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1

BUENO, André; ESTACHESKI, Dulceli; CREMA, Everton; NETO,


José Maria [orgs.] Vários Orientes. Rio de Janeiro/União da
Vitória; Edições Sobre Ontens/LAPHIS, 2017.
ISBN: 978-85-65996-49-5
Disponível em: www.revistasobreontens.site

2
ÍNDICE
RAÍZES SOCIOCULTURAIS E POLÍTICAS DO TEATRO INDIANO
Ana Beatriz Pestana Gomes, 9

INFLUÊNCIA CULTURAL JAPONESA NA PERSPECTIVA DO ANIMÊ DEATH


NOTE
Angélica da Cruz Bernardo & Lúcio Reis Filho, 15

REFLEXÕES E REPRESENTAÇÕES DA ÁSIA E SUA (NÃO) UTILIZAÇÃO EM


ESPAÇO ESCOLAR
Ary Albuquerque Cavalcanti Junior & Ítalo Nelli Borges, 25

FONTE DE VIDA: POSSIBILIDADES DE ANÁLISE DE UMA FONTE CRISTÃ


PRODUZIDA NA ÍNDIA MOGOL NO FIM DO SÉCULO XVI
Bruna Soalheiro, 33

A SOCIEDADE JUDAICA DO PRIMEIRO SÉCULO E O DOMÍNIO ROMANO


Bruno da Silva Ogeda, 43

AS FILIPINAS, O MUNDO ASIÁTICO E A COLONIZAÇÃO ESPANHOLA,


SÉCULO XVI
Carlos Guilherme Rocha, 53

EXPOSIÇÃO DO MUNDO PORTUGUÊS E DIVULGAÇÃO DA ARTE CHINESA


Caroline Pires Ting, 65

HISTÓRIA DA ÁSIA E INTERDISCIPLINARIDADE NA EDUCAÇÃO BÁSICA:


UM DUPLO DESAFIO
Cyanna Missaglia de Fochesatto, 71

“ESMAGUEM OS QUATRO ANTIGOS”: A REVOLUÇÃO CULTURAL


PROLETÁRIA NA CHINA
Daniele Prozczinski, 77

HISTÓRIA E ANIMES: A UTILIZAÇÃO DE ANIMES PARA O ENSINO SOBRE


HISTÓRIA DO JAPÃO
Débora Dorneles Uchaski, 87

BREVE ESTUDO DO JAPÃO EDO: PODER E LEI NOS GOVERNOS DO


XOGUNATO TOKUGAWA (1603-1868)
Diego Almeida de Sousa, 97

JAPONESES NO BRASIL: UMA ANÁLISE HISTÓRICA


Douglas Augusto da Silva, 107

O NASCIMENTO DA JAPONOLOGIA
Edelson Geraldo Gonçalves, 115

3
EDUCANDO UM IMPÉRIO: UMA REFLEXÃO SOBRE O CONTEXTO
HISTÓRICO EDUCACIONAL CHINÊS
Elois Alexandre De Paula, 125

O JAPÃO E O OLHAR SOBRE O “OUTRO”: O NEGRO EM PERSPECTIVA


Felipe Adriano Alves de Oliveira, 133

O COLÉGIO DE SÃO PAULO EM GOA: NOTAS PRELIMINARES SOBRE


CIÊNCIA, CURRÍCULO E ORGANIZAÇÃO
Felipe Augusto Fernandes Borges & Saulo Henrique Justiniano Silva, 141

DO EXTREMO ORIENTE AO NOVO MUNDO: CAMINHOS DA


INTERCULTURALIDADE NA MISSIONAÇÃO JESUÍTA PORTUGUESA (SÉC.
XVI E XVII)
Fernando Roque Fernandes, 153

ENTRE COLÔNIA, GUERRA INTERNA E DIVISÃO DO PAÍS: UM BREVE


PANORAMA HISTÓRICO DA CORÉIA NO SECULO XX
Flávio Moisés Soares, 163

“POVO SEM HONRA, COVARDES, BRUTAIS E CRUÉIS”: REPRESENTAÇÕES


DOS JAPONESES NO JORNAL PARAENSE FOLHA VESPERTINA (1942-1945)
Geraldo Magella de Menezes Neto
Victor Lima Corrêa, 171

