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Rifü' Franêis GônzalêzyRii'drigues Branco


Fábia'Mariâ OliveiraP.inlio
Arnaldo LêmõsPorto
(elmo CelênôPorto

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P.ara oexame clínico
Anamnese (entrevista)
24 Exame Clínico

• Palpação
► Introdução • Percussão
• Ausculta
Houve, em determinada época, quem dissesse que o • Uso de alguns instrumentos e aparelhos simples.
método clínico acabava de ser superado pelos recursos tec-
nológicos e, para simbolizar esta afirmativa, um radiologista Observações fundamentais
colocou sobre sua mesa, dentro de uma redoma, um estetoscó-
pio e uma antiga "valva" (nome arcaico do espéculo vaginal), Adquirir as informações essenciais e desenvolver as habilidades psicomotoras
dizendo que aqueles instrumentos não passavam de meras básicas do método clínico devemconstituir os objetivos fundamentais quando
se iniciaoestudo da propedêutica médica, já que todoorestante depende disso.
antiguidades.
A evolução da medicina, no entanto, mostrou que aquele Não se espera que o estudante consiga dominar o método clínico com
médico cometera um grosseiro erro de previsão ao superes- total desenvoltura nesta fase de seu aprendizado; isso leva tempo, depende
de dedicação, esforço continuado e longo treinamento. Contudo, as bases do
timar o potencial diagnóstico dos raios X e dos aparelhos de
método devem ficar firmemente assentadas: sem elas, odesenvolvimentodo
uma maneira geral. O símbolo da tecnologia moderna é o
computador eletrônico, e, quando se vê seu aproveitamento na aprendizado do exame do paciente torna-se mais difícil, mais lento e sempre
será incompleto, não havendo possibilidade de suprir sua falta por meio de
elaboração da própria anamnese, concluimos que o método
extensos conhecimentos obtidos de exames complementares de qualquer
clínico, ao invés de se tornar obsoleto, está cada vez mais vivo.
natureza.
Na verdade, mudam-se apenas alguns procedimentos e deter-
minadas maneiras para sua aplicação, mas o essencial perma-
nece, formando o arcabouço que caracteriza a arte clínica, cuja
base continua sendo o exame do paciente.
O exame clínico tem papel especial em três pontos cruciais
► Posições do examinador e do
da prática médica: paciente para oexame clínico
• Estabelecer uma boa relação médico-paciente
Para executar o exame físico, costuma-se usar fundamen -
• Formular hipóteses diagnósticas (raciocínio clínico)
talmente as seguintes posições:
• Tomar decisões.
• Decúbito dorsal (Figura 3.2)
A iniciação ao exame clínico tem suas bases em alguns
• Decúbito lateral (direito e esquerdo) (Figuras 3.3 e 3.4)
procedimentos que constituem o método clínico (Figura 3. 1) .
• Decúbito ventral (Figura 3.5)
São eles: • Posição sentada (no leito, em uma banqueta ou cadeira)
• Entrevista (Figura 3.6)
• Inspeção • Posição ortostática (Figura 3.7).

1111• Divisão da superfície corporal em regiões.


Para a localização dos achados semióticos na superfície corporal, utiliza-se uma nomenclatura padronizada de acordo com a divisão proposta pela Comissão Internacional de
Nomenclatura Anatômica contida na Nômina Anatômica.
Conforme mostram as Figuras 3.8, 3.9, 3.1 O, 3.11e3.12, a superfície do corpo humano pode ser dividida da seguinte maneira:
1. Regiões da cabeça VI. Regiões do dorso
1. Frontal 4. Temporal 28. Vertebral 32. Lombar
2. Parietal 5. lnfratemporal 29. Sacra 33. Supraescapular
3. Occipital 30. Escapular 34. lnterescapulovertebral
li. Regiões da face 31. lnfraescapular
6. Nasal 10. lnfraorbitária VII. Região perineal
7. Oral 11. Jugal (da bochecha) 35. Anal 36. Urogenital
8. Mentoniana 12. Zigomática VIII. Regiões do membro superior
9. Orbitária 13. Parotideomasseterina 37. Deltóidea 42. Anterior do antebraço
Ili. Regiões do pescoço 38. Anterior do braço 43. Posterior do antebraço
14. Anterior do pescoço 16. Lateral do pescoço 39. Posterior do braço 44. Dorso damão
15. Esternocleidomastóidea 17. Posterior do pescoço 40. Anterior do cotovelo 45. Palma da mão
IV. Regiões do peito 41. Posterior do cotovelo
18. lnfraclavicular 20. Axilar IX. Regiões do membro inferior
19. Mamária 21. Esternal 46. Glútea 51. Posterior da perna
V. Regiões do abdome 47. Anterior da coxa 52. Anterior da perna
22. Hipocôndrica 25. Umbilical 48. Posterior da coxa 53. Calcaneana
23. Epigástrica 26. Inguinal (Fossa ilíaca) 49. Anterior do joelho 54. Dorso do pé
24. Lateral (Flanco) 27. Pubiana ou hipogástrica 50. Posterior do joelho 55. Planta do pé
26 Exame Clínico

