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, COGNIÇÃO
ESPECIAL
E APRENDIZAGEM
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FONSECA V
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DISLEXIA, COGNIÇÃO E APRENDIZAGEM
PLANIFICAÇÃO
CODIFICAÇÃO
S
A
T
S
O
P
S
ATENÇÃO E
R
S
O Codificação e recuperação
L Associação fonema-articulema
U
M Sequencialização
Í
T
S Decodificação de optemas análise + Série de de
Sistemas procedimentos
organização
E
síntese + memória Elaboração/regulação
Associação optema-fonema Controle/monitorização
Processamento simultâneo/sequencial Internalização verbal
Fonema monemas Intenção => ação
Seleção + sustentação (des)+(re) construção Linguagem oral
Filtragem + focagem Significação=compreensão Retroação
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todas, combinam-se e articulam-se para gerar Lashley 24, em contrapartida, sugere que todos
comportamentos, Luria está em oposição aos os comportamentos envolvem a participação
localizacionistas. Paralelamente, porque o equitativa de todas as áreas, ou seja, defende
tecido cerebral é psicologica e fisiologicamen- que nenhuma área pode conclusivamente es-
te especializado, Luria está em contradição pecificar uma aprendizagem particular.
também com os equipotencialistas. Halstead 25 e especialmente Galaburda &
Para ler, escrever ou calcular, por exemplo, Hemper 26, nas suas pesquisas com inúmeros
o cérebro põe em marcha, para cada um dos casos portadores de lesões cerebrais e em
processos, um complexo sistema funcional, casos de dislexia não conseguiram encontrar
composto de vários subsistemas visuais, au- evidências que sustentassem os pressupostos
ditivos, tatil-cinestésicos e motores, subléxi- desta doutrina de “ação em massa” do cére-
cos, léxicos, cognitivos e metacognitivos que bro, entendido aqui como órgão da aprendi-
interagem sequencialmente, melodicamente zagem da leitura.
e sistemicamente. A visão de Lúria, portanto, é inequivoca-
Em síntese, a aprendizagem da leitura mente diferente de ambas. Nenhuma área
resulta do funcionamento de sistemas funcio- do cérebro por si só pode ser responsável por
nais que integram várias áreas ou unidades qualquer aprendizagem da leitura, ou por al-
de cérebro, mais do que resultados de áreas gum comportamento particular. Por analogia
específicas bem determinadas. De acordo também, nem todas as áreas são consideradas
com esse axioma, uma dada aprendizagem igualmente contribuintes para a leitura e a
pode ser afetada quando qualquer parte do escrita, o que pressupõe uma organização
sistema funcional por ele responsável estiver hierarquizada e desenvolvimental muito com-
igualmente perturbada. plexa e sistêmica.
Com base nessa perspectiva, um indivíduo A teoria luriana dos sistemas funcionais
pode apresentar, por exemplo, sinais de dis- concebe que o cérebro oper a apenas com um
lexia, sem apresentar lesõ es no girus angular número limitado de áreas quando está en-
(denominado “centro de leitura” para os volvido na produção de uma aprendizagem
localizacionistas), pois é possível verificar-se específica, cada uma delas jogando um papel
disfunções em um ou mais componentes do peculiar dentro do sistema funcional, deno-
sistema funcional da leitura. minada pelo mesmo como uma constelação
O conceito de sistemas funcionais é para de trabalho.
Luria, consequentemente, diferente dos con- A noção de sistema funcional tende a equa-
ceitos inerentes à teoria da localização ou da cionar uma concatenação ou uma cadeia de
equipotencialidade. transmissão onde cada ligação, elo ou zona
A teoria da localização, preconizada por de mediação, representa uma área part icular.
frenologistas como Gall, citada por Luria 23, Cada elo é necessário para que a cadeia seja
sugere que todos os comportamentos resultam uma totalidade funcional, cada um partici-
de áreas ou centros específicos do cérebro pando com uma função específica no conjunto
(por exemplo, “centro de leitura”, “centro da global da cadeia funcional. A cadeia funcional
escrita”, ”centro
quentemente, do cálculo”,
indicia que todasetc) e, conse-
as desordens que
mos,opera napelos
integra leitura e na escrita,
menos comovisual,
os sistemas já vi-
ou lesões possam ser adstristas a áreas cere- auditivo, cognitivo e motor, oromotor para a
brais circunscritas. leitura, e grafomotor para a escrita.
