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2017
e-ISBN
artis intelligentia: 978-989-99839-5-3
i ma g i n a r
o r e a l
16º Encontro Internacional de Arte e Tecnologia
16th International Meeting of Art and Technology
titulo | title
16º Encontro Internacional de Arte e Tecnologia: 16th International Meeting of Art and Technology:
#16.ART: Artis intelligentia: IMAGINAR O REAL #16.ART: Artis intelligentia: IMAGINING THE REAL
edição
i2ADS – Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade
Editora | Publisher
i2ADS – Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade
ISBN eletrônico
978-989-99839-5-3
1 Keynotes
29 Arte digital e museus: 32 Pensamentos e objetos
encontros, desencontros que constroem a realidade
e projectos à margem Milton Sogabe
Helena Barranha
41 Live transmission
Morgan O'Hara
2 Ciência e Tecnologia
43 “#ninfabebê”: 80 A conversa das coisas:
longa-metragem tecnoscópico poéticas entre objetos
Aldo Luís Pedrosa da Silva ancestrais e conectados em rede
Cesar Baio
49 Gesture-based cognitive Cláudia Marinho
enhancements by random walks Henrique Cunha
and human digital body doubles Jair Delfino
Alexander Matthias Gerner
88 Arte Computacional:
58 Arte, Design e Sustentabilidade interações e sensações
Aplicados a Agricultura Familiar: entre corpo, música e imagem
caso em Salvador - Bahia - Brasil Elias do Nascimento Melo Filho
Anailde Pereira de Almeida
94 Urban Lab: análise semiótica
66 Pensar a Simplicidade do modo como o espaço
em Arte e Tecnologia urbano é expresso por meio
Anelise Witt da art tecnologia
Fátima Aparecida dos Santos
73 A vida e a máquina: a vida
artificial na arte computacional
Artur Cabral Reis
100 I Will Play the Electric Brain 167 Pixel por Pixel: uma análise
The Manipulation of the da produção artística na era
Brain’s Electric Capacity, das novas mídias através do
and Clusters, Through trabalho colaborativo Place
Sensing and Imagination, Lucas Alves de Brito
to Synthesize Sound Entities
Horácio Tomé-Marques 175 Dados, algoritmos e espaços
Miguel Carvalhais Abstrações matemáticas como
mediação do mundo
112 A relação do corpo com os Marcilon Almeida de Melo
ecrãs em ambientes físicos
Ivo Teixeira 185 Porto - A game project about a
Pedro Tudela cultural heritage of a Oporto city
Miguel Carvalhais Miguel Ángel Roque López
Resumo
Uma das franquias de games de estratégia em
tempo real (RTS – real time strategy) mais po-
pulares entre os jogadores é o Age of Empires
(1997). Conhecido por seu caráter histórico, o
game abrange vários períodos da história da
humanidade, abordando desde a Pré-história
até a Modernidade europeia. Assim, a série lida
com diversas civilizações tendo como pano de
fundo seus conflitos históricos. Os astecas
fazem parte das civilizações abordadas em
Age of Empires II (1999), com uma campanha
específica dentro da expansão “The Conquerors”.
O artigo analisa visualidades e narrativas, ves-
tuários, cenários e desenvolvimento da civiliza-
ção Asteca, vislumbrando também as possibi-
lidades de imersão disponíveis aos jogadores.
É de suma importância considerar o processo
de pré-produção do jogo, à medida que en-
volve um design instrucional e uma pesquisa
histórica, para compreender os elementos que
constroem a representação Asteca em Age of
Empires II.
Palavras-chave
Astecas, game, representação.
1
Artista multimídia, doutorando e bolsista CAPES no Programa de Pós-graduação em Arte pela Uni-
versidade de Brasília. Mestre em Arte e Cultura Visual. Contato: jloures-arte@hotmail.com
2
Doutoranda em História pela Universidade Federal de Goiás. Mestra em Ciências Sociais e Humani-
dades (UEG). Tutora do curso de Licenciatura em História da UEG - UAB. Contato: pepita_af@hotmail.
com
Introdução
Desde 1997 a série de jogos Age of Empires de cada civilização que participa ou é abordado
(fig.1) utiliza a história para cativar jogadores nas campanhas.
ao redor do globo. Os títulos principais da série O foco do artigo é a representação dos
foram desenvolvidos pela Ensemble Studios e astecas, e partimos de uma indagação: Quem
publicados pela Microsoft Game Studios. Es- seria o conquistador, Montezuma ou Hernán
tima-se que os jogos de Age of Empires já te- Cortez? Para entender essa forma de repre-
nham vendido mais de 15 milhões de cópias, sentação, estabelecemos um diálogo entre
entretanto, o número de jogadores pode ser historiadores que abordam o assunto e de for-
muito maior do que o registrado, pois como ma geral, propomos uma análise de aspectos
se trata de uma série majoritariamente para como a representação, narrativa e visualidades
computadores, o fator pirataria está envolvido. da civilização Asteca.