RELIGIOSIDADE E ESPIRITUALIDADE ORIENTAIS NA REDE


ADVENTISTA: A ABORDAGEM SOBRE ÍNDIA E CHINA EM LIVRO
EDITADO PELA CASA PUBLICADORA BRASILEIRA
Gustavo Uchôas Guimarães, 181

A LITERATURA BRASILEIRA E O ORIENTE: ENTRE A OJERIZA E A


APROPRIAÇÃO
Heraldo Márcio Galvão Júnior & Arcângelo da Silva Ferreira, 187

O POEMA DE PENTAUR: RAMSÉS II E A BATALHA DE KADESH


Isaias Holowate & Naton Joly Botogoske, 195

FRANCISCANOS NO EXTREMO ORIENTE: REPRESENTAÇÕES DO MUNDO


MEDIEVAL EM RELATOS DE VIAGEM
Israel da Silva Aquino, 205

UNESCO, YOGA E MAHÃBHÃRATA: HISTÓRIA E PATRIMÔNIO CULTURAL


IMATERIAL DA ÍNDIA
Janaina Cardoso de Mello, 215

EXTREMO ORIENTE: DOIS OLHARES PARA O VAZIO


Jienefer Daiane Marek, 225

4
O IMPÉRIO ASIÁTICO PORTUGUÊS: UMA PERSPECTIVA
HISTORIOGRÁFICA
Jorge Lúzio, 235

EM BUSCA DOS „CHINS‟


Kamila Rosa Czepula, 243

“MUÇULMANOS X CRISTÃOS”: A CRIAÇÃO DO INIMIGO DA AL-QAEDA E A


EDUCAÇÃO PARA O ÓDIO
Katty Cristina Lima Sá, 253

REFLEXÕES SOBRE O RELATO DE UM VIAJANTE BRASILEIRO AO


EXTREMO ORIENTE NO SÉCULO XIX: DA FRANÇA AO JAPÃO DE
FRANCISCO ANTONIO DE ALMEIDA
Kelly Yshida, 263

ELEMENTOS DO XINTOÍSMO DE ESTADO NAS ESCOLAS JAPONESAS


(1890)
Leonardo Henrique Luiz, 271

MAVO: O MODERNISMO E A POLÍTICA NO JAPÃO DO SÉCULO XX


Leonardo Souza Alves, 281

O CÓDIGO DE HAMURABI: O IMPERADOR, SUA OBRA E O DIVÓRCIO NA


ANTIGUIDADE
Lucimara Andrade da Silva & Luana Aparecida da Silva, 289

O QUANTO DE ÁRABE HÁ EM NÓS?


Luciano dos Santos Ferreira, 299

A ÉTICA ECONÔMICA BUDISTA E O ESPÍRITO CAPITALISTA JAPONÊS


Luís Henrique Palácio da Silva, 309

O TIANZHU SHIYI, OU O VERDADEIRO SIGNIFICADO DO SENHOR DO


CÉU: COMENTÁRIOS SOBRE SUA NATUREZA E IMPACTO
Luiz Felipe Urbieta Rego, 317

O ORIENTE MÉDIO ATRAVÉS DO CINEMA: DIÁLOGOS A PARTIR DAS


REPRESENTAÇÕES PRODUZIDAS NOS ESTADOS UNIDOS
Maicon Roberto Poli de Aguiar, 325

O OCIDENTE PELO ORIENTE: A REPRESENTAÇÃO DA SEGUNDA GUERRA


PÚNICA NO MANGÁ “HEUREKA”, DE HITOSHI IWAAKI
Maria Carolina Silva Martins Pereira & Pedro Antonio de Brito Neto, 335

