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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO

DE 9 A 12 DE OUTUBRO

CIRCUITOS DE PROXIMIDADE E A CONSTRUÇÃO DE QUALIDADE:


EXPERIÊNCIAS DA GRANDE FLORIANÓPOLIS, SC

DANIELE LIMA GELBCKE1


MARIA DAS GRAÇAS S. L. BRIGHTWELL2

Resumo: Termos como circuitos curtos ou de proximidade, cadeias agroalimentares curtas, redes
alimentares alternativas (AlternativeFood Networks) têm em comum a proposição de uma maior
aproximação - tanto relacional quanto geográfica - entre produtor e consumidor, priorizando
principalmente a qualidade dos produtos, garantida por critérios de confiança e informação e
contribuindo para (re) localização da alimentação. Esta comunicação visa contribuir com este debate,
buscando confrontar os principais critérios utilizados na definição desses conceitos, com a realidade
de algumas experiências da Grande Florianópolis.
Palavras-chave: circuitos curtos; orgânicos; Grande Florianópolis

Abstract: Circuitos curtos ou de proximidade, short food supply chains and Alternative Food
Networks are terms used to proposea close proximity between producers and consumers- both in
geographic and relational terms- prioritizing quality (guaranteed by trust and information) thus
contributing to ( re) localize food production and consumption. This communication aims to contribute
to this debate, seeking to confront the main criteria used in defining these concepts with the reality of
some experiences of Florianópolis.
Key-words: short food supply chain; organic; greater Florianópolis

1- Introdução
O surgimento ou renovação de formas alternativas de produção, distribuição e
consumo vem ganhando visibilidade em vários países e são orientadas por três
estratégias que se destacam: a aproximação entre produção e consumo, podendo a
mesma ser geográfica ou relacional, a produção de alimentos a partir de bases mais
ecológicas e a qualidade dos alimentos em contraponto à padronização imposta
pelas indústrias de produção em massa. A terminologia é ampla e tenta dar conta de
experiências complexas e situadas em diversos contextos geográficos: circuitos

1
Doutoranda no programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa
Catarina. E-mail de contato: dani.gelbcke@gmail.com
2
Pós doutora no programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa
Catarina. E-mail de contato:gracabrightwell@hotmail.com

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curtos (AUBRI e CHIFFOLEAU, 2009; DAROLT et al., 2013) ou de proximidade


(SILVA, 2009), cadeias agroalimentares curtas (FERRARI, 2011, MARSDEN et al.,
2000) ou redes alimentares alternativas (Alternative Food Networks) (RENTING et
al., 2003).
Ainda que apresentem possibilidades e potencialidades para produtores e
consumidores, autores como Ferrari(2011) e Darolt et al.(2013) tem apontado para a
necessidade de se aprofundar conceitos, métodos e abordagens, capazes de
traduzir a complexidade empírica destas experiências. A noção ainda está em
construção no Brasil, os critérios adotados em outros países precisam ser validados,
ou quem sabe, novos critérios criados para a nossa realidade. Buscando analisar de
forma empírica o assunto, o presente artigo se baseia em duas experiências
desenvolvidas na Grande Florianópolis, estado de Santa Catarina, ambas
envolvendo a produção e comercialização de produtos orgânicos em circuitos
regionais.

2- Abordagens teóricas sobre circuitos curtos


O critério de proximidade geográfica é um dos atributos mais importantes para
definir os circuitos curtos, regionais, diretos ou de proximidade. Malassis (apud
SILVA, 2009) argumenta que estes são a manifestação de relações restritas aos
mercados locais e regionais, que se caracterizam pela circulação de produtos
frescos, elaborados artesanalmente e comercializados em pequenas quantidades,
com relação ao conjunto do abastecimento alimentar. Maluf (2004) também enfatiza
a proximidade física entre os agentes através do conceito de „circuitos regionais‟.
Estes seriam formados no interior do país ou no entorno dos núcleos urbanos de
pequena e média dimensão e, através da inclusão da agricultura familiar, capazes
de dinamizar as economias territoriais.
Na argumentação pela relocalização dos sistemas agroalimentares, dois
conceitos são comumente mobilizados: embeddedness (enraizamento) e
sustentabilidade ecológica. O primeiro baseia-se no argumento de que as interações
face-a-face ajudariam a fortalecer os valores comunitários, de justiça e segurança
alimentar (MURDOCH et al., 2000). O segundo, aponta para a inviabilidade a longo

