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Paulo Coelho

Maktub
II
Paulo Coelho

Maktub II
Fonte Digital:

http://www.paulocoelho.com.br

Versão para eBook por:

eBookCult
Créditos

C ole ção de te x tos publicados


e m dive rsos jornais do Brasil e
e x te rior, que não fazem parte
do livro Mak tub [ Ed. R occo,
1994 ] . Ve rsão Ex clusiva para
Inte rne t. Ve rsão com ple ta.

A tenção

Este te x to é distribuído
gratuitam e nte atravé s da
hom e page de Paulo C oe lho.
Ele não pode se r e ditado sob
ne nhum a form a. O autor
de té m todos os dire itos do
m anuscrito e m que stão.

(c) 2000 — Paulo Coelho


DO TIJOLO

Durante um a viage m, recebi


um fax de m inha se cre tária.
"Ficou faltando um tijolo de
vidro para a re form a da
cozinha" — dizia e la. "Envio o
proje cto original, e o proje cto
que o pe dre iro usará para
com pe nsar a falta ."
De um lado, havia o
de se nho que m inha m ulhe r
fize ra: file iras harmoniosas de
tijolos de vidro, com abe rtura
para a ve ntilação. Do outro
lado, o proje cto que resolvia a
falta de um tijolo: ve rdadeiro
que bra-ca be ça s, onde os
quadrados de vidro se
m istura va m se m qua lque r
e sté tica.

5
"C om pre m o tijolo que
falta ", e scre ve u m inha
m ulhe r. Assim foi fe ito. E o
de se nho original foi m antido.
Naque la tarde , fique i
pe nsando m uito te m po no
ocorrido; quantas ve ze s, pela
falta de um sim ple s tijolo,
de turpam os com pletamente o
proje cto original de nossas
vidas.

6
DO DESERTO

Um hom e m larga a vida


m unda na e tra nsforma-se em
e rm itão. Longe do ce ntro de
de cisõe s políticas da é poca
passa anos de sua vida
te nta ndo pre pa ra r o cam inho
para o Me ssias. De fine -se
com o "a voz que clam a no
de se rto".
Num prim e iro m om e nto,
pode m os pe nsar que tal
hom e m — João Baptista —
não te ria qualque r influê ncia
e m sua é poca . Mas a história
nos m ostra o contrário: sua
pre se nça foi funda m e ntal na
vida de Je sus.
Q uantas ve ze s nos sentimos
com o voze s que clam am no

7
de se rto? Nossas palavras
pare ce m pe rde r-se no ve nto,
nossos ge stos aparentemente
não de spe rtam qualque r
re acção.
João pe rsistiu; cabe a nós
faze r o m e sm o. As vozes que
clam am no de se rto são as que
e scre ve m a história do se u
te m po.

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DA CA SA

Um conhe cido m e u, por sua


incapacidade de com binar o
sonho com a re alização,
te rm inou com sé rios
proble m as finance iros. E pior:
e nvolve u outra s pe ssoa s,
pre judicando ge nte que não
que ria fe rir.
Se m pode r pagar as dívidas
que se acum ulavam, chegou a
pe nsar em suicídio.
C am inhava por um a rua certa
tarde , quando viu um a casa
e m ruína s. "Aque le pré dio ali
sou e u", pe nsou. Ne ste
m om e nto, se ntiu um im enso
de se jo de re construir aque la
casa. De scobriu o dono,

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a je itaram um a m ane ira de
conse guir tijolos, m ade ira,
cim e nto. Trabalhou com amor,
se m sabe r porquê ou para
que m . Mas se ntia que sua
vida pe ssoal ia m e lhorando à
m e dida que a re form a
avançava.
No fim de um ano, a casa
e stava pronta. E se us
proble m as pe ssoais
solucionados.

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DA ESCOLA

Um am igo com e ntou com


Júlio R ibe iro: "É m ais
com plicado organizar um a
e scola de sam ba que a
Ge ne ral Motors. São 5 m il
pe ssoa s, que com pa re ce m
pontualm e nte aos e nsaios,
de coram a le tra de sam bas
com plicadíssim os, concebem
ce nografias de Hollywood,
confe ccionam m ilhare s de
a de re ços, organizam centenas
de costure iras. O be de ce m
ce gam e nte a orde m dos
fiscais, che gam se m atraso à
conce ntra çã o, a juda m a
e m purrar carros ale góricos.
Aí, sam ba m por a pe na s uma
hora, e a inda chora m se a

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e scola pe rde . C omo chegam a
e sta pre cisão de re lógio
suíço?"
Ningué m disse nada. E o
am igo re sponde u à própria
pe rgunta: "Porque todos
que re m a m e sm a coisa , neste
caso, de sfilar bem. Quando há
união e m torno do m e sm o
obje ctivo, não há obstáculo
que atrapalhe ."

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DA PA RTICIPA ÇÃ O

A vida pe de -nos
constante m e nte : "participe!".
A participa çã o é ne ce ssária
para a nossa a le gria , m as
tam bé m para a nossa
prote cção. Q ue m se om ite
diante das barbaridade s que
vê , e stá pre stando se rviço a
força das tre va s, e isto lhe
se rá cobrado um dia.
Há m om e ntos e m que
e vita m os a luta, sob os m ais
dive rsos pre te x tos:
se re nidade , maturidade, senso
de ridículo. Ve m os a injustiça
se ndo fe ita a nosso próximo, e
ficam os calados. "Não vou me
m e te r à toa e m briga s", é a
e x plica çã o.

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Isto não e x iste . Q ue m
pe rcorre um cam inho
e spiritual, carre ga consigo um
código de honra a se r
cum prido. A voz que clam a
contra o que e stá e rrado é
se m pre ouvida por De us.
Se o nosso irm ão não te m
m ais forças para re clam ar, é
nossa ve z de fazê -lo por e le.

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DO A EROPORTO

Voávam os de Ne w York para


C hica go, rum o a um
congre sso lite rário. De
re pe nte , um rapaz fica em pé
no corre dor do avião: "Preciso
de doze voluntários", disse .
"C ada um vai carre gar um a
rosa, quando ate rrizarm os."
Várias pe ssoas levantaram a
m ão. Eu tam bé m le vante i,
m as não fui e scolhido.
Mas re solvi acom panhar o
grupo. De sce m os, o rapaz
apontou para um a m oça no
saguão do ae roporto de
Ó Ha re . Um a um , os
passage iros foram entregando
suas rosas para e la. No final,
o rapaz pe diu-a em

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casam e nto na fre nte de todos
— e e la a ce itou.
Um com issário de bordo
com e ntou com igo: " de sde
que tra ba lho a qui, foi a coisa
m ais rom ântica que aconteceu
ne ste ae roporto".

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DO DESEJO

Na Ida de Mé dia , as catedrais


góticas e ram construídas por
várias ge raçõe s. Este e sforço
prolongado ajudava se us
participante s a organizar o
pe nsa m e nto, a grade ce r, e
sonhar.
Hoje o rom antism o acabou;
a construçã o é a pe na s m ais
um ne gócio. Entre tanto, o
de se jo de construir
pe rm a ne ce . Muita ge nte
de dica o final de suas vidas
para acabar um a casa, moldar
um pasto, le vantar um a
cape la.
Tam bé m nós pre cisa m os
e x e rce r e ste dire ito; se não
te m os um a cate dral,

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re construire m os nosso quarto.
Isto irá nos ajudar a conhecer
m e lhor que m som os. Isto vai
nos faze r m odificar um a série
de coisas que e stão nos
incom odando.
Tanto as igre jas com o os
hom e ns sofre m o desgaste do
te m po — e por isso não se
pode parar nunca.

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DO ERRO

Num dos m om e ntos m ais


trágicos da crucificação, um
dos ladroe s pe rce be que o
hom e m que m orre ao seu lado
é o Filho de De us. "Se nhor,
le m bra-Te de m im quando
e stive re s no Paraíso", diz o
ladrã o. "Em ve rda de , e starás
hoje com igo no Paraíso",
re sponde Je sus,
transform ando um bandido no
prim e iro santo da Igre ja
C atólica: São Dim as.
Não sabe m os por que razão
Dim as foi conde nado à morte.
Na Bíblia, e le confe ssa a sua
culpa, dize ndo que foi
crucificado pe los crim e s que
com e te u. Suponham os que

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te nha fe ito algo de crue l,
te ne broso o suficie nte para
te rm ina r daque la m ane ira ;
m e sm o assim , nos últim os
m inutos de sua e xistência, um
pacto de fé o re dim e — e o
glorifica.
Le m bre m os de ste e x emplo
quando, por algum a razão,
nos julgarm os incapaze s de
te r um a vida e spiritual.

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DO SUICÍDIO

C olin W ilson, hoje um


e scritor consagrado, descreve
sua te ntativa de suicídio aos
16 anos: "Entre i no laboratório
de quím ica da e scola, e peguei
o vidro de ve ne no. C oloque i
num copo diante de m im ,
olhe i bastante , re pare i na cor,
e im agine i o possíve l gosto
que te ria. Então, aprox im ei o
ácido de m e u rosto, e se nti
se u che iro; ne ste m om e nto,
m inha m e nte de u um salto até
o futuro — e e u podia se nti-lo
que im ando a m inha garganta,
abrindo um buraco no m e u
e stôm ago. A se nsa çã o dos
danos causados pelo ácido era
tão re al, que pare cia já tê -lo

21
be bido. Foi e ntão que tive
ce rte za que não que ria aquilo.
Fique i alguns m om e ntos
se gurando o copo e m minhas
m ãos, sabore ando a
possibilidade da m orte , até
pe nsar com igo mesmo: se sou
vale nte para m e m atar,
tam bé m sou vale nte para
continuar vive ndo".

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DO PILOTO

Um conhe cido m eu, piloto de


um a com panhia aére a da
Tunísia, com e nta: "na
a viação, te m os um a pa re lho
cham ado piloto autom ático,
que dirige o avião quando
che ga em de te rm ina da
altura."
Na vida dos adultos também
e x iste isto: com o nossas
actividade s vão ficando cada
ve z m ais com ple x as, e x iste
um m om e nto em que
pre cisam os de ix ar parte das
tare fas para o piloto
autom ático. Acontece que este
piloto autom ático, que
havíam os criado para cuidar
de coisas aborre cidas, ganha

23
vida própria, e com e ça a
inte rce ptar tudo que chega até
nós. Se u radar e stá ligado, e
e le se m pre m ove nosso avião
para longe de coisas que não
conhe ce . Assim , pe rde m os o
se ntido da ave ntura.
E que m pe rde o se ntido da
a ve ntura, de ce rta m ane ira
pe rde tam bé m o se ntido da
vida.

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DO CONTO

Um am igo m e u, Bruno
Saint-C ast, trabalha na
im plantação de alta tecnologia
na Europa. C e rta noite ,
se ntiu-se força do a e scre ve r
um te x to sobre um ve lho
a m igo de a dole scê ncia, que
havia e ncontrado no Tahiti.
Me sm o sabe ndo que teria que
acordar ce do no dia se guinte,
se ntou-se no com putador as 8
horas da noite , e só conseguiu
sair as 3 da m anhã — de pois
de have r e scrito a história
onde o tal am igo, John
Salm on, fazia um a longa
via ge m da P a tagónia a té a
Austrália. Enqua nto e scre via,
se ntia um a se nsação de

25
libe rdade m uito grande, como
se a inspiração brotasse sem
qua lque r inte rfe rê ncia .
Na m anhã se guinte, recebeu
um te le fone m a de sua m ãe:
e la a ca ba va de sabe r que o
John Salm on havia m orrido.

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DA REFORMA

Se is m e se s atrás, uma nova


m áquina de lavar e x igiu que
fizé sse m os um novo sistema
de canalização na área de
se rviço. Mudam os, o piso, e a
pare de pre cisou se r pintada.
No final, a áre a e stava m ais
bonita que a cozinha.
Para e vitar o contraste ,
re form am os a cozinha. Só
e ntão notam os com o a sala
e stava ve lha. R e fize m os a
sala, que te rm inou ficando
m ais acolhe dora que o
e scritório de quase de z anos.
R e fize m os o e scritório. Aos
poucos, a re forma se estendeu
pe la casa inte ira.

27
Espe ro que o que se passou
na m inha casa, se passe
tam bé m e m m inha vida.
Espe ro e star abe rto para as
pe que nas novidades; que elas
se m pre m e chamem a atenção
para tudo que pre ciso mudar.

