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Leonor Neves da Costa Luis dos Reis

ÉTICA E INFINITO
de Emmanuel Lévinas

PORTO
2012
UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA
Centro Regional do Porto
Escola das Artes
Licenciatura em Som e Imagem

ÉTICA E INFINITO
de Emmanuel Lévinas
POR
Leonor Neves da Costa Luís dos Reis

Trabalho para a unidade curricular:


“Pensamento Contemporâneo”
Orientador: Prof. Doutora Yolanda Espiña

PORTO
2012
Antes de dar início à análise detalhada da teoria de Emmanuel Lévinas discutida em
entrevista no livro “Ética e Infinito” parece-me pertinente começar com uma breve
explicação de uma série de termos propostos pelo autor.
Lévinas insere esta sua filosofia na Ética, partindo, para isso, de uma noção de
relação social, intersubjectiva, entre Eu e o Outro, criada, não, através de um acto de olhar
perceptual (uma implicação deste é o de que pressupõe uma forma finita que sendo finita,
delimita um objecto, viabilizando, assim, a ideia de julgamento; daí, a subjugação ao poder)
mas de um acto de aceder eticamente; este acesso não é cognitivo, mas sensível (uma ideia
um tanto platónica, perceber através dos sentidos, neste caso, aceder através dos sentidos).
Trata-se então de uma fase precognitiva pois é anterior ao conhecimento (anterior no
sentido de mais básica, mais primitiva, primeira). O Outro, um dos sujeitos desta relação, é
a outra pessoa, que pode ser qualquer um, mas um de cada vez com o qual eu me relaciono
(daí o uso da palavra no singular). Este Outro tem de ser necessariamente diferente de mim,
não posso ser eu, nem é ainda o terceiro, os outros homens. O Outro é o meu próximo,
aquele com quem estabeleço uma relação (num dado momento), com ele e nenhum outro,
embora ele possa ser qualquer um. O Rosto será, quiçá, o conceito, simultaneamente, mais
complexo e mais importante nesta teoria. Ao utilizar esta palavra, Lévinas está a referir-se,
não a face como atributo estético ou mesmo físico, embora o seja, mas como representante
expressivo (o mais expressivo) e mais vulnerável do Outro. Rosto enquanto identidade
primitiva ou rosto enquanto presença; ao simultaneamente estar exposto (a mim) e
expressar o Outro, o rosto é, em si mesma, a prova da existência (e da mortalidade, como
veremos mais à frente) do Outro – é o seu ser pessoa, e o seu ser pessoa aí.
Na base da compreensão desta teoria de Lévinas está, em primeiro lugar, a forma de
acesso à alteridade. Sem esta compreensão, o sentido desta teoria não será, de todo,
apreendido, visto que a sua essência, aquilo que simultaneamente a fundamenta e
diferencia das filosofias de totalidade (ver em baixo), está precisamente nesse acesso
primitivo ao Outro, através do seu rosto. Nesse acesso, e tal como antes afirmei, Lévinas
rejeita o conhecimento, e assim, a percepção (forjada ontologicamente, com base no
julgamento), em prol do único acesso que me permite conhecer o rosto do Outro em toda a
sua pobreza essencial, a sua vulnerabilidade, nudez, transparência (cujo extremo mais não
é do que a própria morte – a morte da sua alteridade). Daí também, que o autor afirme o
rosto como “significação sem contexto”, pois aquilo que é próprio à natureza de alguém é
anterior a qualquer máscara que lhe possamos aplicar, qualquer coisa a mais, que, essa sim,
pode ser vista cognitivamente, viabilizando, assim, o juízo. O rosto afecta-me, tornando a
relação com o Outro, essencialmente, ética; assim, a referência ao homicídio não é sem
mais: o sentido do rosto é ele próprio uma exigência (ordem) ética, à qual o saber (cujo
campo é distinto do ético) é incapaz de aceder verdadeiramente, uma vez que o rosto é
irredutível a um conteúdo. É o rosto, na sua vulnerabilidade, que se expressa diante mim,
que me impede de matar, dizendo: “não me mates e deixa-me ser eu”; a forma mais fácil de
matar o Outro é também a mais desumana: tornar o Outro no Mesmo.
Pertencendo, como vimos, a ética a um campo distinto daquele onde se encontra o
saber (cuja promessa é a verdade), ela representa uma saída do Ser – a ideia de infinito –
que, ultrapassando o alcance do pensamento, ultrapassa naturalmente o próprio acto de
pensar. Contudo, a ideia de Infinito existe, mas contrariamente ao que afirma Descartes,
para Lévinas ela toma em nós, não a forma de um saber, mas a de um desejo – o de escapar
do Ser (uma impossibilidade assumida pelo próprio autor) – que é, na verdade, a própria