Figura 3.2 1 Decúbito dorsal: paciente em decúbito dorsal, com os membros Figura 3.3 1 Decúbito lateral direito: paciente em decúbito lateral direito com o

superiores repousados sobre a maca em minima abdução. membro superior esquerdo repousado sobre seu corpo e o membro superior direito
fletido em abdução.

Figura 3.4 1 Decúbito lateral esquerdo: paciente em decúbito lateral esquerdo Figura 3.5 1 Decúbito ventral: paciente em decúbito vent ral com os membros
com o membro superior direito repousado sobre seu corpo e o membro superior superiores sob o rosto, o qual se encontra fletido para o lado.
esquerdo fletido em abdução.

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Figura 3.6 1 Sentado (no leito, em uma banqueta ou em uma cadeira): paciente Figura 3.7 1 Posição ortostática: paciente de pé, com os pés moderadamente
sentado com as mãos repousadas sobre as coxas. afastados um do outro e os membros superiores pendendo naturalmente junto
ao corpo.

Figura 3.8 1 Divisão da superfície corporal em regiões: cabeça e face (vista anterior). Figura 3.9 Divisão da superfície corporal em regiões: cabeça e pescoço (vista
posterior).
Capítulo 3 1 Método Clínico 27

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Figura 3.1 O I Divisão da superfície corporal em regiões: pescoço, tórax, abdome, Figura 3.12 1 Divisão da superfície corporal em regiões: tórax, dorso, membros
membros superiores e inferiores (vista anterior). superiores e inferiores (vista lateral).

► Anamnese (entrevista)
Entrevista é uma técnica de trabalho comum às atividades
profissionais que exigem o relacionamento direto do profissio-
nal com sua clientela, como é o caso do repórter, do assistente
social, do psicólogo, do enfermeiro, do cirurgião dentista e do
médico.
A entrevista, em sentido lato, pode ser definida como um
processo social de interação entre duas ou mais pessoas que se
desenvolve diante de uma situação que exige necessariamente
um ambiente no qual as pessoas interajam. A situação apre-
senta elementos de orientação para a ação das pessoas envol-
vidas na entrevista, quais sejam os objetos físicos (o local de
trabalho, os instrumentos), os objetos culturais (os conheci-
mentos prévios, os valores, as crenças) e os objetos sociais (as
pessoas envolvidas na entrevista).
A entrevista no exercício da profissão médica é um pro-
cesso social de interação entre o médico e o paciente (ou seu
acompanhante), diante de uma situação que envolve um pro-
blema de saúde, e é chamada de anamnese.
A iniciativa da consulta, regra geral, cabe ao paciente, que,
ao sentir-se convicto de que algo não está bem consigo, decide
Figura 3.1 1 1 Divisão da superfície corporal em regiões: tórax, abdome, dorso, procurar o médico para confirmar ou não a sua situação como
membros superiores e inferiores (vista lateral). doente. Se a iniciativa cabe ao paciente, sua plena execução
cabe ao médico.
O médico, ao conhecer os fatores capazes de interferir na
entrevista, poderá criar condições que favoreçam uma com-
O examinador deve se posicionar de modos diferentes, ora
preensão maior entre ele e seu paciente, tornando possível
de um lado, ora de outro, de pé ou sentado, procurando sem- uma interação "ótima''. Isso será alcançado se o médico con-
pre uma posição confortável que lhe permita máxima eficiên - seguir do paciente uma predisposição positiva para fornecer
eia em seu trabalho e mínimo incômodo para o paciente. A informações durante toda a entrevista.
recomendação para o examinador se posicionar à direita do O ambiente (consultório, ambulatório, enfermaria, quarto
paciente é clássica; contudo, não quer dizer que ele deva per- de hospital ou a própria residência do paciente) e o instru-
manecer sempre nesta posição. O examinador deverá deslo- mental utilizado pelo médico são os objetos físicos que inter-
car-se, livremente, como lhe for conveniente. ferem na anamnese. Dessa maneira, um ambiente adequado
28 Exame Clínico

