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Texto da Conferencia de encerramento do VIII Encontro Nacional e I Encontro Internacional com o
Pensamento de Milton Santos. Natal, 13 a 15 de maio de 2009.
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Território usado, significado que se contrapõe àquele de território, que contém a idéia de espaço palco,
espaço inerte. O território usado é ativo, pois dinamizado pela vida dos lugares e todas as suas contradições,
expressas nas reações e resistências aos aconteceres que neles se dão.
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Lugar, espaço do acontecer solidário, na definição proposta por Milton Santos.
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Não se trata aqui de uma Geografia da Percepção, coisa que não existe
na nossa perspectiva epistemológica, mas da percepção das materialidades
territoriais fundamentais a existência humana, pela emoção. Sei o que quero,
sei de que preciso e sei também que hoje isto é inatingível. Mas acredito que
seja possível obtê-lo. É esta força alimentada exclusivamente pela capacidade
de acreditar no futuro, que aqui denomino de razão emocional, ingrediente
maior da nova razão prática, não mais tão diretamente associada a razão
material. Este é também o fundamento da nova POLITICA.
Assim se descobre a liberdade, para além da racionalidade, para além
dos limites territoriais, geográficos. Assim se constrói a liberdade, grande
lição que a obra de Milton Santos nos dá com este diálogo entre a revolução e
a barbárie no seu tratamento pela disciplina geográfica.
O território usado, campo minado pela existência, tanto suporta
emoções radicais propiciadas pela guerra, quanto a radicalidade do afeto, do
sensível, da existência, propiciadas pelas solidariedades gestadas,
especialmente no campo da sobrevivência, pela grande maioria de homens
vivos no Planeta. O que conhecemos nós os geógrafos hoje sobre a construção
dos lugares, dos aconteceres e das solidariedades no mundo pobre?
Emoção e comunicação elementos centrais na configuração dos lugares
no mundo de hoje, esse espaço do acontecer solidário sedimentado pela
cultura, manifesto pela saudável e corajosa coexistência que dignifica os
homens pobres e lentos do planeta, que à partir dos lugares, pela emoção,
constroem o futuro do mundo e processos ainda bastante desconhecidos das
ciências humanas e sociais.
Para elas um duplo desafio se apresenta: primeiro ter a coragem para a
produção de novos paradigmas e segundo aventurar-se no conhecimento do
mundo novo. Sabemos todos que são poucos os colegas que hoje se atrevem a
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Não seria esse um grito do território, pois ela tem origens detectadas e
bem específicas segundo artigos de jornalistas e intelectuais críticos
inconformados com a unanimidade da mídia e sua tentativa de despolitizar e
abafar o processo de compreensão desse novo “evento” 3 cujo significado se
aplica em cheio a dimensão LUGAR/MUNDO suscitada pela discussão
central deste nosso Encontro?
Outros exemplos intrigantes de eventos e processos que caracterizam
estes tempos presentes são também objeto de estudos geográficos. Poderíamos
citar alguns, que dizem respeito à dinâmica dos lugares e da vida cotidiana,
como por exemplo: o mundo virtual e o uso do território revelando a
esquizofrenia do lugar (das lanhouses e da subserviência especialmente dos
jovens ao computador...), a mercantilização do corpo, a servidão ao dinheiro
puro pelo consumo desvairado e o uso do território.
Como podemos estudar os shoppings, esses objetos técnicos, fora da
usual perspectiva antropológica, sociológica ou econômica, reforçando a sua
compreensão geográfica, desvendando através do método a indissociabilidade
contraditória entre sistema de objetos e ações, portadores de aconteceres
perversos e segregadores? Que método construir para, além dos usuais
esquemas analíticos, compreender esse objeto, templo do mais terrível dos
fundamentalismos contemporâneos – o CONSUMO - , simbiose perfeita entre
a realização LUGAR/MUNDO, no presente?
Lugares novos que se forjam exigindo um esforço intelectual maior, por
exemplo, dos geógrafos urbanos que insistem em conhecer a urbanização com
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“Um evento é o resultado de um feixe de vetores, conduzido por um processo, levando uma nova função ao
meio preexistente. Mas o evento só é identificável quando ele é percebido, isto é, quando se perfaz e se
completa. E o evento so se completa quando integrado ao meio.” (SANTOS, 1996: 76 e 77). Fomos sempre
ensinados a limitar o conceito de evento a simples funcionalidade, tão cara aos geógrafos urbanos, aos
urbanistas e suas razões simplesmente funcionalistas.
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História, conceito que prefiro usar, malgrado os cuidados tidos por Milton,
quanto a sua utilização. Mas é realmente disto que se trata. A maioria
crescente do mundo, por razões diversas, tomarem consciência de que também
são sujeitos da história, que tem direitos ao uso do território, que possuem
identidades a serem territorial e localmente defendidas!
Tudo indica não haver espaço para a subjetividade exacerbada – o uso
do território e a dinâmica do lugar não o permitem – mas forçando ainda que
de forma violenta por vezes, a experiência da convivência no diverso.
Na pobreza, por mais que a sociologia tenha insistido, não há
homogeneidade, mas ela implica necessariamente na sociodiversidade,
atributo deste período técnico, científico e informacional.
Mas não é a sociologia quem nos ajuda a compreender este novo
processo, mas sim a filosofia, especialmente a Filosofia das Técnicas tão cara
ao nosso homenageado. As tragédias humanas geradas pela pobreza unem os
pobres e, por mais contraditório que isto possa parecer, definem novas
solidariedades, constrói lugares que assustam os donos do mundo do presente!
Esta contemporaneidade, também chamada de modernidade trouxe um
novo conceito e modo de viver, mas não deixou fechada, acabada, as
possibilidades de como utilizá-la e quem tem o direito de usar suas benesses.
Daí o conceito de pós-modernidade não se aplicar jamais ao raciocínio
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geográfico. Caso contrário como explicaríamos as rugosidades? Como
justificaríamos a denominada Geografia Cultural? A legitimação das classes
sociais, em seu processo de apropriação dos benefícios trazidos pela
modernidade é que se transforma neste tempo presente. Cada vez mais a
classe média que durante um século legitimou a modernidade começa, enfim,
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rugosidade conceito forjado por Milton Santos
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