relação social, o acesso à alteridade, ao Outro. Esta relação não se estabelece, contudo, fora
da totalidade (do mundo), mas, porque suscita o desejo de infinito, questiona-a; assim
podemos falar de infinito e de totalidade, não como opostos mas como complementares – o
Outro, sendo, é totalidade, mas porque ultrapassa esse ser é, também, infinito. Aqui, surge
a linguagem que Lévinas remete ao rosto e identifica com responsabilidade (ética) – de
responder ao outro, independentemente do conteúdo (o dito); o acto de responder (o dizer),
que implica uma abertura ao Outro e que ultrapassa o que é dito – o próprio rosto fala com
a afirmação: “Eis-me aqui!” (o estar é já por si uma interpelação), que é a exigência ética
que fundamenta e dá significado à relação.
A questão da responsabilidade começa por remeter-nos, mais uma vez, ao Outro
como “necessariamente diferente de mim”; diferente porque Eu, na minha riqueza, estou
submetido à sua pobreza e domínio, sendo, precisamente, neste o pressuposto, que se
baseia a nossa relação. O facto de esta relação não se esgotar entre mim e o Outro,
estendendo-se entre o Outro e os seus terceiros, tem o revés da escassez do controlo,
suscitando, assim, a questão da existência da justiça. A responsabilidade em Lévinas é de
natureza Ética: aí fala em responsabilidade por outrem e ainda em subjectividade. Mas qual
o elo de relação entre os três conceitos? Simplesmente isto: na Ética tem lugar o nosso
encontro com o Outro, e tratando-se então, esse encontro, de uma relação ética, deve
basear-se na responsabilidade (precisamente, pelo Outro), sendo daí que, segundo o autor,
resulta a subjectividade; esta, não sendo racional ou ontológica, é assim de natureza ética.
Significa isto que a subjectividade do Eu é definida pela responsabilidade pelo Outro (o
acto de ser responsável pelo Outro define a minha subjectividade). Eu estou, assim,
subordinado ao Outro pela responsabilidade por ele, e a esse “peso” que sinto (que o Outro
exerce sobre mim) Lévinas dá-lhe o nome de proximidade. Ora, não se tratando a
subjectividade, como já disse, nem de um processo racional (imagem mental), nem
ontológico (centrado no Eu como Ser), a existência dessa proximidade não está dependente
da intencionalidade, nem ainda se limita à coexistência física com o Outro num mesmo
espaço; mas antes do Rosto que, na sua expressividade, significa (em si mesmo),
simultaneamente, a ordem e o pedido aos quais estou subjugado.
Retomando a definição de responsabilidade, não enquanto conduta moral, mas
antes, sujeição total e infinita ao Outro, Lévinas afirma que na sua origem está a ideia do
desinteresse, no seu sentido mais literal: da saída do Ser, do fim da condição ontológica. O
desinteresse na relação entre mim e o Outro é visível na sua não-reciprocidade: Eu não
espero que o Outro seja responsável por mim pois sendo a minha responsabilidade total,
sou responsável até pela responsabilidade dele. Então, além de total ela é também
incessante, mas é precisamente isso que, não só afirma e sustém a minha identidade, pois
sendo a responsabilidade pelo Outro algo que só a mim cabe, Eu sou único e insubstituível
(e assim sou apenas na medida em que sou responsável), como a eleva à espiritualidade.
Lévinas introduz, então, a ideia de testemunho, não enquanto comunicação de
dados (implica a sua tematização que contraria a ideia de Infinito), mas enquanto vestígio
de uma exterioridade que se torna interior – a glória do infinito. O testemunho não é, então,
um acto contemplativo e passivo, mas precisamente o oposto: ele irrompe essa passividade
egocêntrica do Eu, no momento em que o exterior se torna interior – é um testemunho
ético. As ideias de Infinito, glória e exterioridade remetem-nos quase instintivamente para
uma transcendência quase inumana (que não nos diz respeito). Mas a transcendência que o
autor postula é aquilo que precisamente nos confere humanidade; ela está presente na
nossa relação diária (afectiva) com o Outro. Não se trata de uma abstração dogmática mas
de uma realidade concreta; é a assunção da responsabilidade pelo Outro, a sujeição a essa
responsabilidade (ordem) antes mesmo da sua compreensão – e a isto o autor chama
profecia. Os textos e livros religiosos, fonte de consolação para os homens, constituem
formas concretas de interpretações proféticas de fontes diversas que confluem numa
verdade ética comum; mas, apenas enquanto transcrições de testemunhos éticos de