A teoria da equipotencialidade defendida Daqui resulta a noção de que, se alguma
por outros autores, nomeadamente Flourens, parte do sistema funcional está disfuncional
também citado de Luria, e essencialmente ou desagregada em termos sistêmicos, a
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órgão plástico e flexíve l, e é nessas condições Tal cooperação complexa joga com a par-
que o processo normal de aprendizagem da ticipação particular de cada uma das áreas
leitura ou da escrita ocorre. Se efetivamente cerebrais relacionadas com um determinado
surge um problema ou uma dificuldade, por sistema funcional, de ta l modo que a sua des-
lesão, imaturidade ou por outra razão, não truição, disfunção ou imaturidade, porque não
dizer que o sistema funcional esteja prospec- causa e perda total da performance (afunção
tivamente bloqueado ou desagregado. Pelo ou incapacidade), induz necessariamente a
contrário, o que esta concepção sugere é algo desintegração ou desconexão de algumas
muito diferente. Se existe alguma dificuldade, subfunções, enquanto outras podem se man-
podemos mudar a natureza da tarefa (condi- ter intactas, o que é promissor em termos de
ções externas), ou então, mudar a composição modificabilidade cognitiva para muitos casos
do sistema ou cadeia funcional, mudando a clínicos.
localização neurofuncional onde a informação
é processada (condições internas), alterando a A ORGANIZAÇÃO NEUROFUNCIONAL
modalidade de input ou de output, adequando DO CÉREBRO NA APRENDIZAGEM DA
novas formas de processamento simultâneo LEITURA
ou sequencial da informação, modificando o De acordo com Luria 14,32, Geschwind 33,34 e
conteúdo verbal para não-verbal, ajustando Das 35, a linguagem, quer falada ou escrita,
a estrutura mental de um componente para integra também em termos funcionais a coo-
subcomponentes mais elementares, ou então, peração de várias áreas.
promover e automatizar as funções cognitivas No caso da linguagem falada, por exemplo,
de processamento de dados (input, elaboração a recepção da fala ou a compreensão auditiva
e output ) etc; adaptando a tarefa ao perfil (input ) envolve a sensação procedente dos
cognitivo do indivíduo. ouvidos, que é recebida pelo córtex auditivo
Apesar do pouco conhecimento de como o primário (captação de fonemas), sendo poste-
ser humano aprende e o seu cérebro funciona, riormente processada em morfema s com base
e da análise cérebro-aprendizagem ser ain- semântica na área de Wernicke (2ª unidade
da rudimentar, a teoria neuropsicológica de funcional luriana), enquanto a sua expressão
Luria apresenta uma arquitetura perceptível verbal ( output ) requer que as suas representa-
e coerente para compreender como a apren- ções sejam transferidas daquela mesma área,
dizagem da leitura e da escrita se estrutura, para a área de Broca (3ª unidade funcional
pois se suporta na grande quantidade de luriana), através dos fascículos arqueados,
investigações neuropsicológicas realizadas Nesta área pré-frontal, a fala envolve um
sobre o problema 31. detalhado plano oromotor de articulação (pro-
A organização funcional do cérebro pro- dução de articulemas), onde participa o anel
posta por Luria permite entender como os cortico-cerebral, por sua vez transmitido para
sistemas funcionais operam, quer seja nas a área motora primária para desencadear a
praxias ou na linguagem falada e escrita. execução sequencializada dos múltiplos mi-
A aprendizagem da leitura, da escrita e cromovimentos da laringe, faringe, língua e
do cálculo,
ceptivos composta
( input de componentes
), integrativos, re- e
elaborativos lábios
No que
casomaterializam
da linguagema verbalização.