A CONSTRUÇÃO DOS 47 RONIN COMO SÍMBOLO NACIONALISTA


Mariana Steiner Farias, 345

5
OS FESTIVAIS EGÍPCIOS: MITO, MAGIA E RELIGIOSIDADE
Maura Regina Petruski, 355

PIRATAS JUDEUS NA ANTIGUIDADE


Nelson Rocha Neto, 363

OLHARES CRUZADOS: JAPÃO E PORTUGAL


Newton Ribeiro Machado Neto, 371

O ORIENTALISMO E AS REPRESENTAÇÕES DO EGITO ANTIGO EM 'AGE


OF MYTHOLOGY'
Pepita de Souza Afiune & José Loures, 385

MITANI: O REINO PERDIDO


Priscila Scoville, 399

REPRESENTAÇÕES DA RAPOSA NA LITERATURA MARAVILHOSA


MEDIEVAL: UMA COMPARAÇÃO ENTRE O IMAGINÁRIO EUROPEU E O
JAPONÊS
Raphaella Ânanda Sâmsara Maia Augusto de Souza Faria, 409

A INFLUÊNCIA GEOGRÁFICA NA DEFINIÇÃO DA GUERRA NAVAL RUSSO-


JAPONESA (1904-1905)
Rayanne Gabrielle da Silva, 415

INTERVENÇÃO DO PIBID DE HISTÓRIA: O JAPÃO NA SALA DE AULA


Renan Lourenço da Fonseca, 425

“MIMOS INDIANOS” E “DELÍCIAS DA ÁSIA”: UM DEBATE SOBRE O


IMPÉRIO ULTRAMARINO PORTUGUÊS NO SÉCULO XVI
Ricardo Hiroyuki Shibata, 431

RELEITURAS DO PERÍODO “MUROMACHI BAFUKU” ATRAVÉS DO FILME


OS SETE SAMURAIS
Rodrigo Galo Quintino, 439

O PROJETO DE NAPOLEÃO BONAPARTE PARA O EGITO:


CONSIDERAÇÕES SOBRE ORIENTALISMO
Rodrigo Henrique Araújo da Costa, 451

LITERATURA COMO ABORDAGEM DO PASSADO: DEFESA DA TRADIÇÃO


JAPONESA NO ENSAIO EM LOUVOR DA SOMBRA DE JUN‟ICHIRŌ
TANIZAKI
Ronny Costa Pereira, 463

ALÉM DA GUERRA E RADIAÇÃO - UMA ANÁLISE DA HISTÓRIA ANTIGA


DO JAPÃO NOS LIVROS DIDÁTICOS DO ENSINO MÉDIO DAS ESCOLAS
ESTADUAIS DE MEDIANEIRA NO PARANÁ
Sander Fernando de Paula, 471

6
O ORIENTALISMO E AS REPRESENTAÇÕES DO
EGITO ANTIGO EM AGE OF MYTHOLOGY
Pepita de Souza Afiune
José Loures
Introdução
A cultura egípcia antiga exerce um fascínio no Ocidente atualmente.
Exposições itinerantes atraem estudantes e curiosos, filmes trazem
entretenimento e ao mesmo tempo invocam um Egito mágico, e
muitas edificações urbanas inspiram-se em formatos piramidais ou
obeliscos. Essa interação com culturas milenares habita o imaginário
de muitas pessoas na contemporaneidade. Propomos estabelecer
uma breve análise das representações do Egito Antigo no jogo
eletrônico Age of Mythology (AoM), considerando suas visualidades
e narrativas, vestuários, figuras míticas, edifícios, cenários e
desenvolvimento da civilização egípcia.

O Egito é apresentado nos games desde o surgimento dos primeiros


videogames. Alguns jogos exploraram a cultura egípcia de maneira
complexa, apresentando a sociedade e cultura como: Civilization
(1991), Age of Empires (1999) e Assassin's Creed Origins (2017).
Outros games apresentam a cultura egípcia como parte de sua
narrativa, parcialmente em cenários e personagens, como:
Darkstalkers (1995), Castlevania: Portrait of Ruin (2006), Plants
vs. Zombies 2: It's About Time (2013) e Overwatch (2016). Contudo,
o diferencial de AoM e os jogos citados, é um desenvolvimento e
aprofundamento nos mitos do Egito Antigo.

Consideramos o processo de pré-produção do jogo, porque este


momento envolve elementos como o design instrucional e a pesquisa
histórica. Compreendemos estas representações do Egito Antigo
como uma manifestação da Egiptomania.

