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Introdução.

Câncer é um filme de Glauber Rocha pouco visto no Brasil. Nunca entrado


comercialmente nos circuitos comerciais, ficou restrito durante a década de 70 ao seu
círculo de amigos, tendo sido exibido, após sua montagem e sincronização em Cuba e
na Itália, em uma mostra de cinema experimental na TV italiana, RAI, no início da
década. Mas sua exibição em cinema brasileiro, como parte de uma mostra dedicada ao
autor, só veio a ocorrer em 1984 após sua morte. Até então, até ser disponibilizado no
portal Youtube já na década de 2010, só era possível assisti-lo em mostras de filmes do
período, ou dedicadas ao autor. Talvez por isso, encontramos até o momento poucos
estudos e comentários sobre Câncer. Nossa ideia, nesse sentido, é constituir o sentido
do filme como expressão da conjuntura político e cultural em que surge, em vista de
restituir a sua singularidade. Sem procurar aloca-lo em algum período da história do
cinema brasileiro, como por exemplo, sobre se Câncer inaugurou o assim denominado
Cinema Marginal. Escolhemos por realizar um estudo imanente ao filme, tendo-se
como pressuposto a inseparabilidade de forma e conteúdo, para compreender a obra em
sua integridade, pressupondo-a como produção histórica cujo tema é a própria história.
Ao efetuar uma análise de suas partes, no sentido de reestabelecer seu todo,
identificamos que Câncer se estrutura sob o eixo da temporalidade. Isso significa o
modo como o filme internaliza o hiato temporal entre os dias em que foram captadas
suas imagens, no ano de 1968, e os quatro anos subsequentes, após o exílio do autor,
sendo somente montado e sincronizado em Cuba e na Itália em 1972; isto é, o autor
internaliza a temporalidade do próprio filme, em vista de expressar a conjuntura política
e cultural do ano em que surge suas imagens e, após o AI-5, os quatro anos seguintes.

Dado o caráter fragmentário da narrativa, constituída por cenas relativamente


autônomas, em que atores e não atores improvisam diante da câmera, em planos
sequencias, temas relacionados à violência, têm-se a impressão à primeira vista de o
filme ser a expressão da intenção inicial de Glauber ao filmar tais cenas, a saber, se
divertir com amigos e experimentar a capacidade de um chassi no tempo de um plano e
a utilização do som direto, enquanto espera os negativos para filmar em Milagres o
Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro. O autor muda a própria posição sobre o
filme. Se em um primeiro momento não havia interesse de lança-lo, após sua
finalização, Glauber o assume como parte do conjunto de sua obra.
Tendo a sua importância vinculada a um gesto inaugural que desagua no
experimentalismo do cinema brasileiro, dominante de 68 à 73 como nos informa Ismail
Xavier, chamado por muitos de cinema marginal ou underground; a importância de
Câncer passou a ser discutida em vista de sua inserção na história do cinema brasileiro
ou pela presença e influência de outra importante personalidade da cultura da época,
Hélio Oiticica. Perde-se de vista, assim, ao que Eduardo Escorel chama atenção em uma
entrevista sua no início dos anos 90, sobre a montagem em Glauber Rocha, para o
quanto essa etapa de produção é fundamental na concepção dos filmes do cineasta
baiano, sendo uma de suas marcas autorais. Tanto Terra em Transe como Dragão da
Maldade segundo o montador e cineasta, foram completamente repensados na
montagem.

Perdemos de vista esse elemento fundamental se não levamos a sério sua voz
over justaposta às duas inserções documentais presentes no filme, como veremos a
diante. De qualquer modo, até o momento, encontramos apenas um pequeno conjunto
de comentários em obras esparsas e uma dissertação de mestrado. Em síntese, as
direções da crítica definem Câncer pela ênfase ao experimentalismo situando o filme
na tradição das vanguardas estéticas dos anos 60 e 70; ou pela ênfase na alegoria, como
crítica aos intelectuais de esquerda ou de direita, na esteira de Terra em Transe, como
representação do subdesenvolvimento brasileiro; ou ainda, como dissemos logo acima,
procurando identifica-lo na historiografia do cinema brasileiro repondo a polêmica
iniciado pelo próprio Glauber de que Câncer seria o primeiro filme underground
brasileiro, antecipando as produções do final da década e início da década de 70.
Podemos identificar no conjunto, a despeito das diferenças, a ausência de um estudo
mais sistemático do longa; ou a constatação de que o filme é desigual, ressaltando sua
força nos improvisos com o som direto e os planos sequencias e, por sua vez, a má
sucedida tentativa de politizar de modo retrospectivo, as importantes experiências
formais realizadas em 1968.

Contudo, o que procuramos por aqui é restabelecer a unidade de Câncer em


vista de reconstituir o modo como o autor efetua pela montagem e sincronização uma
parábola das agitações político-culturais de 1968 cujo desfecho se dá no dia 13 de
dezembro do mesmo ano. Para tanto, se pretende por meio de um estudo analítico de
suas partes – no interior de cada plano, entre planos, e na relação entre som e imagem –
revelar o projeto político de Glauber ao finalizar Câncer. No rastro da teoria
eisensteiniana da montagem, o autor procura estabelecer um outro sentido quando sons
e imagens se encontram na estrutura fílmica. Esse sentido no caso do nosso objeto de
análise é claramente determinado por duas inserções documentais, dois procedimentos
de matriz épica, que visam internalizar o sentido sócio-histórico da sua estrutura,
também tematizando o próprio processo de realização do filme. Aqui alegorias,
procedimentos formais, historiografia do cinema brasileiro, movimento cultural e
político, não podem ser pensados sem ter em vista a temporalidade estrutural em
Câncer. Nesse sentido análise e interpretação caminham juntos no presente percurso
segundo a qual iremos seguir a próprio movimento das cenas ordenadas por Tininha e
Tineca sob a coordenação do autor já em 1972.

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