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Facto e valor
Robert Nozick
Traduzido e adaptado por Vítor João Oliveira
Diferença de opiniões
O(X) = F
O(F) = V.
Ou talvez esta segunda fase do processo opere não apenas em F, mas em ambos
F e X, de tal modo que:
O(X,F) = V [I]
Nenhum destes casos esclarece a relação entre o dever e o ser. E discussões sobre
a “emergência” do dever em relação ao ser nada explicam sem que o modo como
essa emergência se dá seja especificado. Ou a explicação correcta reside em
qualquer outra analogia, ou o fosso entre o ser e o dever é muito sui generis, em
nada comparável a outros hiatos derivativos. (Será cada um dos outros
esclarecido pelo resto?) Ou poder-se-á considerar que não é necessária qualquer
explicação sobre por que é que esse hiato existe; pelo contrário, a conjectura de
que a derivação poderá ter lugar, que a ética pode não ser um universo autónomo,
é enganadora.
A discussão à volta do que é e o que deve ser ou facto e valor aparece quando se
tomam a sério as verdades éticas. Supondo que existem verdades éticas
objectivas, podemos averiguar a razão porque uma em particular encerra verdade
em si mesma. A explicação pode demonstrar que esta verdade ética específica é
um indício de uma verdade ética mais profunda ou mais geral, ou que (dados
vários pressupostos factuais) se enquadra dentro de tal verdade. E uma vez mais
podemos inquirir sobre a razão dessa verdade mais profunda e geral. Repetindo
o processo, parece que acabaremos por chegar a (uma ou a um número de)
verdades éticas fundamentais as quais, enquanto explicamos tudo o resto,
parecem elas próprias extinguir qualquer explicação ética. Mais nenhuma
verdade ética as explica. Deste modo ou são elas factos brutos que se sustentam
sem qualquer explicação, ou então deve existir alguma explicação sobre as
verdades éticas fundamentais em termos de verdades não-éticas. Se uma
explicação envolver derivação, dedutiva ou de outro tipo, sobre o que está a ser
explicado a partir do que motiva a explicação, então este último tipo de explicação
pressupõe que um dever possa derivar de um ser. É necessário ter em conta que
esta questão ou problema não depende da tentativa de justificar ou convencer
alguém sobre uma qualquer asserção ética. A tarefa não consiste em promover a
concordância sobre a verdade ética, mas sim de perceber por que encerra
verdade. No caso das verdades éticas fundamentais, a questão reside no facto de
tentarmos perceber qual o tipo de explicação que poderia existir. Se estas
verdades éticas fundamentais não puderem ser explicadas através de verdades
não-éticas – e não fazemos ideia sobre como tal explicação poderia resultar —
então o universo ético passaria a ser autónomo.
Este corpo autónomo de verdades éticas seria ordenado e estruturado
através da relação explicativa E, “é uma correcta explicação de”. As possibilidades
de estruturação deste universo ético autónomo (através de relação explicativa)
são aquelas, já anteriormente sugeridas e analisadas no capítulo 2, que incidem
sobre como o universo de todas as verdades poderia ser estruturado. A relação
explicativa assimétrica e transitiva “é uma correcta explicação de” vai permitir
que num universo autónomo, seja de todas as verdades seja apenas (um universo
autónomo) de verdades éticas, a seguinte estrutura seja possível: (a) um dos
vários elos explicativos volta infinitamente ao ponto de origem, sendo que cada
verdade será explicada por uma outra mais profunda; ou (b) um elo explicativo
termina com uma verdade que é um facto bruto — nada o explica; ou (c) um elo
explicativo termina com uma verdade fundamental que se pressupõe ela própria
através da teoria da quantificação; a verdade genérica é um indício de si própria.
Ao recordar as estruturas possíveis subjacentes à explicação de todas as
verdades, tal como foi referido no Capítulo 2, tornamo-nos mais receptivos às
circunstâncias específicas das verdades éticas. Podemos desprezar a ideia de
verdades éticas que não oferecem explicação acrescida — verdades brutas — até
avaliarmos se podemos ou não evitar a possibilidade estrutural no universo
de todas as verdades. Resultarão algumas leis gerais não-éticas que são factos
brutos, sem qualquer explicação acrescida? Então se essas ocorrerem, por que
não incluir também as verdades éticas?