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prazo do sistema capitalista de produção e consumo de alimentos, que entres outras


coisas, lança mão de extenso e excessivo uso de transporte a largas distancias,
geralmente referido como foodmiles (distância percorrida pelo produto, ou pegada
ecológica) (NORBERG-HODGEet al., 2002).
Entretanto, o próprio Maluf (2004) ressalta que a aproximação geográfica, por
si só, é insuficiente para gerar relações sistemáticas e sinérgicas entre os agentes
econômicos instalados numa região. Para este, as relações devem ser construídas
por processos que refletem as formas sociais de ocupação do território, as opções
de estratégias dos agentes econômicos envolvidos e as ações públicas voltadas
para promover as atividades econômicas locais e regionais.
A defesa da escala de produção local, por sua vez, como sendo a mais
ecológica, justa socialmente e economicamente, ou ainda, portadora da melhor
qualidade muitas vezes esquece que “o resultado produzido por um sistema
alimentar é contextual, ou seja, ele depende de atores e agendas, empoderados por
relações sociais particulares de um dado sistema alimentar", argumentam Born e
Purcel (2009, p. 117). Um exemplo neste sentido é a adoção da compra direta do
produtor por redes varejistas maiores, como os supermercados, que o fazem com o
objetivo de reduzir custos e garantir a qualidade dos produtos, relacionada ao
frescor dos mesmos. Esta relação direta não garante, entretanto, relações sociais e
econômicas mais justas para os fornecedores.
Outra abordagem usada entre os que discutem a aproximação entre produção
e consumo é aquela focada no número de atores envolvidos. Para Matte et al.
(2014), um dos aspectos centrais e decisivos na organização das cadeias curtas de
suprimentos, refere-se à redefinição e mesmo a construção das relações com os
mercados. Para os autores, não há cadeia curta sem que ocorra o encurtamento ou
estreitamento das distâncias e do contato entre produtores e consumidores. Autores
como Chiffoleau (2008), Humbert e Castel (2008), Montiel (2010) defendem que o
encurtamento não se dá apenas pelas relações de confiança, mas pela diminuição
do número de intermediários. Esta discussão inspirou a definição oficial de circuito
curto na França, que o compreende como o modo de comercialização de produtos
agrícolas que se exerce, seja através da venda direta do produtor ao consumidor,
seja pela venda indireta, na condição que haja um único intermediário

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(http://agriculture.gouv.fr/circuits-courts). Esta definição engloba uma grande


variedade de canais de comercialização de alimentos, tais como: feiras, venda na
propriedade, venda pela internet, no domicílio, em pontos de entrega, todas essas
consideradas vendas diretas. As vendas indiretas podem ocorrer via restaurantes,
lojas especializadas, pequenos comércios, restaurantes coletivos (merenda escolar,
empresas, hospitais, etc.) e mesmo médias e grandes redes de supermercados.
Um terceiro critério de aproximação entre produção e consumo é o da
informação. Marsden et al. (2000:426) deixam claro que “não é o número de vezes
que o produto é manuseado ou a distância pela qual é transportado que é
necessariamente crítica, mas sim, o fato do produto alcançar o consumidor
carregado de informações”. Estas informações devem permitir ao consumidor
estabelecer conexões com o lugar/espaço de produção, valores, pessoas envolvidas
e métodos produtivos utilizados, como por exemplo, produtos com a certificação Fair
Trade (Comércio Justo). Desde este ponto de vista, o termo cadeias curtas,
utilizado pelo autor, não é compreendido como encurtamento geográfico, nem
mesmo relacional, visto que a relação direta produtor – consumidor não é
necessariamente realizada. Renting et al. (2003) segue o mesmo princípio, ao
compreender circuitos curtos como as inter-relações entre atores que estão
diretamente implicados na produção, transformação, distribuição e consumo de
novos alimentos. Esta relação pode dar-se a curta distância ou a longa distância,
sendo que neste caso, o encurtamento não se produz em termos de distância física,
mas organizativa e cultural através da informação, da confiança e dos valores
compartilhados em torno da qualidade regional, ecológica ou natural.
Todo este debate sobre cadeias ou circuitos curtos/de proximidade surge como
contraponto aos circuitos longos e a alimentação altamente industrializada, sendo a
qualidade dos alimentos uma questão central. Apesar do arcabouço de regras
sanitárias e boas práticas de manipulação adotadas pela grande distribuição,
eventos de contaminação e adulteração de alimentos nos processos produtivos e
nas indústrias alimentares vem promovendo a demanda por produtos menos
transformados (MALUF e WILKINSON, 1999). Alimentos „naturais‟, produzidos com
respeito ao meio ambiente e ao bem-estar animal, aspectos culturais e éticos se
juntam ao rol de valores adotados pelos consumidores. Para Pimentel (2005) esta

