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ENSAIO SOBRE A
DESIGUALDADE DAS
RAÇAS HUMANAS
TRADUÇÃO E PREFACIO
DE
FRANCISCO SUSANNA
Editorial Apolo
Barcelona
1937
PREFACIO DO TRADUTOR
CONDE DE GOBINEAU
CONDE DE GOB1NEAU
IO
CONDE DE GOBINEAU
De maneira que , assim que o Ario emigra de seu solo natal — o Irã — >
para fundar , cá e acullá., agrupamentos progressivos; assim que seu espírito
bélico e dominador, sempre à gaga de conquistas , lhe leva a se misturar
com outros povos de raça diferente e inferior à sua , melhora a estes sen-
siblemente, mas sensivelmente também se depaupera a si mesmo. Essa mez-
cla, por ou restantes indispensável, traz consigo um germen de degeneração ,
de morte . De não captar um novo aflujo de sangue aria, sobrevem inde-
fectiblemente a depauperación dos diversos agrupamentos. E como esse
aflujo de sangue ana é impossível , porquanto, segundo o próprio Gobineau,
não fica já sobre a face do planeta um Ario puro , a humanidade está fa-
talmente condenada a uma gradual decadência, até o dia, por fortuna muito
longínquo ainda, em que se extinga total e definitivamente. O Dies irae t com seus
fúnebres trenos, é, pois, o cántico reservado aos ramos futuros das
presentes gerações. Tal é a escalofriante conclusão do Ensaio.
A teoria das raças assim concebida parece atingir em nossos dias seu
máximo predicamento. E, falsa ou verdadeira — coisa que não nos compete a
nós averiguar — , o verdadeiro é que, bastante desnaturalizada, conta hoje
com milhares de prosélitos em todos ou quase todos os países do mundo. Na-
turalmente, a isso não tem sido nade estranha a paixão política. Porque com a
doutrina das ragas ocorre hoje que é reivindicada pelos partidos mais
opostos e, antes de mais nada , pelos nacionalistas. Assim vemos que a ideia
racista
nos Estados Unidos, o nazismo em Alemanha, o kemalismo em Turquia,
o bñtanismo, etc., direta ou indiretamente inspiram-se no gobinismo.
Por sua vez, os Escandinavos, descendentes dos antigos Vikings, em-
señan em suas Universidades que Gobineau os conceptuó como os super .
viventes mais puros da raga aria. Assim mesmo em América latina, os partida-
rios do hispanismo ou pelo menos de suas tradições, enfrentados com os
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CONDE DE GC8INEAU
branca que ela ... Com tudo , estar, inarmonías entre o conjunto e os de-
talhe não alteram o essencial da doutrina ou seja a irreducible desigualdade
das raças , a extinção gradual dos grupos racialmente superiores e,
por último , a decadência e quiçá o fim do mundo civilizado , conclusões ,
dito seja de passagem , que distan bastante de justificar a menor sombra de
otimismo e muito menos o otimismo de quem pretendem ilusos!
reivindicar para seu povo a nobreza e virtudes da extinguida raça ana .
Em resumo, pois, diremos que, ainda que a teoria das raças não
esteja isenta de lunares e ainda que as consequências sacadas dela tenham
sido muito outras que as que cania ccptrar dos princípios em que se assenta,
estes não têm sido em modo algum invalidados . As grandes diretivas que
o gênio de G ou bine au plotasse ao problema das raças subsistem inte-
gramente. E isto o reconhece o próprio Elle Faure , que é quem maior
número de objeciones tem oposto à doutrina . Pelo demais, como estudo
psicológico das raças, o livro é de uma profundidade e veracidad indis-
cutibles . Neste aspecto, as perspectivas que ante nossas miradas pró-
yecta o autor são tais, que forçadamente temos de reconhecer como fun-
dada a opinião segundo a qual não pode jactarse ninguém de conhecer verdade-
ramente a sua própria pátria, qualquer que esta seja, nem no passado nem o
presente, a menos de ter percorrido uma a uma as páginas deste Ensaio .
F. S.
Pelo demais, tenho crido advertir, para tais trabalhos, facilidades pecu-
envolver de nossa época . Se esta, por suas agitações, convida a praticar uma
espécie de química histórica, facilita também semelhantes tarefas , As densas
nuvens, as profundas trevas que nos ocultavam, desde tempo inmemorial,
as origens ae civilizações diferentes da nossa, se afastam e dissipam
ao calor da ciência . Lina maravilhosa depuração dos métodos analíticos,
depois de apresentamos, através de Ñiebuhr, uma Roma ignorada de Tito-
Livio, descobre-nos e explica também as verdades, misturadas com os
relatos fabulosos, da infância helénica . Em outro lugar do mundo, os
povos germánicos, por muito tempo desconhecidos, mostram-nos
tão grandes e tão majestuosos, como bárbaros dessem nos pintar os
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CONDE DE GOB1NEAU
Não é que o passado esteja sem mácula. Nele há de tudo, e pelo mesmo
brinda-nos a confesión de muitas faltas e descobrimos nele mais de um
vergonzoso desfallecimiento . Os homens de hpy poderiam inclusive alardear
de alguns méritos de que ele carece. Mas, se, para recusar suas acusações,
ocorre-lhe de súbito evocar as sombras grandiosas dos períodos heroi-
cos, que dirão? Se lhes reprocha o ter comprometido a fé religiosa,
a fidelidade política, o culto ao dever, que responderão? Se afirma-lhes que
já não são aptos para prosseguir o desenvolvimiento de conhecimentos cujos
princípios foram por ele reconhecidos e expostos; se acrescenta que a antiga
virtude converteu-se em um objeto de debocha; que a energia tem passado
do homem ao vapor; que a poesia se extinguiu , que seus grandes
Nada, senão que todas as coisas belas, sumidas no esquecimento, não estão
mortas e dormitan; que todos os tempos têm conhecido períodos de tran -
sición, épocas em que o sofrimento luta com a vida e das que esta
liberta-se, ao fim, vitoriosa e resplandeciente , e que, já que a Caldea
demasiado envelhecida fué substituída antanho pela jovem e vigorosa Persia,
a Grécia decrépita pela Roma viril e a bastarda dominación de Augús-
tul ou pelos remados dos nobres príncipes teutónicos, assim mesmo as raças
modernas conseguirão rejuvenecerse *
CONDE DE GOBINEAU
Ao traçar aqui estas considerações, sientome enarc dea vão ou, StNUl^por
a proteção que o vasto e elevado espírito de V Uto IRA MAfUdíAU
outorga aos esforços da inteligência e pelo ínteres mas particular com
que ELA honra os trabalhos da erudición histórica. Nunca deixar ae
conservar a lembrança dos preciosos ensinos que me foi dable
recolher de lábios de VOSSA MAJESTADE , e ousarei acrescentar que não se
que admirar mais, se os conhecimentos tão brilhantes e solidos, dos quais
o Soberano de Hannóver possui as mais vanadas colheitas, ou bem o gene *
roso sentimento 3/ as nobres aspirações que os fecundan e que brindam
a seus povos um remado tão próspero, mTírrTDA
SENHOR,
de VOSSA MAJESTADE
muito humilde e muito obediente servidor,
A, de Gobineau
Este livro foi publicado pela primeira vez em 1853 (tomo I e tomo II);
os dois últimos volumes (tomo III e tomo IV) são de 1855* Na edi-
ción atual não se mudou uma linha , e não porque , no intervalo ,
certos trabalhos não tenham determinado bastantees progressos de detalhe . Mas
nenhuma das verdades por mim expostas tem sido quebrantada , e tenho juz 'r
gado necessário manter a verdade tal como a descobri . Antanho , não se
abrigava sobre as Raças humanas mais que suspeitas muito tímidas . Sentíase
vagamente que era preciso escavar por esse lado se se desejava pôr ao dê -
coberto a base não conhecida ainda da história , e presentíase que dentro
dessa ordem de noções mal desbastadas , embaixo desses mistérios tão
escuros , deviam de encontrar a certas profundidades os vastos alicerces
sobre os quais se elevaram gradualmente os pavimentos , logo os
muros, em uma palavra, todos os desenvolvimientos sociais das multi-
tudes tão variadas cujo conjunto compreende o mosaico de nossos povos .
Mas ignorava-se o caminho a seguir para chegar a alguma conclusão.
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CONDE DE GOBINEAU
Então escrevi este livro. Desde seu aparecimento, tem dado lugar a nume-
rosas discussões . Seus princípios têm sido menos combatidos que as aplica-
ciones e, sobretudo, que as conclusões . Os partidários do progresso ili-
mitado não se mostraram com ele nada benévolos. O sábio Ewald emitiu a
opinião de que se tratava de uma inspiração dos católicos extremistas;
a Escola positivista declarou-o perigoso. Enquanto, escritores que não
são nem católicos nem positivistas, mas que possuem hoje uma grande reputação, têm
introduzido de incógnito, sem confessá-lo, os princípios e ainda partes inteiras
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Deixo, pois, meu livro tal como o fiz, sem lhe mudar absolutamente nada .
É a exposição de um sistema, a expressão de uma verdade, hoje para mim
tão diáfana e indubitable como quando a professei pela primeira vez • Os
progressos dos conhecimentos históricos não me fizeram mudar de
opinião em nenhum sentido nem em nenhum grau . Minhas convicções de antanho
são as mesmas de hoje, que não têm oscilado nem para a direita nem para a
esquerda, e têm seguido sendo tais cuales brotaram desde o primeiro mo -
mentó . As aquisições sobrevindas na esfera dos fatos em nada
prejudicam-lhes . Os detalhes multiplicaram-se , o que me compraze . De
os resultados obtidos nada tem sido alterado . Sento-me satisfeito de que
os depoimentos contribuídos pela experiência tenham vindo a demonstrar em
maior grau ainda a realidade da desigualdade das Raças .
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CONDE DE GOBINEAU
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tifie ar seu vôo . Quem me prova que hoje o dirigiria melhor e sobretudo
que chegaria a maior altura nas regiões da verdade? O que reputé
exato, por tal sigo estimando-o, e não tenho, pois, por que introduzir em
isso nenhuma mudança .
Este livro é, pois, a base de todo o que tenho podido fazer e farei em
o futuro . Em verdadeiro modo, comecei-o desde minha infância. É a expressão
dos instintos contribuídos por mim ao nascer. Desde o primeiro dia em que
reflexionei, e reflexionei muito cedo, senti avidez por compreender minha própria
natureza, vivamente impressionado por esta máxima : « Conheça-se a você meus -
mo»; não julguei que pudesse me conhecer sem saber como era o meio em
que ia viver e que, em parte, me inspirava a simpatia mais apasio-
nada e terna, e, em parte, me asqueaba e enchia-me de ódio, de menos*
preço e de horror. Tenho feito, pois, o possível para penetrar na análise
do que chamamos, de uma maneira mais geral do que conviria, a
espécie humana, e a este estudo devo o que exponho aqui .
Depois de ter terminado esta segunda parte de minha tarefa pude abordar
as dificuldades da terça, causa e objetivo de meu interesse. Tracei a his *
toña de uma família, de suas faculdades recebidas desde sua origem, de suas
aptidões, de seus defeitos, das flutuações que influíram em sua dê *
Um, 3> escrevi a história de Ottar Jarl, pirata noruego , e de sua descen-
dencia. Assim é como, após ter tirado a envoltura verde, espinosa,
grossa da noz, e depois a corteza leñosa, pus ao descoberto o núcleo.
O caminho por mim recorñdo não conduz a um desses promontórios escar-
pados d,onde o solo avaria-se, senão a uma dessas planícies estreitas, onde,
com a rota aberta ante si, o indivíduo herda resultados supremos da
raça, seus instintos bons ou maus, fortes ou débis, e desenvolve livremente
sua personalidade.
LIVRO PRIMEIRO
CAPITULO PRIMEIRO
2.6
CONDE DE GOBINEAU
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A respeito das vias que segue a vontade divina para levar os povos
à morte, ^nada nos diz de preciso ; pelo contrário, inclina-se a consi-
derar estas vias como essencialmente misteriosas. Penetrada de piedoso terror
à vista das ruínas, crê harto facilmente que os Estados que se de-
rrumban não podem ser sacudidos ^ pulverizados se não é por efeito de
algum prodígio. Que se tenha produzido em certas circunstâncias um fato
milagroso, inclino-me sem esforço a crê-lo, enquanto os livros sa-
graus afirmam-no ; mas nos casos em que os depoimentos sagrados não
pronunciam-se de uma maneira formal — e é na maioria deles — , cabe
legitimamente considerar a opinião dos tempos antigos como insufi-
cientemente fundada e reconhecer, pelo contrário, que, já que a ira ce-
leste exerce-se sobre nossas sociedades de uma maneira constante e por efec-
to de uma decisão anterior ao estabelecimento do primeiro povo, a sentença
executa-se de uma maneira prevista, normal e em virtude de prescrições
definitivamente inscritas no Código do Universo, ao lado das demais
leis que, em sua inmutable regularidade, regem a natureza animada assim
como o mundo inorgânico.
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men e do vício, que todo o que se separava deste quadro normal lhes
importava mediamente e permanecia com frequência inadvertido ou descui-
dado. Este método era falso, mesquinho, e ainda com frequência ia com-
tra a intenção de seus autores, já que empregava, segundo as necesi-
dades do momento, o nome de virtude e de vício de uma maneira arbi-
traria ; mas, até verdadeiro ponto, serve-lhe de desculpa o severo e loable senti-
minto em que se baseava, e, se o gênio de Plutarco e o de Tácito não
sacaram dessa teoria nada mais que novelas e libelos, trátase de novelas
sublimes e de libelos generosos.
Meu objetivo não é, em modo algum, entablar uma polémica; não tenho
querido senão fazer observar até que ponto a ideia comum a Tucídides e
ao abate Raynal origina resultados divergentes; conservadora em um, cíni-
camente agressiva no outro, é em ambos casos um erro. Não é verdadeiro
que as causas às quais se atribui o afundamento das nações
sejam necessariamente as culpadas disso, e ainda reconhecendo de bom
grau que podem ser manifestado no momento de morrer um povo, nego
que possuam força suficiente e estejam dotadas de uma energia destructiva
bastante segura para determinar por si sozinhas a irremediable catástrofe.
CAPÍTULO II
É antes de mais nada necessário explicar bem o que entendo por uma socie-
dêem. Uma sociedade não é o círculo mais ou menos vasto no qual se
exerce, sob uma forma ou outra, uma soberania diferente. A república de
Atenas não é uma sociedade, como também não o é o Reino de Magada, nem o
Império da Ponte, nem o Califato de Egito na época dos Fatimitas.
São fragmentos de sociedade que indubitavelmente se transformam, se jun-
tão ou se subdividen sob a pressão das leis naturais que procuro, mas
cuja existência ou morte não envolve a existência ou a morte de uma
sociedade. Sua formação não é senão um fenômeno com frequência transitório e
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Todos estes fatos têm sido achados, umas vezes isoladamente, outras
simultaneamente e com grande intensidade* em nações que se desenvolviam
a maravilha, ou que, pelo menos, não se resentían deles o mais mínimo.
(3) Prichard, Histoire naturelle de Vhomme (trad. de M. Routin. In. 8.°. Paris,
1843). — Dr. Martins. Martms und Spix, Retse in Brasilien.
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tamente os mais débis. Para um povo, a molicie e o luxo não são, pois,
necessariamente causas de decadência e de morte.
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gênio militar (i). Parece que, nos tempos que seguiram, assim que
ambas raças começaram a se misturar, tudo piorou, e que, para os se"
glos VIII e IX, o solo nacional não oferecia um panorama do que tivéssemos
que envanecernos demasiado. Mas no decurso dos séculos XI, XII e XIII,
o espetáculo resultou totalmente outro, e, enquanto a sociedade foi amalga-
comando seus elementos mais discordes, o estado dos costumes chegou a ser
geralmente digno de respeito ; entre as ideias daqueles tempos não
tinham cabida esses ambages que afastam do bem a quem ao aspira. Os
séculos XIV e XV constituíram uma época deplorable por sua perversidad e
seus conflitos; neles predominou o bandidaje; por mil , conceitos, e em
o sentido mais amplo e mais rigoroso da palavra, ^fué um período de
decadência; ante os libertinajes, as matanças, as tiranías, a quebra com-
pleta de todo sentimento honrado entre os nobres que roubavam a seus
villanos, entre os burgueses que vendiam a pátria a Inglaterra, entre uma
clerecía disoluta e, em fim, entre os demais grupos sociais, tivesse-se dito
que a sociedade inteira ia afundar, arrastando consigo e ocultando baixo
suas ruínas todas aquelas vergonhas. A sociedade não se afundou, senão que
continuou vivendo, ingeniándoselas e lutando até sair de penas. Em o^século
XVI, apesar de suas sangrentas loucuras, consequências mitigadas da época
{ )recedente, foi bem mais digno que seu antecessor ; e, para a humanidade,
a noite de San Bartolomé não é ignominiosa como a matança de os
Armagnacs, Em fim, daquela época emendada a médias, a sociedade
francesa passou às luzes vivas e puras da época dos Fénélon, de os
Bossuet e dos Montausier. Assim, até Luis XIV, nossa história oferece
rápidas alternativas de bem e de mau, e a vitalidad própria da nação
permanece ai margem do estado de seus costumes. Tenho assinalado de pressa
e correndo as maiores diferenças, passando por alto as de detalhe, que por
verdade abundam e cuja enumeración exigiria não poucas páginas ; mas, para
não falar senão do que temos tido sob nossas miradas, não é sabido
que cada dez anos, desde 1787, o nível da moralidad tem variado enor-
memente? Minha conclusão é que sendo, em definitiva, a corrupção de cos-
tumbres, um fato transitório e flutuante, que tão cedo piora como
melhora, não cabe a considerar como uma causa necessária e determinante de
ruína para os Estados.
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grande fervor* Portanto, é absurdo pretender que todos os povos
que vêem destruída sua nacionalidade expían com este fato um abandono de o
culto de seus antepassados* Não é isso tudo: nos dois únicos exemplos que
podem ser invocado fundadamente, o fato que se assinala é mais aparente
que real, já que o mesmo em Roma que em Atenas o antigo culto não
foi nunca abandonado até o dia em que em todas as consciências triunfou
por completo o cristianismo; em outras palavras, acho que em matéria de fé
religiosa, não tem tido nunca em nenhum povo uma verdadeira solução de
continuidade ; que, quando a forma ou a natureza íntima da crença
teve mudado, o Teutatés galo fez-se seu o Júpiter romano, e a Júpiter
o cristianismo, sem transição de incredulidad ; de maneira que, se não se
tem achado nunca a uma nação da que fundadamente possa ser dito que
carecia de fé, não há razão alguma para supor que a carência de fé
destrói os Estados,
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CONDE DE GOBINEAU
(i) César, democrata e cético, sabia pôr sua linguagem em desacordo com
suas opiniões quando as circunstâncias o requeriam.
DESIGUALDADE DAS RAÇAS
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imperial teve reduzido estas mesmas classes ao mais humilde dos papéis,
o populacho quis ser vingado delas, e, se equivocando de vítimas, degolou
aos cristãos, aos quais tratava de impíos e tomava por filósofos*
jQué diferença de épocas! O pagano verdadeiramente cético é aquele
rei Agripa que, por curiosidade, deseja ouvir a san Pablo (i); escuta-lhe,
discute com ele, lhe toma por um locó, mas não trata em modo algum de
castigar pelo fato de que pense de diferente maneira à sua. É o
historiador Tácito, cheio de menosprezo pelos novos crentes, mas que
censura as crueldades de que Nerón lhes faz vítimas. Agripa e Tácito
eram incrédulos. Diocleciano era um político que se guiava pelos clamores
dos governados. Dedo e Aureliano eram fanáticos como seus povos.
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CONDE DE GOBINEAl)
CAPÍTULO III
3 »
CONDE DE GOBINEAU
CAPÍTULO IV
Do que há que entender pelo VOCABLO DEGENERAÇÃO; da
MISTURA DOS PRINCÍPIOS ÉTNICOS, E COMO As SOCIEDADES SE FORMAM
E DISSOLVEM-SE
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CONDE DE GOBINEAU
mesmas mãos, Mas assim dou ao mesmo tempo com um problema bem mais
audaz que aquele cuja explicação tenho tentado nos capítulos precedentes,
já que a questão que abordo é esta :
Para que se compreenda meu pensamento de uma maneira mais clara e mais
fácil, começo por comparar uma nação, toda uma nação, ao corpo têm
mão, respeito do qual os fisiólogos professam a opinião de que se renova
constantemente, em todas suas partes constitutivas, que o trabalho de trans-
formação que se realiza nele é incessante, e que ao cabo de certos pe-
riodos encerra muito pouca coisa do que em sua origem fazia parte inte-
grante dele ; de tal maneira, que o idoso não conserva nada do homem
maduro, o homem maduro nada do adolescente, o adolescente nada de o
menino, e que a individualidad material não se mantém senão por virtude de
formas internas e externas que se sucederam umas a outras se copiando
aproximadamente. Admitirei, no entanto, uma diferença entre o corpo
humano e as nações, e é que, nestas últimas, mal se trata da
conservação das formas, as quais se destroem e desaparecem com infinita
rapidez. Tomo a um povo ou, falando melhor, a uma tribo, no momento
em que, cedendo a um instinto de acentuada vitalidad, se dá leis e em-
peça a desempenhar um papel neste mundo. Pelo mesmo que seus necesi-
dades e suas forças se acrecientan, pónese inevitavelmente em contato
com outras famílias, e, pela guerra ou pela paz, consegue incorporar.
Não a todas as famílias humanas lhes é dado atingir este primeiro grau,
passo necessário que uma tribo deve dar para se elevar um dia ao estado de
nação. Se certo número de raças, que nem sequer se cotaram muito alto
na escala da civilização, deram-no, não cabe dizer na verdade que isso
constitua uma regra geral; pelo contrário, parece ser que a espécie
humana experimenta inclusive uma dificuldade bastante grande para elevar-se
acima da organização parcelaria, e que unicamente entre grupos
especialmente dotados efetua-se o bilhete a uma situação mais complexa.
Invocarei, em depoimento disso, o estado atual de grande número de grupos
espalhados por todas as partes do mundo. Essas tribos incultas, sobretudo
as dos negros pelágicos da Polinesia, os Samoyedos e outras famílias
do mundo boreal e a maior parte dos negros africanos, não têm podido
livrar-se nunca dessa impotencia, e vivem yuxtapuestos os uns aos outros
e em relações de completa independência. Os mais fortes matam a os
mais débis, e estes tentam viver o mais distanciados possível daqueles;
a isto se reduz toda a política desses embriões de sociedades que
perpetuam-se desde o começo da espécie humana, em um estado tão im-
perfeito, sem ter podido nunca chegar a mais. Se objetará que essas misera-
bles hordas formam a parte menos numerosa da população do Globo;
sem dúvida, mas há que ter em conta as que têm existido e desaparecido.
Seu número é incalculable, e certamente compreende a maioria de raças
puras dentro das variedades amarela e negra.
4 *
a civilização; sim t ademais, consideramos que esses grupos se encontram
diseminados sobre a face inteira do mundo, nas mais diversas condições
de lugar e de clima, habitando indiferentemente nos países glaciais,
temperados, tórridos, à beira dos mares, dos lagos e dos rios, em o
fundo dos bosques e das verdes praderas, ou nos desertos áridos,
vemos-nos induzidos a concluir que uma parte da humanidade está, em
sim mesma, condenada a não se civilizar nunca, nem sequer no primeiro grau,
já que é incapaz de vencer as repugnancias naturais que o homem,
como os animais, experimenta pelo cruzamiento.
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Não seja se o leitor tem pensado já em isso, mas, no quadro que traço,
e que não é senão, em muitos aspectos, o que oferecem os Indianos, os Egip-
cios, os Persas, os Macedonios, encontro dois fatos muito destacados. O
primeiro, é que uma nação, sem força e sem poderío, se encontra de súbito,
(i) Leste apego das nações árabes ao isolamento étnico manifesta-se às vezes
de uma maneira muito estranha. Conta um viajante que em Djidda, onde as costum-
bres estão muito relaxadas, a mesma beduína que cede sem escrúpulo à mais leve
oferta de dinheiro, se julgaria deshonrada se se unisse legitimamente bem com o
turco,
bem com o europeu ao qual se presta o menosprezando.
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Quero que o povo^ sobre o qual raciocino seja confirmado em suas ideias
de separação pelas mais formais prescrições religiosas, e que tenha
estabelecida uma penalidade temível para espantar aos infractores. Como é
um povo civilizado, seus costumes são moderados e tolerantes, inclusive
em menoscabo de sua fé; mas, digam o que digam os oráculos, terá indi-
viduos descastados: e será preciso estabelecer cada dia novas distinções,
inventar novas classificações, multiplicar as faixas, fazer impossível que
um se reconheça entre as infinitas subdivisiones, que variam de província
em província, de cantón em cantón, de aldeia em aldeia? fazer, em fim, o que
tem lugar nos países indianos. Mas ninguém como o brahmán para man-
ter tenazmente suas ideias separatistas ; os povos civilizados por ele, fora
de seu seio, não têm tolerado nunca, ou pelo menos têm recusado desde
longo tempo, trava molestas. Em todos os Estados avançados em cultura
intelectual, não se preocuparam um sozinho instante das medidas desespe-
radas que o desejo de conciliar as prescrições do Código de Manú com
a corrente irresistible das coisas inspirou aos legisladores do Ariavarta.
Em qualquer outra parte, as castas, quando realmente as teve, cessaram
de existir no momento em que a possibilidade de lavrar fortuna, de ilus-
trarse por meio de descobertas úteis ou de artes amáveis, ofereceu-se a
todos, sem . distinção de origem. Mas também, a partir do mesmo dia, a
nação primitivamente conquistadora, impulsora, civilizadora» começou a
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ciência estratégica e triunfos guerreiros, sem outro instinto superior, não têm
atingido um final melhor que o de se inteirar por seus vencidos, e ainda de
inteirar-se mau, como se vive na paz. Os Celtas, as hordas nómadas
do Ásia, contam com anales que não falam de outra coisa.
CAPÍTULO V
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As instituições políticas não podem optar senão entre duas origens ; ou bem
derivam da nação que deve viver sob sua regra, ou bem, inventadas
em um povo influente, são aplicadas por ele a Estados que se acham baixo
sua esfera de ação.
Com a primeira hipótese não há dificuldade. Evidentemente o povo tem
imaginado suas instituições segundo seus instintos e necessidades; tem-se abste-
ninho de estatuir nada que possa molestar a uns e a outros; e se, por in-
advertência ou torpeza, tem incorrido em isso, muito cedo o mal-estar sub-
seguinte leva-lhe a emendar suas leis e a pô-las em mais perfeita concor-
dancia com seu objetivo. Cabe dizer que em todo país autônomo, a lei emana
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Não nos caiba nenhuma dúvida. Como a nação nasce dantes que a lei,
a lei parece-lhe e toma seu selo dantes de plotar-lhe a ela o seu.
As modificações que o tempo origina nas instituições são outra prova
do que dizemos.
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Não pode ser admitido, pois, que as instituições façam que os povos
sejam como os vemos, quando são os povos quem as inventaram*
Mas, é igualmente assim na segunda hipótese, isto é, quando uma
nação recebe seu Código de mãos estrangeiras provistas do poder nece-
sario para fazer aceitar, de bom ou mau grau?
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CONDE DE GOBINEAU
envolver-se com horror contra umas superstições ainda mais repugnantes* Não
conseguiu
destruí-las senão após muito prolongados esforços, já que no se-
glo XVIII, a matança dos náufragos e o exercício do direito de frac-
tura subsistiam em todas as parroquias marítimas onde o sangue kynrica (i)
tinha-se conservado pura. E é que estes costumes bárbaros respondiam
aos instintos e sentimentos indomables de uma raça que, não tendo
sido suficientemente misturada, não teve até então motivos determi-
nantes para mudar de parecer.
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sangue de seus vencedores, quem têm descido assim a seu nível, enquanto
que as fiéis peles vermelhas dos Estados Unidos, acometidos pela ener-
gía anglo-saxã, têm sucumbido a este contato* Os poucos que ficam
vão desaparecendo dia depois de dia, e desaparecem sem civilizar, exatamente
como seus pais*
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■(i) A colônia de Santo Domingo, dantes de seu emancipación, era um dos lu-
gares da Terra onde a riqueza e a elegancia de costumes tinham levado a o
máximo seus refinamientos.
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lhes, negaram toda confiança aos chefes laicos enviados pela Coroa de
Espanha. Não mostraram nenhum apego a suas novas instituições. O gosto
pela vida selvagem acometióles de novo, e hoje, a exceção de trinta e
sete pequenos povoados que vegetan ainda nas orlas do Paraná, de o
Paraguai e do Uruguai, aldeias que encerram certamente um núcleo de
população mestiza, todos os restantes têm voltado às selvas e ali vivem
em um estado tão selvagem como as tribos ocidentais de igual origem, os
Guaraníes e os Cirionos. Os fugitivos têm voltado a adotar, não direi seus
velhos costumes em toda sua pureza, mas sim costumes que pouco diferem
delas e que delas derivam diretamente, e isso porque não é dable
a nenhuma raça humana mostrar-se infiel a seus instintos nem abandonar o
caminho no qual Deus a colocou. Cabe achar que se os jesuítas hubie-
sen seguido regendo suas missões do Paraguai, seus esforços, ajudados por
o tempo, tivessem determinado melhores sucessos. Admito-o; mas com esta
condição única, sempre a mesma, de que, ao amparo de sua ditadura,
tiverem^ vindo grupos de população européia a estabelecer-se pouco a pouco
no país, tivessem-se misturado com os nativos, tivessem primeiro modifi-
cado, e depois mudado completamente o sangue, e, nestas condições,
habríase formado naqueles lugares um Estado designado talvez com um
nome aborigen, vanagloriándose quiçá de descer de antepassados autóc-
tons, mas de fato, em realidade, tão europeu como as instituições que
o tiverem regido.
Tenho aqui quanto tinha que dizer sobre as relações das instituições
com as raças.
CAPÍTULO VI
(i) Consultar, entre outros, a Carus: Ueber ungleiche Befachigung der verschie -
denen Menschheitstaemme für hochere geistige Entzuickelung .
5 »
CONDE DE GOBINEAU
não há que dizer que t dado tal hipótese, a humanidade não será perfectible
senão com ajuda da natureza material, e que todo seu valor e sua grandeza
existiriam em germen fosse dela mesma. Por muito especiosa que, a prime-
ra vista, resulte esta opinião, não concorda em nenhum ponto com os nu-
merosos fatos que a observação nos brinda.
Não há certamente países mais fértiles, nem climas mas suaves que os de
os diferentes países de América. Ali abundam os grandes nos ; seus
golfos, baías e portos são vastos, profundos, magníficos, numerosos; os
metais preciosos encontram-se a ras do solo; a natureza vegetal
prodiga quase espontaneamente os meios de existência mas vanados, em
tanto que a fauna, rica em espécies alimentares, oferece recursos ainda
mais substanciais. E, no entanto, a maior parte de seus afortunados países
é habitada, desde muitíssimos séculos, por tribos incapazes da exploração,
sequer muito mediocre, de seus imensos tesouros.
(3) A Índia antiga precisou, dos primeiros colonos de raça branca, imensos
trabalhos de roturación. Ver Lassen, Indische Alterthumshunde , t. I. Para o Egito,
59
6ou
CONDE DE GOBINEAU
61
62
CONDE DE GOBINEAU
Quero significar que não foi o lugar o que determinou o valor da nação,
e que nunca o determinou, nem o determinará jamais ; ao invés, era
a nação a que dava, tem dado e dará ao território seu valor econômico,
moral e político* .
A fim de ser todo o claro possível, acrescentarei no entanto que não esta
em meu pensamento o negar a importância da situação para verdadeiras
cidades, já se trate de fábricas, de portos de mar ou de capitais. As
observações que se fizeram, a propósito de Constantinopla e de Ale-
jandría especialmente, são incontestables (i). Verdadeiro é que existem em o
Globo diferentes pontos que podemos chamar as chaves do mundo; ^ asi se
concebe que, no caso da abertura do istmo de Panamá, o poderío que
possua a cidade não construída ainda sobre este canal hipotético (2) habra de
influir consideravelmente nos problemas mundiais. Mas esta influência,
uma nação exerce-a acertadamente ou bem desacertadamente ou ainda deixa de
exercê-la em absoluto, segundo o que ela valha* Alarguem o não Chagres,
e façam que os dois mares se unam sob seus muros; depois povoem a cidade
com uma colônia a gosto vosso : de vossa eleição depende o porvenir
da nova cidade* No caso de que a raça seja verdadeiramente digna de
a elevada sorte à que terá sido chamada, se a situação de Chagres
não é precisamente a mais a proposito para favorecer todas as vantagens de
a união dos dois oceanos, aquela população abandonará sua residência
e irá a outro lugar para despregar com inteira liberdade os esplendores de seu
destino (3)*
CAPÍTULO VII
(3) Ewald, em sua obra Geschichte dê Wolkes israel (t. I, p. 259) demonstra, com
grande acopio de dados, cuán escassa influência exerce o território material sobre
o ca^
rácter e a civilização de um povo.
DESIGUALDADE DAS RAÇAS
63
CONDE DE GOBINEAU
65
Í joderío mundano, meios de adquirí-lo, todo isso não conta para nossa
ey. Nenhuma civilização, de qualquer gênero que seja, atraiu nunca seu
admiração nem provocou sua desdén, e débese a esta rara imparcialidade, e úni-
camente pelos efeitos a que dió lugar, o que esta lei pudesse ser chamado
com razão católica , universal, pois não é exclusiva de nenhuma civilização,
nem vinho a preconizar exclusivamente nenhuma forma de existência terrestre,
senão que, pelo contrário, não recusa nenhuma e aspira às purificar todas.
66
CONDE DE GOBINEAU
em ^a questão das cerimônias chinesas. O que não se vê, é que ela tenha
assinalado nunca ao mundo um tipo único de civilização ao que seus crentes
tivessem que se aderir. A todo se acomoda, inclusive à choça mais tosca,
e ali onde se encontra um selvagem bastante estúpido para deixar de com-
prender a utilidade de um abrigo, ali encontra-se igualmente um misionero
bastante abnegado para sentar a seu lado na dura rocha e não pensar
smo em fazer penetrar em sua alma as noções essenciais da salvação.
O cristianismo não é, pois, civilizador tal como comumente o entende-
mos; pode, portanto, ser adotado pelas raças mais diversas
sem ferir suas aptidões especiais nem pedir-lhes nada que rebase o limite de
suas faculdades.
6?
Esquimales à luz religiosa ; mas não o encontro menos que seus neófitos
tenham permanecido pelo demais absolutamente no mesmo estado social
em que dantes se encontravam* Finalmente, para terminar, constitui, a meus
olhos, um fato simples e natural o que os Lapones suecos continuem em o
mesmo estado de barbarie que seus antepassados, ainda que, desde faz
séculos, tenham penetrado ali as salvadorás doutrinas do Evangelho* Sincera-
mente acho que todos esses povos poderão produzir, têm produzido já
quiçá, pessoas notáveis por sua piedade e a pureza de seus costumes; mas
não confio ver sair nunca de ali sábios teólogos, inteligentes militares, pró-
fundos matemáticos, artistas de mérito, em uma palavra, essa seleção de
espíritos refinados cujo número e perpétua sucessão constituem a força
e a fecundidad das raças dominadoras, em maior grau ainda que a rara
aparecimento daqueles gênios sem igual que não são seguidos dos povos
pelas vias nas quais se aventuram senão quando estes povos estão
conformados de tal modo que lhes leva aos compreender e a avançar baixo
sua direção. É, pois, necessário e justo desinteresar inteiramente ao cris-
tianismo no assunto. Se todas as raças são igualmente capazes de cone-
cerlo e de apreciar sua benéfica influência, não é missão do cristianismo o
voltá-las a todas iguais : seu reino* podemos dizê-lo determinadamente, no sen-
tido de que aqui se trata, não é deste mundo.
68
CONDE DE GOBINEAU
imitar tão de perto os costumes por eles pregadas, que daqui por diante,
inteiramente amoldada à exploração da terra, possuirá, como aqueles
mesmos Cherokis de que tenho falado, e como os Criks da ribera Sur de o
Arkansas, rebanhos perfeitamente cuidados e ainda numerosos escravos negros
para trabalhar nas plantações.
Adrede tenho escolhido os dois povos selvagens que se citam como mais avan-
zados; e, longe de compartilhar a opinião dos igualitarios, creio, ao observar
esses exemplos, que não é possível encontrar uma prova mais palpable da
incapacidade geral das raças para avançar por uma via que sua natureza
própria não bastou a lhes fazer descobrir.
Tenho aqui duas tribos que têm ficado isoladas de numerosas nações
destruídas ou expulsadas pelos alvos, e, no entanto, duas tribos que se
destacam excessivamente das outras que se diz descem da raça allegha-
niense, à qual se atribuem os magnos vestígios de antigos monumentos
descobertos no Norte do Mississipi. Há ali já, no espírito daqueles
que pretendem observar a igualdade entre os Cherokis e as raças européias,
um grande desvio respeito do conjunto de seu sistema, já que a
primeira palavra de sua demonstração consiste em estabelecer que as nações
alleghanienses não se parecem às anglo-saxãs senão porque são superiores
às demais raças da América setentrional. Ademais, que lhes ocorreu
àquelas duas tribos de elite ? IE 1 Governo norte-americano tirou-lhes os
territórios nos quais viviam antigamente, e, por meio de um tratado
de trasplantación, tem feito emigrar a uma e outra para um terreno esco-
gido de antemão, onde lhes assinalou a cada uma seu lugar. Ali, sob a
vigilância do Ministério da Guerra e sob a direção dos misioneros
protestantes, aqueles indígenas têm devido abraçar, pela força, o gênero
de vida que hoje praticam. O autor a quem devo estes detalhes, e que os
sacou a sua vez ae a grande obra de M. Gallatin (i), assegura que o número
de Cherokis vai em aumento. Alega como prova que na época em que
Adair visitou-os, o número de seus guerreiros estimábase em 2.300, e que hoje
a cifra total de sua população faz-se ascender a 15.000 almas, comprem-
diendo nela, é verdadeiro, 1,200 negros escravos propriedade sua; e como
acrescenta também que suas escolas, o mesmo que suas igrejas, estão dirigidas
pelos misioneros, e que estes misioneros, em sua condição de protestantes,
estão casados, se não todos, pelo menos em sua maioria; e têm filhos ou
criados de raça branca, e provavelmente também uma espécie de estado maior
de empregados europeus de todas as profissões, resulta muito difícil apreciar
se realmente tem tido aumento no número dos indígenas, ao passo
que resulta muito fácil comprovar a pressão vigorosa que a raça européia
exerce ali sobre seus discípulos (2).
Colocados em manifesta-a impossibilidade de fazer a guerra, desterrados,
presenciando por todos lados o poderío norte-americano, inconmensurable
para seu imaginación, e, por outra parte, convertidos à religião de suas dorm-
69
Sei que homens muito eruditos, muito sábios, têm dado lugar a essas reha-
bilitaciones algo burdas, pretendendo que entre certas raças humanas e as
grandes espécies de simios não tinha mais que diferenças de matiz. Como
rejeição sem reservas semelhante injúria, é-me igualmente lícito não aceitar a
exagero com a qual se responde a ela. Desde depois, a meus olhos, as
raças humanas são desiguais; mas não acho que nenhum bruto esteja a seu
nível e seja semelhante a elas. A última das tribos, a variedade mais
grosseira, o subgénero mais miserável de nossa espécie, é pelo menos
capaz de imitação, e não tenho a menor dúvida de que tomando a um indi-
viduo qualquer entre os mais horríveis Bosquímanos não possa ser obtido,
não desse mesmo indivíduo, se é já adulto, senão de seu filho ou pelo menos
de seu neto, a necessária inteligência para aprender e exercer uma profissão,
e ainda uma profissão que exija um verdadeiro grau de estudo. Se concluirá
disso que a nação a que pertence esse indivíduo poderá ser civilizada a
nossa maneira? É raciocinar às presas e concluir demasiado de pressa. Média
muita distância entre o exercício dos oficios e das artes, produtos de
uma civilização avançada, e esta mesma civilização. E, por outra parte, se
está seguro de que os misioneros protestantes possam levar concienzuda-
mente a cabo a tarefa a eles imposta? São deveras os depositarios de
uma ciência social verdadeiramente completa? Duvido-o ; e se a comunicação
entre o Governo norte-americano e os mandatários espirituais que conserva
entre os Cherokis chegasse a romper-se de súbito, o viajante encontraria, uns
anos depois, nas granjas dos indígenas, instituições muito inesperadas,
muito novas, fruto da mistura de alguns alvos com aquelas peles vermelhas,
e não veria nelas senão um pálido reflexo do que se ensina em Nova York.
Fala-se com frequência de negros que têm aprendido música, de negros que
estão empregues em casas de banca, de negros que sabem ler, escrever, calcu-
7ou
CONDE DE GOBÍNEAU
Não ; não sou tão exigente, tão exclusivo. Não peço já que com nossa
fé um povo abrace todo quanto forma nossa individualidad ; suporto
que a recuse; admito que escolha outra muito diferente. Mas que lhe veja
pelo menos, no momento em que abre os olhos às luzes do Evangelho,
como compreende de súbito até que ponto sua marcha terrestre resulta tão
grávida e miserável como não tem muito o era sua vida espiritual ; que
veja-lhe criar-se a si mesmo um ruevo ordem social a sua guisa, reunindo ideias
até então infecundas, admitindo noções estrangeiras que ele trans-
forma. Que ponha mãos à obra ! Aí aguardo-lhe ! Não peço senão que
a isso se decida. Nenhum começa. Nenhum o tentou nunca. Não se
me assinalará, compulsando todos os registros da História, uma sozinha nação
que se tenha incorporado à civilização européia por efeito de adotar o
cristianismo, uma sozinha em que o mesmo grande fato a tenha levado a civi-
lizarse por si mesma.
7 *
CAPÍTULO VIII
7 ^
CONDE DE GOBINEAU
73
; r os Fenicios, afastados uns de outros, não deixavam de estar unidos por uma
orma de cultura análoga e que tinha seu protótipo em Asiría. As repúblicas
italianas uniam-se no movimento de ideias e opiniões dominante em o
seio das monarquias vizinhas. As cidades imperiais suabias e turingias,
muito independentes desde o ponto de vista político, estavam inteiramente
vinculadas ao progresso ou à decadência geral da raça alemã. Resulta
destas observações que M. Guizot, ao classificar aos povos por ordem
de mérito, introduz nas raças antagonismos injustificados e diferenças
inexistentes. Como não é este um lugar a propósito para entablar uma dis-
cusión a fundo, passarei de longo. Se, não obstante, tivesse que o fazer, não
teríamos que nos negar a admitir que Calca, Génova, Veneza e outras
cidades resultassem inferiores a Milão, Nápoles e Roma?
74
CONDE DE GOBINEAU
Para mim não resulta superior, senão inclusive inferior à definição dada
pelo barón Guillermo de Humboldt: «A civilização é a humanización
dos povos em suas instituições, em seus costumes e no sentimento
interior com elas relacionado» (i).
(i) W. v. Humboldt, Ueber die Kauñ'Sprache auf der Insel Java; Einleitung,
t. I, p, XXXVII.