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DA NECESIDA DE

C am inho com m e u e ditor


a m e rica no e sua m ulhe r, por
um parque . Pode m os ve r a
cidade de San Francisco ao
longe , ilum inada pe lo sol
poe nte . Sha ron e scre ve u um
livro sobre um m oste iro
be ne ditino, e conta que as
ora çõe s da tarde , cha m a da s
"vé spe ras", são cantos de
e spe rança pe la ce rteza de que
a noite passará.
"As vé spe ras nos indicam a
ne ce ssidade que temos de nos
aprox im ar do outro, quando a
noite che ga ", diz e la . "Nossa
socie da de pre za m uito a
capacidade que cada um tem
de lidar com as próprias

29
dificuldade s. Este
individualism o le va ao
de se spe ro e solidão. Fingimos
que não nos im porta a
ate nção dos outros; mas basta
um ge sto de carinho, e nossa
pose de he rói cai por te rra".
"Não te nho m e do de
de pe nde r do próx im o: e le
tam bé m e stá pre cisa ndo de
m im ."

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DA CUMBUCA

Eis a orige m do ditado:


"m acaco ve lho não bota a mão
e m cum buca ".
Na Índia, os caçadore s
abre m um pe que no buraco
num coco, colocam um a
banana de ntro, e e nte rram -
no. O m acaco se aprox im a,
pe ga a banana, m as não
conse gue tirá-la — porque sua
m ão fe chada não passa pela
a be rtura. Ao invé s larga r a
fruta, o m acaco fica ali
lutando contra o im possíve l,
a té se r a ga rrado.
O m e sm o se passa e m
nossas vidas. A ne ce ssidade
de te r de te rm inada coisa faz
com que te rm ine m os

31
prisione iros de la. Não
pe rce be m os que é m e lhor
pe rde r um pouco, do que
pe rde r tudo.
Pe rm a ne ce m os na
arm adilha, não abrim os mão
do que conse guim os. Nos
julgam os sábios, m as — no
fundo do coração — sabemos
que é um a idiotice agir assim.

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DA CRIA NÇA

O m onge Ste indl-R a st


com e nta:" a filha de um
am igo m e u disse ce rto dia:
papai, não é um a surpre sa
que e u e x ista?"
As crianças sabe m
intuitivam e nte com o é
m ilagrosa a vida. Nós também
sabe m os — porque ainda
som os crianças, e e ste nosso
lado infantil não m orre rá
nunca. Pode m os e sque ce r a
inge nuidade , trancá-la, dar-
lhe um a r de se rie da de e
re spe ito, m as e la continuará
e x istindo e nqua nto vivermos.
É m e lhor a ce itá-la .
Q ua ndo a pre nde m os a lição
de nossos dias, pre cisam os

33
com binar o e ntusiasmo infantil
com a sabe doria da
e x pe riê ncia . Para isto, é
ne ce ssário "nasce r de novo",
com o dizia Je sus.
Se hoje fosse o prim e iro dia
de sua vida, o que você
e staria faze ndo?

34
DO PROFETA

O que é um profe ta ? O
filósofo Augusto de Franco
de fine m uito be m a arte da
profe cia, que e stá de ntro de
cada um de nós.
Se gundo e le , o profe ta é
capaz de ante ve r um a
situação de te rm inada, com os
olhos da fé . Q uando
profe tizam os, não e stam os
de finindo o que irá acontecer;
na ve rdade , possibilitam os a
nós m e sm os — e aos outros —
a e scolha do m e lhor caminho.
O profe ta não adivinha. Ele
e stim ula a criação de um
futuro. Se us oráculos, ao
invé s de fe char um a
possibilidade , e stão nos

35
pre ve nindo das consequências
de nossas atitude s, e abrindo
novas alte rnativas.
O hom e m pode inventar seu
próprio futuro, se optar por
se guir se u próprio cam inho.
Para isto, e le pre cisa libe rtar-
se do passado, e das escolhas
que fize ram por e le — sem lhe
consultare m .

36
DO MITO

Q uando olham os e sculturas


e m cate drais antigas, imagens
que nos pare ce m absurdas,
gravuras e m ve lhos livros de
m itologia, notam os que
algum a coisa nos pare ce
fam iliar. E com pre e nde m os,
m e sm o se m e nte nde r.
Para pintore s e e scultore s
possuídos pe la fé , e ra m ais
im portante transm itir um
se ntim e nto que um a ide ia .
De se nhavam contrariando os
padrõe s artísticos da época, e
ousavam dividir sua alma com
outros. Me sm o cham ados de
tolos — ou de loucos — suas
criaçõe s e stão vivas a té hoje.

37
Não dê a m e nor im portância
para o que os outros acham
de você . Ningué m m e lhor que
você m e sm o para sabe r as
própria s qua lida de s e
lim itaçõe s.
Se você se de ix ar envenenar
pe la opinião alhe ia, e stá
pe rdido.

38
DO A MOR

Um jornalista pe rse guia o


e scritor francê s Albe rt Camus,
que re ndo que e x plica sse
de talha da m e nte o se u
trabalho. O autor de "A Peste"
se re cusava: "Eu e screvo, e os
outros julgam com o
e nte nde m ".
Mas o jornalista não
sosse gava. C e rta tarde ,
conse guiu e ncontrá-lo num
café e m Paris.
"A crítica viva acha que o
se nhor nunca aborda um tema
profundo", disse o jornalista.
"Eu lhe pe rguntaria agora: se
tive sse que e scre ve r um livro
sobre a socie da de , a ce itaria o
de safio?"

39
"C laro", re sponde u C amus.
"O livro te ria ce m páginas.
Nove nta e nove se riam e m
branco, pois não há o que
dize r. No final da ce nté sim a
página, e u e scre ve ria: "o
único de ve r do hom e m é
am ar"".

40
DO A MOR

Santo Agostinho e scre ve u


que , da m e sm a m ane ira que
um a cidade pre cisa de le is
para que se us habitante s
possam vive r juntos, o
hom e m pre cisa de um a única
le i — o Am or — para convive r
e m paz com o m undo
e spiritua l. O utra s pe ssoa s
falaram sobre e sta ve rda de
unive rsal: "O ve rdadeiro amor
não pe de re com pe nsa, m as
m e re ce um a" (São Be rnardo
de C laivaux ). "O amor é Deus;
e a m orte significa que um a
gota de ste am or deve retornar
a sua fonte " (Tolstoi). "As
ve rda de s de a m or são como o
oce a no: tra nspa rentes apenas

41
nos lugare s supe rficiais"
(Patm ore ). "Q uanto m ais
a m a m os a lgué m , m ais
pe ne tram os nos m isté rios de
todos" (Jalal-Ud-Dim ). "Onde
e x iste a possibilidade de ódio,
e x iste tam bé m a possibilidade
de am or; basta faze r um a
e scolha" (Tillich).

42
DO CONGRESSO

É m uito fácil julgar os


outros, quando não nos
colocam os na m esma situação
de le s. Um e x e m plo disto
ocorre u no C ongre sso do
Partido Com unista, quando
Nik ita Khrusche v — para
e spanto do m undo —
de nunciou os crim e s de Stalin.
Durante o discurso, alguém
gritou:
-O nde e stavas, cam arada
Khrushche v, e nqua nto os
inoce nte s e ra m m assacrados?
— Le vante -se que m disse
isto — pe diu Khrusche v.
Ningué m se m e x e u.
-Se ja você que m for, já
re sponde u à sua pe rgunta —

43
continuou Khrusche v. —
Naque le m om e nto, e u estava
na m e sm a posição e m que
você e stá a gora .

44
DA TRA DIÇÃ O

Em pra tica m e nte todas a s


re ligiõe s e culturas, a tradição
da hospitalidade e stá
pre se nte . Nos e va nge lhos,
Je sus divide se us dons com
hom e ns e m ulhe re s que o
acolhe m . Na tradição judaica,
Lot é salvo a o a colhe r
e strange iros que de pois se
re ve lam anjos. No Islã,
Moham m e d (Maom é ) diz:
"m a ldita a socie da de que não
a ce ita hóspe de s".
Todos som os hóspe de s
de ste m undo. Estamos aqui de
passage m e ntre um a vida e
outra — e não pode m os
carre gar nada alé m de nossos
bons ge stos. A tradição da

45
hospitalidade não pode morrer
e m nossas vidas, mesmo que
e x ista — de ve z e m quando —
ge nte que abusa de nosso
te cto e carinho. Se m pre que
a colhe m os a lgué m , nos
a brim os para a a ve ntura e o
m isté rio.

46
DA MENDIGA

Vim os a se nhora na esquina


da rua C onstante R am os, em
C opacabana. Estava num a
cade ira de rodas, pe rdida no
m e io da m ultidão. Minha
m ulhe r ofe re ce u-se para
a juda -la; a grade ce u, e
ace itou; pe diu que a le vasse
a té a Santa C la ra .
Alguns sacos plásticos
pe ndiam da cade ira de rodas.
No cam inho, contou-nos que
aque le s e ram todos os se us
pe rte nce s; dorm ia sob as
m arquise s, e vivia da caridade
alhe ia.
C he gam os ao lugar indicado.
Ali havia outros m e ndigos. A
m ulhe r da cade ira de rodas

47
tirou de um dos plásticos dois
pacote s de le ite Longa-Vida, e
e ntre gou-os a e le s.
“Faze m caridade com igo,
pre ciso faze r caridade com os
outros”, foi se u com e ntário.

48
DA RENOVA ÇÃ O

No de se rto de Mojave , é
fre que nte e ncontrarm os a s
fam osas cidade s-fantasm a:
construídas pe rto de minas de
ouro; e ra m a ba ndonadas
quando todo o produto da
te rra tinha sido e x traído.
Havia cum prido se u pape l, e
não tinha m ais se ntido
continuar se ndo habitadas
Q uando passeamos por uma
flore sta, tam bé m ve m os
á rvore s que — um a ve z
cum prido se u pape l,
te rm inaram caindo. Mas,
dife re nte das cidade s-
fanta sm a, o que a conte ce u?
Abriram e spaço para que a luz
pe ne trasse , fe rtilizaram o

49
solo, e te m se us troncos
cobe rtos de ve ge tação nova.
A nossa ve lhice vai depender
da m ane ira que vive m os.
Pode m os te rm inar como uma
cidade -fantasm a. O u e ntão
com o um a ge ne rosa árvore ,
que continua a se r importante,
m e sm o de pois de caída por
te rra.

50
DO CHÁ

No Japão, participe i da
conhe cida “ce rim ónia do chá”.
Entra-se num pe queno quarto,
o chá é se rvido, e nada mais.
Só que tudo é fe ito com tanto
ritual e protocolo, que um a
prática quotidiana transforma-
se num m om e nto de
com unhão com o Unive rso.
O m e stre do chá, O k ak usa
Kasuk o, e x plica o que
a conte ce : “a ce rim ónia é a
a dora çã o do be lo e do
sim ple s. Todo se u e sforço
conce ntra-se na te ntativa de
atingir o Pe rfe ito atravé s dos
ge stos im pe rfe itos da vida
quotidiana. Toda a sua beleza

51
consiste no re spe ito com que
é re a liza da .”
Se um m e ro e ncontro para
be be r chá pode nos
transportar até De us, o que
dize r das outras oportunidades
que aconte ce m todo dia — e
não nos dam os conta.

52
DOS COSTUMES

Um apre ndiz de ocultism o


que conhe ço, na e sperança de
im pre ssionar be m o se u
m e stre , le u alguns manuais de
m agia e re solve u com prar os
m ate riais indicados nos
te x tos.
C om m uita dificuldade ,
conse guiu de te rminado tipo de
ince nso, alguns talismãs, uma
e strutura de m ade ira com
caracte re s sagra dos e scritos
num a orde m de te rm inada.
Ve ndo isto, o m e stre
com e ntou: “Você acredita que,
e nrolando fios de computador
no pe scoço, conse guirá te r a
sabe doria da m áquina?
Acre dita que , ao com prar

53
chapé us e roupas sofisticadas,
vai adquirir tam bé m o bom -
gosto e a sofisticação de quem
as criou?
“O s obje ctos podem ser seus
aliados, m as não contê m —
ne le s m e sm os — qualquer tipo
de conhe cim e nto. Pratique
prim e iro a de voção e a
disciplina, e tudo o m ais lhe
se rá acre sce ntado.”

54
DOS PLA NOS

Estou andando pe la praia


com m inha m ulhe r, de
re pe nte e scuto um a m oça
dize ndo para a outra, de
m ane ira convicta: “Eu
program e i m inha vida da
se guinte m ane ira...”
Fique i pe nsando: se rá que
e la conta com a s coisa s que
a conte ce m , justa m e nte
quando não e stam os
e spe rando? Pe nsou que Deus
talve z te nha um plano
dife re nte , e m uito m ais
inte re ssante ? Le vou a sé rio a
hipóte se de que — ao incluir
outras pe ssoas na sua
program ação — e ste ja

55
inte rfe rindo e m ide ia s e
proje ctos distintos?
“Q ue m pode acre scentar um
til ou um jota a sua historia?”
diz Je sus C risto. Te m os uma
le nda pe ssoal para viver. Mas
e la se m anife sta a qui e agora,
e não nos planos que fazemos
para o futuro. O re sto é
de lírio.

