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técnica e

transformação
perspectivas
antropológicas
Organizador
carlos emanuel sautchuk
Copyright © 2017 dos autores

Editora: ABA Publicações


Revisão: Malu Resende
Diagramação: Luis Costa
Projeto Gráfico: Daniel Mira
Capa: Daniel Mira
Imagens: Todas as fotografias que abrem os capítulos são de autoria daqueles que assinam os
textos, exceto quando indicado.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Angélica Ilacqua CRB-8/7057

Técnica e transformação : perspectivas antropológicas / organização de


Carlos Emanuel Sautchuk. -- Rio de Janeiro : ABA Publicações, 2017.
500 p.

Bibliografia
ISBN Impresso: 978-85-87942-55-5
ISBN Ebook PDF: 978-85-87942-52-4.

1. Antropologia 2. Filosofia 3. Technê (Filosofia) I. Sautchuk, Carlos Emanuel

18-0047 CDD 301

Índices para catálogo sistemático:


1. Antropologia

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de


Nível Superior - Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001
Parte II
Ciências, ambientes e conhecimentos tradicionais

5 Técnicas de navegação por jangadeiros no litoral norte da


Paraíba: “marcação por terra”, GPS, propulsão à vela e motor 153
Gabriel Coutinho Barbosa e Rafael Devos

6 Matar e manter: conservação ambiental como transformação


técnica 183
Carlos Emanuel Sautchuk

7 “Tem que saber botar”: técnica e habilidade na pesca com timbó


entre os Wapichana em Roraima 213
Alessandro Roberto de Oliveira

8 A volta do que não foi: sobre animais presentes em naturezas


futuras 239
Guilherme José da Silva e Sá

Parte III
Máquinas: gesto e objeto técnico

9 “Flecha é igual 22”: gesto técnico e transformação no arsenal de


caça dos Panará 265
Fabiano Campelo Bechelany

10 Invenção e maquinização no campo: o caso da sangria de


seringueiras no interior de São Paulo 295
Eduardo Di Deus

11 Mestres, máquinas e ferramentas: sobre a construção da


carpintaria naval tradicional 327
Simone Soares
Capítulo 8

A volta do que não foi: sobre animais


presentes em naturezas futuras

Guilherme José da Silva e Sá

Neste artigo1 apresento dados coletados em pesquisa etnográfica iniciada no


ano de 2014 na Reserva da Faia Brava – considerada pelo Instituto de Conserva-
ção da Natureza e Biodiversidade / Instituto de Conservação da Natureza e das
Florestas (ICNB / ICNF)2 como a primeira Área Protegida Privada de Portugal.
A Reserva da Faia Brava possui ainda uma característica que tem sido fomen-
tada pela associação que a administra – a Associação Transumância e Natureza
(ATN) – que é a de se destinar ao restauro ecológico. Esta especificidade fez
da Reserva o ponto de partida para um ambicioso projeto de renaturalização3
da região Oeste da península ibérica, que prevê a reintrodução de espécies
animais de grande porte em território português através da sua integração
à rede Rewilding Europe. Ao longo do texto descreverei algumas das etapas
necessárias à criação de áreas de renaturalização, bem como levantarei hipó-
teses vinculadas ao projeto de renaturalização da Europa, particularmente
de Portugal.

1 Artigo originalmente publicado em língua inglesa sob o título “The return of what never left: ani-
mals present in future natures (Vibrant, 14, n. 2 – 05/08/2017).
2 Órgão público responsável pela conservação da natureza e biodiversidade e de autoridade florestal
portuguesa.
3 O termo “renaturalização” vem sendo utilizado entre biólogos da conservação para designar um
processo deliberado de reintrodução de espécies animais e vegetais com o objetivo de recuperar
determinado ecossistema degradado. A expressão rewilding tem tido diversas traduções de acordo
com as regiões em que se aplica, tais como “assilvestramento”, “refaunação”, “ensauvagement”.
Utilizo aqui o termo “renaturalização” como me foi apresentado em campo de acordo com meus
interlocutores.

239
Técnica e transformação

Um introdução etnográfica ao campo de pesquisa

Acordei cedo para pegar um ônibus na rodoviária de Lisboa que me levaria


até Guarda, cidade onde mais tarde alugaria um automóvel para chegar até
Figueira de Castelo Rodrigo. A viagem até Guarda4 levou cerca de cinco horas,
das quais a última foi gasta admirando o contorno da Serra da Estrela (maciço
situado no centro-oeste do território português). Ao caminhar até a locado-
ra de veículos, me deparei com um mercado público que tinha o cheiro dos
velhos talhos e seus queijos artesanais e com algumas “lojas de chinês”5 – em
uma delas trabalhava um brasileiro que preservava em sua fala um acento do
interior paulista, apesar de viver há 14 anos em Portugal. Comi qualquer coisa
em uma dessas lanchonetes de posto de gasolina abertas 24h e ali comprei um
exemplar do jornal semanal da região, Terras da Beira. As notícias publicadas
naquela edição de 28 de agosto de 2014 eram particularmente interessantes
por oferecerem indícios daquilo que eu encontraria pela frente. A manchete
principal dizia “Figueira de Castelo Rodrigo adere ao programa ‘Novos Povo-
adores’ e sua manifesta intenção de aderir”.
“Novos Povoadores” foi o nome dado ao programa de repovoamento rural
que auxilia na implementação ou na transferência de projetos empresariais
para o interior português, surgido em 2007 a partir de uma conversa entre
vizinhos, uma socióloga e um técnico de uma associação de desenvolvimen-
to local. A dinâmica do projeto prevê o cadastramento de famílias “novas
povoadoras” para seu posterior reassentamento em terras compatíveis com
os seus perfis. Assim, a concessão dada a cada família dependeria também da
identificação, feita por uma equipe técnica, do potencial de negócios de cada
região. No caso de Figueira de Castelo Rodrigo, o que está previsto são vagas
para cinco famílias que supram uma necessidade imediata de pessoas dispostas
a trabalhar nos setores de pecuária e de transformação do granito.
O repovoamento do território dividia o espaço da capa com a notícia
“Incêndios Florestais no Distrito: Menos área ardida do que no ano passado”.
As queimadas que se multiplicavam por toda a região nessa época do ano (final
do verão europeu) são facilitadas pelo calor elevado, pela baixa ocorrência de
chuvas e pelos ventos que constantemente mudam de direção. As equipes de

4 A Guarda é uma das principais cidades situadas na região da Beira Interior Norte de Portugal.
5 Onde se vende de tudo um pouco, desde utensílios domésticos até artigos de papelaria e vestuário.

240
A volta do que não foi

bombeiros florestais são forçadas a se dividirem em várias frentes de trabalho


para cobrir a vasta área de relevo rochoso e vegetação rasteira. Embora a notí-
cia do jornal dê conta de uma redução anual da extensão das áreas queimadas
até aquela data, o que se viu nos telejornais nos dias seguintes foi a proliferação
dos focos de incêndio. Como me foi dito mais tarde, os incêndios florestais são
uma das principais preocupações dos administradores da Reserva Faia Brava.
Pra preveni-los, diariamente seu perímetro é monitorado por um vigilante
que busca avistar focos de incêndio que possam ameaçar a reserva. Logo nos
primeiros dias de pesquisa pude acompanhar uma dessas vistorias noturnas,
quando observamos um grande arco de fogo se alastrar com o vento por uma
região próxima ao Vale do Rio Côa.
O tema da terra que arde com o fogo é recorrente ao tratarmos das memó-
rias e das motivações que ocupam o trabalho do gerente geral da Associação
Transumânica e Natureza e coordenador em Portugal da iniciativa Rewilding
Europe, mas, por ora, cabe nos determos em uma breve notícia complemen-
tar publicada na coluna semanal do jornal: “GNR identifica suspeito de fogo
na zona da Corujeira”. O fogo que destruiu entre 60 a 80 hectares do Par-
que Natural da Serra da Estrela teria sido causado, segundo fonte do Coman-
do Territorial da GNR6 da Guarda, por um homem “motivado por questões
de vingança contra os irmãos e por heranças familiares”, já que o incêndio
começou junto à casa do suspeito “e ardeu tudo menos a parte dele” (Terras
da Beira, 22/08/2014). Os encaminhamentos dos eventos notáveis parecem
estar profundamente ligados à vida das pessoas naquela região. Se, por um
lado, há espaço para vinganças familiares que marcam o solo da região com
ardor irrefletido, por outro, há que se informar também que a “Campanha
Mantinhas Solidárias supera expectativas” (Terras da Beira, 22/08/2014). Essa
pessoalidade presente nas notícias de jornais parece indicar a indissociável
presença do gentio em cada sítio, em cada caminho, em cada muro de pedra
que, após séculos, confundem-se com as paisagens naturais. A vida ali é relevo.
Na mesma edição do hebdomadário, lia-se uma coluna intitulada “Homens
& Lobos: Um conto de verão”, assinada pelo Grupo Lobo do Departamento de
Biologia Animal da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Conto
cuja narrativa falava de Mondego, cão pastor que sozinho acompanhava uma
manada de vacas:

6 Guarda Nacional Republicana.

241
Técnica e transformação

[...] Ele limita-se a ficar ali, vigilante mesmo que deitado, mirando a dúzia de
vacas que subiu o monte com ele e que mais logo o descerá: a sua família. Pelo
menos a única que o Mondego conheceu; da sua verdadeira origem, dos seus
irmãos de ninhada, já memória alguma sobra. Ele encontrou ali, na vastidão em
que a manada vagueia e pasta, o seu lar, a sua liberdade e também a sua missão.

Anos depois, o dono de Mondego não se cansaria de reproduzir a história


passada naquela noite, contada já com traços fantásticos, mas ainda fiel ao
cerne do ocorrido:

quando as vacas voltaram, vi que faltava um vitelo. E o Mondego também tinha


ficado lá no cabeço. Mas estava nevoeiro cerrado e tive de esperar pela manhã para
sair à procura deles. Quando dei com o vitelo, estava deitado junto a umas pedras,
para se abrigar... com o cão encostado a ele, como se fossem dois cachorros. Aqui
o Mondego não quis deixar o pequeno sozinho e passou a noite toda a guardá-lo.
E nem sei se teve ou não de o defender de algum lobo...

O texto termina a narrativa heroica:

Certo, certo, é que esta história aconteceu mesmo, algures nos nossos campos.
E se foi um Castro Laboreiro, um Serra da Estrela7 ou outro o herói, isso pouco
interessa. Pois esta é a vida dos muitos cães de gado que todos os dias saem com as
“suas” vacas, cabras ou ovelhas, arriscando a vida em face do lobo – mas também
do bicho homem, sempre mal-agradecido, com as suas armadilhas, os seus carros
e os seus venenos (Terras da Beira, 24/08/2014).

Esta é uma história de adaptações e composições, como tudo aquilo a que a


vida se assemelha por ali. No lugar da celebração de uma natureza que preserva
suas fronteiras insolúveis, encontra-se um discurso sobre uma “re-natureza”,
que subsiste por meio de suas composições. A família é aquela à qual um sujei-
to se adapta, uma vez adotado. Cães e gado já não se distinguem e passam a
antagonizar com inimigos igualmente adaptados, o lobo e o homem. Contra
o primeiro – sua agilidade e sua alcateia – não bastaria ao cão apenas as suas
dimensões avantajadas (historicamente modeladas por mãos humanas na
criação de padrões das raças de pastoreio). É preciso ainda recompor a ana-
tomia canina, oferecendo-lhes grossas coleiras repletas de pregos pontiagudos,

7 Célebres raças de cães pastores portugueses.

242
A volta do que não foi

artefato de proteção contra as mordidas dos lobos. Contra o “homem”, em


uma inversão recombinante hobbesiana, o lobo torna-se o homem do lobo.
O retorno do grande predador aos campos europeus atribui um novo sen-
tido a antigas práticas. O lobo reinventa o cão, que recria o pastoreiro, que
pretende dar novo sentido à vida no campo e às vidas das pessoas. Portanto,
somente abdicando de suas velhas (e novas) armadilhas, os seres humanos
poderiam recompor esta cadeia. Ao contrário de subentender uma oposição
tácita entre as atividades humanas – como a transumância e a caça regula-
mentada – e os elementos que compõem a “natureza” (fauna e flora), o que
se espera é um acordo de convivialidade. Sobre este acordo de reinvenção
mútua da “natureza” e das práticas humanas reside a esperança num futuro
que se, por um lado, evoca um passado mítico, por outro, estaria pautado
em novos termos capazes de evitar as ações predatórias de outrora. Assim,
com a notícia sobre a detenção de dois homens por “crimes de caça” ံ– um
caçava sem licença de arma, nem carta de caçador, e o outro caçava espécies
não autorizadas – a edição do periódico local é encerrada, mas isso é só mais
um começo.

A pesquisa

A pesquisa que venho desenvolvendo desde 2014 tem como objetivo central
acompanhar as dinâmicas de implementação e as práticas dos diversos atores
envolvidos em um novo tipo de reserva natural adaptada às condições dispos-
tas na Europa para a reconstrução e a conservação de seu meio ambiente. Tan-
to o estabelecimento das diretrizes “rewilding” quanto a sua materialização
como parques naturais são registros recentes na história da biologia da con-
servação, não excedendo uma década de existência. Desta forma, verificou-se
que uma das peculiaridades deste tipo de programa de renaturalização é o seu
engajamento inextricável com a proposição de atividades humanas pautadas
em uma ideia de desenvolvimento econômico sustentável. Na medida em que
se contrapõem ao argumento da preservação de um “estado de natureza origi-
nária”, os ambientalistas filiados à vertente da renaturalização sustentam que
- assim como costumamos associar a noção de produção à cultura - a natureza
também deveria e poderia ser (re)composta através de processos tidos como
artificiais. Disto deduz-se que uma ampla gama de possibilidades de interação
entre espécies (humanas e não humanas) se oferece ao abdicar-se da evocação
à crença em uma natureza desantropizada.