75
yS CONDE DE GOBINEAU
Não existe tribo tão embrutecida à qual não se descubra um duplo ins-
tinto: o das necessidades materiais e o da vida moral. O grau de
intensidade das umas e da outra dá origem à primeira e mais sensível de
as diferenças entre as raças. Em nenhum lugar, nem sequer nas tribos mais
primitivas, equilibram-se exatamente ambos insiintos. Em umas, predo-
mina a necessidade física, em outras, as tendências contemplativas. Assim, jas
abyectas hordas da raça amarela aparecem-nos dominadas pela sensação
material, sem estar, no entanto, absolutamente privadas de toda luz acerca
das coisas sobrehumanas. Pelo contrário, na maior parte de tribos
negras do grau correspondente, os hábitos são mais bem ativos que
contemplativos, e a imaginación dá mais importância às coisas que não se
vêem que às que se tocam. Não sacarei disso a consequência de uma
superioridad destas últimas raças sobre as primeiras, desde o ponto de
vista da civilização, já que não são — a experiência dos séculos o de-
mostra — mais susceptíveis de atingí-la una que outras. Nunca as tem
visto realizar nenhum esforço para melhorar sua sorte, condenadas como
estão todas elas por uma mesma incapacidade de combinar ideias bastantees
com fatos suficientes para sair de seu abyección. Limito-me a assinalar que
no grau mais superior das raças humanas encontro esta dupla
corrente, diversamente constituída, cuja marcha terei de seguir sob medida
que me vá elevando.
77
Dividirei, pois, todos os povos em duas classes, a fim dos colocar mais
particularmente, ainda que nunca de um modo absoluto — o recordem bem —
sob a ação de uma das duas correntes. À cabeça da categoria
masculina, inscreverei aos Chineses; e como protótipo da classe oposta,
escolherei aos Indianos.
CONDE DE GOBINEAU
78
CAPÍTULO IX
79
8ou
CONDE DE GOBINEAU
sobre o estado dos povos estrangeiros. Do fato de que exteriormente seu civi-
lización não se pareça à nossa, concluímos com frequência, ou que são bárbaros ou
que
são inferiores em mérito a nós. Nada mais superficial, nem deve por tanto ser mais
suspeito, que uma conclusão sacada de tais premisas.
8l
82
CONDE DE GOBINEAU
e os fatos que se produzem em sua superfície estejam bem arraigados nas
massas, e que as consequências dessas ideias e desses princípios respondam
aos instintos da maioria? Há que acrescentar ademais esta pergunta :
Pensam e atuam no sentido do que chamamos civilização européia as
últimas capa de nossos povos?
(1) «Não existe senão a Chinesa onde um pobre estudante possa ser apresentado ao
com-
curso imperial e sair convertido em grande personagem. É o lado brilhante da
organi-
zación social dos Chineses, e sua teoria é indiscutivelmente a melhor de todas;
desgraçadamente o aplicativo dista muito de ser perfeita...» (F. J. Mohl, R apport
annuel fait à Société asiatique, 1842, p. 49.)
CONDE DE GOBINEAU
84
Se, trasude ter observado o escasso gosto por nossa civilização, com-
sideramos o fundo das crenças e das opiniões, o afastamento resulta
ainda mais acusado. Quanto às crenças, há que lhe agradecer tam-
bién aqui à fé cristã o que não seja exclusivista e não tenha querido
impor um formulismo demasiado estreito. Tivesse tropeçado com é-
collos muito perigosos. Os bispos e os curas têm que lutar, o mesmo
que faz um século, o mesmo que faz cinco, quinze séculos, contra preven-
ciones e tendências transmitidas hereditariamente, e tanto mais temíveis
quanto que, por não ser confessadas, não permitem ser combatidas nem vencidas.
Não há cura perspicaz que, tendo evangelizado pueblecillos, não co-
nozca a profunda astúcia com que o camponês,- inclusive devoto, continua
86
CONDE DE GOBINEAU
E ainda se nossa população rural não fosse mais que grosseira e ignorante,
caberia preocupar-se mediamente de tal separação e consolar-se com é-a-
peranza de conquistá-la pouco a pouco e de fundir nas multidões já
ilustradas. Mas ocorre com estas massas absolutamente o mesmo que^ com
certos selvagens : a primeira vista, julgamo-los incapazes de reflexão e
parecidos aos brutos, por causa de seu aspecto humilde e inexpresivo; dê-
pués, à medida que penetramos, por pouco que seja, no seio de sua vida
particular, advertimos que não obedecem, em seu voluntário ^isolamento, a
um sentimento de impotencia. Seus afecciones e seus antipatías não são ca-
prichosas, e tudo nelas concorda com um encadeamento lógico de ideias
muito arraigadas. Falando faz um momento da religião, tivesse podido
fazer esquecer também a distância imensa que separa nossas doutrinas
morais das de nossos camponeses* até que ponto o que eles lume-
riam delicadeza difere do que nós entendemos com este nome;
e, em fim, com que tenacidad continuam olhando todo o que não é como
eles, camponês, com o mesmo ar com que os homens da mais remota
antiguidade olhavam ao estrangeiro. Não o matam, é verdadeiro, graças ao terror,
singular e misterioso, que lhe inspiram umas leis que eles não têm feito;
mas odeiam-no abertamente, desconfiam dele, e assim que se trata de dê-
pojarlo, fazem-no muito gozosos, de encontrar-se a coberto de perigos, São
maus? Não, entre eles, já que observam uma conduta leal e correta.
O que ocorre é que se consideram de outra espécie; espécie, se há que
crer-lhes, oprimida, débil, que deve recorrer à astúcia, mas que conserva
também um orgulho muito tenaz e despreciativo. Em algumas de nossas pró-
vincias, o camponês considera-se de melhor sangue e a mais rancio origem
que seu antigo senhor. O orgulho de família em alguns camponeses, iguala
hoje, pelo menos, ao que se observava na nobreza da Idade Média.
CONDE DE GOBINEAU
(i) Muito pouco do que expõe Gobineau a respeito de Chinesa poderia ser sustentado
em nossos dias, sacudida como está atualmente por contínuas guerras civis.
(N. do T.)
89
Advirto que tenho feito uma digresión muito longa, cujas ramificações
estenderam-se para além do que calculava. Não o sento em demasía.
Tenho podido emitir, nesta ocasião, certas ideias que deviam ser necessária-
mente conhecidas do leitor. Com tudo, já é hora de que prossiga o curso
natural de minhas deduções. A série dista ainda de ser completa.
CAPÍTULO X
9 ou
CONDE DE GOBINEAU
ñas oferecem diferenças tão radicais, tão essenciais, que não podemos menos
de negar-lhes a identidade de origem* Ao lado da descendencia adamítica,
os eruditos aderidos a este sistema supõem muitas outras genealogias*
Para eles a unidade primordial não existe na espécie, ou, para nos expressar
melhor, não existe uma sozinha espécie, senão três, quatro e mais, das quais
têm saído gerações perfeitamente diferentes, que, por suas misturas, têm
formado as híbridas. .
9 1
92
CONDE DE GOBINEAU
93
Muitas são as dúvidas que suscitou esta classificação* lhe pôde repro-
char, com motivo, como à de Camper, que passava por alto muitos ca-
racteres importantes* E a isto se deveu, em parte, que, para evitar as
objeciones principais, Owen propusesse examinar os cráneos não pela
coronilla, sinq por sua base* Um dos resultados principais desta nova
maneira, de proceder foi o encontrar definitivamente uma linha de de-
marcação tão precisa e acusada entre o homem e o orangután, que
resultava para sempre impossível voltar a achar entre ambas espécies o
laço imaginado por Camper* Efetivamente, uma primeira olhadela a estes dois
cráneos, o um de orangután, o outro de homem, examinados por suas bases,
basto para fazer notar diferenças capitais. O diâmetro ánteropostenor é
mas alongado no orangután que no homem ; o arco cigomático, em
lugar de encontrar-se compreendido dentro da metade anterior da base
craneana, forma, na região média, exatamente um terço da lon-
gitud total do diâmetro; em fim, a posição do buraco occipital, tão in-
teresante por suas relações com o caráter geral das formas do indi-
viduo, e sobretudo pela influência que exerce sobre os hábitos, não é
em modo algum a mesma. No homem, ocupa quase o centro da base
do cráneo; no orangután, está situado no centro do terço pos-
terior (2)*
Para demonstrar a diferença das raças, os dois sábios que cito têm
partido desta ideia: que quanto maiores são os cráneos, mais superiores
mostram-se, em general, os indivíduos a quem pertencem (4)* A cues-
tión proposta é, pois, esta: Tanto faz em todas as categorias humanas o
desenvolvimento do cráneo?
94
CONDE DE GOBINEAU
Povos brancos
Povos amarelos
Peles Vermelhas ♦
Negros . . ♦
Número
Termo
Máximo
Mínimo
de cráneos
meio da
de
de
medidos
cifra de cap.
capacidade
rapacidad
52
87
109
75
i Mogoles
10
83
93
69
( Malayos.
18
81
89
64
J 47
82
100
60
2 9
78
94
65
Os resultados inscritos nas duas primeiras colunas são realmente
muito curiosos. Em mudança, concedo pouca importância aos das duas ulti-
mas; pois pára que a violenta perturbação que parece contribuir das
observações da segunda coluna fosse real, séria antes de mais nada preciso que
Mr. Morton tivesse operado sobre um numero bem mais considerável de
cráneos e, depois, que tivesse especificado a posição social das per-
sonas às quais tivessem pertencido.
95
(1) Há ligeiras que são não obstante muito características. Entre elas assinalarei
certa hinchazón da carne a ambos lados do lábio inferior, entre os Alemães e
os Ingleses. Este sinal, de origem germánico, a encontro também em algumas figu-
ras da Escola flamenca, na Madona de Rubens do Museu de Dresde, em os
Sátiros e ninfas da mesma coleção, na que toca o laúd, de Mieris, etc. Nenhum
método craneoscópico está em condições de recolher tais detalhes, que não deixam
no entanto de ter seu valor entre nossas raças tão misturadas*
CONDE DE GOBINEAU
96
Weber tem vindo a atacar esta teoria, conquanto com escassa vantagem, já que
tem devido reconhecer que certas formas da pelvis se encontravam mais fre-
cuentemente em uma raça que em outra. Todo o que tem podido fazer, é se-
ñalar que a regra não carece de exceção, e que determinados indivíduos
americanos, africanos e mogoles apresentam formas comuns aos Europeus.
Não é isto provar muito, tanto menos quando Weber, ao falar destas
exceções, não parece se ter preocupado da ideia de que sua conforma-
ción particular podia não ser mais que o resultado de uma mistura de sangue.
(2) Nem os Suíços, nem os Tiroleses, nem os montañeses de Escócia, nem os Eslavos
dos Bal kanes, nem as tribos do Himalaya, oferecem o aspecto monstruoso de os
Quichuas.
Como nada autoriza a achar que a espécie humana esteja isenta desta
regra, nada também não, até hoje, tem podido quebrantar a força da ob-
jeción que, mais que todas as outras, inutiliza o sistema dos adversários
da unidade. Afirma-se, é verdadeiro, que, em certas partes de Oceania, as
mulheres indígenas que têm dado a luz mestizos europeus, não são aptas nun-
ca mais para ser fecundadas por seus compatriotas. Dando esta referência como
exata, seria digna de servir de ponto de partida para investigações mais
profundas ; mas, por agora, não é lícito a utilizar para invalidar os princípios
admitidos sobre a geração dos híbridos. A referência nada prova com-
tra as deduções que se saca deles.
CAPÍTULO XI
7
9 8
CONDE DE GOBINEAU
Que Adán seja o autor de nossa espécie branca, há que o admitir, cier-
tamente. É manifesto que as Escrituras querem que se entenda assim, posto
que daquele descem gerações que indiscutivelmente têm sido blan-
cas. Isto sentado, nada prova que, no pensamento do primeiros re-
dactores de genealogias adamitas, as criaturas que não pertenciam à raça
branca tivessem sido conceituadas como fazendo parte da espécie. Não se
diz uma palavra das nações amarelas, e não é senão graças a uma inter-
pretación como conseguirei, creio eu, no livro seguinte, fazer realçar o que
há de arbitrário no fato de atribuir ao patriarca Cam a cor negra.
Sem dúvida os tradutores, os comentaristas, ao afirmar que Adán fué o
autor de todo o que leva o nome de homem, têm feito entrar dentro
das famílias de seus filhos ao conjunto de povos que depois se têm seu-
cedido. Segundo eles, os Jaféticos são a origem das nações européias,
os Semitas ocupam o Ásia interior, os Camitas, que, sem razão fundada,
repito-o, consideram-se como de raça originariamente melania, ocupam as
regiões africanas. Isto, pelo que respecta a uma parte do Globo, é
magnífico; e da população do resto deh planeta, que se faz? Lha
deixa excluída desta classificação.
Não vou insistir, por agora, sobre essa ideia. Não quero entrar em luta
aparente, nem sequer com simples interpretações, desde o momento que
dá-as por boas. Contento-me com indicar que quiçá, sem se sair de os
limites impostos pela Igreja, poderia ser posto em dúvida a validade de
elas; depois me constriño a procurar se, admitindo tal qual é a parte fun-
damental da opinião dos Unitários, não terá ainda medeio de expli-
car os fatos de muito outra maneira que eles o fazem, e de examinar se as
diferenças físicas e morais mais essenciais não podem existir entre as raças
humanas e produzir todas suas consequências, independentemente da
unidade ou da multiplicidade de origem inicial.
99
IOO
CONDE DE GOBINEAU
(i) É Barrow quem tem emitido esta ideia, fundando em algumas semelhanças em
a forma da cabeça e na cor, efetivamente amarillento, dos indígenas do Cabo
da Boa Esperança.
IOI
102
CONDE DE GOBINEAU
religiosa até a época do casamento. Desde tal ponto de vista, era muito
natural que este momento fosse retardado todo o possível, e que o legis-
lador encontrasse importantíssimo o desenvolvimento do julgamento, dantes de
autorizar
o que tão prematuramente autorizava a natureza. Isto não é tudo. Com-
tra os graves depoimentos que invoca M. Prichard, há outros mais conclu-
yentes, ainda que mais leves, e que falham a questão em favor de minha opinião.
103
a reconhecer que, desde o momento em que os tipos são tão por completo
hereditarios, tão constantes, tão permanentes , em uma palavra, apesar de
os climas e o tempo, a humanidade não deixa de resultar menos inteira
e inquebrantavelmente dividida que se as distinções específicas arranca-
sen de uma diversidade primitiva de origem.
{2) Edinburg Revi ew, Ethnology or the Science of Races, Outubro 1848.
io4
CONDE DE GOBINEAU
Estas razões são mais especiosas que sólidas, A origem finés da raça
turca não pode ser admitido mais que a benefício de inventário. Esta origem
não se demonstrou, até agora, senão por meio de um sozinho e único
argumento : o parentesco das línguas. Mais longe demonstrarei até que
ponto este argumento, quando se apresenta isolado, oferece margem à críti-
ca e lugar a dúvidas. Supondo, com tudo, que os primeiros criadores da
nação tenham pertencido ao tipo amarelo, abundam os meios para dêmos-
trar que tiveram razões fundadas para se afastar dele.
105
io6
CONDE DE GOBINEAU
assim de Ásia como de Europa, e que não tem excedido nunca de 12 milhões,
chegaremos ao convencimiento de que a questão da permanência de o
tipo não tem absolutamente nada que ver, nem em pró nem na contramão, com a
história de um povo tão misturado como os Turcos* E esta verdade é tão
clara, que ao encontrar — o que ocorre alguma vez — em indivíduos osman-
líes alguns rasgos característicos da raça amarela, não há que atribuir o
achado a uma origem finés direto; é simplesmente efeito de uma união
eslava ou tártara, que fornece de segunda mão o que ela mesma reci-
biera do estrangeiro. Tenho aqui o que pode ser observado sobre a etnología
dos Otomanos. Passo agora aos Magiares.
Em uma nota muito bem escrita, A. de Gerando (1) tem feito trizas as
teorias de Schlotzer e de seus partidários, demonstrando, com as razões mais
sólidas, sacadas dos historiadores gregos e árabes, e apoiado na
opinião dos analistas húngaros, em fatos comprovados e em datas
que desafiam todas as críticas, e finalmente com razões filológicas, o
parentesco dos Sículos com os Hunos e a identidade primitiva^ da
tribo transilvana com os últimos invasores da Panonia. Os Húngaros
são, pois, Hunos. .. , , „
Aqui se produzirá, sem dúvida, uma nova objeción. Se dirá que disso
deduze-se unicamente que os Magiares têm um parentesco diferente,
mas não menos íntimo com a raça amarela. É um erro. Se^ denomina-a-
ción de Hunos é um nome de nação, é também, historicamente tem-
macio, um nome coletivo, que não designa a uma massa homogênea. Entre
a multidão de tribos agrupadas sob a bandeira dos antepassados de Atila,
distinguiu-se, entre outras, em todas as épocas, a certas bandas chamadas
os Hunos brancos, nas quais dominava o elemento germánico.
107
Assim, qualquer que seja o critério que queira ser adotado sobre a unidade
ou a multiplicidade das origens da espécie, as diferentes famílias estão
hoje perfeitamente separadas umas de outras, já que nenhuma influência
exterior poderia levá-las a juntar-se, a assimilar-se, a confundir-se.
Ninguém ousará o negar: este tão grave problema se acha envolvido em uma
misteriosa escuridão, grávida de causas ao mesmo tempo físicas e inmateriales.
Cier-
tas razões que dependem do entendimento divino e que o espírito pré-
sente sem adivinhar a natureza delas, dominam no fundo das mais
densas trevas do problema, e é muito verosímil que os agentes terrestres.
io8
CONDE DE GOBINEAU
aos quais se pede a chave do segredo, não sejam mais que instrumentos,
resortes inferiores da magna faz* As origens de todas as coisas, ^ de
todos os movimentos, de todos os fatos, são, não infinitamente pequenos,
como se dá em afirmar, senão, pelo contrário, tão imensos, tão vastos e
desmesurados em frente a nossa debilidade, que não podemos suspeitar e indi-
car senão que quiçá existem, sem poder esperar nunca tocar com o dedo nem
revelar de uma maneira segura* Do mesmo modo que, em uma corrente de
ferro destinada a sustentar um grande peso, ocorre com frequência que o anel
mais próximo ao objeto é o mais pequeno, assim também a causa última pode
parecer com frequência quase insignificante, e se paramos-nos a contemplá-la aisla-
io 9
não
CONDE DE GOBINEAU
Não há que sacar partido desses desvios fortuitas que se produ-
cen às vezes em certos indivíduos, e que, se se perpetuassem, criariam indis-
cutiblemente variedades muito dignas de atenção. Sem falar de diversas
afecciones, como a gibosidad, se revelaram fatos curiosos que parecem,
a primeira vista, a propósito para explicar a diversidade das raças. Para
não citar mais que um, M. Prichard fala, de acordo com M. Baker (i),
de um homem cujo corpo, exceção feita do rosto, estava protegido
por uma espécie de caparazón de cor escura, parecida a uma imensa
verruga muito dura, insensible e callosa, e que ao ser cortada não manava
sangue. Em diferentes épocas, esse tegumento singular, em tendo alcan-
zado uma espessura de três quartos de polegada, desprendia-se, caía e era re-
emplazado por outro exatamente igual. Quatro filhos nasceram deste hom-
bre, todos parecidos a seu pai. Um só sobreviveu; mas M. Baker, que
o vió em sua infância, não diz se chegou à idade adulta.^Deduj ou unicamente
que, já que o pai tinha produzido tais retoños, tivesse podido
formar-se uma família particular que teria conservado um Upo especial, o
que tivesse permitido mais tarde, ao cabo de várias gerações, considerar
esta variedade de homens como uma variedade dotada de carateres especí-
ficos particulares.
tenecía de uma maneira muito definida nem à variedade branca, nem à negra,
nem à amarela. Neste caso, os desvios que conduziram os caracte-
rês primitivos da espécie^ humana para as variedades hoje estabelecidas,
resultaram imensamente mais fáceis que o seria hoje, por exemplo, para a
raça negra chegar ao tipo branco, ou para a amarela ao tipo negro. Neste
suposto, teria que representar ao indivíduo adamita como igualmente
estranho a todos os grupos humanos atuais: estes se teriam desenvolvido
a seu ao redor, afastando-se uns de outros o duplo da distância existente
entre ele e a cada um deles* Que tivessem conservado então do ejem-
plar primitivo os indivíduos de todas as raças? Unicamente os carac-
teres mais gerais que constituem nossa espécie: a vadia semelhança
de formas que os grupos mais distanciados têm em comum ; a possibilidade
de expressar suas necessidades por meio de sones articulados pela voz ;
mas nada mais. Quanto ao resto dos rasgos mais especiais deste
primeiro tipo, os teríamos perdido todos, o mesmo os povos negros
que os povos não negros; e, ainda que primitivamente descidos* dele,
teríamos recebido de influências estranhas todo o que constitui no
futuro nossa natureza própria e diferente. A partir de então, as raças
humanas, produtos a um tempo da raça adamita primitiva e de os
ambientes cosmogónicos, não teriam entre sim mais que relações muito
débis e quase nulas. O depoimento persistente daquela fraternidad pri-
mordial consistiria na possibilidade de engendrar híbridos fecundos, e seria o
único. Não teria nada mais, e ao mesmo tempo em que as diferenças dos ambien-
tes primordiais teriam distribuído em cada grupo seu caráter isolado, seus
formas, seus rasgos, sua cor de uma maneira permanente, tivesse-se quebran-
tado decididamente a unidade primitiva, mantida em um estado de fato
estéril quanto a sua influência sobre o desenvolvimiento étnico. A per-
manencia rigorosa, indeleble das raças e das formas, aquela perma-
nencia que os documentos históricos mais remotos afirmam e garantem,
seria o selo, a confirmação dessa eterna separação de raças.
CAPÍTULO XII
E BELEZA
I 12
CONDE DE GOBINEAU
homem civilizado, com todo seu poder, não realiza ainda senão com grandes
dificuldades? Para responder a estas objeciones, há que examinar qual
pôde ser o lugar onde primeiramente estabeleceu sua morada a humana
espécie. *
Estes dois exemplos bastam para que admitamos a ideia de uma rápida
difusão de certos grupos humanos em climas muito diversos, e sob o
império das mais opostas circunstâncias locais. Se, não obstante, fossem
precisas outras provas, poderia ser falado da facilidade com que os insetos,
ios testáceos, as plantas, difundem-se por todos os lados, e certamente não é
necessário demonstrar que o que acontece às categorias de seres que acabo
de citar resulta, com muito maior motivo, menos difícil para o hom-
bre (2). Os testáceos terrestres são arrastados para o mar, pelo dê-
plome dos cantiles, depois conduzidos pelas correntes para praias
remotas. Os zoófitos, sujeitos à concha dos moluscos, ou deixando flutuar
seus brote pela superfície do oceano, vão, a graça dos ventos, a
estabelecer longínquas colônias; e estas mesmas árvores de espécies desconhecidas,
estas mesmas vigas esculpidas que, no século XV, vieram a parar, depois de de
muitas outras inadvertidas, à costa de Canárias, e que, servindo de
pasto às meditaciones de Cristóbal Colón, contribuíram ao descubri-
minto do Novo Mundo, tinham provavelmente também, em seus superfi-
cies, ovos de insetos, que ao calor de uma nova savia deviam romper
o cascarón bem longe do lugar de origem e do terreno em que viviam seus
congéneres.
i x 4
CONDE DE GOBINEAU
dido viver sob climas muito diversos, e em lugares muito afastados uns de
outros* Mas, para que a temperatura e as circunstâncias locais que de
isso resultam sejam diversas, não é necessário, inclusive no estado atual de o
Globo, que os lugares se encontrem a longas distâncias* Sem falar de os
JI 5
1 16
CONDE DE GOBINEAU
Dantes de que vamos mais longe, convém que assinalemos uma lei : os
cruzes não determinam unicamente a fusão das variedades, senão que pró-'
vocan a criação de carateres novos, que resultam desde então o lado
mais importante por onde possa ser considerado um subgénero. Cedo vere-
mos disso uns exemplos. Não preciso acrescentar — o que de seu se explica
que o desenvolvimento desta nova originalidade não pode ser completo sem esta
condição segundo a qual a fusão dos tipos gerais será previamente
perfeita, pois que sem isso a raça terciana não poderia ser dado como verdadeira*-
mente fundada. Adivinha-se, pois, que são precisas aqui condições de tiem-
po tanto mais consideráveis quanto mais numerosas sejam as duas nações
fusionadoras. Até que a mistura seja completa e a semelhança e iden-
tidad fisiológica das individualidades tenham sido estabelecidas, não há
novo subgénero, não há desenvolvimento normal de uma originalidade própria,
ainda que composta; não existem senão a confusão e a desordem que nascem
sempre da combinação incompleta de elementos naturalmente estranhos
um a outro. . . , .
(1) Carus contribui seu poderoso apoio à lei por mim estabelecida a respeito da
aptidão
especial das raças civilizadoras a misturar-se. ( Ueber die ungí . B. d . versch.
Mensch -
hettst f. hoeh geist . Entwick p. 4.)
JI 7
119
CAPÍTULO XIII
120
CONDE DE GOBINEAU
1 21
Pelo que respecta a nossas ideias novas sobre a política, cabe sem
inconveniente tomar-se com elas liberdades maiores ainda que com nossas
ciências.
122
CONDE DE GOBINEAU
Crê alguém que nas opiniões que atualmente dominam, por muito
variadas que resultem, exista uma sozinha ou sequer um matiz que não tivesse
sido conhecido em Roma? Faz um momento falava das cartas escritas
desde Tusculum: é o pensamento de um conservador progressista. Pom-
peyó e Cicerón resultavam liberais em frente a Sila* Não o eram bastante para
César. O eram demasiado para Catón. Mais tarde, sob o Principado, vemos
em Plinio o Jovem a um realista moderado, que gosta não obstante do re-
poso. Não quer nem demasiada liberdade nem excesso de poder, e, positivo em
suas doutrinas, interessando-se muito pouco pelas extinguidas grandezas da
época dos Fabios, preferia a estas a prosaica administração de Trajano.
Não todos opinavam assim. Muitas pessoas pensavam, por temor a que resu-
citasse o antigo Espartaco, que o imperador não devia ser mostrado ^demasiado
severo. Alguns provincianos, pelo contrário, pediam e obtinham o que
poderíamos denominar garantias constitucionais; ao passo que as opiniões
socialistas encontravam intérpretes não menos qualificados que o césar galo
C. Junho Postumo, que exclamava em seus declamaciones : Dives et pauper ,
inimici; o rico e o pobre são inimigos natos.
123
CONDE DE GOBINEAU
124
Sem dúvida nossos Estados são mais complicados, satisfazem maior numero
de necessidades; mas, quando observo ao selvagem errabundo, sombrio, sujo,
huraño, inativo, andando preguiçosamente, com seu pau puntiagudo que lhe
serve de lança, através de uma região erma; quando lhe contemplo, se-
guido de sua mulher, unida a ele por um himeneo cuja única cerimônia com-
sistió em uma violência ferozmente inepta; quando vejo a essa mulher levando
a seu hijito, ao qual matará no caso de que enferme ou tão só de que a
incomode; que subitamente, acossado pela fome, esse miserável grupo,
à caça de uma presa qualquer, se detém encantado ^ ante um desses
ninhos de inteligentes formigas, destrói de um puntapié o edifício, arre-
bata e devora seus ovos; depois, terminada a comida, retira-se tristemente
ao oco de uma rocha, pergunto-me se os insetos que acabam de perecer
não têm sido mais favoravelmente dotados que a estúpida família de o. dê-
tructor; se o instinto dos animais, circunscrito a um reduzido conjunto
de necessidades, não lhes proporciona maior bem-estar que essa razão com a que
nossa humanidade encontrou-se nua sobre o planeta, e mil vezes
mais exposta que as outras espécies aos sofrimentos que podem causar
o ar, o sol, a neve e a chuva. [Pobre humanidade! Nunca tem^ conseguido
inventar a maneira de que todos andem vestidos, de que todos esten a cu-
bierto da sejam e da fome. Certamente o último dos selvagens é
mais perspicaz que os animais, mas os animais conhecem o que para eles
é útil e nós o ignoramos. Os animais não se separam disso, e nos-
outros não podemos o conservar quando temos conseguido o descobrir. Sempre,
em tempo normal, contam, graças a seus instintos, com a segurança de
encontrar o necessário. Nós, em mudança, vemos a numerosas hordas
que, desde o começo dos séculos, não têm conseguido sair de um estado
precário e penoso. Assim que refere-se a bem-estar terrestre, nós não po-
seemos sobre os animais nada mais que um horizonte mais dilatado, ainda que
finito e limitado como o seu.
Não tenho insistido bastante sobre essa triste condição humana de perder
sempre por um lado quando ganhamos por outro ; é esse, no entanto, o fato
que nos condena ao erro em nossas esferas intelectuais» sem conseguir nunca»
ainda sendo limitadas, as possuir por completo* Se esta lei fatal não existisse,
se compreenderia que em um dia dado, longínquo quiçá, em todo caso provável,
o homem, achando-se em posse de toda a experiência das épocas suce-
sivas, sabendo o que pode saber, se tendo apoderado do que pode
tomar, teria em fim aprendido a aplicar suas riquezas, viveria no meio de
a natureza, sem luta com seus semelhantes nem também não com a miséria, e,
tranquilo ao fim, gozaria, se não de um máximo de perfección, pelo menos
de um estado de suficiente abundância e bem-estar*
Tal felicidade, ainda sendo restrita, não nos está reservada sequer»
já que à medida que o homem aprende, esquece; já que não
pode melhorar no aspecto intelectual e moral sem perder no aspecto
físico, e já que não retém com suficiente força nenhuma de suas com-
quistas para estar seguro de conservá-las sempre*
Cremos nós que nossa civilização não perecerá nunca, porque po-
seemos a imprenta, o vapor, a pólvora* A imprenta, que não é menos
conhecida no Império de Annam e no Japão que na Europa central,
tem proporcionado talvez aos povoadores daqueles países uma civiliza-
ción sequer média? (1)* Não carecem no entanto de livros; possuem-nos
em abundância e vendem-se a preços bem mais baixos que os nossos*
A que se deve que esses povos se achem tão relaxados, tão débis, tão
próximos àquele estado em que o homem civilizado, corrompido, debilita-
do e sem coragem não pode equipararse, em potencial intelectual, a um bárbaro
qualquer que, à primeira ocasião, vem ao oprimir? A que se deve
isso? Unicamente a que a imprenta é um meio, e não um princípio* Se a
utilizam para^ reproduzir ideias sãs, vigorosas, saudáveis, funcionará de
a maneira mais fructífera, e contribuirá a sustentar a civilização* Se, por o
contrário, as inteligências estão de tal modo embrutecidas que ninguém leva
já às imprensas faz filosóficas, históricas, literárias, capazes de nutrir in-
tensamente o gênio de uma nação ; se essas imprensas envilecidas não servem
mais que para multiplicar as malsanas e venenosas composições de cérebros
enervados, as produções envenenadas de uma teología de sectarios, como
e por que a imprenta salvará a civilização?
Supõe-se sem dúvida que, pela facilidade com que pode difundir em grande
número ras obras mestres do espírito, a imprenta contribui a conservar-
as, e ainda, nas épocas em que a esterilidad intelectual não permite o flore-
alicerce de gênios rivais, a oferecê-las pelo menos à meditación de
as pessoas honestas* Assim é, efetivamente* Com tudo, para ir procurar um livro
do passado e empregá-lo para sua própria melhoria, é preciso possuir já,
de antemão, o mais precioso dos bens: a força de um alma esclare-
cida. Nos tempos adversos, em gue falham as públicas virtudes, faz-se
pouco caso das antigas composições, e ninguém se preocupa de turbar o
silêncio das bibliotecas.
(1) Deve ser tido em conta a data em que foram escritas estas linhas* (Nota
do tradutor *)
126
CONDE DE GOB1NEAU
Vejamos que tem sido dessas miríadas de excelentes obras publicadas dê-
da data em que funcionou a primeira imprensa. A maior parte estão olvi-
dadas. Aquelas das quais se fala ainda carecem quase^de leitores, e tal ou
qual livro muito solicitado cinquenta anos atrás vê seu título se apagar pouco
a pouco de todas as memórias.
Para encarecer o mérito da imprenta, negou-se em demasía a
difusão dos manuscritos. Esta era maior do que costuma se imaginar. Na
época do império romano, os meios de instrução estavam muito difundi-
dois, os livros eram inclusive comuns, a julgar pelo número extra-
ordinário de gramáticos harapientos que pululaban inclusive pelas mais peque-
ñas populações, espécie de indivíduos comparáveis aos advogados, a os
novelistas, aos jornalistas de nossa época, e cujas impúdicas costumes,
cuja miséria e cuja apasionada inclinação aos prazeres achamos descritas
no Satiricón de Petronio. Quando a decadência fué completa, quem de-
seaban adquirir livros encontravam-nos ainda. Virgilio era lido em todas
Í iartes. Os camponeses, que ouviam lhe alabar, o tomavam por um feiticeiro pe-
igroso. Os monges copiavam-no. Copiavam também a Plinio, Dioscórides,
Platón e Aristóteles. Copiavam assim mesmo a Cátulo e a Marcial. Quanto a
a Idade Média, a julgar pelo grande número de livros que daquele tempo
conservamos após tantas guerras, devastaciones, incêndios de abadias
e castelos, cabe adivinhar até que ponto as obras literárias, científicas, fio-
sóficas, saídas da pluma dos contemporâneos, tinham sido multipli-
cadas para além do que se supõe. Exageram-se pois os méritos reais de
a imprenta pelo que respecta à ciência, à poesia, à moralidad e
à verdadeira civilização; e seríamos mais exatos se, falando mais mo-
destamente do assunto, limitássemos-nos sobretudo a falar de os, ser-
vícios quotidianos que presta esse invento aos interesses religiosos e políticos
de todos os países. A imprenta, repito-o, é um instrumento maravilhoso;
mas quando falham a mão e a cabeça, o instrumento deixa de funcionar
como convém.
127
fazer surgir tinha morrido, deixando perder o segredo teórico de que aque-
llos procedimentos emanaban* Em fim, recordarei que o bem-estar material
não tem sido mais que um anexo exterior da civilização, e que nunca se
tem ouvido dizer que uma sociedade tenha vivido unicamente porque conhecesse
os meios de ir de pressa e de vestir oien.
suas ciências, suas mecânicas, suas poderosas máquinas cujas obras admiramos'
com estupor sem poder adivinhar seu mistério* Também eles conheciam o segredo
de transportar massas enormes* Construíam fortalezas nas que colocavam
uns sobre outros blocos de pedra de trinta e oito pés de longo por dez
e oito de largo* As ruínas de Tihuanaco mostram-nos um espetáculo
semelhante, e aqueles materiais monstruosos eram trazidos de várias léguas
de distância* Sabemos como as compunham os engenheiros daquele pue-
blo, hoje extinguido, para resolver tal problema? Não o sabemos, como não
sabemos também não os meios aplicados à construção das gigantescas
muralhas ciclópeas cujos restos resistem ainda, em tantos e tantos pontos da
Europa meridional, à força destruidora do tempo.
CAPÍTULO XIV
128
CONDE DE GOBINEAU
não tivessem demorado em encontrar terras onde despregar com proveito seu
inteligente atividade.
129
13ou
CONDE DE GOBINEAU
minada a conquista, entregou-se a uma tolerância indolente, não oprimindo
senão segundo as ocorrências. Tenho aqui, pois, por que os Índios da América
espanhola são menos desgraçados e seguem subsistindo, enquanto os
vizinhos dos Anglo-saxãos perecerão sem misericordia.
Este resultado é inevitável tão cedo como dois tipos, entre os cua-
lhes não existe nenhuma afinidad, se encontram em contato ativo, e não co*
nozco disso melhor demonstração que a sorte das famílias polinesias e
americanas. Está pois estatuido pelos razonamientos que anteceden :
131
que seja o ambiente superior que tenham podido atravessar, e o serão siem-
pré; 2. 0 , que, para que uma nação selvagem possa sequer suportar a per-
manencia em um ambiente civilizado, é preciso que a nação que cria esse
ambiente seja um ramo mais nobre da mesma raça; 3* 0 , que a mesma
circunstância é ainda necessária para que civilizações diversas possam,
não se confundir, o que não se produz nunca, , senão unicamente se modificar
recentemente a uma pela outra, se copiar reciprocamente o melhor da cada
uma, dar origem a outras civilizações compostas de elementos comuns;
4. 0 , que as civilizações surgidas de raças completamente estranhas uma
a outra não podem ser posto em contato senão superficialmente, não se penetram
nunca e se excluven sempre* Como este último ponto não tem ficado
suficientemente aclarado, vou insistir*
CONDE DE GOBINEAU
Quanto aos usos, greve fazer realçar 'até que ponto diferiam de
os de Grécia. Se um era jovem, rico, voluptuoso e cosmopolita, o querer
imitar as maneiras de viver de rivais bem mais fastuosos e^ refinados que
os Helenos expunha ao público desprezo. Assim, até a época de Ale-
jandro» isto é, durante o belo e grande período do poderío grego, du-
rante o período fecundo e glorioso, a Persia, pese a toda sua preponderan-
cia, não pôde converter a Grécia a sua civilização. ^
133
A civilização árabe não fué nada mais que a civilização grecosiria, re-
juvenecida, reavivada pelo sopro de um gênio bastante limitado, mas mais
*34
CONDE DE GOBINEAÜ
novo, e alterada por uma mistura persa. Assim formada, disposta a muitas
concessões, não concorda, no entanto, com nenhuma fórmula social surgida
de origens diferentes dos seus; do mesmo modo que a cultura grega
não se harmonizou com a romana, emparentada com ela tão de perto e que
permaneceu encerrada tantos séculos nos limites do mesmo Império. Isto é
o que desejava dizer a respeito da impossibilidade de se confundir nunca civi-
lizaciones próprias de grupos étnicos estranhos uns a outros.
{i) O julgamento mais vigoroso quiçá que tenha podido formular sobre a variedade
melania emana de um dos patriarcas da doutrina igualitaria. Tenho aqui como
definia Franklin ao negro : «É um animal que corre o mas possível e trabalha o
menos possível».
135
136
CONDE DE GOBINEAU
CAPITULO XV
137
formação, não cabe sustentar, nem por um momento sequer, a ideia de que
a família altaica, a aria, a semítica não procedem de origens perfeita -
mente estranhos uns a outros* Tudo nelas difere* A lexicología reveste,
naqueles diferentes ambientes linguísticos, formas perfeitamente carac-
terizadas. A modulación da voz é, em cada um, especial ; aqui, sir-
vendo-se sobretudo de os* lábios para criar os sones; ali, formando-os
pela contração da garganta ; em outro sistema, produzindo-os pela
emissão nasal e como desde o alto da cabeça. A composição das
partes do discurso não oferece sinais menos diferentes, reunindo ou saiba-
rando os matizes do pensamento, e apresentando, sobretudo nas flexio-
nes dos subjuntivos e na. natureza do verbo, as provas mais senha-
ladas da diferença de lógica e de sensibilidade que existe entre as
categorias humanas. Que resulta disso? Pois que, quando o filólogo, a o
esforçar-se em dar-se conta, por conjecturas puramente abstratas, da origem
das linguagens, começa partindo do homem idealmente concebido, de o
homem desprovisto de todos os carateres especiais de raça, do homem
em fim, parte de um verdadeiro contrasentido, e prossegue infaliblemente em
essa mesma forma. Não há homem ideal, o homem não existe, e se estou
persuadido que não lhe descobre em parte alguma, é sobretudo se tratando
de linguagem* Neste terreno, conheço ao posesor da língua finesa, ao de o
sistema ario ou das combinações semíticas; mas ao homem absoluto,
não o conheço. Não posso pois raciocinar, . segundo esta ideia, que tal ponto de
partida único tenha guiado à humanidade em suas criações idiomáticas.
Tem tido vários pontos de partida porque teve várias formas de inteli-
gencia e de sensibilidade (1),
CONDE DE GOBINEAU
I 3 8
Disse, faz um momento, que se esta última causa tivesse podido pré-
valecer, um fundo de articulações formadas a esmo tivesse bastado às
necessidades humanas nos primeiros tempos da existência da espécie.
Parece demonstrado que esta hipótese não é sustentável.
139
. Humboldt tem observado, com seu habitual perspicacia, que cada língua
existe independentemente da vontade dos homens que a falam.
Unindo-se estreitamente a seu estado intelectual, está completamente por
em cima da força de suas caprichos, e não pode ser alterada arbitrária-
mente por eles. Alguns ensaios sobre a matéria oferecem curiosos testimo-
nios disso.
„ Uma tentativa mais completa foi assinalada por Sylvestre de Sacy, a pró-
pósito da língua balaibalán. Este extravagante idioma foi composto
pelos Sufís, para aplicar a seus livros místicos e como medeio de rodear
CONDE DE GOBINEAU
140
Mas, ali onde a inteligência das raças tem tropeçado com escollos
e descoberto lagoas, também a língua os teve. Isto o demonstram
o chinês, o sánscrito, o grego, o grupo semítico. Pelo que respecta ai
chinês, tenho observado já uma tendência mais particularmente utilitaria de
acordo com a via por onde transita o espírito da variedade. A co-
piosa abundância de expressões filosóficas e etnológicas do sánscrito, ^seu
riqueza e sua beleza eurítmicas são ainda paralelas ao gênio da nação.
O mesmo ocorre com o grego, enquanto o defeito de precisão de
os idiomas falados pelos povos semitas concorda perfeitamente com
141
que têm despojado ao alemão moderno das formas harto brilhantes ob-
servadas no gótico do bispo Ulfila t não são também não outras que a pré-
sencia de uma densa população kymrica dentro do pequeno número de
elementos germánicos subsistentes para além do Rin, após as grandes
emigrações que seguiram ao século v de nossa era*
Tenho dito em outro lugar que, tendo cada civilização um alcance par-
ticular, não tinha que se estranhar se o sentido poético e filosófico aparecia
mais desenvolvido entre os Indianos sánscritos e entre os (anegos que entre
nós* ao passo que o espírito prático, crítico, erudito, distingue maior-
mente a nossas sociedades* Tomados em massa* estamos dotados de uma
virtude ativa mais enérgica que os ilustre dominadores do Ásia meridional
e da Hélada* Em mudança, devemos ceder-lhes o passo no terreno do
belo, e é, por tanto, natural que nossos idiomas ocupem o humilde
faixa de nossos espíritos* Um vôo mais poderoso para as esferas ideais
reflete-se naturalmente na palavra de que fizeram uso os escritores de
a Índia e da Jonia, de sorte que a língua, que é já — assim o creio —
um excelente critério da elevação geral das raças* é-o ainda, de
uma maneira especial, de sua elevação estética, e tomada sobretudo este
caráter quando se aplica à comparação das civilizações respectivas*
Para não deixar escuro este ponto, me permitirei discutir uma opinião
emitida pelo barón Guillermo de Humboldt, a propósito da superio-
ridad do mexicano sobre o peruano, superioridad evidente, diz, ainda
quando a civilização dos Incas tenha superado em muito a dos habi-
tantes de Anáhuac*
CONDE DE GOBINEAU
142
Pelo demais, seguindo esta via, não constituirá uma pequena dificuldade
o determinar para os povos mestizos as causas do estado idiomático em
que os encontra. Não sempre se possuem, sobre a proporção das
misturas ou sobre sua qualidade, luzes suficientes para poder examinar o trabalho
organizador delas. No entanto, a influência dessas causas primeiras
persiste, e, se não está desenmascarada, pode conduzir facilmente a com"
clusiones errôneas. Precisamente como a relação do idioma com a
raça é bastante estreita, conserva-se muito maior tempo que a estruc"
tura estatal nos povos. Faz-se ostensible ainda depois que os povos
têm mudado de nome. Unicamente que, alterando com seu sangue, não
desaparece, não morre senão com a última parcela de sua nacionalidade. O
grego moderno encontra-se neste caso ; mutilado em grau somo, dê"
pojado da melhor parte de suas riquezas gramaticales, enturbiado e man"
chado em seu lexicología, empobrecido inclusive, ao que parece, no que
ao número de sons refere-se, não tem cessado de conservar seu belo original.
