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Resumo
Esta comunicação é parte de uma pesquisa maior que está sendo desenvolvida no
GPMIA/ICA/UFPA, coordenado pela etnomusicóloga Líliam Barros, que desenvolve
estudos sobre a relação entre mito e música entre povos indígenas do Alto Rio Negro, no
Amazonas. Buscando aportar contribuição antropológica para tais estudos,
empreendemos pesquisa exploratória sobre o complexo cultural das flautas sagradas,
com ênfase no mito de Yurupari, o “dono das flautas sagradas”. Nossa pesquisa conta
com o apoio do PPGArtes/UFPA e do PNPD/CAPES. Para o seu desenvolvimento, foram
feitos trabalhos de campo nas cidades de S. Gabriel da Cachoeira e no distrito de
Iauaretê, no Amazonas, cuidadosa leitura sobre a literatura e etnografias relativas ao
assunto, apoiadas por teorias das ciências sociais, da etnomusicologia e do imaginário
antropológico de G. Durand. O produto desta pesquisa deverá contribuir para o conjunto
dos estudos em Etnomusicologia, trazendo aporte antropológico, iluminado pelo
universo simbólico. A pesquisa está em andamento e esta nossa comunicação apresenta
uma parte das nossas análises, parte esta que conta com o apoio multidisciplinar do
imaginário antropológico e da sociologia das emoções aplicados à análise da mitologia
relativa ao complexo cultural das flautas sagradas.
Palavras-chave
Complexo cultural das flautas sagradas; Simbolismo; Emoções sociais: inveja, ciúme,
vingança; Etnomusicologia; Povos indígenas do Alto Rio Negro-AM; Mitologias
indígenas; São Gabriel da Cachoeira; Yurupari
Abstract
This communication is part of a larger research project being developed by GPMIA / ICA
/ UFPA coordinated by ethnomusicologist Liliam Barros, who conducted studies on the
relationship between myth and music of the people of Rio Negro in Amazonas. Seeking
contribute anthropological contribution to these studies, we undertook exploratory
research on the cultural complex of sacred flutes, with emphasis on myth Yurupari, the
owner of the sacred flutes. Our research is supported by the PPGArtes / UFPA and
handbag PNPD CAPES. For its development, were done fieldwork in the city of S.
Gabriel and in the District of Iauaretê, Amazonas, careful reading of the literature and
ethnography on the subject, supported by theories of social sciences, ethnomusicology
and by anthropology of the imaginary of the G. Durand. The product of this research will
contribute to the set of studies in ethnomusicology, bring anthropological contribution,
lit by the symbolic universe. The research is ongoing and this our communication presents
a part of our analyzes, this part that has the support of multidisciplinary anthropological
imagination and the sociology of emotions applied to the analysis of mythology
concerning the cultural complex of sacred flutes.
Keywords
Sacred flutes, Symbolism, Social emotions
Olhar antropológico, simbolismo e emoção
na mitologia das flautas sagradas1
Apresentação
Esta comunicação apresenta parte de uma pesquisa maior que está sendo
desenvolvida no Grupo de Pesquisa Música e Identidade na Amazônia – GPMIA, no
Instituto de Ciências da Arte – ICA da Universidade Federal do Pará – UFPA, pesquisa
esta coordenada pela etnomusicóloga Líliam Barros, que desenvolve estudos sobre a
relação entre mito e música dos povos indígenas do Alto Rio Negro, no Amazonas.
Buscando aportar contribuição antropológica para o conjunto das pesquisas
desenvolvidas no GPMIA, empreendemos pesquisa exploratória sobre o complexo
cultural das flautas sagradas, com ênfase no mito de Yurupari, o dono das flautas
sagradas. Nossa pesquisa conta com o apoio do PPGArtes/UFPA e do PNPD/CAPES e
as supervisões da coordenadora do GPMIA e do antropólogo Robin Wright da
Universidade da Flórida – EUA.