A Egiptomania é hoje um ramo de pesquisas mais específico no


âmbito da Egiptologia, sendo uma prática que inicialmente teria
começado com os próprios gregos antigos, teria se afamado depois
com os franceses e posteriormente se espalhou pelo mundo todo.
Após a empreitada de Napoleão Bonaparte ao Egito essas
representações intensificaram-se.

385
Dentro do contexto de intriga entre franceses e ingleses está o Egito,
que em pleno século XIX era uma colônia, na verdade entendida
como uma extensão da Europa. Essas e muitas outras
representações que surgem neste período, principalmente na
literatura, marcaram o que Edward Said denomina de Orientalismo
Moderno, uma invenção do Oriente a partir do olhar europeu
colonizador. O Egito foi o protagonista das representações
ocidentais a respeito do Oriente Próximo e suscitou paixões de
muitos aventureiros.

Egiptomania e Orientalismo
De acordo a pesquisadora referência em Egiptomania no panorama
brasileiro, Margaret Bakos (2014), o Egito Antigo promoveu seu
legado na contemporaneidade a partir das apropriações de suas
simbologias que foram readaptadas e ressignificadas em diversos
suportes, como na arquitetura, na mídia e nas novas religiosidades.

Os estudos sobre a Egiptomania no Brasil foram iniciados pelo


Laboratório de História Antiga da Universidade Federal do Rio de
Janeiro baseando-se em experiências realizadas em países europeus.
Muitas destas pesquisas abordaram a manifestação da Egiptomania
em várias regiões do Brasil, como no Rio Grande do Sul, na Paraíba,
no Amazonas e no Paraná. Também há pesquisas que analisaram a
Egiptomania em cemitérios, coleções, acervos, e em grupos
esotéricos dentre os quais se destaca a Ordem Rosacruz.

Jean-Marcel Humbert cunhou o termo Egiptomania (1994, p. 21),


definindo essa prática como a interpretação das imagens do Egito
readaptadas na atualidade. A Egiptomania para Bakos (2007, p. 05)
é “o agente de um dos mais longos fenômenos de transferência
cultural já contabilizado, matriz de valores e de gostos estéticos
mundiais contemporâneos”. A Egiptomania é um novo ramo de
pesquisa que aborda as práticas culturais que retomam elementos do
Egito Antigo, analisando a permanência de certos valores e suas
transformações ou adaptações (Ibidem, p. 02).

Segundo Bakos, a Egiptomania tem origem no século IV a.C.,


quando Alexandre o Grande conquista o Egito, saqueando peças
egípcias que depois alastraram-se para outros países. A
historiografia grega também atribui ao Egito uma imagem
fascinante como pode-se perceber nos relatos de Heródoto: “Todo
homem sensato que ainda não tenha ouvido falar nisso notará,

386
visitando o país, ser o Egito uma terra nova e um presente do Nilo”
(HERÓDOTO, 2006, p. 136);

“Estender-me-ei mais no que concerne ao Egito, por


encerrar ele mais maravilhas do que qualquer outro país; e
não existe lugar onde se vejam tantas obras admiráveis,
não havendo palavras que possam descrevê-las” (Ibidem, p.
149).

A Egiptomania se intensificou a partir das expedições de Napoleão


Bonaparte, Champollion e Howard Carter. Em 1798 a Campanha de
Napoleão no Egito tornou ainda mais populares as práticas da
Egiptomania, alocando este estudo a um novo ramo da Egiptologia.
Napoleão sonhou com uma reconquista ao Egito, como um novo
Alexandre.

Nesse período, o Egito ocupava uma posição central nas relações


entre Europa, África e Ásia, passando a ser um anexo da Europa a
partir de um projeto civilizador. Esse projeto visava a sua grandeza
clássica, sendo colocado dentro do contexto da antiguidade europeia
clássica. Esse discurso foi difundido através da publicação da obra
de Napoleão “Descríption de l’Égypte” em 1809. Esse
empreendimento de Napoleão estimulou a chegada de muitos
europeus para o Egito com interesse científico ou literário.

