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1. Introdução
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Professor do Instituto de Sociologia e Política (UFPEL). Dr. em Sociologia.. Este texto foi publicado no livro
Desenvolvimento Regional – abordagens interdisciplinares. Organizado por Dinizar F. Becker e Milton Luiz
Wittmann. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2003
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Este capítulo está escrito em primeira pessoa do plural. O Nós como sugestivamente disse Morin(1977, p. 33),
é um “companheirismo imaginário com o leitor”
pensamento crítico que se distancie das interpretações simplificadoras e
mistificadoras do desenvolvimento.
No primeiro capítulo deste livro, Dinizar Becker nos alerta sobre essas
interpretações simplificadoras, ao mesmo tempo em que nos propõe distanciarmos
da abordagem disciplinar e resgatar o método dialético, o “grande método” (Brecht),
o “pensamento interveniente” (Gramsci) que “faz explodir definitivamente as
distinções em atividades fechadas, em instâncias chamadas aqui e ali [de]
econômica, [de] política”. Enfim, o autor chama a atenção sobre a necessidade de
recorrer ao método dialético, superando desta maneira qualquer tipo de visão
disciplinar, e poder dar conta da complexidade das múltiplas determinações da
dinâmica do desenvolvimento regional. É por isso que dizíamos que método e objeto
se confundem, ou melhor, se fundem, convergindo.
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De acordo com Morin (1977, p. 24) “A simplificação é a disjunção entre entidades separadas e fechadas, a
redução a um elemento, a expulsão daquilo que não cabe no esquema linear”.
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Talvez uma tentativa de superar essa dicotomia entre global e local encontra-se nas análises de Benko
(1999:76) que propõe o conceito de “globalidade dinâmica local” para expressar “as aberturas dos sistemas
locais para seu mileu” (...) Essa abertura se opera segundo duas modalidades. A mais corrente é a intensificação
das trocas com outros territórios”.
Nesse mesmo sentido, Kosik (1986, p. 18) nos esclarece que se trata de
compreender a “realidade humano-social como unidade de produção e produto, de
sujeito e objeto, de gênese e estrutura”. O método dialético explicitado por Kosik vai
da representação caótica e abstrata do todo à rica totalidade da multiplicidade das
determinações e das relações. Em outras palavras, somente é possível apreender a
realidade complexa e contraditória da dinâmica do desenvolvimento regional
utilizando o método dialético5. É isso que nos anuncia Becker no primeiro capítulo
deste livro. É este o desafio do pesquisador que busca inovar teórica e
metodologicamente, mas para isso é imprescindível superar “as ideologias dos
saberes fechados ou a divisão do trabalho intelectual” (Becker, Cap. 1). O que sem
dúvida nos leva à “transdisciplinarização”, ou seja, nos obriga a subverter os campos
disciplinares. E o que Morin denomina de paradigma da complexidade como
superação do paradigma cartesiano baseado na disjunção do objeto e do sujeito; do
espírito e da matéria; da oposição do homem e a natureza (Morin, 1977).
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Não é nossa intenção dar a entender que exista uma receita metodológica pronta denominada de “método
dialético”. Como disse Morin(1977) (p. 25), o método só pode formar-se durante a pesquisa “ só pode
desprender-se e formular-se depois, no momento em que o termo se torna um novo ponto de partida, desta vez
dotado de método”.
Em síntese, segundo Becker o capitalismo se desenvolve através das suas
próprias contradições, superando-as e renovando-as continuamente. Daí o caráter
dialético do processo. Em primeira instância, o capitalismo transforma o trabalho
humano, a natureza e as necessidades humanas em mercadorias. Em segundo
lugar, o capitalismo transforma essas mercadorias em capital dinheiro. A primeira se
constitui na negação, e a segunda na negação da negação do movimento dialético
do capitalismo. Agora nosso objeto de estudo fica mais definido e claro, isto é, as
diferentes dinâmicas do desenvolvimento regional.
Mesmo assim, convém não esquecer que o movimento global do capital está
de forma permanente influenciando e modificando as relações sociais, as formas
econômicas e os valores culturais das regiões. É difícil acreditar que quando o
capital transnacional subordina os agricultores familiares de uma determinada
região, não provoque algumas modificações sociais, econômicas e até culturais.
Ainda, é necessário reconhecer que a globalização se revela tanto na prática da vida
cotidiana como nos espaços estratégicos e por isso, o global não pertence apenas
ao domínio econômico, nem ao sociológico.
O conceito de capital social não é tão novo assim como pode aparecer.
D´araujo (2003) sistematiza muito bem a evolução do conceito de capital social
desde suas origens. Segundo ela, Lyda Judson Hanifan foi o primeiro a utilizar o
conceito de capital social em 1912 para mostrar a existência de uma estreita
vinculação entre o aumento da pobreza e o declínio das relações de solidariedade
entre os indivíduos de uma determinada comunidade. Nos anos 50, John Seeley
definiu capital social como as possibilidades de acesso a diversos bens facilitado
pelo fato dos indivíduos de uma comunidade pertencerem a alguma associação. Na
década de 60 Jane Jacobs, no seu livro A morte e a vida das grandes cidades
americanas, mostrou que a presença de redes urbanas de solidariedade constituía
um importante capital social para o bem-estar da população. Nos anos 70, Glenn
Loury e Ivan Light, salientaram que a ausência de relações baseadas na confiança
nas comunidades afro-americanas impedia o desenvolvimento dos negócios nessas
comunidades. Porém, Loury e Light observaram que acontecia o contrário nas
comunidades asiático-americanas, onde a presença das relações de confiança
estimulava o surgimento dos negócios. Nos anos 80, Pierre Bourdieu definiu capital
social como a possibilidade de pertencer a determinados grupos e instituições a
partir da existência de uma dotação de recursos. No fim da década de 80, Ekkehart
Schlicht ressaltou que a organização social influencia o funcionamento da economia.
Nesse mesmo período, James Coleman destacou a importância das normas sociais
como referência para a ação dos indivíduos, estabelecendo-se uma espécie de
código para determinar se essa ação está certa ou errada. As ações que se situam
fora das normas, são condenadas pela comunidade. Recentemente Robert Putnam
buscou explicar as desigualdades regionais da Itália a partir da existência de capital
social e participação cívica nas comunidades. Por último, Francis Fukuyama
analisou as relações entre prosperidade econômica, cultura e capital social, para
atingir tal objetivo, o autor estudou os processos históricos de desenvolvimento
industrial nos Estados Unidos e alguns países da Europa e a Ásia.
Segundo Putnam (2000, p., 132) nem as tensões sociais (falta de estabilidade
social), nem a presença de bons índices de educação, nem a urbanização podem
explicar o desempenho dos governos e instituições, “nenhuma dessas explicações
ajuda a compreender melhor por que certos governos funcionam e outros não (...) o
contexto cívico é importante para o funcionamento das instituições. O principal fator
que explica o bom desempenho de um governo é até que ponto a vida social e
política de uma região se aproximam do ideal de comunidade cívica”. A análise de
Putnam se propõe como alternativa às análises tradicionais que consideram a
democracia como resultado das instituições. Então as diferenças entre o norte e o
sul da Itália se explicam pela presença ou a ausência de cultura cívica. Assim, o
maior desenvolvimento do norte italiano se explica pela maior intensidade da cultura
cívica, por uma maior presença da cooperação e, portanto, de uma maior
participação da população para conseguir o bem público, enfim, devido à presença
de um maior capital social. Em contraste, o norte se caracterizou historicamente pelo
individualismo, a desconfiança pessoal e a forte presença paternalista da igreja
católica.
4. Conclusão
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS