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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DA PARAÍBA –

CAMPUS JOÃO PESSOA


DIRETORIA DE DESENVOLVIMENTO DE ENSINO
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL
UNIDADE ACADÊMICA IV
CURSO TÉCNICO EM INSTRUMENTO MUSICAL

FILIPE DE MEDEIROS SANTOS

OS PROCESSOS DE REELABORAÇÃO MUSICAL E TRANSFONAÇÃO


INSTRUMENTAL DE CANÇÕES REGIONAIS PARA VIOLÃO SOLO: UMA
ANÁLISE DE QUATRO OBRAS PRESENTES NO LIVRO “BAIÃO
ERUDITO” DE NONATO LUIZ.

JOÃO PESSOA – PB
2017

-1-
FILIPE DE MEDEIROS SANTOS

OS PROCESSOS DE REELABORAÇÃO MUSICAL E TRANSFONAÇÃO


INSTRUMENTAL DE CANÇÕES REGIONAIS PARA VIOLÃO SOLO: UMA ANÁLISE
DE QUATRO OBRAS PRESENTES NO LIVRO “BAIÃO ERUDITO” DE NONATO LUIZ.

Monografia apresentada ao Curso


Técnico em Instrumento Musical, do
Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia da Paraíba, como requisito
parcial para a conclusão do mesmo.

Orientador: Profº. Me. Vinícius de


Lucena Fernandes

JOÃO PESSOA – PB
2017

-2-
OS PROCESSOS DE REELABORAÇÃO MUSICAL E TRANSFONAÇÃO
INSTRUMENTAL DE CANÇÕES REGIONAIS PARA VIOLÃO SOLO: UMA
ANÁLISE DE QUATRO OBRAS PRESENTES NO LIVRO “BAIÃO
ERUDITO” DE NONATO LUIZ.

RESUMO

Trata-se de uma pesquisa cujo objetivo foi investigar quais os recursos composicionais,
métodos e procedimentos técnicos instrumentais foram utilizados por Nonato Luiz nas suas
reelaborações musicais do cancioneiro popular para violão solo. Fundamentei o trabalho em
conceitos como nacionalismo e regionalismo nas expressões de manifestação artística, construção
histórica do repertório violonístico, além definir termos como reelaboração musical, transfonação
instrumental, arranjo, adaptação e transcrição. Conclui que a adaptação de canções populares
regionais, possibilita, em acordo com os pressupostos adotados, uma performance expressiva do
repertório analisado ao violão solo.

Palavras-chave: Violão; Nonato Luiz; Música Regional; Adaptação; Arranjo; Reelaboração Musical.

ABSTRACT

It is a research whose objective was to investigate which compositional resources, methods


and instrumental technical procedures were used by Nonato Luiz in his musical re-works of the
popular songbook for solo guitar. I work on concepts such as nationalism and regionalism in
expressions of artistic expression, historical construction of the repertoire, and define terms such as
musical reelaboration, instrumental transfonation, arrangement, adaptation and transcription. It
concludes that the adaptation of regional popular songs, makes possible, according to the
assumptions adopted, an expressive performance of the repertoire analyzed to the solo guitar.

Keywords: Guitar; Nonato Luiz; Regional Music; Adaptation; Arrangement; Musical Re-
elaboration.

-3-
Dedicado à memória de minha maior
incentivadora e educadora, Dona Ana
Maria de Medeiros Santos

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Música Fogo Pagô, compassos 1 – 5……………………………………………………..36


Figura 2: Música Fogo Pagô, compassos 23 – 25…………………………………………………..37
Figura 3: Música Fogo Pagô, compassos 52 – 54…………………………………………………..37
Figura 4: Música Fogo Pagô, compassos 9 – 11……………………………………………………39
Figura 5: Música Fogo Pagô, compassos 25 – 27……………………………………….………….39
Figura 6 – Música Fogo Pagô, compassos 98 – 101……………………………………………......40
Figura 7 – Música Fogo Pagô, compassos 113 – 115……………………………………………....40
Figura 8 – Música Fogo Pagô, compassos 80 – 81…………………………………………………41
Figura 9 – Música Fogo Pagô, compassos 80 – 81 (Esboço com sugestões do autor)……………..41
Figura 10 – Música Fogo Pagô, compassos 83 – 84……………………………………………......41
Figura 11 – Música Fogo Pagô, compassos 83 – 84 (Esboço com sugestões do autor)……………42
Figura 12 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 27 – 31 (Melodia da Seção A –
original)..............................................................................................................................................44
Figura 13 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 1 – 5 (Melodia modificada para a
introdução)……………………………………………………………………………………….….44
Figura 14 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 54 – 57 (Melodia da seção B)...44
Figura 15 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 11 – 14 (Melodia da seção B
modificada para a introdução)………………………………………………………………………45
Figura 16 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 1 – 5 (Cifragem da primeira
exposição do tema A)……………………………………………………………………………….45
Figura 17 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 6 – 10 (Cifragem da reexposição
do tema A)…………………………………………………………………………………………..45
Figura 18 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 69 – 73…………...…………...47
Figura 19 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 111 – 112………….......……...48
Figura 20 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 119 – 120………...…………...48
Figura 21 – Música Assum Preto, seção A………………………………………………………….48
Figura 22 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 69 – 76..………...………...…..49
Figura 23 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 103 – 110.…………...………..49
Figura 24 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 185 – 188………...…………...51
Figura 25 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 229 – 232……………...……...51
Figura 26 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 142 e 143……………...……...52
Figura 27 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compasso 156……………………………..52
Figura 28 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 246 – 251………………...…...52
Figura 29 – Música Vem Morena, compassos 1 – 4………………………………………………...54
Figura 30 – Música Vem Morena, compassos 29 – 32……………………………………………...54
Figura 31 – PEREIRA, Marco, 2007, p.64………………………………………………………….55

-5-
Figura 32 – Música Vem Morena, compassos 81 – 84……………………………………………...55
Figura 33 – Música Vem Morena, compassos 49 – 52……………………………………………...55
Figura 34 – Música Vem Morena, compassos 175 e 176………….......……………………………56
Figura 35 – Música Vem Morena, compassos 182 – 183………….………………………………..57
Figura 36 – Música Vem Morena, compasso 185……………………….......……………….……..57
Figura 37 – Música Xandusinha, compassos 37 – 39 (Motivo da seção A).........……………....….59
Figura 38 – Música Xandusinha, compassos 1 – 4 (Início da subseção a da introdução)….……….59
Figura 39 – Música Xandusinha, compassos 12 e 13……………………………………………….59
Figura 40 – Música Xandusinha, compassos 26 – 28………………………………………………60
Figura 41 – Música Xandusinha, compassos 55 e 56……………………………………………….60
Figura 42 – Música Xandusinha, compassos 46 e 47……………………………………………….60
Figura 43 – Música Xandusinha, compassos 87 e 88……………..………………………………...61
Figura 44 – Música Xandusinha, compassos 92 e 93……………………………………………….61
Figura 45 – Música Xandusinha, compassos 131 – 134……………………………………………62
Figura 46 – Música Xandusinha, compassos 143 – 146……………………………………………62
Figura 47 – Música Xandusinha, compassos 163 – 166….………………………………………...62
Figura 48 – Música Xandusinha, compasso 178 – 186……………………………………………..63
Figura 49 – Música Xandusinha, compassos 181 – 183……………………………………………63
Figura 50 – Música Xandusinha, compassos 191 – 193……………………………………………64
Figura 51 – Música Xandusinha, compassos 204 – 205……………………………………………64

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO…………………………………………………………….....…………….........8

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA………………………………………………..………....….10

2.1. Considerações sobre os processos de reelaboração musical e transfonação


instrumental…………………………………………………..…….……….…..............…10
2.1.1. Buscando compreender a instância generalizante: “a obra original”................12
2.1.2. Reelaboração musical.......................................................................................15
2.1.3. Arranjo..............................................................................................................16
2.1.4. Transfonação instrumental................................................................................17
2.1.5. Transcrição........................................................................................................17
2.1.6. Adaptação........................................................................................................18
2.2. Breve resumo sobre a influência dos processos de reelaboração musical e transfonação
instrumental na construção do repertório violonístico…………….…....……………….….19
2.2.1. As práticas de reelaboração musical e transfonação instrumental e suas
relações com a constituição do repertório violonístico...............................................19
2.2.2. Breve abordagem histórica da construção do repertório violonístico..............21
2.2.3. Desenvolvimento histórico do repertório adaptado ao violão..........................22
2.3. A influência do nacionalismo e do regionalismo nas expressões de manifestação
artística……………............................................……………………………………………27
2.3.1. Nacionalismo....................................................................................................28
2.3.2. Regionalismo....................................................................................................31

3. NONATO LUIZ: VIDA E MÚSICA…………………………………...……………………...34

3.1. Análise da obra “Fogo Pagô” (Sivuca e Humberto Teixeira)


……......................................................................................………………………36
3.2. Análise da obra “Juazeiro, Assum Preto e Algodão” (Luiz Gonzaga e Humberto
Teixeira)……………………………………….....................................……………………43
3.2.1. Juazeiro.............................................................................................................43
3.2.2. Assum Preto......................................................................................................47
3.2.3. Algodão.............................................................................................................50
3.2.4. Outras Considerações........................................................................................52
3.3. Análise da obra “Vem Morena” (Luís Gonzaga e Zé Dantas)………………………....53
3.4. Análise da obra “Xandusinha” (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira)………...……….58

4. CONCLUSÃO…….……………………………………………………………………………..65

5. REFERÊNCIAS………………………………………………………………………………...67

-7-
1. INTRODUÇÃO

Meu contato inicial com a música deve-se ao incentivo familiar, logo, devido à influência de
minha mãe, estive imerso na tradição musical regional ao longo de toda a minha vida enquanto
estudante de música.
Porém, no meio acadêmico da área de música, observei uma ligação latente do ensino de
violão com o repertório de tradição europeia. Principalmente, no tocante ao instrumento citado,
ainda existe uma dicotomia em relação ao repertório erudito e popular, tanto no que diz respeito às
obras, como também na técnica.
A ideia deste trabalho surge a partir dessas observações e da notável necessidade que
compartilho com diversos outros violonistas, que, como eu, desejam o rompimento do paradigma
entre os repertórios popular e erudito, através da produção de arranjos, transcrição e adaptações,
além de uma literatura específica sobre esse campo de produção artística.
Este trabalho tem como problemática investigar quais os recursos composicionais e técnicas
instrumentais utilizados por Nonato Luiz1 nas suas reelaborações musicais de obras do gênero baião
encontradas em quatro reelaborações musicais do álbum “Baião Erudito”2.
O trabalho justifica-se, inicialmente, pela relevância do gênero musical abordado, ou seja, o
baião sob um ponto de vista sociocultural, aliado à escassez de literatura específica sobre os
processos de reelaboração musical de obras populares utilizando recursos violonísticos tradicionais.
Partimos da hipótese de que o violão possibilita recursos expressivos para a performance das
obras analisadas, e, por conseguinte, de outras obras pertencentes ao gênero Baião. Considerei,
também, que as reelaborações de Nonato Luiz podem conter recursos idiomáticos e expressivos de
para o violão sob a perspectiva de um violonista ligado diretamente à cultura regional.
O objetivo geral deste trabalho foi investigar os recursos composicionais e técnicos
instrumentais utilizados por Nonato Luiz nas suas reelaborações musicais de quatro obras do gênero
Baião encontradas no álbum “Baião Erudito”. Para o alcance do objetivo geral, foi necessário traçar
alguns objetivos específicos, dentre eles: a) Exposição e análise dos recursos composicionais e
técnicos instrumentais utilizados por Nonato Luiz; b) Demonstração sob quais aspectos os aportes
adaptativos podem enriquecer a performance das obras reelaboradas; c) Explicitação das
terminologias: original virtual, reelaboração musical e transfonação musical, como também arranjo,
transcrição e adaptação, definindo e conceituando todos os termos, a fim de minimizar a ocorrência
1 Violonista, arranjador e compositor, nascido em 1952 no município de Lavras da Mangabeira (Ceará). Possui uma
produção de arranjos significativa, principalmente no tocante à música regional.
2 LUIZ, Raimundo Nonato de Oliveira. Baião Erudito: 13 peças para o violão. Fortaleza: Letra e Música
Comunicação, 2007.