243
Técnica e transformação

Iniciarei com a narrativa de um encontro que visava identificar novas áreas


possíveis para a expansão do projeto de renaturalização. O evento narrado,
ocorrido quando se completavam três anos de atuação da Rewilding Europe
na região da Beira Alta Interior em Portugal, marcava o início de uma nova
fase do projeto de renaturalização do oeste ibérico. Naquele momento, após
ter consolidado a experiência a partir da Reserva Faia Brava,8 iniciava-se o pla-
nejamento de prolongamento desta área seguindo o curso do Vale do Rio Côa.

Primeiro ato: em busca do vazio, definindo o trajeto

Nosso encontro se deu por volta das 9 horas da manhã em um cruzamento


de uma pequena aldeia à margem de uma rodovia portuguesa. O grupo, agora
composto por dois antropólogos (eu e um estagiário da reserva), dois biólogos
que trabalhavam na Reserva Faia Brava e dois diretores da organização Rewil-
ding Europe, seguiu em uma caminhonete com tração 4x4 por uma estrada
tortuosa, que logo se transformou em um estreito caminho de terra e pedras.
Após uma subida íngreme seguimos caminhando até o topo de um morro onde
era possível vislumbrar a paisagem que se estendia por quilômetros ao redor.
De pé sobre um gigantesco bloco de granito, com uma das mãos mantinham-
-se os binóculos à altura dos olhos e, com a outra, apontava-se em direção ao
horizonte, como se com a ponta dos dedos fosse possível esquadrinhar o relevo.
O silêncio sempre presente naquela paisagem bucólica só era rompido pelas
conversas entusiasmadas e o andar apressado do grupo de visitantes. Após ter
se surpreendido com o fato de que um antropólogo brasileiro tivesse tomado
conhecimento da iniciativa Rewilding Europe, um dos diretores iniciou sua
explanação com o cuidado de ser o mais didático possível na explicação dos
objetivos daquela visita de campo a Portugal. De um lado do vale, era possível
encontrar áreas cultivadas com cerca de “40 a 60% de ocupação humana”;
na encosta oposta, avistavam-se basicamente formações rochosas graníticas
que o diretor, entusiasmado, indicava como “o futuro do projeto Rewilding
em Portugal”. Ele explicou pacientemente que o objetivo da iniciativa Rewil-
ding Europe era atuar em regiões em que atualmente a presença humana era

8 Reserva privada de conservação da natureza, com cerca de 850 hectares, localizada entre os con-
celhos de Pinhel e Figueira de Castelo Rodrigo (Portugal). Foi criada em 2003 e atualmente é admin-
istrada pela Associação Transumância e Natureza. Em 2011 passou a fazer parte da rede Rewilding
Europe, sendo uma das áreas-modelo de renaturalização na Europa.

244
A volta do que não foi

escassa. Ao tratar da próxima fase do projeto de renaturalização em Portugal, a


terminologia dos porcentuais novamente se impunha, já que esta seria implan-
tada em territórios de “80 a 100% abandonados”. Segundo ele, esses vazios
demográficos apresentavam boas condições para a natureza ser reconstruída
e, como mais tarde seria dito, futuramente poderiam representar uma “boa
oportunidade” também para as pessoas que habitam aquela região.
Divagando ao longo do trajeto que atravessa aldeias com poucas dezenas
de habitantes – em sua maioria composta de idosos – os planos para os pró-
ximos anos de atuação Rewilding em Portugal ganhavam forma. As trilhas
percorridas nos levavam a sítios em que predominavam ruínas de muros de
pedra – vestígios de ocupação humana secular que se confundiam com o relevo
originalmente rochoso, gerando a impressão de haver um mosaico de formas
simétricas e assimétricas e cores em tonalidades verdes e cinzas. Havia tam-
bém evidências de antigos moinhos e canais de irrigação, partes de um sistema
que viabilizava o cultivo de vegetais extraindo a água do riacho que corria ao
lado. Por diversas vezes, o diretor parou e expressou sua visão sobre como
seria a paisagem futura daqueles locais. Invariavelmente, ela tinha jovens com
mochilas nas costas praticando o trecking e ciclistas em suas montain-bikes
deslizando pelas trilhas ao longo do vale. Ao seu redor haveria manadas de
cavalos e bovinos selvagens, além de cabras montanhesas equilibradas nas
escarpas. Compondo o cenário, águias e abutres ilustravam os céus.
O foco em um futuro viável, como veremos, é o principal diferencial da
iniciativa Rewilding Europe em relação aos demais movimentos homônimos
rewilding já elaborados. Enquanto algumas propostas de movimentos de rena-
turalização apontam para um retorno a um estado de natureza referendado no
passado – como sugere o complemento Rewilding to Pleistocene na proposta
norte-americana – a iniciativa Rewilding Europe concentra seus esforços em
criar ambientes futuros de interação entre os seres humanos e o meio natural.
Segundo esta lógica, o questionamento sobre qual seria o ponto ótimo a ser
alcançado na renaturalização deixa de fato de ser relevante. A renaturalização,
de acordo com a orientação do Rewilding Europe, trata prioritariamente do
que a “natureza” poderá vir a ser, e não daquilo que ela já foi um dia.

245
Técnica e transformação

A gênese do conceito de rewilding

Cunhado originalmente nos Estados Unidos nos anos 2000, o termo rewil-
ding9 relacionava-se à ideia de fomentar a elaboração de um modelo alter-
nativo de reservas para conservação da vida selvagem na América do Norte.
Conhecida também como Rewilding to Pleistocene, esta proposta – postu-
lada por um grupo de renomados especialistas em ecologia da conservação
– pretendia estipular bases concretas para a reintrodução de espécies animais
(sobretudo de herbívoros representantes da megafauna e de grandes predado-
res) em áreas que no tempo presente se encontravam despovoadas. Na medi-
da em que evocavam um tempo pretérito, a referência ao Pleistoceno seria
uma alusão às condições do meio ambiente existentes no início do período
de ocupação e expansão humana sobre o planeta. Embora reconhecessem a
dificuldade de “trazer de volta à vida” espécies animais já extintas há milênios,
os mentores deste tipo de “renaturalização” expuseram em dois artigos de
grande repercussão nos círculos acadêmicos e ambientalistas o que conside-
ravam ser as bases concretas para a recuperação de ecossistemas degradados.
O primeiro de seus princípios ponderava que o ser humano possui a auto-
ridade moral – e mesmo o dever ético – de intervir no meio natural, já que as
suas ações irresponsáveis teriam causado, direta ou indiretamente, a extinção
de várias outras espécies animais e vegetais. Ainda assim, segundo Donlan et
al. (2005) os seres humanos continuarão causando extinções, modificando
ecossistemas e alterando o curso da evolução, o que faz com que se posicionar
politicamente para alcançar uma solução, sem negar a participação no pro-
blema, seja uma postura altamente desejável.
Esta percepção parece situar o problema em uma arena mais ampla de dis-
cussão contemporânea, qual seja, os discursos relativos à iminência de uma nova
“época” geológica, amplamente reconhecida como “Antropoceno”,10 caracte-
rizada como o evento-momento que afirma o papel da espécie humana como
uma nova força constante de intervenção nos processos biofísicos do planeta.

