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Objetivos
Oferecer uma visão preliminar da temática dos Direitos Humanos, bem como do
debate atual em andamento no Brasil, de forma interdisciplinar, para que o/a
estudante possa familiarizar-se com aspectos básicos da área e compreender o que é,
especificamente Direitos Humanos.
Contudo, quando observamos a questão mais de perto vemos que este é um tema que
está longe de ser um consenso entre os seres humanos, e que a ideia de direitos que sejam
universais, ou seja, comuns a toda a humanidade não é compartilhada por todos, mais distante
ainda está uma prática política geradora de igualdade real entre os seres humanos, a maior
prova disso é que testemunhamos violações de direitos e a injustiça sendo praticada
cotidianamente, muitas vezes em nome de interesses econômicos e da manutenção do poder.
Outro aspecto que chama a atenção sobre os direitos humanos é o fato de haver um
enorme desconhecimento sobre suas implicações e seus objetivos na vida prática das pessoas,
tanto é assim que muitas pessoas, aproximadamente 39,5%, associam as ações em defesa dos
direitos humanos como representação dos “direitos de bandidos”, e ainda que para 37,7%
como “Direitos que impedem ou prejudicam o trabalho da polícia”, isto segundo dados de
estudos realizados pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo em seu
5º Relatório Nacional sobre os Direitos Humanos no Brasil (CARDIA, 2010, p. 47).
O “Disque 100 1”, número de telefone que acolhe denúncias sobre violações de direitos
humanos no Brasil, acumulou entre 2011 a 2012 exatamente 111.837 denúncias de violações
de direitos humanos, destas denúncias 2:
1
“O Departamento de Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos tem a competência de receber,
examinar e encaminhar denúncias e reclamações, atuar na resolução de tensões e conflitos sociais que
envolvam violações de direitos humanos”. (SDH)
2
Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República. (SDH).
http://www.sdh.gov.br/assuntos/combates-as-violacoes/dados-estatisticos/violencia-sexual
Ao avaliar estas questões Nancy Cardia afirma que:
Como se observa, não existe consenso quando o tema são os direitos humanos, é o
que nos revela o Relatório Nacional sobre Direitos Humanos no Brasil. As opiniões estão
divididas mesmo quando tratamos de uma questão como a tortura, que é considerada uma
prática que afronta a toda a humanidade e um crime contra a ordem internacional, conforme
a Convenção Internacional contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis,
Desumanos e Degradantes de 1984, que foi ratificada pelo Brasil em 1991 3, e que compreende
a tortura como:
3
Transformou-se em lei em 7 de abril de 1997 (Lei nº.9.455/97), que define e pune o crime de tortura
quando perpetrada por agente privado, é especialmente utilizada
como forma de castigo.
Como se constata, pela análise dos acórdãos 4, a tortura é uma prática para obtenção
de confissão ou algum tipo de informação, contudo sua prática é condenada no direito
internacional e pelas leis brasileiras, por afrontar os direitos fundamentais dos seres humanos.
De acordo com a Lei 9.455/97, o crime de tortura se configura deste modo:
De acordo com JESUS e CALDERONI (2015, p. 38) “a tortura tem sido descrita, por
alguns estudos, como método de investigação policial que, apesar de ilegal, encontra-se
incorporado à cultura dessa corporação”. Neste caso é necessário reafirmar que a prática é
grave violação dos direitos humanos.
Fato é que a tortura irá se constituir como grave violação dos direitos humanos, por
impor ao indivíduo a impossibilidade de defesa e ferir sua liberdade de consciência,
compreende-se assim, que sob nenhuma circunstância tal ato se justifica ou pode ser aceito.
Após esta abordagem inicial sobre os direitos humanos, em que fizemos um recorde
sobre a temática da tortura, vamos agora pensar como a discussão se desenvolveu ao longo da
história. Sem dúvida há uma história dos direitos humanos, e mesmo nos tempos e lugares
4
Trata-se de uma decisão final ou sentença. O acórdão é o acordo entre vários julgadores para chegar à
um resultado final e decisivo, é diferente de uma sentença dada somente por um juiz.
mais remotos iremos encontrar práticas e ideias que nos permitirão observar trações do que
podemos chamar de “direitos humanos”.