(silencioso, agradável, limpo) e um instrumental apropriado corredores dos hospitais ou o interrogam durante as festas
(aparelhos que funcionam bem, por exemplo) são condições às quais o médico comparece. Tais "consultas" são inevitavel-
indispensáveis para uma boa entrevista. mente incompletas e tirar conclusões diagnósticas delas é um
O emprego de gravadores não é conveniente na entrevista ato de adivinhação. Desde logo os estudantes devem aprender
clínica, pois poderá atuar como forte inibidor para o paciente. que o corredor do hospital e os salões de festa são ambientes
As anotações de próprio punho do médico continuam sendo inadequados para a entrevista médica.
a melhor maneira de registrar as informações prestadas pelo A cultura fornece aos membros de uma sociedade, além do
paciente. O registro digital é utilizado atualmente como alter- instrumental básico de comunicação entre eles - que é a lín-
nativa para listar os dados da entrevista médica; neste caso, o gua -, os padrões de comportamento social que devem orien-
médico ou o estudante deve estar atento para não dispensar tar suas ações.
mais importância à máquina que ao paciente. O aluno ini- O médico e o paciente, regra geral, têm maneiras distintas
ciante costuma se valer de um roteiro impresso para conduzir de sentir, pensar e agir: o médico apoia suas atitudes, como
a anamnese; a condição de iniciante justifica tal procedimento profissional, em um quadro de referência científico, enquanto
(Figura 3.13). o paciente apoia suas atitudes em um modelo explicativo leigo.
Valorizando o ambiente e o instrumental, criam-se condi- A utilização de quadros de referências distintos para orientar
ções favoráveis para a interação entre o médico e o paciente. as ações pode dificultar o desenrolar da entrevista entre o
A melhor exemplificação da necessidade de ambiente ade- médico e o paciente; assim, deve o médico preocupar-se não
quado é bem conhecida dos médicos: são as chamadas "con- só em conhecer e compreender os elementos culturais que
sultas de corredor" e as "consultas em eventos sociais", quando orientam a ação do paciente, como também fazer uma análise
os "clientes" abordam o médico ao passarem por ele pelos de si próprio, no sentido de tornar conscientes os valores bási-
cos que orientam sua ação.
O médico deve dar atenção especial à lingua-
gem utilizada durante a entrevista, pois o con-
junto de símbolos (termos e expressões) utilizado
Paciente pela profissão médica nem sempre é compreen-
Predisposição dido pelo paciente, uma vez que seu quadro de
positiva para dar referência pode ser distinto.
informações Plaja et ai. (1969) fizeram um estudo dos pro-
cessos e níveis de comunicação entre médico e
paciente e chegaram a resultados que merecem
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- ser do conhecimento dos iniciantes no método
clínico. Verificaram que muitos doentes tiveram
Atenção a indícios Controle de suas problema de compreensão e, no entanto, por ini-
sublimiares de manifestações que bição ou acanhamento, "fingiram" estar enten-
incompreensão, possam induzir a
receio, defesa, respostas
dendo perfeitamente o que lhes fora perguntado
insegurança e inadequadas ou explicado. Comprovaram também que o grau
Médico
desconfiança
Médico
de incompreensão acompanhava de perto as
diferenças sociais entre o médico e o paciente.
Constataram, por fim, que essas barreiras eram
A superadas no momento em que o médico enten-
dia e aceitava a necessidade de levar em conta a
cultura de seus pacientes.
O médico deve conhecer, também, os padrões
Objetos Objetos
normativos que a cultura criou para ele e para
físicos Paciente (modelo culturais o seu paciente. A nossa cultura estabelece, por
Ambiente adequado
quase sempre explicativo leigo): exemplo, que tanto o médico quanto o paciente
representado por • Componentes devem se apresentar bem compostos em termos
um consultório, um culturais de higiene e aparência pessoal; o paciente espera
• Expectativas de
quarto, uma que o médico se interesse por seu caso e que
enfermaria ou um comportamento
• Comunicação lhe dê atenção, enquanto o médico espera que
cômodo da casa do
(linguagem) o paciente responda de modo adequado às suas
paciente
perguntas. O conhecimento adequado do médico,
~=====================~ :=======================:
Médico (modelo Comunidade:
dos padrões normativos que regem a sua conduta
explicativo científico): • Conhecimento
e a do paciente, bem como o conhecimento das
• Consciência ética dos recursos expectativas de comportamento que o paciente
• Adequação da assistenciais tem do profissional médico, ou seja, a conduta
linguagem disponíveis que o paciente espera que o médico tenha, são
• Cuidado com a • Conhecimento elementos úteis para realizar uma boa entrevista.
apresentação social das condições
A entrevista médico-paciente desenvolve-se,
Objetos sanitárias Objetos pois, em um ambiente específico, seguindo
culturais culturais
padrões normativos preestabelecidos pela cultura.
O médico não deve se esquecer de que, além
B dos objetos físicos e culturais, existem os objetos
Figura 3.13 1 (A e B) Elementos que interferem na anamnese. sociais. Estes objetos sociais são o próprio médico
Capítulo 3 1 Método Clínico 29