escrita receptiva-
expressivos ( output ), emerge, como já vimos, leitura, a recepção das letras ( input ) é feita no
da cooperação de várias áreas ou zonas cor- córtex visual primário (captação de optemas)
ticais e subcorticais, e não como se pensava por meio de complicados processos de fixação
na teoria neurológica clássica, de uma só ár ea e focagem onde participam o sistema mag-
específica. nocelular, sendo posteriormente transmitida
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ao girus angular para associar e equivaler a Por esta simples apresentação dos sistemas
logografia da palavra com o correspondente funcionais da linguagem falada e da escrita,
modelo auditivo (fonológico e morfológico) podemos constatar que os problemas encon-
na área de Wernicke. No caso de uma leitura trados em disléxicos, por exemplo, poderão
silenciosa, a compreensão opera-se neste ser atribuídos não só a déficits cerebrais 7, que
sistema funcional (2ª unidade funcional), no interferem com a atenção e com a produção
caso de uma leitura oral, o processo é similar rápida e fluente de processos automáticos
ao processo expressivo da linguagem falada, sensório-motores básicos, como a déficits de
utilizando os mesmo substratos neurológicos processamento multissensorial, quer simultâ-
acima descritos. neos e sequenciais, quer visuo-gráficos, quer
Em contrapartida, a linguagem escrita fonológicos e semânticos.
expressiva-escrita ( output ) envolve que as Outro conceito fundamental de Luria para
representações das letras (traços e linhas compreender a aprendizagem da leitura é
pormenorizadas e fonemas corresponden- o da falta unicidade ou de uniexclusividade
tes) sejam transferidas do córtex associativo dos sistemas funcionais, sugerindo que é a
visuo-auditivo, em primeiro lugar para o multiplicidade dos sistemas que surge como
córtex parietal associativo, a fim de formular responsável por uma aprendizagem específica.
visuo-espacialmente e tátil-cinestesicamente Com base nestas formulações funcionais,
as formas das letras, e em segundo lugar, para os efeitos de uma lesão ou disfunção cerebral
a área de Exner (3ª unidade funcional), onde numa criança tendem a ser substancialmente
se opera um detalhado programa grafomotor diferentes dos do adulto, na medida em que
(produção de grafemas), terminando na área ambos dispõem de sistemas funcionais distin-
motora primária a execução sequencial mi- tos em termos de organização neuropsicológi-
cromotora dos gestos da escrita, pondo em ca, um ainda imaturo, e o outro eventualmente,
movimento múltiplos músculos da coluna, do maturo 23,36,37.
ombro, do braço, do antebraço, do pulso, da De acordo com estes conceitos lurianos,
mão e dos dedos, onde de novo o anel cortico- não existe uma correspondência linear entre
cerebral tem um papel crucial. uma aprendizagem e uma zona específica do
Todos estes sistemas funcionais da lin- cérebro, levando-se em consideração a natu-
guagem corporal, falada e escrita, põem em reza sistêmica das funções cerebrais.
jogo, como acabamos de ilustrar, uma melodia Luria 23 adota, assim, uma metodologia de
complexa de componentes de processamento estudo do cérebro centrada mais em síndro-
de informação, que no fundo constituem o mes (padrões de sintomas) do que em sinto-
conjunto das funções cognitivas que suportam mas isolados, quando o estuda funcionalmente
as aprendizagens simbólicas superiores 23,27. a partir da análise dos seus distúrbios. A dis-
Em resumo, quando um dos componentes função cerebral que resulte de uma estrutura
dos sistemas funcionais que acabamos de ou de uma zona específica dentro do sistema
descrever se encontra lesado, disfuncional ou total pode manifestar-se por diferentes déficits
imaturo, a organização da linguagem pode ser cognitivos, de acordo com o foco da lesão ou
comprometida, podemos
disnomias, disastrias, gerar1ºora
no caso disfasias,
sistema sim- a distribuição
Por exemplo,da no
disfunção.
caso de uma dislexia, se
bólico, ora dislexias (diseidéticas.disfonéticas a criança não pode ainda ler por razões de
ou mistas), disortografias e disgrafias, no caso imaturidade neurológica, os sistemas funcio-
do 2º sistema simbólico, podendo ocorrer entre nais responsáveis por tais funções cognitivas
ambos os sistemas uma cadeia ontogenética superiores, sejam corticais ou subcorticais,
causal. podem estar disfuncionais pelo menos num
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Figura 5 – Cognição
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ao adulto (ser experiente), onde neste todas um processo intencional de interação social e
estas unidades são supostas funcionarem mediatizadora entre indivíduos experientes e
integralmente. inexperientes 42.