A série pertence ao gênero RTS - real time stra-
3
tegy, em português, estratégia em tempo real .
Em 2000 foi lançada a expansão The Os bastidores de Age of Empires II
Conquerors para Age of Empires II (1999), esse
conteúdo acrescentou 5 novas civilizações: O designer Bruce Shelley participou no desen-
Astecas, Maias, Espanhóis, Hunos e Corea- volvimento de Age of Empires quando traba-
nos. O imperador asteca Montezuma aparece lhava na Ensemble Studios, trazendo assim sua
ao lado de outras personalidades como Átila, experiência em jogos de tabuleiro, e o mesmo
Érico (o ruivo) e El Cid. O jogo apresenta um também decorria da criação da série Civilization
menu História que traz informações a respeito
A pesquisa de Age of Empires foi feita A série Age of Empires não tem como objetivo
na biblioteca da comunidade local. ensinar e sim divertir, entretanto, os jogos po-
Pesquisa extensiva e detalhada não é dem instigar o interesse do jogador, se apre-
necessária ou mesmo uma boa idéia sentando como uma porta de entrada para a
para a maioria dos produtos de en- história das civilizações.
tretenimento. Os melhores materiais Em 2017 foi anunciada uma versão re-
de referência são freqüentemente masterizada do primeiro AoE, apesar da série
encontrados na seção de crianças não ganhar novos títulos, a comunidade de jo-
porque este é o nível de interesse gadores mantém a marca ainda viva. Existem
histórico para a maioria dos públicos vários fóruns e sites dedicados a esmiuçar cada
de jogos. Se você construir detalhes detalhe de Age of Empires, discutir a arquite-
históricos demais, corre o risco de tura, estratégias, unidades, e história de cada
tornar o jogo obtuso. Os jogadores uma das civilizações oferecidas. Alguns desses
devem ter a diversão, não os desig- sites estão no ar a mais de 12 anos, o que de-
ners ou pesquisadores (MICROSOFT monstra a paixão e interesse dos jogadores. A
GAMES, 1997). comunidade é alimentada possivelmente por
um sentimento de nostalgia, e essa mesma
Shelley aborda um tema histórico de maneira nostalgia alimenta o interesse mercadológico
superficial, não entendendo isso como algo da Microsoft Game Studios. De acordo com o
prejudicial, e sim necessário para alcançar pesquisador Francisco Marinho:
um público maior. AoE é um game, por isso a
jogabilidade e acessibilidade se mostram tão Todas as fontes de informação são
importantes. Age of Empires em sua essência, é operadas no nível digital binário. Essa
um jogo feito para o entretenimento, mas que ponte permitiu a emergência de mun-
toca em questões históricas. O filósofo Johan dos sintéticos virtuais sem referência
Huizinga estipulou regras para determinada a uma realidade empírica externa.
atividade seja reconhecida como um jogo, entre A imaginação ganha uma podero-
elas a liberdade: sa ferramenta para formalizar seus
conteúdos internos, como metáforas
Antes de mais nada, o jogo é uma e analogias. As simulações computa-
atividade voluntária. Sujeito a ordens, cionais permitem, além do acesso às
deixa de ser jogo, podendo no máxi- representações imaginativas por meio
mo ser uma imitação forçada. Basta de um substrato físico, a possibilidade
esta característica de liberdade para de experimentação intersubjetiva que
afastá-lo definitivamente do curso da agrega dados sensoriais às interpre-
existem apenas as ruínas, na atual Teotihua- Outro detalhe interessante é a figura de Chac
cán. Mool, uma estátua antropomórfica em uma
posição reclinada segurando uma bandeja que
pode ser vista sobre a pirâmide do Templo
Maior, pequeno detalhe que o jogo procurou
esmiuçar.
Outra representação interessante é a
própria figuração do personagem Montezuma
Figura 3 - Imagem a esquerda a maravilha (fig.4), que é relatado em seus excessos, luxo
asteca in game. Imagem a direita a maquete do e abuso de autoridade. Uma das fases do jogo
Templo Maior de Tenochtitlán (Museu nacional traz um relato do narrador e sobrinho de Mon-
de Antropologia da Cidade do México). Fonte: tezuma, Cuauhtémoc: “O Imperador Montezu-
http://oxigeniobrasil.com/x/2015/10/22/os-sa- ma mora nos cômodos mais luxuosos do palá-
crificios-astecas/ cio, com suas esposas e concubinas. Enquanto
conversávamos, ele bebia chocolate espuman-
Crônicas do século XVI relatam uma cidade te em uma taça de ouro” (AGE OF EMPIRES II,
com mais de 200.000 habitantes, o centro 2013). Ele relata também que Montezuma
do domínio asteca. Como edifício central es- era lento em suas decisões e que raramente
tava o Templo Maior, templo dedicado aos acompanhava os guerreiros em combate, co-
ritos religiosos, em homenagem aos deuses meçando a ter a sua autoridade questionada
Tlaloc (deus da chuva) e Huitzilopochtli (deus por muitos. As coisas começaram a acontecer
da guerra), por isso percebe-se no seu topo e ele só dizia que tudo que era necessário fazer
dois templos. Ele foi principalmente conheci- eram sacrifícios, sacrifícios e mais sacrifícios.