e o paciente; assim, a reação do paciente frente à ação do O médico, ao conhecer que os objetos sociais se interes-
médico, ou vice-versa, é um estímulo a uma nova ação deste timulam, deve ter o máximo cuidado em controlar e alterar
último, e assim sucessivamente. Logo, existe uma interestimu- o comportamento do paciente; por outro lado, deve desen-
lação entre o médico e o paciente. Se o médico apresenta uma volver sua intuição no sentido de captar no paciente indícios
fisionomia tensa após uma resposta do paciente, isso será um subliminares, como uma leve hesitação ao apresentar uma
elemento de orientação para a ação posterior do paciente, que resposta ou um franzir de testa, que permitirão desenvol-
poderá sentir-se preocupado e passar a responder conforme ver condições que levem a uma interação mais eficaz com o
uma nova perspectiva. paciente.

Relato de um encontro clínico

Ao se fazer a anamnese, o significado de uma pergunta pode ser totalmente o paciente, com ar amistoso, convidando-o a sentar-se diante da escrivaninha.
diferente para o médico e para o paciente, como se pode observar a partir do Naquele momento tinha início um "encontro clínico" com toda a sua complexi-
relato do encontro clínico descrito, aseguir, em cinco atos. dade, embora parecesse algo tão simples: um paciente em busca de assistência
médica! Éfácil imaginar a distância entre aquelas duas pessoas - diferenças
1º ato socioeconômicas, culturais, educacionais. Viviam em mundos diferentes: os
Um paciente que morava nas margens de um afluente do Rio Negro, ao se sentir desejos, as expectativas, os sonhos, as possibilidades, as limitações, tudo era
adoentado, sem poder trabalhar, decide ir à procura de um médico em Manaus. diferente. Ao iniciar a entrevista, o médico, que sempre se interessou pela rela-
Levanta cedo, guarda no embornal a farofa que sua mulher preparou naquela ção médico-paciente, levou em conta tudo isso. Mas as vivências eas expectati-
madrugada, pega sua rede, uma camisa e uma cueca. Embarca em sua canoa e vas eram diferentes como se pode perceber pelo diálogo entre eles:
rema durante várias horas para chegar ao Rio Negro no fina l daquela tarde, a Médico: Bom dia, seu José. (O médico sabia o nome porque estava no
tempo de pegar o barco que o levaria a Manaus. Não se esqueceu de levar seu prontuário.)
radinho de pilha, único elo de ligação dele com o mundo. Paciente: Bom dia, Doutor. (O paciente não sabia o nome do médico. Era
apenas o "doutor''.)
2Q ato Médico: Oque osenhor sente? (Era sua maneira de iniciar aanamnese.)
Naquela mesma noite, o médico que oatenderia no diaseguinte eque era pro- Paciente: Oque eu sinto, Doutor, é muita saudade da minha mulher e de
fessor da Faculdadede Medicina foi para seu escritório, em sua casa, para estu- meus meninos! Deixei eles ontem de madrugada. Minha mulher toma conta
dar epreparar uma aula, hábito que cultivaradurante toda asua vida. Consultou direitinho deles. Eu sei, mas estou preocupado.
livros, visitou alguns sites da internet, ouviu um pouco de música clássica e foi Médico (Pensando: "O paciente não entendeu o"significado" de minha per-
dormir ao lado de sua mulher. gunta. Vou modificá-la:'): Seu José, o que o senhor tem?
Paciente: Ah! Doutor, não tenho quase nada. Só tenho umas galinhas, um
3º ato porquinho engordando no chiqueiro, uma rocinha de mandioca, pouca coisa,