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demanda por qualidade está diretamente relacionada ao surgimento da agricultura


orgânica, um dos segmentos agroalimentares com maior expansão mundial, com
taxas anuais de crescimento entre 15 e 20%, contra 4 e 5% de crescimento do setor
industrial alimentar (NIEDERLE e ALMEIDA, 2013).
Na verdade, como observam Niederle e Almeida (2013), o mercado de
alimentos orgânicos se caracteriza por uma diversidade e segmentação de canais
de comercialização, cada qual impondo um conjunto mais ou menos específico de
exigências aos produtores, tais como, escala de produção, diversificação dos
produtos, regularidade de entrega, padrões de qualidade etc. Se Goodman (2002),
propõe que estas redes alimentares alternativas, podem criar “novos espaços
econômicos” capazes de superar as forças globalizantes, mercados não
controlados, divisão do trabalho e poder de grandes empresas, o que se observa na
prática é a convivência em um mesmo espaço geográfico de formas convencionais
de distribuição e formas alternativas, muitas vezes interseccionadas e sobrepostas
(MIOR, 2010, SONNINO E MARSDEN, 2006). Berger (2008), por sua vez, aponta
para uma tendência à apropriação da comercialização de produtos de qualidade
diferenciada como os ecológicos, artesanais, territoriais por esquemas clássicos.
Mas seria de fato possível estabelecer uma diferenciação nítida entre circuitos
convencionais e alternativos?

3 - As experiências da Grande Florianópolis


A produção orgânica é considerada uma experiência emergente da agricultura
familiar catarinense e uma importante alternativa de renda para os pequenos
produtores, que ocupam 87% dos estabelecimentos rurais do Estado de Santa
Catarina e tem um papel importante na sua economia, gerando 64% do Valor Bruto
da Produção Agropecuária (IBGE, 2006). Segundo a Zoldan e Mior (2012), algumas
tendências contribuem para o desenvolvimento desta produção no Estado, como o
crescimento e consolidação de diversos mercados regionais de alimentos em função
do crescimento populacional, e da expectativa da melhoria de renda e da qualidade
de vida da população.

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Em estudo realizado em 2012, a Empresa de Pesquisa Agropecuária e


Extensão Rural de Santa Catarina (EPAGRI) levantou a presença de 603
agricultores orgânicos em 138 municípios catarinenses, e um valor total da produção
dos principais produtos comercializados no Estado de R$ 12,656 milhões. A região
da Grande Florianópolis, área de interesse para este estudo, possuía naquele
momento 52 produtores orgânicos, especializados principalmente em hortaliças
(ZOLDAN e MIOR, 2012). Outro dado interessante apontado pelo estudo é que o
próprio município é o principal destino da produção comercializada, caracterizando,
portanto, um circuito curto. A venda direta ao consumidor em feiras ou na
propriedade é o principal canal de comercialização para todos os agricultores
entrevistados, e a comercialização em supermercados (olerícolas) e cooperativas
(olerícolas e produtos de lavouras temporárias ou permanentes) é citada como
importante para uma parcela significativa dos mesmos.
O abastecimento alimentar através da produção regional de alimentos
orgânicos e agroecológicos pode se dar através de estruturas de varejo, tanto
públicas como privadas. No município de Florianópolis, destacam-se os Programas
de Aquisição de Alimentos (PAA) e de Alimentação Escolar (PNAE) enquanto
iniciativa pública e, o Box de produtos orgânicos localizado na estrutura da CEASA
de São José; as feiras de produtores; os supermercados; as lojas especializadas e
os sacolões como iniciativa privada, mesmo quando utilizam espaço público.
Procurando responder sobre a possibilidade de diferenciações nítidas entre circuitos
convencionais e alternativos buscaremos analisar duas experiências de
comercialização de produtos orgânicos no mercado de Florianópolis. Os estudos de
caso foram selecionados a partir de trabalho de campo realizado no âmbito da
disciplina “Circuitos Curtos: inclusões e exclusões no sistema agroalimentar”3, cujo
objetivo principal foi confrontar a teoria sobre o assunto com experiências locais de
circuitos curtos. As saídas de campo utilizaram como ferramentas para coleta de
dados: entrevistas semi estruturadas, observações e registro fotográfico.Partindo
dos critérios de aproximação geográfica entre produção e consumo de alimentos
orgânicos, o estudo adotou a presença de no máximo um intermediário para a