do por ser o palco dos sangrentos sacrifícios Mas nada disso estava adiantando.
humanos. Diversas fontes citam a sua altura
entre 45 a 60 metros de altura. Ele fazia parte
de um complexo maior com outras pirâmides
de menor estatura. Além de recinto religioso, o
local representava toda a centralidade do poder
político, desenvolvimento econômico, social e
cultural.
A cidade tinha problemas de inundações, Figura 4 - Montezuma e seus excessos in game.
por ser ilhada pelo lago Texcoco, e também es-
tava sobre um terreno instável, mas sabe-se Durante o decorrer das fases, o imperador se
que a sua ruína se deve à destruição espanho- depara em um paradoxo quando se encontra
la. O jogo aborda em uma fase a dominação com os espanhóis, vivendo uma interna in-
de Tenochtitlán, mostrando que a cidade era triga, afinal, quem seriam esses homens que
uma ilha no lago Texcoco, o que parece ser uma chegam? Seria este homem o Quetzalcoátl (a
tentativa fiel ao que se conhece sobre a cidade. serpente emplumada, que nos mitos astecas
retornaria ao planeta)? Montezuma questiona: hipótese poderia ter sido inventada por estes
Quem são esses estranhos? São deuses? Eles conquistadores.
estão sobre bestas, feras (se referindo aos Filho (2005, p. 52) afirma que muito foi
cavalos). questionado o fato de Montezuma ter se en-
tregue tão facilmente aos espanhóis, em vista
Havia a lenda religiosa de um deus as- de seu caráter guerreiro. Montezuma não teria
teca que havia saído pelo mundo e um reagido e teria sido preso por algumas hipó-
dia retornaria para tomar aquilo que teses apontadas por muitos historiadores, de
era seu, a Cidade do México. Acontece que ele era louco, ou pelo contrário, um sábio
que Hernán Cortez, sabendo dessa que não desejava ver o massacre de seu povo.
história, mandou mensageiros dize- Outro aspecto levantado seria a própria de-
rem a Montezuma que ele era esse voção asteca pelos deuses, que naquele mo-
deus que viera buscar o que era seu mento sentiram-se abandonados, chegando
(FILHO, 2005, p. 52). até mesmo a pensar que aquilo seria uma pre-
destinação, pois muitas profecias haviam sido
O jogo relata esse encontro, que inicialmente lançadas anteriormente que se confirmaram
teria se dado de forma amigável, pois Monte- sobre a sua decadência. O jogo inclusive é bem
zuma muito presenteou Hernán Cortez, mas enfático nessas profecias, em um momento
ele relatava que parecia que este homem não Cuauhtémoc relata:
estava interessado nos presentes, apenas no
ouro! Até que em um momento ele começa a Os deuses ainda estavam inquie-
perceber que quem ele achava que poderia ser tos, pois naquele mesmo ano, outro
um deus, na verdade era um homem, e foi pre- presságio apareceu. O templo de
so por eles. Neste episódio da história asteca, Huitzilopochtli, de repente, explodiu
na fase do jogo chamada A noite triste, Tenoch- em chamas, apesar de ter sido feito
titlán é queimada, o ouro saqueado, e Monte- de pedra. Quando as pessoas corre-
zuma preso e morto. Sobre sua morte, o jogo ram para jogar água sobre o fogo, ele
não se posiciona em relação à causa, devido ao queimou com violência ainda maior
descompasso entre historiadores. Uma versão (AGE OF EMPIRES II, 2013).
aponta que Montezuma teria sido apedrejado
pelos seus próprios súditos, considerado um A penúltima fase aborda os entraves pós-mor-
fraco perante os espanhóis. Outra versão acre- te de Montezuma, abordando a substituição do
dita que ele teria sido morto por homens de trono pelo seu sobrinho. Como ele é o próprio
Cortez. Assim, o relato de Cuauhtémoc no jogo narrador, ele conta sobre sua intriga íntima
demonstra exatamente essa incerteza, ele diz em receber uma incumbência tão complexa,
que não sabe ao certo o que causou a morte do uma coroa, que será nada confortável. Sua
seu tio, porém, ele ouve dizer que ele poderia missão agora é contra-atacar os espanhóis,
ter sido apedrejado pelos seus próprios ou sido mas Cortez havia fugido com seus homens e
morto pelos espanhóis, mas que essa primeira todo o ouro roubado. Cuauhtémoc inicia uma
Referências