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de ambiguidades nas aplicações dos mesmos; d) Apresentação resumida sobre o desenvolvimento
histórico dos processos de reelaboração musical e transfonação instrumental ao violão e e) Sob a
perspectiva do repertório abordado, tratar os conceitos de nacionalismo e regionalismo.
Para uma melhor assimilação do leitor, a fundamentação teórica iniciará com as
conceituações que serviram de base na pesquisa, proporcionando um aporte no qual baseio o
desenvolvimento das análises. Nesta parte, relaciono dois dicionários gerais de língua portuguesa
com dicionários e literatura específica da área de música, para fundamentar o significado positivado
de cada conceito utilizado para fins da pesquisa.
Logo após, abordo, sob perspectiva histórica, os primórdios dos processos de transfonação
instrumental nas práticas realizadas por músicos e compositores de instrumentos da mesma família
organológica do violão (cordas dedilhadas), entre eles: alaúde, vihuela, guitarra barroca, mandolim
etc.
Seguindo, abordo os conceitos de nacionalismo e regionalismo usando como principal
referência o autor Eric Hobsbawn3. Neste capítulo destaco o “poder cultural e social” intrínseco aos
gêneros regionais dentro de seu nicho específico.
Terminada a fundamentação teórica, analiso quatro das reelaborações musicais de Nonato
Luiz, encontradas no álbum “Baião erudito”, expondo os métodos técnicos e composicionais
utilizados, além de explicitar suas contribuições na execução da obra.

3 Nascido em Alexandria, no dia 9 de junho de 1917, foi um grande historiador de inclinações marxistas, reconhecido
como um dos grandes pensadores do século XX. Entre sua produção intelectual podemos destacar a temática do
desenvolvimento das tradições no contexto do Estado-nação, sendo a própria nação e o nacionalismo temas muito
recorrentes em sua obra.

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2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1. CONSIDERAÇÕES SOBRE OS PROCESSOS DE REELABORAÇÃO MUSICAL E


TRANSFONAÇÃO INSTRUMENTAL.

Ao longo da história musical, os processos elaborativos e reelabolativos musicais agregaram


definições cujos conceitos seguiram com pouca clareza na literatura especializada 4. Tendo em vista
a confusão em relação às terminologias de práticas como transcrição, arranjo, adaptação,
orquestração, redução, versão, citação, paráfrase, entre outros, cria-se no meio musical referente ao
uso desses termos uma certa “indefinição conceitual e uma imprecisão no discurso, observáveis
tanto no cotidiano da prática musical quanto na literatura…” (ARAGÃO, 2000, p.1). Logo, faz-se
necessário para o desenvolvimento desta monografia, abordar e definir as práticas que serão as
bases conceituais usadas ao longo da pesquisa. São eles: transcrição, adaptação e arranjo.
Podemos observar a ambiguidade com a qual esses termos são usados, no próprio dia a dia
como músicos, porém, para exemplificar a imprecisão do significado das três terminologias com as
quais trabalharemos neste trabalho, citaremos dois dicionários de língua portuguesa, e um
dicionário especializado de música como exemplos da citada indefinição conceitual.
Na 4ª edição revista e ampliada do Mini Aurélio (2000), o quinto significado do verbete
Arranjo5 é “Versão diferente da original de obra ou fragmento de obra musical”. Logo, observei
nesta citação uma característica particular do arranjo, que é a alteração do texto musical, podendo
inclusive ser arranjado apenas uma parte da obra (elemento constituinte das possibilidades musicais
do arranjo). Porém, ainda assim, ocorre uma ambiguidade no tocante a definição de arranjo, que diz
respeito ao uso do termo “versão”6 que é uma prática reelaborativa independente, como sinônimo de
arranjo.
De acordo com o dicionário UNESP do português contemporâneo (2011), o primeiro
significado do verbete Arranjo é: “adaptação de uma composição musical…” (p.110), os demais
significados fazem relação com as palavras ordenação, organização, combinação, adorno, o que
expõe o caráter mais livre desta modalidade de reelaboração musical.

4 De acordo com Alan Borges Guerreiro (2012): “A prática de transcrições musicais e adaptações de composições
musicais para outros meios de expressão, quer sejam instrumentais ou vocais, camerísticos ou sinfônicos, remonta aos
primórdios da música instrumental.” (p.15)
5 Explicitamos apenas um dos significados do verbete “arranjo”, pois os demais conceitos não são abordados em
relação à área musical neste dicionário.
6 Por ser uma terminologia muito ampla, adotamos um dos significados de versão exposto por Diogo Maia Santos
(2015), sendo ele, “o resultado de pequenas variações de instrumentação ou de notação, em geral, realizadas pelos
próprios compositores ao revisarem uma obra já estabelecida” (p.51), incluindo-se também cada etapa composicional
como uma versão da obra.

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A confusão que permeia as terminologias de práticas reelaborativas, fica explícita na
definição do verbete arranjo exposto pelo dicionário UNESP, que elenca a “adaptação” como
sinônimo de “arranjo”, criando desta forma uma ambiguidade, embora tenhamos encontrado na
discriminação das práticas reelaborativas em Flávia Vieira Pereira (2011) que elas são
independentes e distintas.
Já o verbete “Transcrever” do dicionário UNESP do português contemporâneo (2011), tem o
seu segundo significado relacionado ao termo musical: “adaptar uma partitura para instrumento que
não faz parte da composição original” (p.1374), significado que se relaciona diretamente com o
emprego da palavra no meio musical, justamente por expor o sentido da fidelidade da partitura,
mudando-se apenas o meio.
Podemos reforçar o argumento da confusão conceitual em relação a terminologia
“Transcrever”, que pode ser identificada no uso do termo “adaptação” de forma conflitante dentro
da perspectiva do dicionário, como sinônimo da terminologia “Transcrever”, porém destaco que
essas duas práticas têm relação direta.
Observei, ainda, que os termos das três práticas são usados, geralmente, como sinônimos. No
“A dictionary of music and musicians”, uma importante enciclopédia de música, as terminologias
arranjo e adaptação são abordados no mesmo verbete, explicitado a segui:

“Arranjo ou adaptação é a contrapartida musical da tradução literária. Vozes ou


instrumentos são as línguas em que os pensamentos ou emoções de compositores
são dadas a conhecer ao mundo; e o objeto do arranjo é fazer o que foi escrito em
uma linguagem musical inteligível em outra”. (GROVE, 1879, p.89. Tradução do
autor)7

Logo, por meio da citação exemplificada as duas práticas distintas foram elencadas como
iguais, mesmo sendo um dicionário especializado em música, mostrando-nos a fragilidade na
conceituação dessas terminologias, até mesmo em literatura específica da área musical.
Diogo Maia Santos (2015, p.7), em sua dissertação distinguiu as práticas reelaborativas a
partir de dois critérios: “seus propósitos e o grau de transformação de seus materiais musicais”.
Esses critérios são de extrema relevância para uma definição coerente, sendo recorrentes nas
pesquisas de Flávia Vieira Pereira (2011) e Pedro J. A. F. Rodrigues (2011) quando abordam os
conceitos de reelaboração musical e transfonação instrumental, respectivamente. Porém, dentre os

7 Texto original: “ARRANGEMENT or ADAPTATION is the musical counterpart of literary translation. Voices or
instruments are as languages by which the thoughts or emotions of composers are made known to the world; and the
object of arrangement is to make that which was written in one musical language intelligible in another.”
(GROVE,1879, p.89)

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trabalhos pesquisados, esses critérios não são observados da forma adequada, sendo expostos e
conceituados, muitas vezes, de maneira inexata.

2.1.1. BUSCANDO COMPREENDER A INSTÂNCIA GENERALIZANTE: “A OBRA


ORIGINAL”.

Entretanto, antes de explanar esses processos distintos a saber: arranjo, adaptação e


transcrição, abordo a seguinte questão: “o que é a obra original?”. Pois, para pensar cada prática
citada anteriormente é necessário conceituar o que é a obra original, da mesma forma que para a
utilização de cada método desses temos a “necessidade de preexistência de uma obra autônoma”
(SANTOS, 2015, p.62). Por conseguinte, acredito que definir o que é a composição original é
requisito subsidiário para seguir adiante com a definição dos processos de arranjo, adaptação e
transcrição.
A importância do conceito de “obra” pode ser exposto na citação a seguir:

“No cotidiano das atividades musicais enquanto instrumentistas, arranjadores,


compositores, regentes ou apreciadores nos acostumamos a classificar as músicas
do repertório erudito indiscriminadamente, como obras.” (SANTOS, 2015, p.75)

De acordo com Santos os conceitos de originalidade e obra autônoma surgiram a partir do


século XVIII (p.25), isso influenciou diretamente a relação entre obra original e as reelaborações
musicais e transfonações instrumentais, pois até então os próprios compositores costumavam
reelaborar suas próprias obras de acordo com contexto repetindo temas e passagens.
Porém, a partir deste período as composições ganharam o status de intocáveis, logo, “o uso
repetido de temas e passagens em diferentes peças musicais passou a ser considerado um
procedimento preguiçoso e sem valor” (Santos, p.25).

“Desse modo, logo a música adquiriu uma espécie de intocabilidade, o que


significava concretamente que, uma vez composta, não era mais permitido que
outro compositor a alterasse”. (Goehr apud SANTOS, 2015, p.27)

Esse status deriva de vários aspectos relacionados ao contexto sociocultural e histórico,


porém, entre essas várias perspectivas, podemos citar, primeiramente a mudança da música “[…] de
seu lugar social do artesanato (ars mechanica) para o reino da Grande Arte em fins do século
XVIII.” (BOTA, 2008, p.13), e a mistificação da criação musical, que é decorrente do “ideário
romântico”.

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Santuza Cambraia Naves (1998, p.3), abordando a música brasileira modernista, expõe o
conceito de “estética monumental”, que seria uma concepção estética onde a obra de arte seria
tratada como uma totalidade8. A autora afirma ainda, que existem “afinidades entre o conceito de
cultura da vertente modernista hegemônica no ambiente musical erudito e o conceito de cultura do
pensamento romântico alemão. A confluência pode ser percebida na estética monumental, resultado
da ambição modernista brasileira de forjar totalidades (a da obra de arte, a da nação)…”.
Porém, esta ideal de obra musical, caracterizada pela intocabilidade, foi questionado em
meados do século XX, por compositores como Gustav Mahler, que prosseguiu utilizando a prática
de recriação de obras de outros compositores, e de suas próprias obras, apoiando-se na concepção
de que uma obra nunca está acabada, e que deveria ser alterada se passasse a soar mal, dissertando
sobre Mahler e sua postura diante das próprias obras João Victor Bota (2008) expõe:

“Com postura idêntica diante das próprias obras (que passaram por diversas
revisões ao longo de sua vida), declarava que depois da morte dele, se algo não
soasse bem, deveria ser mudado. Essa concepção de que a obra não está acabada
nunca e que pode, portanto, ser sempre aprimorada com novas orquestrações, é
reveladora de como o processo composicional desse compositor era feito por meio
de sucessivas transcrições de um mesmo material musical.” (BOTA, 2008, p.20)

Numa visão mais pragmática Francisco Monteiro (1999) apoia a sua caracterização do
conceito de obra musical em três elementos, sendo eles:

1. A composição (ato criador)


2. Audição (apresentação da obra em forma de música)
3. Testemunho (registro através de notação, gravação etc.)

Na música erudita a terceira base é de especial importância, pois a partitura é considerada de


certa forma uma materialização da ideia original do autor, tornando-se autônoma.

“No universo da música clássica, é relativamente simples visualizar o ‘original’ de


uma obra. Indubitavelmente, esse original estaria representado, nesse caso, pela
partitura” (ARAGÃO, 2000, p.5).

8 O termo “totalidade” foi utilizado neste trecho com o mesmo significado empregado por Santuza Cambraia Naves
(1998), que grosso modo foi o de uma adjetivação da obra musical como consumada em sua completude.

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Porém, no tocante à música popular surge outra problemática, muito explorada por Aragão
(2000), sobre o que seria o original dentro da música popular, que em geral não usa os recursos
notacionais.
Admitindo-se a notação como base inicial para o estabelecimento de um ideal de
originalidade finalizado como obra musical, a música popular por não usar em sua grande maioria
deste recurso, não teria como demarcar o original, senão por outros meios.
Alguns estilos populares como o jazz usam uma notação denominada leadsheet, que consiste
um registro em partitura, com algumas diferenças relacionadas às partituras de música erudita.

“o tipo de partitura mais comum na música popular, geralmente inclui apenas a


melodia e os acordes simplificados na forma de cifras e, algumas vezes, detalhes
rítmicos (‘convenções’) ou de instrumentação” (FABRIS et BORÉM apud
THOSMAZ et SCARDUELLI, 2013, p.8).