Se a ética é um universo autónomo, não deveríamos ficar surpreendidos
quando encontramos uma verdade ética geral sem qualquer explicação. Mais
ainda, poderíamos esperar encontrar que fosse tão profunda que fosse um
pressuposto de si mesma e explicasse a si própria. Um dos objectivos da filosofia
é pôr a descoberto e delinear tais verdades fundamentais. É preciso lembrar que
o pressuposto não é prova ou condição suficiente de verdade. (“Todo o princípio
contendo sete palavras é verdadeiro” pressupõe-se, mas é falso). Contudo, se um
princípio explicativo suficientemente profundo for verdadeiro, então (pensamos)
também pode constituir a explicação de si mesmo através do pressuposto.
Um princípio fundamental da moralidade poderia ser pressuposto e
revelaria muitas outras verdades morais (sendo que os factos ocupariam uma
posição subsidiária enquanto premissas de menor importância). O princípio
fundamental da moralidade, se é que existe, seria um princípio fundamental que
se desdobraria em pressuposições revelando todas as outras verdades morais.[II]
Um princípio fundamental de moralidade apresentar-se-ia do seguinte
modo.
U: Seja qual for o princípio com que todos concordem unanimemente (ou com o qual
concordariam) tendo em conta condições C (o véu da ignorância, conhecimento
absoluto, ou o que quer que seja) ele deve ser seguido.
A Estruturação de Kant
Estas reflexões não pretendem ser um contributo para a teologia, mas sim sugerir
e assinalar uma possibilidade análoga sobre a nossa relação com os valores. Neste
caso parecem existir as seguintes possibilidades. (1) Não existem quaisquer
valores ou verdadeiros estados de dever (asserções que emitem juízos de valor) (e
não poderão existir?), esta posição foi designada por nihilismo. (2) Os valores
existem de facto; eles existem e possuem um carácter independente das nossas
escolhas e atitudes. Esta ficou conhecida por realismo ou platonismo. (3) Os
valores existem, mas a sua existência e carácter são ambos de certo modo
dependentes de nós, das nossas escolhas, atitudes, compromissos, estruturas, ou
o que for. Podemos chamar a esta perspectiva idealismo
filosófico ou criacionismo. Embora estas três possibilidades tenham sido
bastante discutidas em várias obras, existem outras duas que vale a pena
especificar. (4) Os valores existem independentemente de nós próprios, mas de
forma incipiente. Escolhemos ou determinamos (dentro de limites?) o seu
carácter preciso; esculpimo-los e delineamo-los. Chamaremos a esta
modo formacionismo ou romantismo. (5) Escolhemos ou determinamos que
existam valores, que eles existem, mas o seu carácter é independente de nós. A
este ponto de vista poderíamos chamar realizacionismo. (Variantes das posições
3 — 5 poderiam considerar que a existência ou o carácter dos valores deriva de
nós e das nossas actividades, mas não depende das nossas escolhas voluntárias,
antes resultam do que temos que fazer, de alguma necessidade das nossas
naturezas.)
A quinta perspectiva oferece uma reconciliação entre autonomia e padrão
externo (enquanto que a quarta não apresenta qualquer padrão externo ao qual
devêssemos aderir ou tentar alcançar). Sendo que a existência de valor está
dependente de nós, o valor e o mundo impregnado dele e iluminado com ele
torna-se-nos menos estranho; porque o conteúdo do valor é independente de nós,
possuímos um padrão externo para nos alinharmos em função dele e o seguirmos.
