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A perda da mãe ou do pai, será sem dúvida alguma, a mais complexa de explicar a
uma criança. Pode constituir um trauma mais ou menos grave, dependendo
sobretudo do modo como os adultos lidam com a situação. É que o trauma não se
instala no momento mas sim à posteriori, fruto da mentira ou do silêncio que se
ergue em torno da morte. Deixamos aqui algumas ideias sobre o assunto, que
poderão ajudar todos aqueles que se deparam actualmente com situações de perda.
Há alguns anos, as pessoas morriam em suas casas e toda a família estava presente,
inclusive as crianças. Nas sociedades modernas, isso deixou de acontecer. Perante
uma doença ou acidente, a hospitalização surge de imediato e a morte quase sempre
ocorre no hospital. Durante este tempo, as crianças são enviadas para casa de
parentes. Frequentemente cabe ao sobrevivente do casal, transmitir a notícia. A
maior parte das pessoas optam por fazê-lo de imediato, mas quando a criança é
muito nova, inventam desculpas do tipo “ a mãe foi viajar”. Só que a criança percebe
que algo não está bem. A ansiedade que os adultos tentam camuflar, aumenta a
desconfiança e as primeiras perguntas surgem.
Elisabeth Kübler-Ross, psiquiatra de formação, foi uma das autoras que mais estudou
este tema e, com base nos seus estudos, desaconselha vivamente que sejam dadas
explicações do tipo “Deus levou a mãe porque ela era boa” ou “Deus levou a
Mariazinha para o céu, por amar as crianças”. Deste modo, a morte surge associada
à bondade o que vai gerar uma mágoa contra a Entidade Divina e o sentimento de
profunda injustiça. Explicar que foi fazer uma viagem também é insensato. A criança
perguntará constantemente pelo dia da volta e, à medida que o tempo vai passando,
o sentimento de abandono vai-se instalando. Até porque, em muitos casos, quando
os pais são hospitalizados prometem que estarão de volta dentro em breve. Como a
criança não foi levada a visitá-los durante a hospitalização, vai ficar à espera que se
cumpra a promessa.
Outra explicação utilizada, especialmente com relação a uma pessoa idosa, é dizer
que foi dormir. É certo que é apenas um modo figurativo de explicar os factos, mas
as crianças não têm ainda a capacidade de o entender. Levarão à letra o que lhes é
dito e não é de surpreender, que o acto de adormecer passe e ser uma actividade
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in revista Viver com Saúde, Abril 1999)
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perigosa. A noite transforma-se num tormento, em que o sono é associado à morte.
Daqui surgem os pesadelos e o medo do escuro.
Quando for altura de abordar este tema, os adultos têm que ter em conta que todas
as crianças possuem já algumas ideias sobre o assunto. É que, no decurso de suas
vidas, vão-se apercebendo de algumas situações, mais que não seja através do
desaparecimento dos animais de estimação. A partir do que lhes é dito pelos
adultos, desenvolvem as suas próprias ideias. Muitas vezes querem fazer uma
caixinha e enterrá-lo no canteiro, esperando que volte a viver na primavera. Mas se
os pais explicarem que o canário morreu e que, por isso mesmo, não voltará a viver,
a criança pode não perceber muito bem o que se passou, mas vai acreditar porque
são os pais que o dizem.
Até aos três anos, dizem os livros, a separação é o que mais preocupa a criança. O
medo de ser abandonada pelos pais é uma constante, já que se sente desprotegida
quando a mãe não está ao alcance dos seus olhos. Segue-se o temor da mutilação.
Isto porque é nesta fase que a exploração do meio se inicia, e pode assistir a um
pássaro ser devorado por um gato. A morte, nesta altura, não é encarada como um
facto permanente. Para isso contribuem os desenhos animados em que o herói é
imortal. A criança assiste a atropelamentos e explosões, sem que um ferimento seja
visível. Por isso há que em conta os acidentes domésticos, já que não há a noção de
perigo.
