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FILHO, Domício Proença. A linguagem literária. 8.ed. São Paulo: Ática, 1986. p. 12 - 25.

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A linguagem

Conceitos

Apesar do ceticismo com que alguns estudiosos encaram a


caracterização da linguagem, creio útil destacar, por pertinentes ao nosso
objeto de estudo, alguns conceitos com que se tem tentado configurá-la:

• A linguagem é uma das formas de apreensão do real. O ser humano


vive em permanente e complexa interação com a realidade e a apreende de
várias maneiras, por exemplo, através dos sentidos. Mas, como lembra o
linguista Iouri Lotman, as informações que o envolvem, os sinais que a vida lhe
envia exigem, para um melhor desempenho na luta pela sobrevivência, que ele
os decifre e os transforme em signos capazes de permitir-lhe comunicar-se.14
Vale dizer, ele precisa transformar essas informações e esses sinais em
elementos de uma linguagem para assegurar-lhes a perfeita compreensão de
que decorre o pleno aproveitamento de importantes oportunidades no seu
percurso de vida.

Para certos teóricos, acrescento, a linguagem, ao converter a realidade


em signos, ultrapassa as limitações da apreensão
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sensorial para permitir um desvelamento (um "retirar de véus") do real em
relação ao sujeito. É, por outro lado, uma forma de organizar o mundo que nos
cerca.

• A linguagem é a faculdade que o homem tem de expressar seus


estados mentais através de um conjunto de sons vocais chamado língua, que é
ao mesmo tempo representativo do mundo interior e do mundo exterior, propõe
a clássica lição de Ernst Cassirer que pode ser lida nas páginas 91 e 92 da sua
obra lançada na tradução espanhola com o título Psicologia del lenguaje, pela
Paidós, em Buenos Aires.
14
Cf. LOTMAN, Iouri. La structure du texte artistique. Paris: Gallimard, 1973. p. 29.
Sob essa visão, centrada de maneira óbvia no sujeito, a linguagem é
entendida como uma atividade que apresenta um aspecto psíquico (linguagem
virtual) e um aspecto propriamente linguístico (linguagem realizada) que
compreende, por sua vez, o ato linguístico (realidade imediata) e o repertório
dos atos linguísticos (material linguístico). No âmbito desse posicionamento, a
língua é uma abstração, um conjunto organizado de aspectos comuns aos atos
linguísticos, vale dizer, em termos técnicos, um sistema de isoglossas.15

Cabe esclarecer que a linguística tem como objeto o estudo da linguagem


falada e articulada, ou seja, aquela que se concretiza nas línguas naturais. Os
demais sistemas são objeto de interesse da semiótica ou semiologia, entre eles
o sistema de comunicação usado pelos animais (zoossemiótica), as
comunicações táteis, os sinais olfativos, os códigos do gosto, os códigos
musicais, o sonho, a pintura, a literatura e outros.

• A linguagem, como acentua Tatiana Slama-Casacu, na página 20 de


seu Langage et contexte (Haia, 1961), é um conjunto complexo de processos
— resultado de uma certa atividade psíquica profundamente determinada pela
vida social — que

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torna possível a aquisição e o emprego concreto de uma língua qualquer. Eis-
nos de novo ante um conceito restrito. Essa dimensão se amplia, ainda na
palavra de Lotman, quando afirma que "por linguagem entendemos todo
sistema de comunicação que utiliza signos organizados de modo particular".16

Sistema, comunicação e signo

Esse último conceito de linguagem nos conduz didaticamente à


explicitação de sistema, comunicação e signo.

Sistema é um conjunto organizado. Dizer "organizado" pressupõe


princípios organizatórios que conferem singularidade ao conjunto. Diante das
múltiplas modalidades de linguagem, cumpre, pois, conhecer esses princípios,
se desejarmos dela nos assenhorear e assegurar a eficácia da comunicação

15
Cf. COSERIU, E. Teoía del lenguaje y linguística general. 2. ed. Madri: Gredos, 1969. p. 91-2.
16
LOTMAN, Iouri. Op. cit. Paris: Gallimard, 1973. p. 34-5.
que por seu intermédio se processa.

Por comunicação compreende-se, ainda em sentido restrito, a troca de


mensagens ou informações entre seres humanos. Se se pensa na etimologia
da palavra, pode ser entendida como a faculdade que o homem tem de tornar
comum a outrem seus pensamentos, sentimentos e desejos e as coisas do
mundo que o cercam. Em sentido amplo, envolve também a realidade técnica
da relação entre o homem e as máquinas (por exemplo, os computadores) e
das máquinas entre si, além de estender-se ao mundo animal e aos sistemas
próprios do interior do indivíduo, como, por exemplo, os sinais transmitidos
pelos feixes de nervos do organismo.

