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Máquina e Imaginário – O Desafio das

Poéticas Tecnológicas

Arlindo Machado
EDUSP, 1ª edição: 1993, 2ª edição: 1996

Resenhado por Martins, Viviana Isabel vivianamartins@ig.com.br e Timmermans, Jacques.


jtimmermans@ig.com.br

Considerações gerais:
Arlindo Machado é professor do Depto. de Cinema, Rádio e TV da ECA(1) e
coordenador do programa de pós-graduação em comunicação e semiótica(2) da PUC-
SP(3) .
Este material foi inicialmente preparado para publicação em periódicos diversos ou para
conferências ou encontros especializados. Isto talvez explique certa falta de unidade no
conjunto, embora a idéia que norteou o percurso deste trabalho tenha sido na direção
das poéticas tecnológicas.
Este trabalho, compilado no início dos anos 90, capta como uma foto o que acontecia,
naquele instante, de mais atual no mundo da tecnologia a serviço da
criatividade,imagem e comunicação.
Mas, como o desenvolvimento tecnológico caminha a proporções exponenciais, o leitor
do ano 2000, embora consiga, com a leitura deste trabalho aprender e amarrar diversos
conceitos, verá este estudo como algo um pouco antigo, porque depois da Internet,
como aconteceu similarmente com a imprensa de Gütenberg, mudaram as percepções e
conceitos de comunicação em todo o planeta.

Tirando este senão, a leitura é bastante profunda e abrangente, lidando com conceitos de
imagem e comunicação; e com o casamentoque há entre arte, ciência e tecnologia desde o
Renascimento(9) até os anos 80.

Este trabalho é bastante feliz em valorizar a criatividade e genialidade do artista e da amálgama


que há entre este e a disponibilidade técnica do seu tempo para expressar sua arte.

O autor é profundo e especialmente feliz na explanação dos capítulos 3 e 4 “A simulação da


Imagem” e “O imaginário numérico”, quesão uma leitura bastante rica para os “aprendizes” da
ciência da computação.

Há uma relação apaixonada de Arlindo Machado com a arte, principalmente ao cinema. O


capítulo 7 “A síndrome de Colorização” é uma declaração de amor ao cinema.

As explanações teóricas estão acompanhadas, didaticamente, de fotos bastante elucidativas,


ratificando a idéia que uma imagem vale por mil palavras.
Só nos resta então,desejar uma boa leitura!

Resumo do livro que não dispensa, de forma alguma, a leitura do original:

Introdução :
Nas últimas décadas a técnica foi rotulada como algo estranho ao homem, e este último
concebido como um animal nu, desprovido de qualquer prótese instrumental que não fosse a
linguagem, tudo sendo encarado como artificial, desmerecedoras de valor e excluídas do
universo da cultura. Seríamos aquilo que escapa a competência de um robô e nos deslocando
para tarefas que ele não poderia cumprir: “Somos condenados a reinventar nossa humanidade e
o estado do homem jamais é portanto conquistado” (Couchot).
Houve tempos em que os intelectuais constituíam a força de ruptura das sociedades,
hoje,concorre com a religião para preservar valores canônicos contra o rolo compressor da
civilização ou da sociedade de massa.
Mas seria preconceito, comodismo e instinto de autodefesa dizer que as máquinas usurpam as
atividades criadoras. Não se pode tomar a moderna civilização das máquinas e das mídias como
algo que uniformiza a pluralidade e empastela a diversidade.

Ao contrário, sem as técnicas de produção, a história inteira da arte seria impensável. A


arquitetura, por exemplo sempre operou na intersecção perfeita da arte com a técnica, desde as
pirâmides egípcias.

Hoje, arte, ciência e tecnologia caminham entrelaçadas em qualquer área do conhecimento.


Observando o trabalho singular de certos criadores, nem sabemos mais se são artistas,
engenheiros, cientistas ou homens de mídia. Um químico que constrói intricadas arquiteturas de
moléculas também é um escultor e há algo de ficcionista num físico que “adivinha” a vida das
partículas e reconstitui a história íntima do comportamento dos átomos.

Agora, é a máquina que realiza o trabalho físico da obra, cabendo ao artista, o trabalho
intelectual e a atividade imaginativa. O difícil é conseguir codificar a idéia construtiva de tal
modo que a máquina possa entende-la e executa-la corretamente.

Hoje, a cópia de uma obra de arte ainda está associada a um objeto único, mas não é mais um
original, mas uma matriz ou um negativo, não há mais diferença entre uma geração de cópia e
outra. Mas embora as inovações técnicas tenham uma rapidez vertiginosa, são inseridas em
práticas culturais estabelecidas que obscurecem ou neutralizam seus efeitos desestabilizadores.