diferentes homens no seu encontro com o rosto do Outro, e não enquanto relatos
dogmáticos do sagrado e hermenêuticas de diferentes tradições, podemos afirmar que,
neles, se revela a glória do Infinito. Lévinas afirma, então, a santidade da Bíblia que, mais
do que as outras grandes literaturas (através das quais também se expressa o rosto do
Outro), expressa-o no seu próprio significado. A Bíblia não se reduz a um conjunto de
saberes, de máximas unívocas, mas contém em si mesma uma abertura essencial que não
só permite todo o género de exegeses, como a sua transmissão e retransmissão, que lhe
conferem a sua santidade; mais uma vez, não a interpretação do seu conteúdo, mas da
humanidade que emana e da proximidade que, simultaneamente nos apela e ordena a lê-la.
Porém, apenas crendo na ética, por si só, na sua verdade absoluta, pode o homem ser digno
da consolação de um “final feliz”, depois de todo o esforço, que a religião lhe oferece.
Tudo isto serve, em última instância, para compreender o sentido do Ser, e para isso
o autor retoma a questão da responsabilidade, mas aqui, procurando-lhe a origem que
atribui a um medo desinteressado: o medo pela morte do Outro. E assim, a nossa
responsabilidade é, essencialmente, pela morte do Outro. Mais, esse medo que sinto pelo
Outro é duplo: temo pela morte do Outro, pelo seu sofrimento, ao mesmo tempo que temo
pela minha violência para com ele (remete-nos à dicotomia do rosto que ordena e suplica).
E com tudo isto podemos, enfim, compreender a razão pela qual Lévinas afirma
como questão última do sentido do Ser, uma máxima que se fundamenta até
biologicamente: não será que mato, existindo? Uma questão que, definitivamente, coloca
em dúvida a ideia modernista, sedutora mas solipsista, de que no Ser está a razão da sua
própria existência.
Longe de ser mais uma teoria filosófica em busca do sentido do Ser, esta filosofia
de Lévinas destaca-se das demais ao recuperar a noção de transcendência, “destruída” pela
filosofia Ocidental que ao encapsulá-la em estruturas ontológicas, reduziu o sentido do Ser
à sua própria totalidade, esquecendo aquilo que o ultrapassa e que foge a essa finitude: o
Outro. Esta recusa do autor em definir ontologicamente a transcendência é resolvida
quando em vez de Filosofia propõe a Ética como fundamento de tudo, sendo nesta “troca”
que se compreende o porquê da afirmação que abre este parágrafo. Lévinas contradiz a
colocação da pergunta última pelo Ser da filosofia modernista ao transferi-la do Eu para a
relação ética que me liga ao Outro, rejeitando assim o “Eu egocêntrico” – sempre do Outro
em relação a mim, e na sua mesmidade – no qual, a tradição filosófica insistia. E no lugar
de um racionalismo universal, Lévinas sugere uma ética universal, baseada não na
representação, mas antes na sensibilidade, afectividade, sob a forma de sujeição ao Outro,
trazendo assim uma fisicalidade (única) à questão da existência, do Ser e da transcendência.
Na sua radicalidade, o pensamento de Lévinas tem as suas falhas e inconsistências:
desde logo, é difícil conceber um altruísmo tão “extremo” como aquele que o autor postula
para o Eu na sua responsabilidade pelo Outro, ficando ainda uma sensação de
inconsequência na sua incapacidade, assumida, de construção de modelos pragmáticos.
Mas uma crítica que lhe é feita infundadamente, é a de que na sujeição ao Outro, o Eu,
perde a sua identidade e a sua liberdade; infundada porque peca em não ver que para além
do finito em que compreende o Eu, há um infinito que se abre em mim na minha sujeição
total ao Outro, de forma que o Eu nunca se isola em si mesmo (visto que o ego que serve
deixa de ser o seu e passa a ser o do Outro, que nunca cessa de o solicitar), sendo aí que
precisamente nasce a (nova) identidade do Eu. É, na verdade, a tradição moderna, com a
sua mesmidade do pensamento do ser, que “mata” a individualidade, pois reduz todos a um
denominador comum – o Outro nada mais é que um alter-ego.
Para terminar, interessa ainda ressalvar que, na impossibilidade de estabelecer
directrizes ou princípios morais, a exposição esta teoria de Lévinas é, em si, mais do que a
imposição de um sistema de pensamento, um verdadeiro acto social, no qual o filósofo faz
de nós testemunhas do sentido ético e social com que postula a existência – não se limita a
afirmar a Ética, ela é Ética!

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