9 O termo rewilding refere-se a um processo de “reasselvajamento” ou “renaturalização”; optei por


preservar a ideia de “renaturalização” neste texto, pois esta põe em evidência o forte caráter de
artificialização contido nas dinâmicas de construção dos ambientes naturais em questão.
10 “Mas já vimos como a definição mesma do Antropoceno consiste no fenômeno do colapso das
magnitudes escalares. Quando a espécie-agente biológico se torna a espécie-força geofísica (pela
mediação histórica da espécie-engenheira), quando a economia política se encontra com a entro-
pia cósmica, são as ideias mesmas de escala e de dimensão que parecem fora de escala” (Danowski
& Viveiros de Castro, 2014:128).

246
A volta do que não foi

Embora não o desejemos, os seres humanos continuarão a causar extinções, a


mudar os ecossistemas e alterar o curso da evolução. [...] Nossa proposta está
baseada em várias observações. Em primeiro lugar, a Terra não é em nenhum
lugar imaculada; nossa economia, política, demografia e tecnologia permeiam
todos os ecossistemas. [...] os humanos provavelmente foram ao menos parcial-
mente responsáveis pelas extinções do Pleistoceno superior na América do Norte,
e nossas atividades subsequentes limitaram o potencial evolutivo da maioria dos
grandes vertebrados restantes. Portanto, temos uma responsabilidade ética de
corrigir esses problemas (Donlan et al., 2005: 436).

Muito mais do que qualquer outra espécie na história da vida na Terra, os humanos
alteram seus ambientes, eliminando espécies e alterando o funcionamento dos
ecossistemas [...]. A Terra agora não é em lugar nenhum intocada, no sentido
de estar substancialmente livre da influência humana e, na verdade, a maioria
das principais extensões terrestres têm sustentado milhares de anos de ocupa-
ção humana e de seus impactos [...]. Os impactos ambientais produzidos pelo
ser humano não têm precedentes em sua magnitude e são cosmopolitas em sua
distribuição, e mostram sinais alarmantes de que estão piorando (Donlan et al.,
2006: 660-1)

Em certo sentido, a “naturalização” da presença e da agência humanas


faz com que o conservacionismo nos moldes rewilding assuma caracterís-
ticas próprias, pois atribui aos humanos algum protagonismo na tarefa de
restituir à Terra seus antigos ecossistemas, sendo para isto necessário intervir
proativamente em suas dinâmicas e processos vitais. Por conseguinte, é pos-
sível depreender que a noção de uma natureza intocada passa a ser apartada
do vocabulário dos promotores da estratégia de renaturalização. A natureza,
portanto, reservaria em si um grande potencial de artificialização, ao passo
em que não mais se poderia falar em termos da existência de conjuntos de
espécies isoladas, mas sim de um feixe de relações integradas às ações destas
espécies (o que fatalmente incluiria a espécie humana).
Transposto o obstáculo inicial sustentado pelo mito da natureza intocada,
é preciso dar os próximos passos que visam restaurar a “saúde” funcional dos
ecossistemas e, para isso, é imprescindível adotar uma postura proativa ou,
como preferem dizer, uma perspectiva “otimista” para o conservacionismo do
século XXI. São estudadas criteriosamente diversas possibilidades de recons-
trução de determinado ecossistema, identificando seus processos funcionais
de interação e suas cadeias tróficas para avaliar qual seria a viabilidade de
reintroduzir espécies (se é possível remanejar indivíduos de outras áreas, ou

247
Técnica e transformação

se será necessário cogitar a utilização de espécies “proxy”, que cumprirão o


papel funcional legado por aquelas já extintas). Desta maneira, busca-se res-
tituir não apenas espécies avulsas, mas privilegiar a recomposição das intera-
ções funcionais entre elas e fundamentalmente suas cadeias alimentares. Esta
disposição leva ao entendimento de que seria necessário priorizar a reintro-
dução de grandes predadores e/ou de herbívoros de grande porte, pois assim
garantir-se-ia a recuperação de toda a cadeia trófica – do topo à base – uma
vez que o investimento para a reintrodução de um predador de topo de cadeia
exigiria condições adequadas para sua nutrição e sobrevivência.
Entretanto, as razões destacadas para a escolha dos grandes animais trans-
cendem as explicações organicistas, embora ainda assim preservem um certo
pragmatismo. Segundo os idealizadores da proposta rewilding, notoriamente
os animais representantes da megafauna são aqueles dotados de maior carisma,
fato que mobilizaria mais facilmente interesse, recursos e empatia entre os
seres humanos. Este é um ponto fundamental que passaria a ser considera-
do em qualquer empreendimento de renaturalização. Ter o apoio da opinião
pública é vital para a equação que relaciona sustentabilidade e obtenção de
recursos. Além disso, a comprovada adesão da recuperação do meio ambiente
a um cenário de desenvolvimento econômico sustentável torna-se uma notá-
vel estratégia de convencimento a respeito da viabilidade e da “racionalidade”
deste empreendimento, que à primeira vista pareceria muito pouco razoável.

Rewilding Europe

Apesar de a proposta formulada por Donlan et al. (2005, 2006) ter se tor-
nado uma referência global para o termo rewilding, ela está longe de ser sua
única definição possível. Projetos inspirados na renaturalização encontram-se
em curso em diferentes partes do mundo, observando suas especificidades téc-
nicas e ideológicas. Por exemplo, a ideia de um retorno ao Pleistoceno é com-
partilhada entre as iniciativas norte-americanas e russas, mas não representa
realmente os interesses da rede Rewilding Europe, cujo foco está naquilo em
que os nichos ecológicos poderão se tornar no futuro. A iniciativa Rewilding
Europe contrasta inclusive com suas congêneres em relação à sua viabilidade
de implementação. Enquanto os projetos de retorno ao Pleistoceno parecem
existir apenas como projeções arrojadas, o trabalho da Rewilding Europe vem
sendo executado desde o ano de 2011.

248
A volta do que não foi

Tendo sua sede em Nijmegen, Holanda, a organização Rewilding Europe


configura-se como uma rede que envolve grandes e pequenas ONGs conser-
vacionistas, investidores e bancos que subsidiam projetos locais, pesquisado-
res vinculados a universidades que fornecem os fundamentos técnicos para a
implementação das ações planejadas, proprietários e produtores rurais, além
de turistas e voluntários que circulam pelas oito (estima-se em breve o número
de dez) áreas-modelo rewilding na Europa.
Nas atividades promovidas pela Rewilding Europe o conceito de “renatu-
ralização” assume um caráter particular, que vê na geração de oportunida-
des (sociais e econômicas) um caminho para a devolução da vida selvagem
à Europa, e vice-versa. Trata-se, portanto, de se comprometer com o pla-
nejamento de uma natureza futura sem propriamente perpetuar os víncu-
los herdados pela história natural. Por meio da reapropriação e reocupação
de terras abandonadas em virtude de um processo histórico de êxodo rural
presenciado no continente europeu durante o século XX, a renaturalização
consiste num modelo ecologicamente viável para áreas consideradas econo-
micamente improdutivas.
O efeito gerado por essa intervenção é a criação de reservas privadas em
áreas que são progressivamente adquiridas com o capital de pequenos e gran-
des investidores que, por sua vez, tornam-se parceiros do empreendimento
de renaturalização. As reservas, em geral, são administradas por organizações
não governamentais locais que representam uma ampla gama de cotizadores
associados. Existem também formas alternativas de integração ao projeto de
rewilding, como, por exemplo, o arrendamento de terras para a gestão de
recursos naturais reintroduzidos (em geral espécies animais) e parcerias que
consistem na oferta de serviços relacionados ao ecoturismo (prioritariamente
a criação de hotelaria rural e pequenos restaurantes).
Contudo, o alcance das áreas-modelo de renaturalização ligadas à inicia-
tiva Rewilding Europe nem sempre coincide com os limites dessas reservas
privadas de proteção da natureza, e muitas vezes o transcende. Isto ocorre em
virtude de a área de ocupação dos animais poder ultrapassar as fronteiras dos
parques. As áreas de renaturalização são concebidas como grandes extensões
territoriais, cujo usufruto deve servir à sobrevivência de espécies animais e
vegetais (reintroduzidas e/ou recuperadas através de planos de manejo). O
fato de boa parte dos animais em questão ser migratória e, portanto, não ser
restrita às reservas faz com que uma área de renaturalização seja ententida

249
Técnica e transformação

como a área de ocupação dessas espécies. As reservas, propriamentente ditas,


funcionariam como hot spots futuros de onde os animais poderiam migrar,
definindo eles mesmos rotas e corredores ecológicos que, com algum inves-
timento humano, integrariam todo o sistema.
Ao passo em que são definidas pelos fluxos vitais dos animais, as áreas
rewilding na Europa também são marcadas por seu longo histórico de antro-
pização. Este elemento é regularmente considerado nos planos de ação da
Rewilding Europe. Ao mesmo tempo em que essas zonas passam a ser pre-
paradas para receber projetos de reintrodução de animais, são pensadas as
condições necessárias para garantir a visitação de turistas e pesquisadores
interessados na vida selvagem. Como exemplo de investimento dedicado a
este tipo de visitante, são construídos abrigos no interior das reservas de onde
é possível observar e fotografar os animais com toda a discrição necessária a
este fim. Além disso, esforça-se para que as atividades comerciais destinadas
ao turismo no entorno das áreas de proteção sejam aprimoradas por meio de
cursos de capacitação em hotelaria rural, gastronomia e venda de produtos
tradicionais de cada região.
No que concerne à reintrodução de espécies, há algum consenso entre os
ecólogos envolvidos com a Rewilding Europe, que entendem a administração
de uma reserva nos moldes de uma propriedade rural. Lobos, ursos, linces,
equinos, bovinos e caprinos em estado selvagem, além de águias e abutres
são algumas das espécies animais vislumbradas no projeto de repovoamento
da futura natureza europeia. Ao evitar ao máximo a introdução de espécies
exógenas, busca-se recuperar espécies nativas – lançando mão, inclusive, das
pesquisas genéticas e da intervenção direta no meio ambiente ao se criarem
refúgios e zonas de alimentação para as populações de animais – com o intuito
de devolvê-las à paisagem remodelada segundo interesses que aliam o ambien-
talismo ao desenvolvimento econômico sustentável.
Para alcançar estes fins, existem poucas restrições à intervenção humana
nos processos ditos “naturais”. É comum ouvir que em áreas historicamente
abandonadas pela ocupação humana a “natureza volta” progressivamente para
retomar seu espaço. Tipicamente, esse é o processo que vem sendo verificado
em algumas regiões da Europa nas últimas décadas. No entanto, sabe-se que
o tempo de recomposição autônoma desses fluxos é razoavelmente longo e,
por isso, é salutar que os humanos deem “um empurrãozinho inicial” nesse
processo. Contudo, a artificialização da natureza é vista como um deflagrador

250
A volta do que não foi

e não como um substituto de agências não humanas que tenderão paulatina-


mente a se autonomizarem.

Segundo ato: um bom negócio, consolidando a estratégia

Após ter sido definida a nova rota de renaturalização em território portu-


guês, com base nas incursões exploratórias ao campo durante os dias de visita
técnica da equipe Rewilding Europe, é preciso colocar a estratégia em prática.
Para isso, alguns procedimentos e medidas são tomados.
Primeiramente, volta-se para os mapas e para os registros de propriedades a
fim de identificar com precisão a sobreposição dos locais de alcance da progres-
são rewilding. Paralelamente, são agendadas reuniões com representantes dos
concelhos e entidades locais para informá-los da iniciativa que está em curso.
Tive a oportunidade de acompanhar um desses eventos realizado na Câmara de
Vereadores de um concelho na Beira Alta Interior. A apresentação da proposta
foi feita pelo coordenador local da Rewilding Europe, que expôs todas as van-
tagens presentes no projeto, que consistiam na revalorização do território há
tempos abandonado em função do empobrecimento do solo não mais rentável
para as atividades agrícolas convencionais (plantio e pastoreio). Essa reade-
quação passaria pelo redirecionamento das atividades econômicas, ou seja, da
agricultura ao ecoturismo. Como seria plausível imaginar que a substituição
de uma atividade pela outra determinasse um despovoamento ainda maior
dos campos, o coordenador explicou que investir na natureza poderia ser um
“bom negócio” que, inclusive, permitiria a retomada de algumas atividades
tradicionais (como a produção artesanal de doces, queijos, azeites, compotas
e utensílios diversos) para fins de comercialização junto aos turistas.
O coordenador passou a expor o sistema de parceria oferecido pela ini-
ciativa rewilding, que previa o acesso a linhas de crédito para a readequação
de rebanhos (substituição de raças bovinas e equinas consideradas exógenas
por raças de interesse de reintrodução11), para o arrendamento de terras e,
por fim, para a implementação de pequenos negócios que pudessem estar
ligados ao perfil do empreendimento rewilding. O desenvolvimento de uma
cadeia de serviços, como operadores de atividades outdoor, safaris fotográ-
ficos, hotelaria e culinária rural, converge para aquilo que é considerado o

11 Como é o caso do gado maronês e dos cavalos garranos.

251
Técnica e transformação

lema da iniciativa Rewilding Europe: oferecer uma “experiência com a vida


selvagem” em território europeu.
Após ouvir toda a explanação em silêncio, a representante da Câmara de
Vereadores perguntou com algum interesse sobre qual era, de fato, a demanda
feita àquela instituição. O coordenador respondeu que naquela ocasião gostaria
apenas de notificá-los acerca da atuação da Rewilding Europe na região e que-
ria poder contar com o empenho dos representantes públicos na divulgação
do projeto, pedido que foi satisfatoriamente atendido.
A partir desse momento a estratégia de ação da Rewilding Europe passa para
um novo estágio de convencimento e busca de apoiadores locais como forma
de ampliar a área de renaturalização. Para isso, nos meses subsequentes ao
levantamento exploratório, serão estabelecidos contatos com representantes
públicos e comunitários a fim de que eles sirvam de intermediários entre a
organização e possíveis parceiros.