Capítulo I – Máquina e Imaginário


Os anos 60 presenciou o nascimento do vídeo-arte que abrangia trabalhos com um leque
bastante largo de tecnologias: computadores, sintetizadores, hologramas e máquinas de efeitos
sonoros e gráficos. Movimento também ligado a contra-cultura e movimentos de contestação da
Nova Esquerda americana.
O que se discutiu foi se tais tecnologias ainda poderiam ser consideradas arte, pois colocaram
em crise os conceitos tradicionais e anteriores sobre os fenômenos artísticos.
A confluência de arte e tecnologia representou um novo campo de possibilidades, podendo
resultar num novo conceito de arte.
Os gregos não faziam qualquer distinção entre arte e técnica e esse conceito não foi mudado até
o Renascimento(9). Para um homem como Leonardo da Vinci (8), pintar uma tela, estudar a
anatomia ou a geometria euclidiana e projetar o esquema técnico de uma máquina constituíam
uma única atividade intelectual.

Já o célebre teorista do Renascimento Leo Batista Alberti vislumbrou na matemática a


linguagem comum tanto do artista quanto do cientista. Nesse verdadeiro reinado de
Prometeu(11) a figura de inventor se sobrepõe a do sábio iluminado e a máquina torna-se
modelo conceitual para explicar e representar o universo físico natural.

Exposições recentes em todo mundo mostram como é cada vez mais difícil fazer uma distinção
categórica entre objetos originários da imaginação artística, da investigação científica e da
invenção técnico-industrial. Há uma interação de talentos e de investimentos das três áreas.

Há um casamento, mas não de papel fixados: a produtividade tecnológica deverá conviver com
a gratuidade anárquica da arte. O trabalho com tecnologias de ponta, exige sistematização,
eliminação do improviso,sem excentricidade ou irracionalismos, porém o trabalho artístico se
alimenta de ambigüidade, dos acidentes do acaso e das liberdades do imaginário. O trabalho
artístico depende muito pouco dos valores da produção, precisa da desordem, da
imprevisibilidade, sem os quais degenera na metáfora da utilidade programada.

Sem um projeto cultural e mais especificamente estético, as máquinas correm o risco de cair
rapidamente no vazio. Hoje há, nas sociedades industriais uma estratégia no sentido de produzir
uma informatização integral da sociedade. Trata-se, acima de tudo, de fundar um imaginário
social baseado na presença da mídia na paisagem urbana.

Assim, como a arte sempre dependeu de uma espécie de mecenato (da igreja, da nobreza, da
elite burguesa, dos colecionadores, das estatais), as modernas poéticas tecnológicas dependem
largamente do patrocínio de empresas e instituições detentoras dos meios de produção.

Definir o autor da obra de arte é cada vez mais impreciso,por exemplo no caso da fotografia: há
o talento do engenheiroque projetou a câmera, do físico que codificou o sistema óptico,do
químico, mas o crédito de uma foto pertence ao fotógrafo. Mas a máquina não é um simples
artefato mecânico, inventar uma máquina significa dar forma material a uma idéia.

Segundo Flusser, a tarefa da arte seria insurgir contra a automação estúpida, contra a
robotização da consciência e da sensibilidade.

A informática exibe de forma mais nítida o problema que estamos discutindo: entre a máquina e
o usuário, há o software, sem os quais as máquinas são inúteis.

Se já era difícil decidir sobre a paternidade de um produto da cultura técnica visto que oscilava
entre a máquina e os vários sujeitos que a manipulam, agora entra em cena um novo
personagem, o engenheiro de software. O trabalho deles também é considerado artístico desde
que eles aperfeiçoam a percepção e abrem as portas do imaginário, desde que o seu caráter
lúdico não tenha sido esmagado pela finalidade pragmática.

Capítulo II – Hegemonia da imagem eletrônica


Aqui é comentada a proliferação do uso do vídeo desde vídeo-games, imagens em circuito
fechados e até em instalações multimídias.
Embora o vídeo é uma forma de representação distinta, pós-fotografia,aqui são expostas as
fragilidades e inadequação principalmente com filmes, estes criados para o cinema que tem toda
uma percepção concentrada, de sala escura, isolada do exterior, percepção contínua, sem
interrupções. Não é portanto sem motivos que obras arrebatadoras do cinema se convertem em
paródias quando confinadas a tela pequena dos aparelhos de tv.
O vídeo é capaz de fazer metamorfoses nas imagens. Ernie Tee aponta a água como a melhor
metáfora para o vídeo, considerando que um como o outro diluem a representação (já não se
observou a estréia semelhança entre o aparelho de tv e o aquário?). A imagem de vídeo
manipula as imagens reais, as formas desafiam a concretização, ocupadas constantemente em
escapar de sua própria expressão.

A foto e o vídeo são um sistema de signos com a qual se pode “escrever” verdades e mentiras,
como em qualquer outro código significante, não se pode ter a crença ingênua que eles atestam
a realidade das coisas.

O vídeo que lida, além das imagens, com o som tem um parentesco com a música. O vídeo é
verdadeiramente música com imagens e quase toda a história da vídeo-arte confirma esse
postulado.

Enquanto outros sistemas figurativos caminham na direção de uma hierarquização, em


que o olho, separado dos demais sentidos, reina absoluto e solitário, a arte do vídeo
tende mais propriamente à sinestesia, ou seja, à reunificação dos sentidos.