Será esta visão do valor — enquanto algo cuja existência é dependente de nós,
mas cujo carácter é independente — coerente? (Deixemos de lado o facto de os
pais muitas vezes verem esta descrição — existência dependente mas carácter
independente — como apropriada à condição dos seus filhos.) Uma corrente
dentro da filosofia da matemática defende que nós criamos ou construímos
entidades matemáticas, a progressão dos números naturais, ou seja o que for, mas
os factos relacionados com estas entidades criadas, a relação entre eles e assim
por diante, existem independentemente de nós. Criamos entidades matemáticas
e depois descobrimos as verdades que sobre elas se sustentam se forma
independente. De forma semelhante, Karl Popper defendeu que existe um
universo criado pelo homem (“o terceiro mundo”) constituído por entidades
abstractas, problemas intelectuais e fóruns de discussão actuais, a partir do qual
as verdades se sustentam autonomamente, independentes de nós. Os problemas
que resultam da tentativa de fornecer uma interpretação realista na área da
mecânica quântica não produziram uma arena activa de perspectivas sobre
acontecimentos ou estados cuja existência é dependente de nós (ou no que
respeita a comportamentos de observação) mas cujo carácter é independente de
nós. Durante o século XX apareceram outras áreas de conhecimento que deram
relevo à resposta a um determinado assunto: em psico-análise, o critério de
validação de uma teoria é a aceitação do analisado (irrevogável, subjectivo)
(enquadrar-se-á isto melhor na quarta possibilidade?); é comum dizer-se em
literatura que as reacções e leituras do leitor (ou do crítico) dão vida à obra,
mesmo se a obra for sobre o próprio processo de leitura; também se pensa que a
pintura moderna seja de igual modo reflexiva. A minha questão não é a de que o
mesmo tipo de abordagem deve ser considerada verdadeira em cada uma das
áreas, na matemática, na física, nas artes, ou até que de facto comporta verdade
em cada uma delas; todavia, o facto da última abordagem (realizacionismo) ter
sido proposta de forma séria em tantas áreas é razão para acreditar que, pelo
menos, é uma abordagem coerente, e por isso mesmo uma possível forma de
estruturar a teoria do valor.
O declínio da abordagem realista sobre o valor, que teve a sua base e apoio
institucional de maior importância ao nível da igreja, esteve em grande evidência
nas diagnoses do período moderno. A terceira, quarta e quintas possibilidades,
concebendo-se o romantismo em sentido abrangente, representam uma resposta
intelectual: manter a viabilidade de algum tipo de valores. Porém, estas posições
não se materializaram em instituições influentes de grande alcance. (Continuam
a existir realistas que desacreditam o que vêem como um afastamento da
verdade.) Uma segunda resposta ao declínio do realismo, apresentada por
aqueles que não compreendem como é que o vazio daí resultante poderia ser
preenchido pela nossa própria actividade (criativa), foi (tal como em Kafka,
Beckett, e os existencialistas) uma certa ansiedade, uma consciência de perda,
mas também a recusa de serem transportados de um estado de angústia para um
de contentamento (ilusório). Algumas vezes os que defendem esta posição fazem
da sua angústia autêntica uma virtude de modo a que isso constitua o derradeiro
valor a existir, contudo esta tentação de cairmos em aspectos do romantismo não
se oporá ao escrutínio. Uma terceira abordagem, geralmente descrita como um
efeito posterior ao declínio do realismo mais do que uma resposta a ele, defende
que não existem verdades válidas, apenas preferências pessoais, esta perspectiva
não considera que alguma coisa esteja em falta ou ausente, não vê razão para
angústias. É a que prevalece e domina entre o grupo de cientistas sociais; a sua
base cultural é o resultado das ciências naturais (desprovidas de valor) e as
capacidades de uma civilização tecnológica e industrial. A tecnologia é um meio
(instrumento) “neutro”. Embora teoricamente a ascensão do que Max Weber
designou por objectivo de racionalidade deixe lugar para que os valores possam
ser inseridos como fins em direcção aos quais se tem como objectivo definir os
meios, tais valores não têm objectivos práticos — desejos arbitrários são
suficientes. Ao contrário do gato chestshire em “Alice no País das Maravilhas” de
Lewis Carroll, que tem a capacidade de desaparecer deixando apenas o sorriso,
este desaparecimento de valores nem mesmo a sua ausência (notável) deixou
para trás. [VI]
Os proponentes desta última posição podem apenas seguir os seus “meros”
desejos; não podem acreditar que devem agir daquela maneira, ou que é melhor
agir de determinada maneira. De modo semelhante, acreditam ser verdade que
não existem valores objectivos, mas não (escolhem) acreditam no que é
verdadeiro porque devem ou porque é melhor — simplesmente o preferem, ou
fazem-no como uma forma de satisfazer as suas preferências. Algumas frases
feitas terão diferentes interpretações consoante o ponto de vista em que são
analisadas. Para o criador de valores, “faz o que gostas de fazer”, significa
encontrar satisfação pessoal na actividade valorável de exprimirmos a nossa
própria individualidade e também construir uma combinação singular de valores,
enquanto que para aquele que propõe esta última perspectiva isso significa que
não há razão nenhuma para não fazermos exactamente o que nos dá prazer, uma
vez que não existem valores alguns.