56
DA DECISÃ O

Durante m inha viage m ao


Japão, para prom ove r “O
Diário de Um Mago”, perguntei
ao e ditor Masao Masuda, por
que os japone ses conseguiram
conquistar m e rcados que
a nte s e ra m dom inados pelos
a m e rica nos.
“Muito sim ple s”, re spondeu
Masuda-san. “O s am e ricanos
tê m um a ide ia , tra ncam -se
num a sala com pe squisas,
tom am de cisõe s, e gastam
um a e ne rgia im e nsa para
provar que e stavam ce rtos.
Nós não que re m os provar
nada a ningué m : de ix am os
que cada se r hum ano
m anife ste suas ne cessidades,

57
e procuram os soluciona-las. O
re sultado prático é que cada
um te rm ina com prando aquilo
que já de se java ante s.”
É im portante que o guerreiro
da luz use e sta e stra tégia em
sua vida. Q ue m só de se ja
de m onstrar que e stá ce rto,
te rm ina por agir e rrado.

58
DO SUICÍDIO

Um psiquiatra am igo conta


que — ao contrário da cre nça
popular, que atribui a
e scuridão a capacidade de
de prim ir as pe ssoas — a maior
parte dos suicídios ocorre de
m anhã. É justam e nte no
m om e nto de acordar que o
de pre ssivo se vê diante de sua
m aior dificulda de : e nfre ntar
um novo dia.
Isto nos le va a conside rar o
ve lho ditado árabe : o pior de
todos os passos é o primeiro.
Q uando e stam os prontos para
um a de cisão im portante ,
todas as forças se concentram
para e vitar que sigam os
a diante .

59
Já e stam os acostum ados
com isto. É um a ve lha le i da
física: que brar a iné rcia é
difícil. C om o não pode m os
m udar a física, conce ntremos
a e ne rgia e x tra e
conse guire m os dar o primeiro
passo. De pois o próprio
cam inho ajuda.

60
DOS DEFEITOS

Gilbe rto de Nucci te m um a


e x ce le nte im a ge m a re speito
de nosso com portam e nto.
Se gundo e le , os hom e ns
cam inham pe la face da Terra
e m fila indiana, cada um
carre gando um a sacola na
fre nte e outra a trás.
Na sacola da fre nte , nós
colocam os as nossas
qualidade s. Na sacola de trás,
guardam os todos os nossos
de fe itos.
Por isso, durante a jornada
pe la vida, m ante m os os olhos
fix os nas virtude s que
possuím os, pre sas e m nosso
pe ito. Ao m e sm o te m po,

61
re param os im pie dosam ente,
nas costas do com panhe iro
que e stá a diante , todos os
de fe itos que e le possui.
E nos julgam os m e lhore s
que e le — se m pe rceber que a
pe ssoa andando atrás de nós,
e stá pe nsando a mesma coisa
a nosso re spe ito.

62
DO CA SULO

O grande e scritor gre go


Nik os Kazantzak is (“Zorba, o
Gre go”) conta que , quando
criança, re parou num casulo
pre so a um a á rvore , onde
um a borbole ta pre pa ra va -se
para sair. Espe rou algum
te m po, m as — com o e stava
de m orando m uito — re solveu
a ce le ra r o proce sso. Começou
a e sque ntar o casulo com seu
hálito; a borbole ta te rm inou
saindo, m as suas asas ainda
e stavam pre sa s, e te rm inou
por m orre r pouco te m po
de pois.
“Era ne ce ssária um a
pacie nte m aturação fe ita pelo
sol, e e u não soube e sperar”,

63
diz Kazantzak is. “Aque le
pe que no cadáve r é , até hoje,
um dos m aiore s pe sos que
te nho na consciê ncia. Mas foi
e le que m e fe z e ntender o que
é um ve rda de iro pe cado
m ortal: forçar as grande s leis
do unive rso. É pre ciso
paciê ncia , a guarda r a hora
ce rta, e se guir com confiança
o ritm o que De us e scolhe u
para nossa vida”.

64
DO DESPOJA MENTO

C onhe ci a pintora Miie


Tam ak i durante um seminário
e m Kawaguchik o. Pe rguntei o
que pe nsava da re ligião."Não
te nho m ais re ligião", e la
re sponde u.
"Foi e duca da para se r
budista. Mas, com o passar do
te m po, com e ce i a ve r que o
cam inho e spiritual é um a
constante re núncia. Te m os
que supe rar nossa inve ja,
nosso ódio, nossas angústias
de fé , nossos de se jos. Fui me
livrando de tudo isto, até que
um dia m e u coração ficou
vazio: os pe cados tinham ido
e m bora, e m inha nature za
hum a na tam bé m .

65
"Durante algum te m po
ace ite i isto, m as notei que não
podia m ais com partilhar da
vida a m inha volta. Foi e ntão
que largue i a re ligião. Hoje
te nho m e us conflitos, m e us
m om e ntos de raiva e de
de se spe ro, m as se i que estou
de novo pe rto dos hom e ns —
e conse que nte m e nte perto de
De us".

66
DA UTILIDA DE

Je an passe ava com seu avô


por um a praça de Paris. A
de te rm inada altura, viu um
sapate iro se ndo de stratado
por um clie nte , cujo calçado
apre se ntava um de fe ito. O
sapate iro e scutou calmamente
a re clam ação, pe diu
de sculpas, e prom eteu refazer
o e rro.
Pararam para tomar um café
num bistro. Na m e sa ao lado,
o garçon pe diu que um
hom e m -`com aparê ncia de
im portante — m ove sse um
pouco a cade ira, para abrir
e spaço. O hom e m irrom pe u
num a torre nte de
re cla m a çõe s, e ne gou-se .

67
"Nunca e sque ça do que viu",
disse o avô. "O sapate iro
a ce itou um a re cla m a çã o,
e nqua nto e ste homem a nosso
lado não quis m ove r-se . O s
hom e ns úte is, que fazem algo
útil, não se incom odam de
se re m tratados com o inúteis.
Mas os inúte is se m pre se
julgam im portante s, e
e sconde m toda a sua
incom pe tê ncia a trás da
autoridade ".

68
DO PRESENTE

Miie Tam ak i re solve u largar


tudo que fazia — e ra
e conom ista — para dedicar-se
à pintura. Durante anos
procurou um m e stre
a de quado, a té que e ncontrou
um a m ulhe r e spe cia lista e m
m iniaturas, que vivia no Tibet.
Miie de ix ou o Japão e foi para
as m ontanhas tibe tanas,
a pre nde r o que pre cisa va .
Passou a m orar com a
profe ssora, que e ra
e x tre m a m e nte pobre .
No final do prim e iro ano,
Miie voltou ao Japão por
a lguns dia s, e re tornou a o
Tibe t com um carro che io de
pre se nte s. Q ua ndo a

69
profe ssora viu isto, começou a
chorar, e pe diu que Miie não
voltasse m ais a sua casa,
dize ndo: "Ante s, nossa relação
e ra de igualdade e amor. Você
tinha te cto, com ida, e tintas.
Agora , a o m e tra ze r e ste s
pre se nte s, você e stabe le ce
um a dife re nça socia l e ntre
nós. Se e x iste e sta diferença,
não pode e x istir compreensão
e e ntre ga ".

70
DA FLA UTA

C re io que grande parte dos


le itore s assistiu o film e
"Am ade us": m assacrado pela
crítica m usical de sua é poca,
que o a cusa va de supe rficial,
W olfa ng Am a de us Mozart
consola va -se sabe ndo que o
público gosta va e a poiava sua
arte .
Sua últim a ópe ra , "A Fla uta
Mágica", m ostra um Mozart de
um a le ve za e x tra ordiná ria —
ignorando por com ple to a
filosofia sinistra que complica
a vida. Para um am igo, o
com positor e x plicou o porquê
de tanta sua vida de : "A vida é
pe rm a ne nte . Ele não pre cisa
de significados ocultos para

71
m ostrar sua be le za e sua
e te rnidade . De us não está na
tortura da alm a ou nas
confusõe s do pe nsam e nto,
m as na capacidade que o
hom e m te m — de sde os
te m pos m ais re m otos — de
olhar a s e stre la s e ficar
com ovido."

72
DO METRO

Te rry Dobson viajava num


m e tro e m Tóquio, quando um
bê bado e ntrou, e com e çou a
ofe nde r todos os passageiros.
Dobson, que e studava arte s
m arciais há alguns anos,
e ncarou o hom e m . "O que é
que você que r?" pe rguntou o
bê bado. Dobson pre parou-se
para a ta ca -lo. Ne ste
m om e nto, um ve lhinho
se ntado num dos bancos,
gritou: “Ei!” "Vou bate r no
e strange iro, de pois bato e m
você !", disse o bê bado.
"Eu tam bé m costum o
be be r", disse o ve lho. "Sento-
m e todas as tardes com minha

73
m ulhe r, e tom am os sak ê .
Você te m m ulhe r?"
O bê bado ficou desnorteado.
e re sponde u: "não te nho
m ulhe r, não te nho ningué m.
Só te nho ve rgonha de m im ".
O ve lho pe diu que o bêbado
se ntasse ao se u lado. Quando
Dobson de sce u, o hom e m
e stava chora ndo.

74
DO OLHA R PA RA SI

Q ua ndo e u m e e ncontrava
faze ndo o cam inho de Roma,
um dos quatro cam inhos
sagrados de m inha tradição
m ágica, m e de i conta —
de pois de quase vinte dias
pra tica m e nte sozinho — que
e stava m uito pior do que
quando havia começado. Com
a solidã o, e u com e ce i a te r
se ntim e ntos m e squinhos,
am argos, pe que nos.
Procure i a guia do cam inho,
e com e nte i o fato. Disse que,
ao iniciar aque la peregrinação,
ache i que ia m e aprox im ar
m ais de De us. Entre tanto —
de pois de tantos dias —

75
e stava m e se ntindo m uito
pior.
-"Você e stá m e lhor, não se
pre ocupe " — disse e la. "Na
ve rda de , qua ndo acendemos a
luz de nossas alm as, a
prim e ira coisa que vemos são
a s te ias de a ra nha e a poeira,
nossos pontos fracos. Mas
e sta é a oportunidade de
corrigi-los. Nunca de ix e que a
consciê ncia de suas fraquezas
lhe assuste ".

76
DO VA ZIO

As ve ze s som os possuídos
por um a se nsação de tristeza
que não conse guim os
controlar. Não im porta o lugar
onde e stam os — no trabalho,
junto da pe ssoa a que m
am am os, num a fe sta — mas,
se m qua lque r e x plica çã o, o
m undo pe rde se u colorido, e a
vida e sconde sua m agia .
Ne ste s m om e ntos — nos fala
Kare n C ase y — nada m e lhor
que olhar para de ntro de nós
m e sm os. Ali e stá um a criança
com m e do, que não sabe bem
o que e stá faze ndo a qui,
porque quase não é ouvida e
consultada. Vam os se r
tole rante s com e sta criança .

77
Vam os de ix ar que ela tome as
ré de as por quanto te m po for
ne ce ssário, até que se ntir-se
de novo am ada.
Em bre ve , nossos olhos
voltam a brilhar. E, a partir
daí, se não pe rde m os m ais o
contacto com e sta criança,
não pe rde re m os m ais o
se ntido da vida.

78
DE PA PA I NOEL

Jose ph C am pbe ll nos diz: "o


prim e iro choque do hom e m
m ode rno com o m undo
m ágico aconte ce quando e le
de scobre que Papai Noe l não
e x iste ".
C am pbe ll, um dos m aiores
e studiosos de m itologia de
nossos te m pos, não e stava
brincando. Q uando nos damos
conta que toda a fanta sia
criada e m torno dos presentes
de Natal e ra a pe na s fruto de
um a tra diçã o, a cham os que
todas as tradiçõe s são iguais.
Se Papai Noe l não e x iste , é
possíve l que não e x ista Deus,
Anjo da Guarda, Vida após a
Morte . C om m e do de nova

79
de silusão, e m pobre ce m os
nosso m undo, e desconfiamos
de qualque r m ilagre .
Não som os m ais crianças.
Pode m os convive r com as
de ce pçõe s ine re nte s ao
próprio cam inho e spiritual —
a liás, e ste é um caminho cheio
de de ce pçõe s. Mas, que m
pe rsistir, che ga lá.