Capítulo III – A simulação da imagem


A computação gráfica tem oscilado, me sua breve história, entre duas alternativas distintas: ou
ela é solicitada para simular o mundo natural (que inclui também o mundo artificial criado pelo
homem), ou então para simular a própria imagem.
Aqui o autor expõe como o computador interpreta a imagem, pois o computador opera com
números e não com imagens. O computador opera uma lista de números organizados numa base
de dados. O computador forja procedimentos específicos de visualização, que não são senão
algoritmos de simulação de imagem. São eles que tornam possível a representação plástica de
expressões matemáticas.Agora, considerando que a imagem é regida por convenções de
representação, por regras de formar e por estereótipos, resultados da própria história da cultura.
Então,para visualizar expressões matemáticas é preciso algo mais do que a simples tradução dos
dados numéricos para a informação de luz projetada numa tela, é preciso posicionar-se em
relação a certos ditames da representação plástica acumulados ao longo dos séculos.
Para simular a imagem, o computador trata os objetos convencionais da experiência cotidiana
como se fossem objetos matemáticos e se faz uso de coordenadas, matrizese usa uma infinidade
de algoritmos para tratar e codificar a imagem: splines, teoria da elasticidade,modelos de
iluminação, mapeamento de texturas, etc...

Embora a computação gráfica tenha uma história curta, ela é cheia de acontecimentos e em
pouco tempo, desenvolveu técnicas e procedimentos sofisticados de construção de imagem.

Das imagens limpas e artificiais das primeiras animações, a arte do computador


evoluiu“sujando” e se contaminando por uma certa taxa de desordem,visando forjar uma
realidade dinâmica e complexa. Neste instante, os métodos de Reeves para sistemas amorfos e a
geometria fractal de Benoit Mandelbrot(12) impulsionaram bastante a computação gráfica.
Particularmente, o conjunto de Mandelbrot é considerado o mais complexo objeto matemático
já visualizado pelo homem. É como se arte e ciência se combinassem no conjunto de
Mandelbrot.

Uma etapa difícil da computação gráfica é a reprodução das expressões fisionômicas, pois estas
dão vida e nos permite ler no seu rosto os seus mais diferentes estados psicológicos. (como dizia
Merleau-Ponty, fatos psíquicos como cólera, vergonha, ódio e amor não acontecem em nenhum
lugar oculto dentro de nós, nas se deixam ver do lado de fora , sob a forma de máscaras faciais
características).Os modelos para descrição de rostos se baseiam em estruturas tridimensionais e
um modelo mais recente e completo (1987), foi desenvolvido por Keith Waters, baseado no
trabalho dospsicologistas Ekamn e Friesden(1977), no qual diferentes estados emocionais são
expressos por distorções faciais correspondentes.Simplificando, os músculos são reduzidos a
polígonos ou grupos poligonais na estrutura wire frame em que as estruturas faciais são
modeladas.

Os modelos de animação também são combinados com modelos de reconhecimento e síntese de


voz, para que segundo o autor, nossa réplica humanóide, diferentemente do David de
Michelangelo(10), possa também falar.

Finalmente, é claro que a figura humana será sempre uma representação. No limite, a prótese do
homem nunca correrá o risco de ser fulminada em cena por um colapso cardíaco (como foi
Cacilda Becker), enquanto ao ator de carne e osso jamais irá desaparecer no ar por causa de uma
interrupção do fornecimento de energia elétrica. Cada um é definido pelo seu nível de realidade.

Conforme a teoria de sistemas tem advertido (Bertalanffy, 1973), nem todos os fenômenos
podem ser reduzidos a modelos matemáticos e a vida situa-se justamente entre os fenômenos
mais resistentes à formalização algorítmica. Algumas imagens podem ser mais calculáveis do
que outras, mas nem toda imagem pode ser a priori e imediatamente descrita por um algoritmo.

Finalizando,podemos dizer que predomina hoje, nas esferas de ponta da computação gráfica,
uma certa euforia produtiva, talvez até mesmo uma certa arrogância pseudocientífica,
disseminada por uma elite tecnológica entusiasmada com os seus próprios progressos e que
considera plenamente viável uma axiomatização integral do fenômeno visível. É preciso
considerar, entretanto, de que o universo estaria escrito em linguagem matemática deriva de
preceitos teológicos do século XVII, hoje questionados pela ciência e resultados surpreendentes,
porém sempre parciais, não nos devem enganar. O atual boom da imagem sintética resulta de
uma aplicação inevitável de conquistas formais já acumuladas nos vários campos da
matemática. A medida que os procedimentos forem se esgotando, as inovações se tornarão mais
lentas.

Capítulo IV – O imaginário numérico


Um espectador está acostumado aos modelos de animação vistos nos desenhos animados desde
a infância.O espectador desavisado olhando a imagens de computação gráfica na tela de um
computador de, por exemplo: cardume de peixesou pássaros voando,pode achar que se trata do
mesmo efeito.
Na verdade, há muita diferença: no desenho animado, o desenhista o projetou imagem após
imagem e sabe exatamente qual a evolução da imagem. No caso da computação gráfica o
trabalho é feito utilizando conquistas recentes no campo da Inteligência Artificial: a equipe cria
um modelo de comportamento, com suas regras gerais de funcionamento, uma vez instaurado o
processo, os personagens agem como que tivessem uma inteligência própria, é como se os
nossos pássaros fossem ensinados a voar e se comportar no espaço e a partir daí, evoluir numa
trajetória não especificada antecipadamente.Na verdade essa autonomia é relativa, pois a
simulação nunca é completa ou exata.
A técnica de simulação de bandos e cardumes baseia-se no conhecimento já acumulado na área
de biologia e a partir daí criados modelos matemáticos.
As simulações de modelos na tela de um computador, são hoje utilizadas amplamente em
diversos ramos da ciência. A simulação por computador permite reconstituir fenômenos naturais
de tal sorte que a imagem visualizada no monitor pode ser utilizada para predizer como a
natureza se comporta sob determinadas condições. Técnicas computacionais como a geometria
fractal, o sistema de partículas ou a modelação por procedimentos sugerem hoje que se pode
conceber imagens, portanto, representações – utilizando leis que parecem também operar no
mundo natural, ou, inversamente, que determinados elementos da natureza aderem
perfeitamente às equações matemáticas.

Uma das técnicas mais disseminadas é o chamado método dos elementos finitos, que utiliza um
conjunto de elementos simples e interconectáveis para representar um objeto complexo, fazendo
derivar desse modelo equações estruturais que especificam a contribuição de cada elemento ao
sistema inteiro, podendo-se prever o comportamento de estruturas complexas. Na indústria
aeroespacial, particularmente, os progressos têm sido expressivos: os complicados e custosos
túneis de vento para testar protótipos de aviões são agora substituídos por técnicas de
computação gráfica.

A crescente generalização das simulações é devida principalmente por razões práticas. Na vida
real, a experimentação implica custos muitas vezes proibitivos e certos testes (caso de aviões)
podem resultar na morte da tripulação. No universo das simulações tudo é permitido, desde que
tenha as equações adequadas.

Mas a substituição do modelo pelo real pode gerar confusão entre a realizada e signos. Como
são estreitas nossas categorias de interpretação, essas categorias podem ser embaralhadas, a
ponto de comprometer a operacionalidade. A imagem sintética, simulacro, já não é mais
original, nem cópia, nem modelo, nem “reflexo”, , nem qualquer dessas categorias dicotômicas.
Não é mais sombra do objeto porque pode muito bem existir sem ele e em alguns casos, tomar o
seu lugar. Ele tem propriedades do objeto físico e da imagem, mas não é nem uma coisa nem
outra, o simulacro é uma terceira coisa.

A representação não é o mundo, mas determinados conceitos que forjamos a respeito do mundo.
A computação gráfica apenas torna evidente e leva às últimas conseqüênciasesse fato que é da
própria natureza da imagem técnica.

O computador trabalha basicamente com cálculos matemáticos e leis puras da física, ele pode
trazer á luz imagens que nunca foram antes captadas por um olho humano, sejam elas realistas
(no sentido de verossímeis) ou assumidamente abstratas.

Ter ou não ter uma referência concreta no mundo material é, portanto, uma questão desprovida
de pertinência para a computação gráfica, pois ao contrário dos meios dependentes da
enunciação de uma câmera, como a fotografia, o cinema e a televisão, as imagens do
computador são inteiramente sintéticas e não dependem de nenhuma conexão física com objetos
do exterior. E mesmo quando imagens anteriormente enunciadas com câmeras são digitalizadas
na memória do computador, o que se visa é explorar as infinitas possibilidades de manipulação,
o que quer dizer transfigurá-las ao limite da abstração.

O que importa, entretanto, não é a novidade do motivo, mas a revolução do procedimento.


Novas imagens implicam novas formas de ver, novos critérios de avaliação e novos conceitos de
beleza. O que há de belo nas praias onduladas de Max e Fournier é a inteligência de um
programa capaz de dar-lhes vida sem necessidade de registro fotoquímico algum, sem apelar
sequer à imaginação do pincel de um artista, mas aplicando apenas as leis físicas e as equações
matemáticas pertinentes ao motivo representado. Ao contrário do pintor e do fotógrafo, o
programador de ondas sintéticas não presta atenção simplesmente à aparência perceptível do
fenômeno, ele quer entender o mecanismo das ondas , os fatores que colocam em órbita circular
as partículas de água, ele que descrever com o máximo de precisão todos os elementos em jogo,
Todos os fenômenos de altura e largura de ondas, direção das massas onduladas, tipos de
quebras ou de atenuação nas areias e assim por diante são dados pelos parâmetros regrados ou
aleatórios do algoritmo. É um efeito da ciência e como tal, pode demandar anos de estudos e
concepção do algoritmo adequado.

Os primeiros estudos de ondas couberam a Leonardo da Vinci(8) que são até hoje consideradas
observações acuradas, expressivas e exatas. Mas os leonardos da era da informática querem ir
um pouco mais longe: partindo do pressuposto de que deve haver alguma espécie de
isomorfismo entre as formas da matemática e as estruturas do universo, eles querem explorar os
limites do simulável, criar territórios experimentais onde o arbítrio do conceito possa se
materializar e se encarnar em figuras virtuais de um mundo paralelo. O que parecia vivo e livre
se vê agora fixado por modelosvatídicos (4) e podemos pensar o que “vive” nos algoritmos, o
que á de recursivo no vivo?