Osol nascia sobre a Floresta Amazônica quando o ribeirinho saiu da rede após Doutor.
uma noite maldormida, já que estava intranquilo e inseguro. Era a primeira vez Médico (Pensando: "Fiz a pergunta de maneira errada, outra vez!"). No
quedeixava sua casa, sua mulher e seus filhos em busca de assistência médica. mundo interior do paciente naquele momento"sentir" e"ter" não estava rela-
Na mesma hora, o médico acordou, bem disposto, contente com a vida, pois cionado com sua doença. Decidiu, então, mesmo contrariando o qu~ ensinava
gostava de seu trabalho como médico ecomo professor. Tinha grande interesse aseus alunos, fazer uma pergunta maisdireta: Seu José, qual ésuadoença?
pelos pacientes e pelos seus alunos. Tomou um bom café da manhã, beijou sua Paciente: Ah! Doutor, o senhor équesabe, osenhor é médico. Osenhor sabe
mulher, pegou seu carro para deixar os filhos no colégio eir para o hospital onde muita coisa, vim aqui pra o senhor me curar, para eu poder voltar logo para
atenderia os pacientes no ambulatório de clínica médica. No mesmo momento, minha casa.
o ribeirinho desembarcou no cais de Manaus; tomou um café com leite no pri- Médico (Ao perceber que precisava mudar a estratégia para encontrar um
meiro boteco que encontrou epediu informações a umguarda sobrecomoche- ponto de contato entre ele e o paciente.): Seu José, por favor, tire a camisa e
gar ao Hospital Universitário. deite-se nesta mesa paraque eu possa examiná-lo.
Apartir de então, as expectativas do médico edo paciente entraram emsinto-
4º ato nia. Naquele momento, oencontro clínico teve início de verdade porque o médico
Omédico e o paciente chegaram quase juntos ao hospital. Era um dia tran- se deu conta de que teria de fazer uma adaptação das"técnicas daentrevista"para
quilo de atendimento, e a funcionária que o atendeu foi atenciosa e prestativa; aquele paciente que estava diante dele. Naquele caso, a melhor técnica foi fazer a
deu-lhe uma ficha para que fosse examinado naquela manhã mesmo na clínica história durante arealização do exame físico. Àmedida que examinava opaciente,
geral. fazia as perguntas que o permitiriamconstruir uma históriaclínica.
Esse relato foi descrito antes da abordagem da seção que serávista adiante,
5º ato Técnicas da Entrevista, para exemplificar a necessidade de conhecer não apenas
O médico já havia tomado seu lugar na sala de consulta do ambulatório. as bases eas técnicas de uma entrevista clínica, mas, também, algo indispensá-
Naquele dia não havia estudantes; estavam em greve. Opaciente permaneceu vel: ter consciência de que o mundo do paciente, incluindo tantosaspectos que
sentado em um banco em frente à sala cujo número correspondia à sua senha. o médico desconhece, pode ser tão diferente do dele que só será possível levar
Ele era analfabeto, mas conhecia números. Uma auxiliar abre a porta e chama adiante a elaboração da anamnese se ele souber usar a principal qualidade do
seu nome. Levanta-se ecaminha um pouco assustado naquele ambiente total- método clínico, suaflexibilidade. Portanto, ao estudar as técnicas da entrevista,
mente estranho, tendo em seus pensamentos a lembrança de sua mulher e nunca se esqueça: a melhor "técnica" é a que permite estabelecer uma verda-
de seus filhos. Omédico, demonstrando educação, põe-se de pé para receber deira comunicação com o paciente.
30 Exame Clínico