80
DO CUIDA DO COM A S
PA LA VRA S

Q uantas ve ze s dizemos para


a lgué m : "pux a , faz tempo que
não discuto com fulano". Ou:
"nunca m ais tive um a gripe".
E de re pe nte , no dia seguinte,
pe gam os um a gripe ou
discutim os com fulano.
Então concluím os: se
falam os a s coisa s boa s que
aconte ce m connosco, isto traz
m á sorte .
Nada disso. Na ve rdade , a
Alm a do Mundo — ante s de
qualque r proble m a — sempre
nos m ostra quanto te m po
ficam os se m nos aborre ce r
com de te rm inada coisa. Ela
que r nos dize r com o a vida

81
te m sido ge ne rosa até aquele
m om e nto — continuará sendo,
se supe rarm os com bravura o
obstáculo.
Mante nha as palavras
positivas no ar. Elas vão lhe
a juda r a cre sce r e m qua lquer
dificuldade .

82
DA SOMBRA DO HOMEM

Elie W ie se l, pré m io Nobel de


lite ra tura , e scre ve : "De us é a
som bra do hom e m . Assim
com o a som bra re pe te os
m ovim e ntos do corpo, De us
re pe te os m ovim e ntos da
alm a".
De sta m ane ira, se m pre
e x iste um a re lação e ntre o
que faze m os e o que
re ce be m os e m troca. Se
som os ge ne rosos, a "sombra
de De us" re pe te os
m ovim e ntos que fize m os em
be ne fício do nosso próximo, e
nos dá com ge ne rosidade dez
ve ze s m aior. Se somos cruéis,
e sta nossa crue ldade se

83
re fle cte no pla no a stra l, e
tam bé m re torna.
Muita ge nte justifica sua
própria infe licidade ,
argum e ntando que e stá
pagando agora o que fe z em
vidas passadas. Ex iste m
alguns raros casos e m que
isto aconte ce , e — m e sm o
ne ste s casos — um verdadeiro
acto de am or apaga qualquer
culpa. De ve m os nos
conce ntra r e m m ovimentos de
harm onia, para que a sombra
que proje ctam os no m undo
e spiritual se ja se m pre um ato
de louvor a De us.

84
DA MÍSTICA

O te x to é de Le onardo Boff:
"C aptar De us é tê -Lo e m
todas as dim e nsõe s da vida,
não a pe na s e m situa çõe s
privile giadas, como quando se
com unga ou se re za. Te r a
e x pe riê ncia de De us se m pre
— andando na rua, respirando
o ar poluído, ale grando-se ,
tom ando ce rve ja, procurando
e nte nde r um te x to que se
e ste ja e studando. De us vem
m isturado com tudo isto; e
qua lque r situa çã o é
suficie nte m e nte boa para
capta-Lo e dize r: "Ele anda
connosco".
"A cha ve do m ístico é
procurar ve r o que e stá por

85
trás de cada coisa, o que a
constitui e suste nta. Não ficar
pre so ao supe rficial, — m as
faze r de tudo um símbolo, um
sinal, um sacram e nto, um a
im age m ".
"Pa ra que m te m a
e x pe riê ncia de Deus, o mundo
é um a gra nde m e nsa ge m ".

86
DA PRESENÇA

C he go e m Madrid a s 8 da
m anhã. Vou ficar ape nas
algum as horas, de m odo que
não adianta te le fonar para
a m igos e , m arca r a lgum
e ncontro. R e solvo cam inhar
sozinho por lugare s que m e
são que ridos, e te rm ino
se ntado num banco do parque
R e tiro.
"Você pare ce que não e stá
aqui", diz um ve lho que se
aprox im a.
"Estou há oito anos atrás,
e m 1986", re spondo. "Sentado
ne ste banco com um am igo
pintor. C onve rsando sobre um
assunto absurdo: onde tomar
aulas de dança".

87
"Aprove ite e sta be nção", diz
o ve lho. "Mas saiba que um
pouco de sal dá te m pe ro a
com ida, m uito sal e straga o
alim e nto. É pre ciso m uito
cuidado com as le m branças —
ou você acabará sem presente
para re cordar".

88
DA REA LIDA DE

Sartre diz: "o hom e m é


aquilo que de cidiu que de via
se r". Aos 20 anos, o fam oso
com positor m e x icano Augustin
Lara viu naufragar o navio
onde via ja va . Durante horas,
lutou contra as ondas —
jurando a De us que , se
che ga sse à pra ia , esqueceria o
passado e com e çaria nova
vida.
Lara che gou num a pra ia de
Tacotlapan, Ve racruz. Embora
nascido e criado na cidade do
Mé x ico, cum priu se u
juram e nto — e passou a dizer
a todos que Tacotaplan e ra
sua te rra natal.

89
Em 1968, Lara com e morou
70 anos de vida. Vários
jorna listas foram a fe sta e m
Tacotapla n — e a li, escutaram
histórias de ve lhos que havia
brincado com Lara e m sua
infância, as ruas onde fez suas
prim e iras cançõe s. No
m om e nto m ais im portante da
fe sta , o pre fe ito de Tacotaplan
lhe de u a s cha ve s da casa
onde nasce u!

90
DO A FECTO

H. Bloom fie ld soube que o


pai fora hospitalizado de
re pe nte : "Enquanto viajava
para Ne w York , pe nsava que
tinha chance de fazer com que
e sta visita fosse dife rente das
de m ais. Se m pre tive ra medo
de m ostrar m e u afe cto,
se m pre quis m anter a mesma
distância prude nte que m e u
pai m antinha com igo. Quando
o vi na cam a, che io de tubos,
de i-lhe um abraço. Ele se
surpre e nde u. "Abraça-m e
tam bé m , papai", e u pe di. Ele
m e havia e ducado dize ndo
que um hom e m nunca
de m onstra se us se ntimentos.
Mas insisti. Papai le vantou os

91
bra ços e m e tocou. Ali e stava
e u, pe dindo a m eu pai que me
m ostrasse o quanto me queria
— e m bora e u já soube sse ".
"Se nti suas m ãos na m inha
cabe ça e — pe la prim e ira vez
— e scute i as palavras que seu
coração dizia, m as que se us
lábios jam ais haviam
pronunciado. "Te am o", disse
e le . E, a partir do m om e nto
e m que te ve corage m de
m ostrar se u am or, re cuperou
sua vontade de vive r."

92
DO UNIVERSO

"Mak tub" significa: "e stava


e scrito".
Em 1991, "O Alquim ista" foi
ofe re cido à Maison R obe rt
Laffont, um a das três maiores
e ditora s fra nce sas.
R e cusado. No ano se guinte,
nova ofe rta; nova re cusa.
Anne , filha de Laffont,
passava as fé rias e m Ibiza,
quando ganhou um a cópia do
livro e m inglê s.
"Por que não e ditam os?",
pe rguntou ao pai.
"Já foi re cusado duas
ve ze s", re sponde u Laffont.
Anne de scobriu o m otivo; a
brasile ira e ncarre gada da
se le cção ne m o tinha abe rto,

93
a le ga ndo que não e ra
conside rado pe la crítica. "Pois
vou e dita-lo", disse Anne . "E
fare i o m e lhor".
Esta se m ana, com o livro
e logiado pe la crítica local, e
nas listas de m ais vendidos da
França, Anne te le fonou:
"Mande um pre se nte à
brasile ira que re cusou se u
livro. Há trê s anos, se ria
a pe na s lança m ento perdido no
m e io de outros. Agora foi um
de safio pe ssoal meu. Maktub!"

94
DO RETORNO

O s laços de am or criam uma


re lação m ais forte do que
supom os. J. R hine e Sara
Fe athe r, do Laboratório de
Parapsicologia da Universidade
de Duk e , cole ccionaram uma
sé rie de casos sobre as m ais
dive rsas m anife stações desta
re lação — inclusive com os
anim ais. Eis um de stes casos:
Um rapaz, Hugh Brady,
costum ava cuidar dos pombos
que viviam pe rto de sua casa.
C e rta ve z, e ncontrou um a
de sta s a ve s fe ridas; curou-a,
alim e ntou-a, e colocou na
pata dire ita um a e tiqueta com
o núm e ro 167.

95
No inve rno se guinte , Hugh
te ve que se r ope ra do de
e m e rgê ncia. Enqua nto se
re cupe rava, num hospital
longe de sua casa, e scutou
algo bate ndo na jane la. Pediu
a e nfe rm e ira que a brisse; um
pom bo e ntrou voando pe lo
qua rto a de ntro, e pousou no
pe ito do rapaz.
Na pata dire ita e stava a
e tique ta com o núm e ro 167.

96
DA A CÇÃ O

Mahatm a Gandhi lutou sua


vida inte ira, m as conse guiu
libe rtar a Índia do dom ínio
inglê s. Q uando lhe disse ram
que e ra um dos m aiore s
nom e s jam ais surgidos na
História Unive rsal, respondeu:
"Nada te nho de novo para
e nsinar ao m undo. A verdade
e a não violê ncia são tão
antigas quanto as montanhas.
Tudo o que te nho fe ito é
te nta r pra tica -las na e scala
m ais vasta que m e é possível.
Assim faze ndo, e rre i algumas
ve ze s e apre ndi com m e us
e rros.
"O s que acre ditam nas
ve rdade s sim ple s que expus,

97
só pode m propaga-las se
vive re m de acordo com e las.
Estou absolutam e nte
conve ncido de que qualque r
hom e m ou m ulhe r pode
re alizar o que re alize i, se fizer
o m e sm o e sforço e cultivar a
m e sm a e spe rança e fé ."

98
DA GA RRA FA

C e rta m anhã, e u caminhava


com um am igo arge ntino pelo
de se rto do Mojave , quando
vim os algo brilhando no
horizonte ; e m bora nosso
de stino fosse ir até um
"canyon", m udam os nosso
cam inho para ve r o que emitia
tal brilho. Durante quase uma
hora, de baix o de um sol cada
ve z m ais forte , nos dirigimos
para lá — e só conse guim os
de scobrir o que e ra quando
che gam os.
Era um a garrafa de ce rveja,
vazia . De via e star a li há anos;
a a re ia tinha cristaliza do no
se u inte rior. C om o o de se rto
já e stava m uito quente aquela

99
hora, de cidim os não ir m ais
a té o "ca nyon". Na volta , e u
pe nsava: quantas ve ze s
de ix am os de se guir o nosso
cam inho, atraídos pe lo falso
brilho do cam inho ao lado?
Mas pe nsava também: se eu
não fosse até lá, com o ia
sabe r que e ra apenas um falso
brilho?

100
DO PA DRE

Escute i no re staurante :
— Você de ve de ix ar e ste
e m pre go e faze r os tais
obje ctos de acrílico.
— Prim e iro pre ciso ganhar
dinhe iro.
— Você disse que e stá
ganhando m al, pé ssim o.
— De qualque r m ane ira é
um a se gurança.
— Mas você disse que pode
ganhar dinhe iro com os tais
obje ctos.
— Posso. Te nho ce rte za.
Te nho até e ncom e ndas.
— Então por que não larga
tudo?
— Porque pre ciso de
dinhe iro.

101
— Mas você não e stá
ganhando dinhe iro no
e m pre go!
— Mas pe lo m e nos é um a
garantia. Não e nche , vam os
com e r.

102
DA NEGA ÇÃ O

Josiah R oyce (1855-1916),


num m om e nto e m que morre
algué m m uito que rido,
e scre ve e stas palavra s: "Nós
m orre m os e nquanto Tu
pe rm a ne ce s. A e te rnidade é
Tua . E, na e te rnidade ,
se re m os le m brados não como
pontos insignificante s de ste
m undo re al m as com o folhas
sadias que , e m um ce rto
m om e nto, flore sce ram nos
ram os da Árvore da Vida.
Estas folha s cae m da á rvore,
m as não cae m no
e sque cim e nto, Porque Tu
se m pre Te le m brarás de las."

103
DE SÃ O FRA NCISCO

Ne lson Liano foi a Be lo


Horizonte para um a
confe rê ncia . No hote l, alguém
lhe de u um a oração, O Cântico
das C riaturas, e disse que era
de São Francisco de Assis.
Ne lson achou o te x to mas tão
be lo que , na abe rtura da
pale stra, le u se us ve rsos e
citou o autor.
De volta ao hote l, se ntiu-se
culpado: que m garantia que a
ora çã o e ra de São Fra ncisco?
Se rá que havia e nganado a
pla te ia ? P e rguntou a se us
am igos, ningué m tinha ouvido
falar no te x to.
A próx im a confe rê ncia e ra
em O uro Pre to; ficou

104
hospe dado na casa de um dos
habitante s da cidade . De
noite , ante s de dorm ir, Nelson
foi a té a e stante do qua rto, e
sorte ou um livro para le r.
Era o te x to de um
cate drático italiano,
de scre ve ndo o processo usado
por Francisco de Assis para
e scre ve r "O C â ntico das
C riaturas".