Falando agora do realismo das cenas, vemos que a expressividade de um quadro depende
basicamente da posição da câmera em relação à cena. No realismo conceitual se representa o
que se sabe do objeto e não o que se vê. Num certo sentido, a simulação visa colocar em
movimento a “vida” dos símbolos e resgatar a sua produtividade conceitual, O programador, o
inventor de algoritmos são algo como demiurgos(5) da formalização matemática, que têm por
tarefa forjar o conjunto das equações necessárias a gênese de micro-universos capazes de
evoluir de forma mais ou menos autônoma.

Capítulo V. O efeito zapping


O zapping é a mania do telespectador mudar de canal, a qualquer pretexto, na menor queda de
ritmo ou de interesse do programa e, sobretudo quando entram os comerciais. Zipping, por sua
vez, é o hábito de fazer correr velozmente a fita de vídeo durante os comerciais em programas
gravados em videocassetes.
Depois do aparecimento do controle remoto esse costume proliferou intensamente e aumentou
também a inserção de comerciais nos programas sob a forma de merchandising, inovando-se a
técnica do anúncio publicitário.
O telespectador zapa tudo e a qualquer pretexto, não mais assiste a programas inteiros, nem
acompanha mais histórias completas. Ele salta continuamente, em pouco tempo ele aprende a
assistir qualquer coisa por amostragem.
Certamente já se zapava antes do controle remoto e da televisão. O leitor de livro sempre zapou
secretamente. Machado de Assis sugeria isso a seus leitores e quem viaja de automóvel zapa o
auto-rádio o tempo todo.

Mas nunca se zapou tanto como na era da televisão. O zapping é a resposta mais simples à
tirania dos índices de audiência.

O resultado pode ser tanto uma colagem “pós-moderna” de toda a diversidade cultural,
ideologia e mítica do planeta, como também a reiteração infinita e pleonástica do mesmo
enunciado. Já não aconteceu a todo mundo varrer todos os canais de televisão, num determinado
horário, e encontrar em todos eles um telejornal, repetindo todos a mesma notícia, sob o mesmo
e único enfoque, ilustrado com as mesmas imagens obtidas da mesma agência noticiosa? Assim,
o prazer perverso de uma desregulagem da máquina produtiva da televisão pode resultar, pura e
simplesmente, na mesma apatia indiferenciada da recepção passiva, ou na frustração diante do
determinismo estrutural do dispositivo simbólico.

O zapping tem contribuído para produzir uma mutação nas maneiras como vemos a televisão e
nos relacionados com ela. Uma outra mutação, porém, mais sutil mas não menos avassaladora,
dá-se na própria produção de mensagens midiáticas: uma vez que agora todos zapam e zipam
em todos os níveis e a todos os pretextos, uma vez que a televisão criou espectador diferente,
que mantém com as imagens e sons uma relação fundamental de impaciência e de evasão, o
efeito zapping acaba por contaminar as mensagens ao nível da própria produção e vira modelo
de construção. O cinema e a televisão deverão aprender a contar outro tipo de história que leve
em conta a impaciência preponderante do espectador.

No filme “Janela Indiscreta” em que o voyeur Jeff espiava entre inúmeras janelinhas e obtinha o
efeito de pluralidade de zapping. Mas, a diferença é que a medida que avança a intriga
principalas outras particulares convergem todas para ela, para um desfecho redentor e catártico.
Mas o efeito zapping é exatamente o contrario. O gesto do zapper consiste exatamente em
desmantela-las, confundi-las, tritura-las até o limite da desconexão absoluta.

Capitulo VI – O sonho de Mallarmé


O sonho de Mallarmé, perseguido durante toda a sua vida, era dar forma a um livro integral, um
livro múltiplo que já contivesse potencialmente todos os livros possíveis, ou talvez uma
máquina poética, que fizesse proliferar poemas inumeráveis; ou ainda um gerador de textos,
impulsionado por um movimento próprio, no qual palavras e frases pudessem emergir,
aglutinar-se, combinar-se em arranjos precisos, para depois se desfazer, atomizar-se em busca de
novas combinações.
Como dizia Haroldo de Campos (1969), trata-se verdadeiramente de um livro-limite, “o limite
da própria idéia ocidental de livro”, que desafia os nossos modelos habituais de escritura e
aponta para o livro do futuro.
Quando um usuário moderno se coloca diante de um terminal de videotexto e se põe a
selecionar as “páginas” de informação, percorrendo um caminho singular dentro do imenso
labirinto das eqüiprobabilidades do banco de texto, ele está, num certo sentido, materializando
(mas também banalizando) o sonho mallarmiano de uma escritura em continua expansão e em
permanente metamorfose, graças as propriedades combinatórias do sistema.
No computador, o sonho de Mallarmé parece poder finalmente converter-se em realidade. O
livro é na verdade um algoritmo combinatório.