A atuação da Rewilding Europe em Portugal

Originalmente, a área destinada à renaturalização do oeste ibérico deveria


integrar iniciativas de conservação em Portugal e Espanha. A faixa de território
contínuo que se estende do nordeste português - no departamento da Guarda
- até o oeste espanhol - no departamento de Castilla y León – teria em suas
extremidades as reservas da Faia Brava (PT) e Campanarios de Azaba (ES). Esta
região transfronteiriça apresenta elementos histórico-geográficos comuns
que apontam para um passado de atividades agropastoris que paulatinamente
perderam relevância e interesse entre suas novas gerações de habitantes. Esse
fenômeno causou o progressivo acanhamento das principais vilas da região
e até mesmo o abandono completo de algumas aldeias. Em função da migra-
ção de jovens para grandes centros urbanos como Lisboa, Porto, Salamanca e
Madri, ou mesmo para outros países, decorre o envelhecimento da população
local que, com dificuldade, ainda se esforça para manter suas ocupações como
o pastoreio e a produção de víveres em pequena escala.
Após os primeiros três anos de atuação na região, foi realizada uma avalia-
ção dos resultados obtidos até aquele momento, para então iniciar em 2014 a
nova fase deste projeto de renaturalização do oeste ibérico. Se, por um lado,
a iniciativa portuguesa foi bastante elogiada por conseguir atingir as metas e
cumprir os prazos previstos, por outro, os trabalhos desenvolvidos no lado

252
A volta do que não foi

espanhol não obtiveram o êxito desejado e a parceria com a Rewilding Europe


foi suspensa. Este descompasso forjou a necessidade de retraçar a estratégia
de ação da organização para os próximos anos. Portanto, naquele momento,
a visita da equipe central da Rewilding Europe a Portugal serviu para explorar
novas zonas de expansão do projeto de renaturalização que, com a saída dos
parceiros espanhóis, deveria percorrer um novo trajeto a partir da Reserva
Faia Brava. As incursões levavam agora ao curso do rio Côa, uma região que
atualmente conta com pequena densidade populacional e pouco registro de
atividades agropastoris e que, em compensação, tem um relevo marcado por
escarpas rochosas e águas cristalinas.

Algumas questões que a renaturalização coloca para a antropologia

A transição do século XX para o XXI reservou para a história natural um


panorama ambíguo: se, por um lado, acentuou-se o processo de degradação
de ecossistemas e a consequente ameaça à sobrevivência de diversas espécies
animais e vegetais notadamente nas regiões intertropicais, por outro lado, no
mesmo período, obtiveram-se avanços consideráveis nas legislações ambien-
tais no hemisfério norte e na mobilização da opinião pública acerca da neces-
sidade de um projeto ecológico integrado para o planeta.
O surgimento deste tipo de pensamento ecologizado se deu em face da
evidente perda de vastas regiões de florestas nativas e do esgotamento de áreas
cultiváveis, em particular, no território europeu. Essa contingência orientou
duas medidas – cujos sensos morais se contrapõem – mediante o declínio da
produção agrícola europeia. A primeira delas exacerbou o caráter explorató-
rio da produção agrícola, redirecionando e criando novos pactos comerciais
transnacionais junto às economias emergentes do hemisfério sul. Esta expan-
são da fronteira agrícola em nível global foi igualmente responsável pela difu-
são dos problemas de deflorestamento em escala mundial, aproveitando-se
da fragilidade das legislações ambientais locais. Logo, a crise ecológica deixa
de ser uma questão facilmente localizada e assume seu caráter sistêmico, com
efeitos globais e causas que se dispersaram ao longo da história.
A segunda consequência do êxodo rural europeu e da desvalorização de
parte das terras tradicionalmente cultivadas foi o surgimento daquilo que
Benardina (2011) chama de sociedade pós-rural, cuja dinâmica seria a retoma-
da do estilo de vida característico de uma determinada “ruralidade” conjugado

253
Técnica e transformação

com o interesse de fornecer condições reais de reaquecimento de economias


locais por meio do turismo rural e ecológico. Esta última dimensão remete à
patrimonialização das práticas da vida no campo (as técnicas locais, a caça, as
manufaturas, as festividades, a comensalidade e a cooperação etc.) e à criação
de parques naturais (através de iniciativas de reflorestamento e reintrodução
de animais).
Nota-se que ambos os caminhos mantêm uma marca em comum, que é o
propósito da geração de capital (embora divirjam sobre a sua concentração),
seja na atuação de grandes empresas multinacionais na África ou na América
Latina, seja nas ações dos pequenos empreendedores que habitam as zonas
rurais europeias. Esta duplicidade – não redundante – é importante para situ-
armos o contexto de origem dos programas abordados neste capítulo. Susten-
to aqui que os projetos rewilding são fortemente marcados pelos princípios
motivacionais que regem um sistema capitalista. A mobilização dos recursos,
a forma de comunicar sua proposta e a liberalidade na gestão das políticas da
natureza fazem com que tais projetos passem a ser vistos como uma reatua-
lização idílica da engrenagem capitalista.
Entretanto, uma nova configuração na cadeia produtiva é colocada, uma
vez que a natureza deixa de ser simplesmente fornecedora de matérias-primas
e torna-se o próprio produto a ser comercializado após passar por determi-
nadas transformações. Assim, cabe-nos pensar como o empreendimento
ambientalista de renaturalização – que se propõe proativo na reconstrução de
espaços naturais vitais para os seres humanos e não humanos – pode ser pen-
sado no seio do que vêm sendo denominado “Antropoceno”, ou “Capitaloceno”
(Hache, 2014). Antropoceno é termo cunhado pelo biólogo Eugene Stoemer e
popularizado a partir da década de 1980 pelo renomado químico Paul Crutzen,
que defende a sua utilização da seguinte maneira: “Parece apropriado atribuir
o termo ‘Antropoceno’ ao presente, uma época geológica de muitas formas
dominada pelo homem” (Crutzen citado em Kolbert, 2015).
Assim, a era geológica em que oficialmente vivemos, o Holoceno, daria lugar
a um novo contexto caracterizado pelo advento da ação humana como uma
força geológica capaz de interferir decisivamente nos processos ditos naturais
do planeta. A reapropriação do conceito em torno da denominação “Capita-
loceno” visa chamar a atenção para o fato de que esta agência (peculiarmente
destrutiva) do ser humano para com o planeta não seria uma característica
intrínseca à nossa espécie, mas relativa à sua cumplicidade com uma deter-

254
A volta do que não foi

minada forma de apropriação do mundo: o capitalismo. A utilização do termo


Capitaloceno é fomentada pela perspectiva do sociólogo Jason Moore (2014),
para quem, segundo Danowski e Viveiros de Castro (2014),

[...] [a] Revolução Industrial iniciada no começo do século XIX é apenas consequ-
ência da mutação socioeconômica que gerou o capitalismo no ‘longo século XVI’
e que, portanto, a origem da crise reside, em última instância, nas relações de
produção antes que nas (e antes das) forças produtivas, se podemos nos exprimir
assim (2014: 28).

Em um primeiro momento, o que cabe pensar localmente a partir dos


dados etnográficos preliminares dá conta de um aparente desvio na lógica do
Antropoceno – usualmente associado aos efeitos cataclísmicos e deletérios da
ação humana na natureza – em direção a formas de intervenção humana que
pretendem, ao contrário, refazer a natureza. Em contrapartida, o que pode
soar como uma manifestação altruísta do chamado “capitalismo verde” revela
em certos casos, como o Breakthrough Institute, uma presunção megalômana
e tecnofílica.