É, em verdadeiro modo, no universo intelectual, o que é, sobre a 1 ierra
aquele Partenón tão degradado, que, depois de ^servir de igreja aos Popes,
e após convertido mais tarde em polvorín, de ter estoirado em mil
lugares diferentes de seu frontón e de suas colunas sob os proyectiles vene"
cianos de Morosini, apresenta ainda à admiração dos séculos o ado"
rabie modelo da graça serena e da singela majestade.
143
Seja o que for, tenho aqui, respeito dos Judeus, uma prova manifesta
desta verdade, segundo a qual não cabe sempre, a primeira vista, estabelecer
uma concordância exata entre uma raça e a língua de que está em pose-
sión, atendido^ que esta língua pode não lhe ter pertencido originaria-
mente. Após os Judeus, poderia citar ainda o exemplo dos Zíngaros
e de muitos outros povos.
*44
CONDE DE GOBINEAU
já que não só numerosas nações não empregam mais que línguas alte-
radas cujos principais elementos não foram contribuídos por elas» senão tam-
bién que muitas outras adotaram línguas completamente estrangeiras, em
cuja confecção mal contribuíram. Este último fato é sem dúvida mas
raro. Inclusive apresenta-se como uma anomalía. Basta, no entanto, que
pudesse ter lugar, para que devamos nos pôr em guarda contra um
gênero de provas sujeitas a tais desvios. De todos modos, como o
fato é anormal, já que não se descobre tão frequentemente como
o fato oposto, isto é, a conservação secular de idiomas nacionais por
muito débis grupos humanos; como que se vê também até que ponto
as línguas parecem-se ao gênio particular do povo que as cria, e até
que ponto se alteram precisamente na medida em^ que o sangue de o
povo modifica-se; como que o papel que desempenham na formação
de seus derivados é proporcional à influência numérica da raça que
contribui-as na nova mistura, tudo dá direito a concluir que um povo
não pode possuir uma língua que valha mais que ele, a menos de mediar
razões especiais. E como não se insistirá nunca demasiado sobre este ponto,
vou fazer realçar a evidência disso com uma nova espécie de de-
mostración. .
*45
Para dar origem a este, só era questão de criar uma alteração bastante
fácil da terminologia^ latina, modificada por verdadeiro número de ideias gra-
maticales tomadas ao céltico e a outras línguas antanho desconhecidas em o
Oeste de Europa. As colônias imperiais tinham contribuído grande número de
elementos italianos, africanos, asiáticos. As invasões borgoñonas, e sobre
todo as góticas, proporcionaram uma nova contribuição dotada de uma grande
vivacidad de harmonia, de sons amplos e brilhantes. As irrupciones
sarracenas fortaleceram seu poderío. De sorte que o romance, distinguién-
dose completamente do galo, quanto a seu euritmia, revestiu cedo um
selo muito especial. Sem dúvida, este não o encontramos perfeito na fórmula
de juramento dos filhos de Luis o Apacible, como mais tarde nas
poesias de Raimbaud de Vachéres ou de Bertrand de Born. Com tudo, se
reconhece-lhe já pelo que é, seus carateres aparecem já destacados, e seu
direção está netamente determinada. A partir de então, resultou deveras,
em seus diferentes dialetos lemosín, provenzal, auvemiano, a língua de um
povo tão misturado de origem como não o tenha tido nunca no mundo.
Aquela língua flexível, fina, espiritual, zombadora, cheia de brilho, mas sem
profundidade, sem filosofia, oropel e não ouro, não pôde, em nenhuma das
opulentas minas que lhe foram abertas, senão recolher migalhas na superfície.
io
146
CONDE DE GOBINEAU
147
Não passarei também não em silêncio um detalhe que deve encontrar aqui seu
explicação. Tenho exposto como certos grupos étnicos poderão, sob o im-
perio de uma aptidão e de necessidades particulares, renunciar a seu idioma
natural para adotar outro que era para eles mais ou menos estranho. Tenho
citado aos Judeus, aos Parsis. Existem exemplos ainda mais singulares
deste abandono* Vemos a povos selvagens em posse de línguas soube-
riores a eles mesmos, e é América a que nos oferece este espetáculo.
Aquele continente teve a estranha sorte de que seus povos rnás ativos
tivessem-se desenvolvido, por dizê-lo assim, em segredo. A arte da escritura
CONDE DE GOBINEAU
148
Posso desde agora deixar sentado que a filología, em suas relações com
a natureza particular das raças, confirma todas as observações da
fisiología e da história. Só que seus aserciones se distinguem por uma
extrema delicadeza, e quando não podemos nos apoiar senão nelas, nada
mais aventurado que contentar com seus resultados para chegar a uma com-
clusión* Sem dúvida, sem nenhum gênero de dúvida, o estado de uma linguagem
responde ao estado intelectual do grupo que o fala, mas não sempre a seu
valor íntimo. Para obter esta conexão, há que considerar unicamente
a raça por e para a qual esta linguagem tem sido primitivamente criado.
M9
Esta regra está ditada por uma prudência necessária. Empero, todos os
fatos que acabamos de revisar estabelecem que, em sua origem, a identi-
dêem acha-se por inteiro entre o mérito intelectual de uma raça e o de seu
língua natural e própria ; que as línguas são, portanto, desiguais
em valor e em influência; que suas modificações não provem/provêm senão de
misturas com outros idiomas, como as modificações de raças; que seus
qualidades e méritos absorvem-se e desaparecem, absolutamente como a
sangue das raças, em uma imersão demasiado considerável de elementos
heterogéneos; em fim, que, quando uma língua de casta superior é falada
por um grupo humano indigno dela, não deixa de decaer e de se mutilar.
Se, pois, é difícil, em um caso particular, estabelecer, a primeira vista, o valor
de um povo partindo do valor da língua de que se serve, não por isso
é menos incuestionable que, em princípio, é lícito o fazer. Estabeleço, pois,
este axioma geral :
CAPÍTULO XVI
i5ou
CONDE DE GOBINEAU
Vêm agora os povos brancos. Energia reflexiva, ou, por melhor dizer,
uma inteligência enérgica ; conhecimento do útil, mas em um sentido da
palavra muitíssimo mais amplo, mais elevado, mais animoso, mais ideal
que nas nações amarelas; uma perseverancia que se dá conta de os
obstáculos e encontra, à longa, os meios de salvá-los; junto com uma
maior energia física, um instinto extraordinário desordem, não já só como
garantia de repouso e de paz, senão como meio indispensável de conser-
151
152
CONDE DE GOBINEAU
É isto o que nos ensina a História* Esta nos mostra que toda civi-
lización prove/provem da raça branca, que nenhuma pode existir sem o com-
curso desta raça, que uma sociedade não é grande e brilhante senão em
o grau em que conserva ao nobre grupo que a criasse, e em que este
mesmo grupo pertence ao ramo mas ilustre da espécie* Para expor
estas verdades a plena luz, basta listar e depois examinar civiliza-as-
C10I ^ S < l ou& ^an reinado no mundo, cuja lista não é por verdadeiro muito longa*
154
Tenho dito que as grandes civilizações humanas não são senão em nú-
mero de dez e que todas se devem à iniciativa da raça branca. Tem^
que pôr ao começo da lista :
Uma colônia aria, chegada da Índia, contribuiu ali as luzes sociais. Única-
mente que em vez de se misturar, como nas orlas do Nilo, com povos
negros, fundiu-se com massas malayas e amarelas, e recebeu, ademais, por o
Noroeste, contribuições bastante numerosas de elementos brancos, igualmente
arios, mas não já indianos. #
Semitas. , . 1 . . ,
VIL As raças germánicas transformaram, no século V, o gênio de
155
Dentro das dez civilizações, nem uma sozinha raça melania ocupa a faixa
dos iniciadores. Unicamente os mestizos atingem a faixa de iniciados.
LIVRO SEGUNDO
CAPÍTULO PRIMEIRO
, Os Camitas
Seja que tenha que a ter por simples ou composta, seja que lha consi-
dere nas regiões abrasadas do Meio dia ou nos vales glaciais de o
Septentrión, não transmite nenhum vestígio de civilização, nem presente nem
possível. Os costumes destas tribos parecem ter sido das mais
brutalmente crueis. A guerra de exterminio, tenho aqui sua política; a an-
tropofagia, tenho aqui seu moral e seu culto. Em nenhuma parte vêem-se nem
villas, nem templos, nem nada que revele um sentimento qualquer de sócia-
bilidad. É a barbarie em toda sua fealdad, e o egoísmo dos débis em
toda seu ferocidad. A impressão que disso receberam os observadores
primitivos,^ surgidos de outro sangue, que vou cedo a introduzir na
cena, fué por todas partes a mesma, mistura de desprezo, de terror e
de repugnancia. Os animais de presa pareciam de natureza demasiado
nobre para servir de ponto de comparação com aquelas tribos repulsivas.
i 6 ou
CONDE DE GOBINEAU
trevas (i). . . KT
Esta raça não parece ser menos antiga que as outras duas. Dantes de seus
invasões, vivia em silêncio, preparando os destinos humanos e desarro-
llándose, para a glória do planeta, em uma parte de nosso Balão que
mais tarde tem voltado a afundar na escuridão.
161
Mas não eram nem o ouro, nem os diamantes, nem as peles, nem o musgo,
do que aquelas regiões deviam sacar sua glória; sua incomparável honra,
estriba em ter criado a raça branca.
E or o demais tão difícil, ainda para os alvos, que cinco mil anos não têm
astado ainda para sua total realização*
A família predestinada, bem como as outras duas a seu serviço, não pode
ser senão muito escuramente definida. Por todos os lados mostrou grandes
semelhanças,
que autorizam e inclusive obrigam à agrupar por inteiro sob uma mesma
denominação : a denominação» algo vadia e muito incompleta, de raça
branca . Como, ao mesmo tempo, suas principais ramificações revelam apti-
tudes bastante diversas e características muito peculiares, pode ser julgado
que não há identidade completa nas origens do conjunto; e, do mesmo
modo que a raça negra e os habitantes do hemisfério boreal apresentam,
no seio de suas espécies respectivas, diferenças muito acusadas, assim também
% é verosímil que a fisiología dos alvos oferecesse, desde o começo,
análoga multiplicidade de tipos. Mais tarde procuraremos as impressões dessas
divergências. Aqui não nos ocupamos senão dos carateres comuns.
A raça branca vivia reunida ainda nos países remotos do Ásia sep-
11
IÓ2
CONDE DE GOBINEAU
Seja o que for, tenho aqui a esses povos brancos, muito tempo dantes
das épocas históricas, provistos, em seus diferentes ramos, de dois elemen-
tosse básicos de toda civilização : uma religião, uma história.
163
(2) Génesis , cap. IX, v. 25. «Ait: Maledictus Chanaan, servus servorum erit
fratribus suis.»
CONDE DE GOBINEAU
164
165
gras, resultou para elas cada vez mais difícil impedir que sua língua natural
alterasse-se; e uma vez encontraram-se materialmente enlaçados com os ne-
gros, perderam-na completamente, devido a tê-la deixado invadir e dê-
figurar pelos dialetos melamos.
O mundo não pode conceber nada comparável, por seus efeitos, com os
resultados do enlace dos Camitas brancos com os povos negros. Os
elementos de semelhante aliança não existem em nenhuma parte, e nada tem
de estranho que, na produção tão frequente dos híbridos de ambas
espécies, nada represente já nem no físico nem no moral a energia de
a primeira criação. Se o elemento negro tem conservado bastante em gene-
ral sua pureza de raça, não ocorre assim com o alvo. A espécie não se descobre
já^em nenhuma parte com seu valor primitivo. Nossas nações, ainda as
mas substraídas aos cruzes, não são senão resultados muito decompostos, muito
pouco harmônicos, de uma série de misturas, seja de negros e brancos como,
no meio dia de Europa, os espanhóis, os italianos, os provenzales ; seja
de amarelos e brancos como, no Norte, os ingleses, os alemães, os
russos. De maneira que os mestizos, produto de um pai suposto alvo,
cuja esencia original está já tão modificada, não podem em modo algum
comparar ao tipo etnicamente peculiar dos Camitas negros.
i66
CONDE DE GOBINEAU
Tenho aqui, creio eu, o que pinta melhor aos Cainitas negros, v facilmente
me inclinaria a ver uma estreita conexão de semelhança entre a mistura de
a qual aqueles têm surgido e o maldito himeneo das avós de^Noé
com aquele outro filho desconhecido que o pensamento primitivo relegou, não
sem verdadeiro horror, a uma faixa sobrenatural.
(1) Tais eram, por exemplo, os querubines com cabeça de boi. (Lexicón ma>
nuale hebraicum et chaldmcum .)
167
CAPÍTULO II
Os Semitas
Estes povos são os que chamamos Semitas* Sua força principal parece
ter-se concentrado» nos primeiros tempos, nas vastas regiões mon-
tañosas da Alta Caldea. De ali saíram, em diferentes épocas, suas massas
mais vigorosas. De ali emanaron as correntes cuja mistura regenerou com-
siderablemente, e por muitíssimo tempo, o sangue desnaturalizada de
os Cainitas, e, a seguir, a espécie igualmente bastardeada de os
mais antigos emigrantes de sua própria raça. Esta família tão fecunda irradió
sobre uma grande extensão de territórios. Na direção do Sudeste, engen*
dró aos Armenios, aos Arameos, aos Elamitas, aos Elimeenses» nome
igual sob diferentes formas; cobriu com seus retoños o Ásia Menor. Os
Licios, os Lidios, os Garios, a ela pertencem. Suas colônias invadiram a
Creta» de^a que partiram, mas tarde» sob o nome de Filisteos, para ocu-
par as Cicladas, Thera, Melos, Citerea e a Tracia. Estenderam-se por tudo
o contorno do Propóntide, na Tróade, ao longo do litoral da
Grécia, chegaram a Malta, e às ilhas Lipari em Sicília.
Uma difusão tão enorme não se explicaria, qualquer que pudesse ser
porlo demais a fecundidad da raça, se quisesse ser reivindicado para estes
povos uma grande pureza de sangue. Mas, por muitas causas, esta preten-
sión não seria sustentável. Os Camitas, contidos por uma repugnancia natu-
ral, tinham-se quiçá resistido algum tempo a uma mistura que confundia sua
sangue com a de suas súbditos negros. Para sustentar esta luta e manter
i68
CONDE DE GOBINEAU
CONDE DE GOBINEAU
170
pagá-lo tudo. . ,
171
172
CONDE DE GOBINEAU
muito honroso para eles e que dá, a um tempo, a medida de sua gosto
pela civilização e a da vasta extensão de seus trabalhos*
(1) Os Asirios ocuparam três vezes Fenicia: a primeira vez, 1.000 anos dantes
de J.-C. ; a segunda, para a metade do século XIII ; a terça, em 750. (Movers, Dá
P ficen. Alterih. t. II, i. a parte, p. 259.)
*73
sagrado não nos diz que poderosas razões tinham ditado a resolução de o
semita. Estas razões eram graves, sem dúvida, já que o filho do emigram-
proibiu você mas tarde a sua raça que se repatriasse, ainda que ao mesmo tempo
ordeno a seu herdeiro que escolhesse uma esposa no país de seus ante-
passados (1).
CONDE DE GOBINEAU
1 74
Não quero levar mais longe os detalhes desta história: são harto co-
nocidos. Sabe-se que os Semitas abrahamidas acabaram por se assentar em
o país da Promessa. O que unicamente quero acrescentar, é que as é-
jantares do primeiro estabelecimento, como as da partida, e as das vaci-
laciones que lhe precederam, recordam de uma maneira vivísima o que mues-
tran, em nossos dias, tantas famílias irlandesas ou alemãs em terras de
América. Quando um chefe inteligente as conduz e dirige seus trabalhos, mar-
chan adiante como os filhos do patriarca. Quando as dirige mau, Ira-
casam e desaparecem como tantos grupos semíticos cujos desastres nos deixa
entrever a trechos a Biblia. A situação é a mesma; os mesmos senti-
mente mostram-se ali em circunstâncias sempre análogas* Se vê persis ir
no fundo dos corações aquela terna parcialidad com respeito a a
pátria longínqua, para a qual, por nada no mundo, se quisesse no entanto
retrogradar. É também a mesma alegria quando dela se recebem notícias,
o rmsmo orgulho pelo parentesco que ali se conserva; em uma palavra,
tudo é parecido. , t . i
175
Por muito tempo teve de achar-se que esta fonte regeneradora seria
inesgotável. Quando, para a época da primeira emigração dos Semitas,
algumas das nações arias, diferentes das tribos brancas, estabeleceram-se
na Sogdiana e no Pendjab atual, ocorreu que dois ramos se despren-
deram destas. Os povos ariohelénicos e ariozoroástricos procuravam uma
saída para chegar ao Oeste, exerciam forte pressão sobre os Semitas, e lhes
(3) Isaías.
CONDE DE GOBINEAU
176
e o amárico. _ ,
I??
É uma língua cafre, ^ e o povo que fala seus dialetos, povo em-
fechado antanho, em opinião dos Europeus, nos territórios mais meridio-
nales do África, estende-se agora, para nós, 5 0 mais ao Norte, até
para além de Mombasa (6). Os gallas falam dialetos que se parecem ao cafre.
Estas observações não terminam aqui. É lícito acrescentar esta última fra-
se, da maior importância : todo o continente do África, de Sur a Norte
e de Leste a Oeste, não conhece mais que uma sozinha língua, não fala mais que
dialetos de uma mesma origem. Assim no Congo como na Cafrería e em
Angola, em todas as proximidades da costa, se descobrem as mesmas
formas e as mesmas raízes. A Nigricia, que ainda não tem sido estudada,
e a jerga dos Hotentotes, continuam, provisionalmente, à margem de
esta afirmação, mas não a refutan.
É necessário mais para reconhecer que este grupo, tanto por suas formas
(3) Ewald, Zeitschrift fur die Kunde dê Morgenlandes , Ueber die Saho-Sprache
in Aethiopien, t. V, p. 410.
{4) Os Sahos habitam não longe de Mossawa, ou melhor Massowa, no mar Vermelho.
i 7 8
CONDE DE GOBINEAU
como por suas lagoas, baseia suas razões de existir no fundo dos ele-
mentos étnicos que o compõem, isto é, nos efeitos de uma origem branca
absorvido no seio de uma proporção infinitamente formidable dele-
mentos melanios?
179
i8ou
CONDE DE GOBINEAU
CAPÍTULO III
Os Cananeos marítimos
181
182
CONDE DE GOBINEAU
compradores. l
mesmas fontes. ,
183
que não tinham o sangue puro e, ainda que preponderantes, não o eram
bastante para influir nas imaginaciones até o grau necessário às
apoteosis* Os Camitas negros souberam igualmente denegarles o acesso a
os sacerdocios reservados desde tantos séculos às mesmas famílias* Enton-
ces os Semitas humilharam à teocracia e colocaram, acima dela,
o governo e o poder da espada* Depois de de uma luta bastante viva, o go-
bierno das cidades fenicias, dantes sacerdotal, monárquico e absoluto,
convirtióse em aristocrático, republicano e absoluto, substituindo assim uma
tríade de forças por outra.
Seja que se^ aceitasse^ para o futuro, no governo das cidades feni-
cias, um chefe único, ou bem — combinação mais frequente — que a coroa
desdoblada dividisse-se entre dois reis escolhidos a tentativa dentro de duas
casa rivais, a autoridade destes chefes supremos resultou inteiramente limi-
tada, vigiada, e não lhes concedeu mal, com plenitude, mais que prerro-
gativas sem efeito e esplendores sem liberdade* É lícito achar que os Semitas
estenderam a todos os países onde dominaram aquela zelosa vigilância
do poderío monárquico, e que, assim em Nínive como em Babilonia, os titu-
lares do Império não foram, sob sua inspiração, mais que os representantes
sem iniciativa dos sacerdotes e dos nobres.
CONDE DE GOB1NEAU
184
caráter imperativo que reveste a lei, todo devia ceder ante esta lei, cujas
primeiras vítimas eram os próprios legisladores. Em nenhuma parte e nunca
essa abstração tinha em conta as situações pessoais. Um rigor infle-
xible fazia chegar os temíveis efeitos até o interior das famílias, atira-
nizaba as relações mais íntimas dos esposos; pesava sobre a cabeça
do pai, déspota de seus filhos, estabelecia a coerción entre o indivíduo e
sua consciência. Em todo o Estado, desde o último marinho ou o mais ínfimo
operário, até o grande sacerdote de Deus mais reverenciado ou até o nobre
mais arrogante, a lei estendia o terrível nível revelado por esta breve
sentença: {Tantos homens, tantos escravos!
l8 5
exigiam muitos braços. Tiro e Sidón, sobre ser grandes cidades marítimas
e comerciais pelo estilo de Londres e Hamburgo. eram ao mesmo tempo
grandes centros industriais como Liverpool e Birmingham ; convertidas em
desaguaderos dos povos do Ásia Anterior, davam ocupação a todos v
vertiam o sobrante no vasto círculo de suas colônias. Desta sorte, em-
viaban ali, com imigrações constantes, forças frescas e um sobrante de
sua própria vida. Não admiremos em demasía tão prodigiosa atividade. Todas
estas vantagens de uma população sem cessar aumentada ofereciam suas enojosos
inconvenientes : começaram por alterar a constituição política no sentido
de melhorá-la; acabaram determinando sua total ruína.
i86
CONDE DE GOBINEAU
sua própria debilidade. A derrota não podia ser previsto mais que por efeito da
até no Senegal. , , t , , .. ^
l8 7
i88
CONDE DE GOBINEAU
189
CONDE DE GOBINEAU
Não me fica por dizer nada mais sobre o ramo mais vivaz da família
cananea. Esta, por seus méritos e seus vícios, brinda a primeira certeza que
apresenta a história à etnología: o eleniento negro domino nela. De
aí, amor desenfrenado a goze-os materiais, superstições profundas,
disposições para as artes, inmoralidad, ferocidad.
O tipo branco mostrou nela menos vigor. Seu carac er varonil tendeu
a apagar ante os elementos femininos que o absorviam. Contribuo, em
aquela vasta mistura, o espírito utilitario e conquistador, o gosto por uma
organização estável e aquela tendência à regularidade polhica que
desempenha seu papel na instituição do despotismo legal, papel contra-
nado sem dúvida, ainda que eficaz. Para completar o quadro, a superabundancia
de tipos^ inconciliables» saídos em proporções diversas das misturas»
engendrou a crônica desordem e provocou a parálisis social e aquele estado
de relajamiento gregario no qual predominou cada dia mais a esencia
melania. Nesta situação é como se estancaram daqui por diante as raças
formadas pelas alianças cananeas.
CAPÍTULO IV
Tenho mostrado que o sistema das línguas semíticas era uma extensão
imperfecta do das línguas negras. É nestas unicamente onde se
encontra o ideal desta forma idiomática. Alterou-se com o árabe, resultou
ainda mas incompleto com o hebreu, e não tenho ido, nessa progressão desejem^
dêem você, mas lá do arameo, no qual a decadência dos princípios
constitutivos é ainda mais acusada. Encontramos-nos aqui como aquele
que* penetrando em um lugar subterrâneo, vê que à medida que avança
vai faltando-lhe a luz. Ao seguir avançando, a luz se fará de novo, mas
sera pelo lado oposto da caverna e seu fulgor será diferente.
O arameo não oferece ainda nada mais que uma deserción negativa de o
espírito melanio. Não revela formas netamente estranhas a este sistema. Meu-
rando algo mais longe, geograficamente falando, se apresenta muito cedo
o armenio antigo, e ali, sem dúvida alguma, se percebem novidades. Trope-
zamos ali com uma originalidade que impressiona. Analisamo-lo, o estu-
diamos; é o elemento indogermánico. Não cabe duvidar disso. Muito limi-
tado ainda, débil quiçá, mas vivo e inconfundível.
Prossigo minha rota. Ao lado dos Armenios estão os Medos. Escuto seu
língua. Reconheço ainda sons e formas semíticas. Uns e outras são mais
borrosos que no armenio, e nelas o indogermánico ocupa maior é-
P acl ° j- Tão P ronto como P^etro nos territórios situados ao Norte de
a Média, passo ao zendo. Descubro ali ainda o semítico, desta vez em um
estado de completa subordinación. Se dirigisse-me para o Sur, o pehlvi,
CONDE DE GOBINEAU
192
diferente ordem. , ,
A nação médica não fué nunca muito numerosa — teremos mas tarde
193
13
194
CONDE DE GOBINEAU
Í jaíses mesopotámicos. Mas tão cedo como os Caldeos, mais puros que
a família ismaelita, mostraram-se de novo, esta desceu do trono para
ceder a eles.
Vemos, pois, que nas elevadas esferas do poder, ali onde se ela-
boran as ideias civilizadoras, nada destacam já os Camitas negros, nem devem
ter-se nunca mais em conta. Suas massas humilharam-se completamente
sob as capa sucessivas dos Semitas. Dentro do Estado não contam sina
como número, e não desempenham o menor papel. Mas, pese a seu aparente
humillación, sua missão não é menos terrível e decisiva. É o fundo estacio-
nario no qual todos os conquistadores vão, depois de escassas gerações, a
abater-se e afundar-se. Ao começo, daquele terreno corrompido sobre o
qual avançam triunfalmente os vencedores, o varro não lhes chega senão até
o tornozelo. Cedo afundam-se as pernas, e a imersão rebasa a cabeça.
Assim fisiologicamente como moralmente, a imersão é completa. Na
época de Agamenón, o que mais impressionou aos Gregos fué a cor de
Memnón, filho da Aurora, que acaudillaba aos Asirios chegados em auxílio
de Príamo. Àqueles povos orientais os rapsodas aplicavam-lhes sem
vacilação o nome significativo de Etíopes.
195
tributária sua, e a proteger a Jonia. Seu objetivo era pôr fim ao macaco-
polio das cidades^ fenicias, e, em consequência, depois de sucumbir os
Troyanos, permitiu-se que seus vencedores os substituíssem* Os Gregos
asiáticos converteram-se assim nos fatores prediletos do comércio de
Nínive e de Babilonia. É a primeira prova que temos podido descobrir
dessa verdade tão com frequência repetida pela História : que se a identidade de
raça cria entre os povos a identidade de destinos, não determina em modo
algum a identidade de interesses e, por tanto, a afección mútua*
E aginas um lugar aparte, se as grandes ideias que suscita seu nome não se
> tivessem reservado já de antemão.
CONDE DE GOBINEAU
196
197
Não deixar aos Israelitas sem dedicar umas palavras a certas tribos que
viveram longo tempo entre eles, nos distritos situados ao Norte do Jor-
dán. Esta misteriosa população parece não ter sido outra que os restos
conservados^ puros de algumas das famílias melanias, daqueles negros
antanho donos do Ásia Anterior, dantes da chegada dos Camitas brancos.
A descrição que os livros sagrados nos oferecem daqueles homens
miseráveis é precisa, característica, terrível, pela ideia de profunda degra-
dación que sugere.
«Fazem troça de mim aqueles de cujos pais não jogaria eu mão nem
ainda para que com meus cães guardassem meu ganhado.
CONDE DE GOBINEAU
198
CAPÍTULO V
Os Egípcios; os Etíopes
200
CONDE DE GOBINEAU
201
Sufis e seu irmão Sensufis. Assim, em 2120 dantes de J.-C* o Egito teria
apresentado já um estado de civilização muito avançado e capaz de acometer
e de levar a bom hn os trabalhos mais surpreendentes realizados pela mão
do homem. A emigração branca teria, pois, tido efeito dantes dessa
época, já que cada grupo de pirâmides pertence a uma época diferente,
e que cada pirâmide, em particular, deveu de custar demasiados esforços'
para que uma sozinha geração pudesse empreender a construção de varia
delas.
Quer ser suposto que um ramo camita tenha avançado até as regio-
nes do Nilo, entre Syene e o mar, e tenha fundado ali a civilização
egípcia? Esta hipótese destrói-se por si mesma. Por que aqueles Ca-
nutas, após ter estabelecido um Estado considerável, tivessem rompido
em seguida toda relação com os outros povos de sua raça, se afastando de
1 se S ou . lc * a P° r estes últimos, e avançando em suas emigrações para
o África, longe do Mediterráneo, longe do Delta, para inventar ali, em o
isolamento, uma civilização inteiramente egoísta, hostil em mil pontos a
a dos Canutas negros? Como teriam adotado uma língua tão soma-
mente diferente dos idiomas de seus congéneres? Não vemos a estas obje-
ciones uma resposta razoável. Os Egípcios não são, pois, Camitas, e há
que dirigir a outro lado.
A antiga língua egípcia compõe-se de três partes. Uma pertence
às línguas negras. A outra, procedente do contato destas línguas ne-
gras com o idioma dos Camitas e dos Semitas, produz aquela mistura
que toma o nome da segunda destas raças. Finalmente apresenta-se
uma terceira parte, muito misteriosa, muito original sem dúvida, mas que, em
vários pontos, parece revelar afinidades arias e verdadeiro parentesco com o
sánscrito* Este fato importante, se estivesse solidamente estabelecido, po-
dría considerar-se como concluyente e a propósito para traçar o itinerario
dos colonos brancos de Egito, desde o Pendjab até a embocadura
do Indo, e de ali até o vale superior do Nilo. Desgraçadamente, ainda-
que indicado, não está claro e não pode servir mais que de índice. Sem em-
bargo, não é impossível encontrar motivos em que o apoiar.
202
CONDE DE GOBINEAU
levava a repudiar. . ,
203
204
CONDE DE GOBINEAU
Acabo de provar que não trato de reforçar minha opinião com um argu-
mento que julgo frágil. Agora acrescentarei que ao me pronunciar contra todas
as conclusões diretas que cabe sacar da existência simultânea das
castas na Índia e em Egito, disto muito de sustentar que não caiba
chegar a induções colaterales, que não deixam de corroborar de uma maneira
muito útil o princípio da comunidade de origem: tal é a veneração
igual pelos ministros do culto, sua longa dominación e a dependência baixo
a qual têm sabido manter a casta militar, inclusive quando esta tem levado
a coroa, triunfo que o sacerdocio camita não soube atingir, e que cons-
tituyo a glória e a força das civilizações do Indo e do Nilo. Débese
isto a que a raça ana é antes de mais nada religiosa. Há que observar ainda
a constante intervenção dos sacerdotes nos costumes e os atos
mas íntimos do lar doméstico (1). Em Egito, como na Índia, vemos
aos sacerdotes regulamentá-lo tudo, até a eleição dos alimentos, e
estabelecer, a este respeito, uma disciplina mais ou menos análoga. Em uma
palavra, ainda que o número de castas não seja o mesmo, a hierarquia
resulta bastante parecida em ambos territórios. É isto todo o que convém
assinalar a respeito de uns fatos, ao que parece secundários, mas que oferecem
a vantagem de prestar-se a um paralelo, fragmentos dispersos de uma primi-
tiva unidade, se não de instituições, pelo menos de" instintos, ao mesmo
tempo que de sangue.
2ü6
CONDE DE GOBINEAU
2°7
fante : membro do Conselho soberano, sua voz tinha o peso dos oráculos ;
e como Se todos esses laços de servidão tivessem parecido ainda demasía’'
do débis para salvaguardar aquela parte tão enorme de poder, os reis
sabiam que após sua morte estariam sujeitos a um julgamento, não por parte
de seus povos, senão por parte de seus sacerdotes; e em uma nação que
abrigava sobre o mas alia ideias tão particulares, cabe facilmente imaginar-se
o terror que infundía no espírito do mais audaz dos déspotas fa cria
quitasoles ° r ° C SegUlr e ^ etr ^ s seu car roza, entre o pó, levando seus
208
CONDE DE GOBINEAU
Também eles eram utilizados como bestas de ônus para executar aque-
llos gigantescos trabalhos que admirarão todos os séculos. Eram eles quem
transportavam os blocos destinados à erección das estátuas e dê
os obeliscos monolíticos. Era aquela população negra ou quase, negra a que
morria em massa ao escavar os canais* enquanto as castas mais brancas ima-
ginaban* ordenavam e vigiavam a obra* e, uma vez terminada esta, se lle-
vaban justamente a glória disso. Que a humanidade gema ante tão te-
rrible espetáculo* é muito natural; mas, qualquer que seja a humana
indignação* preciso é reconhecer as terríveis razões que obrigavam às
massas populares de Egito e de Asiria a suportar pacientemente um jugo
tão duramente imposto : na plebe daqueles países tinha uma in-
vencible necessidade étnica de suportar os caprichos de todos os sobe-
ranos, a condição* no entanto, de que aqueles soberanos conservassem
209
Mas é bem evidente que aquela pureza, pelo demais relativa, não
podia durar indefinidamente. As castas não estavam suficientemente orga-
nizadas. Assim, não cabe dúvida que se a civilização egípcia não tivesse tido
outra razão de existir que a da sozinha influência do tipo indiano ao qual devia
a vida, não tivesse tido a longevidade que cabe lhe atribuir, e muito
dantes de Ramsés III, que fecha a era de máximo esplendor, muito dantes
do século XIII dantes de J.-C., tivesse começado a decadência.
14
210
CONDE DE GOBINEAU
Sei que pronuncio agora palavras muito irreverentes que não deixarão de
indignar aos panegiristas da espécie negra, pois não se ignora que,
misturando-se em isso o espírito de partido, os aduladores dessa fração
da humanidade empenharam-se em atribuir-lhe títulos de glória e não têm
vacilado em apresentar a civilização abisinia como típica, surgida única-
mente do intelecto de seus favoritos e anterior a toda outra cultura. Daí,
levados de um nobre impulso que nada refrena, têm feito derramar esta
suposta civilização negra por todo o Egito, e a levaram também
para o Ásia. Na verdade, a psicologia, a linguística, a história, os monu-
mentos, o sentido comum, levantam-se unanimemente contra esta maneira
de representar o passado. Mas os inventores deste belo sistema não se
deixam desconcertar facilmente* Provistos de escassa ciência, dotados de
muita audacia, é verosímil que continuarão sua rota, sem cessar de propor
Axum para capital do mundo. Trata-se -de excentricidades de que não faço
menção senão para mostrar que não valem a pena de ser discutidas.
Antes de mais nada, o primeiro ponto: Ludolf refere muito habilmente os ra-
zonamientos de Scaliger a propósito do silêncio dos historiadores gregos
sobre a emigração Himiarita a Abisinia. Demonstra que esse silêncio não
teve por causa senão o esquecimento acumulado por uma longa série de séculos sobre
um fato demasiado frequente na história das idades pretéritas para
que os observadores de então pensassem em lhe dar importância. Na épo-
ca em que os gregos começaram a se ocupar da etnología das nações
que, segundo eles, se achavam ao extremo da Terra, esses acontecimentos
CONDE DE GOBINEAU
Sob as dinastías 18. a e 19. a (de 1575 a 1180 dantes de J.-C.), os Abisi-
nios estavam submetidos aos Faraones e pagavam tributo. Os monumentos
mostram-nos contribuindo aos intendentes reais as riquezas e ^curio-
sidades de seu país. Aqueles homens marcadamente negros cobriam seu
corpo com túnicas de muselina transparente, fornecidas pelas manu-
faturas da Índia ou das cidades da Arabia e de Egito. Aquele vê-
tido curto, que não chegava senão aos joelhos, se ajustava ao corpo por meio
de um cinto de couro lavrado, ricamente dourado e pintado. Uma pele de
leopardo sujeita aos ombros servia de manto ; sobre o peito pendiam os
colares, os brazaletes oprimiam as bonecas, nas orelhas balançavam-se
grandes pendentes de metal e a cabeça ia carregada de plumas de avestruz.
Ainda que aquela magnificencia bárbara não se ajustasse ao gosto egípcio
participava dele, e a imitação se manifestava em todas as partes ímpor-
2I 3
É preciso descer até uma época mais próxima para descobrir, com
mas refinamiento, a causa étnica das inovações à qual tenho feito já
alusão.
2x4
,rabes muçulmanos. . . j 1 * i
215
mota antiguidade, à qual sento pressa de voltar, não tinham sido senão o eco
do aperfeiçoamento egípcio, sustentado por uma lembrança de Asiría, trans-
mitido de mão em mãos até ela. Os fantásticos esplendores da corte
do Preste Juan, se alguém se empenha em que seja o Grande Negus, não têm
existido senão na imaginación dos viajantes românticos do passado século.
2l6
CONDE DE GOBINEAU
CAPÍTULO VI
Esse período tem um final. Tão cedo como o labor contribui realmente
seus primeiros frutos, e o homem começa a gozar daquela segurança
relativa para a qual lhe levam todos seus instintos, e um governo regular,
órgão do sentimento geral, está finalmente constituído, então em-
peça a história, e a nação conhece-se verdadeiramente a si mesma. É o
que se produziu, sob nossas miradas, em diversas ocasiões, em ambas
Américas, desde sua descoberta no século XV.
217
gestación em que nada está completo nem coordenado e não pode confiar um
conjunto de fatos lógicos à memória dos séculos.
' Assim, pois, não obstante considerar a escritura jeroglífica como um sólido
titulo da nação egípcia para figurar entre os povos civilizados, não
cabe desconhecer que a natureza desta concepção, levada inclusive a suas
últimos aperfeiçoamentos, não classifica a seus inventores acima de os
povos asinos. Isto não é tudo : no fato daquela ideia esterilizada,
hy ainda algo que observar. Se os povos negros de Egito não tivessem
sido governados, desde dantes dos tempos de Menés, por iniciadores
alvos, o primeiro passo da descoberta da escritura jeroglífica não
tivesse-se levado certamente a cabo. Mas, por outra parte, se a ineptitud
da espécie negra não tivesse, a sua vez, dominado a tendência natural
dos Arios a aperfeiçoá-lo tudo, a escritura jeroglífica e, depois de de ela, as
artes de Egito, não tivessem adolecido daquela inmovilidad que não é
lino dos carateres menos especiais da civilização do Nilo.
2l8
CONDE DE GOBINEAU
dirigido, ilustrado por ideias germinadas em seu solo e surgidas de sua raça,
suas artes puderam ser modificado em seus detalhes; não mudaram nunca em
o conjunto. Nenhuma poderosa inovação as transtorno. Mas rudas quiza
sob a 2. a e a 3. a dinastías, não conseguiram sob as 18. a e a 19. mas que a
suavización daquela rudeza, e sob a 29. a , que precedeu a am íses,
a decadência não se expressa senão pela perversión das formas, e não F
a introdução de princípios até então desconhecidos. O gomo local
envelheceu e não mudou. Elevado, rayando no sublime enquanto exerceu
a preponderancia o elemento branco, estacionário o tempo todo que aquele
elemento ilustre pôde ser mantido no terreno civilizador, decrecien
cada vez que o gênio negro conseguiu acidenta mente predominar, não se lhe-
vantó nunca mais. As vitórias da nefasta influência apoiavam-se demasiado
constantemente no fundo melanio sobre o qual descansava o editicio ( 1 ).
219
220
CONDE DE GOBINEAU
221
Com toda a reserva que devo observar neste debate, confesso que
nenhuma das maneiras como se tratou de provar as conquistas de os
Faraones em Ásia pareceu-me nunca satisfatória. Todas descansam
sobre alegações demasiado vãs; levam aos vencedores bem longe e
íes atribuem demasiados domínios para não acordar a desconfiança.
222
CONDE DE GOBINEAU
íucscu
o resto do mundo. . . ,
223
ASIRIOS
Elemento negro fundamental
EGÍPCIOS
CONDE DE GOBINEAU
224
CAPITULO Vil
POVOS NEGROS
de Egito e de Asiria. ,
225
»Há em seu povo outra que possa comparar? Seu magnificencia era
como torrente de fogo.
»Mais que a neve brilhava o fulgor de sua mirada... Seu peito velado era
como o coração da neve.
))Tal uma flor seca, nossa alma está empañada com sua morte; se
tem quebrantado com o gemido dos cantos fúnebres.
15
226
CONDE DE GOBINEAU
Por outra parte, como é muito duvidoso que a escultura tivesse prescindido
nunca por completo das cores, e que os artistas asirios ou egípcios se
tivessem avenido a apresentar às exigentes olhadas de suas materialistas
espectadores faz revestidas unicamente das cores da pedra, de o
mármol, do pórfido ou do basalto, e o separar ambas artes ou elevar a pintura
a um nível de igualdade com a escultura, é enganar sobre o espírito de
aquelas antiguidades. Em Nínive e em Tebas não cabe se figurar as estátuas
e os baixos relevos senão dourados e pintados com os mais ricos cores.
227
Nada mais glorioso para a civilização de Nínive que o ter ido tão
longe na rota que devia conduzir a Fidias. No entanto, não era este o
resultado a que tendia a arte asirio. O que perseguia era o esplendor, a
grandiosidad, o gigantesco, o sublime, e não o belo. Deténgome ante estas
esculturas de Korsabad, e que vejo nelas? Muito certamente o produto
de um cincel hábil e livre. O que há nelas de convencional é relativa-
mente escasso, se compara-se estas grandes obras com o que vemos em o
tempero-palácio de Kamak e nas muralhas do Memnonio. No entanto,
as atitudes são forçadas, os músculos salientes, seu exagero sistemático.
A ideia da força opresiva realça em todos aqueles membros fabulosa-
mente vigorosos, orgulhosamente tensos. No busto, nas pernas, em os
braços, o desejo que animava ao artista de pintar o movimento e a vida,
rebasa todas as medidas. Mas e a cabeça? A cabeça que diz? Que diz
a face, este campo da beleza, da concepção ideal, da elevação de o
pensamento, da divinización do espírito? A cabeça, a cara, aparecem
nulos, gelados. Nenhuma expressão em seus rasgos impasibles. Como os
combatentes do templo de Minerva, não dizem nada ; os corpos lutam,
mas as caras não sofrem nem triunfam. Débese a que ali não se preocupavam
do alma, senão unicamente do corpo. É a ação e não o pensamento o
que se perseguia; e a prova de que fué esta a única causa da morte
da arte^ asirio, é que, em todo o que não é intelectual, em todo o que se
dirige unicamente à sensação, a perfección fué plenamente conseguida.
Quando se examina os detalhes ornamentales de Korsabad, aquelas elegan-
tes grecas, aqueles tijolos esmaltados de flores e de deliciosos arabescos,
não demoramos em reconhecer que o gênio grego não teve mais que copiar, e
nada teve que acrescentar à perfección daquele gosto, nem também não à gra-
ciosa e correta frescura daquelas invenções*
228
CONDE DE GOBINEAU
grandes qualidades, não pôde evitar mil enormidades monstruosas que ince-
santemente acompanharam-no e que constituíram sua tumba. Tal é o caso
dos Kabiros e os Telquinos semitas ao fabricar, para a edificación de
Grécia, semicompatriota sua, aqueles ídolos mecânicos que moviam os bra-
zos e as pernas, imitados mais tarde por Dédalo, e que não demoro em menos-
apreciar o bom sentido de uma nação demasiado varonil para comprazer-se
em tais futilidades. Quanto aos povos afeminados de Cam e de
Sem, estou bem persuadido que não se cansaram nunca disso ; para eles
não podia ter nenhum absurdo na tendência a imitar, tão de perto como
fosse possível, o que a Natureza oferece de materialmente verdadeiro.