105
DA TA RTA RUGA

C la udia Martins ve m se rvir


nossa m e sa — num café e m
San Die go, C alifórnia. Conheci
Cláudia no Brasil há quatro
a nos, e conto a os a m igos a
vida que e stá le vando nos
EUA: dorm e a pe na s três horas
— pois trabalha no café até de
m adrugada, e é baby-sitte r
durante o dia inte iro.
— "Não se i com o ague nta",
diz algué m .
— "Ex iste um conto budista
sobre um a tarta ruga ",
re sponde um a a rge ntina e m
nossa m e sa. "Ela cam inhava
por um pântano, suja de
lam a, quando passou diante
de um te m plo. Ali viu um

106
casco de tartaruga todo
adornado de ouro e pe dras
pre ciosas. "Não te inve jo,
antiga am iga", pe nsou a
tarta ruga . "Você e stá coberta
de jóias, m as e u e stou
faze ndo o que que ro"".

107
DO KOSMOS

Em 1982 e u re solvi largar


tudo e corre r o m undo — até
e ncontrar um se ntido para
m inha vida. Ne stas andanças,
vivi um a é poca na Holanda,
onde fre que ntava o Kosmos —
local onde se re uniam as
pe ssoas com que m e u tinha
afinidade .
C e rta noite , um a holandesa
m e pe rguntou com o e ra o
Brasil.
Eu com e ce i a falar de nossos
proble m as, da falta de
libe rdade (vivíam os sob
re gim e m ilitar), da miséria, da
dificuldade de vive r com o
artista.

108
— "Mas você s vive m no
m e lhor lugar da Te rra", e u
disse . "C om o é vive r no
paraíso?"
A holande sa ficou um longo
te m po quie ta. Então
re sponde u: "É a coisa m ais
chata do m undo. Aqui e stá
tudo ce rtinho, não sobrou
ne nhum de safio, ne nhum a
e m oçã o. O x a lá e u tive sse os
se us proble m as — e ntão
voltaria a se ntir-m e parte da
hum a nida de ".

109
DA FÓRMULA

Estava com m e u m e stre ,


assistindo um a partida de
x adre z num parque e m San
Die go, C alifórnia. -"Seria mais
fácil se a busca e spiritua l
pude sse te r fórm ulas com o
e ste jogo", e u com e nte i.
— "Sabe de onde ve m a
palavra fórm ula?", pe rguntou
e le rindo. "Ve m do latim forma
— o re cipie nte onde
colocam os a m assa para fazer
um bolo. Já im aginou
a prisiona r De us, o Unive rso,
os a njos, a e te rnidade — tudo
num a form a? Pode m os
inspira r-nos e m e x e m plos.
Mas se guir adiante im itando
os passos , a fórm ula, a forma

110
dos outros é e m pobre ce r a
vida e m atar o e ntusiasmo da
Busca. O de safio é individual;
pode se r m ais difícil, m as é
m uito m ais anim ado, rico e
inte re ssante ."

111
DO FA MOSO

Erne st He m ingway, o autor


do clássico "O Ve lho e o Mar",
m isturava m om e ntos de dura
actividade física com períodos
de inactividade total. Antes de
se se nta r para e scre ve r a s
páginas de um novo romance,
passava horas de scascando
laranjas e olhando o fogo.
C e rta m anhã, um re pórte r
notou e ste e stranho hábito.
— "Você não a cha que e stá
pe rde ndo te m po?", perguntou
o re pórte r. "Você que é tão
fam oso, não de via fazer coisas
m ais im portante s?"
— "Estou pre pa ra ndo a
m inha a lm a para e scre ve r,
com o um pe sca dor pre pa ra

112
se u m ate rial ante s de sair ao
m ar", re sponde u He m ingway.
"Se e le não fize r isto, e a char
que só o pe ix e é im porta nte,
jam ais irá conse guir coisa
algum a".

113
DE SE PERDER

Marce lo, m arido de um a


produtora de te le visão, estava
pe rdido e m Los Ange le s,
C alifórnia. Durante horas
vagou se m rum o, e , já tarde
da noite , te rm inou e ntrando
num a á re a pe rigosa.
Pe rce be ndo o a m bie nte à sua
volta, ficou ne rvoso e resolveu
tocar a cam painha de um a
casa com luz ace sa. Um
hom e m de pijam a ate nde u.
Marce lo e x plicou a situa ção e
pe diu que cham asse um táxi.
Ao invé s de faze r isto, o
hom e m ve stiu-se , tirou o
carro da garage m , e foi le vá-
lo a té a o hote l.

114
No cam inho, e x plicou: "há
cinco anos atrás, e stive no
Brasil. C e rta noite , pe rdi-m e
e m São Paulo. Eu não falava
um a palavra de portuguê s,
m as um rapaz brasile iro
te rm inou por e nte nde r o que
e u que ria, e le vou-m e a té ao
hote l. Hoje , De us permitiu-me
saldar e sta dívida".

115
DA GA IVOTA

Estava num pie r e m San


Die go, C alifórnia, conversando
com um a m ulhe r da Tradição
da Lua — um tipo de
apre ndizado fe m inino que
tra ba lha e m harm onia com as
forças da nature za.
— "Q ue r tocar num a
gaivota?", pe rguntou e la
olhando as ave s na am urada
do pie r.
C laro que sim . Mas se m pre
que m e aprox im ava, e las
voavam .
— "Procure se ntir am or por
e la . De pois, faça e ste a m or
jorrar do se u pe ito com o um
fe ix e de luz, atingindo o peito

116
da gaivota. E aprox im e -se
com calm a".
Fiz o que e la m andou. Duas
ve ze s não consegui nada, mas
na te rce ira — com o se e u
tive sse e ntra do e m "transe ",
conse gui tocar a gaivota.
R e pe ti o "transe ", com o
m e sm o re sultado positivo.
C onto a qui a e x pe riê ncia ,
para que m quise r te ntar. "O
a m or cria ponte s e m lugare s
que pare ce m im possíveis", diz
a m inha a m iga fe itice ira.

117
O SEXO

O fam oso com e diante


Groucho Marx e scre ve u um
be m -hum orado, m as
se ríssim o, te x to sobre a
paix ão:
— "Eu acre dito que o am or
ve rda de iro só a pa rece quando
o fogo inicial da paix ão
dim inuiu, e a s bra sa s ficaram
a li a rde ndo." Isso é a m or.
Este tipo de re lação só
conhe ce o se x o de vista e de
le m brança . Sua s parte s
com pone nte s são a paciência,
o pe rdão, o e nte ndim e nto
m útuo, e um a gra nde
tole rância pe las faltas do
outro.

118
— "A paix ão é um truque . É
um a pe na que , com o diz
Sha w, justa m e nte qua ndo
duas pe ssoas se e ncontram
sob a influê ncia da m ais
viole nta, insana, e ilusória das
paix õe s, se m pre apare ce
algué m e x igindo que
pe rm ane çam continuam e nte
ne sta condição e x citada,
a norm al e e x a ustiva , a té que
m orte os se pare ".

119
DA FÉ

Muitas pe ssoas dizem: "sigo


a m inha re ligião individual".
Q ue bobage m ! O C am inho é
individual. Mas e le não existe
se m a de voção cole ctiva —
se ja católica, prote stante ,
judia, islâm ica, e tc.
Anthony Me llo, é autor de
e x ce le nte s livros, com
histórias de dive rsas
tradiçõe s. Na de dicatória de
um de le s, sinte tiza, com rara
be le za, a im portância da
re ligião: "Não posso esconder
dos le itore s a m inha condição
de sace rdote católico.
Pe re grine i por bom te m po, e
livre m e nte , por tradições não-
cristãs, e a té m e sm o não-

120
re ligiosas. Elas e nriqueceram-
m e , e e x e rce ram gra nde
influê ncia na m inha m ane ira
de pe nsar. A Igre ja, porém, é
m e u lar e spiritual. Te nho
noção das suas lim itaçõe s, e
a té m e sm o de sua e stre iteza
ocasional — o que m e de ix a
e m baraçado. Mas isto nunca
irá de struir o facto de que foi
e la que m e form ou, m e
m oldou, e fe z de m im o que
sou".
Pratique sua re ligião, se ja
e la qua l for. Todos nós
pre cisam os de um lar
e spiritua l.

121
DO A PENDICITE

A m á inte rpre tação da Nova


Era pode ge rar confusõe s
pe rigosas. Um a de las re fere-
se à saúde : acre dita-se que a
m e nte é capaz de tudo, que as
coisas só aconte cem connosco
porque pe rm itim os.
Não é ne m nunca se rá
assim . Um a coisa é o poder da
pre ce — capaz de ope rar
m ilagre s. O utra coisa é deixar-
se dom inar por um sentimento
de om nipotê ncia que pode ser
fatal.
Um a am iga próx im a foi
subm e tida a um a cirurgia de
e m e rgê ncia. Soubemos depois
que tive ra a pe ndicite , e que
fora inte rnada e m e stado

122
gravíssim o. Q uando já se
re cupe rava, o m é dico foi
conve rsar com e la: "A
ape ndicite dá m uitos sinais;
dore s, fe bre alta, e tc. Por que
não ve io ante s?
— "Ve jo a doe nça como uma
re sposta do corpo a um
e nfraque cim e nto da mente —
re sponde u e la. — Te nte i lutar
por m im m e sm a".
E, por causa disto, quase
m orre u. Muito cuidado, gente.

123
DE COMO ERA

Je sus de ve te r pe nsado
m uito be m e m suas atitudes.
Sabia que e la s se ria m
com e ntadas pe los sé culos
vindouros, e pre cisa va dar o
e x e m plo.
Se u prim e iro m ilagre ? Não
foi curar um ce go, faze r um
cox o andar, e x orcizar um
de m ónio: m as transform ar
á gua e m vinho, e a nim a r a
fe sta.
Se us com panhe iros? Não
foram os que com andavam a
cultura e a re ligião da é poca;
m as hom e ns com uns, que
viviam de se u trabalho.
Suas com panhe iras? Não
e ra m com o Marta , que fazia

124
a plica da m e nte a tare fa
dom é stica; m as com o Maria,
que o se guia com libe rdade .
O prim e iro Santo? Não foi
um apóstolo, ne m discípulo,
ne m um fie l se guidor; m as o
ladrão que m orria ao seu lado.
O suce ssor? Não foi aque le
que m ais se aplicou e m
apre nde r se us e nsinamentos;
m as que m o ne gou no
m om e nto e m que m ais
pre cisa va de a juda .
Enfim , nada do que
m andava o m anual do bom
com portam e nto.

125
DA SA BEDORIA

No inte rior da Paraíba, junto


a Pe dra do Ingá, conhe ci um
hom e m analfabe to, se m
qua lque r cultura a lé m da
tradição oral. Na m e ia-hora
que passám os juntos, disse-
m e coisas que só os m e stres
dize m .
Num apartam e nto de
cobe rtura, e m Ne w York, junto
ao C e ntral Park , conhe ci um
hom e m que falava cinco
línguas. Tinha um a vasta
bibliote ca sobre m agia.
Passám os trê s horas
conve rsando, e e le disse -me
coisa s que a pe na s os
discípulos dize m .

126
E, outro dia, conhe ci outro
hom e m analfabe to e se m
cultura , que e m m e ia-hora
falou ape nas tolice s.
E, passado um te m po,
conhe ci outro hom e m culto,
poliglota, que m e abriu os
olhos para coisas
im portantíssim as.
Isto tam bé m já aconte ce u
com você . Portanto, te ntar
e stabe le ce r re gras,
pre conce itos, ou padrõe s,
a pe na s e m pobre ce nossa
busca . Estar a be rto para a
vida, é e star a be rto para o
próx im o. Q uando nosso anjo
usa as pe ssoas para nos dar
algum re cado, não as escolhe
da m ane ira que e scolhe mos.

127
DA MA ÇÃ

O cine asta R ui Gue rra


contou-m e que — ce rta noite
— conve rsava com am igos
num a casa no inte rior de
Moçam bique . O país e stava
um a gue rra, de m odo que
faltava tudo — de sde gasolina
até ilum inação. Para passar o
te m po, com e çaram a falar
sobre o que gostariam de
com e r. C ada um foi dize ndo
se u pra to pre fe rido, a té que
che gou a ve z de R ui. "Eu
gostaria com e r um a m açã",
disse , sabe ndo que e ra
im possíve l e ncontrar frutas,
por causa do racionam e nto.
Ne ste e x a cto m om e nto,
e scutaram um barulho. E uma

128
re luze nte , sucule nta m açã
e ntrou rolando na sala e parou
e m fre nte a e le !
Mais tarde , R ui de scobriu
que um a das m oças que
viviam ali tinha ido buscar
frutas no m e rcado ne gro. Ao
volta r, subindo a e scada,
le vou um trope ção e caiu; a
sacola de m açãs que havia
com prado abriu-se , e um a
de las rolou sala ade ntro.
C oincidê ncia? Be m, isto seria
um a palavra m uito pobre para
e x plicar e sta história.