Porém, o interessante neste ponto é que mesmo admitindo-se a existência de um testemunho


em alguns gêneros de música popular, este não é considerado o original. Tomando um rumo
diferente ao anacronismo entre música erudita e popular, Aragão propõe a existência de uma
instância original enquanto virtual, materializada por meio de uma primeira gravação, interpretação
ou até mesmo transcrição etc.
Logo, pela necessidade o arranjo é levado a “condição de processo inerente a essa música”
(ARAGÃO, 2000, p.6), pois todos os interpretes dependeriam do arranjo/transcrição para
transformar em música a ideia musical original.
Resolvendo até certo ponto essa discussão, o autor propõe a existência de um “original
virtual”, de caráter prático, pragmático e potencializado, como destacado a seguir:

“Poderíamos supor, então, a existência de um ‘original prático’ na música popular,


que seria a primeira configuração de uma obra através de um primeiro arranjo, ou
esboço de arranjo, que permita a transformação da obra até então ‘virtual’ em obra
arranjada e passível de execução” (ARAGÃO, 2000, p.6).

Terminada a conceituação anterior, vamos agora destrinchar as terminologias: reelaboração


musical e transfonação instrumental, que são as categorias nas quais arranjos, transcrições e
adaptações estão inclusos. Conceitos necessários e de fundamental importância para fins desta
monografia.
Contudo gostaríamos de esclarecer que os conceitos abordados são diretamente relacionados,
por conseguinte, existem exceções as definições que serão expostas, além de que não existe uma

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conceituação “certa” ou uma “regra” no tocante a esses termos, logo, as definições a seguir são as
adotadas, sobre a caracterização desses termos João Victor Bota (2008) nos afirma:

“Entretanto, toda caracterização muito dura no que se refere às particularidades


tanto dos arranjos, quanto das transcrições são analiticamente perigosas, pois não
consideram todo um complexo de recriações musicais pertencentes à zona
fronteiriça de tais atitudes composicionais”. (2008, p.2)

2.1.2. Reelaboração musical

Começando pela conceituação do termo reelaboração musical, a tese de doutoramento de


Flávia Vieira Pereira (2011), relaciona o termo “reelaboração musical” com o termo “arranjo”. Para
a autora, o termo “arranjo” engloba uma série de procedimentos que podem fundamentar a
definição dos processos reelaborativos musicais, afirmando que esse o termo “reelaboração
musical” é “usado largamente para definir a prática de reformulação de uma composição musical”
(p.11). Constato, ainda, a utilização do termo “reformulação” englobando alterações que dizem
respeito à interpretação da obra, como também alterações acerca do idiomatismo da obra e sua
exequibilidade. Logo, para a autora, as práticas de reelaboração musical englobam atividades de
transcrição e adaptação, em que a composição musical original é mantida em sua grande parte
inalterada, ignorando desta forma o conceito de transfonação instrumental, como exposto a seguir:

"[…] as práticas de reelaboração musical selecionadas aqui como, transcrição,


orquestração, redução, arranjo adaptação e paráfrase" (PEREIRA, 2011, p.3).

Logo, concordamos com a conceituação de Pereira (2011), na qual as práticas de


reelaboração musical são caracterizadas por reformular a composição. Porém, admitimos como
“Reformulação” apenas as alterações feitas estritamente no texto musical, tendo as práticas de
arranjo, paráfrase, como seus principais representantes.

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2.1.3. O arranjo.

Este termo é usado de forma muito ampla atualmente, por fazer referência a um dos métodos
mais populares na atualidade, dentre todos o que já foram citados nesta monografia, sendo uma
terminologia empregada geralmente como generalização das demais categorias de reelaboração
musical e transfonação instrumental.
A principal distinção do arranjo, diz respeito ao seu aspecto livre, diferente das demais
práticas, que almejam a fidelidade a obra, o arranjo promove mudanças estruturais nas obras,
podendo-se desta forma chegar a alterar o texto musical de acordo com a imaginação e criatividade
do arranjador. Logo, o arranjo em si possui um propósito artístico, que vai além da simples mudança
de meio instrumental.
Além das características citadas acima o arranjo possui uma particularidade, que é a
discrepância surgida no seu uso pela música popular e pela música erudita, como ressaltado por
Flávia Vieira Pereira:

“Assim, parece que o termo arranjo possui dois procedimentos distintos, um para a
música erudita e outro para a música popular. Na música popular podemos
comentar que o arranjo é tão importante que parece que esse gênero se apropriou
deste termo, fazendo do arranjo a ‘própria composição’. E na música erudita, por
uma série de fatores já comentados anteriormente, essa prática tornou-se tão
popular no sec. XIX que acabou transformando-a numa prática desvalorizada e
discriminada. Ou seja, o arranjo ao mesmo tempo em que exerce um papel
fundamental na música popular, sofre preconceitos na música erudita se revestindo
de outros termos (orquestração, redução, etc)”. (PEREIRA, 2011, p.176)

Logo, uma mesma prática pode tornar-se pluralizada, assumindo características internas
diferentes dependendo-se do contexto. Neste ponto evidencia-se que as fronteiras entre as práticas de
reelaboração musical e transfonação instrumental são tênues, tornando-se aceitável que determinado
caso assuma características que não lhe são intrínsecas.
Encerrando este trecho sobre a prática do arranjo, ressalta-se, ainda, duas categorias expostas
por Paulo Aragão (2000). O autor observando o significado do verbete arranjo, escrito por Malcon
Boyd para o New Grove Dictionary (1980), destaca duas categorias de arranjo, o primeiro
denominado de arranjo prático, que seria meramente utilitário, logo, não possuiria fins artísticos, e
outro denominado arranjo criativo, onde haveria um envolvimento artístico do arranjador.

- 16 -
2.1.4. Transfonação Instrumental

Já o termo “Transfonação Instrumental”, encontrado na tese de doutoramento de Pedro


Rodrigues (2011), é definido pelo autor como exposto a seguir:

“Uma das práticas mais recorrentes na arte de Bach, funda-se na adequação de uma
obra cujo instrumento original difere ao nível de âmbito, timbre, idioma, técnica,
possibilidade textural do(s) instrumento(s) destinatário(s)”. (RODRIGUES, 2011,
p.50)

Logo, práticas das quais os instrumentos de realização sonora são alterados se configuram
como Transfonações Instrumentais. Faz-se necessário frisar que nessas práticas alguns trechos da
composição original podem ser alterados com o objetivo de adequá-la ao instrumento.

2.1.5. Transcrição.

A segunda prática a ser definida é a da transcrição, o princípio básico para identificar essa
prática é a mudança do instrumento original para outro qualquer, como afirma Flávia Vieira Pereira
(2011): “quando se faz uma transcrição, muda-se o meio, não se pode fazer uma transcrição para o
mesmo meio instrumental” (p.52).
Como citado acima, no dicionário UNESP do português contemporâneo (2011), o verbete
Transcrever está diretamente relacionado a alteração do instrumento: “adaptar uma partitura para
instrumento que não faz parte da composição original” (p.1374). Neste ponto, destaco que essa
definição vai de encontro a cultura musical erudita, pois, a música popular como foi dissertado
acima, dispõem de pouco registro de suas obras no que se refere a partitura, sendo que a prática
transcricional nesse meio é feita geralmente no ouvir a obra, pelo próprio instrumentista.
Já no que concerne a fidelidade ao texto musical, a transcrição ela busca manter-se
inalterada até certo ponto, respeitando um limite de lealdade ao pensamento composicional original,
porém, mudanças no texto podem ser necessárias, justamente pelas diferenças nas características do
meio instrumental original e transcrito, além, de que algumas alterações são necessárias para a
transcrição não tornar-se uma cópia, sobre isto Diogo Maia Santos (2015) nos afirma:

“[…] para que uma transcrição seja apresentada como uma peça distinta da obra
original, e não como uma mera cópia, se faz necessário que haja alteração em sua
constituição. Essa alteração, em geral, envolve mudança de meio ou

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instrumentação e, consequentemente, alteração de algumas notas da partitura”
(SANTOS, 2015, p.62).

No texto acima fica claro que o processo transcrição possui fins artísticos, afastando-se de
uma simples reescritura de determinada obra musical, onde ela é meramente copiada, pois, no ato
de transcrever a obra é translida, para apenas depois deste processo ser transfonada, referente a isto
podemos citar um comentário feito por João Victor Bota (2008), exposto a seguir:

“Na verdade, em música tratar-se-ia de um processo de recriação, no qual o


compositor se baseia em uma obra preexistente (e que lhe serve de ponto de
referência bastante forte ao qual se remete), deixando suas próprias marcas
estilísticas no material transcrito” (BOTA, 2008, p.1).

2.1.6. Adaptação.

Por último vamos abordar a prática da adaptação, que entre as categorias abordadas acima,
pode ser considerada a mais simples de conceituar, e para isto citaremos Diogo Maia Santos (2015).
No que se refere a alteração do texto musical da obra original, a prática de adaptação não
busca a fidelidade, porém, em geral ela ocorre devido as poucas alterações nos aspectos estruturais da
obra.
Já no que concerne a mudança de meio, uma adaptação não necessariamente precisa mudar de
instrumento, pois uma obra pode ser adaptada para o mesmo instrumento, com o objetivo de torná-la
mais fácil ou idiomática.
Essas características não definem essa prática, pois mesmo explicitando a adaptação sobre
essas duas visões, o termo permanece ambíguo. Logo, o que define uma adaptação é o princípio
teleológico, ou seja, sua finalidade, pois essa prática em si busca adequar uma obra em relação a
diversos aspectos, como afirma Diogo Maia Santos (2015): “Em geral, são sempre adequadas em
relação a algo específico como, por exemplo, o contexto, o instrumental, ou um público-alvo.” (p.49).

- 18 -
2.2. BREVE RESUMO SOBRE A INFLUÊNCIA DOS PROCESSOS DE REELABORAÇÃO
MUSICAL E TRANSFONAÇÃO INSTRUMENTAL9 NA CONSTRUÇÃO DO REPERTÓRIO
VIOLONÍSTICO.

Neste capítulo tratarei das categorias de reelaboração musical e transfonação instrumental, a


saber: transcrição, adaptação e arranjo, relacionando-as com a prática instrumental ao violão,
descrevendo a importância dessas práticas na constituição do repertório violonístico, além de
abordar o impacto dessas práticas para o violão de concerto.
O capítulo será dividido em três partes, as duas primeiras partes são subsidiárias para o
último subtópico, inicialmente comentaremos a importância da relação das práticas citadas
anteriormente para o violão e suas influências para o violão de concerto, e seguindo-se para o
segundo subtópico relataremos historicamente a construção do repertório originalmente escrito para
o violão. Por último, retrataremos historicamente como desenvolveu-se o uso das práticas de
transcrição, adaptação e arranjo de obras musicais de outros instrumentos para o violão, desde a
origem com os instrumentos da mesma família organológica do violão, até os dias atuais, tratando
de suas diversas problemáticas relacionadas a confiabilidade dessas reelaborações e transfonações
disponíveis.

2.2.1. As práticas de reelaboração musical e transfonação instrumental e suas relações com a


constituição do repertório violonístico.

Os processos de transcrição10 surgem a partir de diversas motivações, Luciano César Morais


(2007, p.38) cita três finalidades principais para os processos de transcrição, adaptação e arranjo: a)
Promover a circulação de obras de origens diversas; b) Fruição de um repertório que não é
facilmente ouvido por determinado público; c) Atender a necessidade de contato com o público;
Aliado a essas três motivações surge uma quarta, que é a necessidade de expandir o
repertório de determinado instrumento. A importância dessa motivação para o violão pode ser
ilustrada na citação a seguir: “O violão é um instrumento que apresenta uma situação peculiar:
grande parte do seu repertório tradicional é composto por transcrições.” (FUNCK, 2000, p.6).

9 Termo encontrado na Dissertação de Doutorado de violonista Pedro Rodrigues (2011, pág. 50), cujo significado
aponta para “uma das práticas mais recorrentes na arte de Bach, funda-se na adequação de uma obra cujo instrumento
original difere ao nível de âmbito, timbre, idioma, técnica, possibilidade textural do(s) instrumento(s) destinatário(s)”.
10 Termo usado especificamente neste trecho como sinônimo de arranjo e adaptação.