Já se pense no Baal de Malta com seu peluca e sua barba loiras, rojizas
ou douradas; já se recorde aquelas pedras informe, cobertas de vestidos
espléndidos e cumprimentadas com o nome de divinidades nos templos de
Síria, para passar depois à fealdad sistemática e repugnante das bonecas
hieráticas da Armaria de Turín, não há em todas essas aberraciones nada
que não responda às inclinações da raça camita e de sua aliada. Uma
e outra não procuravam senão o impressionante: o terrível, e, em defeito do
colosal, entregavam-se ao horrível, esfregando sua sensibilidade inclusive no
repugnante. Era um anexo natural do culto rendido aos animais*
Para o leitor, creio eu, o problema está já resolvido. Bom é, sem em-
bargo, examinar se em outros lugares e em outros tempos não se representou algo
análogo. A Índia aparte, e ainda a Índia de uma época posterior a sua verda-
dera civilização aria, não, não ofereceu nunca nada semelhante. Nunca a imagi-
nação humana sentiu-se, como ali, livre de todo travão, nem experimentou, com
uma sejam e uma fome tal da matéria, tão irreprimibles inclinações à
depravación ; o fato é. pois, sem discussão, peculiar de Asiría e de Egip-
to. Estabelecido isto, consideremos ainda, dantes de concluir, outro aspecto de
a questão.
229
riendas, a fim de obter algo que seduza mais que a realidade. Agora bem :
temos visto que, nas duas civilizações primitivas, o que organizou, dis-
ciplinó, contribuiu leis, governou com ajuda delas, em uma palavra, se conduziu
razoavelmente, foi o elemento branco, camita, ario e semita. Assim, pois, se
apresenta esta jrigurosa conclusão : que a origem de que têm partido as
artes é estranho aos instintos civilizadores. Esta origem jaz oculto na
sangue dos negros. Este poder universal da imaginación, que vemos
envolver e impregnar as civilizações primordiais, não tem outra causa que
a influência sempre crescente do princípio melanio.
CONDE DE GOBINEAU
230
tas ideias trascendentales do belo, que o são ainda mais desconhecidas, lhe
deixará tão frio como a exposição de um problema de álgebra» Assim mesmo,
traduzam-lhe uns versos da Odisea, e especialmente o encontro de Ulisses
com Nausicaa, o mais sublime da inspiração reflexiva : se cairá de sonho.
Em todos os seres, para que a simpatia estoire, é preciso que primeiramente
intervenha a inteligência, e isto é o difícil no negro, cujo espírito se
mostra obtuso assim que há que reflexionar, aprender, comparar, san-
ear consequências. A sensibilidade artística deste ser, em si extraordina-
riamente poderosa, permanecerá, pois, necessariamente, limitada aos mas
baixos menesteres. Se inflamará e se apasionará; mas por que? Por umas
imagens ridiculas e grosseiramente pintadas. Se estremecerá de adoración
ante um tronco de madeira repugnante, ^ mais turbada, pelo demas, mil
vezes mais emocionada, por aquele espetáculo degradante, que o foi n um '
ca o alma selecta de Pericles aos pés de Júpiter Olímpico. Debese
a que o negro pode elevar seu pensamento até a imagem ridicula, até
um repugnante pedaço de madeira, e que ante o verdadeiramente belo este
pensamento está surdo, mudo e cego de nascimento. Não cabe, pois, em isto
iniciação possível para ele. Assim, entre todas as artes prediletas da cria-
tura melania, a música ocupa o primeiro lugar, enquanto acaricia seu
ouvido com uma sucessão de sones e não pede nada à parte pensante
de seu cérebro. O negro ama com loucura a música, goza com ela em excesso ;
no entanto, cuán estranho permanece àqueles delicados convencionalis-
mos com os quais a imaginación européia tem aprendido a ennoblecer as
sensações ! .
231
Assim o negro possui até o mais alto grau a faculdade sensual sem a que
não há arte possível; e, por outra parte, a carência de aptidões intelectuais
fá-lo completamente inepto para a cultura da arte, inclusive para a apre-
ciación do que este nobre aplicativo da inteligência humana pode
produzir de elevado. Para sacar partido de suas faculdades, é necessário que
alie-se com uma raça diferentemente dotada. Nesse enlace, a espécie me-
lanía mostra-se como personalidade feminina, e ainda que suas diversas
ramos apareçam diferentemente misturadas, sempre, nessa aliança com o
elemento branco, está representado por este último o princípio macho. O
produto que disso resulta não reúne as qualidades inteiras de ambas
raças. Há ademais esta mesma dualidad que explica a fecundación ulterior.
Menos vehemente na sensualidad que as individualidades absolutas de o
princípio feminino, menos completo em força intelectual que as do prin-
cipio macho, goza de uma combinação de ambas forças que lhe permite
a criação artística, não outorgada nem a nenhum dos troncos associados.
Greve dizer que esse ser por mim inventado é abstrato, inteiramente ideal.
Não vemos senão raramente, e por efeito de múltiplas circunstâncias, enti-
dades nas quais aqueles princípios geradores se reproduzam e se em-
frenten com forças convenientemente ponderadas. Em todo caso, e sim é
lícito crer em tais combinações entre indivíduos isolados, não cabe soube-
nerlo entre as nações, e aqui não se trata senão destas. Os elementos
étnicos oscilam constantemente nas massas. É tão difícil descobrir os
momentos em que se encontram quase em equilíbrio ; são tão fugaces, tão
impossíveis de prever estes momentos, que é preferível não mentarlos e não
raciocinar senão sobre aqueles nos quais tal elemento, manifestamente
superior ao outro, preside algo mais permanentemente os destinos nacionais.
CONDE DE GOBINEAU
232
LIVRO TERCEIRO
CAPÍTULO PRIMEIRO
Mas estes primeiros passos, desviados da parte de história que tenho exa-
minado ao começo, me levarão para além das regiões indianas; porque
a civilização brahmánica, quase estranha ao Occidente do mundo, tem vivi-
ficado poderosamente a região oriental, e, encontrando ali raças que Asiria
V Egito não fizeram mais que entrever, entrou em íntimo contato com as
hordas amarelas* O estudo destas relações e de seus resultados é de
capital importância. Com sua ajuda veremos se poderá ser estabelecido soube-a-
rioridad da raça branca tanto respeito dos Mogoles com*ou respeito de
os Negros, em que medida a demonstra a História, e consequentemente
o estado respectivo das duas raças inferiores e de suas derivadas*
CONDE DE GOB1NEAU
236
idioma branco primitivo, um tipo físico que, devido a seu especial particu*
laridad, nunca os expôs a confundir entre as populações negras. Para
explicar este duplo fenômeno é necessário admitir que, a seu passo, se reti-
raban as raças aborígenes, dispersa ou destruídas pelas incursões de vão-
guarda, ou bem que estavam muito desparramadas pelos altos vales de o
Cachemira, primeiro país indiano invadido por os^ conquistadores. Pelo de-
mais, não pode ser negado que a primeira população destas comarcas perte-
neciese ao tipo negro (1). As tribos melanias que se encontram ainda em o
Kamaún são prova disso. Estão formadas por descendentes dos fugi-
tivos que, não tendo seguido a seus congéneres quando o grande reflujo
para os montes Vyndhia e o Dekkhan (2), se adentraron nas gargantas
alpestres, refúgio seguro, já que nelas conservam seu individualidad
desde tempo inmemorial.
2 37
CONDE DE GOBINEAU
238
não renegaram de seu nome nem em seus hábitos de pensar — o fato é indis"
cutible — , nem tão sequer em sua denominação nacional*
Poderia ser levado mais longe esta investigação, e se encontraria esta raiz
ar , ir ou er, conservada no vocablo alemão moderno Ehfe f que parece
provar que nos pensamentos da mais bela das raças humanas ocupou
sempre grande lugar um sentimento de orgulho fundado sobre o mérito
moral* # ,
239
240
CONDE DE GOBINEAU
mente igual que a dos Iranios dantes de Ciro, não mostra nos soberanos
senão uma autoridade das mais limitadas; como as epopeyas do Ramayana
e do Mahabharata só conhecem a realeza electiva, conferida pelos habi-
tantes das cidades, os brahmanes e ainda os reis aliados, tudo induze
a inferir que o poder que tão em absoluto emanaba da vontade ge-
neral, não devia de ser senão uma delegação bastante débil, quiza inclusive pré-
caria, completamente de acordo com a organização germánica anterior à
espécie de reforma que entre nós fez Khlodowig. _
Os Ânus guerreaban, pois, entre si (1), e como não eram nómadas (2),
como permaneciam o maior tempo possível na pátria por eles adotada,
e em todas partes sua valorosa audacia tinha acabamento presto com a resistência
dos indígenas, suas expedições mais frequentes, suas campanhas mais longas,
seus desastres mais completos, bem como seus triunfos mais espléndidos, não
tiveram por atores senão a eles mesmos. A virtude era, pois, o heroísmo
do combatente, e, ante toda outra consideração,, a bondade eradla bravura,
noção que descobrimos, muito tempo depois, nas poesias italianas
onde o buon Rmaldo é também ü grande virtuoso de Ariosto. As mas
brilhantes recompensa eram para os campeões, mais esforçados. Lhos
chamava sura, os celestes (3), porque, se sucumbiam na, batalha, iam a
morar no Svarga, magnífico palácio no que os recebia Indra, o rei
de ios deuses; e esta honra era tão grande, tão superior a quanto pod,ía
reservar a outra vida, que nem mediante ricos sacrifícios, nem pela extensão
e profundidade do saber, nem graças a nenhum recurso humano, podia ninguém
ocupar no Céu o mesmo lugar que os suras. Todo mérito se eclipsaba
ante o da morte recebida em combate. Mas a prerrogativa de os
intrépidos guerreiros não acabava sequer neste ponto supremo. Não só
podiam ir morar, hóspedes venerados, na mansão etérea de os
deuses: estavam em condições de destronar aos mesmos deuses, e, em
o seio de seu omnipotencia, Indra, ameaçado sem cessar de ver-se arrebatar
o cetro por um mortal indomable, tremia continuamente (4).
Poderia ser achar# que o coração do homem branco juntava a este exage-
rado sentimento de sua dignidade certa inclinação à impiedad. Seria
um erro; porque precisamente o coração do alvo é religioso por ex-
celencia (1). As ideias teológicas preocupam-lhe em alto grau. Já se viu
com que cuidado conservava as antigas lembranças cosmogónicos, cujos frag-
mentos mais numerosos possuía-os a tribo semita dos Hebreus abrahá-
meça, metade por seu próprio fundo, metade por transmissão camitica. A na-
ción aria, por sua vez, prestava sua adesão a algumas das verdades de o
Génesis. Pelo demais, o que procurava principalmente na religião era
as ideias metafísicas, as prescrições morais. O culto em si mesmo era
dos mais singelos.
CONDE DE GOBINEAU
242
Duvido que tal acontecimento seja resultado das causas que decidiram
a emigração primitiva das populações brancas. O contragolpe estava
já esgotado, porque se os invasores amarelos tivessem perseguido a os
243
Esta re &rán, objeto de tantas lembranças, fué assim testemunha do novo dê-
doblamiento da família aria, e as clarezas já mais vivas da História
permitem discernir bastante bem as circunstâncias do debate que a ori-
ginó. Vou referir a mais antiga das guerras de religião.
.244
CONDE DE GOBINEAU
Mas, seja que no período que decorre entre a partida dos Gregos
e a ocupação do Pendjab, a família aria, tendo-se encontrado em longo
contato com as nações aborígenes, tivesse perdido já sua pureza e com-
plicado seu esencia física e moral com a agregação de um sentir e de uma
sangue estranhos; seja que as modificações sobrevindas não fossem mais
que o desenvolvimento natural do gênio progressivo dos Arios, o caso é que
as antigas noções sobre a natureza do pontificado modificaram-se
insensivelmente, e chegou um momento em que os guerreiros nc se creram
com direito nem faculdades para desempenhar as funções sacerdotales ; em-
tonces instituiu-se aos sacerdotes.
245
Vivia isolado cerca dos chefes bastante ricos ou generosos para sustentar seu
vida singela e pacifica. Não levava armas; não era de raça inimiga* Saído
da mesma família do vis-pati ou de sua tribo, era o filho, o irmão,
o primo dos guerreiros (1). Comunicava sua ciência a discípulos que po-
dían abandonar a seu desejo e empuñar de novo o arco e as setas.
De uma maneira insensible e por vias desconhecidas ainda para aqueles que
as seguiam, o brahmanismo jogava asi os fundamentos de uma autoridade
que ia ser exorbitante.
CONDE DE GOBINEAU
246
Eles aceitaram o eminente papel que lhes atribuía^ Não obstante, não
creio nem no predominio de cálculos egoístas na política de uma classe
inteira, nem nos grandes resultados produzidos por pequenas causas. Quando
no seio das sociedades produz-se uma revolução durable, é^que as
paixões dos triunfadores contam, para quicar, com um solo mas firme
que o dos interesses pessoais, sem o qual andam a ras de terra e não se
elevam a nenhum lugar. O fato do qual o sacerdocio ario fez brotar seu
destino, longe de ser miserável ou ridículo devia, pelo contrário, granjearle
as simpatias íntimas do gênio da raça, e a observação que disto
fizeram os sacerdotes daquela época antiga revela em eles^ uma rara
aptidão para a ciência de governar, ao próprio, tempo que um espírito subtil,
sábio, combinador e lógico até a violência. „
247
perigo, com as gentes demasiado pobres para viver livres, compuseram
uma amalgama sobre a qual passaram o rasero de uma inferioridad idêntica
e decidiram que esta classe humilde ganhasse sua subsistência desempenhando
aquelas funções penosas e ainda humillantes que são, no entanto, nece-
sarias nas sociedades estabelecidas*
A esta classe, a esta vama, a esta cor branca por excelência, atribuí-lhe
yeron, não já o direito de governar, resultado definitivo que só podia
ser obra do tempo, senão,^ pelo menos, o princípio deste direito e tudo
quanto podia conduzir a ele ; isto é, o monopólio das funções sacerdo-
tais, a consagración real que já possuíam, a propriedade dos cantos reli-
giosos, o poder de compo-los, interpretá-los’ e comunicar a ciência em
eles contida; finalmente declararam-se a si mesmos pessoas sagradas,
inviolables; negaram-se aos cargos militares, tentaram-se o lazer nece-
sario e dedicaram-se à meditación, ao estudo, a todas as ciências de o
espírito, o qual não excluía nem a aptidão nem a ciência políticas (3)*
248
Não ocorria assim com a vama que vinha após a casta guerreira, isto
é, com a dos vaisías, reputados menos brancos que as duas categorias
sociais superiores e que, provavelmente também, eram menos ricos e in-
fluyentes na sociedade. Com tudo, sendo ainda evidente e indiscutible
seu parentesco com as duas altas castas, o novo sistema considerou-os como
249
homens selectos, homens nascidos duas vezes ( dvidja :), expressão consagrada
para representar a existência da raça em frente às populações aboríge-
nes (1), e formo-se com ela ao povo, ao grosso da nação propriamente
dita, acima da qual estavam os sacerdotes e os soldados, e foi
por esta razão que o nome de Arios, abandonado pelos chatrías e
também pelos purohitas, mais orgulhosos, os uns, de seu título de fortes
os outros do qualificativo novamente tomado de brahmanes , foi compartilhado
pela terça casta.
Com estas três altas castas, a sociedade indiana, segundo seu ideal, estava
completa. Fora de seu círculo não há arios, não há homens duas vezes
nascidos. No entanto, tinha que ter em conta à população indígena,
que, submetida desde fazia mais ou menos tempo e talvez algo emparentada
com o sangue dos vencedores, vivia obscuramente no inferior da
escala social. Não podia ser recusado absolutamente àqueles homens ape-
gados a seus vencedores e que só recebiam destes seu sustento, sem lançar-
se, com barbara imprudencia, a perigos inúteis. Por outra parte, segundo o
ocorrido depois, é muito provável que os brahmanes tivessem visto já cuán
contrano séria a seus verdadeiros interesses romper com aquelas multidões
negras que, conquanto não lhes rendiam as homenagens delicadas e raciocinados de
as outras castas, pelo menos rodeavam-lhes de uma admiração mais cega e
serviam-nos com um fanatismo mais abnegado. O espírito negro mostrava-se
ali por inteiro. O brahmán, sacerdote para os chatrías e os vaisías, era
deus para a multidão negra. Não se inimiza um de bom grau com amigos
tão calurosos, sobretudo quando para os conservar não é necessário fazer
grandes esforços.
CONDE DE GOBINEAU
250
251
252
CONDE DE GOBINEAU
sim mesmas, a admiração para seus legisladores deve ser sem reserva. Frente
às castas normais e às populações descastadas que as rodeiam, apare"
cen verdadeiramente sublimes. Mais tarde resultará demasiado fácil recono-
cer como têm degenerado os brahmanes, através do tempo e da perver^
sión inevitável dos tipos, que se acusam cada vez mais apesar de todos
os esforços; mas nem os viajantes, nem os administradores ingleses, ny os
eruditos que consagraram suas vigílias ao estudo da grande península a s? at j c ,
a
têm titubeado nunca em reconhecer que, no seio da sociedade indiana,
a casta dos brahmanes conserva uma imperturbable superioridad sobre
todo o que vive ao arredor seu. Hoje, mancillada pelos enlaces que
tanto horripilaban a seus primeiros pais, mostra, não obstante, em meio
de seu povo, um grau ae pureza física sem igual. Só nela se encontra
ainda o gosto pelo estudo, a veneração dos monumentos escritos, a
ciência da língua sagrada; e o mérito de seus membros, como teólogos
e gramáticos, é bastante notável para que os Colebrooke, os Wilson e
outros indianistas, justamente admirados, tenham devido felicitar-se de ter
recorrido a suas luzes. Até o mesmo Governo britânico confiou-lhes
parte do ensino no colégio de Fort-William. Este reflexo da anti-
gua glória está, sem dúvida, muito empañado. Não é mas que um eco, e este
eco vai debilitando-se cada vez mais, à medida que aumenta desorganiza-a"
ción social na Índia. No entanto, o sistema hierárquico inventado por
os antigos purohitas tem permanecido totalmente em pé. Pode-lhe
estudar por inteiro em todas suas partes ; e para render-lhe, sem regateos, tudo
a honra que se merece, basta calcular de modo aproximado o tempo que
leva de existência.
Não obstante ser muito incertas estas datas, se pretende-se procurar outras
mais recentes, não se encontram, e à medida que avança, ao resultar mais
intensa, a clareza histórica não permite duvidar que nos afastamos do ob-
jeto procurado. Assim, após uma lagoa, certamente bastante longa, em o
século XIV a. de J."C. t encontra-se ao brahmanismo perfeitamente assentado
e organizado, fixadas já as escrituras litúrgicas e estabelecido o calendário
védico; é, pois, impossível descer mais.
253
para a questão de que aqui se trata, tenho bastante. Não consideremos se-
queira que o brahmanismo existia já visivelmente muito tempo dantes de
aquela época e concluamos que desde o ano 2448 a. de J.-C. ao da
era cristã de 1852 têm decorrido 4300 anos, que a organização brah-
mamca vive sempre, que hoje se encontra em um estado comparável à
situação dos egípcios sob os Tolomeos do século III dantes de nossa
era e à da primeira civilização asiría em diferentes épocas, entre outras
no século VIL Asi, mostrando-se generosos com a civilização egípcia, com-
cedendo-lhe, o que não faço com a dos brahmanes, todo o período ante-
rior à migração e todo o de seus começos dantes de Menés, terá durado
desde o ânus 2448 até o 300 a. de J.-C„ isto é, 2.148 anos. Quanto a
a civilização asina, fazendo retroceder seu ponto de partida quanto se
queira, como não lhe pode fazer anterior em muitos séculos à era ca-
chemirana, segue-se que também não há que falar dela : fica demasiado
longe da meta*
254
CONDE DE GOBINEAU
CAPITULO II
Desenvolvimientos do brahmanismo
256
CONDE DE GOBINEAU
livro de Lucrecio. , - . . j
Notarei aqui, de passagem, que, segundo toda probabilidade, foi pouco dê-
pués desta separação quando começou a se formar o dialeto pracrito e
a língua aria propriamente dita, se alguma vez existiu em uma forma
mais concreta que um faça de dialetos, acabo por desaparecer. O sánscrito
dominou ainda longo tempo no estado de idioma falado e preexcelente,
o qual não impediu que as derivações se multiplicassem e que, à longa,
tendessem a confinar a língua santa no mutismo elocuente dos livros.
2 57
Como lhes recebeu muito mau (não esperavam sem dúvida outra acolhida), se
entabló uma guerra que teve por teatro todo o Norte, o Sur e o Leste de
a península até Videha e Visala, e por atores a todas as populações,
o mesmo arias que aborígenes (1). A contenda foi tanto mais longa quanto
que os invasores tinham aliados naturais em muitas das nações arias
do Himalaya, hostis ao regime brahmánico. Encontraram-nos também
em muitos povos mestizos, mais interessados ainda no recusar, e, se
era possível, em abatê-lo: conquistadores e bandidos, os bandidos de tudo
cor, convertiam-se em amigos seus (2).
CONDE DE GOBINEAU
258
Em fim, em terceiro lugar, e ainda por embaixo destes dasyus tão detestados,
vinham as nações aborígenes. Não pode ser concebido gente mais selvagem» e,
desgraçadamente, seu número era exorbitante. Os brahmanes davam-lhes
em general o nome de mlekkhas f selvagens ou bárbaras (2). Este último
nome está incorporado em todas as línguas da espécie branca, e tes-
tifica a superioridad que esta família se adjudica sobre o resto da espécie
humana.
259
mas citados por Lassen, foram devorados pelos antropófagos. Mas por
cada eremita degolado iam dez, que se disputavam o santuário desde
então santificado, e as veneráveis colônias, estendendo mais e mais
suas ramificações, conquistavam irresistivelmente o território. Seus funda-
2Ou0
CONDE DE GOBJNEAU
26l
2Ou2
CONDE DE GOBINEAU
brahmán (i). . . , ,
263
264
265
Essa derrota não fué, pelo demais, senão um episódio da guerra, e teve
mais de um encontro em que os brahmanes não levaram a vantagem. Tudo
indica também que seus adversários, quase tão Arios como eles, não se mos-
traron desprovistos de habilidade, e que não tiveram na força de suas
espadas uma confiança tão absoluta que não tivessem julgado necessário
apelar ainda a armas menos materiais. Os chatrías situaram-se muito
mañosamente no seio mesmo dos recursos do inimigo, na ciuda-
dela teológica, seja a fim de quebrantar a influência dos brahmanes sobre
os vaisías, os sudras e os indígenas, seja para tranquilizar sua própria com-
ciência e tirar a sua empresa um caráter de impiedad que não tivesse
demorado em fazê-la odiosa ao espírito profundamente religioso da nação.
266
CONDE DE GOBINEAU
267
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CONDE DE GOBINEAU
Este golpe, sem dúvida bem concebido e longo tempo meditado, pois por
os desenvolvimientos a que esteve sujeito revela a duração e o encarni-
zamiento de uma luta obstinada, ameaçava ao poder dos brahmanes e,
com este, à sociedade indiana, com uma ruína definitiva. De um lado, estaria
Vichnú com seus chatrías livres e armados; de outro, Brahma, igualado por
um novo deus, com seus pacíficos sacerdotes e as classes impotentes de os
vaisías e dos sudras. Os aborígenes tinham sido intimados a escolher entre
ambos sistemas, o primeiro dos quais lhes ofereceu, junto com uma religião
tão completa como a antiga, uma libertação aboluta da tiranía das
castas e a perspectiva, para o último dos cidadãos, de elevar-se a tudo,
durante o curso mesmo da vida atual, sem ter que aguardar um segundo**
do nascimento. O outro regime np tinha nada novo que dizer; situação
sempre desfavorável quando se trata de atrair às massas; e, do mesmo
modo que não podia acusar de impiedad a seus rivais, já que reconheciam
o mesmo templo que ele, salvo um deus superior diferente, também não podia
erigirse, como o fizesse até então, em defensor dos direitos de os
débis, em liberal, como se diria em nossos dias; já que o liberalismo
estava evidentemente do lado daqueles que o prometiam tudo aos mais
humildes, e aspiravam inclusive, se chegava o caso, a conceder-lhes a faixa
supremo. Agora bem, se os brahmanes se enajenaban a fidelidade de sua
mundo negro, que soldados poderiam opor à ameaça das espadas
reais, eles que não podiam expor sua vida?
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CONDE DE GOBINEAU
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271
Um brahmán exercia a profissão que digo, e, seja que ganhasse pouco, seja
que gastasse demasiado, andava escasso de dinheiro. Sua mulher aconselhou-lhe que
ruese à porta do palácio do rajah e, que assim que lhe visse sair de o
palácio, avançasse determinadamente em sua direção e lhe recitase algo que pu-
desse ser-lhe agradável. r
CAPÍTULO III
O budismo ; sua derrota ; a Índia atual
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274
CONDE DE GOBINEAU
de uma imaginación tanto mais fecunda quanto que se nutria das classes
negras; todo o que o pensamento humano, ébrio de refinamientos e com-
pletamente extraviado pelo abuso da reflexão pôde imaginar de^ extra-
vagante em matéria de formas, veio a entronizarse naqueles espléndidos
refúgios. Por pouco que os brahmanes quisessem salvar sua sociedade, deviam
pôr mãos à obra. Entablóse a luta, e se compara-se o tempo de o
combate com o da paciência, o um foi tão longo como o outro. A guerra
começada no século V terminou-se no XIV.
275
que envia ao céu o espírito piedoso conteúdo sob suas letras, regocijando
com ele às inteligências supremas* A que grau de envilecimiento se some
cedo uma teoria racionalista que se aventura fora das escolas e sai a
tomar a direção dos povos! O budismo mostra-o plenamente, e
cabe dizer que as multidões imensas cujas consciências dirige pertencem
às classes mais viles da Chinesa e dos países circunvecinos. Tal fué seu
fim, tal é sua sorte atual.
Que deve ser admirado mais aqui? A tenacidad com que se conservou o
brahmanismo, durante aquele enorme lapso de tempo, perfeitamente igual
a si mesmo em seus dogmas essenciais e no que a mais vital oferece seu
sistema político, sem transigir jamais sobre ambos terrenos? É, pelo com-
trario, sua condescendência a render homenagem à parte honorífica das
ideias de seu adversário e a desinteresar o amor próprio no momento sü^
premo da derrota? Não saberia o decidir. O brahmanismo demonstrou, du-
rante essa longa luta, aquela dupla habilidade, antanho justamente alabada
entre a aristocracia inglesa, de saber manter o passado acomodando-se a
as exigências do presente. Em uma palavra, esteve animado de um ver-
dadero espírito de governo, e obteve recompensa-a com a salvação da
sociedade por ele criada.
CONDE DE GOBINEAU
276
parte de suas virtudes especiais* Não se segue de aqui, é verdadeiro, que a longa
resistência dos budistas tenha carecido de resultados: longe disso. Não
duvido que a volta ao seio brahmánico de numerosas tribos da casta
sacerdotal e de chatrías mediamente fiéis, durante tantos séculos, a
as prescrições étnicas, não tenha desenvolvido consideravelmente os gér-
menes importunos que existiam já. Não obstante, a natureza aria era
bastante forte, e o é ainda hoje, para manter em pé sua organização em
meio das provas mais terríveis por que jamais tenha atravessado um
povo.
Desde o ano 1001 de nossa era, a Índia cessou de ser aquele país fechado
às nações ocidentais, e do que o maior dos conquistadores,
o próprio Alejandro, não pôde senão suspeitar as maravilhas encerradas entre
os povos impuros, entre as nações vratías do Oeste que tinha combatido.
O filho de Filipo não penetrou no território sagrado. Um príncipe muçulmano
de raça mestiza, bem mais branca que o que resultou o cruze do qual
procedem atualmente os brahmanes e os chatrías, Mahmud o Gnaznevida,
à frente de exércitos que inflamaba o fanatismo muçulmano, passou a sangue e
fogo a península, destruiu os templos, perseguiu aos sacerdotes, aniquilou
aos guerreiros, acabou com os livros e começou, em grande escala, uma persecu-
ción que não tem cessado nunca desde então. Se a toda civilização lhe é
difícil manter-se em pé contra os assaltos interiones que as paixões hu-
mana desencadeiam constantemente contra ela, que ocorrerá pois quando
não só se vê atacada, senão dominada por estrangeiros que nada lhe perdoam e
que só perseguem sua perdição? Existe, na História, um exemplo de
longa e afortunada resistência contra essa terrível conspiração? Não conheço
senão um, e é na Índia onde o encontro. A partir do rudo sultán de
Ghizni, pode ser afirmado que a sociedade brahmánica não gozou um mo-
mento de tranquilidade e, no meio desses ataques constantes, conservou a
força para expulsar ao budismo. Após os Persas de Mahmud vinie-
rum os Turcos, os Mogoles, os Afegãos, os Tártaros, os Árabes, os
Abisinios, depois de novo os Persas de Nadir-Scha, os Portugueses, os
Ingleses, os Franceses. Ao Norte, ao Oeste, ao Sur, abriram-se rotas de inva-
siones incessantes, vieram a ocupar as províncias multidões abigarradas
de populações estrangeiras. Obrigadas pela força do sable, nações em-
teras fizeram defección à religião nacional. Os Cachemiranos se com-
virtieron em muçulmanos; e também os Sicrdis e ainda outros grupos do Ma-
labar e da costa de Coromandel. Por todos os lados os apóstoles de Mahoma,
favorecidos pelos príncipes da conquista, prodigaron, e não sem sucesso,
temíveis predicaciones. O brahmanismo não renunciou um sozinho momento a o
combate, e sabido é, ao invés, que no Leste e nas montanhas de o
Norte, especialmente após a conquista do Nepal pelos Gorjas em
no século XV, prosseguiu ainda seu proselitismo, e saiu triunfante (1). A
infusión de sangue semiaria, no Pendjab, produziu a religião igualitaria
de Nanek. O brahmanismo se desquitó desta perda fazendo a cada
vez mais imperfecta a fé muçulmana que com ele convive.
277
ninguém que, tendo vivido na Índia, se incline a achar que esse país
possa experimentar nunca uma transformação e se voltar civilizado à
maneira nossa. Diversos observadores que têm tido ocasião de penetrar
em seus costumes e de conhecê-lo melhor que ninguém declaram que, em seu
opinião, esse momento não chegará nunca.
No entanto, o brahmanismo acha-se em completa decadência? seus
grandes homens têm desaparecido; as absurdas ou crueis superstições,
as necedades teológicas da parte negra de seu culto, têm tomado uma
preponderancia alarmante sobre o que sua filosofia antiga apresentava de
tão elevado, de tão nobremente arduo. O tipo negro e o princípio amarelo
abriram-se passo em suas populações selectas, e, em muitos pontos, é difí-
cil, quase impossível, distinguir os brahmanes de determinados indivíduos
pertencentes às castas baixas. Em todo caso, nunca a natureza perver-
tida desta raça degenerada poderá prevalecer contra a força superior de
as nações brancas vindas do Occidente de Europa.
CONDE DE GOBINEAU
278
Birmanos. t -ir
279
Fica o Sur da Índia, a parte que se estende para Calcutá, ao
longo do Ganges, as vastas províncias do Centro e o Dekján. Nestas
regiões, as tribos de selvagens negros são numerosas; os bosques imensos,
impenetráveis, e o uso dos dialetos derivados do sánscrito cessa quase
completamente* Um amasijo de línguas, mais ou menos ennoblecidas por ele-
mentos tomados do idioma sagrado, o tamul, o malabar e outras cem se
repartem as populações* Um abigarramiento infinito nas carnaciones
assombra em seguida ao europeu, que não descobre no aspecto físico de os
homens nenhuma impressão de unidade, nem sequer nas castas superiores*
Estas regiões são aquelas em que a mistura com os aborígenes é mais
íntima. São também as menos recomendáveis sob todos os aspectos*
Multidões apáticas, sem energia, sem coragem, mais supersticiosas que em parte
alguma, parecem morridas, e só é lhes fazer estrita justiça o as declarar
incapazes de bater um sozinho instante por um desejo de independência* Sempre
têm estado sumisas e sujeitas, e o brahmanismo não recebeu delas nenhum
socorro, porque a proporção de sangue dos negros, difundida no seio
desta massa, ultrapassa em excesso o que se vê no Norte, desde onde
as tribos arias nunca levaram até ali, já por terra, já por mar, sina
colônias insuficientes.
280
CONDE DE GOBINEAU
consequência. Só o brahmanismo possui o segredo de contrariar o progresso
de tal açoite.
Mas, desde que, fará uns vinte anos, a filología, a filosofia, a esta"
dística, começaram o inventário da sociedade e da natureza indianas,
sem esperança quase de completá-lo em muitíssimo tempo — ■ tão rica e abum
dante é a matéria — , tem sucedido o contrário do que revela a experien"
cia comum : quanto menos conhecida é uma coisa tanto mais admira-a ; aqui,
à medida que conhece-se e aprofunda, admira-a mais. Habituados à
existência limitada de nossas civilizações, repetíamos, imperturbable"
mente, as palavras do Salterio sobre a fragilidade das coisas humanas,
e quando se descorrió a cortina imensa que ocultava a atividade da
existência asiática, e a Índia e a Chinesa apareceram claramente a nossas
miradas, com suas constituições inquebrantáveis, não temos sabido como
tomar esta descoberta, tão humillante para nossa sabedoria e nosso
poderío.
Mas» acabo de dizê-lo: não tem sido a Índia o único país onde se tem
realizado o fenômeno que admiro; há que citar também a Chinesa. Inves-
tiguemos se as mesmas causas têm originado ali os mesmos efeitos. Leste
estudo enlaça-se tanto melhor com o que aqui termina» quanto que entre
o Celeste Império e os países indianos estendem-se vastas regiões» como o
Tibet, onde as instituições mistas têm o caráter das duas sociedades
das quais emanan. Mas» dantes de informar-nos de se esta dualidad é
verdadeiramente o resultado de um duplo princípio étnico» é absolutamente
necessário conhecer a origem da cultura social em Chinesa e damos conta
da faixa que este país tem direito a ocupar entre as nações civili-
zadas do mundo.
CAPÍTULO IV
A RAÇA AMARELA
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CONDE DE GOBINEAU
285
A raça branca era, pois, também muito prolífica, e como as duas espécies
negra e finesa não lhe permitiam traspassar o Muztagh e o Altai pelo Leste
m * ou 1 P° r i e 0este ’ estreitada entre estes limites, estendia-se, por o
Norte, para o curso médio do Amur, do lago Baikal e do Obi.
Tenho terminado o que tinha que expor a respeito dos povos que figu-
ran na história do Ásia Central, e resulta agora oportuno passar ao estudo
de sua civilização. O grau mais alto dela se encontra em Chinesa, que é
286
CONDE DE GOBINEAU
ao mesmo tempo o ponto de partida de sua cultura e sua expressão mais original.
Ali,
pois, é onde há que a estudar.
CAPÍTULO V
Os Chineses
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CONDE DE GOBINEAU
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não temos podido perceber ainda uma aurora privada das clarezas da
inteligência*
289
Hoje mesmo, nos altos vales que bordean o grande Tibet do lado de
Bután, encontra-se, o mesmo que nas nevadas cumes das regiões
situadas mas ao Oeste, tribos muito débis, muito espalhadas, em sua maioria
estranhamente misturadas^ e que, no entanto, revelam uma descendencia
ana* Perdidas, como estão, no meio dos restos negros e amarelos de
toda procedência, as pode comparar com esses trozos de cuarzo que,
arrastados pelas águas, contêm ouro e vêm de bem longe. Pode que
as^ tempestades étnicas, as catástrofes das raças, tivessem-na levado
alia onde sua espécie mesma não tinha aparecido nunca. Não argumentarei,
pois, baseando-me nestes detritos alterados, e limitóme a dar conta de
sua existência.
Mas, bem mais para o Norte, em uma época bastante recente, para
no ano 177 a. de J.-C., vemos numerosas nações brancas de cabelos loiros
ou vermelhos, de olhos azuis, acantonadas nas fronteiras ocidentais de Chinesa.
Os escritores do Celeste Império a quem deve-se o conhecimento deste
fato, nomeiam a cinco dessas nações. Observemos, desde depois, a
posição geográfica que ocupavam na época em que nos dão a conhecer.
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CONDE DE GOBINEAU
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Onde a ideia se altera tão cedo como o sangue aria se mistura com
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Com tudo, como a sua vez temia, não sem motivo, a aliança dos descon-
tentos com as hordas da fronteira, reuniu tropas, destacou-as em posicio-
nes convenientes, e ordenou que em caso de alarme se acendessem fogueiras
e tocasse-se o tambor, a cujo sinal tinham de ir todos os generais com
seus soldados, para fazer frente ao inimigo.
295
quando o conseguia, e nada podia lhe ser mais grato. Um dia, cundió por todas
partes um pânico repentino, os guardiães acharam que os caballeros tár-
taros tinham cruzado a fronteira e avançavam? colaram imediatamente
fogo às lenhas preparadas ao efeito, e dejóse ouvir um redoblar de tambo-
rês. A este ruído* príncipes e gerais, reunindo a suas tropas, compare-
cieron? só se via a gente armada, correndo de aqui para lá e pregun-
tando onde estava o inimigo, que ninguém via, já que não existia e
todo era um falso alarme.
Basta este relato para mostrar até que ponto, de fato, a autoridade
absoluta dos imperadores estava limitada pela opinião pública e por
os costumes? por isso se viu sempre em Chinesa não aparecer a tiranía
senão como um acidente constantemente detestado, reprimido, e que difí-
cilmente perpetua-se, já que o temperamento da raça não se presta a
isso. O imperador é, sem dúvida, o chefe dos Estados do Centro, isto é,
por uma ficção mais audaz, do mundo inteiro, e aquele que se nega a
obedecer-lhe é, por este fato, reputado bárbaro e à margem de toda civilri
zación. Mas, enquanto a Chancelaria chinesa desfaz-se em fórmulas de
respeito quando se dirige ao Filho do Céu, o uso não permite a este expre-
sarse, por sua própria conta, de uma maneira tão pomposa. Sua linguagem afec-
ta uma modéstia extrema: o príncipe representa-se como indigno, por seu
escasso mérito e seu mediocre virtude, das sublimes funções que sua au-
gosto pai confiasse a sua insuficiência. Conserva toda a fraseología ama-
ble e afectuosa da linguagem doméstica, e não perde ocasião para fazer
constar que se interessa ardentemente pelo bem de seus caros filhos: são
seus súbditos (2).
296
CONDE DE GOBINEAU
não eram senão objetos muito secundários e mal esboçados, em Chinesa cons-
tituyeron o grande problema de governo* e deixou-se realmente em último
plano as duas questões que em outras partes se sobreponían àquelas : a
guerra e as relações diplomáticas.
diversos* acho que pode ser admitido que* neste aspecto, o Celeste Impe-
rio obteve resultados bem mais perfeitos e sobretudo mais contínuos
que o que se vê nos países da Europa moderna* desde que os Gobier-
têm-se consagrado particularmente a este ramo da política. Em tudo
caso, o Império romano não pode comparar a este respeito*
298
CONDE DE GOBINEAU
Dentro da literatura propriamente dita, a rima e todas as distraccio-
nes inventivamente pueriles a ela parecidas gozam de grande estima. Elegia
algo deforme, descrições da natureza mais minuciosas que pintores-
cas, ainda que não isentas de graça, tenho aqui o melhor. O realmente bom é
a novela. Estes povos sem imaginación possuem muito espírito de obser-
vación e de fineza, e tal ou qual produção em que destacam ambas cualida-
dê recorda entre eles, quiçá as superando, as obras inglesas destinadas a
pintar a vida do grande mundo. O drama resulta mau concebido e bastam-
te vulgar. A oda ao estilo de Píndaro não tem cessado de passar pelo filtro
do espírito dessa nação sem nervo. Quando o espírito chinês joga os
bofes para estimular seu verbo, lança-se de cheio para as nuvens, faz in-
tervenir aos dragões de toda classe de cores, perde o fôlego, e não dá
senão na ridiculez. 4
CONDE DE GOBINEAU
casos, e assim deve ser reconhecido em loor da lógica, que os chefes daquelas
Escolas não têm recusado em modo algum a condição primordial e in-
dispensable do sucesso de suas ideias, que é o despotismo. Têm admitido de
bom grau, como os políticos do Celeste Império, que não se força às
nações a seguir uma regra precisa e exata, se a Lei não anda armada em
todo tempo com uma faculdade completa e espontánea de repressão. Para
entronizar seu regime, não se negariam a tiranizar. O triunfo se conseguiria
com essa condição, e uma vez estabelecida a doutrina, todos os homens
teriam assegurados o alimento, a moradia e a instrução prática. Não
teria já necessidade de ocupar das questões propostas sobre a
circulação do capital, a organização do crédito, o direito ao trabalho e
outros detalhes.
Í )or em cima da plebe* Tudo isto se opõe, ao que parece, às ideias sobre
as cuales fundam-se os partidários dos falansterios e seus émulos.
301
que estou bem longe de aplaudir, tem o reverso de seus defeitos. Não somos
gentes capazes de pôr em prática quanto imaginamos. A nossas loucas
fantasías sucedem-se sempre outras, que nos levam a esquecer as anteriores.
Os Chineses se considerarão ainda como os primeiros administradores deí
mundo, quando, abandonados já todas as tentativas dos imitar, teremos
passado a alguma nova fase de nossas histórias, ai! tão abigarradas.
CONDE DE GOBINEAU
302
Outro ponto ainda. Temos visto à raça malaya receber em^ o Yunán
as primeiras lições dos arios ao aliar-se com eles; depois, com as
conquistas e agregações de toda classe, a família amarela se aumentou
rapidamente e acabou por neutralizar, no maior número de províncias
do Império, aos mestizos negros, pois ao dividir a virtude ae é-a-
pecie branca não a transformava. Disso se derivou durante algum tempo
uma falta de equilíbrio manifestada pelo aparecimento de alguns costumes
completamente bárbaras.
303
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CONDE DE GOBINEAU
305
a ter por exato seu cálculo vendo a crônica apatía daquelas pobres
gentes, que do querem se turbe a tranquila fermentación digestiva, única
preocupação sua neste mundo. Suponhamos, pois, tentada e termi-
nada a conquista., Em que posição se tivessem encontrado esses trinta
mil homens? Segundo Lord Clive, seu papel tivesse devido limitar-se a estar
de guarnición nas cidades. Como o sucesso se tivesse perseguido com
uma única finalidade de exploração, as tropas teriam ocupado os prin-
cipales, portos, quiçá tivessem levado a cabo expedições pelo interior
do país para manter a sumisión, assegurar a livre circulação das
mercadorias e a cobranza dos impostos, e nada mais.
Semelhante estado de coisas, por muito conveniente que resulte, não pode
nunca se prolongar longo tempo. Trinta mil homens para dominar a
trezentos milhões, é demasiado pouco, sobretudo quando estes trezentos
milhões mostram tanta unidade cíe sentimentos e de instintos, de nece-
sidades e de repugnancias. O audaz general tivesse acabado por aumentar
suas forças, elevando a uma cifra mais proporcionada à imensidão
do oceano popular cujas tormentas tivesse querido conter com sua vo-
luntad. Aqui dou começo a uma espécie de utopia. v
so
CONDE DE GOBINEAU
306
307
atacado desde faz 4,000 anos, nunca tem tido que ter senão com
populações estrangeiras muito pouco numerosas para amenguar a densidade
de suas massas soñolientas* Tem permanecido, pois, mais homogênea que a
família indiana, e pelo mesmo mais tranquila e estável, mas também
mais inerte*
CAPÍTULO VI
Temos visto a Nínive irradiar sua influência sobre Tiro, e a Tiro so-
bre Cartago; inspirar aos Himyaritas, aos filhos de Israel, e depois perder
cada vez mais sua ação sobre estes países, segundo que a identidade das
raças estivesse mais alterada entre eles e ela* Paralelamente temos visto a
Egito enviar a civilização ao interior de África. As sociedades secun-
darias de Ásia apresentam, com o mesmo espetáculo, a observação rigu-
rosa das mesmas leis.