De que modo, então, pode descrever-se a relação entre facto e valor? Factos
específicos F não implicam valor ou estados de valor V. É necessária uma
premissa adicional, nomeadamente: a de que existe valor. Esta é a premissa
adicional mais fraca possível (com alguma qualidade moral) de valor. No entanto
serve o nosso objectivo, atendendo ao resto do aparato crítico deste capítulo,
quando pretendemos estabelecer o modo como um valor específico pode resultar
de factos específicos. Esta premissa simples é a demanda (quantificada de modo
existencial) de que haja algum valor verdadeiro ou estado de valor. (Se a premissa
de que existem alguns juízos de valor verdadeiros fosse valorável, então, pelo
menos, existiria um além dela.) Isto está a uma grande distância de fazer passar
valores específicos clandestinamente para a derivação.
Deveríamos esperar uma relação mais próxima do que esta entre facto e
valor? De acordo com a ideia de que o valor é uma unidade orgânica, os factos
podem ser valoráveis tornando presente e realizando a estrutura ou configuração
da unidade orgânica que é o valor; podem ser modelos do valor. Porém, a nossa
questão aqui é sobre a ligação entre, por exemplo, a ideia de que “o facto F tem
um grau de unidade orgânica d”e a ideia de que “F tem valor V”. Podemos concluir
que a unidade orgânica constitui valor apenas na suposição de que existe valor; e
esta suposição é suficiente. Se as condições necessárias ao valor intrínseco
especificam a dimensão do “grau de unidade orgânica” enquanto um candidato
singular à existência de valor, então ao acrescentarmos uma asserção adicional
de que existe (uma dimensão de) valor estamos a criar condições suficientes para
a presença de valor na unidade orgânica. De que modo esta premissa adicional, a
asserção de que existe valor, está relacionada com os factos? A nossa teoria
advoga que a pessoa imputa de modo reflexivo essa asserção aos factos. (Não seria
melhor que os factos imputassem a existência de valor a si mesmos, em vez de ser
a pessoa a fazê-lo? Todavia não é essa pessoa, e esse seu acto, parte dos factos?)
Atendendo à escolha da existência de valor, evidenciada no plano de fundo
da premissa que o valor existe, de que modo se relaciona o valor com o facto?
Serão, então, alguns factos, os que possuem unidade orgânica, idênticos ao(s)
valor(es)? Devo dizer: a relação reside na unidade orgânica — os valores estão
ligados de modo orgânico a (alguns) factos. (Que mais poderíamos esperar?) A
escolha da existência de valor comporta (alguns) factos na relação orgânica com
o valor, sendo que eles são unificados mas não identificados.
Quão impermeável poderá ser esta relação de unificação orgânica?