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Paulo Aragão (2000, p.3) destaca ainda o surgimento de uma modalidade de reelaboração
musical chamado “arranjo comercial”, que de acordo com o autor seriam “partituras elaboradas com
objetivo de fazer uma composição alcançar um público consumidor sempre maior”.
A modalidade de “arranjo comercial” relaciona-se com a possibilidade de um maior alcance
ao público, tendo em vista o contexto sociocultural ao qual a música foi produzida.
Abordando a importância de algumas dessas finalidades em uma perspectiva histórica,
Flávio T. Barbeitas afirma que a constituição do repertório no âmbito instrumental foi a principal
motivação para a produção de arranjos e adaptações no Renascimento – nesse período a música era
em sua grande maioria vocal. Ainda de acordo com o autor, no Romantismo, a principal finalidade
era a de divulgar obras, ressaltando, ainda, a perspectiva “mercadológica” do último período.
Atualmente vivemos um período em que a ampliação do repertório tornou-se a principal
motivação, isso se justifica a partir de uma herança do século XX. Sobre isto, Barbeitas expõe: “No
século XX, a prática transcritiva entrou em notório declínio, sobrevivendo, de forma um tanto
marginal, basicamente como procedimento para ampliação de repertório de alguns instrumentos.”
(BARBEITAS, 2000, p.1)
No tocante ao violão, a expansão do repertório pode ser considerada a principal motivação
para a produção das reelaborações musicais e transfonações instrumentais.
Aragão discorre sobre a importância do método de arranjo 11 para o repertório violonístico,
citando o exemplo do violonista Andrés Segóvia e sua contribuição para a expansão do repertório
do violão: “[…] arranjos elaborados com a intenção de expandir o repertório de instrumentos que,
por alguma razão, tenham um corpo de peças originais limitado; é esse o caso das inúmeras peças
adaptadas por Segóvia para o violão”. (ARAGÃO, 2000, p.3)
Laís Fujiyama e Joel Mendes (2013) em artigo revisando uma transcrição para duo de
violões da obra “Canhoto” do compositor brasileiro Radamés Gnatalli, destaca a importância da
temática dos processos reelaborativos musicais para a formação do repertório violonístico: “A
importância desse trabalho se dá pelo fato de que esse tema permeia o cenário violonístico, uma vez
que grande parte do repertório do instrumento se deve às transcrições”. (FUJIYAMA & MENDES,
2013, p.1).
A “dependência” dos processos de reelaboração musical para o desenvolvimento do
repertório violonístico, pode ser justificado em decorrência da pouca idade do violão. De acordo
com Morais (2007, p.34) o violão como nós conhecemos hoje, surgiu entre “[...] aproximadamente
1770 e 1780…”, inicialmente com cinco ordens12, ao qual foi adicionada uma sexta corda simples,
posteriormente, todas as ordens foram substituídas por cordas simples.

11 Termo utilizado pelo autor como sinônimo de transcrição e adaptação.

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O desenvolvimento do repertório de um determinado instrumento, pode está relacionado aos
seus aspectos físicos, ou seja, sua construção. A respeito das modificações ocorridas na construção
do violão, Luis Cesar Gontarski afirma: “O violão é um instrumento relativamente novo, se
levarmos em consideração suas últimas alterações estruturais, atribuídas a Antônio Torres Jurado,
por volta de 1856” (GONTARSKI, 2008, p.1).

2.2.2. Breve abordagem histórica da construção do repertório violonístico.

A produção do repertório para o violão com as características físicas como hoje


conhecemos, tem seu início no século XIX, logo, toda a obra musical original para o violão abrange
pouco mais de duzentos anos – período curto se comparado a outros instrumentos orquestrais e de
natureza semelhante. Marcelo Kayath (2009) afirma que nesta época denominada “[…] período de
ouro para a música, o violão não chamou a atenção de Mozart, Beethoven ou Schubert. Em vez
disso, tivemos Sor, Giuliani, Aguado, Carulli e outros menos votados.” (KAYATH, 2009, p.1).
Alguns dos principais compositores cuja obra é dedicada ao violão moderno e interpretada
até os dias atuais emergiram no século XIX. Numa perspectiva geográfica, “os dois grandes centros
europeus que abrigaram a produção violonística desse período (primeira fase do Romantismo)
foram Paris e Viena.” (MORAIS, 2007, p.34). O autor afirma ainda que grandes nomes como
Giuliani, Diabelli, Matiegka moraram em Viena, enquanto em Paris viveram os violonistas Carulli,
Legnani, Regondi, Sor, Carcassi etc.
A partir do século XX, mediado pela busca por composições originais, intérpretes de violão
passam a encomendar obras, tendo como principais representantes o violonista espanhol Andrés
Segóvia, e posteriormente os violonistas John Williams e Julian Bream, australiano e inglês,
respectivamente, esse movimento proporciona um aumento considerável no corpo de obras
compostas originalmente para o violão.
Segóvia merece destaque pois foi o primeiro a motivar compositores de sua geração a
contribuírem com a ampliação do repertório original para violão. Morais (2007) aponta que “a
preocupação com a substituição de transcrições por obras originais é uma meta de vida para
Segóvia…” (p.43). Entre os compositores que receberam encomendas de Segóvia podemos destacar
o mexicano Manuel Maria Ponce, o espanhol Federico Moreno-Torroba, chegando, com a sua
influência, a alcançar o compositor brasileiro Heitor Villa-Lobos.

12 Ordem é o termo utilizado para definir pares de cordas muitos próximas utilizadas em instrumentos de cordas
dedilhadas. Geralmente, essas cordas são afinadas na mesma altura e, em alguns casos, em oitavas distintas.

- 21 -
Stephen Goss (2016), entrevistando o violonista John Williams, destaca sua influência e a de
seu contemporâneo Julian Bream na formação do repertório original para violão, afirmando ainda
que o alcance referente a contribuição do Williams é maior “no que diz respeito a geografia e
estilo…”13.

2.2.3. Desenvolvimento histórico do repertório adaptado14 ao violão.

Em uma perspectiva histórica, a prática da transfonação instrumental já era recorrente entre


os músicos e compositores de instrumentos de cordas dedilhadas desde o século XVI, estendendo-se
até meados do século XVIII, sendo uma prática integrante do fazer musical dos instrumentistas
desse período.
Os instrumentos de cordas dedilhadas do século XVI, embora possuíssem o mesmo
princípio de produção sonora, detinham uma grande variação na quantidade e disposição das
cordas, podendo ser duplas ou simples, levando-se em conta a diversidade dos instrumentos e a
região – dependendo do país ou região existiam algumas diferenças 15. Mediante a observação do
repertório da época é comum identificarmos processos de transfonação entre instrumentos
semelhantes. Destacamos que para a realização musical, uma parte considerável da produção
transcricional desse período para instrumentos de cordas dedilhadas não alterava o texto musical.
A tablatura como meio de representação gráfica do repertório para instrumentos de cordas
dedilhadas do século XVI, também é algo a ser destacado. Esse sistema de notação musical consiste
resumidamente em “grades que reproduzem esquematicamente o braço do violão ou do alaúde, nos
manuais modernos como nas antigas tablaturas, carregam marcas que sugerem a posição dos dedos
para cada som a ser obtido, e são, portanto, índices imperativos.” (MAMMI, 1998, p.4).
Esse sistema de notação musical adotado no século XVI por músicos de instrumentos de
cordas dedilhadas, evidencia a prática da transfonação instrumental, pois a tablatura enquanto
representação gráfica da performance16 torna o registro de uma obra musical especifico ao

13 Stephen Goss faz referência à geografia e estilo alcançados por John Williams em seu esforço de encomendar obras
para violão de diversas partes do globo, destacando-se a interpretação de música latino-americanas e orientais escritas
originalmente para violão. Para Goss, Julian Bream focou na constituição de um repertório original para violão centrado
na música de tradição europeia.
14 Neste trecho em específico, por adaptado entende-se também o repertório arranjado e transcrito.
15 Rafael Garcia Borges (2007), em dissertação de mestrado descreve a disposição das cordas de alguns instrumentos
antigos. Como principal exemplo, podemos citar o caso do alaúde barroco, que possuía em geral treze ordens, porém os
de origem francesa dispunham de onze ordens (p.17).
16 A tablatura utiliza-se de signos icônicos, representando a execução do instrumentista, diferente da partitura (notação
convencional), que representa a obra por meio de signos simbólicos que ilustram a altura e ritmo da composição
musical.

- 22 -
instrumento originalmente escrito, fazendo-se necessário desta forma a prática da transcrição ou
adaptação musical, para a execução desta mesma peça por um músico de outro instrumento.
Nesse período a prática de transfonação musical usada em específico era a da intabulação,
que resume-se em “arranjos de obras polifônicas vocais para instrumento corda pulsada – alaúde e
vihuela – realizados nos séculos 16 e 17 [sic].” (WOLFF, 2003, p.2).
No período Barroco a prática da transcrição musical torna-se mais comum, chegando a ser
usada por compositores, baseados em sua própria obra, como por exemplo o caso do compositor
alemão Johann Sebastian Bach, logo recriar e citar material musical já compostos em novas obras
podia fazer parte do processo composicional, como exposto por João Victor Bota (2008):

“Bach recriou, também, diversas de suas próprias obras. Exemplo claro é a


Sinfonia da Cantata BWV 29 (escrita em 1720), baseada no prelúdio da Partita em
Mi Maior BWV 1006 (1731). Na Partita em Mi, Bach trabalhou, no prelúdio, uma
ágil melodia para violino — sem acompanhamento — que na Sinfonia da Cantata é
confiada a um solo de órgão acompanhado de orquestra, tudo numa nova
tonalidade, ré maior. A estrutura geral da peça, no entanto, foi mantida” (BOTA,
2008, p.10).

Além de uma maior difusão das práticas de reelaboração musical e transfonação


instrumental, no período Barroco a transcrição17 também era encarada em uma perspectiva
pedagógica, de acordo com João Victor Bota (2008) neste período “[…] a cópia manual de
partituras e a transcrição de músicas podiam servir como técnica de aprendizado em composição
musical. Os músicos de então entendiam que o ato de ler uma partitura e copiá-la servia como
processo de análise e memorização de determinada música.” (p.7).
Ao longo da história das transcrições, adaptações e arranjos para o violão, podemos
classificar a escolha do repertório a ser reelaborado ou transfonado em dois grandes grupos
principais18 levando-se em consideração o instrumento original da composição.
Os transcritores e arranjadores geralmente baseiam-se nesses instrumentos pela facilidade
resultante das características próprias dos instrumentos de origem, sendo eles: instrumentos
semelhantes (numa visão anatômica e ergonômica) e instrumentos de realização sonora semelhante.
As adaptações, transcrições e arranjos de instrumentos anatômica e ergonomicamente
semelhantes ao violão foram importantes de um ponto de vista histórico para o violão na construção
de uma cultura de performance do repertório transcrito, permanecendo-se viva até os dias atuais.

17 Termo usado neste trecho especifico como generalizante de todas as práticas citadas anteriormente.
18 Essa classificação não exclui as várias exceções.

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Os instrumentos da mesma família organológica do violão são semelhantes entre si,
exigindo-se pouco do transcritor no que diz respeito a execução da obra, que em alguns casos pode
chegar a se preocupa apenas com características idiomáticas e adaptativas da obra.
Ainda na perspectiva dos instrumentos anatômica e ergonomicamente semelhantes ao
violão, podemos destacar alguns recursos utilizados pelos transcritores para facilitar a execução,
citaremos dois desses recursos a seguir: o uso do capotraste por exemplo, usado para simular a
afinação de instrumentos antigos (vihuela, alaúde etc), e do recurso de corde avallée para facilitar o
preenchimento harmônico19.
Sobre os recursos utilizados por transcritores e arranjadores para facilitar a execução de
obras transcritas podemos destacar a visão de Rafael Garcia Borges, na qual surge um tipo de
transcrição "bilateral", como exposto a seguir:

“Isto nos mostra um tipo de adaptação (transcrição) bilateral, onde ao mesmo


tempo em que temos que conformar a música dentro dos limites de nosso
instrumento, também adaptamos o instrumento de maneira que ele se conforme da
melhor maneira possível às exigências idiomáticas e estilísticas da obra.”
(BORGES, 2007, p.31)

O segundo grande grupo é o de instrumentos com realização sonora semelhante ao violão,


esse grupo possui um número de representantes menor se comparado aos instrumentos do primeiro
grupo, por mais que alguns deles façam parte dos dois.
O cravo pode ser considerado um dos principais representantes deste grupo, assemelhando-
se ao violão por não possuir “sustain”, pela possibilidade de realização polifônica e por possuir uma
dinâmica limitada da mesma forma que o violão (faz-se necessário destacar que esses instrumentos
também possuem diferenças na realização sonora, como por exemplo: o violão possui uma riqueza
de timbres que o cravo não possui).
Atualmente vem sendo recorrente levar em consideração esse aspecto instrumental para a
escolha de repertório a ser transcrito, baseado em uma visão pragmática e funcionalista, pois,
adaptar peças desses instrumentos proporcionam facilidades específicas nos processos de
reelaboração e/ou transfonação das mesmas, assim como nas transcrições de obras originais para
instrumentos do primeiro grupo.
Os dois grandes grupos citados anteriormente foram classificados pelas facilidades
proporcionadas nos processos de reelaboração musical e transfonação