CONDE DE GOBINEAU
308
ñas» nas que o sangue indiano era menos abundante, foram também as
mais imperfectas.
309
Pelo demais, não há que se enganar: aquele rincão do mundo tão pouco
conhecido reserva a solução de questões etnográficas elevadísimas. Cuan-
do seja permitido chegar a o* estudá-lo com tranquilidade, comparar as raças
que o habitam, projetar as observações sobre os archipiélagos que lhe
tocam pelo Norte, se encontrarão ali apoios decisivos para o esclareci-
minto do que a mais arduo apresentam as origens americanas.
A Coreia é, o mesmo que o Japão, uma cópia de Chinesa, ainda que me-
nos interessante. Como o sangue aria não tem chegado àqueles lugares aparta-
dois senão por comunicação muito indireta, não tem produzido neles sina
esforços de imitação muito torpes. Segundo insinuei-o já, o Laos se
encontra ainda em inferior posição, e mais baixa ainda se acha a povoar
ción do Archipiélago de Lieu-Kieu*
3io
CONDE DE GOBINEAÜ
Mais acima, para o Norte, cessa bem cedo de aparecer, assim que se
abrem estepas percorridas pelas grandes nações nómadas do Ásia central.
Nestas frias regiões reina tão só uma burda mistificación das ideias
chinesas, com um budismo reformado, quase por completo despojado das
ideias indianas.
311
O temível avanço das massas inimigas não os deixou gozar longo tempo,
em paz em sua improvisada pátria* Ao cabo de doze anos, os Yue^tchi foram
novamente atacados e vencidos* Atravessaram o Thian-chan, costearon o
novo país dos Ou-Sun e foram estabelecer no Sur, sobre o Sihun,
na Sogdiana* Ali encontrava-se uma nação branca como eles, à que
os Chineses chamavam Szu e que os historiadores gregos denominavam Ge-
tas ou Hindoescitas. São os Khetas do Mahabharata, os Ghats atuais
do Pendjab, os Utsavaran-Ketas da Cachemira ocidental* Estes Getas,
atacados pelos Yue^tchi, cederam-lhes o terreno e retrocederam até a
monarquia mestiza e degenerada dos Bactrianos'Macedonios* Habiéndo-
a derrubado, fundaram sobre suas ruínas um Império que não deixou de ter
bastante importância.
312
CONDE DE GOBINEAU
Toda vez que a raça negra ocupava, nas épocas primitivas e dantes
Turán, invadia territórios que lhe eram desconhecidos, por todas essas razões
resulta bem evidente, indiscutible e positivo que os primeiros domínios de
esta raça branca devem ser procurados nas mesetas do centro de Ásia,
verdade já admitida, mas que ademais pode ser delimitado de uma maneira
exata. Pelo Sur, estes territórios têm sua fronteira desde o lago Aral
até o curso superior do Hoang-ho, até o Kuku-Nor. Ao Oeste, a
fronteira corre do mar Caspio aos montes Urales. Ao Leste, remonta brus-
camente fora do Kuen-lun para o Altai. A delimitação pelo Nor-
parece você mais difícil ; no entanto, vamos em seguida a procurá-la e encon-
trarla.
313
que, pelo Norte, esses mesmos povos lindaban ainda, em uma época bas-
tante baixa, com o lago Baikal e com o curso superior do Yenisei. Agora
que estão precisados todos os limites pode ser inquirido se o solo que
abarcam não encerra alguns restos materiais, alguns vestígios que possam
referir-se a nossos primeiros pais* Bem seja que peço aqui antigüeda-
dê quase hiperbólicas. Não obstante, a empresa não é quimérica em pré-
sencia das descobertas curiosas e de tanto mistério rodeados que,
no século último, chamaram a atenção do imperador Pedro o Grande
e ofereceram, ^ em sua pessoa, uma prova mais dessa espécie de adivinha-
ción característica do gênio.
As descobertas não deviam ser limitado aí. Bem cedo se advertiu que
não se tinha visto tudo. À medida que avançava-se para o Leste, se encon-
travam tumbas a milhares, fortificações e minas. No Altai, observaram-se
restos de cidades, e, gradualmente, teve-se a convicção de que aqueles
misteriosos vestígios da presença do homem civilizado abraçavam uma
zona imensa, já que estendiam-se desde o Ural medeio até o curso
superior do Amur, atingindo assim toda a largura de Ásia e cobrindo com
sinais irrecusables de uma elevada civilização aquelas terríveis planícies
CONDE DE GOBINEAU
3 X 4
siberianas hoje desertas, estéreis e desoladas. Para o Sur, não se conhece o
limite desses monumentos. Em Semipalatinsk, junto ao Irtisch, no go-
bierno de Tomsk, as campiñas aparecem arrepiadas de grandes túmulos de
terra e de pedras. Junto ao Tarbagatai e o Chamda podem ser visto ainda colo-
sais rumas, restos de numerosas cidades.
Estes são os fatos. Depois deles se apresenta esta questão : a que pue-
blos numerosos e civilizados têm pertencido essas fortificações, essas ciu-
dades, essas tumbas, esses instrumentos de ouro e de prata?
Para obter uma resposta, há que proceder desde depois por exclu-
sión. Não cabe pensar em atribuir todas essas maravilhas aos grandes Impérios
amarelos do Ásia setentrional. Também eles deixaram impressões de sua exis-
tencia. Conhece-se estas impressões, e não são aquelas. Têm outro aspecto, outra
disposição. Não há meio das confundir com as de que aqui se trata.
O mesmo pode ser dito respeito dos restos da passageira grandeza de
certos povos, como os Kirguises. Os conventos búdicos de Ablai-Kitka
têm seu caráter, que não pode ser confundido com o das construções
tchudas (i).
315
Se não cabe atribuir tais obras à época de Herodoto e também não é posi-
ble referí-las, a julgamento seu, à época de Alejandro, por exemplo, em que
este príncipe, após ter avançado até o ponto extremo da Sog-
alvo, nada tivesse sabido das maravilhas do Norte, o qual é inadmissível,
há que adentrarse forçadamente, com toda intrepidez, no que a antigüe-
dêem oferece a mais remoto, mais escuro, mais tenebroso, e não vacilar em re-
conhecer nas regiões siberianas a residência primitiva ae a espécie branca,
quando as diversas nações desta raça, agrupadas e civilizadas, ocupavam
territórios vizinhos uns de outros, quando não tinham ainda motivo para aban-
doar sua pátria e dispersar-se a fim de ir longe em procura de outra.
CONDE DE GOBINEAU
316
Essas estepas do Norte de Ásia, hoje tão tristes, tão desertas, tão dê-
povoadas, mas não estéreis como geralmente se crê, são, pois, o país de
que falam os Iranios, o Airyanemvaego, berço de seus antepassados. Refe-
riam eles mesmos que aquele país tinha sido sepultado em um prolongado
inverno por Ahrimán e que não tinha nem dois meses de verão* É o Uttara-
Kurú da tradição brahmánica, região situada, segundo ela, no extremo
Norte, onde reinava a liberdade mais absoluta para os homens e para as
mulheres; liberdade regulada, não obstante, pela sabedoria, pois ali moravam
os Rischis, os santos do tempo antigo. É a Hermionia de lhes Helenos,
pátria dos Hiperbóreos, das gentes do extremo Norte, Macrobios, cuja
vida era longa, a virtude profunda, a ciência infinita e a existência ditosa*
Em fim, era aquela região do Leste da que os Suevos germánicos não
falavam senão com um respeito sem limites, porque, diziam, eram donos de
ela seus gloriosos antecessores, os mais ilustre dos homens, os Sem-
nones (1)*
317
Tudo indica, por tanto, que a sede originaria dessa raça se encontra
no continente americano. Disto deduzo os seguintes fatos:
CONDE DE GOBINEAU
318
Mas ao lado desta verdade encontra-se ainda esta outra : aue a raça
amarela, asaltante e vitoriosa, caindo precisamente no meio das
nações brancas, fué comparável a um rio que atravessa e destrói yaci-
mientos auríferos: carrega seu limo de pepitas e enriquece-se a se mesmo.
Tenho aqui por que a raça amarela aparece tão com frequência, dentro da
História, como semicivilizadora e relativamente civilizable, importante, por
o menos, como instrumento de destruição, ao passo que a espécie negra,
mais isolada de todo contato com a família ilustre, permanece sumida em
uma profunda inércia.
LIVRO QUARTO
CAPÍTULO PRIMEIRO
Occidente do Globo
21
322
CONDE DE GOBINEAU
Na Índia, a espécie nobre não choca senão com duas antagonistas infe-
riores. Compacta, ao princípio, em seu esencia aria, toda sua tarefa consiste
em defender contra a invasão, contra a imersão no seio de princi-
323
píos estranhos. Este trabalho preservador prossegue-se com energia, com com*»
ciência do perigo e com ajuda de meios que cabe chamar desesperados,
e que seriam verdadeiramente novelescos se não tivessem dado resultados tão
práticos. Esta luta tão real, tão verdadeira, não é no entanto a propósito
para produzir a História propriamente dita. Como o ramo branco posta
em ação está, segundo acabo de dizê-lo, compacta, e tem um objetivo
único, uma sozinha ideia civilizadora, basta-lhe somente vencer e viver. Pouca
variedade na origem dos movimentos engendra escassos desejos de com-
servar a impressão dos fatos; e do mesmo modo que se fez notar
que os povos felizes carecem de história, cabe acrescentar que não a possuem
porque não têm nada que contar que não seja do domínio de todos. Assim
o desenvolvimento de uma civilização unitária tal como a da Índia, que não
oferece à reflexão nacional senão muito poucas inovações surpreendentes,
nem muitas mudanças inesperadas nas ideias, nem nas doutrinas, nem nas
costumes, não tem nada grave que referir, e daí vem que as cró-
nicas indianos tenham revestido sempre a forma teológica, os matizes de
a poesia, e apresentem uma carência tão completa de cronología e tão
consideráveis lagoas no registro dos acontecimentos.
3M
CONDE DE GOBINEAU
325
Não renovarei meus argumentos contra esta doutrina. Não repetirei que,
se as localizações de Alejandría, de Constantinopla, estavam fatalmente
indicados para converter-se em grandes centros de população, tivessem sub-
sistido e seguiriam igual em todos os tempos, alegação desmentida por
os fatos. Também não recordarei que, de raciocinar assim, nem Paris, nem Londres,
nem Viena, nem Berlim, nem Madri, teriam título algum para ser as célebres
capitais que são, e que em seu lugar tivéssemos visto como, desde a
aparecimento dos primeiros mercaderes, Cádiz, ou talvez melhor Gibraltar,
Alejandría muito dantes que Tiro ou Sidón, Constantinopla, com a exclusão
eterna de Odesa, Veneza, sem esperança alguma pára Trieste, acaparaban
uma supremacía natural, incomunicable, inalienable, indomable, se é-me
lícito emplpr esta palavra; e tivéssemos visto, por tanto, como a história
humana girava eternamente ao redor desses pontos predestinados. Em
efeito, são certamente os lugares melhor situados para fomentar o tráfico.
Mas, felizmente, o mundo tem interesses maiores que os das
mercadorias. Seus negócios não andam a graça da seita economista. Mó-
viles mais elevados que as considerações do deva e o ter presidem seus
atos e, desde a aurora do mundo, a Providência tem estabelecido assim as
regras da gravitación social : que o lugar mais importante do Globo não
é necessariamente o melhor situado para comprar ou para vender, para fazer
transitar os gêneros ou para fabricá-los, para recolher as matérias prima ou
para cultivá-las. É aquele em que, em um momento dado, habita o grupo
alvo mais puro, mais inteligente e mais forte. Ainda no caso de que,
por um concurso de circunstâncias políticas invencibles, residisse este grupo
entre os gelos polares ou sob os raios de fogo do ecuador, o mundo
intelectual se inclinaria para esse laclo. Para ali convergiriam todas as
ideias, todas as tendências, todos os esforços, e não há obstáculos natu-
rales que pudessem impedir que os gêneros e os proauctos mais longínquos
chegassem ali através dos mares, dos rios e das montanhas.
326
CONDE DE GOBINEAU
Negros,
Gamitas,
Semitas,
Iranios. i
misturas negras.
competidores mais brancos. Tenho aqui por que os Arios Germanos fixaram de"
cididamente a civilização no Noroeste.
CAPÍTULO II
Os Zoroástricos
CONDE DE GOBINEAU
328
329
Pode parecer singular que estes Arios, assim impregnados de sangue negro,
diretamente ou por mistura com os Camitas e os Semitas degenerados, hu-
biesen podido chegar a assumir o papel importante que lhes atribui a His-
toria. Se coubesse supor que a mistura era igual em todas as tribos, resul-
taría muito difícil explicar etnicamente o domínio das mais ilustre de
elas sobre as populações asirías.
Já, em uma época remota, uma tribo meda tinha reinado em Asiria. Seu
debilidade numérica tinha-a constreñido a submeter a uma invasão caldeo-
semita procedente das montanhas do Noroeste. Desde aquele tempo, se
enlaçam umas doutrinas religiosas, relativamente veneráveis, com o nome
de Zoroastro levado pelo primeiro rei dessa dinastía asiria; não há
meio de confundir o príncipe assim chamado com o reformador religioso?
mas a presença de tal nome na data do ano 2234 a. de J.-C., pode
servir para mostrar que os Medos e os Persas do século Vil conservavam
a mesma fé monoteísta que seus mais antigos antepassados.
33 °
CONDE DE GOBINEAU
Em tal momento, a religião nacional, ainda que volta estranha, por sua
reforma, ao culto dos purohitas e ainda àquelas noções teológicas
mais singelas, era patrimônio primitivo de toda a raça branca nas re-
giones setentrionais do mundo. Aquela religião era incomparavelmente
mais digna, mais moral, mais elevada que a dos Semitas. Por este fato
pode ser julgado que, não obstante suas alterações, no século vil valia mais
que o politeísmo, no entanto menos abyecto, adotado desde fazia longo
tempo pelas nações helénicas. Sob a direção desta crença, as
costumes não estavam tão degradadas e conservavam verdadeiro vigor.
Desde que fosse arrojada de Nínive não tinha decaído. Tinha persistido
em seu culto, honra rarísimo, devido evidentemente a sua tenaz homoge-
neidad. Tinha conservado seu prurito de independência sob o comando de
chefes de escassa autoridade entre seus governados: a nação meda tinha,
pois, permanecido aria. Uma vez sacada de sua belicosa anarquía, a nece-
sidad de dar um aplicativo a seu vigor, deixado sem emprego pela feliz sofo-
cación das discórdias civis, voltou suas miradas para as conquistas
exteriores. Começando por submeter as nações allegadas estabelecidas em
sua vizinhança, entre outras os Persas, se fortaleceu com sua agregação. Dê-
pués, quando alistó sob suas bandeiras e fundiu em um sozinho corpo de pue-
blos, dos quais era ela a cabeça, a todos os discípulos meridionales
de sua religião, atacou ao Império ninivita.
331
As últimas emigrações semíticas tinham cessado de descer das
montanhas da Armenia e de ir a regenerar as populações asirías*
As regiões ribereñas do Caspio e vizinhas do Cáucaso não tinham mais
homens para enviar fora. Desde fazia tempo, as colunas viajantes de
os Helenos tinham cessado de passar, e os Semitas, que tinham permanecido
naquelas regiões, não foram expulsos delas por ninguém* Asiria não
renovava, pois, seu sangue desde fazia séculos, e a abundância dos prin-
cipios negros, sempre em curso de assimilação, tinha determinado a de-
cadencia das raças superpostas.
332
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CONDE DE GOBINEAU
336
vista do mérito militar* tudo; porque* se esses 24.000 Iranios não tivessem
ficado paralisados, em seus movimentos, pelo tropel de seus inertes auxi-
envolver, é muito provável que a musa de Plateia teria celebrado a outros
vencedores. Seja como for, como a nação reinante não podia fornecer
soldados em maior número* resultava pouco considerável e não podia ser bastado
para a tarefa de f regenerar a densa massa das populações asiáticas. JNo
tinha, pois, senão a perspectiva de um sozinho porvenir : corromper-se a se meus-
ma afundando-se muito cedo no seio daquelas. .
O fim das nações iranias estava asi fixado para uma techa muito cer-
cana ao dia de seu triunfo. Com tudo, enquanto seu esencia não esteve dema-
siado misturada, seu superioridad sobre o universo civilizado era positiva e
indiscutible : não tinham competidores. O Ásia Inferior inteira submeteu-se
a seu cetro. Os pequenos reinos de além o Eufrates, aquele baluarte cuida-
dosamente mantido pelos Faraones, foram englobados rapidamente em
as satrapías. As cidades livres da costa fenicia foram anexadas à
monarquia persa, com os Estados dos Lidios. Chegou no dia em que não que-
dava já mais que Egito, antigo rival, que para os herdeiros das
dinastías caldeas pôde valer a pena de uma campanha. Ante este coloso caduco,
os conquistadores semitas mas vigorosos tinham retrocedido . ^constante*
mente. Os Persas não retrocederam. Tudo favorecia seu dominación. A de-
cadencia egípcia era um fato. O país do Nilo não possuía já recursos perso-
nales de resistência. Certamente pagava ainda a mercenários para montar a
guarda em tomo de seu caducidad, e, entre parêntese, a degeneração gene-
ral da raça semítica tinha-a obrigado a substituir quase absolutamente
aos Carios e aos Filisteos por Arios Gregos. A isto se limitava o que
podia tentar. Não tinha já bastante ductilidad nem nervo para correr ele
mesmo às armas ou para refazer de uma derrota.
337
22
CONDE DE GOBINEAU
338
339
fato que refere vai parecer estranho: não por isso deixa do afirmar (i).
CAPITULO III
{1) Algumas palavras sobre estes aborígenes que os tempos históricos têm entre-
visto mal. Todas as lembranças primitivas da Hélade andam cheios de alusões
a essas tribos misteriosas. Hesiodo lume autóctonos aos povos mais antigos da
Arcadia, qualificados de pelásgicos. Erecteo, Cecrops, eram chefes reconhecidos
como au-
tóctonos. O mesmo dizia-se das nações seguintes : a generalidade de Pelasgos,
os Léleges, os Curetas, os Cocones, os Aonios, os Témiques, os Hiantos, os Beo-
cios Tracios, os Télebes, os Epirotas, os Flegios, etc. (Ver Grote, hiistory of
Greece,
t. I, p. 238, 262, 268, e t. II, p. 349 ? Larcber, Chronol. d’Hérod t. VIII;
Niebuhr,
Roenische Geschichte, t. I, p. 26 a 64; Ou. Müller, Ote Etrusker, Einleit, p. 11 e
75
a 100.) Sobre a rapidez com que os povos aborígenes desapareceram tão cedo
como os Arios Helenos fizeram seu aparecimento entre eles, consultar Grote, t. II,
p. 351.
Hécate, Herodoto e Tucídides andam de acordo sobre este ponto : que teve uma
época antihelénica, durante a qual entre o cabo Malea e o Olimpo se falavam dei-
versa línguas. (Grote, t. II, p. 347.)
CONDE DE GOBINEAU
340
dos Léleges e dos Curetas, isto é com habitantes locais, por consi'
guiem você não arios, foi estabelecer na Tesalia, muito após a cria-
ción dos Estados de Sicione, de Argos, de Tebas e de Atenas. Esse com-
quistador procedia do Norte.
raça camosemítica. . .
341
(2) Hesiodo deriva a palavra Titán , de « titaino oi teinontes tas jeiras », os que
342
CONDE DE GOBINEAU
{2) Que, no entanto, não eram bárbaros. (Mac Torrens Cullagh, The industrial
History of free Nations , t. I, p. 7.)
343
do a luta pela luta, e, dado seu religioso conceito da lealdade, não tran-
sigiendo com o dever que se impõe* Se faz querer por seus nobres senti-
mientos, e compadecer pelas paixões impetuosas que lhe perdem. É digno
de que lhe compare aos vencedores da epopeya indiana, do Schahndmeh
e das canções de gesta.
Prossigamos o retrato.
344
CONDE DE GOBINEAU
com suas próprias mãos talha em madeira de oliveira seu leito nupcial, e este
leito, incorporado de marfil, é uma obra mestre. Elocuente, artista, bribón
e perigoso, é um compatriota, um émulo do pirata-mercader nascido em
Sidón, do senador que governará Cartago, enquanto, fecundo em ideias,
inquebrantável em suas opiniões, hábil em dominar suas paixões como em
temperar as dos outros, moderado quando queira, modesto, já que o
orgulho é uma hinchazón torpe da razão, é Ânus. Não cabe dúvida que
Ulisses deve aventajar a Ayax, verdadeiro Ario Finés. O matiz do tipo grego
ao qual pertence o filho de Laertes está destinado a uma sorte mais elevada
e mais rápida, mas também mais frágil, que sua contrincante. A glória de
Grécia fué obra da fração aria, aliada ao sangue semítica ; enquanto
que a grande preponderancia exterior daquele país se deveu à ação de
as populações algo mogolizadas do Norte.
(i) Pott, Encycl. Ersch ou. Gmber, Indo Germanischer Sprachstamm, p. 23, e
Grote, Híst. of Greece, t. I, p. 32.
345
CONDE DE GOBINEAU
346
Este quadro precisa ser comentado (1). Não contém, falando com pró-
piedade, um sozinho elemento puro* De cada sete, seis encerram, em graus dei-
ferentes, princípios melanios; dois possuem princípios^ amarelos, outros dois
contêm o elemento branco tomado do ramo camitica ou , por tanto, ex-
tremadamente debilitado ; três tomaram-no do ramo semítica ; outros dois
do ramo aria : três, em fim, reúnem os dois últimos origens* Disso saco
as consequências seguintes: . .
(1) Grote, Hist. of Greece, t. II, p. 359 e passim; Encyclop . Ersch . ou. Gruber ,
347
Pode parecer estranho que diga que os Arios Gregos tinham dominado
em seu próprio país o princípio semítico, após ter demonstrado que
a maior parte de sua civilização estava impregnada dele. Para dar conta
desta aparente contradição não tenho de recordar senão uma reserva inscrita
mais acima. Dizendo que a cultura grega era principalmente de origem
semítico deixava em reserva verdadeiro estado anterior que vou examinar agora
e que, junto com três elementos inteiramente arios, contém a história pri-
mitiva do helenismo épico. Estes elementos são : o pensamento guber-
namental, a aptidão militar e um gênero muito particular de talento literário.
Os três derivam-se destes dois instintos ânus: a razão e a apetencia de
o útil.
{i) Zumpt» Memórias da Academia de Berlim. Ueber dêem Estande der Bevoelkerung
und die Volksvermehrung in Alterthum, p. 5.
CONDE DE GOBINEAU
348
349
Assim a sociedade grega, muito jovem ainda, possuía uma hierarquia de acordo
com a superioridad de nascimento. Ao lado da liberdade, e da zelosa
liberdade dos Arios Helenos, nem uma sombra de igualdade entre os demais
ocupantes do solo e seus audazes dominadores. O cetro, ainda que outorgado
em princípio à eleição, encontrou no respeito de que se rodeava a os
altas linhagens uma base poderosa para perpetuar-se exclusivamente entre algu-
nas descendencias. Sob certos aspectos inclusive, a ideia de supremacía de
espécie, consagrada pela família, conduziu os Arios Gregos a resultados
comparáveis àqueles que temos observado em Egito e na Índia, é
dizer, que também eles conheceram as demarcaciones de castas e as leis
prohibitivas das misturas. Mais ainda : aplicaram essas leis até os últimos
tempos de sua existência política. Cita-se casas sacerdotales que não se alia-
ban senão entre si, e a lei foi sempre dura para os retoños dos ciuda-
dê-nos casados com estrangeiras. No entanto, apresso-me a dizê-lo, estas
restrições eram moderadas. Não podiam ter o mesmo alcance que as
leis do Nilo e do Ariavarta. A raça aria-grega, a despecho da com-
ciência de sua superioridad de esencia e de faculdades sobre as populações
semíticas que a desbordaban por todas partes, possuía a desvantagem de sua
inexperiência e escasso saber, ao passo que as outras procediam de uma velha
civilização. Estas últimas gozavam, em detrimento daqueles, de uma sua-
perioridad exterior que não cabia desdenhar nem permitia se negar completa-
mente à mistura. O sistema das castas permaneceu sempre em estado
embrionario; não pôde ser desenvolvido. O helenismo teve demasiado a menu-
do interesse em permitir enlaces desiguais, e outras vezes se vió forçado a
CONDE DE GOBINEAU
350
suportá-los. Sob este duplo aspecto, sua situação parece-se muito ao que
ocorreu mais tarde entre os Germanos.
E do mesmo modo que a cada qual pretendia ser livre, honorado, admi-
rado, a cada qual também aspirava a dominar todo o possível. Parece que se-
mejante tendência teve de resultar de difícil realização em uma sociedade
de tal modo constituída, na qual o próprio rei, o pastor do povo, dantes
de expressar uma opinião, tinha que averiguar se tal opinião satisfazia a os
deuses, aos sacerdotes, às pessoas de alto abolengo, aos guerreiros, a
a massa do povo. Felizmente, não faltavam recursos: tinha o é>
prego, o antigo autóctono avasallado, e, finalmente, os estrangeiros. Veja-
mos primeiro o que era o escravo.
351
dêem ; e, mais tarde ainda, segundo outra regra, que, desde o ponto de vista de
a lei original, e em um sentido étnico, não era senão uma assimilação arbitra-
na» estendeu-se esta franquia a todas as nações gregas.
Esta nobre e generosa criatura, sentada em frente a sua belicoso esposo, cer-
ca do lar doméstico, aparecia rodeada de filhos submetidos até a muer-
ta as vontades paternas. Os filhos e as filhas assinalavam, na casa, o
primeiro grau da obediência. Mas, uma vez saído da morada de suas
antepassados, o filho ia fundar outra soberania doméstica, e praticava a
sua vez o que tinha aprendido. Após os filhos, chegavam os escravos :
sua situação subordinada não tinha nada de muito penoso. Que tivessem sido
comprados por certa quantidade ou adquiridos permutándolos com touros e ter-
neras, ou ainda que a sorte da guerra os tivesse posto em mãos de os
vencedores como restos de uma cidade tomada por assalto, os escravos eram
CONDE DE GOBINEAU
352
mais bem súbditos que seres livrados a todos os caprichos de seus propie-
tarios.
Assim o Ânus Grego, soberano em sua casa, homem livre na praça pu-
blica* verdadeiro senhor feudal* dominava sem reserva a todos os seus* meninos,
servos e burgueses.
353
Não contradigo a isso : é verdadeiro que o gênio asiático estava tão maduro
e ainda podre» como inexperto e ignorante de seus futuros destinos era o
gênio ario-grego. Este último, aturdido ainda pelo prolongado tráfico que
acabavam de realizar seus varoniles antepassados através de tantos países e
casualidades, não tinha tido tempo de afinarse. Não duvido, no entanto, que,
de ter tido ocasião de reconhecer-se a si mesmo dantes de cair sob a
influência asiría, tivesse feito melhor, até adiantar à civilização
européia. Tivesse podido introduzir uma parte maior de sua originalidade em
os destinos dos povos helénicos. Quiçá seus triunfos artísticos tivessem
atingido menos vôo; mas sua vida política, mais digna, menos agitada,
mas nobre» mais respetable, tivesse sido mais dilatada. Desgraçadamente,
as massas ario-gregas não eram comparáveis em número às imigrações
de Ásia.
CONDE DE GOBINEAU
a pátria. , . ru i
355
CONDE DE GOBINEAU
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357
CONDE DE GOBÍNEAU
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cerca dos Almeónidas f estou a esmo de uma maioria. Com ou sem tiranía»
o governo das cidades gregas era execrable» vergonzoso» já que»
em qualquer mão que caísse» não supunha a existência de um direito inhe'
renda à pessoa do governado» já que estava acima de toda
lei natural» já que provia/provinha em linha reta da teoria asina» posto
que suas primeiras e verdadeiras raízes» ainda que inadvertidas, partiam da
envilecedora concepção que as raças negras se forjam da autoridade*
Aconteceu, por verdadeiro muito com frequência, _ que aqueles tiranos, tão execra-
dois, tão odiados dos povos gregos, governaram-nas no entanto com
muito maior moderación e sensatez que suas Assembléias políticas. Guiado
por um sentido justo, o poseedor único de um direito absoluto contenta-se
de bom grau com uma parte dessa omnipotencia, e encontra ao mesmo tempo
escasso goze e interesse em extremar seus prerrogativas. Esta feliz reserva difí-
cilmente encontra-se nunca nos tribunais e administrações, sempre
inclinados, pelo contrário, a alargar suas atribuições, e em Grécia tudo
contribuía a que as magistraturas se mostrassem assim e que nada as refrenase.
Com tudo, pese aos serviços que pudessem prestar os tiranos, e pese
também à moderación de seu jugo, era obrigado que lhes amaldiçoasse : o
impunha assim o pundonor. Seus reinos eram uma corrente de ^conspirações, e
de suplicios. Raramente sustentavam-se até sua morte,, e mais raramente ainda
herdavam o cetro seus filhos. Esta terrível experiência não impedia que a
natureza mesma das coisas suscitasse sempre sucessores aos tiranos dê-
possuídos. Assim é como se verificava o que disse faz um , momento: o go-
bierno era a regra, a tiranía a exceção, e a exceção aparecia muito
mais frequentemente que a regra.
(1) Mac Torrens Cullagh, The Industrial History of jree Nations, t. I, p. 31.
359
CONDE DE GOBINEAU
360
bado sacrifício pela pátria não podia conduzir as cidades senão a desenvol-
ver-se dentro de um círculo estreito» de sucessos infecundos e de derrotas
desastrosas (i).
361
Ninguém se dava nem podia ser dado conta do verdadeiro mau, já que
este mau arraigava na constituição íntima das raças helénicas. Todos
os inventores de sistemas novos, começando por Platón, o soslayaron.
CONDE DE GOBINEAU
362
Não cabe hoje a menor dúvida de que, do mesmo modo que^ as bases
essenciais do sistema político e moral procediam de Asiría, assim também
os princípios artísticos foram fielmente copiados do mesmo país; v, a
este respeito, as escavações e as descobertas de Khorsabad, ao é-
363
tablecer uma manifesta relação entre os baixos relevos do estilo ninivita
e as produções do templo de Egina e da Escola de Mirón, não deixam
subsistir a menor escuridão sobre esta questão (1). Mas como os Gregos
participavam em maior grau do princípio branco e ario que os Camitas
negros, força-a reguladora existente em seu espírito era também mais consi-
derable, e, além da experiência de seus antecessores asirios e da com-
templación e estudo de suas obras, os Gregos possuíam uma superabundancia
de razão e um sentimento do natural muito imperioso* Resistiram-se
vivamente e com acerto aos excessos a que se nabían entregado seus maes-
tros, no qual teve não pouco mérito, já que cabia a tentación de
sucumbir a eles* Sabido é que entre os Helenos se conheceram as muñe-
cas hieraticas de membros movibles e as monstruosidades de certas imá-
genes consagradas* Felizmente, o gosto extraordinário das massas pró-
declarou contra ^ aquelas depravaciones* A arte grega não quis geralmente
admitir nem símbolos horríveis ou irritantes, nem monumentos pueriles*
Por causa deste fato se lhe reprochó o ter sido menos espiritualista
que os santuários de Ásia* Esta censura é injusta, ou pelo menos se deve
a uma confusão de ideias* Se chama-se espiritualismo ao conjunto das teo-
ria místicas, o reproche^ estaria justificado; mas se, mais verídicamente, se
considera que estas teorias não devem sua origem senão a impulsos imaginati-
vos faltos de razão e de lógica, e não obedecendo senão aos estímulos de
a sensação, se convirá em que o misticismo não tem que ver com o ritua-
lismo, e aue pelo mesmo não procede acusar aos Gregos de se ter lan-
zado pelas vias do sensualismo ao afastar-se precisamente dele* Estiveram,
pelo contrário, bem mais isentos que os Asiáticos das principais
misérias do materialismo, e, culto por culto, o de Júpiter Olímpico é me-
nos degradante que o de Baal. Tenho tratado já, pelo demais, este assunto*
No entanto os Gregos não eram também não muito espiritualistas* Ainda que
aminorada, a ideia semítica dominava entre eles, e achava sua expressão
no prestígio dos mistérios sagrados exercidos nos templos* As po-
blaciones aceitavam esses ritos, limitando-se às vezes a mitigá-los, segundo o
sentimento de horror que inspirava a fealdad física* Quanto à feal-
dêem moral, sabemos que era bastante mais tolerada*
CONDE DE GOBINEAU
364
Não esqueço nada. No entanto, não invalido também não meu razonamien-
to, e repito que o grande período de glória literária e artística de Grécia fué
aquele em que se soube edificar, esculpir, fundir, pintar, compor cantos
líricos, livros de filosofia e anales dignos de fé. Mas reconheço ao mesmo
tempo que dantes desta época, muito tempo dantes, teve um momento
em que, sem se preocupar de todas essas belas coisas, o gênio ario, quase livre
do abraço semítico, limitava-se à produção da epopeya, e se mos-
trava admirável, inimitable neste grandioso aspecto, como ignorante,
inhábil e falto de inspiração em todos os demais (i). A história de o
espírito grego compreende pois duas fases muito diferentes : a dos cantos
épicos emanados da mesma origem que os Vedas, o Ramayana, o Mrt-
habarata, os Sagas, o Schanameh, as canções de gesta : é a inspi-
ración aria. Depois veio, mais tarde, a inspiração semítica, em que a epo-
peya não apareceu senão como arcaísmo, em que o lirismo asiático e as artes
do desenho triunfaram absolutamente.
Homero, seja que se tratasse de um homem, seja que tal nomeie resuma
a nombradía de muitos cantores, compôs seus relatos no momento
365
CAPITULO IV
Os Gregos semíticos
366
CONDE DE GOBINEAU
Com respeito ao estado do povo em Atenas, não seja que dizer, senão que
encerra tantos oprobios políticos ao lado de magnificencias intelectuais
inimitables, que teria de se crer a primeira vista que para levar a cabo
semelhante obra teve realmente necessidade de alguns séculos. Mas, hacien-
do começar este regime no arcontado de Iságoras, em 508, não se pode
prolongá-lo senão até a batalha de Queronea, em 339. O governo continuou
sem dúvida mais tarde chamando-se República; com tudo, a isonomía estava
perdida, e, quando os cidadãos de Atenas se aprestaron a tomar as
armas contra a autoridade macedónica, foram tratados menos como ene-
migos que como rebeldes. De 508 a 339 medeiam 169 anos*
Era uma querela entre dois irmãos. Esquilo não ignorava essa ria*
ción de parentesco, quando, em , o sonho de Atosa, põe em boca da
mãe de Jerjes:
CONDE DE GOBINEAU
368
24
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O longo período que abarcou esta situação não esteve falto de indivi-
dualidades destacadas; mas o público não se mostrou com elas nada sim-
pático, e tudo se manteve na mediocridad. Com frequência tem-se pré-
guntado por que certas épocas não se elevam a um nível superior; tem-se
respondido que ou se devia à falta de^ liberdade ou à carência de é-
tímulo. Os uns ^atribuem à anarquía ateniense o florecimiento de
Sófocles e de Platón, do mesmo modo que afirmam que sem os perpétuos
distúrbios nas municipalidades de Itália, nem Petrarca, nem Boccaccio, nem
Dante sobretudo, tivessem nunca assombrado ao mundo com a magnifi-
cencia de seus escritos. Outros pensadores, pelo contrário, atribuem a
grandeza do século de Pericles às generosidades deste estadista, e o
vôo da musa italiana à proteção dos Médicis, exatamente como
era-a clássica da literatura francesa e suas laureles à bienhechora influen-
cia do sol de Luis XIV. Vemos como, partindo das circunstâncias
locais, encontram-se opiniões para todos os gustos, umas atribuindo a
a anarquía o que outras ao despotismo.
ario mal em uma. Não preciso dizer que não persigo aqui cálculos exatos ;
não trato senão de pôr de relevo minha ideia.
Mas o Egípcio do século HIV, ainda que degenerado, possuía ainda, sem
embargo, uma nacionalidade, uma originalidade. Não possuía já, sem dúvida, a
virtualidad dos antepassados dos quais era o representante; não obs-
tante, a combinação étnica de que procedia continuava o caracterizando
de algum modo. A partir do século v cessou de ser assim.
374
CONDE DE GOBINEAU
375
As invasões arias foram, assim para os Gregos como para seus herma"
no-los Iranios, pouco fecundas em comparação das massas em mais de duas
terços melanizadas entre as quais foram a anegarse. Era, pois, inevita-'
ble que após ter modificado, durante um período mais ou menos
longo, o estado das populações com as quais se fundiam, se perdessem
a sua vez entre o elemento destruidor no qual seus predecessores brancos
habíanse absorvido sucessivamente dantes que elas. É o que aconteceu em
as épocas macedónicas; é também o que hoje acontece.
CONDE DE GOBINEAU
376
LIVRO QUINTO
CAPÍTULO PRIMEIRO
Populações primitivas de Europa
38°
CONDE DE GOBINEAU
Há que ser mais ousados em Itália. Nenhuma dúvida cabe de que as cons-
trucciones parecidas aos monumentos galos e espanhóis que ali encontra-
mos são anteriores ao período romano e, mais ainda, ao período etrusco.
Helos aí remontando do século III ao século VIII, pelo menos.
(i) Borrow, The Bible in Spain , ín-12, London, 1849, cap. VII, p. 35.
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CONDE DE GOBINEAU
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estudo* ,
Uma objeción sem réplica destrói esta hipótese pelo demas tunda-
mentalmente inadmissível por muitos outros motivos (2)* Entre a Idade de
Bronze e a Idade de Ferro, não há outra diferença que a maior variedade
de matérias empregadas e a crescente perfección do trabalho. O pensa-
minto dirigente não muda ; se contínua, modifica-se, se afina, passa de
o bom talvez, mas se mantendo dentro dos mesmos elementos*
Pelo contrário, entre as produções da Idade de Pedra e as da
Idade de Bronze, advertem-se, à primeira olhadela, contraste-os mais
impressionantes ; nada de transição de umas a outras, quanto ao esen-
cial: o sentimento criador transforma-se de acima abaixo* Os instintos, as
necessidades por ele acordados, não se correspondem em modo algum* Por
consiguiente, a Idade de Pedra e a Idade de Bronze não guardam as mesmas
relações de coesão em que esta última se encontra com a Idade de
Ferro* No primeiro caso, há passo de uma raça a outra, enquanto,
no segundo, não há mais que simples progresso no seio das raças,
se não completamente idênticas, pelo menos muito emparentadas de perto*
Agora bem : não é duvidoso que os Eslavos estão estabelecidos em Europa
desde faz pelo menos quatro mil anos* Por outra parte, os Celtas
combatiam na região do Garona no século XVIII dantes de nossa era.
Henos aqui, pois, chegados passo a passo a esta convicção, resultado matemá-
tico de todo o que precede ; os monumentos da Idade de Pedra são ante-
riores, quanto a seu estilo, ao ano 2000 dantes de J*-C.; a raça particular
que os construiu ocupava os países em que lhes encontra dantes que toda
outra nação; e como, pelo demais, se apresentam em maior abundância a
medida que o observador, abandonando o Sur, avança mais para o Nor-
oeste, o Norte e o Nordeste, essa mesma raça era ainda mais primitivamente
e, em todo caso, mais solidamente soberana nestas últimas regiões. Se se
deseja fixar de uma maneira aproximada a época provável do apogeo de seu
poderío, nada se opõe a que se aceite a data de 3,000 anos dantes de J.-C*,
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CONDE DE GOBINEAU
385
35
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CONDE DE GOBINEAU
Tanto por sua massa, que faz deles o monumento mas destacado que
tenha produzido a raça finesa, como pelos restos que contêm, os dól-
menes devem ser considerado como um ele os depoimentos mais concluyentes de
a presença de tribos amarelas em um ponto dado. As escavações mais
minuciosas não têm conseguido descobrir nunca objetos de metal, senão única-
mente essa espécie de instrumentos ou utensílios, tão elementares pela ma-
teria como pela forma, que temos listado dantes. Os dólmenes oferecem
ademais um caráter precioso, é sua vasta difusão. Existem em toda Europa*
Resulta tanto mais curioso descobrir entre a raça amarela esse gênero de
conhecimentos quanto que, entre os descendentes puros ou mestizos da
variedade melania, não se percebe vestígio algum disso nas épocas corre-
pondientes. A arte de aliviar os sofrimentos não fué mal, nestes últi-
mos, para além do emprego de singelos tratamentos exteriores. O interior de o
corpo humano e sua estrutura eram-lhes completamente desconhecidos. É a
consequência do horror que lhes inspiravam os mortos, horror puramente
imaginativo, nascido dos supersticiosos temores que de longo tempo prece- .
deram ao respeito, e que afogava todo desejo de penetrar em um domínio teni-
do por temível. Pelo contrário, os amarelos, preservados por seu tempera-
mento flemático contra as impressões desse gênero, olharam com escassa so-
lemnidad os despojos de suas conquistas. A antropofagia brindava-lhes todas
as ocasiões desejáveis para instruir-se sobre a osteología humana. A pré-
ocupação mesma de sua glotonería, induzindo-lhes a estudar a natureza de
os ossos, a fim de saber, a ponto fixo, onde encontrar a medula, lhes pró-
porcionaba a experiência prática. A isso se deve que se mostrem tão sa-
bios os atuais povoadores da Sibéria meridional. Seus conhecimentos
anatômicos, no que se refere às diferentes categorias de animais,
são tão precisos como detalhados (1).
Em uma palavra, até o presente, a fisiología não tem acrescentado nada de muito
concluyente às provas oferecidas por outras ordens de conhecimentos acer-
(i) Ruc, Souvenirs d’um vou age dans a Tartarie, lhe Thibet et a Chine , t. II.
CONDE DE GOBINEAU
388
389
Greve quase dizer que não são essas as condições que têm presidido a
a construção do enladrillado de Marsal. Não são operários constreñidos
regular e exclusivamente a seu labor quem executaram-no. Fué levado
a termo por famílias de trabalhadores bárbaros, atuando lentamente, torpe-
mente, mas com uma perseverancia imperturbable que não dava impor-
tancia ao tempo nem ao esforço. É também verosímil que, na ideia de
quem puseram primeiramente mãos à obra, o enladrillado não devia
atingir a extensão que tomou. Não é senão à medida que a população,
favorecida pela segurança dos lugares, fué concentrando-se ali, como
pôde sentir a conveniência de í-lo aumentando* Decorreram pois vários
séculos dantes de que esses alicerces chegassem a poder suportar massas de povoar
ción sem dúvida respetables, pois tantos esforços não foram prodigados para
estabelecer espaços vazios.
CONDE DE GOBINEAU
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Não tenho demonstrado até aqui senão por via de comparação e de elimi-
nação a presença primordial dos povos amarelos em Europa. Leste
método, qualquer que seja sua força, não basta. É necessário recorrer a ele-
mentos de persuasión mais diretos. Felizmente, não faltam.
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39 2
CONDE DE GOBINEAU
Os anões oferecem, pois, assim por suas qualidades como por seus vícios, a
fisonomía de uma população essencialmente servil, o qual é uma marca de
que as tradições com ela relacionadas formáronse primitivamente em uma
época em que, em sua maioria ao menos, tinham caícfo já sob o jugo de
os emigrantes de raça branca. Confirmam esta opinião, bem como a auten-
ticidad dos relatos da lenda moderna, as impressões muito reconocibles,
muito evidentes, que descobrimos de todos os fatos que se indica e se
atribui aos anões, de todos, sem exceção alguma, na mais remota
antiguidade. A filología, os mitos e ainda a história das épocas gregas,
etruscas e sabinas, demonstrarão esta aserción.