Há registros muito antigos de leis e códigos que tiveram por finalidade regular a vida
em sociedade e estabelecer direitos para os indivíduos. Um destes códigos antigos é
encontrado no denominado “Cilindro de Ciro” 5, datado de 539 a.C., que é considerado o mais
antigo documento sobre direitos humanos. É possível observar também nos Profetas bíblicos
diversos ensinamentos e preceitos que buscam a garantia de direitos e defesa dos mais
vulneráveis na sociedade.
Contudo, ao tratarmos sobre Direitos Humanos hoje, temos dois marcos históricos
importantes, são eles: 1. A Revolução Francesa de 1789 (contexto do Iluminismo) e 2. A
Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (pós Segunda Guerra Mundial).
O que se seguiu à Revolução Francesa, foram inúmeras lutas sociais que buscaram
sempre a ampliação dos direitos frente às inúmeras situações que impediam o pleno
desenvolvimento humano, como por exemplo as lutas dos trabalhadores nos séculos XVIII e
XIX, que se inserem no contexto das lutas pelos direitos coletivos.
Será neste momento que Karl Marx (2002, p. 32-34) irá apontar as características
liberais e burguesa dos direitos humanos, ao mesmo tempo que afirma que “ os direitos
humanos não são, por conseguinte, uma dádiva da natureza, um presente da história, mas
fruto da luta contra o acaso do nascimento, contra privilégios que a história vinha transmitindo
de geração em geração. São resultado da cultura”. Aqui se evidencia a concepção histórico-
5
Ciro foi o rei da Pérsia (antigo Irã)
estrutural dos direitos humanos e oposição à uma concepção idealista ou mesmo jurídico-
positivista (DORNELLES, 2006).
Com Karl Marx, no século XIX, surge uma nova linguagem de emancipação social, a
emancipação humana, que compreende a superação das mediações entre o mundo e o ser
humano, a superação da sociedade de classes, e que a efetivação dos direitos dependerá das
lutas sociais. (SANTOS, 2013, p. 19)
O segundo momento que marca as lutas por direitos humanos se dá após a Segunda
Guerra Mundial. O horror que a guerra produziu, levou a uma profunda reflexão sobre o que a
capacidade humana de autodestruição. Deste modo a Declaração Universal dos Direitos
Humanos de 1948 é resultado deste momento histórico, que exigia uma resposta para as
atrocidades da Segunda Guerra Mundial.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) é composta por 30 artigos, que
estão longe de sintetizar as questões que afligem a dignidade e os direitos humanos, contudo
foi o consenso possível naquele momento. Assim, “eles não são os únicos e possíveis direitos
do homem: são os direitos do homem histórico, tal como este se configurava na mente dos
redatores da Declaração após a tragédia da Segunda Guerra Mundial” (BOBBIO, 2004, p. 33).
A questão dos direitos humanos continuou a ser refletida e debatida entre os países,
tanto que se seguiram inúmeros instrumentos e convenções que buscaram ampliar os direitos,
dentre eles podemos destacar alguns:
Norberto Bobbio (2004, p. 62) chama a atenção para o fato de existir uma desconexão
entre a teoria e a prática nas ações envolvendo os direitos humanos, uma sua análise a “teoria
e prática percorrem duas estradas diversas e a velocidades muito desiguais”, o que
transformou a linguagem sobre Direitos Humanos um anseio nobre e justo, contudo com uma
prática distante do discurso.
CARDIA, Nancy. Percepções sobre direitos humanos no Brasil. In: ADORNO, Sérgio e CARDIA,
Nancy. 5º Relatório Nacional sobre os Direitos Humanos no Brasil. São Paulo: Núcleo de
Estudos da Violência da USP. (pp. 39-50), 2012.
DORNELLES, João Ricardo W. O que são direitos humanos. São Paulo: Brasiliense, 2006.
SANTOS, Boaventura Souza. Se Deus fosse um ativista dos direitos humanos. São Paulo:
Cortez, 2013