Expressões tranquilizadoras podem ser necessárias


• Técnicas da entrevista em momentos de dificuldade, mas não se deve fazer afir-
Existem várias técnicas para se realizar a entrevista médica, mativas prematuras sobre diagnóstico ou prognóstico só
que podem ser adaptadas em função das características de para aliviar a ansiedade do paciente
cada paciente. • Reafirmação: a reafirmação é uma maneira de transmi-
tir ao paciente uma indicação de que entendeu o que foi
Tipos de perguntas dito por ele. A reafirmação encoraja o paciente, que se
Basicamente, podem ser perguntas abertas e perguntas mostra assustado, aborrecido ou desinteressado. É um
diretas. As perguntas abertas são mais úteis no início da entre- modo de reforçar um diálogo que transparece distancia-
vista, pois permitem ao paciente contar sua história esponta- mento. Quando na forma de interrogação, pode parecer
neamente. Por exemplo: "Que tipo de problema o(a) senhor(a) um confronto. Dependendo do tom de voz, pode ser
está tendo?", "Quais eram suas condições de saúde antes de entendido pelo paciente como apenas a interpretação
surgir esta dor?". que o médico está fazendo de alguma informação.
As perguntas abertas também são usadas para facili-
tar a narrativa do paciente, o que permite ao médico uma
compreensão biopsicossocial do processo de adoecimento. Normas básicas da entrevista
Após algumas perguntas abertas, o examinador deve dire- ■ Não se deve fazer anotações extensas durante a entrevista. Aatenção
cionar a atenção do paciente com perguntas diretas, as quais deve ser centralizada no que a pessoa está dizendo, nas expressões faciais
reduzem as informações, mas permitem obter dados mais e na linguagem corporal
específicos. Por exemplo: "Há quanto tempo surgiu o sin- ■ Pode-se usar um bloco de papel para anotar datas ou nomes importantes
toma?'; "Em que região sente a dor?". para o registro da anamnese
Usa-se esse tipo de pergunta para o procedimento da ficha ■ Digitar no computador durante a narrativa cria um distanciamento entre o
médica ou do prontuário. A compreensão da narrativa e o médico e o paciente que empobrece o relato e interfere na relação médico-
direcionamento da anamnese por meio de perguntas objetivas -paciente. Émelhor fazer a digitação dos dados obtidos após o término da
possibilitam ao profissional médico levantar pontos importan- história da doença atual que é, sem dúvida, o componente principal da
tes para o direcionamento do raciocínio clínico (script) . anamnese. Se a opção for digitar, o entrevistador deve usar uma estraté-
gia em que o computador fique em segundo plano. Opaciente, e não a
Técnicas para entrevistar máquina, deve ficar no foco de atenção do médico
O examinador precisa saber o momento de usar o silêncio, ■ Ao final da entrevista, quando já tiver obtido uma clara impressão do
a facilitação, o confronto, o apoio e a reafirmação. motivo pelo qual o paciente procurou auxílio médico, centrada na história
■ Silêncio: há momentos da entrevista em que o examina-
da doença atual, além de conhecer suficientemente a história patológica