129
DA CRIA NÇA

Logo de pois do lançamento


de "O Alquim ista", e u precisei
passar um te m po fora do
Bra sil. Vivia pre ocupado com o
que e stava a conte ce ndo com
o livro por aqui.
Um dia, caiu-m e nas mãos o
te x to a se guir. E e u m e
e ncontre i de novo com igo
m e sm o.
— "Se você re alm e nte fosse
criança , um a ve rda de ira
criança, ao invé s de
pre ocupar-se com o que não
pode faze r, conte m plaria a
C riação em silê ncio. E
habitua r-se -ía a olhar
calm am e nte o m undo, a
nature za, a história, o cé u.

130
— "Se você re alm e nte fosse
criança , e staria ne ste
m om e nto cantando ale luia
para a s coisa s que e stão na
sua fre nte . E — livre das
te nsõe s, dos m e dos, e das
pe rguntas inúte is —
a prove ita ria e ste te m po para
e spe rar, curioso e pacie nte ,
pe lo re sultado das coisas onde
tanto inve stiu se u am or"
(C arlos C are tto, e rm itão
italiano).

131
DO MEDO E DESEJO

Ana Sharp, autora de "A


Magia do C am inho R e al"(Ed.
R osa dos Te m pos), e
re sponsáve l por acom panhar
Shirle y Maclaine no C am inho
de Santiago, diz-m e ce rta
noite : "O m e do é o de se jo
oculto. Inconscie nte m e nte ,
passam os a vida te ntando
provar que nossos pais
e stavam ce rtos — porque eles
nos de ram a coisa m ais
im portante : o am or. Mas
de ix aram m arcas de se us
próprios te m ore s; e nós, para
não de struir a im age m de
pe ssoas pode rosas que foram,
te rm inam os de ix ando que

132
e ste s m e dos se jam
transfe ridos para nós.
"Só pe rdi o m e do de avião
quando, na vé spe ra de ce rta
via ge m , pe nse i com igo
m e sm a: te nho e ste pânico
porque m e u pai tinha medo, e
e u não posso a ce itar que
e stive sse e rrado."
É pre ciso ficar com as coisas
boas do passado, m as livrar-
se dos te m ore s irracionais.
Hoje , quando m e de fronto
com qualque r m e do, troco a
palavra por 'de se jo' e
pe rgunto: por que e stou
de se jando isto? E o
m e do/de se jo se a fa sta
norm alm e nte ".

133
DA INSISTÊNCIA

Em 1989, e u e stava nos


Piriné us, quando vi um cartão
posta l: "ca pe la de Ge z", dizia.
Abri o m apa, note i que estava
pe rto do m onte Ge z, e resolvi
e scalá-lo para conhe ce r a
igre ja; e nfie i na m inha cabeça
que a cidade ficava no alto —
do outro lado da m ontanha.
Durante horas subi pe los
cam inhos m ais duros
possíve is. Só quando estava a
ce m m e tros do topo, m e de i
conta de dua s coisa s: a ) e u
e stava pe rdido: b) não havia
cidade ne nhum a e m cim a do
m onte (de scobri m ais tarde
que a cape la ficava lá e m
baix o).

134
Q ua se m orri naque la tarde.
De onde tire i a ide ia da
cidade ? Por que não de sisti
quando vi que não havia
ne nhum a e strada?
Às ve ze s cism am os com
ce rtas coisas, e só
de scobrim os o e rro tarde
de m ais. Por isso é se m pre
bom le m brar da frase de
Goe the : "Ningué m conse gue
e nganar-nos m e lhor que nós
m e sm os".

135
DA Á RVORE

Um a ve z e u cam inhava com


m e u m e stre por um cam po
pe rto de C abo Frio. Ele dizia:
"olha ali um a brom é lia!" E
m ais a diante : "ve ja um a
orquíde a!"
Me us olhos não e stavam
a costum ados a o m ilagre das
coisas pe que nas. Tudo que via
dia nte de m im e ra um a
confusão de plantas verdes, e
nada m ais. Aos poucos,
a ndando com e le , a pre ndi a
e duca r a vista e busca r a
planta que que ro.
O m e sm o se passa com os
Sinais de De us, a m ane ira
com o Ele procura nos ajudar a
dirigir nossas vidas. Só um

136
olho tre inado consegue vê-los.
Hoje — e m bora a inda cometa
e rros — e stou m ais
acostum ado a distinguir no
ce nário diante de m im a
caligrafia de De us. Assim
com o a be le za da orquídea se
de staca para que m sabe que
e x iste m orquíde as, os Sinais
se m ostram para quem tem a
corage m de de cifra-los.
W illiam Blak e dizia: "O tolo
não vê a m e sm a árvore que o
sábio vê ". C uste i a e nte nde r
isto, m as a ca be i a prendendo.

137
DA MULHER

Eu se m pre quis conhe ce r a


m ulhe r que , na noite do
Massacre da C a nde lá ria,
surgiu com o o Anjo-da-Guarda
das crianças de rua.
Durante um jantar, alguém
m e apre se ntou: "e sta é
Ivonne ". Eu cum prim e nte i
form a lm e nte a re cé m -
che gada, e continue i
conve rsando com m e us
am igos. Ela, se m je ito, se
afastou. Q uando íamos saindo
da fe sta, m inha e sposa
com e ntou: "e ntão, gostou de
conhe ce r a m ulhe r que você
tanto adm ira?" E e u m e de i
conta do m e u e rro.

138
Na m e sm a hora, procure i-a
e ntre os convida dos — e
Ivonne Be ze rra de Me llo ficou
sabe ndo da m inha admiração
por sua re sistê ncia e coragem.
Mas, ao voltar para casa, eu
pe nsa va : qua ntas ve ze s e m
m inha vida e stive diante de
algo que e ra im portante para
m im , e não pe rce bi?

139
DA MA TER CHRISTI

C onhe ci R e gina Sylvia na


é poca hippie , quando nossas
m e nte s viviam povoada de
de use s a strona utas, purple
haze , e discos voadore s.
R e gina cam inhou por m uitas
e stra da s e soté rica s e místicas.
Hoje e stá e m Pire nópolis
(Goiás), dirigindo um a
com unidade C ristã, voltada
para a de voção de Maria.
"A conve rsão não é um
m om e nto ape nas, m as um
trabalho para toda a vida", diz
e la . "Porque é pre ciso e star
se m pre com pre endendo o que
o coração que r m anife star. Se
param os de e scutar nosso

140
coração, a conve rsão também
pára.
"A palavra conve rsão ve m
de m e tanóia, que e m Gre go
que r dize r, m udança de
m e ntalidade . De us nos dá a
conve rsão pe la graça, e nós
re tribuím os com a acção. Não
é um cam inho fácil: o trabalho
é se m e lha nte ao de
transform ar um de se rto e m
pom ar; m as, se a ge nte
pe rm ite , o Espírito Santo se
e ncarre ga disto".

141
DA VIDA

Talve z você diga: "be m ,


m inha vida não e stá
e x a ctam e nte de a cordo com
a s m inhas e x pe cta tiva s".
Se , e ntre ta nto, a vida lhe
pe rguntasse : "o que você tem
fe ito por m im ?" Q ual se ria a
sua re sposta? Não adianta
que re r e ncurta r o cam inho: é
pre ciso e quilibrar o R igor e a
Mise ricórdia, disciplina e
e ntre ga . Nada a conte ce se m
e sforço, ne m m e sm o os
m ilagre s. Para que um milagre
ocorra, é pre ciso te r fé . Para
se te r fé , é pre ciso ve nce r a
barre ira dos pre conce itos.
Para se de rrubar barre iras, é
pre ciso corage m . Para se te r

142
corage m , é pre ciso dominar o
m e do. E assim por diante .
Vam os faze r as paze s com
nossos dias .É pre ciso não
e sque ce r que a vida e stá do
nosso lado. Tam bé m ela quer
m e lhorar. Vam os ajuda-la.

143
DA DETURPA ÇÃ O

C uidado, porque os símbolos


pode m transform ar-se e m
arm adilhas.
O livro "C ântico para
Le ibowitz" passa-se num
futuro distante , m il anos
de pois da actual civilização ter
sido de struída. Se us
habitante s usam antigos fios
de com putador e nrolados no
pe scoço — porque — diz a
tradição — tais fios continham
sabe doria.
Jorge Luiz Borge s tam bé m
fala da transform ação dos
sím bolos: a cruz, um
instrum e nto de tortura, virou
um instrum e nto de fé . A

144
fle cha assassina agora apenas
indica um a dire cção.
Um a le nda Ze n conta a
história de um m e stre que
se m pre m andava am arrar o
se u gato, que pe rturbava a
m e ditação dos discípulos. O
te m po passou, o m e stre
m orre u. O gato tam bé m
m orre u, e troux e ram outro.
C e m anos de pois, algué m
e scre ve u um tra ta do
re spe itadíssim o, sobre a
im portância de se te r um gato
am arrado durante a
m e ditação.

145
DO CA MINHO

A tradição oral listou os dez


passos do C am inho espiritual:
A inquie tação: a pe ssoa
pe rce be que pre cisa mudar de
vida, se ja por té dio, ou por
sofrim e nto. A busca: ve m a
de cisão da m udança. A busca
se dá com livros, cursos,
e ncontros. A de ce pção:
com e çam as trocas de
cam inho. Aque le que e stá
buscando pe rce be os
proble m as e de fe itos dos que
e nsinam . Por m ais que mude
de corre nte filosófica, religião,
ou socie da de se cre ta ,
e ncontra os proble m as
clássicos: vaidade e busca de
pode r. A ne gação: é com um

146
abandonar o cam inho de pois
de constatar que os que estão
ne le ainda não re solve ram
se us proble m as. A angústia: o
cam inho foi abandonado, mas
um a se m e nte foi plantada: a
fé . E cre sce dia e noite . A
pe ssoa se nte -se
de sconfortá ve l, com a
se nsação de que de scobriu e
pe rde u.

147
DO CA MINHO

O nte m liste i cinco — dos dez


passos do cam inho e spiritual:
inquie tação, busca, decepção,
ne gação e angústia. C oncluo
com os cinco passos
se guinte s: O re torno: por
causa de outra ruptura séria [
um a tra gé dia, um ê x tase ,
e tc.] a pe ssoa de scobre que
sua Fé e stá viva. E a fé , se for
be m cultiva da , re siste a
qualque r de ce pção. O mestre:
o m om e nto m ais pe rigoso.
Me stre são ape nas pe ssoas
e x pe rie nte s. O cam inho é
individual, m as — ne ste
m om e nto — pode de svirtuar-
se , e virar cole ctivo. Os sinais:
o cam inho se m ostra por si

148
m e sm o. Atravé s dos sinais,
De us lhe e nsina o que precisa
sabe r. A noite e scura: são
fe itas as Escolhas. A pe ssoa
m uda sua vida e dá se us
passos — ape sar do m e do. A
com unhão: é o m om e nto em
que , com o dizia São Paulo, a
própria Divinda de passa a
habitar a pe ssoa. O m isté rio
dos m ilagre s se m anifesta em
toda m aravilha e grande za.

149
DO PÃ O

O s e x é rcitos de Ale x andre o


Gra nde , pre pa ra va m -se para
tom ar um a cidade na África.
Mas as portas se abriram, sem
re sistê ncia ; a população e ra
quase toda fe m inina, já que os
hom e ns haviam m orrido nos
com bate s contra o
C onquistador.
No banque te da vitória,
Ale x andre pe diu que lhe
troux e sse m pão. Um a das
m ulhe re s troux e uma bandeja
de ouro, cobe rta de pe dras
pre ciosas, com um pe dacinho
de pão ao ce ntro." Não posso
com e r pe dras pre ciosas e
ouro; o que pe di foi pão!",
bra dou. E a m ulhe r

150
re sponde u: " Ale x andre não
te m pão e m se u re ino?
Precisava vir busca-lo tão
longe ?
Ale x andre continuou suas
conquistas, m as — ante s de
partir dali, m andou gravar
num a pe dra: "Eu, Alexandre o
Gra nde , vim a té a África para
a pre nde r com e stas
m ulhe re s."

151
DA PRINCESA

C he gue i a Ne w York , e
soube que m inha e ditora
a m e rica na re se rva ra o clássico
hote l W aldorf Astoria. Quando
a porta do e le va dor a briu no
m e u andar, vi que e stava
re ple to de se guranças — com
arm as a vista. De scobri, com
a cam are ira , que um a
prince sa á ra be e stava a li. Fiz
m ilhare s de fantasias de como
de via se r um a prince sa, a té
que um dia a vi no corre dor:
um a se nhora gorda, fe ia, os
pé s inchados, e um sé quito
cuidando de cada passo. A
a m iga que e stava com igo
conse guiu falar com e la;
soube m os que a se gurança

152
não a de ix a va ir à rua , que
sonhava e m ir a um cinema, e
que e a prim e ira e stra nge ira
com que m conve rsava e ra
m inha am iga. O s guarda-
costa s logo che ga ra m ,
inte rrom pe ndo a conve rsa —
alé m de nos re vistar em busca
de arm as ocultas. Foi a única
prince sa de ve rdade que
conhe ci e m m inha vida.