O processo básico da geração de um texto “artificial” é dado por uma série estocástica ou
probabilística conhecida como cadeia de Markov (Pignatari 1968, Eco 1971, Bense 1971). Tal
processo baseia-se na idéia de que todo texto é construído operando-se uma seleção de sinais
(fonemas, letras) numa determinada fonte (alfabeto fonético ou escritural), segundo certas
regras de combinação previamente dadas pelo estudo estatístico de uma língua. A abordagem
seletiva executa essa operação através de etapas ou graus de aproximação. O processo poderia
gerar textos aleatórios e experimentais, baseados nas possibilidades combinatórias de uma
língua.

Um programa BASIC que coloca quaisquer palavras numa base aleatória, de modo a
proporcionar resultados semânticos de tipo aforístico (6) produz resultados desconcertantes e
revela uma fecundidade infinita de possibilidades combinatórias.

Autores já desenham estórias com várias alternativas de desfecho, mas neste caso ao invés de
explorar a arquitetura labiríntica do computador, como um Borges (7) cibernético penetrando no
jardim de caminhos que se bifurcam.
O hipertexto, considerando hoje, algo trivial na Internet estava apenas engatinhando quando
Arlindo Machado escreveu o textoe aqui o autor faz uma descrição do mesmo.

Capítulo VII – A síndrome da colorização


Neste capítulo, o autor discorre sobre o quanto o fenômeno de colorização digital, desfigura
clássicos do cinema da era preto e branco.
Ele mostra uma visão bastante ampla e apaixonante do cinema. Os leitores que previamente
tiverem assistido “Metrópolis(1926)”(14), “O Encouraçado Potemkin(1926)”(13), “O
Leopardo(1963)”, O Selvagem da Motocicleta(1987)”,irão se deliciar com os comentários.
O fenômeno de colorização digital de filmes, muito em moda nos anos 80, foi bastante
criticado. Muitos diziam que a colorização falsificava o original.Neste ponto Arlindo Machado
explica que na época do cinema mudo e em p&b era natural que as cópias fossem colorizadas
antes da exibição. Que chegaram até nós várias cópias editadas ditas versões originais que são
bastante diferentes, que o acompanhamento musical nas salas de exibição diferiam bastante.

Neste ponto, o autor diz que não dá para saber o que o original, portanto, essa intolerância da
crítica é muitas vezes inconseqüente e os filmes colorizados e exibidos com trilhas inovadoras
nos anos 80 não podem ser recebidos com tanta apatia.

Cada filme, cada obra de arte é lida de acordo com a percepção do espectador da época. É
impossível dizer que mesmo uma obra intocada será recebida pelo espectador da mesma forma
que foi recebida pelo espectador da época do autor. Já dizia Bakhtin que o autor é prisioneiro de
sua época, de sua contemporaneidade, as épocas posteriores o liberam dessa prisão, uma obra
póstuma vai se enriquecendo de significados. Podemos dizer que nem Shakespeare, nem seus
contemporâneos conheceram O Shakespeare que conhecemos agora.Neste sentido, constitui um
contra-senso considerar as obras culturais algo acabado, encerrado em si, distanciado e
sepultado pelo tempo.

Estamos nos aproximando perigosamente dos labirintos de Borges. Toda noção de falsificação,
plágio, adulteração e outros quejandos pressupõem a idéia de um original, imutável e absoluto,
em relação ao qual divergem as réplicas. Mas nós pudemos verificar também como são frágeis
asa tentativas práticas de determinar com precisão a materialidade original e pertinência de sua
originalidade.

Por exemplo, no caso de Metrópolis, só podemos fazer a leitura do mesmo a partir de nosso
referencial histórico, como expectadores da era do rock, da televisão e da colorização digital,
jamais com os mesmo olhos do cidadão da República de Weimar.

A computação gráfica, com seus inesgotáveis recursos de processamento digital de imagem, se


vê sub-utilizada numa atividade limitada e menor como é a colorização de filmes antigos. Não é
só uma questão de oportunismo comercial, ela depende fundamentalmente de talentos, que
todavia não forma nem desenvolve. A atividade de colorização entregue a funcionários
subalternos, em geral apertadores de botões sem nenhum senso estético ou talento artístico cria
uma epidemia de esterilidade,basta ver o pianista Sam de Casablanca(1942) desfilando de paletó
amarelo-ouro, que é o máximo da cafonice.

É bem provável que num amanhã sejam lançadas versões holográficas dos filmes de hoje, mas
que se atribuam essas tarefas a gente de talento. Se as traições, falsificações e adulterações
forem realizadas com criatividade e competência, nada teremos a perder ou lamentar.
Capítulo VIII - Máquinas de vigiar
Aqui o autor fala sobre o aproveitamento do aparelho de vídeo para monitoramento de portarias,
supermercados, cadeias, aeroportos, enfim toda a sociedade.
A vigilância eletrônica se transforma num sistema abstrato de disciplinamento, já que, na
prática, é inviável exercer uma vigilância direta sobre instituições sociais, dada a magnitude
estatística dos observados.
A densidade demográfica dos grandes centros urbanos não autoriza sistemas de controle direto,
exigindo estratégias de operação de ordem estocástica ou probabilística. Assim a fantasia
orwelliana (livro 1984) de uma sociedade centralizada pela autoridade de um Big Brother torna-
se inverossímil, largamente ultrapassada pelo modelo benthamiano de sociedade, baseado numa
coerção imaginária, ficção de policiamento cultivado pela proliferação inexorável das máquinas
de vigiar.