Pensando nessa fascinação ocidental pelo Oriente que perdurará


pelo século XX, remetemos aos estudos sobre o Orientalismo, a
partir de Edward Said (1990). O autor procura realizar uma
genealogia do Orientalismo, mostrando que o mesmo surgiu dentro
do pensamento colonialista eurocêntrico. Partimos da ideia de que
houve a priori, a criação do que nós, ocidentais, entendemos por
“Oriente”. O Orientalismo surge então como um ramo de estudos
dentro da academia que aborda essa relação estabelecida entre
Ocidente-Oriente. O Orientalismo entende que foram criadas
concepções sobre o Oriente, mas recheadas de ideais eurocêntricos.
Said afirma que:

“Orientalismo é o termo genérico que venho usando para


descrever a abordagem ocidental do Oriente. É a disciplina
por meio da qual o Oriente é abordado sistematicamente,
como um tema de erudição, de descobertas e de prática.
Mas, além disso, eu tenho usado a palavra para designar

387
aquela coleção de sonhos, imagens e vocabulários
disponíveis para qualquer um que tenha tentado falar sobre
o que está ao Leste da linha divisória” (SAID, 1990, p. 82).

A chegada de viajantes aventureiros ou escritores interessados no


exotismo destes países foi a responsável pelas novas atribuições
dadas ao Oriente no século XIX. Afinal, neste momento, o Egito
passa a ser colônia britânica, propriamente em 1882, o que perdurou
até 1954. Até o século XIX essa dominação francesa e inglesa no
Egito foi a responsável pela criação de um olhar romântico que
denota um Egito exótico e mágico. Ao mesmo tempo em que ele era
dominado, sendo sujeito à imposição de uma sensação de
superioridade europeia, que se mostrava nos quesitos além do
militar, econômico mas até mesmo cultural, o Egito por outro lado,
seduzia esses europeus de alguma forma.

Após o longo contexto das independências asiáticas e africanas,


tendo o Egito o nosso foco, vislumbramos neste momento que se
inicia no decorrer do século XX, uma nova posição do Oriente. Agora
ele se posiciona contra a colonização europeia, mas acabou sendo
atraído por um outro imperialismo, o norte-americano. Este novo
imperialismo manteve esse olhar orientalista romântico, como uma
herança colonial.

A partir da década de 60 houve um adentramento da cultura oriental


nos Estados Unidos possibilitada pelas imigrações de indianos e pelo
surgimento do movimento de contracultura. Com o aumento desse
fluxo entre Oriente e Ocidente, podemos perceber uma conexão
entre as sabedorias orientais que irão se difundir pelo país. Dentro
deste contexto podemos perceber o Egito sendo representado
amplamente na indústria cinematográfica, como os filmes César e
Cleópatra (1945), O egípcio (1954), Terra dos Faraós (1955) e
Cleópatra (1963). Posteriormente com o advento dos jogos
eletrônicos, também podemos encontrar várias representações do
Egito que se popularizaram em várias mídias.

388
Age of Mythology (AoM)

In techtudo.com.br

Age of Mythology é um game do gênero RTS – real time strategy,


desenvolvido pela Ensemble Studios e publicado pela Microsoft
Game Studios em 2002. Este gênero é baseado no desenvolvimento
e administração de recursos encontrados pelo mapa, esses recursos
financiam a construção de novos edifícios e unidades. Além disso, os
combates acontecem dentro de uma narrativa linear ou contra a
inteligência artificial (I.A) e outros jogadores. Essas batalhas
acontecem em termo real, diferente de outros jogos de estratégia que
funcionam através de turnos. O jogo Age of Mythology é um
derivado da série Age of Empires (1999), entretanto, em vez de focar
em acontecimentos históricos e personalidades históricas, AoM se
baseia nos mitos das culturas egípcias, gregas e nórdicas. Em 2014
foi lançado uma versão em alta resolução do jogo – esta versão foi
utilizada para a construção do artigo. Desde então, estima-se que até
o momento, as versões de AoM tenham vendido aproximadamente 9
milhões de cópias.

AoM é um jogo preocupado em trazer informações históricas sobre


as civilizações retratadas. No menu inicial, há informações sobre o
que é mitologia, explicando de forma didática a sua importância no
estudo de uma determinada civilização. Justifica que a análise da
mitologia é importante para se compreender a mentalidade de uma
época, a sua forma de tentar explicar determinados fenômenos
naturais e a origem de um povo.