Todo este processo de desenvolvimento, A compreensão da organização neuropsico-
extremamente complexo e articulado entre lógica da cognição, com base em Luria, torna-se
as três unidades funcionais cerebrais, ocorre assim um paradigma fundamental da educação,
num tempo ontogenético e é necessariamente da reabilitação, na medida em que ela permite
contextualizado num tempo social, dito so- operacionalizar o desenvolvimento da inteli-
ciogenético. A multiplicidade interativa dos gência nas suas habilidades e sub-habilidades.
ecossistemas sociais (micro-meso-exo-macro)
A leitura e a escrita, como funções psíquicas
que atuam sobre a criança, ora sequencial-
superiores que não, devem ser desenvolvida s
mente ora simultaneamente, vão determinar a
com programas de enriquecimento linguístico
qualidade multiexperencial e multicontextual
do seu desenvolvimento 46. adequados e com treino cognitivo de proces-
O desenvolvimento neuropsicológico e sos: de atenção; de Informação sequencial e
concomitantes sistemas funcionais surgem simultânea; de associação e generalização; de
só quando interagem com um envolvimento decodificação e codificação; de equivalência
apropriado e com adequados requisitos de intermodal (optema-fonema-articulema-gra-
mediatização 22. Se uma criança for criada com fema); de análise e fragmentação fonológica;
indivíduos que não falam, nem lêem e não a de memória visual e semântica; de autorre-
mediatizam cognitiva e simbolicamente, ela gulação e de metacognição, etc (Figura 5) 35.
nunca aprenderá a falar, a ler ou a pensar De fato, a finalidade essencial da educação
criticamente com fluência, ilustrando assim o e da reeducação é acelerar o desenvolvimento
paradigma das crianças selvagens (por exem- cognitivo das crianças e dos jovens, com ele,
plo, caso Genie) 47. a aprendizagem da leitura e da escrita são
O desenvolvimento neuropsicológico é o mais facilitadas.
produto final de vários fatores: mielinização, Com a educação cognitiva, devemos visar
crescimento axo-dendrítico, crescimento dos à otimização máxima possível do potencial de
corpos celulares, sinaptogênese, estabeleci- aprendizagem de estudantes com rendimento
mento de circuitos e redes interneuronais e normal ou superior. Com a reabilitação cog-
muitos outros eventos bioquímicos, mas não nitiva, a finalidade da sua intervenção deve
explicam a complexidade dos processos de
visar à compensação e o enriquecimento do
aprendizagem.
potencial habilitativo de indivíduos portado-
Os substratos neurológicos intactos e o
res de desigualdades sociais, dificuldades,
envolvimento ecológico facilitador interagem
reciprocamen te para que as formas transien- perturbações, transtornos ou dificuldades de
tes ou sequenciais de aprendizagem possam aprendizagem mais graves 52.
surgir de acordo com uma hierarquia progres- Uma abordagem cognitiva à aprendizagem
sivamente e plasticamente integrada. da leitura e da escrita constitui, portanto, um
Sem experiências de aprendizagem me- novo desafio aos sistemas de educação e de
diatizadas 38,48-51, as habilidades cognitivas e formação que têm a responsabilidade social
simbólicas não emergem, pois não basta que a de desenvolver, ao máximo possíve l, os recur-
maturação neurológica ocorra de acordo com sos humanos de uma sociedade em qualquer
a lógica temporal, é crucial que se observe idade, condição ou contexto.
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SUMMARY
Dyslexia, cognition and learning: a lurian neuropsychological approa-
ch to dyslexia
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