Certos parentes próximos do povo da Singularidade, entretanto, têm dedicado


atenção ao problema, indagando-se sobre as condições tecnológicas imediatas
para a sobrevivência do capitalismo e de suas principais conquistas, a liberdade
e a segurança, em um quadro de consumo energético crescente e de dependên-
cia persistente dos combustíveis fósseis, O Breakthrough Institute, um think
tank americano (californiano, como os Singularitanos) de incerta localização
no espectro político, é talvez o nome mais destacado dentre os defensores desse
capitalismo verde que confia em soluções centralizadas, capazes de implementar
ambiciosos projetos de tecnoengenharia a cargo do grande capital, com forte
investimento material, organicamente (se cabe aqui o advérbio) enraizados na Big
Science: fracionamento hidráulico de rochas para obtenção de combustível fóssil,
expansão e aperfeiçoamento das usinas nucleares, grandes projetos hidrelétricos
(as barragens da bacia amazônica, por exemplo), generalização da monocultura
de vegetais transgênicos, geoengenharia ambiental e por aí afora (Danowski &
Viveiros de Castro, 2014:66-67).

Se ambos os estímulos – negativo e positivo – parecem provir da mesma


fonte capitalista, ao passo em que esta determina a destruição dos ecossis-
temas, eles também têm condições de readequação, apresentando-se como

255
Técnica e transformação

um meio para a sua reconstrução. Como nos diz Stengers: “É da natureza


do capitalismo explorar as oportunidades, ele não pode evitar. A lógica do
funcionamento capitalista não pode evitar identificar a intrusão de Gaia com
o aparecimento de um novo campo de oportunidades” (Stengers, 2015:47).
Avalio, porém, que a magnitude do sonho rewilding esteja em escala utó-
pica bastante inferior ao projetado pelos referidos “Singularitanos” repre-
sentados no Breakthrough Institute. Apesar de o modelo de recuperação e
gestão ambiental apresentado pela Rewilding Europe pretender reordenar as
atividades produtivas a partir de um senso de oportunidade segundo o qual
investir na natureza pode ser um bom negócio, não há qualquer idealização
de que a tecnologia de ponta e os projetos de larga escala possam substituir a
responsabilidade local, e profundamente humana, de dar um “empurrãozinho”
nos processos ditos vitais.
Desta forma, cabe primordialmente perguntar: quais as questões que as
iniciativas rewilding são capazes de colocar para a discussão em torno do
Antropoceno? Em que medida elas dialogam com outras iniciativas de propo-
sição coletivista que neste contexto ganham cada vez mais força?

Implicações sobre a reconstrução de um patrimônio natural

Ao apontar para um primeiro conjunto de questões concernentes ao cenário


global onde está situada a atuação da Rewilding Europe e que diz respeito à
vigência do Antropoceno, conclui-se que a maior contribuição que podemos
oferecer ao tema é descrever etnograficamente o desenrolar das ações locais
associadas ao projeto de renaturalização em Portugal. Isto nos leva à segunda
dimensão desta pesquisa que diz respeito aos processos de patrimonialização
implícitos nos programas de renaturalização. Como já foi evidenciado nos deba-
tes acerca da noção de patrimônio cultural, a “patrimonialização” da natureza
em um contexto rewilding não mais segue os parâmetros clássicos de invio-
labilidade e “autenticidade” atribuídos a uma determinada paisagem natural.
Para os teóricos da renaturalização, a artificialização necessária para a
reconstrução destes ambientes faz parte da estratégia de preservação das espé-
cies e de seus respectivos ecossistemas, ou seja, se os critérios de “autentici-
dade” e de contiguidade com o passado já podem ser repensados no âmbito da
atestação de determinado patrimônio cultural, como discute Gonçalves (1996),
o mesmo pode ser dito acerca de um patrimônio natural deliberadamente

256
A volta do que não foi

reconstituído por meio da agência humana. Neste último caso, seria preciso
não mais centralizar nossa análise nas espécies que habita(va)m um determi-
nado bioma, mas focalizar nas suas interações que permitiriam reproduzir os
papéis funcionais exercidos por cada espécie. Como é possível depreender a
partir dos seguintes excertos, para os defensores da renaturalização vão-se os
contornos das espécies e permanecem os rastros de suas interações.

Esses modelos seriam definidos não apenas pela presença ou ausência de espécies,
mas também pela presença ou ausência de interações entre espécies - a verdadeira
fábrica funcional da natureza (Estes, 2002 citado em Donlan et al., 2006: 661)
[...] o foco da biologia da conservação está se expandindo para incluir não apenas
as espécies, mas as interações entre as espécies (Soulé et al., 2003, 2005 citado
em Donlan et al., 2006)

Na prática, o nível de intervenção na paisagem através da reintrodução de


elementos animais e vegetais é regulado pela avaliação e a capacidade técnica
para efetuar tais medidas. As consultas aos ecólogos especializados na rein-
trodução de animais em ambiente selvagem são frequentes, pois, além de sua
expertise, é necessário um grande conhecimento dos aspectos veterinários,
sanitários e legais vigentes em cada país. É somente em atenção a essa norma-
tização que é possível empreender e administrar um projeto de reintrodução
de espécies. Nesse contexto acontecem as parcerias entre as organizações que
promovem a renaturalização e as instituições públicas e privadas (universida-
des, centros de pesquisa, órgãos reguladores etc.), as quais estão vinculadas
aos consultores nos processos de reintrodução. Esses profissionais, além de
fornecerem informações sobre a ecologia das espécies desejadas, possuem um
conhecimento ampliado acerca dos possíveis constrangimentos originados
pela introdução de um animal / vegetal específico. Isto faz com que a escolha
da espécie a ser (re)introduzida atenda às diversas dimensões de sua existência
futura, como o potencial conflito com a população humana, a sustentabilida-
de trófica e territorial, as legislações cinegéticas, os fluxos reprodutivos e até
mesmo a eficácia/eficiência estética almejada junto à opinião pública.
A relação com os habitantes locais é de vital importância para a efetivação
do projeto rewilding. Além de os adultos serem vistos constantemente como
parceiros em potencial, as novas gerações de crianças são consideradas arti-
culadoras ideais na proposição de revalorização do ambiente natural. Como