389
A narrativa é permeada pela presença dos deuses Isis, Rá, Seth,
Anúbis, Bastet, Ptah, Hathor, Néftis, Sekhmet, Hórus, Osíris e Thot.
As suas cidadelas devem adorar aos deuses para receber bênçãos
importantes para sobrevivência em determinadas fases da
campanha.

A Isis é retratada como a deusa mãe e do casamento. Conhecida pela


sua manipulação da magia e ressurreição de seu marido Osíris. É
comumente retratada amamentando Hórus. É filha de Geb e Nut,
uma união entre a terra e o céu. Seth por sua vez é retratado como o
deus das tempestades e do deserto, e a sua inveja de seu irmão
Osíris. O jogo relata sobre os fatos ao redor da morte de Osíris e a
consequente retomada da vingança pelo seu filho Hórus. Assim, o
jogo chama Seth de “Deus do mal”.

Os egípcios aparecem dentro de um panorama maior da campanha


do jogo, a épica jornada de Arkantos (personagem ficcional), um
herói atlante que participou da Guerra de Troia ao lado dos gregos.
Ao passar pelo mundo inferior e conseguir sair dele juntamente com
Ájax e Quíron, Arkantos se encontra em uma outra parte do mundo.
Perdidos, deparam-se com Amanra, uma heroína egípcia e outra
personagem ficcional. Ajax é um conhecido personagem da
mitologia grega, um herói importante na guerra de Troia, explorado
pela Ilíada; Quíron é um centauro pupilo de Apolo, que tornou-se
um sábio e posteriormente doutrinou heróis como o próprio Aquiles.
Amanra precisa da ajuda destes heróis para desenterrar a espada do
Guardião, aquela mesma utilizada por Hórus para matar Seth.

O antagonista da história é Kemsyt (personagem ficcional), um


antigo inimigo de Amanra que pretende pegar a espada e destruir os
pedaços de Osíris. Para impedi-lo, os heróis precisam resgatar a
espada e posteriormente a caixa funerária contendo os pedaços de
Osíris.

A caracterização das cidadelas egípcias é uma procura por um


retrato fiel ao que se conhece pela historiografia, algumas fases se
passam em regiões desérticas e alguns oásis. Seus cidadãos são
negros, diferente de muitas produções cinematográficas que
insistem em apresentar egípcios com feições de um europeu. Ciro
Flamarion problematizou essa questão da cor da pele entre os
egípcios antigos:

390
“Esta visão, que assegurava serem “caucasoides” (brancos)
em forma predominante os antigos egípcios, foi fortemente
atacada por historiadores negro-africanos - C. Anta Diop e
T. Obenga -, que com argumentos lingüísticos (semelhança
entre o antigo egípcio e línguas negro-africanas de hoje) e
de outros tipos trataram de provar que os egípcios da
Antigüidade eram negros. [...] Foi lembrado também que o
Egito, situado na confluência da África e da Ásia, nunca
esteve isolado, sendo inaceitável pretender que sua
população foi exclusiva ou predominantemente “branca”,
tanto quanto “negra” já que tudo indica ter sido sempre
muito mesclada, pelo menos desde o Neolítico”
(CARDOSO, 1982, p. 04-05).

Os aldeões trabalham compulsoriamente em minas de ouro,


fazendas, construção de edifícios e cortam lenha. Mas esta
característica não os diferencia das demais civilizações retratadas em
AoM. O jogador necessita impor este trabalho aos seus aldeões para
se ter recursos para as guerras.

“A base da mão-de-obra do antigo Egito eram os


camponeses, maioria absoluta da população. Viviam em
aldeias, pagavam impostos ao Estado (em certos casos, a
um templo ou senhor que gozasse de imunidade fiscal) em
forma de cereais, linho, gado e outros produtos, e também
se prestavam a corveias ou trabalhos forçados, a nível local
(obras de irrigação) ou nas obras públicas” (CARDOSO,
1982, p. 15).