dor deve permanecer calado, mesmo que pareça ter per- pregressa, principalmente doenças preexistentes, e ter uma compreensão
dido o controle da conversa. Para o paciente loquaz não das condições socioeconômicas eculturais do paciente, o médico deve expor
é uma boa técnica, porque esse tipo de pessoa passa de ao paciente o que considerou relevante, terminando com as seguintes per-
um tema para outro com muita facilidade e a entrevista
guntas: "Compreendi bem o problema do senhor (ou da senhora)?'; "Deseja
perde a objetividade.
acrescentar outras informações?"
O entrevistador deve utilizar o silêncio quando o
■ Não usar termos médicos durante a entrevista e, quando empregá-los,
paciente se emociona. É inadequado dizer ao paciente estar seguro de que o paciente tenha clara compreensão deles.
que não chore ou que se controle. Entregar ao paciente
uma caixa de lenços de papel naquele momento é uma
atitude de apoio e compreensão
■ Facilitação: a facilitação é uma técnica de comunicação ► Exame físico
verbal ou não verbal que encoraja o paciente a continuar
A inspeção, a palpação, a percussão, a ausculta e o uso de
falando, sem direcioná-lo para um tema. Expressões
alguns instrumentos e aparelhos simples (esfigmomanômetro,
como "Continue", "Fale mais sobre isso'; assim como
otoscópio, oftalmoscópio e outros) são designados, conjunta-
gestos de balançar a cabeça, demonstram interesse e
compreensão e podem facilitar o relato do paciente mente, exame físico, que, junto com a anamnese, constitui o
■ Confronto: o confronto indica ao paciente que o exami- método clínico.
nador detectou algum aspecto que merece aprofunda- Há um aspecto do exame físico que merece ser ressaltado:
mento. Por exemplo: "O(a) senhor(a) parece irritado(a)", seu significado psicológico. Este componente afetivo mais
"O senhor(a) está zangado(a)?". nítido na anamnese sempre existe no exame físico e precisa
O confronto deve ser empregado com cuidado, uma ser mais bem reconhecido pelo médico, porque é um dos
vez que seu uso excessivo pode ser interpretado pelo elementos fundamentais da relação médico-paciente. Sem
paciente como grosseria ou falta de compreensão. dúvida, a base da relação médico-paciente encontra-se na
A interpretação é um tipo de confrontação que anamnese, pois é por meio dela que se estabelecem os laços
se baseia em uma conclusão tirada pelo examina- afetivos entre o médico e o paciente. Contudo, o compo-
dor. Por exemplo: "Parece que o(a) senhor(a) está nente psicológico do exame físico também é muito impor-
amedrontado(a):' tante, bastando lembrar a expressão: "Doutor, estou em suas
■ Apoio: afirmações do apoio promovem segurança no mãos!", que demonstra de maneira clara como os pacientes
paciente. Dizer, por exemplo, "Eu compreendo" no veem o médico nos seus momentos mais difíceis. Nessa
momento em que o paciente demonstrar dúvida ou expressão estão sintetizados a parte técnica e o significado
insegurança pode encorajá-lo a prosseguir no relato ou psicológico. Ser examinado e entregar-se é o significado do
fornecer mais detalhes. que o paciente quer dizer.
Capítulo 3 J Método Clínico 31