19 Sobre isto Borges destaca que: “[...] em tese, corde avallée deveria significar a mudança de afinação em uma única
corda, enquanto que, scordatura deveria se referir a duas ou mais cordas com afinação diferente.” (2007, p.22)

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instrumental (facilidades exploradas pelos transcritores e arranjadores), porém essa classificação
não é de forma alguma uma regra, podendo-se valer o transcritor e/ou arranjador do repertório de
qualquer meio instrumental.
Podemos destacar algumas importantes exceções a essa classificação, entre elas as
transcrições bastante fiéis de Fernando Sor (1778 – 1839) das Seis Árias da Ópera ‘A flauta Mágica’
Op.19 de Mozart, e do arranjo livre em forma de pout-porrit denominado Rossinianas Op.119,
composto por Mauro Guiliani (1781 – 1829) a partir de vários trechos de óperas do Gioachino
Antonio Rossini (1792 - 1868).
As duas obras citadas anteriormente são de importância histórica nos processos de
transcrição, adaptação e arranjo para o violão, feitas por compositores violonistas de extrema
relevância a partir de obras de grandes compositores feitas para ópera, isso nos mostra um pouco do
alcance das possibilidades dos processos transcricionais ao violão.
Entre os personagens mais importantes historicamente falando no processo de expansão do
repertório do instrumento e que possuem transcrições, adaptações e arranjos que continuam a ser
interpretadas atualmente podemos destacar: Miguel Llobet (1878 – 1938), Franscisco Tárrega (1852
– 1909), Andrés Segovia (1893 – 1987), entre outros…
Esses violonistas viveram por um período considerado o ressurgimento do violão (século
XX), em que a atenção dos violonistas se voltaram na busca por aumentar a projeção do violão de
concerto, pois o violão considerado erudito estava de certa forma apagado até então, Luciano Cesar
Morais (2007) parafraseando Gloeden (1996) diz o seguinte:

"Segundo GLOEDEN, houve um período no século vinte que se poderia chamar de


'ressurgimento' que se caracterizou, grosso modo, por um esforço dos maiores
violonistas espanhóis da época no sentido de levar o violão de volta às salas de
concerto."(MORAIS, 2007, p.48)

Nesse período foram produzidas transcrições, adaptação e arranjos executados até os dias
atuais, os esforços de violonistas como Tarrega, Segovia, Pujol e Llobet foram bem-sucedidos como
exposto por Diogo S. Carvalho:

“O trabalho de Tárrega e seus discípulos Emilio Pujol (1886 – 1980), Miguel


Llobet (1878 – 1938), somado ao de Andrés Segovia (1893 – 1987) resultou no
completo ressurgimento do violão no século XX. Os quatro violonistas tem
importantes trabalhos de transcrição” (CARVALHO, 2012, p.1).

Em uma perspectiva contemporânea os estudos sobre as adaptações, transcrições e arranjos


estão ganhando importância, afirmação facilmente comprovada tendo em vista a grande quantidade

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disponível de reelaborações musicais e transfonações instrumentais nos diversos níveis de execução
na internet e através de outros meios de comunicação. Toda essa informação disponível gera
demanda por averiguações e estudos a respeito dessa produção.
Gontarski abordando as transcrições na atualidade chama nossa atenção para uma
problemática muito recorrente, surgida pela “grande quantidade de transcrições disponíveis no
mercado e gratuitamente na internet e tendo em vista a escassez de literatura específica sobre o
assunto, o que dificulta muito a constatação da fidelidade das transcrições…” (2008, p.1).
Desta feita, surge uma procura por transcrições, adaptações e arranjos de procedência
confiável, advindas da insegurança em perder tempo praticando uma partitura mal elaborada e da
necessidade de resultado artísticos positivos que podem ser facilitados ou dificultados dependendo
do transcritor.

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2.3. A INFLUÊNCIA DO NACIONALISMO E DO REGIONALISMO NAS EXPRESSÕES DE
MANIFESTAÇÃO ARTÍSTICA

Neste ponto faz-se necessário abordarmos os conceitos de nacionalismo e regionalismo.


Esses termos são essenciais em decorrência do repertório abordado neste trabalho, que consiste de
músicas populares nordestinas, ou seja, consiste de uma produção musical ligada ao regionalismo e
relacionada diretamente aos ideais nacionalistas.
Para destrinchar o termo “nacionalismo”, e os conceitos derivados como “nação”, que são de
fundamental importância para a compreensão do nacionalismo, teremos como principais referências
Eric J. Hobsbawm (1990), Diogo R. Curto et al (2012), e a autora Santuza Cambraia Naves (1998),
que é diretamente influenciada pelo pensamento de Hobsbawm.
A importância do nacionalismo e do regionalismo para o repertório violonístico fica
explicita em determinados períodos históricos. Na Europa do inicio do século XX, grande parte do
repertório produzido para o violão era baseado na música folclórica, o que aponta para
características musicais nacionalistas e regionalistas exploradas ao violão, como expõe Thomaz e
Scarduelli:

“O repertório composto nesse período [século XX] apresenta grande influência da


música folclórica, especialmente a espanhola, mas filtrada pela lente nacionalista
de compositores como Federico Moreno Torroba, Joaquin Turina, Joaquin Rodrigo
e Manuel de Falla” (2013, p.03).

No Brasil do século XX, a emergente manifestação do nacionalismo e regionalismo, esteve


presente no meio artístico, muito difundida principalmente na música popular. A música popular
enquanto expressão artística adquiriu grande influência social, justificada por sua simplicidade, no
tocante a uma assimilação musical de determinados aspectos de uma obra, facilitada por seu
contexto sociocultural, a seguir trataremos desta temática mais a fundo.
Santuza Cambraia Naves (1998) expõem o conceito de “estética da simplicidade” 20, não se
preocupando em defini-lo dentro de seu trabalho, acredito que devido à redundância do termo para a
autora. Posteriormente, ela associa esta estética à música popular, colocando que no período
modernista brasileiro esta manifestação artística aliada ao cinema “traduziram e produziram

20 De acordo com Francisco Borba no dicionário UNESP do português contemporâneo (2011), simplicidade é a
“característica do que é simples; ausência de rebuscamento ou sofisticação” (p.1287). Logo, baseado na definição de
simplicidade exposta acima, e no trabalho da autora Santuza Cambraia Naves (1998), acredito que o conceito de
“estética da simplicidade” diz respeito a determinados aspectos de uma obra, que por possuir uma linguagem e
produção já assimiladas culturalmente, são de fácil assimilação em seu contexto.

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mudanças na visão de mundo de amplos setores da população, em proporções que nenhum
movimento da alta cultura conseguiu…” (p.1).
Podemos justificar a influência adquirida pela música popular citada no trecho anterior, a
partir da demanda artística do século XX, exposto em Naves (1998), que põe em citação que o
homem do século XX era dominado pelas artes produzidas por e para ele (p.1). Joaquim Alves de
Aguiar (1989), afirma ainda que “a música popular tornou-se largamente consumida porque ela
descarta a necessidade da iniciação” (p.30).
A partir das afirmações anteriores, percebemos que uma obra limitada ao ambiente formal, a
saber: as salas de concerto e afins, e incompreensível para a grande maioria da população que não
possui conhecimentos formais de música, não teria alcance social.
Podemos observar características nacionalistas na música popular brasileira, enquanto
manifestação artística no século XX, explícitas tanto no sentimento de pertencimento – obras
produzidas por e para um determinado grupo ou povo —, como também pela influência social desta
arte, explicitada por um trecho citado anteriormente, no qual a autora Santuza Cambraia Naves
(1998), expõe que a música popular traduzia e produzia “mudanças na visão de mundo de amplos
setores da população” (p.1).
No Brasil, o violão possui grande relação com o contexto da música popular, sendo desde
seu contato inicial com a cultura brasileira, um instrumento que permeia tanto a tradição erudita
como a tradição popular. Sobre isto, podemos citar Taborda apud Thomaz e Scarduelli (2013): “[…]
o violão no Brasil tem, desde o início de sua história, uma marcante característica híbrida entre as
tradições do erudito e do popular” (p.4).
Podemos ainda, destacar a “identidade nacional” do “violão brasileiro”21, que por mais que
seja um instrumento de origem europeia, teve grande difusão no Brasil, recebendo um tratamento
singular, desde a criação de um repertório específico a adaptação de técnicas particulares de
execução e afins, como exposto no trecho a seguir:

“Ao longo do século XX o violão se estabeleceu como um dos símbolos da


nacionalidade brasileira, depois de ser sinônimo de vadiagem, boemia e
marginalidade.” (Thomaz e Scarduelli, 2013, p.5)

21 Por “violão brasileiro” adotamos a definição de Fernando Llanos (2015), exposta no trecho a seguir: “Sob o nome
de violão brasileiro entende-se o corpus das técnicas instrumentais de origem europeia e as técnicas instrumentais
desenvolvidas através dos instrumentistas brasileiros (soluções empíricas)” (p.3). Porém, além de entendermos o
conjunto das técnicas instrumentais europeias e brasileira, também consideramos o repertório composto por
compositores brasileiros.

- 28 -
Destaco ainda, que além da relação do violão com o repertório popular brasileiro, ele
permeou o cenário erudito, possuindo representação nas salas de concerto, através de compositores
nacionalistas que compunham para o instrumento. Sobre isto, podemos destacar o trecho a seguir:

“Assim, no início da formação do repertório erudito nacional, temos


principalmente obras de compositores ligados ao nacionalismo: a renovação da
linguagem do repertório do instrumento – em direção à estética da vanguarda
europeia do Pós-guerra – só se deu na década de 1970, com as obras de Edino
Krieger (1928), Marlos Nobre (1939), Jorge Antunes (1942) e Almeida Prado
(1943).” (Pereira; Gloeden, 2012, p.21)

2.3.1. Nacionalismo

Termos como “nação”, “nacionalismo” e “nacionalidade”22, são de grande importância


atualmente, principalmente quando se busca compreender nossa sociedade atual. No tocante a esta
monografia, acreditamos que a conceituação desses termos é essencial, pois a partir deles podemos
esclarecer manifestações artísticas como o câmbio entre a música erudita e popular.
Para ilustrar o quão essencial são esses termos Hobsbawm (1990), faz a seguinte alegoria:

“Suponha-se que um dia, após uma guerra nuclear, um historiador intergaláctico


pouse em um planeta então morto para inquirir sobre as causas da pequena e
remota catástrofe registrada pelos sensores de sua galáxia. Ele, ou ela – poupo-me
de especular sobre o problema da reprodução fisiológica extraterrestre —, consulta
as bibliotecas e arquivos que foram preservados porque a tecnologia desenvolvida
do armamento nuclear foi dirigida mais para destruir pessoas do que a propriedade.
Após alguns estudos, nosso observador conclui que os últimos dois séculos da
história humana no planeta Terra são incompreensíveis sem o entendimento do
termo ‘nação’ e do vocabulário que dele deriva. O termo parece expressar algo
importante nos assuntos humanos.” (p.11)

Além de sua importância científica, estes termos estão intrinsecamente ligados a população,
gerando um sentimento específico, a partir do ideal de “nação”, e de sua relação com ela. Definindo
“nação” na perspectiva afetiva, Curto el al (2012) faz as seguintes considerações, expostas a seguir:

“[…] promotora de sentimentos, expressão de uma afetividade, de uma memória


sedimentada e até de uma devoção, a ponto de se ter podido querer morrer pela
pátria, como sucedeu durante a Primeira Guerra Mundial…” (p.2)

Terminada a exposição da importância do termo nação, e em decorrência seus derivados,


fica a pergunta: o que significa “nação” e “nacionalismo”?

22 Para fins desta monografia, nos limitaremos a abordar apenas os termos “nação” e “nacionalismo”, pois acreditamos
que termos como “nacionalidade” e os demais que podem surgir são derivados e não necessitam de atenção especial
nesta monografia.