153
DO SA CO

Um dos rituais de iniciação


de fe itice iras consistia e m
colocar a noviça num
gigante sco saco, pe ndurado
num a á rvore . Durante a noite
inte ira , e nqua nto dança vam,
as fe itice iras giravam o saco.
Este costum e surgiu de
re pe nte , se m ne nhum a base
na Tradição oral. Por isso, sua
validade é m uito questionada.
H. Mulle r, e studioso de magia,
a rrisca um a e x plica çã o: "À
m e dida que o saco ia girando,
a noviça pe rdia o se ntido de
dire cção. Ela te ntava ficar em
pé de ntro do saco, mas o chão
e ra fle x íve l. O e spaço e ra
gigante sco — porque e ra

154
e scuro; a o m e sm o tempo, era
pe que no — porque sua m ão
tocava as pare de s do saco.
Assim , e lim inado por completo
o se ntido de te m po e espaço,
a noviça e stava m ais abe rta
para um a nova pe rce pção da
re alidade ."

155
DE SA LOMÃ O

Se você a cha que a pe na s


você e stá sofre ndo, ou
a m a ndo, ou de se spe rado, ou
a pa vora do — e nfim , se você
acha que tudo de bom ou de
m al na vida só aconte ce com
você , re le m bre Salom ão:
"Ge ra çã o vai e ge ração vem,
m as a Te rra pe rm ane ce
se m pre a m e sm a. Levanta-se
o Sol, e põe -se o Sol, e volta
ao se u lugar, e nasce de
novo(...) O que foi, é o que há
de se r; o que se fe z, isso se
tornará a faze r. Não há nada
de novo de baix o do Sol".
Salom ão dizia isto a 3.000
anos atrás — m as não para
faze r com que nos

156
se ntísse m os inúte is ou
re pe titivos. Sua inte nção e ra
m ostrar-nos que , em nenhum
m om e nto, e stam os sozinhos.
Se De us fe z com que todas as
ge raçõe s ante riore s
e ncontrasse m se u rum o, fará
a m e sm a coisa por cada um
de nós. Afinal, Ele te m
m ilé nios de e x pe riê ncia com
nossos proble m as.

157
DA PA RA DA

Não se e sque ça que a s


ve ze s é pre ciso parar. O u os
pé s ficam fe ridos, a m ente se
distrai, e o cansaço
e m pobre ce a Busca .
A tra diçã o a ca dé m ica tem o
"Ano Sabático"; a cada se te
anos de trabalho, o professor
passa um ano longe da
Unive rsidade . Ao sair da
rotina, e le a bre e spaço para
novos conhe cim e ntos.
Na a ntiguida de , os
cam pone se s dividia m sua
te rra e m se te te rre nos: a cada
ano, um de le s ficava
abandonado, se m produzir
nada. Ali cre sciam e rvas
daninhas, m ato, tudo que a

158
nature za tive sse vontade de
produzir se m inte rfe rê ncia do
hom e m . De sta m aneira a terra
se re vigorava, e e ra capaz de
— no ano se guinte — aceitar a
se m e nte do agricultor.
Q ue m não pára por livre
vonta de , te rm ina se ndo
paralisado pe la vida. Na Busca
— com o e m tudo o m ais —
acção e inacção te m a mesma
im portância.

159
DA REBELDIA

Em Moscou, Luiz C arlos


Pre ste s — o m ais im portante
líde r com unista brasile iro —
pre pa ra va -se para volta r a o
Brasil, de pois de vários anos
de e x ílio. Se u filho (que m e
contou e sta história), resolveu
docum e nta r e m film e a
partida do pai.
Pre ste s proibiu-o de faze r
isto. Mas, sabe ndo que estava
diante de um aconte cim e nto
histórico im portante , o filho
le vou o e quipam e nto para o
ae roporto e com e çou a
re gistrar tudo. Em
de te rm inado m om e nto,
Pre ste s pe rce be u o que
aconte cia; largou os am igos

160
que o ce rcavam e partiu para
cim a do filho.
"Eu pe nse i que fosse levar a
m aior de scom postura pública
da m inha vida", m e conta Luiz
C arlos Pre ste s Filho. "Mas ele
che gou diante de m im, olhou-
m e nos olhos, e disse :
"Pa ra bé ns. Você fe z
e x a ctam e nte o que e u proibi,
e isto m ostra o se u valor.
Espe ro que você m ante nha
se m pre e sta m e sm a firm eza
com os outros."

161
DA S RESOLUÇÕES

Judith se conside ra cheia de


de fe itos, e de cide m e lhorar.
Mas não é sua Le nda Pessoal
que a e m purra ne ste sentido;
a Socie da de diz que existe um
padrão de cre scim e nto, que é
pre ciso atingir.
No final do ano, Judith faz
um a lista de de cisõe s para o
ano se guinte . O s prim e iros
dias de jane iro são fáceis; ela
obe de ce a lista, dá passos que
se m pre adiou. Em fe ve re iro,
já não te m a m e sm a
disposição, e a lista começa a
falhar. Q uando m arço chega,
Judith já que brou todas as
prom e ssas fe itas no Ano
Novo; e irá se ntir-se pequena,

162
incapaz, e culpa da a té a
últim a se m ana do ano.
Q ua ndo, e nfim , e sta semana
che ga , e la faz de novo a s
prom e ssas, e o ritual se
re pe te .
Não de ve m os te ntar
m e lhorar naquilo que os
outros e spe ram de nós,
Judith; m as de scobrir o que
e spe ram os de nós mesmos. Aí
ne m é pre ciso prom eter nada,
porque m udam os com prazer
e a le gria .

163
DO CA MINHA R

Dois hom e ns caminham pela


praia. Um de le s faz isto
porque , em virtude de
proble m as no coração, o
m é dico aconse lhou os
passe ios m atinais. O outro
e stá ali porque a caminhada é
um dos grande s praze re s de
sua vida.
O hom e m com problemas no
coração com e nta:" tom ara
que isto a ca be logo! É
chatíssim o andar na praia!" O
outro não e nte nde o
com e ntário; e m se u m undo,
as cam inhadas são
agradáve is.
O hom e m com problemas no
coração podia tirar proveito do

164
que lhe a conte ce na vida.
Q ualque r actividade tocada
pe lo am or, é m otivo de prazer
e júbilo.
Mas e le não conse gue ; a
cam inhada é um tratam e nto
m é dico, nada m ais. Por isso,
sua hora e m e ia de a le gria
tra nsform a-se e m suplício e
torm e nto.

165
DA S DEFINIÇÕES

Dois m e stre s indianos e um


grafitti de fine m o am or:
O sho: "Da r a m or é a
e x pe riê ncia re a l — no próprio
se ntido da palavra, porque
você se com porta com o um
im pe rador. Im plorar am or é
um a e x pe riê ncia de mendigo.
Não aja com o um m e ndigo;
se ja se m pre um im pe rador.
Nisargadatta Maharaj: "o
sofrim e nto ve m do desejo. E o
se ntim e nto de unidade nunca
pode se r frustrado — que se
frustra é o de se jo de
re conhe cim e nto. C om o todas
as coisas puram e nte mentais,
e ste de se jo é uma armadilha".

166
Escrito num m uro e m
Bue nos Aire s (e anotado por
Fabia na R iboldi): "Se a m a s
algué m , de ix a-o em liberdade.
Se e le volta r, foi porque
pre cisou. Se e le não voltar, foi
porque pre cisou".

167
DO MONUMENTO

"Ve ja que m onum e nto


inte re ssante ", diz R obe rt. O
Sol do final de O utono começa
a de sce r. Estam os e m
Saäsbruck , na Ale m anha.
"Não ve jo nada", re spondo.
"Ape nas um a praça vazia". "O
m onum e nto e stá de baix o de
se us pé s", insiste R obe rt.
O lho para o chão: o
calçam e nto é fe ito de laje s
iguais, se m ne nhum a
de coração e spe cial. Não quero
de ce pcionar m e u am igo, mas
não consigo ve r nada demais
naque la pra ça .
R obe rt e x plica: "Chama-se O
Monum e nto Invisível. Gravado
na parte de baix o de cada

168
um a de stas pe dras, e x iste o
nom e de um lugar onde
jude us foram m ortos. Artistas
anónim os criaram e sta praça
durante a II Gue rra, e iam
a cre sce ntando a s laje s a
m e dida e m que novos locais
de e x te rm ínio e ram
de nunciados. Me sm o que
ningué m visse , aqui ficava o
te ste m unho".

169
DO TRA DUTOR

Durante um a conferência em
Toulouse , sou apresentado ao
tradutor de m e us livros para o
sue co. De scubro que se rviu
com o piloto na Inglate rra —
durante a II Gue rra Mundial.
De pois, re solve u m udar-se
para R e cife , onde vive u m ais
de vinte anos.
No jantar, conta-m e a sua
e x pe riê ncia nos cam pos de
batalha da Europa: "Na
Gue rra de scobrim os a ilusão
do pode r. Um Ge ne ral pode
com anda r m ilha re s de
hom e ns, e se ntir-se o homem
m ais im portante do Mundo:
m as e sta se nsação dura
a pe na s a té o m om e nto e m

170
que e le dá a ordem de ataque.
A partir de e ntão, se u pode r
de sapare ce com pletamente —
passa a e star nas m ãos de
Soldados que nunca viu, de
Sarge ntos que não sabe o
nom e .
"Um bom com andante sabe
que o pode r não e x iste . Sua
capacidade re side em
transform ar m uitas vontades
dife re nte s e m um a vontade
única."

171
DO PERDÃ O

"A socie da de conse gue


pe rdoar o crim inoso, e jamais
pe rdoa o sonhador" diz Oscar
W ilde . Mas a le i Unive rsal
obriga-nos a sonhar. É
im portante e star se m pre
pe nsando nisto.
Não de víam os nunca
pe rgunta r a o outro: "o que
você faz na vida?" A pe rgunta
de um a pe ssoa se nsíve l é :
"você e stá se ndo fie l aos seus
sonhos?"
Ao dize r isto, colocam os no
ar a re sponsabilidade de uma
re sposta. O brigam os o outro a
re fle ctir sobre a im portância
de se us m ovim e ntos.
Forçam os um a pausa na

172
confusão quotidiana, e
e ncaram os de fre nte a
e x istê ncia.
Ao pe rguntar, tam bé m
pre cisam os re sponde r.
Som os um a m anife stação
do pe nsam e nto de De us. Ele
e spe ra que a nossa vida seja
digna disso.

173
DOS SINA IS

O s sinais da vida são como


os sinais de transito: por via
das dúvidas, é m e lhor
re spe ita-los.
Há m om e ntos de parar, e
m om e ntos de se guir adiante.
Q uando e stam os pe rdidos,
se guim os o flux o — m as
pre stando a te nção em alguma
coisa que irá nos indicar a
dire cção ce rta. Q uando é
proibido se guir adiante ,
se m pre e x iste um cam inho
para contornar o obstáculo.
Mas — com o tam bé m
aconte ce com os sinais de
transito — m uitas ve ze s
acham os que tal indicação não
se rve para nada; e não

174
obe de ce m os. Furam os o sinal
ve rm e lho um a ve z, outra vez,
se m que aconte ça nada. E
acostum am o-nos a agir assim
— até que um dia...
Por isso, ate nção. Não se ja
im prude nte com os se us
sonhos. Não use sua sorte em
bobage ns.

175
DO ESCRA VO

Na é poca e m que trabalhava


no Sahara com o piloto de
avião postal, o e scritor Saint-
Ex upé ry fe z um a cole cta com
se us am igos da Base Aé re a;
um e m pre ga do m arroquino
que ria volta r à sua cidade
natal.
C onse guiu juntar m il
francos. Um dos pilotos
transportou o e m pre gado até
C a sabla nca, e voltou contando
o que aconte ce u: "Assim que
che gou, foi jantar no m e lhor
re staurante , distribuiu
ge ne rosas gorje tas, pagou
be bidas para todos. C om o
dinhe iro que sobrou, comprou
bone cas para as crianças de

176
sua alde ia. Este hom e m não
tinha o m e lhor se ntido de
e conom ia".
"Ao contrário", re sponde u
Saint-Ex upé ry. "Ele sabia que
o m e lhor inve stim e nto do
Mundo são as pe ssoas.
Gastando assim , conseguiu de
novo ganhar o re spe ito de
se us conte rrâne os, que
te rm inarão por lhe dar
e m pre go. Afina l de contas, só
um ve nce dor pode se r tão
ge ne roso".