A caracterização dos faraós é detalhista, pois eles possuem o cetro,


conhecido como heqa, um símbolo de autoridade. Esse é um tipo de
cajado utilizado por pastores de ovelhas para ordenhá-las. Esse é o
símbolo da ordem e da lei que está sob a autoridade do faraó. Ele
ordenha e cuida de seu povo. O faraó também apresenta a barba de
cerimônia que é trançada e postiça, elemento comumente presentes
em representações de faraós. Outro elemento importante que
aparece em AoM é a utilização da saia, vestimenta muito comum no
Egito Antigo, que de acordo Brancaglion (2009) era o item principal
utilizado nas indumentárias masculinas no período do Médio
Império (2134 – 1784). O faraó também usa a coroa militar, de cor

391
azul, que era utilizada apenas nas ocasiões de guerra, sendo
conveniente ser retratado com ela no jogo.

“A vestimenta era, antes de tudo, um símbolo de prestígio.


Podemos dizer que quanto mais elevada fosse a posição
social de um egípcio antigo mais as roupas eram volumosas
e numerosas” (BRANCAGLION, 2009, p. 01).

Caracterização do faraó Sobekhotep in game.

Brancaglion também analisa a questão da indumentária afirmando


que o branco era uma cor sempre presente, e isso podemos também
verificar na saia dos nossos faraós de AoM, e o linho era na maior
parte das vezes o material. O autor afirma que a vestimenta dos
trabalhadores homens também poderia ser saia, como podemos
perceber nos aldeões representados pelo jogo.

Caracterização dos aldeões egípcios in game.

392
“Dessa forma as vestimentas traduziam as funções que o
homem e a mulher ocupavam na sociedade e juntamente
com os seus títulos a roupa era um identificar da situação
social de um egípcio” (BRANCAGLION, 2009, p. 02).

Ainda sobre os faraós, temos alguns retratados pelo jogo como é o


caso de Sobekhotep, faraó da 12ª ou 13ª dinastia (não há consenso
entre os historiadores). Pouco se conhecia sobre esse faraó, até que
um grupo de arqueólogos norte-americanos encontrou uma tumba e
no local havia uma inscrição em seu nome. Haviam muitos objetos e
urnas funerárias, o que possibilitou o início de muitas pesquisas
para se conhecer melhor este faraó.

Outro faraó retratado no jogo é Neferhotep III que também deixou


dúvidas entre os historiadores se seria da 13ª ou 16ª dinastia.
Governante de Tebas, Neferhotep III ficou conhecido como aquele
que salvou a sua cidade da fome e também teria se envolvido em
uma guerra para defendê-la (RYHOLT, 1997, p. 202).

No quesito arquitetura, a maravilha egípcia, o principal edifício de


cada civilização em AoM, é um templo semelhante ao Templo de
Luxor (1.400 a.C.), localizado na cidade da antiga Tebas, atual
Luxor, na margem do rio Nilo. É dedicado ao deus Amon, obra do
faraó Ramsés II, e um dos edifícios mais importantes da arquitetura
do Egito Antigo. Foi declarado Patrimônio Mundial da UNESCO em
1979.

Templo de Luxor. In http://www.penaestrada.blog.br

393
Maravilha egípcia in game

As cidades são repletas de estátuas de deuses e obeliscos. Nos


templos o jogador pode criar seres mitológicos. Dentre eles está o
Anúbis, o próprio deus dos mortos e da mumificação, mas que nesse
caso aparece como unidade mítica para ser empregada nas guerras.
Esfinge, escaravelho, homem-escorpião, fênix, múmia e tartaruga
são outras unidades míticas empregadas nas batalhas. Cada um
possui determinados poderes, dos quais pode-se perceber que o jogo
utilizou de sua liberdade criativa.

É necessário que o jogador construa estátuas de deuses, para que ele


obtenha “favor”, que seriam poderes sobrenaturais para criar
unidades míticas e aperfeiçoá-las, tendo destaque a estátua de Isis. O
jogo apresenta Isis em uma de suas várias representações clássicas,
quando ela recebeu uma influência de elementos da deusa Hathor,
com os cornos de uma vaca e um disco solar. Apresenta as asas de
falcão, visto que ela pode se transformar neste animal. Suas asas
estão relacionadas a seus poderes mágicos como a ressurreição dos
mortos. Os adornos de ouro na estátua compõem as paisagens das
cidades repletas deste minério. Enquanto os aldeões trabalham nas
minas, o ouro adorna templos, esculturas e os faraós, conferindo
uma imagem de riqueza e poder.