Já houve que fizesse uma aproximação conceitual entre o sistema eletrônica de vigilância e a
estrutura do funcionamento da televisão. A posição dos apresentadores frente as câmeras dão ao
espectador a impressão de estarem sendo vigiados, pelo menos interpelados por um olhar.

Segundo Foucault, a partir do momento em que os telespectadores ligam seus receptores, são
eles mesmos, prisioneiros ou não, que entram no campo da televisão, um campo sobre o qual
não têm qualquer poder de intervenção.

A própria maneira da televisão, ela transforma a vigilância em atração. Sistemas de câmera


oculta são largamente utilizadas por programas de televisão onde pessoas comuns são filmadas
em situações ridículas ou humorísticas.

Um exemplo contemporâneo, que foge a análise do autor é o filme “O show de Truman


(1998)”,onde esse processo de “máquinas de vigiar” é profundamente explorado: a vida de um
ingênuo personagem é atração de tv desde o seu nascimento, todos os outros personagens
sabem, menos ele até o momento que ele descobre e aí acontece a catarse do filme...

Capítulo IX – Máquinas de aprisionar o Carom


Carom é o nome que índios canelas apaniecras do Maranhão dão às imagens e às vozes das
pessoas e das coisas, sejam elas atuais dos vivos ou virtuais dos mortos que retornam sob a
forma de fantasmas.As Câmaras de fotografia, de cinema, de vídeo, são entendidas por estes
índios como aparelhos de captar o carom, aprisioná-lo dentro da máquina e restituí-lo quando
necessário.
O conceito de carom é altamente estimulando para que quer entender um pouco mais a fundo a
relação que as pessoas estabelecem com os aparelhos enunciadores de imagens e sons forjados
pela nossa civilização, sobretudo por colocar essa relação na sua situação-limite.
Para exemplificar o autor narra a existência de uma foto que registra fotógrafos em Brasília se
recusando a fotografar um acontecimento político, a foto foi tirada justamente para provar que
os fotógrafos não fotografaram o evento.Daí qualquer observador mais atento pode perceber que
tudo não passa de uma encenação montada exatamente para possibilitar a foto. Exatamente para
provar o boicote dos fotógrafos é que a foto existiu . Quer dizer: a recusa da fotografia só podia
ser dada por uma foto, a ausência pela presença. Se não há foto, não há prova e, por
conseqüência, não há notícia, o evento pode sequer ser tomado como acontecido. Cada vez
mais, nós tendemos a confundir o evento com a sua enunciação simbólica, ou melhor ainda, os
próprios eventos na acontecem senão para a sua circulação nos veículos de informação.
O cacique Juruna nos anos 80, ficou famoso porque percorria os corredores ministeriais com seu
gravador portátil, o gesto ostensivo era uma maneira de chamar de mentirosos os homens do
governo. Certamente, tal uso do gravador portátil jamais poderia estar no horizonte dos
inventores e fabricantes do aparelho.

A presença dessas máquinas nas comunidades indígenas certamente interfere na sua maneira de
conceber e representar o mundo, produzindo transformações penetrantes e irreversíveis na sua
cultura.

Mas no momento em que a cultura indígena parece ameaçada pela sua transformação em
espetáculo para a mídia, ocorre também um movimento no sentido inverso. Eles utilizam o
vídeo não apenas não apenas de registro passivo de suas tradições, mas também de luta política.
Na verdade estão aprendendo a dominar criativamente as modernas tecnologias de enunciação
para coloca-las a trabalhar em seu benefício.

A diferença da atitude dos índios simplesmente exibir sua imagem prototípica ao voyerismo das
câmeras midiáticas é que agora, aprendemem reverter a situação, deixando de aparecer como
objetos passivos e constrangidos de uma relação sobre a qual não têm qualquer domínio e
inventam, ao mesmo tempo, alternativas para garantir a preservação não mais de sua “pureza”
étnica ou cultural, mas de sua autonomia política e de sua opção (consciente e deliberada, em
alguns casos) por um modelo de vida diferenciado.

Talvez devêssemos aprender algo com os índios. Num momento em que as mídias tendem a
centralizar cada vez mais a vida material e imaginária, qualquer anseio de mudança e qualquer
lutar emancipatória passam necessariamente por uma reapropriação das máquinas de aprisionar
o carom, no sentido mesmo de reinventar as formas de comunicação social e de construir com
elas dispositivos de expressão originais e singulares.