3
Tópico especial ministrado no PPGEO UFSC em 2014 pelos professores Clécio Azevedo da Silva e
Maria das Graças S. L. Brightwell

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primeira seleção. Dentre os casos que atendiam a esses critérios, foram


selecionadas duas experiências, uma de venda direta através de feira livre, e outra
em rede de supermercados, partindo do pressuposto que apresentam relações
comerciais diferenciadas. As informações descritas foram coletadas através de
entrevistas com agricultores e varejo.
A Experiência 1 se refere a um pequeno grupo de agricultores familiares do
município de São Bonifácio (SC), localizado a 79 km de Florianópolis, principal
mercado consumidor. Este grupo composto por seis famílias comercializa a maior
parte da produção em uma feira semanal, realizada dento do campus da
Universidade Federal de Santa Catarina. O restante da produção é entregue em um
mercado especializado em produtos orgânicos (denominado Mercado M) que possui
duas lojas e uma rede de restaurantes, em outros restaurantes da capital, e
esporadicamente para uma empresa que abastece supermercados (Empresa C.V.).
O volume médio comercializado é de 5.000 unidades (kg, maço) de hortaliças e
frutas por semana.
Para este grupo a comercialização dos produtos não é um problema, visto que
a demanda é maior do que oferta. A dificuldade está no estabelecimento de novos
parceiros para produção, falta de mão de obra especializada, infraestrutura precária
para o escoamento e falta de apoio do poder público municipal. Dada a dificuldade
de expandir a produção, a oferta da feira é complementada com produtos
provenientes do Mercado M, que além de cliente, é também fornecedor de produtos
orgânicos para os agricultores/feirantes. Esta parceria extrapola as relações
comerciais segundo o agricultor entrevistado, visto que o Mercado M absorve toda a
produção não comercializada na feira, independente de pedidos formalizados. Como
contrapartida, os agricultores recolhem as sobras do Mercado M e sua rede,
desonerando estevarejo de contratar uma empresa para fazer o descarte.
A Experiência 2 é de agricultores do município de Antônio Carlos, distante 32
km de Florianópolis. Estes, incentivados por uma rede de supermercados, iniciaram
a produção de hortaliças convencionais e a converteram em seguida para orgânica.
Hoje com produção e mercado consolidados, comercializam através da empresa da
família (Empresa A) a própria produção e de vários parceiros do município, do
Estado de Santa Catarina, e esporadicamente do Rio Grande do Sul, Paraná e São

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Paulo.Como a produção de orgânicos não supre a necessidade dos supermercados,


a empresa mantém o beneficiamento de alimentos convencionais adquiridos de
outros agricultores, os quais denominam de produtos tradicionais. Na agroindústria,
orgânicos e “tradicionais” são manipulados separadamente, processados e
acondicionados em embalagens diferenciadas. Embora exista este mix de produtos,
o marketing da empresa é feito em cima dos alimentos orgânicos, que apresentam
um crescimento de 30 a 40% ao ano, contra 12 a 15% dos tradicionais. A parceria
com fornecedores de outras localidades de SC e de fora do Estado se dá pela
necessidade de atender o supermercado, que apresenta uma demanda de
variedade de produtos e em um nível de escala, que não é possível produzir
localmente. A figura 1 mostra os fluxogramas das duas experiências.

4 - Discussão e reflexões
Conforme observado nos fluxogramas (figura 1), embora a comercialização
entre o fornecedor principal e o varejo seja realizada através de uma relação direta,
e grande parte dos produtos serem provenientes da região da Grande Florianópolis,
em ambos os casos existe a necessidade de ampliação dos circuitos para atender a
demanda do mercado consumidor, colocando em questão o critério“aproximação
geográfica”. Da mesma forma, a presença de no máximo um intermediário também
pode ser questionada, visto que em ambos os casos, parte dos produtos é adquirido
de outros fornecedores. No caso da Empresa A, a mesma serve de entreposto dos
supermercados, que por falta de estrutura logística para comprar direto dos
agricultores, os encaminha para esta empresa, que realiza o beneficiamento e a
comercialização dos produtos com sua marca. A vantagem para o supermercado,
além da transação entre empresas (CNPJ), e a redução do número de fornecedores
é a presença de uma marca reconhecida nas suas gôndolas.
Com relação à qualidade dos produtos, nas duas experiências a mesma está
atrelada principalmente ao rótulo de „orgânico‟. Neste caso, a certificação é
ferramenta obrigatória, mesmo para a feira onde a qualidade também é garantida
por relações de confiança. Para a Empresa A, que estabelece relação com varejo de
maior porte, a rastreabilidade é sugerida por este último. Vale destacar que as redes

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varejistas no Brasil são hoje estimuladas pela ANVISA (que desenvolve o PARA4) a
realizar um maior controle de qualidade e de rastreabilidade dos alimentos até o
produtor.