257
Técnica e transformação

forma de atingir o público infanto-juvenil são realizadas visitas regulares dos


membros de equipe rewilding às escolas. Nessas ocasiões são oferecidas pales-
tras de educação socioambiental e promovidas atividades, como a “adoção”
de mudas nativas pelos alunos, que posteriormente serão plantadas em zonas
de reflorestamento, inclusive na própria reserva Faia Brava.
Este ponto nos leva a outra questão que concorre para a maneira com que
as iniciativas rewilding sejam implementadas localmente. Chama a atenção o
caráter inclusivo em relação à presença humana que acompanha desde o início
as formulações das atividades desenvolvidas nas reservas. Se a antropização
deixa de ser um problema epistemológico, ela também não é um impedimen-
to prático para as ações de renaturalização. A consolidação deste modelo de
reserva natural prevê a mobilização continuada de associações e habitantes
locais compondo o cenário onde irão coabitar grandes predadores, como o
lobo e o lince ibérico, as aves de rapina, equínos e bovinos, além de pastores,
pequenos produtores rurais e, eventualmente, caçadores (os últimos tendo
suas ações reguladas pelos órgãos competentes).
Há, contudo, uma controvérsia entre artificialidade e autenticidade na
forma como são idealizados esses parques naturais. Novas paisagens naturais
surgem na medida em que se recompõem os ambientes onde estão presentes
os elementos (humanos e não humanos) responsáveis pelo bom funciona-
mento de sua cadeia operatória. Desta forma, se os elementos que no passado
garantiam a subsistência de famílias – como a extração e a exploração desme-
surada de recursos naturais – não podem mais existir, é preciso substituí-los
por formas alternativas de interação que passarão a gerar papel similar. Neste
contexto, novos impulsos, como a hotelaria familiar e a gastronomia rural
associadas às Quintas, são elencados como formas sustentáveis propícias para
o restabelecimento dos laços entre os humanos e a natureza.
A relação entre a intenção de evocar uma imagem que reflita um modo de
vida pretérito (a lida no campo, a caça, a rusticidade) e o imperativo de ter que
se adequar aos condicionantes contemporâneos associados às experiências
“outdoor” (o preservacionismo, os direitos dos animais, os safaris fotográfi-
cos, as novas tecnologias de comunicação etc.) produz recalcitrâncias entre
a idealização e a concretização do empreendimento. Um exemplo é a forma
como a população tradicionalmente estabelecia seus vínculos com a paisagem
natural em contraste com a expectativa gerada pelos novos projetos de mer-
cantilização deste estilo de vida. Donde é possível depreender que um tipo de

258
A volta do que não foi

transfiguração da paisagem sempre foi realizada pelos aldeões quando estes


traziam para o interior de suas casas os elementos da vida selvagem que os
rodeavam (troféus de caça, amuletos, enfeites, substâncias curativas etc.).
Entretanto, o modelo de turismo rural proposto atualmente impõe a esta
população a necessidade de abrir sua esfera de vida privada aos visitantes. Lon-
ge de passarem por esta inversão de maneira incólume, ao se apropriarem da
natureza – que sempre esteve “lá fora” – os aldeões não o fazem sem abandonar
certo estilo de vida que tornava possível a transfiguração da paisagem natural
na esfera doméstica. A vida moderna demanda a essas pessoas que revejam
reflexivamente, por exemplo, o lugar de seus troféus de caça (taxidermizados)
que adornam as lareiras e as paredes de suas casas, e que passem a identificar
no ambiente externo as suas residências como novos troféus naturais (agora
vivos). Da caça ao safari fotográfico há, portanto, uma grande mudança de
postura que se reflete profundamente nos modos de existência locais.
As referências ao passado estão sempre condicionadas ao seu papel de nor-
teador idílico daquilo que poderá ser feito no futuro, jamais como empecilhos
para o que deve ser feito. É neste fato que reside uma das principais (auto)
definições da iniciativa de “renaturalização”: promover uma ecologia “oti-
mista” e “positiva”. A percepção do papel dos seres humanos como agentes
proativos no processo de recuperação do meio ambiente, destruído pela mes-
ma agência humana pregressa, faz com que tais programas representem um
lócus privilegiado para a análise antropológica que entende a natureza como
uma coprodução humana.
Talvez um bom exemplo disso seja proveniente da própria reserva Faia
Brava. No momento de sua aquisição, as ruínas de antigos pombais abando-
nados foram encontradas nas imediações da reserva. Essas construções, muito
comuns nesta região de Portugal, cumpriam no passado uma dupla função:
produzir esterco para adubar os solos empobrecidos para a lavoura, e fornecer
um suplemento de carne (de pombos) à dieta dos aldeões em épocas de grande
escassez de alimentos. Após a criação da reserva os pombais foram reformados
e recuperaram parcialmente sua funcionalidade, que é a de proporcionar o
aumento da população de pombos, que por sua vez são presas para as águias
ameaçadas de extinção que habitam as escarpas rochosas à margem do rio
Côa. A incorporação dessas edificações à paisagem da reserva natural justi-
fica também a função deste artefato dentro da cadeia de interações existente
em um projeto rewilding. Algo semelhante acontece no plantio de vegetais

259
Técnica e transformação

leguminosos no interior da reserva para que estes sirvam de alimento suple-


mentar aos coelhos, que irão constituir alimentos para as águias, as raposas
e, oportunamente, os linces.
Uma das consequências do “retorno” dessas espécies animais, reintro-
duzidas ou populacionalmente recuperadas é seu acompanhamento através
de um processo de ressignificação dos animais e do próprio meio ambiente,
como evidencia o recente retorno dos lobos ibéricos àquela região. A volta
do grande predador foi possível devido a múltiplos fatores, como a facilidade
de adaptação e locomoção da espécie, a política nacional de proteção do lobo
ibérico, e os vazios demográficos que propiciaram a regeneração gradual da
mata formando nichos ecológicos que funcionam como refúgio e integram
os territórios dos lobos. Contudo, a presença dos lobos vem constituindo um
grave problema aos olhos dos produtores rurais, pois eventualmente têm seu
rebanho atacado e alegam que seus prejuízos não são justamente ressarcidos
pelo Estado.
A presença do lobo, que é percebida pela localização de vestígios, embora
dificilmente sejam avistados, já foi algumas vezes relacionada à atuação dos
ambientalistas rewilding. Desta forma, novos mitos surgem localmente, como
aquele que afirma que os lobos vêm sendo reintroduzidos furtivamente duran-
te a noite, sendo descarregados em helicópteros. Evidentemente, observando
o potencial conflitivo apresentado em decorrência da presença do lobo, ele
jamais foi cogitado como espécie candidata à reintrodução. Todavia, tendo em
vista a rejeição ao lobo, o problema passa a ser ressignificado pelos partidários
da renaturalização ao observarem que a reintrodução de espécies de herbívo-
ros atenuaria os prejuízos dos pastores, uma vez que os ataques predatórios
aos rebanhos tenderiam a ser redirecionados à fauna selvagem.
É possível concluir que a reconstrução de ambientes naturais se faz através
da evocação de modos de sobrevivência e de paisagens ancestrais, mesmo que
em tela pintada por mãos humanas. Portanto, a reintrodução de animais há
muito desaparecidos está ligada à recuperação de um regime de mitos, nar-
rativas e imagens articulados em ambiente antrópico.
Outrossim, a reintrodução do conceito de natureza como uma categoria em
jogo nas ciências sociais acontece em bom momento. Sem recorrer às tradições
ecomaterialistas que permearam a teoria antropológica a partir da segunda
metade do século XX, o que observamos atualmente é a reinvenção da natureza
como um conceito que deverá se adequar às inovações dos campos etnográfi-

260
A volta do que não foi

cos. Apropriando-nos do espírito rewilding, adentramos em um período em


que a cultura da criatividade nos permite imaginar os futuros possíveis para
a antropologia.

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