Capítulo X – A experiência do vídeo no Brasil

Uma das forças criativas do Brasil nos anos 80 foi o chamado vídeo independente.O cinema
brasileiro entrou em declínio devido aos altos custos de produção. A fita magnética é
infinitamente mais barata e os equipamentos de gravação e edição eletrônica contam com
alternativas de custo e qualidade bem mais convidativos que o cinema.
Programas como Armação Ilimitada ou Tv Pirata, grandes sucessos da Rede Globo jamais
teriam sido possíveis não fosse a introdução pelos independentes de um estilo jovem de
produção.Surgiram várias produtoras responsáveis pelas séries mais inteligentes da tv brasileira:
Conexão Internacional, Xingu e Os Brasileiros.
Uma experiência bastante fértil foi do grupo TVDO, realizando reportagens invertidas. Por
exemplo: numa partida de futebol, a câmera se concentra na torcida, num show de rock se
concentra nos fãs, nos vendedores ambulantes e cambistas. Trata-se de um realismo grotesco, a
criação de uma realidade invertida, paralela à oficialmente reconhecida, permitindo lançar um
olhar divergente sobre o mundo, um olhar ainda não enquadrado pelo cabresto da civilização.
Na verdade, a intervenção do grupo TVDO acaba contribuindo para tornar mais acessíveis e
generalizadas conquistas formais e temáticas que se dão na vanguarda da invenção estética, sem
incorrer todavia em diluição. A máxima seguida ao pé da letra pelo grupo, tão cara a Oswald de
Andrade, segundo a qual a massa também pode provar o biscoito fino que as elites consomem.

A contribuição do vídeo independente no Brasil, a medida que ele lança um olhar diferenciado
sobre o Brasil e seu povo.

A imagem eletrônica não está mais restrita à sala de visitas de nossas casas, ela prolifera nas
escolas, empresas, bares, danceterias, aeroportos, metros e assim por diante, A cada dia, inventa-
se uma aplicação diferente, o que torna cada vez mais variável, múltiplo, instável e complexo o
fenômeno do vídeo.

Capítulo XII – Um cineasta da Alemanha


Hans-Jürgen Syberberg foi colocado no centro das polêmicas internacionais, em razão do
impacto causado pelo seu Hitler, um filme da Alemanha. Nós aqui, ficamos alheios a essa
discussão ou nem chegamos a tomar conhecimento dela.A razão é simples: Syberbeg é o avesso
total dessa usina de sonhos que o modelo hollywoodiano nos fez acreditar, durante muito tempo,
se a própria natureza do cinema. Deliberadamente teatral, ou mais propriamente operística, essa
obra representa, em todos os sentidos, o golpe mais radical no coração disso que até aqui
conhecíamos como a “linguagem” do cinema: seus cenários são apenas rascunhados e anti-
realistas por excelência; suas cores completamente artificiais, com rupturas de tom entre o
primeiro plano e o fundo; a maquiagem é carregada como no cinema mudo; a direção de atores
nada tem de naturalista e molda gestos e poses estilizados em atores-estátuas; marionetes são
manipuladas à vista dos espectadores; a trilha sonora está em desacordo com a imagem e não há
a menor continuidade “narrativa” amarrando os planos, em todos os sentidos, trata-se de uma
reinvenção radical do cinema.
O próprio Syberberg nos lembra que a marionete ocupa um lugar proeminente na cultura
germânica, o primeiro livro de Fausto foi tirado de uma peça para marionetes, e, ademais, há o
célebre ensaio de Kleist sobre o assunto.

A obra de Syberberg aparece cada vez mais como um esforço sistemático para realizar um
levantamento da Kultur germânica, através da óptica dos valores populares, recorrendo aos
mitos, heróis e anti-heróis da história recente da Alemanha, tal como eles foram trabalhados nos
veículos de massa.

O nazismo foi, entre outras coisas, uma mise em scène da política. Ao contrário dos gregos, dos
romanos e dos chineses, ele não se preocupou em deixar monumentos ou muralhas para que a
posteridade reverenciasse a sua memória; o que ele deixou às gerações seguintes foram os filme
e os registros magnéticos dos discursos radiofônicos. Hitler organizou a política e a guerra como
conseqüência do fato de ele já ter começado a encenar uma cerimônia. As Olimpíadas e depois
as grandes paradas militares destinavam-se, antes de mais nada, às câmaras de Leni Riefenstahl;
a guerra era encenada para que o povo pudesse ver-se nas telas das atualidades, como guerreiros
loiros extraídos de uma partitura de Wagner. É nesse ponto justamente que se dá a estratégia de
ataque de Hitler um filme da Alemanha, o Führer que aparece em cena é tomado, antes de tudo,
como um cineasta, um mau cineasta se levarmos em consideração os recursos de que dispunha.
Com ironia carnavalesca, Syberberg constrói um antiespetáculo a propósito do espetáculo
nazista: todo o espírito de parada, toda a oratória inflamante e os travelings sedutores de
Riefensstahl são reduzidos a um desfile de manequins, bonecos e marionetes, cobertos de teias
de aranha. O próprio Hitler invocado pelo filme não constitui senão um espectro, destinado a
engrossar a galeria de espectros clássicos do cinema alemão: Caligari, Nosferatu, Mabuse. O
combate a Hitler não se dá portanto sob a óptica de um sociologismo vulgar, mas no terreno
mesmo do cinema, de seu poder hipnótico de invocar mitos e de moldar o imaginário.
Depois, Syberbergdirigiu outros filmes e hoje ele é marginalizado, tanto na Alemanha quanto no
resto do mundo e encontra dificuldades cada vez maiores para filmar.

Referências:

(1)www.eca.usp.br

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