Figura 1. Fluxograma das relações comerciais (elaboração própria)

No caso do supermercado analisado, a rastreabilidade foi também adotada


para os alimentos orgânicos, como uma garantia a mais, um diferencial de venda
segundo o gerente do supermercado. No entanto, este diferencial provocou a
exclusão de um número significativo de fornecedores, que foi reduzido de 280 para
160 após a adoção da rastreabilidade, segundo o mesmo entrevistado.
Os circuitos analisados se mostram imbricados em relações de solidariedade
e conflito com os circuitos longos, perspectiva defendida por alguns autores como
Sonnino e Marsden (2006) e Mior (2010). Sendo assim, a noção de localização
alimentar, entendida como a capacidade de garantir a proximidade geográfica entre
produtor e consumidor pode ser mobilizada tanto por grandes redes varejistas
quanto por feirantes. Se em ambos os casos o fluxo material, que são os alimentos,
é reduzido com a aproximação geográfica, esta proximidade não elimina regras,

4
OPrograma PARA é destinado aos produtos convencionais, com o intuito de controlar se o nível de
resíduos de agrotóxicos está dentro dos Limites Máximos de Resíduos (LMR); conferir se os
agrotóxicos utilizados estão devidamente registrados no país e se foram aplicados somente nas
culturas para as quais estão autorizados; estimar a exposição da população a resíduos de
agrotóxicos em alimentos de origem vegetal e, consequentemente, avaliar o risco à saúde dessa
exposição (ANVISA, 2012).

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normas, sistemas de informação (fluxo imaterial) definidos para além da escala local,
representando desafios para aquelas iniciativas que almejam escapar das regras
das redes convencionais.
Da mesma forma, a redefinição das relações entre produtores e
consumidores, com sinais claros e transparentes da proveniência e das qualidades
atribuídas aos produtos são estratégias utilizadas não só por estes circuitos
alternativos, mas também por grandes redes varejistas através de sistemas de
rastreabilidade. Em terceiro lugar, reconhecemos ainda que estudos sobre os
circuitos de produção, distribuição e consumo não podem mais ignorar o consumo
diante da crescente ansiedade e desconfiança dos consumidores com relação ao
moderno sistema agroalimentar e do nível de exigência com a relação à diversidade
e constante disponibilidade destes alimentos.
Esta dificuldade em escapar das normas rígidas dos circuitos longos, não
significa que outras perspectivas não sejam alcançadas através destas iniciativas.
Seguindo alguns elementos elucidados por Chiffoleau (2008), podemos pressupor
que elas: i) contribuem para uma relação comercial mais justa, visto que o número
de intermediários é reduzido e existem relações de confiança e negociação entre
produtores, intermediários e varejistas. Neste sentido, valem dois comentários, na
feira, a relação direta possibilita maior transparência sobre como são definidos os
preços, pois o produtor pode explicar ao consumidor problemas com sazonalidade,
clima, processos produtivos, etc. Embora os preços do supermercado sejam
superiores, as entrevistas também indicaram transparência na definição de preços
entre fornecedores, intermediário e supermercado, apesar desta transparência não
chegar ao consumidor final; ii) promovem a organização social dos agricultores, seja
através de associação informal, como no caso do grupo de São Bonifácio, seja pela
parceria comercial estabelecida pela Empresa A com seus fornecedores,
reestabelecendo laços de solidariedade frequentemente perdidos nos circuitos
longos; iii) fortalecem a agricultura familiar, com base em processos produtivos mais
sustentáveis do ponto de vista ambiental, econômico e social, importantes para o
desenvolvimento rural. Mesmo carecendo de maior aprofundamento, nos parece que
mais do que a aproximação geográfica e/ou relacional entre produção e consumo, o
que deve ser analisado é a forma como agricultores, distribuidores e consumidores

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vêm construindo os mercados, participando da definição dos atributos de qualidade,


das regras de controle, e se apropriando da renda gerada.

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