- 29 -
Porém, antes de chegarmos a conceituação em si, gostaríamos de frisar que as definições
que serão expostas posteriormente foram adotadas de acordo com os fins deste trabalho, analisadas
e interpretadas a partir do nosso prisma, logo, não temos a ambição de considerar nossa perspectiva
particular como uma “verdade absoluta”, pois não existe uma única conceituação para estes termos.
Como afirma Curto et al (2012), o nacionalismo “responde a dinâmicas particulares, em
períodos e regiões diferentes, podendo por isso mesmo ser considerado contingente e relativo”
(p.2), logo, a conceituação posterior diz respeito apenas ao referencial teórico adotado de acordo
com os objetivos deste trabalho, existindo uma grande variedade de outras definições que, fugiriam
ao escopo desta monografia.
A partir da leitura de Hobsbawm (1990) e Diogo R. Curto et al (2012), pude notar quatro
aspectos nos quais é justificada a criação de uma “nação” e em decorrência o “nacionalismo”:

1. Sentimento nacional coletivo;


2. Etnia, tradição e línguas comuns;
3. Território/origem comum;
4. Fins econômico-mercantis.

Como hipótese inicial do trabalho de Hobsbawm (1990), o autor considera como “nação”
como “qualquer corpo de pessoas suficientemente grande cujos membros consideram-se como
membros de uma ‘nação’” (p.18). Logo, dois pontos podem ser destacados. Primeiramente um
corpo de pessoas suficientemente grande como condição para existência, e posteriormente o
sentimento nacional coletivo como motivação inicial.
Continuando, Hobsbawm (1990) afirma ainda que a “nação” pertence “exclusivamente a um
período particular e historicamente recente” (p.19), excluindo desta forma qualquer argumento de
que a “nação” é uma instância imutável, natural e inerente à organização política, além de destacar
que ela torna-se “uma entidade social apenas quando relacionada a uma certa forma de Estado
territorial moderno” (p.19), continuando até este momento numa perspectiva abstrata.
Por “nacionalismo”, Hobsbawm (1990) adota uma definição baseada no filósofo e
antropólogo social Gellner, que põe o “nacionalismo” como um princípio que torna congruente e
sustenta a unidade política e nacional. Além disto, ele acrescenta a partir de observações pessoais,
que o nacionalismo possui implicações superiores, acima de todas as outras obrigações públicas, a
partir daí ele distingue “o nacionalismo moderno de outras formas, menos exigentes, de
identificação grupal ou nacional…” (p.19).

- 30 -
Este significado difere-se do exposto por Aurélio Buarque de Holanda Ferreira encontrado
no MiniAurélio (2000), um dicionário não especializado, que define o nacionalismo como
simplesmente uma “preferência marcante por tudo que é próprio da nação” (p.479), e
posteriormente elenca como sinônimo o termo “patriotismo”. Essa definição é muito vaga e
simplista, colocando como nacionalismo uma preferência particular. Isso se configura para
Hobsbawm como uma identificação nacional, mas não pode de forma alguma almejar ganhar o
status de nacionalismo. Além disto, o dicionário falha em pôr o termo “patriotismo” como
sinônimo, criando-se uma visão reducionista do “nacionalismo”, pois patriotismo faz menção à
pátria, ou seja, nação onde se nasce, porém o nacionalismo pode aplicar-se a nação onde
determinado individuo habita, mesmo não nascendo nela.

2.3.2. Regionalismo

O nacionalismo é um termo necessário para a definição de regionalismo dentro da


perspectiva de Hobsbawm (1990). De acordo com o autor, inspirado pelas análises do historiador
tcheco e cientista político Miroslav Hroch, a consciência nacional “[…] se desenvolve
desigualmente entre os grupos e regiões sociais de um país…” (p.21), criando desta forma uma
diversidade regional das características e sentimentos nacionalistas. Logo, considerarei este
fenômeno como a gênese do regionalismo.
O regionalismo pode ser definido como uma expressão de uma inter-relação entre espaço,
sociedade e cultura. O pesquisador Benno Werlen (2000), põe que o regionalismo “como a
geografia humana tradicional espacialmente centrada, pode ser entendido como uma tentativa de
glorificar as formas de vida tradicionais pré-modernas sob condições da modernidade tardia” (p.17).
Logo, fica exposto o enraizamento do regionalismo em expressões tradicionais.
Porém, o autor ressalta a importância de não confundir-se os termos “regionalismo” e
“tradição”, pois a tradição enquanto expressão sociocultural é um dos elementos constituintes do
regionalismo. De acordo com Werlen (2000, p.14), as características do tradicionalismo são:

1. Tradições mesclam passado, presente e futuro


2. Parentesco organiza e estabiliza as relações sociais no tempo
3. Nascimento, idade e sexo determinam posições sociais
4. Situações face-a-face dominam a comunicação
5. Pequena quantidade de comunicação inter-regional
6. A aldeia local constitui o contexto da vida familiar

- 31 -
Podemos destacar, ainda, a grande importância da tradição como elemento constitutivo do
regionalismo, pois tem a função de reguladora da sociedade, promovendo estabilidade social, ao
direcionar subjetivamente formas de comportamento e de relacionamento entre os cidadãos,
estabelecendo desta forma limites para as decisões individuais. Isso nos mostra a posição que a
tradição, e por conseguinte o regionalismo, ocupa na vida das pessoas, colocando-se como um
quadro de referência, orientando e legitimando ações e decisões cotidianas dos envolvidos.
O regionalismo de igual modo com o nacionalismo, porém em proporções diferentes,
promove diferenças entre seus adeptos em relação às pessoas pertencentes à outra cultura. Logo, o
regionalismo está diretamente relacionado com o conceito de identidade, pois gera nas pessoas
envolvidas um sentimento de pertencimento, fazendo com que seus adeptos incorporem
determinadas características próprias da cultura. Sobre esta assertiva, podemos destacar o texto a
seguir:

“Falando em ‘identidade’, é preciso lembrar que ‘identidade’ só pode ser um tópico


ou se realizar quando a ‘diferença’ é possível. Obviamente é assim porque
‘identidade’ se refere sempre a duas entidades, o que em princípio pode ser
diferente mas não é. Consequentemente, ‘identidade’ só se realiza pelo aumento da
diferença. Se vemos deste modo, então podemos entender porque na modernidade
tardia, em que problemas de identidade têm se tornado tão evidentes, pode se
estruturar uma política da diferença, tal como o nacionalismo e o regionalismo”
(WERLEN, 2000, p.18).

A música nesta perspectiva identitária, é de grande relevância, pois, enquanto manifestação


artística, ela “reflete o pensamento das particularidades de um determinado grupo regional”
(JESUS; SILVA, 2016, p.2). Participando desta forma no processo de construção de uma identidade
coletiva, a música toma para si características do contexto sociocultural na qual está inserida, para
desta forma criar sua própria identidade artística ligada ao seu contexto.

“A identidade regional não é dada pelo espaço onde se nasce, ela emerge de um
trabalho de subjetivação, ela é a constituição de uma dada subjetividade através
das relações sociais e da incorporação consciente ou não das narrativas que
definem este ser regional” (GOMES, 2015, p.18).

A partir do trecho citado acima, podemos observar que a identidade regional tem sua gênese
na subjetividade dos indivíduos pertencentes a determinado grupo, e além disto, engloba todas as
manifestações particulares expressas decorrentes da subjetividade desses indivíduos. Logo, a arte
por ser a manifestação desta subjetividade, pode ser considerada intrínseca ao processo de
identificação regional.

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Podemos afirma ainda, que uma única cultura nacional ou regional pode possuir mais de
uma identidade. Fernando Llanos (2015) admite a existência de duas culturas musicais brasileiras, a
saber: uma popular e outra erudita. Abordando o violão em específico, o autor põe que o
instrumento possui uma “identidade transitiva” 23 em relação a cultural brasileira, entendendo desta
forma o violão “como espaço para a negociação de identidades culturais cujo estilo poético de
performance oscila entre os referentes atribuídos à música popular e à música acadêmica de tradição
europeia, ou erudita” (p.1).

23 Sobre a importância da identidade transitiva do violão brasileiro, Fernando Llanos (2015, p.6) afirma que: “Numa
primeira aproximação, a partir da noção de identidade transitiva, é possível pensar no violão brasileiro como uma
manifestação expressiva que reflete ou representa o país e, numa análise dessa ‘história da recepção’, descrever como se
torna uma chave para o processo de identidade cultural toda vez que oferece, tão intensamente, um sentido dos outros e
de um mesmo, do subjetivo no coletivo.”

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3. NONATO LUIZ – VIDA E MÚSICA

Raimundo Nonato de Oliveira Luiz, violonista, arranjador e compositor, nasceu em 3 de


agosto de 1952, no município cearense de Lavras da Mangabeira. Iniciou sua vida na música muito
cedo, já aos três anos de idade tocando cavaquinho, passado os anos começou a estudar violino no
Conservatório de Fortaleza, chegando a tornar-se segundo violinista da Orquestra Sinfônica de
Fortaleza.
Posteriormente, escolheu definitivamente o violão como instrumento, estudou com grandes
nomes do violão brasileiro, entre eles Turíbio Santos, aos 21 anos de idade no período em que
estudou no Rio de Janeiro na Escola de Música Villa-Lobos. A partir deste período como estudante
iniciou-se uma longa e frutífera carreira como instrumentista e compositor. Entre o 1º prêmio do
concurso para violonistas da TV Tupi em São Paulo ainda no ano de 1975, até o recebimento da
medalha da abolição pelo governador do Estado do Ceará Lúcio Alcântara em 2006, ele conquistou
inúmeras premiações e honrarias durante sua carreira.
Com cerca de 28 discos gravados, além de diversas participações em produção artística de
outros artistas. Entre esses artistas, Nonato Luiz teve a oportunidade de trabalhar com diversos
nomes de peso do cenário musical brasileiro e internacional, dentre os quais podemos citar: Chico
Buarque, Nara Leão, Luiz Gonzaga, Belchior, Fagner, Pedro Soler, Paco de Lucia, Rafael Alberti,
Mercedes Rosa, Túlio Mourão, Dominguinhos etc., celebrando ao longo de sua carreira a música
brasileira e explorando-a a fundo.
Sua obra inclui composições e regravações que contempla uma parte da variedade musical
brasileira, desde o choro, baião, canções, serenatas etc. Nonato também divulgou a música brasileira
internacionalmente, durante seus concertos em diversos países, entre eles os Estados Unidos, África
do Sul, e parte dos países europeus nas suas diversas turnês pela Europa.
Além de sua carreira de sucesso como compositor e instrumentista, Nonato possui uma rica
produção como arranjador, por mais que não seja reconhecido por suas reelaborações musicais de
igual forma que por suas obras originais e performances. Dentre seus arranjos que perpassam
diversos gêneros musicais brasileiros, incluindo uma coleção específica de músicas do “The
Beatles”, abordaremos alguns de seus arranjos encontrados no disco “Baião erudito” lançado em
2004 (tendo os arranjos sido reunidos e divulgados como um volume de partituras pela editora
“Letra e Música” em 2007) que consiste inteiramente de baiões compostos por Luiz Gonzaga e
Humberto Teixeira, incluindo uma composição autoral.

- 34 -
Acreditamos que esses arranjos são de importância social e cultural, justificada a partir dos
conceitos expostos anteriormente, a saber: nacionalismo, regionalismo e identidade, contribuindo
desta forma para uma maior difusão da música popular regional nas salas de concertos e espaços de
apreciação musical onde geralmente essa música é segregada, por não incluir-se na música
denominada “erudita”.
Além de contribuições no sentido de divulgar a música regional, seus arranjos são
importantíssimos para a ampliação do repertório violonístico 24, pois no tocante ao baião existem
poucos compositores brasileiros que compõem obras originais especificamente para o violão solo.
Destacamos ainda, um ônus próprio da fomentação de uma prática musical, que seria a
execução de suas obras de importância histórica. Logo, a necessidade das reelaborações musicais
virem aliadas às novas composições.
As músicas abordadas serão: Fogo Pagô, Vem Morena, Xandusinha e o pot-pourri das
músicas Juazeiro, Assum Preto e Algodão. A partir desses arranjos tentaremos encontrar os recursos
reelaborativos usados por Nonato, para tornar essas obras mais idiomáticas, interessantes e
executáveis ao violão solo.

24 A importância de uma produção instrumental do gênero musical “Baião”, seja de obras original ou de reelaborações,
é justificado de um ponto de vista histórico e social, pois consiste em um dos gêneros musicais brasileiros mais
importantes, tanto no que concerne a uma construção cultural, como no seu alcance social, sendo o gênero musical mais
importante para o povo nordestino. Logo, há uma identificação cultural muito grande de vários violonistas por esse
gênero, que devido a falta de repertório específico para violão e de arranjos que contemplem o baião são impedidos de
tocar esse gênero musical, aliado a isto existe certo preconceito no meio acadêmico com relação a gêneros musicais
populares, logo os arranjos do Nonato de baiões, exercem grande importância para violonistas que querem tocar baião,
além de quebrar parte do preconceito criado entre as esferas erudita e popular, por adaptar essas obras à técnica
violonística erudita.