177
DA PA SSA RELA

François é canto de ópe ra.


Nós cam inham os juntos pe la
m arge m do rio que banha
Strasburgo. C onve rsam os
sobre a ne ce ssidade que o
Hom e m te m de com preender
a si m e sm o. Em dado
m om e nto, passam os perto de
um a pe que na passare la que
cruza o rio, e François
com e nta : "Ex iste que m é
capaz de construir ponte s
e ntre os se re s hum a nos. São
tra ba lhos re pe rcute m durante
m uitos a nos, e a juda m a raça
hum a na a cre sce r. Tudo que
e u te nho a com pa rtilha r,
e ntre ta nto, é a be le za da
m úsica. Q uando e stou no

178
palco, um laço fino, m as
suficie nte m e nte forte — m e
pe rm ite com unicar a poesia de
que m e scre ve u a s á rias. A
be le za ajuda-nos a ficar mais
pe rto de De us. Ela pode não
te r a força de um a ponte, mas
te m a utilidade de um a
passare la que , — m e sm o
a pa re nte m e nte frá gil —
cum pre sua m issão de
transportar os hom e ns sobre
águas turbule ntas".

179
DO DESENHO

Estou viajando de carro com


Moe bius, o ilustrador de "O
Alquim ista" na França. Chove,
e Moe bius de se nha nos vidros
e m bacia dos.
"Em ce rta s oca siõe s, o
pe ssim ism o pode se r um a
grande força de
tra nsform ação", diz e le . "De
tanto e nx e rgar o lado e scuro
da vida, as pe ssoas acabam
no fundo do poço. Mas — no
m e io da e scuridão total —
algo de tranquilizador
aconte ce .
"Já sabe m que não pode m
de sce r m ais baix o. Só lhe s
re sta um a alte rnativa:
com e çar a subir. Então os

180
valore s m udam , a e spe rança
re nasce , e o cam inho de volta
é fe ito com sabe doria".
C re io que é um proce sso
onde os riscos são
e x a ge ra da m e nte grandes. Se
vislum bra m os a luz, é melhor
largar tudo e se gui-la. Mas
Moe bius pe nsa dife rente, e eu
re solvi re gistrar aqui.

181
DA A JUDA

Mauro Salle s m e contou a


se guinte história re al: O
de putado foi contar a
Tancre do Ne ve s que um de
se us asse ssore s o criticava
constante m e nte . E Tancre do
re sponde u: "Mas com o? Eu
a inda ne m o a jude i!"
Todos já e x pe rim e ntamos a
ingratidão. Tancre do tratou o
assunto com bom -hum or e
sabe doria; outros pe rde m a
confiança no se r hum ano, e
param de faze r qualquer coisa
pe los outros.
Se rá que ajuda sabe r que
isto não aconte ce só com
você ? Espe ro que sim . Porque
as pe ssoas ingratas não

182
pode m m oldar nosso
com portam e nto. Elas não têm
o pode r de de finir nosso
carácte r.
De us — cuja opinião, no
fundo, é a única que conta —
jam ais foi ingrato connosco.
Vam os agarrar-nos a isto;
vam os continuar te ntando
com portar-nos da m ane ira
que que re m os.

183
DA VELHICE

Ana C intra conta que se u


filho pe que no — com a
curiosidade de que m ouviu
um a nova palavra m as ainda
não e nte nde u se u significado
– pe rguntou-lhe : "Mam ãe , o
que é ve lhice ?" Na fra cção de
se gundo ante s da re sposta,
Ana fe z um a ve rda de ira
via ge m a o passado. Lembrou-
se dos m om e ntos de luta, das
dificuldade s, das de ce pçõe s.
Se ntiu todo pe so da idade e
da re sponsabilidade e m seus
om bros. Tornou a olhar para o
filho que , sorrindo, aguardava
um a re sposta. "Olhe para meu
rosto, filho", disse e la. "Isso é
a ve lhice ". E im aginou o

184
garoto ve ndo as rugas, e a
triste za e m se us olhos. Q ual
não foi sua surpre sa quando,
de pois de alguns instantes, o
m e nino re sponde u: "Mamãe!
C om o a ve lhice é bonita!"

185
DO MERCA DO

O filósofo Sócra te s, que


provocou um a ve rdade ira
re volução no pe nsam e nto
hum ano (e por causa disto
a ca bou conde na do a m orte),
e ra se m pre visto passe ando
pe lo m e rcado principal da
cidade .
C e rto dia, um dos se us
discípulos pe rguntou: "Mestre,
apre nde m os com o senhor que
todo sábio le va um a vida
sim ple s. O se nhor não te m
ne m m e sm o um par de
sapatos." "C orre cto",
re sponde u Sócrate s. O
discípulo continuou:
"e ntre tanto, todos os dias o
ve m os no m e rcado principal,

186
adm irando as m e rcadorias.
Se rá que podíam os juntar
dinhe iro para que possa
com prar algo?" "Te nho tudo
que de se jo", re sponde u
Sócra te s. "Ma s a doro ir a o
m e rcado, para de scobrir que
continuo com ple tam e nte feliz
se m aque le am ontoado de
coisas!"

187
DA GENTE

Q uando você com eça a fazer


algum a coisa, se m pre te m
a lgué m torce ndo contra. Se
você conse gue ultrapassar as
prim e iras dificuldade s, a
“torcida contra” aum e nta.
É pre ciso sabe r aprove itar
isto. Não adianta que re r
agradar todo m undo. Só os
m e díocre s conse gue m isso, e
m e sm o assim à custa de
m uito sacrifício pe ssoal.
Tam pouco adianta ficar
re sse ntido, ou odiar quem não
o a m a . C onve nça-se que isto
faz parte do tra ba lho. Use a
e ne rgia da “torcida contra”
para a de stra r sua vonta de ,
para se r m ais profundo e mais

188
sé rio no que e stá faze ndo.
Aprove ite .
Entre tanto, se e ste tipo de
torcida afastar você de se u
cam inho, é porque e ste não
e ra se u cam inho. Se fosse, só
m e sm o a m ão de De us
pode ria te r fe ito alguma coisa
contra.

189
DA VERDA DE

Márcia Fre rias le m bra a


história de um hom em que se
a prox im ou de Sócra te s:
"C om o sou m uito se u amigo,
pre ciso lhe contar algo!"
"Espe ra!", disse Sócrate s. "E
a s trê s prova s? Já fize ste a
prim e ira prova, que é saber se
o que m e conta s é ve rda de?"
"Be m ...não te nho absoluta
ce rte za, m as ouvi dize r..."
"Entã o fize ste a se gunda
prova?", disse o sábio." A
prova da bondade . O que
contarás se rá bom para mim?"
"Não...m uito pe lo contrário..."
"Se não fize ste a prova da
ve rdade ou da bondade , com
ce rte za fize ste a da utilidade.

190
O que m e conta rá s é útil?"
"Útil?", disse o visitante .
"Be m , útil não é ". "Então",
concluiu o filósofo sorrindo,
"se o assunto não é
ve rdade iro, ne m bom , ne m
útil, é m e lhor não se
pre ocupar com e le ".

191
DOS DESA FIOS

Ace ite os de safios. E não


e sque ça : e x iste m m omentos
na vida e m que pre cisam os
m ais de bravura do que de
prudê ncia . C e rta s de cisõe s
pre cisam se r tom adas no fogo
da e m oção.
Entre tanto, nós e stam os
acostum ados a dize r: "é
pre ciso calm a. Te nho que
e star pre pa ra do para isto".
Ningué m conse gue se
pre parar dire ito para nada.
Ex iste m uita coisa que pode
se r pla ne ja da , m as ne m
se m pre é o m e lhor que a vida
nos ofe re ce . Um a a ve ntura
m ágica — onde tudo conspira
para nos ajudar a dar um

192
grande salto sobre o abism o
— se m pre surge
ine spe radam e nte , e parte
logo. Sua pre se nça foi
re sultado de um trabalho
invisíve l que re alizam os, sem
que nos dé sse m os conta. É
pe gar ou largar para se mpre.
C laro que pode m os cair no
abism o. Mas o que , ne sta
vida, não é arriscado?

193
DO PERDÃ O

Dois e x -pre sos políticos


arge ntinos se e ncontraram ,
de pois de m uitos anos se m
qualque r contacto. Sentaram-
se num bar na Av. de Maio e
com e çaram a le m brar os anos
ne gros da re pre ssão, quando
as pe ssoas sum iam se m
de ix ar ve stígio. A ce rta altura,
um pe rguntou ao outro: —
Q uanto te m po você ficou
pre so? — Dois anos — foi a
re sposta. — Sofri torturas que
nunca im agine i. Vi m inha
m ulhe r se ndo viole ntada na
m inha fre nte . Mas os
re sponsáve is já foram presos
e conde na dos. — Ó ptim o. E
sua alm a já os pe rdoou? —

194
C laro que não! — Então, você
ainda continua prisione iro
de le s.

195
DA CA NA LIZA ÇÃ O

A canalização é um processo
de conta ctar a e ne rgia interior
e e x te rior. De scre ve re i o
m é todo ge ralm e nte utilizado,
que dura e m torno de de z
m inutos: Se nte -se num lugar
tranquilo, de pre fe rê ncia no
final do dia — quando você
e stá cansado. Fe che os olhos,
pe nse no que te m vontade de
pe nsar. De pois de algum
te m po, re ze . Pe ça a Deus luz,
prote cção, e ajuda. Então,
com e ce a falar: não procure
lógica nas palavras; escute os
sons que sae m da sua boca.
Em aprox im adam e nte um a
se m ana, e ste s sons começam
a transform ar-se em palavras,

196
e stas palavra s e m fra se s, e
se u Anjo usará e ste canal para
se com unicar. Faça as
adaptaçõe s ne ce ssárias a você
, e pratique com disciplina.
Jam ais pe rca a consciê ncia
durante a canaliza çã o; é
de sne ce ssário e pe rigoso.
Ex iste um unive rso e spiritual
— procure e ntra r e m contacto
com e ste Unive rso.

197
DE ENSINA R

Um a m ãe le vou se u filho ao
Mahatm a Gandhi e im plorou:
"por favor, Mahatm a, peça ao
m e u filho para não com e r
açúcar". Gandhi, de pois de
um a pausa, pe diu: "m e traga
se u filho daqui a duas
se m anas".
Duas se m anas de pois, e la
voltou com o filho. Gandhi
olhou be m fundo nos olhos do
garoto e disse : "não com a
açúcar".
Agrade cida — m as pe rplexa
— a m ulhe r pe rguntou: "por
que m e pe diu duas semanas?
Podia te r dito a m e sm a coisa
ante s!"

198
E Gandhi re sponde u: "há
duas se m anas atrás, e u
e stava com e ndo açúcar".

199
DO MA R

C are im i Assm ann conta:


Die go não conhe cia o m ar.
Santiago Kovadloff le vou-o
para de scobrir o oce ano.
Durante dia s, via ja ra m para
o sul. C e rta tarde , Santiago
disse para Die go: "atrás
daque las dunas está o mar". O
coração do garoto batia de
e m oção. Subiu corre ndo as
are ias, se m e spe rar por
ningué m — e , de re pe nte ,
e stava diante do oce ano.
Foi tanta a im e nsidão, foi
tanto o fulgor, que o m e nino
ficou m udo. Q uando conseguiu
re cupe rar a voz, gague jou: "É
m uito grande ! Ajuda-m e a
olhar!"

200
O m e stre com e nta a
re spe ito: "assim com o
ningué m pode ajudar-nos a
olhar o oce ano, não podemos
usar os olhos de ninguém para
e nte nde r e e nx e rga r o que
aconte ce connosco".

201
DE BORGES

O e scritor arge ntino Jorge


Luís Borge s — já com 80 anos
— e stava no Mé x ico. De pois
de vários dias de pale stras,
confe rê ncia s, e hom e nagens,
Borge s conse guiu te r um a
tarde livre . Pe diu para visitar
as pirâm ide s aste cas no
Yucatán.
Ex plica ra m que se tra ta va
de um a via ge m m uito
cansa tiva , onde e ra pre ciso
andar de táx i, avião, jipe .
Borge s insistiu, e conse guiu
que o le vasse m a té Ux m al.
C he gou no final do dia,
de pois de várias mudanças de
condução. Se ntou-se diante
de um a pirâm ide do sé culo X,

202
e ficou um a hora se m dize r
nada. No final, le vantou-se e
agrade ce u aos se us
acom panhante s: "obrigado
por e sta tarde ine sque cíve l".
C om o sabe m os, Borges era
ce go. Mas isto não o im pediu
de pe rce be r tudo com sua
alm a.

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