394
Estátua de Isis in game.

Uma das preocupações dos desenvolvedores era criar uma narrativa


imersiva, por isso a campanha solo se tornou tão importante. Os
personagens apresentam personalidade e contam também com
dublagem. Antes do lançamento oficial, os programadores estavam
empolgados com as possibilidades da tecnologia 3D aplicada aos
games. Em entrevista o programador chefe Robert Fermier afirmou
que a intenção era transformar a série Age of em um produto mais
cinematográfico, algo até então inédito na série (HeavenGames LLC,
2002).

Para conseguir imergir o jogador naquele universo mitológico, a


imagem é um elemento importante, mas a trilha sonora é
indispensável para a ambientação do jogador. O artista de som
Kevin McMullan questionado sobre o processo criativo das
composições em AoM diz o seguinte:

“Para Age of Mythology, tivemos que ajustar nosso


pensamento um pouco, porque simplesmente não há uma
grande quantidade de material de referência sobre as
tradições musicais dessas culturas antigas. Para esta trilha
sonora, expandimos os temas que foram apresentados nos
jogos anteriores, enquanto incluímos uma interpretação
ampla das culturas, pois sentimos que elas são
apresentadas no jogo” (IGN, 2002, s/p).

De acordo com o compositor, mesmo sem ter uma referência das


músicas da época, houve uma tentativa de interpretação. Assim,
foram utilizados instrumentos característicos de cada civilização,

395
como um alaúde egípcio e conchas marinhas. O processo para criar
som e imagem que remetam a uma era mitológica, é apenas possível
através da imaginação de artistas junto à tecnologia, como os
videogames.

Considerações Finais
Age of Mythology não deixa de ser uma narrativa a partir de olhares
imperialistas, que manteve uma concepção orientalista romântica
nos mínimos detalhes, não esquecendo de enfatizar o caráter mágico
que permeia a mitologia egípcia e imagem de grandeza e poder de
seus deuses. O jogo evoca um egípcio mágico da mesma forma que
muitos filmes hollywoodianos. Sempre retratado lado a lado com as
civilizações da antiguidade europeia, o Egito Antigo é comumente
entendido como parte deste contexto, o que não considera as suas
especificidades.

Mas por outro lado, podemos perceber que Age of Mythology é além
de entretenimento, um dispositivo que possibilita o conhecimento
da mitológica egípcia sem abrir mão da liberdade criativa. A
campanha de Amanra em sua jornada pela busca dos pedaços de
Osíris mostra que durante o desenvolvimento do jogo, houve uma
pesquisa sobre o que se retratar, o que se divagar e o que deixar por
livre interpretação do jogador.

Pode ser uma ferramenta poderosa nas mãos do docente que souber
empregá-la como recurso metodológico, visto que, o jogo é uma
mídia presente na vida de crianças e adolescentes dos dias de hoje.
Assim, muitas discussões ainda podem ser desenvolvidas a este
respeito.

Referências
Pepita de Souza Afiune é doutoranda em História pela Universidade
Federal de Goiás. Mestra em Ciências Sociais e Humanidades
(UEG). Contato: pepita_af@hotmail.com
José Loures é artista multimídia, doutorando e bolsista CAPES no
Programa de Pós-graduação em Arte pela Universidade de Brasília.
Mestre em Arte e Cultura Visual. Contato: jloures-arte@hotmail.com

BAKOS, Margaret. A Egiptomania na América do Sul: um estudo


multidisciplinar e comparativo. In: XXIV Simpósio Nacional de
História. História e Multidisciplinaridade: territórios e

396
deslocamentos. São Leopoldo (RS): UNISINOS, 2007. Disponível
em:
http://anais.anpuh.org/wp-
content/uploads/mp/pdf/ANPUH.S24.1196.pdf. Acesso em 31 de
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