O sozinho fato de que esta alusão tende a assinalar bem aos auditores
do poema qual era a atitude dos Troyanos prestos a combater, demonstra
que se possuía, em tempos de Homero, uma noção muito geral e muito fami-
envolver da existência dos pigmeos. Estes pequenos seres, habitando do lado
do oceano, encontravam-se ao Oeste do país dos Helenos, e como as
grullas iam a seu encontro ao final do inverno, estavam no Norte; pois
a emigração dos pássaros de passagem tem efeito nessa época em dita
direção. Habitavam pois na Europa ocidental. É ali, efetivamente, onde
até o presente reconhecemo-los por suas obras. Homero não é o único,
na antiguidade grega, que tenha falado deles. Hecateo de Mileto os
menciona, pintando-os como labradores minúsculos ocupados em segar seus
trigos a hachazos. Eustato situa aos pigmeos nas regiões boreales.
DESIGUALDADE DAS RAÇAS
393
nada mais que um ser ; é o que está mutilado, sorte comum das coisas
intelectuais e materiais muito antigas.
394
CONDE DE GOBINEAU
mesmo ser, sob outra forma lexicológica, entre as raças brancas aborígenes
de Itália. É faunus , na feminino fauna . Faz já muito tempo que os
eruditos assinalaram como uma rareza que estas divinidades sejam ao mesmo tempo uma
O fauno, o mesmo que o egipán, eram seres grotescos por seu fealdad,
rayando quase na animalidad, bêbados, libertinos, crueis, grosseiros em
todos sentidos, mas conhecendo o porvenir e sabendo o descobrir. Quem
não verá aqui o retrato moral e físico da espécie amarela, tal como se
representaram-na os primeiros emigrantes brancos? Uma invencible propen-
sión a todas as superstições, um absoluto abandono às práticas mágicas
dos feiticeiros, dos adivinos, é ainda o rasgo dominante da raça
finesa em todos os países onde cabe o observar. Os Celtas mestizos e os
Eslavos, ao acolher em seu teología, nas épocas de decadência, as aberra-
ciones religiosas de seus vencidos, chamaram muito naturalmente com o mesmo
nome destes últimos a seus bruxos, herdeiros ou imitadores de um sacer-
docio bárbaro. Percebe-se na lascivia das ondinas esse vício tão cons-
tantemente reprochado às mulheres de raça amarela e que fué causa de
que se estabelecesse a mutilación dos pés, costume praticado como
precaução paterna e marital sobre as raparigas chinesas, e que ali onde não
tropeça com os obstáculos de uma sociedade regulamentada, dá lugar, como
em Kamtschatka, a orgías demasiado parecidas às carreiras das Ménades
da Tracia, para que não nos sintamos dispostos a reconhecer nas ar-
dentes matadoras de Orfeo a umas parentas da atual cortesana de Sua-
Tcheu-Fu e de Nanking. Não se adverte menos entre os faunos o gosto
dominante do vinho e da pastura, essa sensualidad innoble da família
mogol, e, em fim, descobre-se ali essa aptidão para as ocupações rurais
e domésticas que as lendas modernas atribuem a seus semelhantes, e que,
na época dos Celtas primitivos, podiam ser obtido facilmente de uma
raça utilitaria e essencialmente inclinada para as coisas materiais.
A assimilação completa das duas formas, faunus e pan , não oferece dei-
ficultades. Há que a levar mais longe. É igualmente aplicável, ainda que de
uma maneira menos evidente ao começo, aos vocablos khorrigan e kho -
ridwen. Assim é como os camponeses armoricanos designam aos anões
mágicos de seu país. Os Gallones dizem Gwrachan. Estas duas expressões
estão compostas de duas partes. Khorr e Gwr não equivalem senão a gon e
guun ou gan f entre os Latinos genius, em francês génie, empregado em idén-
tico sentido.
A letra r, nas línguas primitivas da família branca, tem sido de uma
extrema debilidade. O alfabeto sánscrito possui-a em três formas, e em nin-
guna reconhece-lhe a força e o valor de uma consonante. Em dois casos, é
uma vogal; em um, é uma semivocal como a í e a w que, para nossos
Esses genii, esses larths, espíritos elementares, não precisam ser compa-
rados insistentemente aos Fineses para que se reconheça neles a estes
últimos. A identidade estabelece-se por si mesma. A alta antiguidade de
esta noção, sua extrema generalização, sua ubicuidad, em todas as regiões
européias, sob as diferentes formas de uma mesma denominação, fauno,
pan, gene ou gênio, fée, khorrigan, fairy, não deixam a menor dúvida de que
descansa sobre um fundo perfeitamente histórico. Não há, pois, nenhuma
CONDE DE GOBINEAU
396
Este vocablo é idêntico a nanus , ou melhor ainda, ao céltico nan, por efeito
da lei de permutación que temos estabelecido mais acima. Nos dia-
lectos tudescos modernos, significa «louco», como antanho, entre os povos
italiotas, fatuus, derivado de jad . As línguas neolatinas consagraram-no
para designar exclusivamente um anão, com abstração de toda ideia de
desenvolvimento moral. Mas, na antiguidade, ambas noções hoje separadas se
apresentavam reunidas. O nan ou o nar era um ser laborioso e dotado de um
gênio mágico, mas tonto, curto de entendimento, bribón, cruel e licen-
cioso, sempre de talha extraordinariamente pequena, e geralmente calvo.
397
CONDE DE GOBINEAU
398
É quiçá mais difícil analisar a fundo a palavra jad. Deve ser achar# que,
mutilada como pi t'borracha, pela necessidade de fazer dela uma raiz, tem
perdido a parte que gnomo tem conservado, e eliminado a que conservo
este último vocablo. Segundo esta hipótese, jad não seria outra coisa que pit ,
em virtude de mutaciones tanto mais admissíveis quanto que a vogal, que é
longa na forma sánscrita, estava do todo preparada para receber ao influjo
de outro dialeto uma pronunciación mais longa.
pit'gene,
fingem ,
fu gene ,
fuuen e
gan,
fínn e /em.
Hoje o vocablo Finés tem perdido, com o uso, sua verdadeira acepción,
e os povos aos quais se aplica são, pelo menos em sua maioria,
mestizos germánicos ou eslavos, de graus muito diferentes.
399
Este baixo relevo encontra seus análogos nas grosseiras estátuas chama-
dá baba, que vemos ainda em tantas colinas das proximidades de o
Yenisey, do Irtisch, do Samara e do mar de- Azof, e de todo o Sur de
Rússia. Como elas, leva impresso de uma maneira inequívoca o tipo mogol.
Amiano Marcelino prestava fé a esta circunstância; Ruysbock assinalou-a
ainda no século XIII, e* no XVlll, Pallas a sublinhou de novo. Em fim,
uma copa de cobre, descoberta em um túmulo do governo de Oremburgo,
está decorada com uma figura análoga, e, para que não subsista a mais leve
dúvida sobre as personagens que se quis reproduzir, um dos babas
do museu de Moscou tem uma cabeça de animal, e oferece assim a imagem
incontestable de um desses Neuros que gozam da faculdade de trans-
formar-se em lobos.
Nesse saquito não pode ser visto senão a bolsa sagrada no qual os
atuais Chamanes conservam seus objetos mágicos, e que, efetivamente, é
absolutamente indispensável, bem como o que contém, ao exercício de seu
CAPÍTULO II
Há motivo para achar que os Tracios não pertenciam senão muito débil-
mente às tribos amarelas, já que estas, quando as encontra
puras, são, em general, pouco guerreiras, e o sentimento belicoso dismi-
nuye em um povo à medida que a proporção do sangue amarelo aumenta
nele* Depois os Gregos falam deles muito com frequência nos tempos
históricos. Empregavam-nos, juntamente com mercenários procedentes das
tribos escitas, em qualidade de soldados de polícia, e conquanto se escandalizan
de seu grosería, em nenhum momento falam daquela estranha fealdad que
era o rasgo da raça finesa. De ter tido motivo, não tivessem deixado
de falar-nos da cabellera rala, da carência de barba, dos pómulos
puntiagudos, do nariz roma, dos olhos flangeados, em fim, da cor
estranho dos Tracios, se estes tivessem pertencido à raça amarela.
Do silêncio dos Gregos sobre este ponto, e do fato de ter com-
siderado sempre a esses povos como semelhantes a eles mesmos, salvo
a rusticidad, infiro ainda que os Tracios não eram Fineses.
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CONDE DE GOBINEAU
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Como, pelo demais, o Ibero dos Pirineos poderia ser de raça pura?
A nação inteira tem sido absorvida entre as misturas célticas, semíticas, ro>
mana, góticas. Quanto ao núcleo, refugiado nos altos vales das
montanhas, sabe-se que a seu arredor e cerca dele foram a procurar um
asilo numerosas capas de vencidos* Não pode pois ter permanecido mais
intacto que os Aquitánicos e os Roselloneses.
Aqui, a luz salta à vista, e com intensidade suficiente para deixar dê^
truídas quase todas as incertezas. Os Iberos, pesados e rústicos, não bár^
baros, possuíam leis, formavam sociedades regulares. Seu caráter era tacri
tumo, seus costumes sombrios. Iam vestidos de negro ou com trajes de
cores apagadas, e não mostravam essa paixão do ornato tão geral entre
os Melanios. Sua organização política resultou pouco vigorosa; pois, depois
de ter ocupado uma extensão de território seguramente considerável, esses
povos, jogados de Itália, arrojados das ilhas e desposeídos de uma grande
parte de Espanha pelos Celtas, o foram, mais tarde também, e sem grande
esforço, pelos Fenicios e os Cartagineses.
4°4
CONDE DE GOBINEAU
Com tudo, nem esta expressão de Virgilio, nem as imagens que tão bem
comenta, aplicam-se, no pensamento do poeta, a indivíduos da raça
puramente rasena* Imagens e descrições poéticas referem-se aos Etrus-
eos da época romana, de sangue muito misturado* É uma nova prova,
e uma prova concluyente, que a imigração civilizadora tinha sido com-
parativamente débil, já que não tinha modificado sensivelmente a natu-
raleza das massas* Assim, basta unir estes dois fenômenos da conservação
de uma língua estranha à família branca e de uma constituição fisiológica
não menos diferente, para estar autorizados a inferir que o sangue da raça
submetida tem conservado o predominio na fusão, e deixou-se guiar,
mas não absorver, pelos vencedores de melhor esencia*
A demonstração deste fato encontra-se ainda no sistema de
cultura particular dos Etruscos* Não falo aqui — uma vez mais o assinalo —
do conjunto raseno-tirreno ; não me refiro senão ao que pode me ajudar
a descobrir a verdadeira natureza da população rasena primitiva*
A religião tinha seu tipo especial* Seus deuses, muito diferentes dos de
as nações helénicas semitizadas, não desceram nunca à Terra* Não se
mostravam aos homens, e limitavam-se a dar a conhecer suas vontades por
meio de signos, ou por mediação de certos seres de uma natureza conv
pletamente misteriosa* Em consequência, a arte de interpretar as escuras
manifestações do pensamento celeste fué a principal ocupação de os
sacerdocios* O arúspice e a ciência dos fenômenos naturais, tais como
a tormenta, o raio, os meteoros, absorveram as meditaciones dos ponha-
tífices, e criaram-lhes uma superstição bem mais estreita e sombria, mais
meticulosa, mais subtil, mais pueril que aquela astrología dos Semitas, a
qual tinha pelo menos a vantagem de se desenvolver dentro de um campo
imenso e de consagrar-se a mistérios verdadeiramente espléndidos* Enquanto
o sacerdote caldeo, subido a uma das torres de que o panorama de Babi-
lonia ou de Nínive estava arrepiado, seguia com mirada curiosa a marcha regu-
lar dos astros semeados com profusão no firmamento sem limites e
aprendia pouco a pouco a calcular a curva de suas órbitas, o adivinho etrusco,
grosso, obeso, de pequena talha, de larga face, errante, triste e inquieto, em
as selvas e marismas salinas que bordean o mar Tirreno, interpretava o
ruído dos ecos, tremia ao fragor dos trovões, se sobresaltaba ao ouvir
o vôo de um pássaro entre os ramos, e tratava de dar um sentido aos mil
acidentes vulgares da solidão. O espírito do Semita perdia-se em fanta^
sías absurdas sem dúvida, mas grandes como a natureza inteira, e que pres-
taban a seu imaginación as maiores asas. O Raseno arrastava o seu entre
as combinações mais mesquinhas, e se o um rayaba na loucura ao querer
enlaçar a marcha dos planetas com a de nossas existências, o outro
rozaba a imbecilidad tratando de descobrir uma conexão entre a caprichosa
dança de um fogo fatuo e determinados acontecimentos que lhe interessava
prever. Em isto precisamente estriba a relação entre os extravíos da
criatura indiana, suprema expressão do gênio ario misturado ao sangue negro,
L íos do espírito chinês, tipo da raça amarela animada por uma infusión
mea* Segundo esta indicação, que assinala como último termo dos erro-
CONDE DE GOBINEAU
406
407
3 ue desta vez a posteriori , e não será nem a última nem a mais impressionante,
e que o fundo primitivo das populações da Europa meridional é
amarelo. Está bem claro que este elemento étnico não se encontrava em
estado puro entre os Iberos, nem ainda entre os Etruscos de primeira formação.
O grau de aperfeiçoamento social a que tinham chegado essas nações,
ainda que bastante humilde, indica a presença de um germen civilizador que
não pertence ao elemento finés, e que só este elemento é susceptível de
servir em verdadeiro grau.
408
CONDE DE GOBINEAU
CAPÍTULO III
Os Galos
Por outra parte, não há dúvida que ao sair de Ásia não se resignaron a
avançar pelo Oeste, muito menos atrayente que o Sur, e, ademais, ocupado
já por multidões de povos amarelos, senão porque as rotas meridionales
íes estavam visivelmente fechadas e proibidas pelas concentrações de
Arios em marcha para a Índia, o Ásia Anterior e Grécia. Assim, pois, seu
chegada à Europa ocidental, por antiga que a suponha, é em muito
posterior ao aparecimento dos Arios nas cristas do Himalaya e de os
Semitas pelo lado de Armenia. Agora bem, segundo dados aceitáveis, a
época aproximada desse aparecimento tem sido fixada no ano 5000. É, pois,
entre esta data e no ano 2000 aproximadamente quando há que procurar
a época do estabelecimento dos Celtas no Oeste.
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(1) Rawlinson, Memoir on the babylonian and assyrian Inscriptions, 1851, p, XXL
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CONDE DE GOBINEAU
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As armas dos Kymris eram de metal (3), alguma vez de pedra, mas,
neste caso, muito finamente polidas por meio de utensílios de bronze ou de
ferro. Parece inclusive que as espadas e os machados desta última espécie,
encontradas nas tumbas, eram mais bem emblemáticas ou destinadas a usos
sagrados que a um emprego sério. À mesma categoria pertenciam, indiscu-
tiblemente, os glavios e multidão de armas em terra cocida, ricamente do-
radas e pintadas, que não podem ter tido senão um destino puramente
figurativo. Pelo demais, é também muito provável que os indivíduos de
a plebe mais humilde fizessem arma de tudo. Resultava-lhes menos caro
e mais fácil enmangar um guijarro furado em uma bengala que se tentar
um machado de bronze. Mas o que estabelece de uma maneira irrecusable que
essa circunstância não implica em modo algum a ignorância geral de os
metais e a inhabilidad para lavrá-los, é que as línguas gálicas possuem pa-
lavra próprias para denominar esses produtos, vocablos cuja origem não se
encontra nem no latín, nem no grego, nem no fenicio. O que alguns
desses vocablos tenham uma acusada afinidad com seus correspondentes gelei-
nicos, não significa que tenham sido contribuídos pelos Masaliotas. Estas seme-
janzas demonstram unicamente que os Arios Helenos, pais dos Focen-
ses e avôs dos Celtas, procediam de uma raça comum.
O ferro chama-se ieme, irne , uim, jarann ; o cobre copar , e era o metal
412
CONDE DE GOBINEAU
i
mais usado entre os Galos para a fabricação das espadas; o chumbo*
ludid ; o sal* hal, sal.
4*3
4*4
CONDE DE GOBINEAU
Mas não cabe negar a evidência* O campo de Peran mostra seus construc-
cienes vitrificadas sob uma mampostería romana, e não é duvidoso que este
gênero imperecível de trabalho não seja obra dos Celtas. Sua antiguidade
é certamente das mais remotas* Vejo a prova disso neste fato,
que em tempo dos Romanos Escócia tinha chegado à decadência, e
que tais monumentos rebasaban, de qualquer jeito, suas necessidades e os
recursos de que dispunha. Há que os atribuir, pois, a uma época em que a
população caledoniense não tinha sofrido ainda nasta um ponto degradante
a mistura com as hordas finesas que a rodeavam.
415
pinas pareciam Ter estado não menos povoadas* Pode ser induzido isto
do número considerável de cemitérios descobertos no diferentes re-
Sitie de dê Europa céltica* A extensão desses campos mortuorios é
geralmente notável* Neles não há túmulos* Esta construção» quando
contém um dolmen, pertence aos primeiros habitantes fineses: não nos
achamos aqui ante essa variedade* Quando encerra uma câmera sepulcral de
manipostería pertence aos príncipes, aos nobres, às classes opulentas
das nações. Os cemitérios são, mais modestamente, o último asilo
das classes médias ou populares. Não oferecem mais que tumbas lisas, em sua
maioria construídas com esmero, talhadas com frequência na rocha ou abertas em
a terra apelmazada* As tumbas estão cobertas por uma lousa* Os corpos
têm sido quase^ sempre incinerados* Ainda que este fato presente a o
guna exceção, sua frequência estabelece uma espécie de distinção supre-
mentaria entre os cadáveres dos mas antigos indígenas» sempre ente-
ros»^ e os dos ^Celtas* Em todo caso, os túmulos com câmeras funerarias»
pelásgicas e ciclópeas, monumentos provavelmente contemporâneos de os
cemitérios» não encerram nunca esqueletos intactos, senão sempre osamen-
tas incineradas guardadas em urnas.
Não basta fugir de tão burdos erros : há que os dissipar até onde
seja possível, fixando em vários detalhes importantes* Os Celtas, hábeis
em tão diversos trabalhos, não podiam permanecer estranhos à necessidade de
remunerá-los e de reconhecer-lhes um valor* Conheciam o emprego do numera-
n0t V j tV f s slglos dantes da Ue S ada de César acuñaban moeda para as
necessidades do comércio exterior* Possuíam peças de ouro, de prata, de ouro-
prata e de cobre, de cobre e chumbo, de ferro, de cobre, redondas, cua-
dradas, radiadas, cóncavas, esféricas, lisas, grossas, delgadas, acuñadas em
^ Ue j° ^j Gn reHeve * P n & ra P n dniero destas moedas foram visivelmente
produzidas sob a influência masaliota, macedónica ou romana. Mas outras
escapam inteiramente a toda suspeita de um parentesco análogo. São certa,
mente as mais antigas : remontam-se muitíssimo para além da data que
acabo de indicar* Há — as radiadas — que encontram suas análogas
CONDE DE GOBINEAU
416
Tácito, por sua vez, assinala um fato que parece se remontar a uma
' época pelo menos tão afastada. Dizia-se em seu tempo que existiam na
Germania e nos Alpes Recios monumentos antigos cobertos de ins-
cripciones gregas. Acrescentava-se que estes monumentos tinham sido levantados
por Ulisses por motivo de seus grandes peregrinaciones setentrionais, aven-'
turas das quais não temos o relato (1). Ao referir esta tradição. Tácito,
muito sensatamente, expressa a dúvida de que o filho de Laertes tivesse via-
jado nunca pelos Alpes e pelo lado do Rin ; mas sua reserva aparece
excessiva quando da pessoa do viajante se estende à existência das
inscrições mesmas (2).
Mas Tácito e César acrescentam que esses carateres, esse alfabeto tão usado,
cuja presença não oferece já nenhuma dúvida em Alemanha (4) e se registra
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de Atila. . , .
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Disso resulta sem dúvida que os Kinross não podiam estar dotados, inte-
lectualmente, como o estão as nações melanizadas do Sur. Se esta com-
dición plotava sua impressão nas produções literárias, não se mostrava
menos sensível no domínio das artes plásticas. De todo o bagaje que
os Galos deixaram depois de si nesse gênero, e que suas tumbas nos têm apor-
tado, pode ser admirado a variedade, a riqueza, e a excelente e sólida com-
fección ; não cabe, em mudança, extasiarse ante a forma. Esta é das mais
vulgares, e não brinda nenhuma impressão que permita reconhecer um espírito
que se compraze, como no Ásia Anterior, em revestir de belo aspecto os
menores objetos ou que sente a necessidade de satisfazer um gosto exigente.
4 2 5
Vê-se que seu sistema de governo era bastante complicado para que
mereça um estudo sério. Um chefe electivo, um corpo de nobreza metade sa-
cerdotal, metade militar, uma classe média, em uma palavra a organização
branca e, embaixo, uma população servil* Excepto pelo brilho das cores,
se creria estar na Índia*
CONDE DE GOBINEAU
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CONDE DE GOBINEAU
O homem amarelo mata sem emoção e para encher uma necessidade momen-
tánea de seu espírito. Em outra parte tenho mostrado que a adoção de verdadeiras
modas ferozes, como a de enterrar a mulheres e escravos com o cadáver de
um príncipe, correspondia em Chinesa a invasões de novos povos ama-
rillos no país.
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CONDE DE GOBINEAÜ
Não era a única. A grosería primitiva tinha penetrado por todas partes
nos costumes do Celta. Como o Ibero, como o Etrusco, o Tracio e
o Eslavo, seu sensualidad, despojada de imaginación, levava-lhe comum-
mente a hartarse de comida e de licores, só para experimentar um mo-
mento de bem-estar físico. De todos modos, dizem os documentos, esta
costume arraigaba no Galo no grau em que se identificava com as
classes baixas. Os chefes não se entregavam a isso senão a médias. No povo,
mais assimilado às populações escravas, encontravam-se com frequência indi-
viduos a quem uma constante embriaguez tinha conduzido gradualmente
a uma completa idiotez. Em nossos dias encontramos ainda entre as na-
ciones amarelas os exemplos mais impressionantes de tão bestial costume.
Os Galos tinham-na evidentemente contraído por efeito de suas alianças
finesas. _
A todos esses efeitos morais ou gerais, não falta senão acrescentar os resul-
tados produzidos na língua dos Kinris pela associação dos ele-
mentos idiomáticos procedentes da raça amarela. Estes resultados são
dignos de consideração.
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CAPÍTULO IV
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que é Hesíodo, não como saído de sua raça, senão porque considero e celebrou
particularmente seus trabalhos, apresenta-os muito apegados a ocupa-as-
ciones rústicas* Esses pastores são igualmente aptos para levantar grandes
muralhas, para construir câmeras funerarias, para amontonar túmulos de
terra de uma imponente extensão. Agora bem : todas estas obras as
temos observado já nos países célticos. Reconhecemo-las como análogas,
quanto aos rasgos gerais, às que cobriram o solo do França
e de Alemanha, sob a ação dos primeiros mestizos alvos.
Não se deve também não esquecer que o teatro das superstições menos
conforme com a natureza do espírito asiático permaneceu sempre esta-
blecido no seio das regiões setentrionais de Grécia. Os ogros,
lhes lémures, a entrada do Tártaro, toda essa fantasmagoría siniestra se
encerrou no Epiro e a Caonia, províncias em que o sangue semitizada não
penetrou senão muito tarde, e em que os aborígenes mantiveram por mais
tempo sua pureza.
Mas se por todas essas causas, estes últimos parecem dever ser com-
presos na faixa das nações célticas, há motivos para excetuar
a outras tribos.
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Para além, para o Norte, conheceu-se ainda aos Latinos, depois aos Rásenos
e aos Umbríos.
Esta classificação, por arbitrária que seja, tem por primeira e asaz
grande vantagem o restringir consideravelmente o aplicativo do título vadio
de aborigen. Em todo momento crê-se conhecer o que se nomeou.
Pôs-se pois aparte aos povos já classificados, Ausonios, Sabelios, Rá-
seios, Latinos e Umbríos, e formou-se uma categoria especial daqueles
que não permaneceram aborígenes senão porque não se tinha tido contato
bastante íntimo com eles para lhes atribuir um nome. Desse número foram
os Ecuos, os Volscos e algumas tribos de Sabinos.
da Galia. Enlaçavam-se por sua raça com as nações que têm seguido
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O verbo lavrar, arar, e o gaélico ra, com as duas forma galas aru e
aredig; o campo, arvum, com o gaélico ar e o galo arw; o trigo, hordeum ,
e o gaélico eorma; a mies, seges, e o bretón segall; o haba, faba, e o
galo ffa ; a vid, vitis, e o galo gwydd ; a avena, avena, e o bretón Havre ;
o queijo, caseus, e o gaélico caise f com o bretón casu; butyrum, a manteca,
e o gaélico butar; a candela, candela , e o bretón cantol; o tenha, fagus , e
o erse feagha, com o bretón fao e faouenn; a víbora, vipera, e o galo
gwiper; a serpente, serpens, e o galo sarff; ía noz, nux, e o gaélico cnu,
exemplo notável dessas mudanças de sones frequentemente sofridos por os
monosílabos ao passar de um dialeto a outro.
funde, bem com o vocablo fortis , animoso; o rio, amnis , gaélico amha,
amhuin ; o rei t rex, gaélico righ ; mensis, no mês t galo meus; a morte t
ynurn , galo, e morrer, morri bretón marheuein. Terminarei com penates , que
não tem etimología senão em céltico (i): este vocablo não se dêem vai de uma
maneira simples e inteiramente satisfatória senão do galo penaf , que queira
dizer «educado», e que tem por superlativo penaeth, «muito educado, o mais
educado».
Mas não era possível às raças italiotas manter o mais mínimo seu
pureza. Iberos, Etruscos, Vénetos, Ilirios, Celtas, metidos em guerras per-
manentes, deviam todos, a cada momento, perder ou ganhar terreno. Era
o estado ordinário. Esta situação piorava por efeito dos costumes
(i) Nada pode o provar melhor que a leitura do bilhete em que Dionisio de
Halicarnaso se encarniza em encontrar a esta denominação etnológica um sentido que
escapa-lhe, pese a todos seus esforços, bem como a seus comentaristas. [Ant. Rom.
C. XLVII.)
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Tenho aqui o que se sabe, o que pode ser visto dos atos mais antigos
da jx>blación primitiva de Itália, população que, em general, escapa à
acusação de barbarie, mas que, a exemplo dos Celtas do Norte, limi-
taba sua ciência ^ social à investigação da utilidade material. Muitas
guerras dividiam-na, e no entanto florescia nela a agricultura; seus cam-
pos eram cultivados e produtivos. Pese à dificuldade de atravessar as
montanhas e os bosques, de cruzar os rios, seu comércio ia procurar os
povos mais setentrionais do continente. Numerosos pedaços de ám-
bar, conservados em bruto ou. cortados em colares, encontram-se frequente-
mente em suas tumbas, e a identidade, já assinalada, de certas moedas ra-
senas com as da Galia demonstra irrefragablemente a existência de rela-
ciones regulares e permanentes entre ambos grupos.
Nessa época tão remota as lembranças étnicas ainda recentes das
raças européias, sua ignorância dos países do Sur, a similitud de suas ne-
cesidades e de seus gustos, deviam ^tender necessariamente a acercá-los. Desde
o Báltico até Sicília (1) existia uma civilização incompleta, mas real
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CAPÍTULO V
Com tudo, não pretendo tratar com indiferença o que chamo aqui cues -
tión de forma, e do mesmo modo que não tomarei nunca como tipo de
homem social ao industrial consumado ou ao mercader mais hábil, e que colo-
caré sempre acima deles e certamente a uma altura incomparável,
seja ao sacerdote, seja ao guerreiro, ao artista, ao administrador ou o que se
lume hoje o homem de mundo e que em tempos de Luis XIV se denomi-
naba homem decente; e do mesmo modo que preferirei sempre, na
esfera dos homens selectos, san Bernardo a Papin ou a Watt, Bossuet a
Jacques Coeur, e Louvoís, ou Turenne, ou o Ariosto, ou Comam-lhe a todas as
celebridades financeiras, assim também não chamo civilização ativa, civiliza-
ción de primeira ordem, à que se contenta com vegetar escuramente, não
dando a seus partidários senão satisfações em definitiva muito incomple-
tas e em demasía humildes, confinando seus desejos sob uma esfera limitada
e desenvolvendo-se dentro daquele torque de aperfeiçoamentos limita-
dois cuja cúspide tem sido atingida por Chinesa. Agora bem; enquanto
um grupo de povos reduz-se, por toda mistura, ao elemento amarelo
combinado com o alvo, não adquire nas qualidades, as capacidades,
as aptidões, sejam mistas, sejam novas, criadas por esse enlace, nada que
atraia-o para a corrente necessária do elemento feminino e leve-o a
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ción com o dos Rásenos. Estes vencedores conseguiram dar, pois, à socie-
dêem, para maior honra desta, suas formas exteriores; no entanto, não
conseguiram levar a uma assimilação completa com o helenismo. Pelo
demais, não o possuíam eles mesmos senão em uma dose asaz débil, já que
não eram Helenos, senão unicamente Kinris, Eslavos ou Ilirios Gregos. Dê-
pués dispuseram-se sem pena a compartilhar bom número de ideias essenciais
que a parte semítica de seu sangue não tinha destruído em seu próprio seio.
Daí essa continuidade do espírito utilitario na raça etrusca^daí esse
predominio do culto e das crenças antigas na mitología importa-
dá; daí, em uma palavra, a persistência das aptidões eslavas. A
massa da nação permaneceu, com pouca diferença, tal como era dantes de
a conquista. Como, no entanto, os vencedores, pese a suas concessões
e suas misturas ulteriores com a população, viram-se assinalados com um selo
especial devido a sua origem semiasiático, a fusão não fué nunca completa
e numerosas tensões prepararam as revoluções e desgarros.
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esse perigoso tipo, não puderam destruir uma aptidão finesa que tenho tido já
ocasião de assinalar: os Etruscos professavam pela pessoa dos chefes e
dos magistrados um respeito verdadeiramente ilimitado (1).
Daqui por diante desejavam atravessar este rio, sequer para aproximar-se a o
estreito, em onde Cumas lhes atraía tanto como Vulturno*
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toria. ... ,
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Não é necessário fazer realçar, sem dúvida, que não se trata aqui senão de
um antagonismo orgânico, instintivo, entre os Sículos e os Etruscos, e em
modo algum uma luta aberta e material. Seguramente esta última não
tivesse tido traça de triunfar. Foi a própria Etruria quem, muito apesar
seu, se encarregou de lançar a Roma naciente na senda das agitações
políticas.
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CONDE DE GOBINEAU
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Esse refúgio, que outro podia ser senão a cidade etrusca que, após
Volsinii, tinha mostrado maior entusiasmo pela revolução, e, sem dúvida
devido a sua excêntrica posição territorial, a seu isolamento para além de o
Tíber, tinha levado mais longe suas doutrinas e aplicado mais abertamente
aquelas ideias? Roma vió assim como iam Mastama, Coelius, e sua gente;
e o tuscus vicus, convertido em residência desses desterrados (i), alargou
ainda o recinto de uma cidade que, desde o ponto de vista de suas aris-
tocráticos fundadores, como do dos reformadores liberais, era uma espe-
cie de campo aberto a todos aqueles que iam em procura de uma pátria, e
desejavam adquirir no seio da negação de todas as nacionalidades.
CONDE DE GOBINEAU
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Roma não tinha nenhum motivo para deter neste ponto. Precisa"
mente as razões que a impelían tão calurosamente para o partido liberal,
que a tinham levado a aplicar as teorias do mesmo, que a tinham desig"
nado para servir, em verdadeiro modo, de segunda capital à revolução, essas
razões, pelo enérgicas, conduziam-na bem mais lá de uma simples refor-
ma política. Se não gostava de que dominassem os Lucumones, era, antes de mais
nada,
porque estes, com os melhores direitos para se chamar seus fundadores, seus
educadores, seus maestros, seus bienhechores, não tinham o de se chamar seus com-
cidadãos. Na debilidade de seus primeiros dias, tinha encontrado um grande
proveito, uma verdadeira necessidade fazendo-se proteger por eles; mas seu
sangue, no entanto, não se tinha fundido com a sua, suas ideias não se tinham
convertido nas suas, nem seus interesses em seus interesses. No fundo, era
sabina, era sícula, era helenizada; depois estava geograficamente separada
de Etruria : de fato, resultava pois para ela estrangeira, e tenho aqui por
que a reação dos Tarquinos não podia triunfar durante um período mais
curto que nas outras cidades, realmente etruscas, e por que, uma vez derri-
bada a aristocracia tirrena, tinha que esperar que Roma se precipitasse em
as inovações em um grau maior do que desejavam os liberais de
Etruria. Mais ainda : cedo vamos ver como a cidade emancipada retorna
às teorias liberais, origem primeira de sua jovem independência, e resta-
blece a aristocracia em toda sua plenitude. As revoluções, pelo demais,
estão cheias de surpresas parecidas.
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CAPITULO V
Roma italiota
Quem possuía a ciência sob todas suas formas, política, judicial, mili-
tar, religiosa, augural? Os nobres etruscos, e quase ninguém mais* Eles eram
quem tinham dirigido aquelas grandes construções da Roma regia,
algumas das quais sobrevivem ainda, e que ultrapassavam de muito
todo o que podia ser visto nas capitais rústicas das outras nações italio-
tas. Eles eram quem tinham levantado os admiráveis templos da pri-
mera época, e eles também quem tinham facilitado o ritual indispensável
para a adoración dos deuses. Sem eles, pois, a Roma republicana não podia
nem construir, nem julgar, nem rezar. Por esta última e importante função da
vida tanto doméstica como social, seu concurso resultou sempre de tal modo
necessário que, ainda sob os imperadores, já desaparecida tempo tem Etru-
ria, e quando levavam séculos os Romanos, absorvidos pelas ideias gregas,
sem aprender já sequer sua língua, órgão verdadeiro da antiga civili-
zación, era ainda preciso, para diversos menesteres do Santuário, com-
fiar-se a sacerdotes que só existiam em Toscana. Mas, no último mo-
mento, não se tratava senão de ritos; sob a Roma republicana, tratava-se
de tudo. Ao jogar aos fundadores do Estado, arrancaram-se os elementos
mais essenciais da vida pública, e não teve outro recurso, depois de felici-
tarse da liberdade conquistada, que o de conformar com a miséria e de
fazer o elogio dela sob o nome de virtude austera. Em lugar das
ricas teias de que se servissem os senhores da Roma regia,' os patricios de
a Roma republicana envolveram-se em toscos sayos. Em vez de formosas
porcelanas, de platos de metal, hacinados nas mesas e cheios de manjares
suculentos, não dispuseram senão de uma ruda louça, mau fabricada por eles
mesmos, na que se serviam um triste condumio. Em vez de edifícios bem
decorados, tiveram que se contentar com choças, nas que, entre os cer-
dois e as gallinas, viviam os cónsules e os senadores, quem se gloriaban
de semelhante vida, a falta de não poder gozar outra melhor. Em uma palavra,
para compreender até que ponto a Roma republicana se encontrava por
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Esta paixão, viva como nas nações helénicas, não oferecia o mesmo
no duro despotismo. A delegação que de seus poderes a pátria fazia à lei
infundía ao culto dos Romanos por essa divinidad um caráter bem mais
regular, mais sério e, em soma, mais moderado. A pátria reinava sem dúvida,
mas não governava, e ninguém pensava, como entre os Gregos, em justificar os
caprichos das facções, suas enormidades e suas exacciones cobrindo-os
com esta única palavra : a vontade da pátria. Para os Gregos, a lei,
feita e desfeita todos os dias, e constantemente em nome do poder
supremo, não tinha nem prestígio, nem autoridade, nem força. Em Roma, por
o contrário, a lei não se revogava nunca, pelo dizer assim; estava sempre
viva, sempre em ação, a encontrava por todas partes; só ela orde-
naba, e, de fato, a pátria permanecia em seu estado de abstração, e, ainda-
que muito venerada, não tinha direito a se fazer ouvir todas as manhãs a tra-
vés dos altisonantes discursos de um novo e péssimo revolucionário, como
com excessiva frequência produzia-se no Pnyx.
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Roma triunfou. Depois, quando por esse lado suas armas lhe tinham ase-
gurado não só descanso senão também o domínio, aproveitou as . difi-
cultades inextricables em que os esforços dos Galos sumiam a seus antigos
dominadores, e, atacando pelas costas, atingiu sobre eles vitórias que,
sem essa circunstância, tivessem sido provavelmente mais disputadas e mais
incertas.
mapa dos Estados contemporâneos não nos «mostra « senão três categorias
de povos em situação de lutar com a República.
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CONDE DE GOBINEAU
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Doze Tabelas e o que falava Cicerón, a diferença era tal que o sábio
orador não as entendia senão muito dificilmente* Passo por alto os cantos sa-
binos, que resultavam ainda mais difíceis. A partir de Ennio, o latín teve
a honra jogar a um lado o que oferecia de itálico.
sacrificar para que lhe servissem de ponte. Triunfar era tudo, e, depois,
prosseguir o vôo*
Sila não tinha ido a procurar nas teorias ideais o plano do regime
regenerador que se propunha impor. Queria simplesmente restaurar por
inteiro a dominación patricia, e, por esse meio, restabelecer a ordem e a
disciplina na República novamente consolidada. Não demorou em advertir
que o mais difícil não era sufocar os motines ou derrotar os exércitos ple-
beyos, senão mais bem encontrar uma aristocracia digna da magna tarefa
que lhe queria brindar. Hacíanle falta Fabios, Horacios; não deixou de lla-
marlos, mas não conseguiu lhes fazer sair daquelas luxuosas moradas onde
residiam suas imagens, e, como não retrocedia ante nada, quis criar de
novo a nobreza que não encontrava.
Então, mais temível para seus amigos que para seus inimigos, se lhe
vió podar e repodar despiadadamente a árvore da nobreza romana. Para
infundir a virilidad a um corpo depauperado, segó cabeças a centenas,
arruinou, desterrou àqueles que não pôde matar, e tratou com a máxima
ferocidad não tanto aos indivíduos da plebe, inimigos francos, como
aos grandes, obstáculos diretos de seus propósitos por seu impotencia a
secundarlos. A força de desmochar o velho tronco, imaginou-se que fazia
sair novos brote, portadores de tanta savia como os de dantes. Esperava
que após ter eliminado os ramos mesquinhos, conseguiria, com ame-
nazas, formar homens valentes, e que assim a democracia receberia de sua
mão, para ser definitivamente abatida, chefes inflexíveis e resolvidos.
No duro resultaria ter que reconhecer que tais meios fossem tidos
por bons. O mesmo Sila cessou de crê-lo. Ao final de uma longa carreira,
depois de de esforços cuja intensidade se mede pelas violências que acumula-
rum,^ Sila, desesperando do porvenir, triste, extenuado, desalentado, aban-
doou por si mesmo o machado da ditadura, e, resignándose a viver ocioso
no meio daquela população patricia ou plebéia à que sua sozinha presença
fazia tremer ainda, demonstrou pelo menos que não era um ambicioso
vulgar, que tendo reconhecido a inutilidad de seus esforços, nenhum
empenho sentia em conservar um poder estéril. Não tenho por que dedicar
elogios a Sila, senão que deixo àqueles que não sentem uma respeitosa ad-
miración ante o espetáculo de semelhante homem, fracassado naquela
empresa, a tarefa de reprocharle seus excessos.
Nenhum meio lhe dió resultado. O povo que ele queria fazer voltar a
os costumes e à disciplina das velhas épocas não se parecia em nada
ao povo republicano que as tinha praticado. Para convencer-se disso,
basta comparar os elementos étnicos dos tempos de Cincinato com os
que existiam na época em que viveu o grande ditador.
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Tempos de Cincinato
Tempos de .!
Sabinos, em maio-’
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Italiotas misturados
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Semitas de África
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i *° Maioria
semi tizada ;
2 *° Minoria
ariana ;
3. 0 Subdivi-
sión extre-
ma do prin-
cipio amari-
llo,
É essa a justiça que há que lhe fazer; mas é indiscutible que o mais
terrível dos gênios não pode conter por muito tempo a ação de
as leis naturais, do mesmo modo que os trabalhos do homem não pue-
dêem impedir que o Ganges faça e desfaça as ilhas efêmeras com que esse
rio povoa seu espacioso leito.
CAPÍTULO VII
Roma semítica
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Seja o que for, a literatura nasceu, e com ela uma boa parte, sem
discussão, da ilustração nacional, e a causa do ruído que fez o
restante; pois não deixará de se reconhecer que a massa semitizada de onde
saíram os poetas e os historiadores latinos deveu a sua sozinha impureza
o talento de escrever com eloquência, de maneira que são as doutos ênfases
dos bastardos colaterales quem permitiram-nos admirar os altos
fatos de antepassados que, de ter podido revisar e consultar seus genea-
logías, tivessem-se apressado a renegar, dantes que nada, de seus respeitosos
descendentes.
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Mas, com que elementos fué criada aquela gente da Província, ou,
como ela mesma se denominava, aqueles verdadeiros Romanos? Dois séculos
dantes tivesse-se podido compor seu sangue com uma mistura italiota*
Daqui por diante, como a mesma mistura italiota se via quase absorvida por
as contribuições semitizadas, fué sobretudo destes últimos que se formou
a nova população. Com ela mezcláronse, em multidão, antigos soldados
CONDE DE GOBINEAU
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Com os grupos semíticos atraídos para o solo galo pela ação dei-
reta do governo teve ainda várias classes de indivíduos cuja estância
temporal ou permanência fortuita e contínua contribuíram a transformar
o sangue gala. Os empregados militares e civis da República contribuíram,
com seus costumes fáceis, grandes causas de renovação na raça. Os
mercaderes, os especuladores, foram também ali; os que traficavam
com escravos não foram os menos ativos, e a derrota moral dos Galos
ficou consumada, como o é hoje a dos indígenas de América, por o
contato de uma civilização inaceitável para aqueles a quem era ofre-
vida, enquanto seu sangue permaneceu pura, e, portanto, sua inteligen-
cia fechada às ideias estrangeiras.
O que daqui por diante se denominou Galo não designou já a um Gall, sina
unicamente a um habitante do país possuído antigamente pelos Galls , de o
mesmo modo que quando dizemos um Inglês não pretendemos indicar um
filho direto dos Sajones de longas barbas vermelhas, opresores das tribos
bretonas, senão um indivíduo saído da mistura bretona, frisona, inglesa,
dinamarquesa, normanda e, portanto, menos Inglês que mestizo. Um Galo
da Província representa, de tomar as coisas ao pé da letra, o produto
semitizado dos elementos mais dispare; um homem que não era nem Ita-
liota, nem Grego, nem Asiático, nem Gall, senão um pouco de todo isso, e que em-
fechava em sua nacionalidade, formada de elementos inconciliables, esse espí-
ritu ligeiro, esse caráter impreciso e cambiante, próprio de todas as raças
degeneradas. O homem da Província era quiçá a pior instância de todos
os enlaces operados no seio da fusão romana; mostrava-se, entre
outros exemplos, muito inferior às populações do litoral hispânico.