Claro está que, quando alguém "fala consigo mesmo", está representando
simultaneamente dois falantes.

Signo é outro termo de conceituação ampla e complexa, mas, de maneira


geral, e em sentido lato, pode ser entendido, se-
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gundo Charles Sanders Peirce, como qualquer elemento que, sob certos
aspectos e em certa medida, representa outro.

À luz das posições do mesmo estudioso, podemos identificar três


modalidades de signo, em relação àquilo que designam: o signo índice ou
índex, que mantém relação direta com o que representa (é o caso de uma
impressão digital, por exemplo); o signo ícone, que tem analogia ou
semelhança com o que representa (uma fotografia, uma estátua, um esquema);
o signo símbolo, que se baseia numa convenção (as palavras de uma língua,
as bandeirolas usadas na comunicação marinheira, os sinais de trânsito etc).
Essas modalidades admitem superposições: a cruz, por exemplo, enquanto
instrumento de flagelação, é um ícone; enquanto representação do
cristianismo, é um símbolo; a impressão digital pode envolver dimensões de
ícone e de índice, e ganha caráter simbólico quando, por exemplo, passa a
representar uma entidade ou uma empresa; as palavras onomatopaicas são
símbolos-ícones: farfalhar (de sedas), cacarejar (de galinhas) etc.17

17
Cf. PIGNATARI, Décio. Informação. Linguagem. Comunicação. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 1970. p.
28-9.
Fatores do processo linguístico da comunicação e funções da linguagem

O processo da comunicação implica fatores e funções que têm sido objeto


de preocupação de vários estudiosos, entre eles Roman Jakobson, para
ficarmos apenas numa perspectiva linguística. Para esse especialista, cada ato
de comunicação verbal envolve, na linguagem comum, um remetente que
envia uma mensagem por meio de um código a um destinatário, estabelecido
entre os interlocutores um contato que envolve um canal físico e a necessária
conexão psicológica. A mensagem enviada é compreendida por-

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que se refere a um contexto extra verbal e a uma situação efetivamente
existente anteriores e exteriores ao ato da fala.

Remetente ou emissor, mensagem, código, destinatário ou receptor,


contato e contexto são, portanto, os seis fatores do processo linguístico da
comunicação.

A partir deles, o citado linguista aponta as conhecidas seis funções da


linguagem:

a) função referencial ou denotativa — pela linguagem nós nos referimos


às coisas do mundo que nos cerca e às do nosso mundo interior; a linguagem
denota, representa o mundo;

b) função expressiva ou emotiva — a linguagem é um meio de


exteriorização psíquica; as interjeições são um exemplo marcante dessa
função;

c) função conativa (de conação, que significa tendência consciente para


atuar) ou apelativa — quando falamos ou escrevemos, exercemos maior ou
menor influência sobre o nosso interlocutor. A linguagem funciona como
atuação social ou como apelo. Os verbos no imperativo acentuam bem a
presença dessa função, e, sob esse aspecto, é significativa a sua utilização tão
frequente nas mensagens da propaganda e da publicidade;

d) função fática — caracteriza-se quando a mensagem busca estabelecer


ou interromper o que se está comunicando. São exemplos frases como "Alô!",
"Estão me entendendo?", "Certo?", "Está tudo claro?";
e) função metalinguística — ocorre quando o emissor e o destinatário
verificam se estão usando o mesmo código, quando explicitamos termos da
própria linguagem usada: Literatura é a arte da palavra;

f) função poética ou fantástica — evidencia-se quando, através dos


signos, se "cria" intencionalmente uma realidade, configurada sobretudo numa
obra de arte literária.18

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As três primeiras funções apontadas por Jakobson — a representativa, a
emotiva e a conativa — foram anteriormente caracterizadas por Karl Buhler, à
luz da psicologia. Para esse estudioso alemão, a linguagem é um meio
precípuo de exteriorização de estados de alma (manifestação psíquica), exerce
uma atuação sobre o próximo na vida comum (atuação social ou apelo) e
estrutura a nossa experiência mentada (função representativa).

Nos atos de linguagem, várias dessas funções se apresentam


concomitantemente e estabelece-se entre elas uma certa hierarquia.

Linguagem, língua e discurso

Linguagem nos faz voltar ao conceito de língua, tal a relação que as


vincula.

A língua é um sistema de signos, ou seja, é um conjunto organizado de


elementos representativos. Como tal, é regida por princípios organizatórios
específicos e marcados por alto índice de complexidade: envolve dimensões
fônicas, morfológicas, sintáticas e semânticas que, além das relações
intrínsecas peculiares a cada uma, são também caracterizadas por um
significativo inter-relacionamento. A rigor, mais do que um sistema, a língua é
um conjunto de subsistemas que se integram.