Depois dos cinco anos, a morte passa a ter um rosto e um corpo. Vulgarmente é um
esqueleto que aparece para levar algumas pessoas. Esta faixa etária é
particularmente vulnerável. Já possuem alguma bagagem cognitiva que lhes permite
perceber o que se passa, mas não têm meios de lidar com o facto em si.
Sensivelmente aos nove anos, é que é adquirido o conceito de morte como um
fenómeno biológico e irreversível.
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As crianças devem ir ao funeral ?
A culpa
Todos nós, num momento de profunda exaltação, somos capazes de desejar a morte
a alguém. Sabemos que o desejo não passa disso mesmo, e que ninguém é preso por
desejar. Com as crianças acontece o mesmo, só que não existe uma clara fronteira
entre o desejo e a realidade. Se o desejo se concretizar, estas crianças poderão ficar
profundamente afectadas porque, inconscientemente, irão assumir a culpa pela
morte do ente querido. Não só se coloca esta questão quando se fala da morte, mas
também noutras situações de perda, como separações ou divórcios. É que a morte
não sendo encarada como permanente, confunde-se com a ausência, e assim o
divórcio será eventualmente vivido do mesmo modo.
O abandono
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Medo da morte
Não é raro que, caso se trate da morte de um dos pais, a criança tenha receio que o
outro morra também. Esta angústia traduz-se frequentemente em comportamentos
difíceis de entender. Se a reacção é de tristeza, não existem dificuldades em
identificar a dor subjacente, mas existem crianças que se tornam distraídas,
hiperactivas ou que têm súbitas explosões de agressividade. É a outra face da
depressão, que não sendo tão evidente, pode não ser imediatamente associada à
perda.
Outros ainda, apresentam sintomas orgânicos como dores de cabeça, vómitos, dores
musculares, etc. Quando recorrem a um médico, nada é detectado, uma vez que se
tratam de somatizações. Estes comportamentos surgem mais frequentemente em
famílias nas quais existe dificuldades em falar sobre o sucedido.
São poucas as pessoas que se sentem à vontade para falar com as crianças sobre a
morte. Algumas optam mesmo por levá-las ao psicólogo, temendo que estejam
traumatizadas com a situação. Contudo, não é a situação em si que é geradora do
trauma mas sim todo o silêncio que a envolve. Não existem temas impossíveis de
abordar. Alguns apenas exigem uma maior sensibilidade por parte dos adultos.
Também não existem receitas que se possam aplicar em todos as situações. Cada
caso é um caso e tem que ser tratado de modo diferente.
É certo que quando é um dos progenitores que morre, o outro sentir-se-á tão
fragilizado que dificilmente será capaz de apoiar os filhos logo nos primeiros
momentos. Por esse motivo, procurar o apoio dos familiares e amigos é fundamental
para que o adulto se possa equilibrar emocionalmente e assim incluir os filhos no
processo de luto.
Deixar chorar
A ajuda que podemos dar a qualquer criança, jovem adolescente ou mesmo adulto, é
partilhar os seus sentimentos. Deixar que fale, grite ou chore, se necessário. Irem ao
cemitério juntos e colocar flores sobre a campa, são actos simbólicos que facilitam o
luto e ligam afectivamente as pessoas. Permitir que se fale normalmente sobre o
falecido, recordando os momentos bons, é mantê-lo vivo na memória de todos. Se a
criança quiser ver um filme onde está o pai/mãe que faleceu, não há motivos para o
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impedir. É certo que causa alguma saudade, mas faz parte da vida e assim deverá ser
encarado. Havendo informação e apoio, torna-se possível que as crianças se enlutem
de uma forma tão sadia como os adultos.
Não ter um processo de luto adequado, pode mais tarde traduzir-se na incapacidade
de possuir relacionamentos próximos, já que o medo constante da perda impede
que se liguem afectivamente a alguém.
Informar as crianças
Livros a consultar
1. Crescer Vazio
Pedro Strecht, Assírio & Alvin
Lisboa, 1998
3. A terapia do luto
J. William Worden, Artes Médicas, 2ª edição, Porto Alegre, 1998
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