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CONDE DE GOBINEAU
a Galia e só para explicar como seu sangue não pôde impedir que Roma
e Itália se semitizasen. Com esta mesma ocasião tenho mostrado em que ficou
convertida essa mesma província após sua conquista. Penetro de novo
na corrente do grande rio romano.
47 1
cia faz ver perfeitamente até que ponto eram reconhecidos a supremacía
étnica dos vencedores e os direitos que dela se derivavam.
Mas não podia ocorrer assim entre os Romanos* Como não tinha existido
nunca no mundo uma nação romana» de raça romana» não tinha tido
também não nunca na cidade que regia ao mundo uma raça que firmemente
predominasse. Um depois de outro» os Etruscos» misturados ao sangue amarelo;
os Sabinos» cujo princípio kínrico estava menos brilhantemente modificado
que a esencia aria dos Helenos» e» em fim, a multidão semítica, tinham pré-
dominado entre a população urbana. As multidões ocidentais hallá-
banse vagamente unidas pelo uso comum do latín; mas, que valia esse
latín, que de Itália se tinha desbordado sobre África, Espanha, as Galias e
o Norte de Europa, seguindo a orla direita do Danubio e rebasándola
às vezes? Não era em modo algum o rival do grego, ainda estando este co-
rrompido, difundido no Ásia Menor até a Bactriana e inclusive até o
Pendjab; era mal a sombra da lenda de Tácito ou de Plinio; um
idioma elástico conhecido com o nome de lingua rustica , confundindo-se
aqui com o oseo, emparejándose lá com os restos do umbrio, mais longe
tomando do céltico palavras e formas, e assimilando-se todo o possível a o
grego nos lábios das pessoas que tendiam à finura da linguagem.
Uma linguagem de uma personalidade tão pouco exigente convinha admirável-
mente aos detritos de todas as nações obrigadas a viver juntas e a
escolher o meio de comunicar-se. A este motivo deveu-se que o latín se
convertesse na língua universal do Occidente e que ao mesmo tempo se
tenha sempre alguma dificuldade para decidir se expulsou as línguas indíge-
nas e, neste caso, a época em que veio às substituir, ou bem se se limitou
a corrompê-las e a enriquecer-se com seus despojos. A questão permanece
tão escura que se pôde sustentar em Itália essa tese, verdadeira baixo
muitos aspectos, de que a língua moderna existiu em todo tempo para-
lelamente à língua cultivada de Cicerón e de Virgilio.
Assim esta nação, que não era tal, esse conglomerado de povos domina-
do por um nome comum, mas não por uma raça comum, não podia ter nem
teve monarquia hereditaria, e fué mais bem a casualidade que uma consequência
dos princípios étnicos o que, confiando nos começos o comando às
famílias dos Julio e às casas com elas emparentadas, conferiu a uma
espécie de dinastía demasiado imperfecta, mas surgida da cidade, os
primeiras honras do poder absoluto. Fué uma casualidade, já que nada impedia,
nos últimos anos da República, que um governante de extração ita-
liota, ou asiática, ou africana, fizesse valer com sucesso os direitos do gênio.
Assim, nem o conquistador das Galias, nem Augusto, nem Tiberio, nem nenhum
dos Césares pensou um sozinho instante no papel de monarca heredita-
rio. Vasto como era o Império, não se tivesse reconhecido a dez léguas de
Roma, não se tivesse nem admitido nem compreendido a ilustração de uma raça
sabina e muito menos ainda os direitos universais que seus partidários
tivessem pretendido fazer derivar dela. Em Ásia, ao invés, se cone-
472
CONDE DE GOBINEAU
cían ainda os velhos troncos macedonios e não lhes discutia nem a glória
superior nem as prerrogativas dominatrices.
473
474
CONDE DE GOBINEAU
Tenho dito em outro lugar que se Cornelio Escipión tivesse sido vencido em
Zama, a vitória não tivesse podido alterar a ordem natural das coisas e
fazer que os Cartagineses dominassem às raças italiotas. Assim mesmo, o
triunfo dos Romanos, sob o amigo de Lelio, não impediu também não que
essas mesmas raças, depois de realizada sua obra, submergissem-se no elemento
semítico e que Cartago, a azarada Cartago, uma onda daquele oceano,
pudesse saborear também sua hora de goze no triunfo coletivo e em o
ultraje postumo aplicado na bochecha da velha Roma.
475
CONDE DE GOBINEAU
476
Assim, Roma não fué nunca, nem sob o Império, nem sequer sob a Repú-
blica, o santuário das musas latinas. Disso se dava tão perfeita conta
que, dentro de seus próprios muros, não outorgava a sua língua natural nenhuma
preferência. Para instruir à população civil, o fisco imperial sustentava a
gramáticos latinos, mas também a gramáticos gregos. Três retóricos lati-
nos, contra cinco gregos, e, ao mesmo tempo, como os escritores de língua
latina eram objeto de honras e percebiam um salário e contavam com um
público onde quer que não fosse Itália, assim também os escritores helénicos
sentiam-se retidos em Roma por vantagens análogas: testemunhas Plutarco de
Queronea, Arriano de Nicomedia, Luciano de Samosata, Herodes Cobertura
477
Assim, a cada passo que damos nos penetramos mais dessa verdade
segundo a qual Roma não possuía nada próprio, nem religião, nem leis, nem língua,
nem literatura, nem sequer primacía séria e efetiva, e o que em nossos
dias deu-se em acolher favoravelmente aprovando-o como uma feliz
novidade para a civilização. Tudo depende do que se ama e se persi-
gue, do que se censura e reprova.
Tal era o sentir general no século III, e, durante dezesseis séculos, cuan-
tosse, fossem paganos ou cristãos, têm considerado essa situação não a têm
achado nada atrayente. Assim os políticos como os poetas, e o mesmo os
historiadores que os moralistas, têm mostrado seu desprezo pelos inmun-
dois povos nos quais não cabia impor outro regime. Esse é o processo
CONDE DE GOBINEAU
478
Não é que não andem de acordo sobre a exatidão dos reproches diri-
gidos às multidões da época imperial; mas opõem àqueles defec-
tosse supostas vantagens que, a seus olhos, os reabilitam. De que se doem?
da mistura de religiões? Derivava-se disso uma tolerância universal.
Do relajamiento da doutrina oficial sobre essas matérias? Reduzia-se a
um ateísmo legal. Que importam os efeitos de semelhante exemplo par-
tendo de tão alto?
479
e passim . * '
CONDE DE GOBINEAU
480
Mas isso não lhe saía a conta ao Fisco. O imperador ditou leis dene.
gando aos curiales, sob as penas mais severas, o direito de abandonar
nunca a residência onde exerciam suas funções. Era quiçá esta a primeira
vez que uns desgraçados se viam fincados pela lei na picota de os
honras. Depois, do mesmo modo que, para humilhar e envilecer ao Senado
de Roma, tinha-se proibido a seus membros a carreira das armas, assim
também, para conservar ao Fisco os senadores provinciais e a exploração
de suas fortunas, proibiu-se a estes o rendimento na milícia e, por extensão,
o abandono da profissão de seus pais, e, por extensão também, a
mesma lei fué aplicada aos restantes cidadãos do Império; de sorte
que, devido a um singular concurso de circunstâncias políticas, o mundo
romano, que não se via já no caso de ter que isolar umas de outras a
raças diferentes, fez o que tinham decretado o brahmanismo e o sacer-
docio egípcio : pretendeu instituir castas hereditarias, ele, o verdadeiro gênio
da confusão ! Mas há momentos em que a necessidade da salvação
leva, assim, aos Estados como aos indivíduos, às inconsecuencias mais
monstruosas.
Tenho aqui aos curiales que não podem ser nem soldados, nem mercaderes,
nem gramáticos, nem marinhos ; não podem ser senão curiales, e — tiranía mais
monstruosa no meio do apasionado fervor do cristianismo naciente —
vióse, com grande menosprezo da consciência, como a lei impedia que aque-
llos miseráveis ingressassem nas Ordens sagradas, sempre como o
Fisco, vendo neles a melhor de suas garantias, não queria os soltar (2).
481
Não basta que um país tenha um soberano único para que fiquem pros-
critos o fraccionamiento e seus inconvenientes. Nesse caso, a antiga
administração do França tivesse sido unitária, o que não crê ninguém. Uni-
tario igualmente tivesse resultado o Império de Darío, outro fato muito
discutido, e, julgando-o assim, o que se conheceu baixo determinada monarquia
asiria fruto era também da unidade. A reunião dos direitos soberanos
em uma sozinha cabeça, não é pois bastante; é preciso que a ação do poder
difunda-se de uma maneira bastante normal até os últimos confines de o
CONDE DE GOBINEAU
482
corpo político; que um mesmo fôlego circule em todo esse ser e o faça
ora mover, ora dormir em um justo descanso. Agora bem, quando a cada um
dos países mais diversos administra-se segundo as ideias que lhe convêm,
não depende smo financeira e militarmente de uma autoridade remota, arbi-
traria, mau informada, e não existe ali verdadeira coesão, real amalgama.
É, se queira-se, uma concentração aproximada de forças políticas; não
constitui nunca uma unidade.
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alvo, do que surgiu uma raça especial ; que essa raça, tomando outra apor-
tación de elementos negro ou alvo ou amarelo, habíase modificado, em os
lugares afetados, no sentido ( de formar uma nova combinação* E assim,
até o infinito; de maneira que a espécie humana, submetida a tal varie-
dêem de combinações, não se achava já separada em categorias diferentes.
A partir de então era-o por grupos yuxtapuestos, cuja economia se alte-
raba a cada instante, e que, mudando sem cessar de conformação física,
de instintos morais e de aptidões, apresentavam um vasto desgrane de indi-
viduos a quem não pedia unir já nenhum sentimento comum, e que só
a violência conseguia fazer marchar a um mesmo ritmo. Tenho aplicado ao período
imperial a qualificação de semítico. Não há que tomar esta denominação
como se indicasse uma variedade idêntica à que resultou das antigas
misturas caldeas e camitas. Tenho pretendido unicamente indicar que, entre
as multidões diseminadas, com a fortuna de Roma, por todos os países
submetidos aos Césares, a maior parte se resentía de uma mistura maior ou
menor de sangue negro, representando assim, em uma gradación infinita, uma
combinação, não equivalente, senão análoga à fusão semítica. Seria impo-
sible encontrar bastantees nomes para assinalar seus inumeráveis matizes,
dotados, no entanto, a cada um deles de uma individualidad própria que
a instabilidade das alianças combinava a cada momento com alguma outra*
No entanto, como o elemento negro se apresentava mais abundantemente
na maioria desses produtos, certas aptidões fundamentais da espe-
cie melania dominavam o mundo, e sabe-se que, conquanto contidas dentro
de certos limites de intensidade e emparejadas com qualidades brancas, com-
tribuyen ao desenvolvimento das artes e aos aperfeiçoamentos intelectuais
da vida social, resultam pouco favoráveis à solidez de uma verdadeira
civilização.
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eles e curtidos nas mesmas lutas* A regra teve suas exceções; mas
tenho o catálogo imperial ante meus olhos, e não deixarei de dizer que a ma-
yoría de nomes confirma o que antecipo^
( 1 ) Suetonio, Doura., 8.
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CONDE DE GOBINEAU
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CONDE DE GOBINEAU
Assim, nada mais ridículo que essa opinião, no entanto consagrada, que
atribui à invasão dos bárbaros do Norte a ruína da civilização.
Aqueles desgraçados bárbaros, são representados no século V como uns
monstros em delírio que, se lançando como lobos famintos sobre a
admirável organização romana, despedaçam-na pelo gosto de despeda-
zarla, destroem-na unicamente para satisfazer seu afán de destruição.
Mas, inclusive aceitando um fato tão falso como admitido, ou seja que
os Germanos tivessem mostrado aqueles instintos de bruto, nada tinha
que inventar no século V em matéria de desordens. Tudo se conhecia já
nessa matéria; espontaneamente, a sociedade romana tinha abolido tempo
tem o que antanho constituísse sua glória. Nada podia ser comparado a seu em-
brutecimiento, senão seu impotencia. Do gênio utilitario dos Etruscos e
dos Kinris Italiotas, da imaginación cálida e viva dos Semitas, não
ficava-lhe já senão a arte de construir ainda com solidez monumentos
faltos de gosto, e de repetir fastidiosamente t como um idoso que cho-
chea, as coisas belas inventadas em outro tempo. Em ponto a escritores e
escultores, não se conhecia já mais que a pedantes e a pedreiros, de maneira
que os bárbaros não puderam afogar nada, pelo concluyente motivo de
que os talentos, a espiritualidad, os costumes elegantes, tudo, em uma
palavra, tinha tempo tem desaparecido. Que era, no físico e no
moral, um Romano dos séculos nem, IV ou V? Um homem de talha média,
de constituição e aspecto endebles, geralmente moreno, encerrando em
as veias um pouco de sangue de todas as raças imagináveis; crendo-se o
primeiro homem do Universo, e, para prová-lo, insolente, rastrero, ignoram-
te, ladrão, depravado, disposto a vender sua irmã, sua filha, sua esposa, sua
país e seu soberano, e dotado- de um medo insuperable à pobreza, ao sufri-
minto, à fadiga e à morte. Pelo demais, não duvidando de que o
Globo e seu cortejo de planetas não tivessem sido criados senão para ele úni-
camente.
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Para dizê-lo tudo, sem exagerar nada, quase todo o que a Roma imperial
conheceu de bom saiu de um tronco germánico. Esta verdade abarca até
tão longe que os melhores construtores do Império, os mais bravos artistas
— caberia afirmá-lo — , foram aqueles bárbaros colonizados em tão grande
número nas Galias e em todas as províncias setentrionais.
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CONDE DE GOBINEAU
pois, se o colono romano soube manejar de tal maneira o que lhe legaram as
civilizações precedentes que disso fizesse brotar princípios descono-
cidos até então e que constituíam o que deveria ser chamado uma civu
Uzación romana .
Guiada por esse único móvel, teve no entanto que desasirse às vezes de
seus hábitos de inerte tolerância.
493
Roma, estrangeira dentro de suas próprias muralhas, não pôde nunca ter,
desde sua origem, senão leis estranhas. Durante seu primeiro período, seu legis-
lación baseou-se na do Lacio, e, quando se instituíram as Doze Tabelas
para satisfazer as necessidades de uma população já muito misturada, se com>
servaron em elas^ algumas antigas estipulaciones apoiando em uma dose
suficiente de artigos escolhidos nos códigos efe a Grande Grécia. Mas
não se conseguia satisfazer ainda as necessidades de uma nação que mudava
em todo momento de natureza e, portanto, de objetivos. Os in-
migrantes, numerosos na cidade, nada queriam saber daquela com-
pilación dos Decenviros, estranha em todo ou em parte a suas ideias nacio-
nales de justiça. Os antigos habitantes, quem, por sua vez, não podiam
modificar sua lei com a mesma rapidez que seu sangue, instituíram um
magistrado especial encarregado de regular os conflitos entre os extran-
jeros e os Romanos, e os dos estrangeiros entre si. Esse magistrado, o
pretor peregrinas, teve como obrigação distintiva a de tomar sua juris-
prudência à margem das disposições das Doze Tabelas .
494
495
trabalhos uma originalidade que não aparecia em parte alguma* Fizeram mara-
villas na tarefa de apropriar-se os materiais de que dispunham, na arte
de sacar as consequências práticas que os mais subtis repliegues do texto
pudessem encerrar. Tenho aqui o que os fez grandes; isto é tudo,
e já é bastante.
CONDE DE GOB1NEAU
Esta majestade, esta grandeza, não deveu a vida senão à postración comum
de todos os povos antigos. Massa informe de corpos agonizantes ou
mortos, a força que a sustentou durante a metade de sua longa e penosa
marcha fué tomada do que era por ela mais detestado, de sua antípoda,
da barbarie. Aceitemos, se queira-se, esse nome e o sentido insultante
a ele inerente. Deixemos à multidão romana erguirse sobre suas pedestales;
não é menos verdadeiro que à medida que aquela protetora barbarie intensi-
ficó sua influência e sua atuação, vimos apontar e reinar finalmente ideias
497
32
LIVRO SEXTO
A Civilização ocidental
CAPÍTULO PRIMEIRO
gostaram de tudo, e tudo fué transitório (1). Suas agitações não chegavam a
produzir bons frutos. A razão disso é que a generalidade das na-
ciones célticas tinham chegado àquele grau ae mistura e portanto
de confusão, que não permite já nenhum progresso nacional. Tinham reba-
sado o ponto culminante de seus aperfeiçoamentos naturais e possíveis?
não podiam no futuro senão descer. São essas, no entanto, as massas
que servem de base a nossa sociedade moderna, sócias para este me-
nester a outras multidões, não menos consideráveis, que são os Eslavos
ou Wendos.
CONDE DE GOBINEAU
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jeras do Euxino. Vemos, pois, que os Eslavos não mereciam também não,
como os Celtas* o ditado de bárbaros.
Não são também não uns povos que caiba ter por civilizados, em o
elevado sentido da palavra. Sua inteligência achava-se demasiado obs-
curecida pelo grau de mistura a que tinham chegado, e, longe de ter
desenvolvido os instintos nativos da espécie branca, tinha-os, por o
contrário, embotado ou perdido em grande parte. Assim, sua religião e o natura-
lismo em que se inspirava tinham descido a um nível mais baixo que entre
os Galos. O druidismo destes, que não era seguramente uma doutrina
isenta das influências corruptoras da aliança finesa, resultava sem em-
bargo menos impregnado delas que a teología dos Eslavos. É em
esta onde apareciam as ideias mais grosseiramente supersticiosas; a crença
na licantropía, por exemplo. Também deles surgiam feiticeiros de
todas as espécies imagináveis.
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Esta raça, assim formada, não possuiu pois sua isonomía senão de uma ma-
nera muito escura, já que essa isonomía não se exerceu senão em centros
demasiado pequenos para ser ainda visíveis através das trevas de
os tempos, e não é senão por sua associação com seus conquistadores melhor
dotados como conseguiu o perceber e julgar suas qualidades e defeitos. Dema-
siado débil e demasiado amável para provocar longos estallidos de cólera
entre os indivíduos que o invadiam, sua facilidade em aceitar o papel se-
cundario nos novos Estados fundados pela conquista, seu natural
laborioso que a fazia tão útil para explodir como fácil cíe governar, todas
essas humildes faculdades permitiam-lhe conservar a propriedade do solo,
fazendo-lhe perder as funções mais elevadas. Os mais ferozes agressores
recusavam muito cedo a ideia de assolar o país, já que nada de bom lhes
tivesse reportado. Após ter enviado alguns milhares de cativos a
os remotos mercados de Grécia, de Ásia, das colônias italiotas, sobrevinha
um momento em que a sumisión de seus vencidos desarmava sua fúria.
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Esta grande fração mestiza da família humana, tão prolífica, tão pa-
ciente ante a adversidad, tão obstinada em seu amor utilitario do solo,
tão atenta a todos os meios do conquistar materialmente, tinha tendido
desde bom começo a rede vivente de suas milhares de pequenas comunas
em uma extensão enorme do país. Dois mil anos dantes de Jesucristo, as
tribos wendas cultivavam as regiões do Baixo Danubio e as riberas sep-
tentrionales do mar Negro, cobrindo, segundo cabe julgá-lo, em concorrência
com as hordas Finesas, todo o interior de Polônia e de Rússia. Agora que
reconhecemo-las na .verdadeira natureza de suas aptidões e de sua
tarefa histórica, deixemo-las entregadas a seus humildes trabalhos, e conside-
remos a seus diversos conquistadores.
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CONDE DE GOBINEAU
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titud perfeita desta transcrição está garantida de uma maneira rara por
o depoimento decisivo dos poemas indianos que, em uma época infinita-
mente mais antiga* produziam-na sob a forma do vocablo Kheta . Os
Khetas são um povo vratía, refractario às leis do brahmanismo, mas
indiscutivelmente ario e estabelecido no Norte do Himalaya.
Com tudo, esse sucesso fué pouca coisa comparado ao esplendor que seu nom-
bre atingiu nos séculos IV e v em Europa. Um grupo originario de seus
irmãos emigrados, e que vamos depois a encontrar de novo com seu genea-
logía, partiu então das riberas orientais do Báltico e do Sur de o
país escandinavo para apagar todo o que seus homônimos nabían podido
levar a cabo de grande. A vasta Confederação dos Godos passeou seu
radiante estandarte por Rússia, pelo Danubio, por Itália, por França
meridional, e por toda a península hispânica. Que as duas formas Godos e
Getas são absolutamente idênticas, certifica-o plenamente um historiador
nacional muito inteirado das antiguidades de sua raça, Jornandes. Não vai-
cila em intitular os anales dos reis e das tribos godas, Rês geticx.
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Não fazia mal mais que dois ou trezentos anos que tinham chegado a
Europa, e esse período fué inteiramente enchido pelos choques violentos
do antagonismo que os opunha às nações limítrofes* Entregados sem
reserva a seus ódios nacionais, absorvidos pelas preocupações únicas
do ataque e da defesa, não tinham tido tempo sem dúvida de perfec-
doar seu estado social; mas este inconveniente resultou de sobre compen-
sado, desde o ponto de vista do porvenir, pelo isolamento étnico, garan-
tia segura de pureza, que fué a consequência disso* Agora se viam for.
zados a transladar-se a uma nova residência. Esta nova residência fixa-a-
ban, com exclusão de outra qualquer, necessidades imperiosas.
CONDE DE GOBINEAU
5H
cabos. Dirigir para o Nordeste era não menos difícil. Aparte dos grandes
grupos fineses que operavam neste ponto» existiam ali nações arias toda^
via consideráveis, mestizos arios amarelos que adquiriam cada vez mas
importância, os quais tinham que fazer recusar fundadamente a ideia e
uma marcha retrógrada para as antigas residências da família branca*
Ficava o acesso do Noroeste. Por este lado, as barreiras, as dificuldades
eram ainda sérias, mas não insuperables. Escassos Arios, muitos Eslavos,
e Fineses em menor quantidade que no Leste, se ofereciam ali probabilidades
de conquistas maiores que em qualquer outro lugar. Os Roxolanos o com-
prenderam; o sucesso lhes dió a razão. No meio das diversas populações
que suas tradições nos dão ainda a conhecer sob seus nomes significa-
tivos de Wanes, de Iotunes e de Alfares ou hadas, ou anões, conseguiram fundar
uma organização estável e regular, cujo recordo v cujos últimos esplen-
doure projetam ainda, através da escuridão dos séculos, um vivo e
glorioso destello sobre a aurora das nações escandinavas.
Os Arios Germanos
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5 l6
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vez t cruzaram o Rin, aqueles emigrantes passaram rozando os territórios
belgas sem ousar atacá-los» eles que enfrentavam sem temor às legiones roma-
nas. Debióse a que reconheceram no Escalda, o Soma e o Oise a grupos
afines quase de tanta valia como eles.
CONDE DE GOBINEAU
5 l8
Foi vencido. A sorte pronunciou-se contra ele, contra seu exército, mas
não, bem sabido é, contra sua raça. Seus homens, que não pertenciam a nin"
guna das nações ribereñas do Rin, dispersaram-se. Aqueles que César,
maravillado de seu valor, não pôde tomar a seu serviço, foram misturar
discretamente com as tribos mistas que constituíam a retaguarda, apor"
tando elementos novos a seu gênio marcial.
Foram eles, ainda que não constituíssem uma nação senão unicamente
um ejercito, quem, dantes que ninguém, deram a conhecer em Occidente o
nome de Germanos. Segundo a maior ou menor semelhança com eles, bem
P° r o aspecto corporal, bem pelos costumes e o valor, César concedeu
aos Treviros, Boyanos, Suevos e Nervienses a honra de reconhecer-lhes algo
de germánico. A propósito deles, pois, há que averiguar o que significa
este nome glorioso, que já tenho indicado, aguardando a verdadeira ocasião
de explicá-lo.
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Í írimeras emissões ocidentais são recobrir por outras novas mais puras,
a invasão escandinava atinge as proporções mais majestuosas; de tal
maneira que, se os Sicambros e os Queruscos cessaram muito cedo de
equipararse aos homens do Império gótico, os Francos podem ser com-
siderados determinadamente como dignos irmãos dos guerreiros de Her-
manarico, e com maior motivo os Sajones da mesma época têm direito
ao mesmo elogio.
Mas, ao mesmo tempo em que^ tantas raças afluían para a Germania meridional,
a Galia e Itália, as catástrofes húnicas, arrancando os Godos e os Alanos
a seus súbditos eslavos, conduziam-nos em massa aos pontos em que as outras
nações germánicas tendiam igualmente a concentrar-se. Disso se originou
que o Oriente de Europa, pouco menos que despojado de suas forças arias,
fué deixado em poder dos Eslavos e dos invasores de raça finesa, que
deviam afundar definitivamente àqueles em uma decadência irremedia-
ble da que os mais nobres dominadores não conseguiram lhes sacar. Dió tam-
bién como resultado o que todas as forças de esencia germánica tenha-
dessem a acumular de uma maneira quase exclusiva nas partes mais
ocidentais do continente, inclusive no Noroeste. Desta disposição de
os princípios étnicos devia resultar toda a organização da história mo-
derna. Agora, dantes de ir mais longe, convém examinar em si mesma a essa
família ariogermánica cujas etapas acabamos de seguir. Nada tão nece-
sario como precisar exatamente seu valor dantes de introduzir no seio
da degeneração romana.
CAPÍTULO III
525
A isto se deve que o Ario resulte sempre se não o melhor dos hom-
bres, pelo menos o mais esclarecido a respeito do valor intrínseco de os
atos que comete. Suas ideias dogmáticas são sempre nesta matéria mais
desenvolvidas e mais completas, ainda que dependam estreitamente do é-
tado de sua fortuna. Em tanto é brinquedo de uma situação demasiado pré-
caria, seu corpo mantém-se acorazado e seu coração igualmente ; no duro
com sua própria pessoa, nada de estranho tem que seja despiadado com os
demais, e neste fato inflexível vemos praticada aquela justiça cuja
integridade alabava Herodoto no belicoso Escita. O mérito consiste aqui
na lealdade com que é aceite uma lei tão feroz, e que não se mitiga
senão no grau em que a atmosfera social ambiente consegue se temperar por
sim mesma.
O Ario é, pois, superior aos demais homens, principalmente por o
grau de sua inteligência e de sua energia; e é graças a estas duas faculta-
dê como, uma vez consegue vencer suas paixões e encher suas necessidades ma-
teriales, é-lhe igualmente permitido atingir uma moralidad infinitamente
mais elevada, ainda que, no curso ordinário das coisas, caiba descobrir
nele tantos atos reprensibles como nos indivíduos das duas espécies
inferiores.
CONDE DE GOBINEAU
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Esta doutrina não é senão o naturalismo ario, modificado por ideias dê-
arrolladas no extremo Norte. A matéria vivente e inteligente, repre-
sentada ainda pelo mito inteiramente asiático da vaca Audhumba, se
mantém nela acima dos três mesmos grandes deuses. Estes na-
cieron depois que aquela : nada tem de estranho que não sejam copartí-
cipes de sua eternidade. Têm que perecer; têm que desaparecer um dia,
vencidos pelos gigantes, pelas forças orgânicas da natureza, e essa
(3) Vceluspa, 3.
527
Uns deuses transitórios, por grandes que fossem, não distaban muito
do homem. Assim o Ario Germano não tinha perdido o costume dele-
varse até eles. Sua veneração por seus antepassados confundia facilmente
a estes com as potências superiores, e sem esforço se trocava em adora-
ción. Gostava de considerar-se descendente de outro maior que ele, e
do mesmo modo que tantas raças helénicas se emparentaban com Júpiter, com
Neptuno, com o deus de Crises, assim também o Escandinavo traçava orgu-
llosamente sua genealogia até Odín, ou até outras individualidades ce-
lestes que as consequências naturais do simbolismo fizeram elevar fá-
cilmente ao redor da trinidad primitiva.
O mesmo aconteceu com as formas do culto, ainda que com maior mesura
na degeneração. Primitivamente o Ario Germano era para si^ mesmo o
sacerdote único, e ainda muito tempo após ter instituído pontí-
fices nacionais, a cada guerreiro conservou em seus lares a dignidade sacer-
dotal. Esta permaneceu inclusive anexa ao direito de propriedade, e a alie-
nação de um domínio entranhou a do direito de sacrificar no mesmo.
Ao modificar-se esse estado de coisas, o sacerdote germánico não exerceu seus fum
ciones senão para o conjunto da tribo. Pelo demais, não fué nunca sina
o que tinha sido o purohita entre os Arios Indianos, nas épocas
528
CONDE DE GOBINEAU
antevédicas. Não formou uma casta diferente como os brahmanes, uma ordem
poderosa como os druidas, e, não menos severamente excluído das fun-
ciones da guerra, não lhe deixou a menor possibilidade de dominar, nem de
dirigir sequer a ordem social* Com tudo, por um sentimento impregnado
de alta e profunda sabedoria, mal os Arios tiveram reconhecido a os
sacerdotes públicos confiáronles as mais imponentes funções civis, em-
carregando-lhes de manter a ordem nas assembléias políticas e de executar
as sentenças dos tribunais de justiça* Daí que existissem nesses
povos os chamados sacrifícios humanos*
34
53ou
CONDE DE GOBINEAU
Não ocorria exatamente assim quando, em sociedade com outros Arios, ac-
tuando sob a direção comum de um chefe de guerra, participava na
conquista de um território do que lhe era adjudicada uma parte, grande ou
pequena. Esta outra situação criava outro sistema de posse inteiramente
diferente; e como fué quase a única que se produziu ao sobrevir as grandes
emigrações no continente de Europa, nela há que procurar o verda-
dero germen das principais instituições políticas da raça germánica.
Mas para poder expor claramente o que era essa forma de propriedade e
as consequências que entranhava, há que explicar de antemão as rela-
ciones do homem ario com sua nação.
531
de tudo, o meio de sedução que podia empregar com maior sucesso, e que
assegurava-lhe a preferência sobre seus rivais, era a oferta e garantia, para
todos aqueles que fossem combater sob suas ordens, de lhes proporcionar
vantagens individuais dignas de tentar sua bravura e sua cobiça. Entabla"
base assim um debate e rivalidad entre os candidatos e os guerreiros. E só
por convicção ou por sedução decidiam-se estes a seguir ao ambicioso de
proezas, de glória e de botim.
53 2
CONDE DE GOBINEAU
dizer de uma vez, em sua obrigação estrita de fazer que suas súbditos
participassem de todas as vantagens de que ele mesmo gozava, lhes concedia,
bens raízes. Mas como os guerreiros não podiam ser levado consigo esse gé-
nero de presentes, não gozavam deles senão enquanto permaneciam fiéis a
seu soberano, e esta situação implicava para tais guerreiros, em seu com-
dición de proprietários, toda uma série de deveres estranhos à constituição
do odel.
constituía um vantagem senão em tanto essa terra fructificase; e como não tinha
nem interesse nem tempo de ocupar-se por si mesmo do cultivo do solo, não
deixava nunca de pactuar, sob a garantia de seu chefe, com os antigos pró-
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vos, e ocupadas ainda por eles (i). Na verdade, sob o regime dos com-
quistadores chegados do Norte, aquelas cidades entraram em um período
de decadência* Criadas pela cultura imperfecta de dois povos mestizos,
muito estreitamente utilitarios, sucumbiram a dois efeitos muito poderosos,
ainda que indiretos, da conquista por elas sofrida* Os Germanes, ao levar
à juventude indígena a adotar seus costumes, ao convidar aos gue-
rreros do país a tomar parte em suas expedições e, portanto, em
suas honras e em seu botim, não demoraram em fazer saborear seu gênero de vida
à nobreza céltica* Esta tendeu a se misturar intimamente com eles. Em
quanto à classe comerciante, quanto a seus industriais, mais sedentarios,
a imperfección de seus produtos não podia sustentar senão dificilmente a
concorrência contra os fabricantes de Roma que, estabelecidos de antigo
nos limites do Império, forneciam aos Germanos mercadorias ita-
lianas ou gregas muito menos caras* ou pelo menos infinitamente mais
belas e melhores que as suas. É o duplo e constante mordomia de uma
civilização avançada. Reduzidos a copiar os modelos romanos para adap-
tarse aos gustos de seus senhores, os operários do país não podiam esperar um
verdadeiro proveito desse labor senão colocando-se diretamente ao serviço
dos posesores de odeles e de feods , já que estes tinham uma tendência
natural a reunir entre sua freguesia imediata e sob sua mão a todos os
indivíduos que podiam ser de alguma utilidade* Assim é como as cidades
se despoblaron pouco a pouco e convirtiéronse em obscuros burgos*
Tácito, que não quer ver em modo algum nos heróis de seu libelo
senão a uns estimables selvagens, falseó todo quanto refere deles em ma-
teria de civilização (2)* Representa-os como bandidos filósofos. Mas,
sem contar que se contradiz a si mesmo com bastante frequência e que
outros depoimentos contemporâneos, de um valor pelo menos igual ao seu,
permitem restabelecer a verdade dos fatos, não há senão contemplar o
resultado das escavações operadas nas tumbas mais antigas de o
Norte para convencer-se de que, pese às enfáticas declarações do gé-
nero de Agripa, os Germanos, aqueles heróis que ele celebra pelo demais
com razão, não eram nem pobres, nem ignorantes, nem bárbaros (3).
(1) H. Leio, Vorlesungen über die Geschichte dê Deutschen Volkes und Reichcs,
t. I, p* 194.
538
Era ali onde o Ario Germano recebia a seus convidados, reunia a seu
família, administrava a justiça, dava suas festines, celebrava conselho com
suas hostes e distribuía-lhes seus presentes. Quando, chegada a noite, se
retirava a seus aposentos interiores, ali iam também seus colegas, avi-
vando o lume do lar, tendendo nos bancos instalados ao redor
da estância e dormindo com a cabeça apoiada em seus escudos.
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54 *
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Não significa isto que as prerrogativas femininas não tivessem suas lími-
tes. Ainda que teve mais de um caso em que as mulheres tomaram parte em
as lutas guerreiras, a lei considerava-as em princípio como incapazes de
defender a terra; portanto, nada herdavam do odel. Menos ainda
podiam aspirar a apropriar-se os direitos de seus esposos difuntos sobre os
feods . Considerava-as aptas para o conselho, inaptas para a ação. Se,
ademais, admitia-se nelas o espírito adivinatorio, não por isso podia
confiar as funções sacerdotales, já que o glavio da lei estava
adscrito a elas. Esta exclusão era tão absoluta, que em vários templos os
ritos impunham que o pontífice levasse o indumento do outro sexo; sem
embargo, era sempre um sacerdote. Os Arios Germanos não tinham podido
aceitar senão com esta modificação os cultos que lhes tinham feito adotar
as nações célticas entre as quais viviam.
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CONDE DE GOBINEAU
CAPITULO IV
Fué a época em que o ditador achou que devia tratar de uma maneira
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Com tudo, é singular que essa estima, que facilitava aos soldados de
raça céltica o acesso às grandes dignidades militares, ou seja à cadeira
de senador, não lhes permitisse tomar parte no concurso aberto para a
púrpura soberana. Os primeiros provinciais que se elevaram a ela foram
Espanhóis, Africanos, Sírios, nunca Galos, excepto os exemplos irregulares
e pouco alentadores de Tétrico e de Postumo. Decididamente, os Galos não
tinham aptidões de governante, e se Otón, Galba, Vitelio podiam tomá-los
como excelentes elementos para uma revolta, não lhe ocorria a ninguém espe-
rar deles nem administradores nem homens de Estado. Alegre e bulliciosos.
CONDE DE GOBINEAU
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não eram nem instruídos nem chamados ao ser. Suas escolas» fecundas em pedan-
tes, contribuíam escasísimos espíritos realmente distintos. A primeira faixa
não era pois acessível para eles, e aquele trono que guardavam tão perfeita-
mente era uma dignidade para a qual não se sentiam aptos.
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ser muito considerável, como o que deixaram que fizessem os partidários semi-
tizados dos antigos cultos» No entanto, terá que temer também que
peça-lhes demasiado» Podiam impedir as consequências inevitáveis de uma
civilização podre que não tinha sido criada por eles? Reformar a socie-
dêem romana sem derrubá-la, tivesse sido belo indubitavelmente. Substituir
suavemente, insensivelmente, a depravación pagana pela pureza católica
sem destroçar nada na operação, tivesse sido realmente o ideal ; mas,
que se reflexione em isso, semelhante obra mestre não tivesse sido possível
senão a Deus»
55ou
CONDE DE GOBINEAU
Deste fato, como de tantos outros, teve de se derivar que no século III
após Jesucristo a nação romana armada e exuberante e a nação
romana pacífica e agonizante não se entendessem o mais mínimo; e, ainda que
os caudillos dessa combinação, ou mais bem dessa yuxtaposición de duas
corpos tão heterogéneos, ostentasen nomes latinos ou gregos e vestissem
a toga ou a clámide, eram fundamentalmente, e muito felizmente para aque-
lla triste sociedade, uns bons e autênticos Germanos. Era este seu título,
no qual se fundava seu direito a dominar*
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Assim fué como, por vontade própria, pela livre eleição do governo
imperial, nações inteiras de raça teutónica foram instaladas em terras
romanas. Juzgóse que essa maneira de proceder seria tão ventajosa, que não
demorou-se em juntar aos aventureros os prisioneiros de guerra. Quando uma
tribo de Germanos ficava vencida, adotava-a, e componíase com ela
uma nova banda de guardas para a vigilância das fronteiras, cuidando
unicamente de afastar de seu país.
Os outros bárbaros não presenciaban sem inveja o espetáculo de uma
situação tão favorecida. Sem necessidade sequer de dar-se conta das
vantagens superiores a que aqueles Romanos fictícios podiam aspirar, nem per-
cibir de uma maneira muito clara as brilhantes esferas em que aquela seleção
dispunha dos destinos do Universo, viam a seus iguais provistos de
propriedades dispostas tempo tem pára, o cultivo; veíanles em contato com
um comércio opulento, e gozando do que os aperfeiçoamentos sociais
ofereciam para eles a mais envidiable. Era isto bastante para que as
agressões arreciasen e menudeasen. Obter terras imperiais constituiu
a partir de então o sonho obstinado a mais de uma tribo, fatigada de
vegetar em seus aguazales e em seus bosques.
Mas, por outro lado, à medida que os ataques eram mais rudos, a situa-
ción dos Germanos colonizados era também mais precária. Seus rivais os
consideravam demasiado ricos; eles, se sentiam demasiado pouco tranquilos.
Com frequência acometia-lhes a tentación de tender a mão a seus irmãos
em lugar de combatê-los, e, a fim de conseguir a paz, de aliar-se com eles contra
os verdadeiros Romanos, situados por trás de sua duvidosa proteção.
Estas ofertas foram aceitadas com júbilo, como era de esperar. Aqueles
que foram objeto delas não pensaram já senão em explodir o melhor po-
sible a debilidade de um Império que se via obrigado a tais expedientes.
Quanto às tribos do exterior, sintiéronse mais possuídas ainda do desejo
de obter terras romanas, de converter-se em soldados romanos, goberna-
doure de províncias, imperadores. Não teve já daqui por diante, dentro de
a sociedade civilizada, tal como o curso dos acontecimentos habíanla
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toria finalidade, foram dos mais extraordinários, e rebasaron ainda o que
tinha-se podido observar neste sentido entre um grande número de empe-
radores* Parecerá que após o estabelecimento em massa no seio de
a romanidad, a barbarie arrependeu-se de ter prestado demasiado pouca
atenção às mesmas futilidades do estado social por ela admirado* To-
dois os escritores contavam com a mais honrosa acolhida na corte de os
reis vándalos, godos, francos, burgondos ou longobardos* Os bispos,
aqueles verdadeiros depositarios da inteligência poética da época, não
escreviam só para seus monges* A raça dos mesmos conquistadores se
pôs a manejar a pluma, e Jornandes, Pablo Wamefnd, o anônimo de
Ravena, e muitos outros cujos nomes e obras têm perecido, demonstravam
de sobra o gosto de^ sua raça pela cultura latina* Por outro lado, os cone-
alicerces mais especificamente nacionais não caíam em esquecimento* Se cortavam
runas na mansão do rei Hilperico, quem, preocupado das imper-
fecciones do alfabeto romano, empregava seus momentos de lazer em refor-
marlo* Os poetas do Norte ocupavam um posto de honra, e as façanhas
dos antepassados, fielmente cantadas pelas novas gerações, serviam
para demonstrar que estas não tinham abdicado as enérgicas qualidades de
sua raça*
Vemos, pois, que o gênio germánico era muito gere lizador, à in-
versa das nações antigas* Ainda que partiu de uma base ao que parece
mais estreita que as instituições helenísticas, romanas ou célticas, e ainda
quando os direitos de o' homem livre, individualmente conceituado, fossem
para ele o que os direitos da cidade para os outros, a noção, que de
eles se formava e que difundia com uma imprevisión tão soberba, lhe
CONDE DE GOBINEAU
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conduziu infinitamente mais longe do que ele mesmo tinha pensado* Nada
mais natural: o alma deste direito pessoal era o movimento, a in-
dependência, a vida, a adaptação fácil a todas as circunstâncias ambien-
tes ; o alma do direito cívico era a servidão, como sua suprema
virtude era a abnegación*
Tenho recordado alguma vez no curso destas páginas, e não foi inútil-
mente, que os grandes fatos que descrevo, as importantes evoluções
que assinalo, não se operam em modo algum por efeito da vontade ex-
presa e direta das massas ou de tais ou cuales personagens históricas* Causas
e efeitos, todo se desenvolve, pelo contrário, muito geralmente, a costas
ou em oposição às ideias daqueles que ali intervêm* Não me ocupo
de traçar a história dos corpos políticos, nem das ações boas ou
más de seus dirigentes* Por inteiro atento à anatomía das raças, tenho
unicamente em conta suas resortes orgânicos e as consequências fatais
que deles se derivam, não desdenhando o restante, senão o deixando a um
lado quando não serve para explicar o ponto que se discute* Se aprovo ou
se censuro, minhas palavras não têm senão um sentido comparativo e, por
dizê-lo assim, metafórico* Em realidade, não é um mérito real para as encinas
o que elevem através dos séculos suas frentes majestuosas, coroadas com
uma verde diadema, como a grama o se secar em poucos dias* Uns e outros
não fazem senão conservar seu lugar dentro das séries vegetais, e seu for-
taleza ou sua debilidade respondem igualmente aos desígnios de Deus que
criou-os* Mas não me dissimulo também não que a livre ação das
leis orgânicas, às quais limito minhas investigações, está com frequência
Era o estado normal dentro da romanidad, e tenho aqui por que, quando
Odoacro teve declarado inútil a pessoa de um imperador de Occidente,
ninguém pensou também não que por efeito dessa medida o Império de Occri
dêem você cessasse de existir. Unicamente julgou-se que começava uma nova
fase; e do mesmo modo que a sociedade romana tinha sido governada,
primeiro, por chefes não distinguidos com nenhum título e depois por outros
que se tinham outorgado o nome de César e outros que tinham estabelecido
uma distinção entre os Césares e os Augustos, e que em lugar de impor
uma direção única ao corpo político, imprimiéronle dois e depois quatro,
assim também se aceitou que o Império prescindiese de um representante
direto e dependesse muito superficialmente, e só na forma, do trono
de Constantinopla, e obedecesse, sem dissolver-se e conservando-se sempre o
Império de Occidente, a magistrados germánicos, que, a cada qual em os
países de sua jurisdição, aplicavam aos povoadores as leis especiais
instituídas antanho para seu próprio uso pela Jurisprudencia romana. Odoacro
não tinha, pois, levado a cabo senão uma simpíe revolução palaciega mu^
j
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56,1
que eles mesmos não ousavam revestir, e quando o azarado maniquí levava
traça de mostrar-se algo independente, uma palavra, um gesto, o fazia dê-
aparecer*
Não foi senão quatro séculos depois quando se allanó o caminho. Ao co-
mienzo desse novo período, as facilidades mais completas hiciéronse vi-
sibles a todos. A maioria de nações germánicas habíanse deixado debili-
tar, se não absorver pela romanidad; inclusive várias delas tinham cessado
de existir como grupos diferentes. Os Visigodos, assimilados aos Romanos de
seus territórios, não conservavam já entre eles e seus súbditos nenhuma dis-
tinción legal que evocasse uma desigualdade étnica. Os Longobardos man-
tinham uma situação mais diferenciada ; outros também faziam o mesmo ; com
todo era indiscutible que e! mundo bárbaro não tinha já mais que um único
representante sério no Império, e este representante era a nação de os
Francos, à qual a invasão dos Austrasios acabava de contribuir um grau
de energia e de fortaleza evidentemente superior ao de todas as demais
raças afines. O problema da supremacía tinha-se resolvido, pois, em favor
deste povo.