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3.1. ANÁLISE DA OBRA “FOGO PAGÔ” (SIVUCA E HUMBERTO TEIXEIRA).

O título da obra “Fogo Pagô” faz referência a ave popularmente conhecida como fogo-
apagou (Columbina Squammata), que recebe esta alcunha em decorrência do seu canto que,
traduzido literalmente, possui grande semelhança com a frase fogo apagou. A ave fogo-apagou está
presente em várias regiões da América Latina, incluindo o Nordeste brasileiro, onde é
especialmente ligada às manifestações da cultura popular.
Analisando aspectos estruturais da obra “Fogo Pagô” como sua forma, métrica, tonalidade e
modulações/tonulações, observamos que o conceito de estética da simplicidade abordado na
fundamentação teórica deste trabalho pode aplicar-se a esta obra, pois alguns aspectos estruturais
dela encontram-se dentro de convenções assimiladas culturalmente na região em que foi concebida
(Nordeste brasileiro). Logo, para um público específico, não incide dificuldades de assimilação.
Essas convenções foram estabelecidas e difundidas historicamente por compositores ligados ao
gênero baião, propagando normas que perduram culturalmente e são aplicadas dentro do próprio
gênero.
A obra possui métrica em 2/4, ostinato rítmico no acompanhamento 25 (com exceção dos
trechos onde o baixo possui uma voz independente) e tonalidade em Ré maior. Abaixo, observamos
um extrato proveniente do livro Baião Erudito (2007), editado pela Letra & Música, com a
coordenação do próprio Nonato Luiz26.

Figura 1 – Música Fogo Pagô, compassos 1 – 5.

Na peça ocorre apenas uma tonulação para Sol maior (tom vizinho direto de Ré) na seção B
e B’, ambas as tonalidades possibilitam a execução das cordas soltas, facilitando a manutenção das
vozes. Na seção A’ encontramos, ainda, uma modulação para Ré menor.
A mudança da tonalidade original (Ré maior) para Sol maior ocorre naturalmente, pois o
acorde de tônica da tonalidade de Ré maior é dominante da tonalidade de Sol maior. Logo, este

25 O ostinato rítmico presente no baião possui variações, porém nesta peça encontramo-lo em sua forma mais simples,
ou seja, uma colcheia pontuada seguida de uma semicolcheia ligada a uma semínima.
26 As figuras que seguem durante a totalidade das análises, quando não informadas, provêm do material ora citado.

- 36 -
acorde assume a função de pivô na tonulação, a partir de uma cadência perfeita para Sol maior,
apenas usando o recurso de alteração da função harmônica (Tônica –Dominante), ocorrendo desta
forma uma modulação diatônica27.

Figura 2 – Música Fogo Pagô, compassos 23 – 25.

Já a modulação para Ré menor, ocorre por meio da alteração do modo do acorde de Ré


maior para menor, o que tem por consequência a alteração para tonalidade homônima.

Figura 3 – Música Fogo Pagô, compassos 52 – 54.

Grande parte dos aspectos estruturais da obra “Fogo Pagô” que foram descritos acima, são
comuns dentro do gênero musical baião, o que tem por consequência uma relação identitária da
música com pessoas que estão inseridas socialmente e culturalmente em uma região onde ocorre a
produção, divulgação e apreciação de músicas deste gênero ou ligadas a ele. Essa relação identitária
possui seu cerne no âmbito cultural, pois até a expansão dos meios midiáticos 28, a música acessível
a determinada população era a música produzida por ela própria, logo toda uma herança ideológica
e artística esta fundada sobre os gêneros populares.
Desta forma, a obra “Fogo Pagô” por pertencer a manifestações artísticas de cultura popular
local, possui um poder social intrínseco justificado no conceito de estética da simplicidade,
traduzindo através do material artístico a visão de mundo de determinadas esferas da população,
além de agir como protagonista produzindo mudanças nessas visões de mundo.
27 De acordo com Koellreutter: “Na modulação diatônica muda-se a função de um acorde do tom original para uma do
tom a ser alcançado” (1986, p.37).
28 Sobre a relação dos meios midiáticos e o acesso das classes populares à música, Joaquim Alves de Aguiar (1989)
influenciado pelo autor Humberto Eco, destaca a “íntima ligação entre o rádio e o gosto popular, lembrando que no
século XIX começam os processos de popularização e massificação da música” (p.52).

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Entrando no universo do arranjo propriamente dito, e não apenas da obra, faz-se necessário
abordar um procedimento recorrente na prática do arranjo e que foi explorado por Nonato Luiz, o
processo de mudança da tonalidade original da obra. Como exposto na fundamentação teórica deste
trabalho, a música popular não possui uma instância original, diferente da música erudita, no qual a
partitura seria o representante desta instância. Logo, admitiremos uma das gravações desta obra
como o original virtual29.
Na gravação de Os brasileiros (original virtual) da música “Fogo Pagô”, a tonalidade
principal está em Láb maior, porém, no arranjo de Nonato Luiz foi transposta para Ré maior, pois, a
tonalidade de Láb maior possui apenas uma nota dentro de sua escala que pode ser executada no
violão com corda solta, a saber a nota sol3 30 da 3ª corda solta. A escrita para o violão nesta
tonalidade, dificultaria sua execução pelo fato de o acompanhamento, em grande parte da obra,
permanecer no acorde da fundamental31. Logo, a manutenção do baixo nesta altura, incorre na
permanência de um dos dedos numa posição fixa, impossibilitando mudanças de posição, além de
algumas escalas e movimentos.
Aliado a mudança de tonalidade para D maior, Nonato Luiz emprega o recurso do corde
avallé, ou seja, a mudança da afinação padrão de uma das cordas do violão para uma altura
diferente, com o objetivo de tornar a obra mais executável e idiomática. No caso da obra “Fogo
Pagô” especificamente, o uso do corde avallé possibilitou que todas as cordas soltas fizessem parte
da escala da tonalidade principal.
A partir da observação da forma do arranjo32, a saber: |Introdução – A – B – C – Introdução’
– A’ – B’ – C’ – A’’ – CODA|, destacamos que o arranjador explorou as possibilidades do violão nas
exposições e reexposições das seções da música, incluindo variações técnicas e interpretativas.
Dentro das possibilidades do violão, ele perpassou os recursos polifônicos, preenchimentos
harmônicos, acordes de quinta e deslocação tessitural pontual, todos esses recursos serão descritos a
seguir.
O violão possibilita a execução simultânea de mais de uma nota, logo ao contrário de um
instrumento de sopro como a flauta que tem sua realização limitada a textura monofônica, o violão

29 No desenvolvimento da análise desta obra, usamos como referencial a gravação do grupo Os brasileiros, composto
pelo Trio Irakitan, Sivuca, Abel Ferreira, Guio de Moraes, Dimas Sedícias e Pernambuco, encontrado no álbum Os
Brasileiros Novamente!, gravado em 1959. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=qfhij5R6bp4>.
30 Ao longo do texto exporemos a altura da nota como expressa no signo da partitura, porém o leitor deve levar em
consideração que essa classificação não corresponde a sua realização sonora, pois o violão enquanto instrumento
transpositor projeta a nota uma oitava abaixo. Desta forma, a nota escrita como sol3 soaria na realidade um sol2.
31 A introdução e a seção A seguem a seguinte harmonia: I – II – I – I. Logo, ¾ da harmonia nessas seções permanece
na fundamental, além disto, podemos destacar que toda a CODA se desenvolve no acorde de tônica, e ele está presente
na seção B.
32 O arranjo não segue a forma da música gravada originalmente, exposta a seguir: |Introdução – A – B – C – A’ – B’ –
C’ – CODA|.

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possui um leque de possibilidades texturais que enquadra tanto a execução da melodia com o
acompanhamento (textura homofônica), como também a execução de duas ou mais linhas
melódicas simultaneamente (polifônica).
O arranjo em sua maior parte encontra-se na textura homofônica, ou seja, uma linha
melódica acompanhada, mantendo desta forma a textura habitual do gênero baião. O violão
proporciona este tipo de execução devido à possibilidade do instrumento de tocar mais de uma nota
simultaneamente, e devido também, a sua tessitura, que alcança as notas mais agudas da melodia
como também os baixos da harmonia, que são explorados mais a fundo pelo arranjador quando ele
muda a afinação da corda mais grave. Para ilustrar o uso desta textura irei expor a seguir um trecho
da seção A:

Figura 4 – Música Fogo Pagô, compassos 9 – 11.

Na seção B, encontramos o uso do recurso da intervalação pelo arranjador, ou seja, visando


duplicar o início da linha melódica, Nonato colocou um intervalo de terça descendente no baixo,
criando um espectro polifônico interessante, que contrasta com a introdução e a seção A da obra,
tornando a execução desta obra ao violão mais interessante e idiomática.

Figura 5 – Música Fogo Pagô, compassos 25 – 27.

Na seção A’’ (incluída pelo Nonato Luiz em seu arranjo), o arranjador com o objetivo de não
tornar a seção cansativa e repetitiva, ele expõe a linha melódica no segundo período da seção
(comp. 98 – 105), com acordes de quinta em paralelismo harmônico, chamando a atenção
novamente para os recursos possibilitados pelo violão, criando desta forma um caráter diferenciado
na melodia, que evoca desta forma a Coda que segue-se.

- 39 -
Figura 6 – Música Fogo Pagô, compassos 98 – 101.

Na Coda, o arranjador emprega o recurso da deslocação tessitural pontual, ou seja, a


deslocação de um motivo para vozes diferentes, que nesse caso seria o motivo melódico da
introdução na voz da região mais grave, em conjunto com a nota lá4, em ritmo de colcheia e na voz
aguda, assumindo o papel de nota pedal. Esses recursos em conjunto dão à Coda uma impressão
contrapontística. A seguir um trecho da seção referida:

Figura 7 – Música Fogo Pagô, compassos 113 – 115.

Este arranjo se enquadra na modalidade de arranjo criativo, logo, em alguns trechos o


arranjador toma a liberdade de acrescentar notas ao texto musical, introduzir seções, e alterar
aspectos estruturais da obra, destaco três modificações principais do arranjador na obra.
Primeiramente ele acrescentou uma introdução variada, como segunda modificação ele reduziu a
seção A’ e colocou-a em modo menor, e como última modificação ele reexpõem a seção A variando-
a para A’’.
Por fim, sugestionarei duas pequenas mudanças no texto musical em dois trechos do arranjo.
Estas mudanças dizem respeito a condução melódica e ao preenchimento harmônico. Na seção C’
existem quatro frases dispostas como antecedente e consequente em dois períodos, sendo todas
anacrústicas e na mesma tonalidade. No original virtual escolhido para os fins desta pesquisa, a
anacruse da primeira frase constitui-se de uma nota com a duração de semínima, enquanto que nas
demais anacruses as notas estão em ritmo de colcheia, no arranjo o Nonato Luiz optou pelos valores
da anacruse das frases dois e três como semínimas. Acredito que essas duas anacruses com o ritmo

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em semínima diminuem a fluência melódica do arranjado, escolhi como resolução a diminuição
desses valores, recriando-se a anacruse encontrada em nosso original virtual, aliado ao uso do
preenchimento harmônico, evitando-se desta forma uma pausa não intencional.
Na segunda frase, no qual a anacruse está na harmonia de Mi maior, escolhi a nota si3 na
segunda corda solta, para preencher o espaço entre o sol#3 da harmonia e a nota mi4 da primeira
corda solta, que seria a nota anacrústica, formando desta forma uma sequência fluente, contínua e
clara. A seguir, o trecho original e o esboço da partitura com a aplicação da sugestão do autor:

Figura 8 – Música Fogo Pagô, compassos 80 – 81.

Figura 9 – Música Fogo Pagô, compassos 80 – 81 (Esboço com sugestões do autor).

Já na terceira frase, encontramos uma situação diferente, pois a anacruse se encontra na


harmonia de Lá maior, e a distância entre a nota dó#4 do preenchimento harmônico para o mi4 da
melodia é de uma terça, logo não há uma nota do acorde entre elas, por conseguinte optamos pelo
si3, que caracteriza-se como a nona do acorde, e seria a mesma nota si3 na segunda corda solta
encontrada na primeira modificação sugerida.

Figura 10 – Música Fogo Pagô, compassos 83 – 84.