Tomemos, por exemplo, a palavra rua: o seu significado tem a ver com o
jogo de oposições que marca o sistema fônico da língua portuguesa, o que se
aclara quando a comparamos com termos como lua, nua ou sua e lembramos
que o fonema se caracteriza por marcar a distinção de significado entre as

18
Cf. JAKOBSON, Roman. Essais de linguistique générale. Paris: Minuit, 1966. V. também______.
Linguística e comunicação. 2. ed. rev. São Paulo: Cultrix, 1979.
palavras de uma língua. A forma nasceu, no jogo morfológico dos verbos,
termina por um fonema que nos indica pessoa, tempo, aspecto e modo da ação
nela expressa; é a terceira pessoa do singular do pretérito perfeito do
indicativo, diz a gramática: nasceu, por oposição a nasceram, nascemos,
nascem, nascesse, indicadores

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de outras pessoas, outros tempos, modos, aspectos, no sistema morfológico da
língua portuguesa; os aspectos sintáticos se fazem presentes na combinação
de umas palavras com as outras na frase de que fazem parte. A significação
global emerge, portanto, das relações fono-morfo-sintático-semânticas que
estão na base da organização desse complexo sistema.

Já que estamos tratando de significação, vale lembrar que, em termos de


palavra, esta resulta fundamentalmente, na sua condição de signo, da relação
entre o significante e o significado, dois aspectos que o identificam: o primeiro,
perceptível, audível; o segundo, produto dele, nele contido. E isso é ponto
pacífico, desde os estudos pioneiros de Ferdinand de Saussure.

Não nos esqueçamos também de que a língua, além de ser um conjunto


organizado de valores, é, simultaneamente, uma instituição social, é a
linguagem de urna sociedade. É constituída de elementos que têm um valor em
si e um valor em relação aos demais; o signo linguístico, como explicita Barthes
nos seus Elementos de semiologia, é como uma moeda: cada peça vale pelo
seu poder aquisitivo, mas vale também em relação às outras moedas de valor
maior ou menor.

A língua pode ser entendida ainda como a realização de uma linguagem,


um sistema de signos que permite configurar e traduzir a multiplicidade de
vivências caracterizadoras do ser de cada um no mundo.

Em sentido restrito, alguns linguistas a consideram um sistema de sons


vocais peculiares ao uso da linguagem pelo ser humano.

Outros, como Celso Cunha, por exemplo, em sua Gramática do português


contemporâneo, a definem como "um sistema gramatical pertencente a um
grupo de indivíduos" e, como expressão da consciência de uma coletividade,
como o meio pelo qual esta concebe o mundo que a cerca e age sobre ele.19

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Podemos, ainda mais, entender saussurianamente com o citado Barthes
que a língua (langue) é "a linguagem menos a fala (parole), é, ao mesmo
tempo, uma instituição social e um sistema de valores. Como instituição social,
ela não é absolutamente um ato; escapa a qualquer premeditação: é a parte
social da linguagem"20. Língua e fala, diz ainda o semiólogo francês, "retiram
sua definição do processo dialético que as une: não existe língua sem fala, não
há fala fora da língua".21

Criação social, a língua vive em permanente mutação, acompanha as


mudanças da sociedade que a elege como instrumento primeiro de
comunicação.

Nesse processo, o exercício da linguagem produz uma espécie de


depósito sedimentário que ganha valor de instituição e se impõe ao falar
individual por meio do dicionário e da gramática.

Discurso e estilo

Se a língua envolve uma dimensão social e se caracteriza por ser


sistemática, a utilização individual que dela fazemos, ou seja, a fala ou
discurso, é um conglomerado de fatos assistemáticos e, em relação a ela, "um
ato individual de seleção e atualização", para ficarmos com as palavras do
mesmo Barthes. Em outra perspectiva, entende-se o discurso como um
enunciado ou um conjunto de enunciados ditos e escritos por alguém na
direção de um destinatário. Enunciado, segundo alguns linguistas, é, em
função da significação, a unidade elementar da comunicação verbal, uma
palavra ou sequência de palavras dotadas de sentido.22

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19
CUNHA, Celso. Gramática do português contemporâneo. Belo Horizonte: Bernardo Álvares, 1970. p. 15.
20
BARTHES, Roland. Le degré zero de l'écriture suivi de éléments de sémiologie. Paris: Gonthier, 1964. p.
85-6.
21
Id., ibid.
22
Os conceitos de discurso e enunciado variam em função do enfoque.

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