim
chegam ao oceano - assim, todas essas crenças e religiões, partindo
de diferentes pontos de vista e percorrendo caminhos tortuosos ou
retilíneos, por fim chegam a Vós. (VIVEKANANDA, p. 390).

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As religiões são encaradas como sendo paralelas umas às outras. É uma
visão que também pode estar baseada em perspectivas antropológicas.

A religião é um elemento, o mais básico, da cultura. A cultura é um


complexo de símbolos, atitudes, valores e comportamento de um povo
determinado.

Cada grupo cultural possui sua religião. Os mitos e rituais talvez possam
variar de cultura para cultura, mas preenchem a mesma função em todas elas.
Eis uma visão atraente. As religiões são caminhos paralelos. Uma não deve
interferir na outra. Cada uma tem que crescer e desenvolver-se de modo próprio.
Uma religião não julga a outra. Todas são tolerantes. O sincretismo é evitado.
Todavia, essa visão não é satisfatória. Ela não é verdadeira em relação à
história, na qual podemos encontrar diálogos religiosos sinceros, benefícios e
influências mútuas.

Pressupõe que cada tradição religiosa seja totalmente autossuficiente. É


uma visão que isola os grupos humanos em compartimentos estanques. Como
diz o prof. R. Panikkar quando afirma que ela não permite a mutação, mas sim, o
crescimento. A tolerância é interpretada simplesmente como não interferência.

As diversas religiões são também encaradas como cores de um espectro


luminoso refratado através de um prisma. Amaladoss (1996), apresenta o
modelo do prof. R. Panikkar explicando:

As diferentes tradições religiosas da humanidade são como as cores,


em número quase infinito, que aparecem quando o divino ou
simplesmente a luz total da realidade recai sobre o prisma da
experiência humana: ela difrata-se em inúmeras tradições, doutrinas
e religiões... por meio de qualquer cor, isto é, religião, pode-se chegar
à fonte de luz branca. (AMALADOSS, 1996, p. 187).

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1. Tendo em vista a abordagem da geografia e sua influência na
construção do conteúdo religioso, analise as alternativas a seguir e assinale
a correta:

a) Uma região geográfica específica produz uma cultura específica, um


modo específico de vida e, assim, também uma religião específica.

b) A região geográfica não tem nenhuma relação com a vida humana, pois
a geografia é uma coisa e a religião é outra.

c) A região geográfica está relacionada com o paisagismo da natureza, mas


não está relacionada com a vida humana.

d) A geografia e a religião são duas ciências totalmente opostas.

2. Amaladoss (1996) observa que: “Alguns diriam que a Realidade


Suprema é a mesma, embora seja chamada de nomes diferentes. Os
hindus chamam Deus de Isvar, os muçulmanos invocam Alá. Os cristãos
falam de Javé. Todavia, esses nomes referem-se a uma única e mesma
realidade, a saber, Deus.” Tendo em vista essa afirmação sobre a Realidade
Suprema, analise as alternativas a seguir e assinale a correta.

a) A Realidade Suprema é a mesma e única e ela não tem múltiplos nomes.

b) Os diferentes nomes de Deus existem para comparar e afirmar a


superioridade de um Deus.

c) A noção de Deus está presente em todas as regiões geográficas, mesmo


com as percepções divergentes – não há ser humano sem pensamento
religioso, esteja onde estiver.

d) A Realidade Suprema não tem relação com o nome de Deus.

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REFERÊNCIAS
AMALADOSS, M. Rumo à plenitude: em busca de uma espiritualidade
integral. São Paulo: Edições Loyola, 1997.

BERGER, P. Pela estrada da vida: prática do diálogo inter-religioso. São


Paulo: Paulinas, 1996.

BONDER, N. Tirando os sapatos: o caminho de Abraão, um caminho


para o outro. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2008.

BOULAY, S. Beyond the darkness: a biography of Bede Griffiths. New


York: Doubleday Dell Publishing Group, 1998.

BURKERT, W. A criação do sagrado. Lisboa: Edições 70, 1996.

BLYTH, R. H. Zen and zen classics. 5 vols. Tokyo: Hokuseido Press,


1974, p. 14.

DURKHEIM, E. As formas elementares da vida religiosa: o sistema


totêmico na Austrália. São Paulo: Edições Paulinas, 1989.

ECK, D. Darsan: seeing the divine image in India. New York: Columbia
University Press, 1985.

GIL F.; SYLVIO F. Paisagem religiosa. In: JUNQUEIRA, S. (Org.) O


sagrado: fundamentos e conteúdo do ensino religioso. Curitiba: Editora Ibpex
2009.

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