Poderíamos continuar a especular. A identidade é um modo específico de unidade
muito forte, e talvez a razão pela qual os factos não são idênticos ao valor (mesmo
dando forma à existência de valor) seja a de que estes factos, aqueles com os quais
lidamos, não são eles próprios suficientemente unificados de forma orgânica para
que possam ser considerados idênticos ao valor. Partamos do princípio de que F
é um facto, um facto valorável, com um grau de unidade orgânica d. Talvez a
(unidade orgânica da) relação deste facto F com o valor não possa ela própria
constituir um grau mais firme do que d. O grau de unidade orgânica do facto
impõe um limite ao modo como pode estabelecer uma relação estreita com o
valor. (Uma vez que coisas que têm valor de facto realizam e tornam presentes as
estruturas abstractas que são os valores, segue-se que estas relações não são as
mais estreitas possíveis.) O valor da relação de um facto específico com um valor
depende, então, da capacidade valorável desse facto. A relação exacta de factos
organicamente unificados (ou situações factuais) com o valor depende do quão
unificados são os factos. No limite, idêntico ao valor está tudo o que for unificado
num grau o mais elevado possível — supondo que a identidade é o factor mais
forte nessa relação, de modo a que a unidade orgânica pudesse assentar nela para
conseguir valor.
Terá havido algum problema na relação entre factos e valores porque os
nossos factos ainda não foram suficientemente unificados a nível orgânico, não
ocorreu uma unificação suficientemente forte a partir de uma diversidade
consideravelmente vasta? Caso seja verdade, não é surpreendente que alguns
autores (por exemplo, os teóricos do “ajustamento” moral), em vez de se
referirem a identidade, caíram na tentação de usar terminologia imprecisa sobre
unidade orgânica para descrever a relação entre facto e valor, com raiz no mundo
das artes ou da psicologia de gestalt.
Na nossa discussão anterior sobre o valor que o eu tem em si, insistimos que
o eu não intenta tão somente ter algo que é valorável (um corpo ou mente
valoráveis, ou seja o que for), mas deseja ele próprio ser valorável. E indagámos
se isto seria necessário, uma vez que mesmo quando a consciência de si mesmo é
ela própria valorável, não será ainda o valor algo que a consciência de si
mesmo possui — uma outra possessão? Parecia que mais nada satisfaria a
consciência de si mesmo do que o valor, ser idêntico ao valor, não apenas possui-
lo ou concretizá-lo.
Porém, as consciências de nós mesmos, finitas e limitadas, não são
suficientemente unificadas de modo orgânico para que possam ser idênticas ao
valor, podem apenas instanciar ou ter valor. No entanto, as perspectivas
teológicas que referem a maior unidade orgânica possível (Deus, o Ein Sof sem
limites, Satchitananda), vêem-na como sendo idêntica ao valor. Encontramo-nos
agora numa posição que nos permite perceber esta ideia. O seu grau de unidade
orgânica é tão grande (infinito — existem aqui normas de infinidade?) que a
relação com o valor é idêntica. É valor. Podemos entender também por que o
místico apresenta as sua experiência com esta grande unidade orgânica não
apenas como uma experiência valorável mas como uma experiência do (que é)
valor.
Mesmo assim, podemos indagar se o místico, mesmo que a sua experiência
seja uma experiência dealgo, de facto teve a experiência da grande unidade
orgânica possível. Talvez seja apenas uma unidade orgânica parcial, tão além do
que geralmente encontramos como parecendo um todo, porém ainda apenas uma
parte, competindo com outras partes iguais ou mesmo superiores. Talvez não
exista qualquer unidade orgânica perfeita, sendo que até mesmo num nível mais
alto (se tal existir) há um esforço para atingir uma ainda maior unidade orgânica,
para conter uma ainda maior diversidade, um valor ainda mais elevado. O que
sabemos nós de facto acerca disso? Teorias alternativas, que postulam níveis
abaixo ou acima de níveis reversíveis, são compatíveis com experiências e
revelações místicas.
Todavia, de acordo com a ideia da teoria do valor não parece ser importante
que exista uma unidade orgânica mais perfeita, ou que os místicos tenham
experiências com a existência de algo que, a um nível invisível, seja o modo como
a conhecem (mais do que ter a experiência do que é parcialmente uma expressão
a sua própria aspiração, ou da aspiração desse algo.) Sendo que, seja qual for o
caso, sabemos o que o valor é, e podemos transformarmo-nos com base nesse
conhecimento, mesmo quando nada ainda é idêntico ao valor.
Robert Nozick
Excerto retirado de Philosophical Explanations, de Robert Nozick (Oxford: Clarendon Press, 1981),
pp. 535-70.
Notas