Quando o médico olha o paciente, ele está fazendo duas tivamente no diagnóstico e na decisão terapêutica, na adesão
coisas: inspecionando seu corpo (parte técnica), ao mesmo ao tratamento, no sucesso ou no fracasso do médico.
tempo em que vê a pessoa que se sente doente (componente Isso não quer dizer que se possa esquecer ou desvalorizar
psicológico), sendo capaz de reconhecer alterações anatômi- os aspectos técnicos, que são indispensáveis para se fazer cor-
cas quando inspeciona e modificações emocionais quando vê. retamente a entrevista, da mesma maneira que não se pode
Quando o médico palpa ou percute também ocorrem duas coi- desconhecer ou desprezar os fatores emocionais e sociocultu-
sas diferentes: do ponto de vista de técnica semiológica, a pal- rais. Semiotécnica, ou seja, técnicas para a entrevista e para o
pação e a percussão permitem detectar modificações estrutu- exame físico, princípios bioéticos e qualidades humanas (auto-
rais e funcionais, mas não se pode esquecer de que no mesmo nomia, beneficência, não maleficência, justiça e sigilo) coexis-
momento o médico está tocando o corpo do paciente com suas tem no encontro clínico, fazendo dele o núcleo luminoso de
mãos; e tocar é mais do que palpar. Quando o médico ausculta todas as profissões da área da saúde. Cumpre salientar, por
percebe os ruídos originados no corpo, porém, mais impor- outro lado, que só é possível compreender o exato significado
tante, é escutar o que o paciente tem a dizer. do encontro clínico convivendo com pacientes. Nada substitui
Donde se conclui que no exame físico é necessário saber o paciente: nem livros, programas de computador, manequins,
inspecionar e ver, palpar e tocar, auscultar e escutar. Os dois tampouco laboratórios de habilidades. Mais ainda, é necessá-
componentes - parte técnica e componente psicológico - rio reproduzir o encontro clínico tal como acontece no mundo
reforçam-se mutuamente, fazendo do exame clínico um ines- real, cuja essência é a relação dual entre um profissional da
gotável manancial de conhecimentos sobre o paciente. saúde e um paciente. O fato de os estudantes serem aprendizes
Uma análise mais profunda desses fenômenos revela não impede a vivência plena de um encontro clínico com o
mecanismos psicodinâmicos que escapam à compreensão paciente.
do paciente e do próprio médico, no que se refere ao compo- O essencial é aprender a fazer o exame clínico ao mesmo
nente psicológico, porque é intuitivo, subjetivo e inconsciente, tempo em que se vai incorporando os princípios bioé-
enquanto a parte técnica, por ser racional, objetiva, analítica ticos, desenvolvendo a capacidade de relacionamento com o
e consciente, é mais fácil de ser planejada e executada. Saber paciente e cultivando as qualidades humanas essenciais - inte-
usar o componente psicológico é uma necessidade que se faz gridade, respeito e compaixão - para o exercício de uma medi-
cada vez mais presente para que o médico recupere a parte cina de excelência.
mais nobre da medicina e a mais respeitada pelos pacientes.
Princípios para oaprendizado do método clínico
■ Dominar o método clínico em toda a sua amplitude para identificar a
► Oencontro clínico doença e conhecer o paciente
■ Saber avaliar opaciente não apenas do ponto de vista biológico (anatômico,
Toda vez que um profissional da saúde tem diante de si uma fisiológico, bioquímico, patológico), mas considerá-lo também em seus
pessoa - sadia ou doente - que busca os seus serviços, isso aspectos emocionais esocioculturais. Em outras palavras: não ficar restrito à
representa um "encontro clínico''. O aprendizado prático dos "lesão" ou "disfunção" de um órgão ou parte dele
estudantes de medicina e de outras profissões da área da saúde ■ Compreender que componentes emocionais são concernentes ao
deve ser encarado como um "encontro clínico''. e não apenas campo da subjetividade, tanto do paciente como do médico, incluindo
como uma "aula prática''. aspectos afetivos e éticos, relacionados ao paciente e à sua família,
Neste momento várias coisas estão acontecendo: a entre- ao trabalho, às condições econômicas e legais, à representação do
vista que vai permitir a construção da história clínica, indis- paciente na sociedade
pensável para se fazer hipóteses diagnósticas consistentes, a • Reconhecer que os aspectos socioculturais dizem respeito ao paciente não
partir das quais se fará o raciocínio clínico que levará a uma como um indivíduo isolado como é visto no modelo biomédico, mas inse-
decisão terapêutica; a relação entre o estudante (no papel de rido em contextos suprapessoais, dos quais participa tanto ativa como
médico) e o paciente; e, acima de tudo, a relação entre duas passivamente
pessoas, quando, então, o que prevalece são as qualidades • Compreender desde o primeiro paciente que oencontro clínico é o núcleo
humanas. luminoso da profissão médica, e é exatamente durante o exame clínico
O modelo biomédico, por ser tecnicista e mecanicista, só que tudo acontece!
dá valor ao que pode ser medido ou visto em imagens. Daí • Por fim, é necessário que tanto o professor quanto o estudante de
a dificuldade dos profissionais da saúde formados no modelo medicina tenham pleno conhecimento do atual código de ética, pois
biomédico em compreenderem a importância e a complexi- o processo ensino-aprendizagem do método clínico assim como todo
dade do encontro clínico. Isso acontece porque estão presentes o ato pedagógico da medicina está hoje sob a égide das normas éticas
fatores emocionais e socioculturais que vão influenciar defini- da profissão.

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