Para o desenvolvimento da nossa pesquisa, foram feitos trabalhos de campo,
buscando uma maior e mais concreta aproximação com aquele campo, ocasião em que
foram feitas entrevistas informais e observação sobre o comportamento cultural dos
povos em foco, nas cidades de S. Gabriel da Cachoeira e no distrito de Iauaretê, além de
uma cuidadosa leitura sobre a literatura e etnografias relativas ao assunto, apoiadas por
teorias das ciências sociais, da etnomusicologia e do imaginário antropológico de G.
Durand. O produto desta pesquisa deverá contribuir para o conjunto dos estudos em
Etnomusicologia, iluminado pelo universo simbólico e, desta forma, agregando
significados socioculturais, que deverão melhor contextualizar as especificidades das
práticas culturais daqueles povos no seu universo musical. A pesquisa está em andamento
e a nossa comunicação apresenta uma parte das nossas análises, à luz de teorias
multidisciplinares, aplicadas ao estudo do complexo cultural das flautas sagradas.
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Partes desta pesquisa foram apresentadas na 28ª. Reunião Brasileira de Antropologia, na PUC-SP, São
Paulo-SP, 02-07/07/2012; no Seminário de Pesquisa em Música no Pará do 38º. Encontro de Artes de
Belém – ENARTE, em Belém-PA, 01-04/12/2011; no Ciclo de Estudos Etnomusicológicos do
GPMIA/UFPA e do GEMA/UEPA, em Belém-PA, 05/12/2012.
Aporte antropológico: algumas noções fundamentais
Inveja, ciúme e vingança são sentimentos humanos que podem gerar regras sociais
e comportamentos culturais específicos, justificar interdições e alimentar festas e guerras;
são sentimentos sociais e podem ser estudados por uma sociologia das emoções, que leva
em conta conflitos entre as culturas objetiva e subjetiva, elementos de intersubjetividade
e interações ambientais e sociais. Estes sentimentos aparecem bem marcados tanto nas
mitologias das grandes civilizações quanto das culturas simples, sendo fortemente
presentes na mitologia dos povos indígenas do Alto Rio Negro. Sentimentos de inveja,
ciúme e, sobretudo, o de vingança podem ser aqui entendidos como “motores de cultura”,
à maneira de como o entreviram Carneiro da Cunha e Viveiros de Castro (1986), no
estudo que fizeram sobre os Tupinambás. As mitologias dos povos do Rio Negro
apresentam-se fortemente motivadas por esses sentimentos e alavancam iniciativas
políticas e práticas culturais e sociais importantes, como o canibalismo, a criação do rito
de puberdade e disputa pelo poder, todos presentes na narrativa mítica sobre Yurupari, o
dono das flautas sagradas, um mestre de cerimônias, um benzedor e um pajé, dono do
xamanismo e das doenças.
Quando ele é convidado para uma Festa de caxiri, ele sabe que era uma festa de
vingança, para “acabarem” com ele. Ele conhece as regras sociais e aceita o seu destino,
mas, devido à sua natureza, ele não deveria se acabar no estômago do inimigo. Então, ele
mesmo ensina como poderia ser destruído pelo fogo de certas lenhas. Ora, Fogo aparece
ali como um forte símbolo de purificação e transcendência, permitiria que ele subisse
como fumaça e se mantivesse em essência. Assim, o espírito de Yurupari subiu embalado
por seu canto de vingança. Na terra, ficaram suas cinzas e seu veneno, e eles vão alimentar
o “estouro” de uma paxiúba, que rompe do chão e sobe até o céu, permitindo uma
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A importância do primogênito e do tio materno nas sociedades indígenas de um modo geral é bem
conhecido pelos antropólogos e não há aqui lugar para explorá-la.
intermediação, ao mesmo tempo em que torna-se a matéria-prima para a fabricação de
flautas sagradas, para serem usadas na Iniciação dos meninos.
Assim seria, não fosse a astúcia das mulheres. Movidas por sentimentos
controversos de inveja, ciúme e vingança, elas furtam as flautas que representam o
conhecimento tradicional e, consequentemente, o poder. As flautas tornam-se um objeto
de disputa entre os homens e as mulheres. As mulheres resistem e os homens empreendem
uma verdadeira guerra e elas perdem. As mulheres são mortas, banidas, excluídas da
transmissão do conhecimento tradicional e, consequentemente, do poder político e
cerimonial.
Referências