3<5
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562
Estava ali o príncipe; mas não parece que as grandes nações germá-
nicas do extremo Norte, as que renovaram a face do mundo, tivessem nunca,
em tanto foram arias, abandonado seus mais importantes posses a indi-
viduos de sangue comum. Quando fizeram seu aparecimento no Império ro-
mão, tinham demasiada pureza de sangue para admitir que seus chefes pudie-
sen carecer dela. Todos pensaram a esse respeito como os Hérulos, e ac-
tuaron igualmente. Não colocaram à cabeça de suas bandas senão a Arios
puros, senão a Ases, a filhos de deuses. Assim, posteriormente ao século v, devem
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Entre tanto, os reis mostraram uma marcada predilección por suas súb-
ditos romanos tão respeitosos, e retiveram-nos, todo o possível, cerca de seu
pessoa. Admitiram-nos muito gostosamente dentro daquele círculo íntimo
dos colegas, que denominavam seu «truste», seu camarilla, e esse favor,
em definitiva inquietante e vejatorio para os guerreiros nacionais, não pa-
reció no entanto ter produzido o efeito de tal. Segundo a maneira de ver
destes, o chefe tinha direito a tomar sob seu serviço a quantos julgasse
indicados. Era entre eles um princípio original. Sua completa tolerância tinha
no entanto razões ainda mais profundas.
Os campeões de origem livre, que não eram comparáveis a seus chefes por o
nascimento e não pertenciam já à linhagem pura dos Ases, pelo menos em
sua maioria, já que tinham sofrido algumas modificações étnicas an-
tes do século V de nossa era, naturalmente estavam dispostos a sofrer outras
novas. Certas leis locais opunham, na verdade, alguns obstáculos a esse
perigo. Determinadas tribos nacionais não estavam autorizadas para com-
trazer casais entre si; o código dos Ripuaríos, ao permití-lo às
populações entre as quais regia e aos Romanos, assinalava com todo uma
decadência para os produtos desses enlaces mistos. Despojava-os de
antemano das inmunidades germánicas, e, submetendo ao regime das
leis imperiais, incorporava-os à multidão dos súbditos do Impe-
rio. Esta lógica e esta maneira de proceder não tivessem sido desaprovadas
na Índia; mas, em soma, não eram mais que restrições muito imperfectas;
não tiveram o poder de neutralizar a atração que a romanidad e a bar-
barie exerciam uma sobre outra. Cedo as concessões da lei aumentaram,
as reservas desapareceram, e, dantes da extinção dos Merovingios,
a classificação dos habitantes de um território sob tal ou qual legislação,
tinha cessado de fundar na origem. Recordemos que entre os Visigodos,
bem mais avançados ainda, toda distinção legal entre bárbaro e Romano
tinha cessado inclusive de existir.
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meras não tinham uma cor tão semitizado como na Provenza; pareciam-se
em maior grau às do Alta Borgoña* Tinha ademais, dentro da mistura
general, a diferença de mérito entre os elementos germánicos de ambos
países, pois os Francos valiam mais que os Borgonones ; pelo demais, os
Francos, ainda que em pequeno número entre estes últimos, prevaleciam ainda
sobre eles*
Para além do Alto Sena e nas regiões que se sucediam até a dê-
embocadura do Rin, de um lado, e, do outro, até o Mein e até o Dá-
nubio, com Hungria por fronteira a Oriente, se aglomeraban multidões
em que os elementos germánicos exerciam uma preponderancia mais indis-
cutida, mas não uniforme* A parte entre o Sena e o Somme pertencia a
Francos consideravelmente celtizados, com uma proporção relativamente me-
diocre de mistura romana semitizada* O país ribereño de mar tinha conser-
vau, quiçá recobrado, o nome kínrico de Picardaich . No interior de
as terras, os Galorromanos misturados com os Francos neustrinos mal
distinguiam-se de seus vizinhos do Sur e do Leste ; estavam no entanto algo
menos energicamente constituídos que estes últimos, e sobretudo que os
do Norte* À medida que avançava-se fazia o Rin e em direção aos an-
tiguos limites decumatas, encontrávamos-nos mais rodeados de^ verdadeiros
Francos do ramo austrasiana na que o antigo sangue germánica existia
em seu mais alto grau de verdor* Habíase chegado a seu berço* Pode, pois,
reconhecer-se muito facilmente, interrogando os relatos históricos, que ali se
achavam o cérebro, o coração e a medula do Império; que ali residia a
força, e que ali se decidiam os destinos* Todo acontecimento que se tivesse
preparado no Rin meio, ou em seus arredores, não tinha, não podia ter
mais que um alcance local muito pouco fecundo em consequências*
Remontando o rio em direção a Basilea, as massas germánicas, vol-
vendo pára cel tizarse em maior grau, acercavam-se a o, tipo borgoñón; em
o Leste, a mistura galorromana complicava-se, a partir de Baviera, ^com
matizes eslavos que iam se fortalecendo até os confines do Hungria e
de Bohemia, onde, resultando mais acentuadas, acabavam por prevalecer
e formavam então a transição entre as nações de Occidente e os
povos do Nordeste e do Sudeste até a região bizantina*
57 °
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Seja o que for, o repito, seu espírito não pereceu. Esse gênio, que repre-
sentava a soma de todos os restos étnicos até então amalgamados,
resistiu, e, durante o tempo em que esteve constreñido a prescindir de
manifestações exteriores muito evidentes, manteve pelo menos sua posição
por um meio que não deixa de ser digno de menção. Foi um fenômeno
completamente oposto ao que tinha tido efeito entre a época de Odoacro
e a do filho de Pepino. Durante aquele período, o Império tinha subsistido
sem o imperador; aqui o imperador subsistiu sem o Império. Sua dignidade,
adscrita de algum modo à majestade romana, esforçou-se durante vários
séculos em conservar-lhe um aspecto de continuador e de herdeiro. Foram toda-
via as populações germánicas as que, despregando nesta ocasião o ins-
tinto, o gosto obstinado da conservação nelas natural, deram um
novo exemplo dessa lógica e dessa tenacidad que seus irmãos da
Índia não possuíram em um grau mais elevado, ainda que o aplicando de outra
maneira.
CAPÍTULO V
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Esses Eslavos, vítimas uma vez mais das catástrofes que agitavam às
raças superiores, chegaram aos países conhecidos de seus antepassados muitos
séculos dantes; quiçá inclusive avançaram até mais longe que o fizeram estes
dois mil anos dantes de nossa era. Cruzaram de novo o Elba,^ encontraram
o Danubio, apareceram no coração de Alemanha. Conduzidos por seus
nobrezas, formados de tantas misturas getas t< sármatas, célticas, pelas quais
tinham sido antanho dominados e confundidos com algumas das bandas
húnicas que lhes empurravam, ocuparam, no Norte, todo o Holstein até
o Eider. Ao Oeste, gravitando para o Saale, acabaram por fazer deste
sua fronteira; enquanto ao Sur se desparramaron pela Estiria, a Car-
niola, atingiram de um lado o mar Adriático, do outro o Mein, e cobriram
os dois archiducados de Áustria, como Turingia e Suabia. Depois dê-
cendieron até as regiões renanas e penetraram em Suíça. Essas na-
ciones wendas, sempre oprimidas até então, convirtiéronse assim de
grau ou por força em conquistadoras, e as misturas que as distinguiam não
fizeram por enquanto demasiado difícil seu labor. As circunstâncias, atuando
com energia em seu favor, levaram as coisas a um ponto em que o elemento
germánico debilitou-se consideravelmente em toda Alemanha e não se man-
teve algo compacto senão em Frisia, em Westfalia, em Hannóver e as regiões
renanas desde o mar até Basilea* Tal fué o estado de coisas no século HIV.
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Tenho aqui a parte de ação reservada aos Eslavos, a que não tivessem
adquirido nunca se os Normandos não lhes tivessem impulsionado à tomar,
e que tem seu foco principal em Rússia, já que é ali onde a dose
mais considerável de atividade fué implantada por esses mesmos Normandos
a quem há que seguir agora em outros campos de luta*
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CAPÍTULO VI
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Numerosos Estados modelam-se o melhor que podem, ainda que com mati-
ces inumeráveis, segundo o protótipo lombardo. As províncias mau reunidas
do reino de Borgoña, a Pró vença, depois o Languedoc, a Suíça meri-
dional, parecem-lhe sem atingir seu brilho. Geralmente o elemento bár-
baro está demasiado debilitado naquelas regiões para prestar tantas
forças à romanidad. No Centro e no Sur da Península, está quase
ausente; assim não se vê ali mais que agitações sem resultado e convulsões
teutónicas, que não foram senão passageiras, não produzindo mais que resul-
tados incompletos, nem atuando mais que em um sentido disolvente. O dê-
ordem étnica não tem deixado de ser menos considerável. Nem os numerosos
voltas de Gregos nem as colonizações sarracenas bastaram a pôr re-
meio. Um momento, a dominación normanda dió uma importância in-
esperada à extremidade da Península e a Sicília. Desgraçadamente,
esta corrente, sempre bastante exigua, ficou muito cedo interrompida,
pelo que sua influência vai se extinguindo, e os imperadores da casa
de Hohenstauffen esgotam os últimos filões dela.
mesura; mas este triunfo foi tão pouco duradouro como o tinha sido entre
os contemporâneos de Platón : mal, o mesmo que para estes, durou um
centena de anos, e, unha vez eclipsado, veio de novo a agonia de todas
as faculdades. Nos séculos XVII e xvili não acrescentaram nada à glória de Itália,
e certamente tiraram-lhe muito.
585
Vem agora o terceiro centro de civilização, que tinha seu foco em Paris.
A colonização franca tinha sido poderosa nos arredores desta cidade.
A romanidad tinha-se composto ali de elementos célticos pelo menos tão
numerosos como nas orlas do Rin, mas bem mais helenizados, e,
em soma, dominava a influência bárbara pela importância de sua massa.
De bom começo, as ideias germánicas retrocederam ante ela. Nos mais
antigos poemas do ciclo carlovingio, os heróis teutónicos estão em seu
maioria esquecidos ou representados em uma forma odiosa, como, por ejem-
plo, os Caballeros de Maguncia, ao passo que os paladines do Oeste, tais
como Rolando, Olivier, ou inclusive do Meio dia, como Gerars do Rosellón,
ocupam o primeiro lugar na estima geral. As tradições do Norte
aparecem cada vez mais desfiguradas sob um ropaje romano.
CONDE DE GOBINEAU
586
Mas por que essas lágrimas e essa piedade? Aquela época não implora
a compaixão. Não é o sentimento o que brota da atenta leitura das
crônicas; seja que fixemos a atenção nas austeras e belicosas páginas de
Ville-Hardouin ou nos maravilhosos relatos do Catalão ( 1 ) Ramón Munta-
ner ou nas Memórias cheias de serenidad, de alegria, de coragem, do nobre
Joinville, seja que percorramos a apasionada biografia de Abelardo, as notas
mais monacales e mais tranquilas de Guibert de Nogent, ou tantos outros é-
critos cheios de vida e de encanto que nos legaram aqueles tempos,
a imaginación se sobrecoge ante a soma de inteligência, de coração e de
energia que nelas se prodiga. Com frequência mais entusiasta que seca-
mente razoável em seus aplicativos, o pensamento de então é siem-
pré vigoroso e são. Uma curiosidade e uma atividade sem limites o inspi-
587
ran ; não passa nada por alto. Ao mesmo tempo que possui forças inesgotáveis
para alimentar sem descanso a guerra estrangeira e a guerra interior, e que,
fiel a médias ainda à predilección dos Francos pelo glaviq, leva o
ruído de suas armas de reino em reino, de cidade em cidade, de villorrio em
villorrio, de aldeia em aldeia, encontra a maneira de salvar os restos da
literatura clássica e de comprazer em sua leitura, meditando-os de uma
maneira equivocada quiçá desde nosso ponto de vista, mas seguramente
original É esse, no meio de tudo, um mérito supremo, e, neste caso par-
ticular, um mérito tanto mais assinalado quanto que nos aproveitámos
disso e constitui a superioridad da civilização moderna sobre a
antiga romanidad. Esta não tinha inventado nada, não tinha feito mais
que recolher, o melhor que soube e a mãos cheias, o fruto dos produtos
murchados pelo tempo. Nós temos criado concepções novas,
temos feito uma civilização, e é à Idade Média à que somos deu-
doure de tão grande obra. O ardor feudal, infatigable em seus trabalhos, não
limita-se a perseverar o melhor possível no espírito conservador de os
bárbaros pelo que respecta ao legado romano, senão que revisa ainda, retoca
incessantemente o que pode descobrir das tradições do Norte e de
as fábulas célticas; com isso compõe a literatura ilimitada de seus poemas,
de suas novelas, de seus romances, de suas canções, o qual seria incomparável
se a beleza da forma respondesse à ilimitada riqueza do fundo.
Ébria de discussão e de polémica, aguza as armas já tão subtis da
dialética alejandrina, esgota os temas teológicos, extrai deles fórmulas
novas, faz brotar em todos os gêneros de filosofia os espíritos mais auda-
ces e mais firmes, completa as ciências naturais, alarga o campo de
as ciências matemáticas, afunda-se nas profundidades do álgebra. Sa-
cudiendo a rotina das hipóteses em que se complugo a esterilidad ro-
mana, sente já a necessidade de ver com seus olhos e de apalpar com seus
mãos dantes de pronunciar-se. Os conhecimentos geográficos alentam po-
derosa e exatamente essas disposições, e os pequenos reinos do se-
glo XIII, sem recursos materiais, sem dinheiro, sem essas excitações accesorias
e mesquinhas de lucro e de vaidade que o determinam tudo em nossos
dias, mas ébrios de fé religiosa e de juvenil curiosidade, sabem encontrar
entre eles os Plano-Carpin, os Maundevill, os Marco Pólo, e lançar depois de
eles nuvens de viajantes intrépidos para os rincões mais apartados de o
mundo, que nem os Gregos nem os Romanos tinham tido nunca sequer
a ideia de ir visitar.
Muito pôde sofrer essa época, admito-o : e não examinarei se com seu ar-
dente imaginación e seus imperfecta? estatísticas, comentadas com o dê-
dén com que nos place olhar todo o que não se refere a nós mesmos,
exageraram-se ou não sensivelmente suas misérias. Considerar as calami-
dades em toda a extensão, verdadeira ou falsa, que lhes tem atribuído e
só perguntarei se no meio dos maiores desastres se é verdadeiramente
desgraçado, quando se é tão vivaz. Temos visto nunca que o servo
oprimido, o nobre despojado ou o rei cativo tenham-se desesperado até
o ponto de dirigir o arma contra si? Achamos que mas dignas de lástima
são as nações degeneradas e bastardas e que, por não amar nada, por não
desejar nada, por não poder nade e não sabendo que fazer no meio de os
588
CONDE DE GOBINEAU
Entre as nações arias, a honra tinha sido, e era ainda entre os In-'
gleses e até entre os Alemães, uma teoria do dever que estava muito de
acordo com a dignidade do guerreiro livre. Cabe inclusive perguntar-se se em
esta palavra, honra , os gentileshombres do Império e os terratenientes de o
tempo dos Tudor não compreendiam sobretudo a suprema obrigação de
sustentar seus prerrogativas pessoais contra os ataques dos mais pode-
rosos. Em todo caso, não admitiam que devessem as sacrificar por ninguém. Por
o contrário, o gentilhombre francês se vió obrigado a reconhecer que as
obrigações estritas da honra impunham-lhe o sacrifício de seus bens, de
sua liberdade, de seus membros e de sua vida em defesa de seu rei. O ideal
de sua qualidade de nobre consistiu para ele em uma absoluta sumisión e,
já que era nobre, nenhum ultraje por parte da realeza podia dispen-
sarle, em estrita consciência, daquela abnegación sem limites. Esta doc-
trina, como todas as que se elevam ao absoluto, não carecia de beleza nem
589
Greve acrescentar que se se deixou degradar assim, foi porque seu sangue não era
já bastante pura para infundirle a consciência do dano que lhe causava
e para proporcionar-lhe forças suficientes para a resistência. Menos roma"
nizado que a burguesía* que a sua vez o era menos que o povo* o
gentilhombre o era ainda muito ; seus esforços atestiguaron* pela do"
sis de energia que podemos presumir neles, a medida em que possuía ainda
as causas étnicas de sua primitiva superioridad. Nas regiões onde tinham
existido os principais estabelecimentos dos Francos fué onde a oposi"
ción caballeresca significou-se em maior grau; para além do Loire* não teve*
em general* uma vontade tenaz. Em fim* com o tempo* e com poucos matizes
de diferenciação* manifestou-se em todas partes um mesmo nível de sumisión*
e a romanidad começou a reaparecer* quase reconocible, quando no século XV
fenecía.
59ou
CONDE DE GOBINEAU
Infiltróse por todas partes algo grosseiro e vulgar que não pertencia nem a o
elemento germánico nem ao sangue helenizada. A literatura caballeresca
desapareceu das fortalezas que bordean as orlas do Rin, e foi reempla-
zada pelas composições jocosas, baixamente obscenas e estúpidamente
grotescas da burguesía das cidades. A gente divertiu-se com as trivia-
lidades de um Hans Sachs. É esta espécie de alegria que tão justamente
denominamos alegria gala e da que França produziu, naquela mesma
época, o mais perfeito modelo, como, efetivamente, era nativamente próprio de
ela, dando por resultado as chanzas de cor subida compiladas por Rabe-
lais, o gigante da comicidad.
591
dades, até então tão admiradas, deveram ser contentado com representar
o papel de imitadoras mais ou menos afortunadas* Só se invocava a os
latinos e aos gregos; e a estes últimos, claro está, entendidos à maneira
latina. Execrábase todo quanto se saía deste círculo ; já não quis recono-
cerse, nem em filosofia, nem em poesia, nem em arte, quanto tivesse forma ou cor
germánico; foi uma inexorável e violenta cruzada contra todo quanto se
tinha feito desde fazia mil anos. Mal se se perdoou ao Cristianismo.
592
CONDE DE GOBINEAU
vez mais ao idioma usual Este t conhecido com o nome de alto alemão mo-
cierno» tem relativamente poucas semelhanças lexicográficas com o gótico ou
com jas antigas línguas do Norte e afinidades cada vez mais estreitas com
o céltico» não sem se assimilar alguns vocablos eslavos, Mas se inclina sobre
tudo para o céltico, e como que não lhe é possível achar com facilidade suas
vestígios nativos no uso moderno, acerca-se com esforço ao composto
que mais se lhe avecina, isto é, ao francês. Sem aparente necessidade toma de o
francês senes de palavras cujos equivalentes poderia achar facilmente em
seu próprio fundo ; apodera-se de frases inteiras que no meio do discurso
produzem um efeito muito estranho ; pese a suas leis gramaticales, cuja pri-
mitiva maleabilidade tenta também modificar, para se acercar a nossas
formas mais estritas e rígidas, se romaniza segundo o matiz celta, que é o
que tem mais a seu alcance, enquanto o francês propende quanto lhe é
dable para o matiz meridional, e não avança menos passos para o italiano
que os que este avança para ele.
Até aqui não tenho sentido escrúpulo algum em empregar a palavra roma-
nidad para indicar o estado para o qual retornam os povos da Europa
ocidental. No entanto, para ser mais preciso, é necessário acrescentar que baixo
esta expressão não pode ser entendido, sem incorrer em erro, uma situação com-
pletamente idêntica à de nenhuma época do antigo universo romano.
Do mesmo modo que na apreciação do mesmo me servi das pá-
bras semítico e helenístico, para determinar aproximadamente a natureza
das misturas em que abundava, prevenindo que não se tratava de mixturas
étnicas absolutamente parecidas às que tinham existido dantes no mundo
asirio e na superfície dos territórios siromacedónicos, assim também não
devemos esquecer aqui que a nova romanidad possui matizes étnicos que lhe
são peculiares e desenvolve, portanto, aptidões desconhecidas da an-
tigua. Um fundo completamente igual, uma maior desordem, uma crescente
assimilação de todas as faculdades particulares pela extrema subdivisión de
os grupos primitivamente diferentes, tenho aqui o que há de comum entre
ambas situações e o que conduz, cada dia, a nossas sociedades para
a imitação do universo imperial; mas o que nos é próprio, pelo menos
neste momento, e o que estabelece a diferença, é que, na fermentación
das partes constitutivas de nosso sangue, muitos detritos germánicos
atuam ainda e de uma maneira muito especial, segundo os observe em o
Norte ou no Meio dia ; aqui, entre os Provenzales, em quantidade disolvente;
lá, pelo contrário, entre os Suecos, com um resto de energia que atrasa
o visível movimento de decadência.
38
594
CONDE DE GOBINEAU
CAPÍTULO VII
Os INDÍGENAS AMERICANOS
de que não existe em América uma família indígena diferente das que tem-
bitan no resto do Globo*
596
597
sa lume que lhe consome; mas é mais verdadeiro ainda que carece de piedade,
como o demonstram as relações que sustenta com os estrangeiros, com seu
tribo, com sua família, com suas mulheres e até com seus filhos.
E não se vá achar que seja assim por falta de inteligência; possui esta
e sabe servir-se dela para satisfazer sua forma de egoísmo. Seu grande prin-
cipio político é a independência, mas não a de sua nação ou de sua iribú,
senão a sua própria, a do indivíduo. A grande preocupação do Guaraní ou
do Chinook é obedecer o menos possível para não renunciar a seu pereza
e a seus gustos. Toda a nobreza que se pretenda descobrir no caráter in-
deu prove/provem daí. No entanto, várias causas locais têm imposto em
determinadas tribos a presença de um chefe. Este tem devido ser aceite,
mas outorga-lhe a menor sumisión possível, e é o subordinado quem a
determina. Ao chefe disputa-lhe até a mais mínima parcela de autoridade.
Esta não lhe é conferida senão por algum tempo, e a tiram quando quie-
ren. Os selvagens de América são uns republicanos extremistas.
CONDE DE GOBINEAU
598
599
Vê-se agora por que médios tem podido estabelecer no Leste do tenho-
misferio austral a comunicação entre os dois grandes tipos negro e ama-
rillo? É muito fácil tranquilizar o ânimo a esse respeito. Entre Madagascar
e a primeira ilha malaya, que é Ceilán, há pelo menos 12 ou , enquanto
do Japão ao Kamtschatka e da costa de Ásia à de América, por o
estreito de Behring, a distância é insignificante* Não temos de esquecer
que em outra parte desta obra temos assinalado a existência de tribos negras
nas ilhas ao Norte de Nipón em uma época muito moderna. Por outra parte,
se tem sido possível a povos malayos passar de archipiélago em archipiélago
até a ilha de Pascuas, não há dificuldade em admitir que, chegados aí, tenham
continuado até a costa de Chile, situada enfrente deles, e que tenham
chegado a ela após uma travesía facilitada pelas ilhas semeadas por
o caminho : Sala, San Ambrosio, Juan Fernández, circunstância que reduz a
duzentas léguas o trajeto mais curto de um dos pontos intermediários
ao outro. Agora bem: é sabido que as casualidades do mar arrastavam frequente-
mente as embarcações dos indígenas a mais do duplo dessa distância*
América era, pois, acessível, pelo lado de Occidente, por seus dois extre-
midades, Norte e Sur, Há outros motivos, ademais, para não duvidar de que o
que era materialmente possível sucedeu efetivamente»
6oo
CONDE DE GOBINEAU
601
Parecerá estranho que essas tribos escapem à lei ordinária que induze
às nações, ainda àquelas que já são mestizas, a eliminar as misturas,
lei que se exerce com tanta maior força quanto mais grosseiros são os ele-
mentos étnicos de que se compõem as famílias. Mas o excesso da com-
fusão destrói esta lei, tanto entre os grupos mais viles como entre os
mais nobres; disso temos muitos exemplos; e quando se considera o
número ilimitado de misturas que todos os povos americanos têm sofrido,
não deve um admirar da avidez com que as mulheres guaraníes do Brasil
procuram os abraços dos negros. É precisamente a ausência de todo ele-
mento esporádico nas relações sexuais o que demonstra de uma maneira
mais completa a que baixo nível têm descido as famílias do novo mundo
quanto a depravación étnica, e o que nos proporciona as razões mais
poderosas para admitir que esse estado de coisas se remonta a uma época
excessivamente longínqua.
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CONDE DE GOBINEAU
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CONDE DE GOBINEAU
uma raça mestiza como elas, mas de um grau algo mais elevado, e sobre
todo mais impregnados do sangue melanesia.
605
6ou6
CONDE DE GOBINEAU
(i) Qualquer á dos ramales de cordas com diversos nodos e cores, de que
os índios peruanos serviam-se para suprir em verdadeiro modo a falta de escritura e
dar
razão de histórias e notícias.
Uma resposta a esta pergunta pode ser achado já ao observar que esses
parciais desenvolvimentos tinham sido em parte determinados^ por fortuitas combi-
nações das misturas amarelas e negras. Ao ver cuán limitadas eram, em
definitiva, as aptidões resultantes destas combinações e as singulares
lagoas que caracterizam seus trabalhos e suas obras, se pôde chegar a o
convencimiento de que as civilizações americanas não se elevavam muito
acima do que têm podido realizar as melhores raças malayas da
Polinesia. Com tudo, também não devemos deixar de reconhecer que por defec-
tuosas que nos apresentem as organizações azteca e quichua, há, sem
embargo, nelas algo essencialmente superior à ciência social praticada
em Tonga-Tabu e na ilha Hawai, pois vemos ali um vínculo nacional
mais tenso, uma consciência mais precisa ae uma finalidade que é, em si, de uma
natureza mais complexa; de maneira que podemos chegar à conclusão de
que, pese a muitas aparências contrárias, a mistura polinésica melhor dotada
não -chega a igualar completamente àquelas civilizações do grande conti-
nente ocidental, e heñios de crer, por tanto, que para determinar esta
diferença tem sido necessária a intervenção local de um elemento mais enér-
gico e mais nobre que os que têm a sua disposição as espécies amarela
e negra. Agora bem ; no mundo, a espécie branca é a única que pode
proporcionar esta qualidade suprema. Cabe, pois, d priori, suspeitar que as
infiltraciones desta esencia preexcelente têm vivificado um tanto aos gni-
pos americanos ali onde existiu uma civilização. Quanto à debili-
dêem destas civilizações, explica-se pela pobreza dos filões de que
nasceram. Faço questão desta última ideia.
6ou8
CONDE DE GOBINEAU
em America não tem excedido de cinco séculos. Seja o que for, os dois grande-
dê Estados que as mãos violentas de Cortês e de Pizarro destruíram
estavam vai em decadência, já que eram inferiores, no Anahuac, a o
dos Olmecas e, na meseta de ande-os peruanos, ao que os Aimaraes
tinham fundado em outro tempo.
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6o ^ CONDE DE GOBINEAU
CAPÍTULO VIII
está em via de prosperidade e de aumento, com dano» claro está, dos descendentes
dos conquistadores, submergidos nesta massa.
ÓI2
CONDE DE GOBINEAU
Quase o mesmo deve ser dito dos Franceses, ainda que desde outro ponto
de vista. No Canadá, nossos emigrantes aceitaram muito frequentemente
a aliança dos aborígenes e, coisa sempre muito rara por parte de os
colonizadores anglo-saxãos, adotaram com frequência e sem esforço o gênero
de vida dos parentes de suas mulheres. As misturas foram tão fáceis,
que se encontram muito poucas famílias canadenses que não tenham tido,
sequer de longe, contato com a raça índia ; e, no entanto, estes mesmos
Franceses, tão acomodaticios no Norte, não quiseram admitir nunca, em
o Sur, a possibilidade de uma aliança com a espécie negra, nem quiseram
considerar aos mulatos mais que como abortos condenados. A causa de
esta aparente inconsecuencia é fácil de explicar. A maioria das fa-
milias que primeiramente se estabeleceram, tanto no Canadá como nas
Antillas, pertencia às províncias de Bretaña ou de Normandía. Pela
parte gaélica de sua origem, existia uma afinidad entre elas e as tribos
malayas muito amarelas do Canadá, enquanto sua natureza resistia-se
a contrair enlaces com a espécie negra nos países onde conviviam com
ela, se mostrando em isto muito diferentes dos colonos espanhóis, que, em
a América do Sul, na América Central e em México, graças às
misturas de toda espécie que livremente aceitaram, se acham em condições
de enfadosa concordância com os grupos indígenas que lhes rodeiam.
613
O núcleo anglo-saxão que existe nos Estados Unidos não tem de esfor-
zarse em que lhe reconheça como o elemento vivaz do novo continente.
Com respeito aos demais povos, acha-se nessa atitude de aplastante
superioridad em que se acharam em outro tempo todos os ramos da
família aria, Indianas, Chatrías Chineses, Iranios, Sármatas, Escandinavos e
Germanos respeito das multidões mestizas* Ainda que este último repre-
614
CONDE DE GOBINEAU
615
que todo quanto não responde a esta tendência, lhe prejudica e que, lógica-
mente, todo quanto prejudica está de antemão condenado e, chegado o
momento, destruído.
menor escala, não deixam de se parecer bastante aos excessos dos primeiros
Camitas alvos.
6i6
CONDE DE GOBINEAU
Este rasgo, que não deve nos ser indiferente, indica que os democratas
do novo mundo têm uma propensão a dar-se tom que contrasta por
completo com as torcidas completamente opostas dos revolucionários
do velho continente. Nesta últimos rainha, pelo contrário, uma tendência
a rebajarse, a descer ao nível inferior, a fim de pôr as esencias étnicas
mais altas e menos numerosas ao nível das mais baixas, as quais, por sua
abundância, dão o tom e dirigem-no tudo.
617
Advertiu-se já que, para obter uma noção mais precisa ‘do grau
de intensidade a que podia chegar a ação do povo dos Estados Unidos
sobre os outros grupos do novo mundo, só se considerou a raça
que fundou a nação e que, por um suposto completamente gratuito, tenho
conceituado como se ainda se conservasse hoje com todo seu valor étnico
especial e como se devesse persistir nele indefinidamente. Nada é mais
fictício. Os Estados Unidos representam, pelo contrário, entre os países
do mundo, o que, desde começos do século XI X e sobretudo nestes
últimos anos (1), tem visto afluir a seu território a maior soma de elementos
heterogéneos. É um novo aspecto que pode, se não mudar, modificar por
o menos gravemente as conclusões apresentadas anteriormente.
6i8
CONDE DE GOBINEAU
solo americano sustente-se por algum tempo, dantes de fim de século a raça
nacional ficará parcialmente extinguida. Por outra parte, já se acha muito
debilitada pelas misturas. Durante algum tempo continuará sem dúvida simu-
lando algum impulso ; mas esta aparência se apagará e o império se achará
por completo em mãos de uma família mista, na que o elemento anglo-
sajón já não representará mais que um papel de subordinado. Farei notar, inci-
dentalmente, que o conjunto da variedade primitiva se afasta da costa
do mar e dirige-se para o Oeste, cujo gênero de vida convém mais a sua
atividade e a seu caráter aventurero.
Assisto com interesse, ainda que com escassa simpatia, confesso-o, ao grande
impulso que os instintos utilitarios prestam a América. Não me oculta
a potência que despliegan; mas, afinal de contas, que resulta disso
que não saibamos já? E ainda : que apresentam que resulte seriamente origi-
nal? Sucede ali algo que no fundo seja estranho às concepções euro'
peas? Existe ali um motivo determinante que possa fazer conceber a
esperança de futuros triunfos para uma humanidade jovem não nascida ainda?
Que se estude maduramente o pró e o contra, e não se duvidará da inani-
dêem de semelhantes esperanças. Os Estados Unidos do Norte de América
não são o primeiro Estado comercial que tenha tido no mundo. Os que
precederam-lhe não têm produzido nada que parecesse uma regeneração de
a raça da qual tinham surgido.
Constantinopla fué a sua vez uma criação que parecia destinada a eclip-
sar em esplendor o presente e o passado, e a transformar o porvenir. Dis-
frutando da situação mais bela que possa ser dado no Globo, rodeada de
619
as províncias mais fértiles e mais povoadas do Império de Constantino, pare,
cía ter-se livrado, como dão em supor para os Estados Unidos, de cuan-
tosse impedimentos deplora ter tido em sua infância todo país chegado a
a maturidade* Povoada de sábios, cheia de obras mestres de toda espécie, fami-
liarizada com todos os procedimentos da indústria, possuindo manufac-
turas imensas e absorvendo um comércio sem limites com Europa,^ Ásia
e África, que rival teve jamais Constantinopla? Pára que rincão de
mundo o Céu e os homens poderão fazer nunca o que se fez para essa
majestuosa metrópole? E como pagou ela tanta solicitação? Constantinopla
não fez nada; não criou nada; não soube curar nenhum dos males que os
séculos tinham acumulado sobre o Império romano; nem uma ideia reparadora
saiu de seu seio. Nada indica que os Estados Unidos do Norte de América,
mais vulgarmente povoados que aquela nobre cidade, e sobretudo mais
que Cartago, tenham de se mostrar mais hábeis.
3 uista dos países que a rodeiam. Este grande sucesso, que lhe daria certamente
erecho a comparar-se com a Roma semítica, é mal provável ; mas basta
que o seja para o ter em conta. Quanto à renovação da sociedade
humana e à criação de uma civilização superior ou pelo menos diferente
— o que, a julgamento das massas interessadas, equivale ao mesmo — , são
fenômenos que só se produzem pela presença de uma raça relativamente
pura e jovem. Esta condição não existe em América. Todo o labor deste
país limita-se a exagerar certos aspectos da cultura européia, e não siem-
pré os mais belos ; a copiar como melhor pode o restante, e a ignorar
bastantees coisas. Esse povo que se chama jovem é o velho povo de Europa,
menos sujeito por leis mais complacientes, mas não melhor inspirado. Durante
o longo e triste viagem que lança os emigrantes a sua nova pátria, o ar
do oceano não os transforma. Chegam ali exatamente como partiram. O
simples translado de um ponto a outro não regenera às raças extenuadas.
CONCLUSÃO GERAL
A teia não resulta de uma sozinha cor nem se compõe de uma sozinha e única
matéria. Longe de ser a inspiração da sobria Pás quem traçasse suas
desenhos» o aspecto destes recorda mais bem o método dos artistas
de Cachemira. As cores mais abigarrados e as linhas mais estranhas e ca-
prichosas complicam-se aí da maneira mais surpreendente» e a força^ de
diversidade e de riqueza» contrariamente a todas as leis do gosto» é como
resulta esta obra, incomparável por sua grandeza, também incomparável
em hermosura.
As duas variedades inferiores de nossa espécie, a raça negra e a raça
amarela, são o fundo basto — o algodão e a lana que as famílias secun-
darias da raça branca suavizam com sua seda — » ao passo que o grupo ario,
fazendo circular seus hilillos mais tênues através das gerações enno-
blecidas, aplica a sua superfície — deslumbrante obra mestre — suas arabes-
cos de prata e ouro.
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Nada prova que essa alma seja uma emanação do homem e dos cuer-
pos 'políticos* Vive por eles, ao que parece; vive para eles certamente* A
medida de vigor e de saúde das civilizações é também a medida de
seu vigor e de sua saúde ; mas se observa-se que é precisamente ao eclipsarse
as civilizações quando essa alma atinge com frequência seu maior grau de
expansão e de força entre certos indivíduos e entre certas nações, se
chegará forçadamente à conclusão de que pode ser comparada a uma
atmosfera respirable que, no plano da criação, não tem razão de ser
senão em tanto deva viver a sociedade à qual envolve e anima; e que, em
o fundo, é-lhe tão alheia como exterior, e que é sua rarefacción a que traz
a morte dessa sociedade, pese à provisão de ar que possa possuir
ainda, quando o manancial vivificador tem cessado de manar*
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CONDE DE GOBINEAU
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mente não virá já, com infantis gemidos, a acusar a Darío de ter
causado a perda de Ásia, nem a Perseo da humillación de Grécia ; mas
também não a verá cumprimentar loucamente, em outras catástrofes, os efeitos de o
gênio dos Gracos ou a omnipotencia oratoria dos Girondinos. Olvi-
dando destas misérias, proclamará que as causas irreconciliables de
semelhantes acontecimentos, cerniéndose no alto muito acima de
a participação dos homens, não interessam à polémica dos partidos.
Dirá que concurso de motivos invencibles as produz, sem que ninguém a esse
respeito tenha de merecer reproche ou elogio, e distinguirá o que a ciência
não pode menos que fazer constar de quanto deve compreender a justiça.
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CONDE DE GOBINEAU
■mais insensatas fantasías. Essa maneira de ver fez que os espíritos sensatos
tivessem durante muito tempo por suspeitas as matemáticas ; mais
tarde, o estudo sério rompeu a corteza e tomou o fruto.
A etnología é, sem dúvida, uma ciência jovem. Com tudo, tem rebasado já
a idade dos primeiros balbuceos. E está o suficiente avançada para dis-
pôr de um número suficiente de demonstrações sólidas sobre as quais
pode ser edificado com toda segurança. Cada dia que passa lhe traz as mais
ricas contribuições. Entre os diversos ramos de conhecimentos que rivalizan
em provê-la, a emulación é tão produtiva, que mal lhe é possível
recolher e classificar as descobertas com a rapidez com que se sucedem.
Pluguiera a Deus que seus progressos não achassem mais obstáculos que esses!
Mas encontra-os piores. Ainda se deixa de apreciar com nitidez seu ver-
dadera natureza e, portanto, não a trata regularmente segundo
os métodos que lhe convêm.
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CONDE DE GOBINEAU
Polinesia e debilmente impressionados pelas civilizações que percebem,
fazem circular desde Madagascar até América o pouco que delas podem
compreender.
Mas para que este grande movimento de fusão geral abarque até
as últimas raças do Globo e não deixe intacta a nenhuma, não basta que um
centro civilizador despliegue toda a energia de que é capaz ; é preciso
ademais que nas diferentes regiões do mundo essas oficinas étnicas se
estabeleçam de maneira que atuem sobre o terreno, sem o qual a faz ge-
neral resultaria necessariamente incompleta. A força negativa das dis-
tancias paralisaria a expansão dos grupos mais ativos. Chinesa e Europa
não exercem uma sobre outra senão uma débil ação, ainda que o mundo eslavo
sirva-lhes de intermediário. A Índia não tem influído nunca muito sobre o
África, nem Asiria sobre o Norte asiático ; e, no caso em que as socie-
dades tivessem conservado para sempre os mesmos núcleos, Europa nunca
tivesse podido ver-se direta e suficientemente afetada, nem completamente
arrastada no torbellino. Ela o fué porque os elementos criadores de
uma civilização a propósito para favorecer a ação geral, tinham sido
previamente distribuídos em seu solo. Com as raças célticas e eslavas po-
seyó, efetivamente, desde os tempos mais remotos, duas correntes amalgama-
doura que lhe permitiram entrar, no momento oportuno, no grande
conjunto.
ocidental, não teve força para realizar nada por si sozinha a partir do século in
de nossa era.
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cidades eram tão numerosas como as espigas em um campo ; hoje são soleda-
dê mortuorias, e a Índia, ainda muito populosa, só é uma sombra de
o que foi* O África ocidental, essa terra que nutria a Europa e na
que mostravam seus esplendores tantas e tantas metrópoles, não contém
mais que as rarísimas lojas de alguns nómadas e as cidades moribun-
dá de uns quantos mercaderes* As demais partes deste continente, em
que os europeus e os muçulmanos têm levado o que uns chamam o
progresso e o que outros chamam a fé, languidecen também e só em
o interior, onde mal se penetrou, consérvase um núcleo asaz com-
pacto* Mas isso não durará* Quanto a América, Europa verte nela
quanta sangue possui e se empobrece, enquanto a outra enriquece-se* Assim,
à medida que degrada-se, a humanidade destrói-se*
Não cabe calcular com rigor o número de séculos que ainda nos separam
da ineluctable conclusão* No entanto, não é impossível vislumbrar algo
que a isso se aproxime* A família aria e, com muita mais razão, o resto
da família branca, tinha cessado de ser absolutamente pura na época
em que nasceu Jesucristo. Admitindo que a formação atual do Globo seja
anterior em seis ou sete mil anos àquele acontecimento, tem bastado esse
período para agostar em germen o princípio visível das sociedades, e
quando esse período acabou, a causa da decrepitud tinha já triunfado em
o mundo. Como queira que a raça branca tinha sido absorvida de maneira
que perdesse a flor de sua esencia nas duas variedades inferiores, estas
sofreram as modificações correspondentes que, pelo que à raça
amarela refere-se, foram muito acentuadas. Nos dezoito séculos que
depois têm decorrido, o trabalho de fusão, ainda que continuado ince-
santemente e preparando suas conquistas ulteriores em uma escala mais com-
siderable que nunca, não tem sido tão diretamente eficaz. Com tudo, aparte de
os meios de ação criados para o porvenir, a confusão étnica tem ido
muito em aumento no interior de todas as sociedades e, por consi-
guiem você, tem acelerado a hora final da perfección da amalgama. Não
perdeu-se, pois, este tempo, m muito menos; e já que tem preparado
o porvenir, e que, por outra parte, as três variedades não possuem grupos
puros, não exageraremos a rapidez do resultado se lhe calculamos, para pró-
ducirse, um tempo algo inferior ao que tem sido necessário para que seus
preparações chegassem no ponto em que hoje se acham. Nos inclinaremos,
pois, a atribuir à dominación do homem sobre a Terra uma duração
total de doze a catorze mil anos, dividida em dois períodos : um, que passou
já, e que terá visto e possuído a juventude, o vigor e a grandeza inte-
lectual da espécie ; outro, que tem começado já e que conhecerá a marcha
desfalleciente da humanidade para sua decrepitud.
cía, se não nos lembrássemos de que pelo menos lhes ficará a fé religiosa,
único vínculo, única lembrança e herança preciosa de dias melhores.
FIM
ÍNDICE
Prefacio do tradutor
LIVRO PRIMEIRO
dos povos
é infinitamente perfectible
25
28
36
38
46
57
62
7i
78
89
97
nem
119
127
3
642
CONDE DE GOBINEAU
Págs.
XV. As línguas» desiguais entre si, estão em perfeita relação com o mérito
LIVRO SEGUNDO
I. Os Camitas * *59
II. Os Semitas .
V. Os Egípcios; os Etíopes J 99
VI. Os egípcios não foram conquistadores; por que sua civilização perma'
néscio estacionária 2I ^
LIVRO TERCEIRO
V. Os Chineses 2§ 7
I. A História não existe mais que entre as populações brancas. — Por que
II. Os Zoroástricos * 3 2 7
LIVRO QUINTO
Civilização européia semitizada
Pg«-
LIVRO SEXTO
A Civilização ocidental