- 41 -
Figura 11 – Música Fogo Pagô, compassos 83 – 84 (Esboço com sugestões do autor).

- 42 -
3.2. ANÁLISE DA OBRA “JUAZEIRO, ASSUM PRETO E ALGODÃO” (LUIZ GONZAGA E
HUMBERTO TEIXEIRA).

Inicialmente, destaco a primeira particularidade desse arranjo33, ele não se baseia em apenas
uma obra original, mas é composta de três obras originais em forma de pot-pourri34, logo, neste
caso específico, analisamos cada obra constituinte em particular. Em seguida abordarei os recursos
usados pelo autor para fazer a conexão entre as peças, de forma a tornar o pot-pourri mais
idiomático, fluido e musical.

3.2.1 Juazeiro

O título da primeira obra do pot-pourri, Juazeiro, faz referência à árvore típica do semiárido
brasileiro, essa referência fica clara no verso “No teu tronco tem dois nomes…”. Pois, sem a
presença deste verso a possibilidade de interpretar o título como menção à cidade de Juazeiro-BA
poderia gerar certa ambiguidade.
Como original virtual, optamos pela primeira gravação da obra, encontrada no álbum
“Gonzagão e Gonzaguinha, A vida do viajante”, gravado em 1981 pela EMI – Odeon/RCA.
Para esta primeira obra, Nonato Luiz propõe um andamento lento e livre, que aliado aos
aspectos melódicos e harmônicos criam um caráter improvisado. Aludindo a um primeiro
movimento de uma suíte, caracterizando de certa forma como um prelúdio.
A obra original possui apenas duas seções que são alternadas entre si, e intercaladas com
Interlúdios, Nonato Luiz na sua reelaboração muda a forma, criando uma introdução. Logo, a obra
fica disposta da seguinte maneira: |Introdução35 – A – B – A’ - B’|.
Para desenvolver a introdução, Nonato permuta os dois temas referentes às duas seções da
música, alterando o modo da tonalidade de Mi maior para Mi menor, logo, algumas notas da
melodia são rebaixadas em um semitom, pela ausência de três sustenidos na tonalidade destino. Ele
explora também, o recurso da transgradação pontual, ou seja, o arranjador substitui algumas notas
por outras próximas que, geralmente, pertencem à harmonia.

33 Considerei que o autor envolveu-se de forma significativa com esta obra, chegando a alterar o texto musical e
aspectos estruturais dela, logo, denominei de arranjo a peça analisada.
34 Pout-pourri ou medley como é popularmente conhecido, é um termo utilizado desde o século XVIII para designar a
prática de executar duas ou mais músicas em conjunto, uma após a outra, muito comum na música, principalmente no
meio popular.
35 Pelo fato da introdução ser composta pelo tema das seções A e B, ela pode ser interpretada como as próprias seções
independentes, apresentando-se da seguinte maneira: |A – B – A’ - B’ - A’’ - B’’|.

- 43 -
No tema constituído de elementos da seção A, Nonato Luiz faz três modificações no texto
musical. Primeiramente, ele aumenta um tom acima as notas ré4 encontradas no segundo tempo dos
dois primeiros compassos, excluindo desta forma a sétima menor, um intervalo muito característico
na harmonia da música nordestina, preenchendo com a oitava. Em segundo lugar ele altera as notas
da escala descendente do terceiro compasso, retrogradando a ordem dos intervalos, para encerrar
com a última modificação, que seria a modificação da última nota, de sol#3 pelo si3.

Figura 12 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 27 – 31 (Melodia da Seção A – original).

Figura 13 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 1 – 5 (Melodia modificada para a introdução).

No que concerne ao segundo tema, às modificações melódicas decorrentes da transgradação


pontual, foram acompanhadas por uma evidente rearmonização. Em decorrência desta
rearmonização, há uma discrepância maior nos intervalos, porém, algumas notas modificadas
mantêm sua função dentro se suas respectivas harmonias.
O tema possui duas alterações no texto, a primeira encontra-se no primeiro compasso
inteiro, onde todas as três notas são substituídas, porém a primeira nota é mantida enquanto
fundamental do acorde nos dois momentos. Já a segunda modificação está na nota final dentro do
quarto compasso, onde a nota sol#4 é substituída pelo si4, sua terça, logo ambas as notas
encontram-se na terça de seus acordes.

Figura 14 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 54 – 57 (Melodia da seção B).

- 44 -
Figura 15 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 11 – 14 (Melodia da seção B modificada para a
introdução).

Um dos pontos interessantes a serem destacados é o fato de que na primeira exposição os


temas no original virtual são finalizados em notas homônimas, a saber: sol#3. Já o Nonato Luiz em
seu arranjo, optou por substituir essas notas por uma única, o si3, o que gerou um caráter de unidade
na seção introdutória, aliada as finalizações nas reexposições, que no original como no arranjo se dá
na nota mi3.
Nos exemplos expostos acima, onde são apresentadas as melodias, ficam claros os
procedimentos usados pelo Nonato Luiz para criar a introdução da obra. A partir do arranjo
completo, podemos observar como ele desenvolve esses temas, explorando-os com diversas
variações harmônicas. Isso fica claro no primeiro período, onde o tema inicial é exposto duas vezes
seguidas com harmonizações diferentes, expostas a seguir:

Figura 16 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 1 – 5 (Cifragem da primeira exposição do tema A).

Figura 17 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 6 – 10 (Cifragem da reexposição do tema A).

A movimentação do baixo está intrinsecamente ligada a progressão harmônica, e que a


sequência harmônica apresentada na figura 16, pode ser considerada como um desenvolvimento do

- 45 -
acorde Mi menor. As sequências harmônicas expostas anteriormente podem ser consideradas
diferenciadas para o gênero baião, e demonstram um esforço do arranjador em explorar diversas
possibilidades composicionais dentro do gênero.
Porém, mesmo possuindo certo grau de complexidade, diversos aspectos do baião são
mantidos, como por exemplo, o centro tonal e a métrica. Devido à permanência de algumas
características do baião na obra, o caráter do gênero é mantido.
No decorrer da análise percebemos que as seções seguintes da obra, são semelhantes à
introdução, com variações na apresentação da melodia e acompanhamento, decorrentes de diversos
procedimentos adotados pelo arranjador. Formulei, então, uma tabela que expõe os procedimentos
adotados por Nonato Luiz ao longo da obra.

Tabela 1: Apresentação do tema nas seções de Juazeiro.


SEÇÕES FORMA DE APRESENTAÇÃO DO TEMA
A Convencional¹/ Paralelismo harmônico²
B Paralelismo harmônico
A’ Golpes de polegar³/ Pizzicato
B’ Convencional
1 Adotamos por convencional, a execução homofônica, apresentando o tema na região aguda do violão, com o acompanhamento da harmonia na
região grave aliada ao preenchimento harmônico na região intermediária.
2 O paralelismo é um processo simétrico de “formas”, ou seja, a relação intervalar entre as notas do acorde permanecem, modificando apenas a
posição do acorde em relação ao braço do instrumento. Neste caso, o paralelismo ocorreu a partir de acordes dispostos em posição de terça, onde a
melodia foi posta na nota mais aguda, ou seja, a terça do acorde.
3 Os golpes com o polegar devem ser executados com a lateral dos dedos, golpeando as cordas próximo ao cavalete. Neste trecho, como também na
parte em pizzicato, o autor optou por expor a melodia nos baixos em textura monofônica.

- 46 -
3.2.2. Assum Preto

O título da música Assum Preto faz referência à ave graúna (Gnorimopsar chopi),
popularmente conhecida por Assum Preto em regiões do Nordeste. Abordar a temática da fauna e
flora é típico de músicas regionais, e no caso da música tradicional nordestina é comum empregar
nos títulos nomes de aves, como por exemplo, Fogo Pagô, composta por Sivuca e Humberto
Teixeira e, Sabiá do próprio Luiz Gonzaga.
Para fazer as comparações da versão original com o arranjo, escolhemos a gravação do
próprio Luiz Gonzaga como original virtual 36. A obra possui uma estrutura composta por uma
introdução, duas pequenas seções e um interlúdio.
No arranjo, Nonato Luiz faz duas modificações na obra original para adequá-lo à forma Pot-
pourri. Primeiramente, ele optou por retirar a introdução, pois esta peça encontra-se no centro do
Pot-pourri, e diminuindo o número de repetições para não torná-la extensa. Ou seja, a forma do
arranjo no Pot-pourri fica reduzida da seguinte maneira: |A – B – Interlúdio – A’ - B’ - CODA|.
Nesta peça o arranjador mudou diversas harmonias, porém manteve a tonalidade em mi menor
durante toda a obra.
A seção inicial A possui oito compassos onde encontramos um período constituído por um
tema e sua repetição variada. A seção B permanece com um período, porém o tema se desenvolve
em oito compassos, totalizando 16 compassos nessa seção. O interlúdio possui doze compassos,
constituindo-se de um tema de quatro compassos que é repetido com o final variado, encerrando-se
com uma escala descendente nos últimos dois compassos.
Analisando a peça podemos reparar que dentre os recursos proporcionados pelo violão,
destacamos a polifonia, como no trecho a seguir no qual o autor cria uma voz intermediária
descendente e cromática como contracanto:

Figura 18 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 69 – 73.

36 Gravado pela primeira vez no álbum “Quadrilhas e Marchinhas Vol.2” - 1979 – RCA. A gravação abordada para fins
de análise, encontra-se disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=yal1QKfMhX8>. Acesso em: 08/12/2016.

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O arranjador utiliza o recurso da intervalação, ou seja, adição de intervalos harmônicos à
melodia, em dois trechos da seção B’, inicialmente com a melodia na voz superior e logo após na
voz inferior:

Figura 19 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 111 – 112.

Figura 20 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 119 – 120.

Nonato Luiz explorou diversas harmonias preenchimentos harmônicos possíveis, um dos


exemplos pode ser encontrado na seção A, onde na gravação original a harmonia permanece no
acorde de Mi menor durante toda a melodia com exceção do último compasso, no qual, vai para Lá
menor, em contraposição com o tratamento harmônico utilizada pelo Nonato, com a utilização de
melodias intermediárias e progressões harmônicas diferenciadas e variações, como exposto a seguir:

Figura 21 – Música Assum Preto, seção A.


Fonte: Transcrição do autor.

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Figura 22 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 69 – 76 (Cifragem do autor).

Figura 23 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 103 – 110 (Cifragem do autor).

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3.2.3. Algodão

A última obra que compõem o pot-pourri analisado chama-se Algodão, composta por Luiz
Gonzaga. Ela possui algumas diferenças com relação às peças anteriores, pois as obras antecedentes
foram arranjadas, logo o autor reelaborou o texto musical, usando sua criatividade. No caso da peça
Algodão observei a predominância do texto original com adaptações técnicas para torná-la
idiomática, com uma única mudança no final da obra, que seria a Coda diferenciada.
No original virtual escolhido37 a estrutura é: |Introdução (a-b) – A (c-d) – B – C – D – B’ –
C’ – D’ – Coda|. Porém, Nonato optou por retirar as reexposições de B, C e D, incluir uma Ponte
antes da Coda e substituir a Coda original por outra de sua autoria. Por conseguinte, a forma da
adaptação obedece a seguinte configuração: |Introdução (a-b) – A (c-d) – B – C – D – Ponte –
Coda|.
Observei uma redução na obra, decorrente da não reexposição das seções B, C e D. Essa
redução pode justificar-se pela forma da obra completa estar em pot-pourri. Logo, diversos
materiais musicais são comunicados ao ouvinte ao longo da obra, e a repetição de seções
semelhantes durante a peça final poderia criar certa monotonia. Já a Coda criada por Nonato, pode
ser consequência de uma busca por um final mais enfático, caráter não percebido pelo autor no
Coda original.
As duas primeiras seções dão compostas por duas subseções, a saber: a e b na introdução, e
c e d na seção A. Tanto a Introdução como a seção A possuem dois temas distintos e
interdependentes, mas semelhantes em ambas às seções. No original, essas seções são bem
destacadas, devido ao diferencial no tratamento dessas melodias e no instrumentarium diferenciado
que executa a voz principal nas seções (na Introdução os instrumentos e na seção A a voz). Porém,
na adaptação, Nonato não explora nenhum recurso composicional ou instrumental para criar uma
diferenciação nas seções, apenas expõe o tema inicial uma oitava acima. Sugiro que, neste caso, o
intérprete busque caminhos de tornar claro ao ouvinte a distinção entre as duas seções.
Todas as seções permanecem com a mesma métrica e tonalidade, com exceção da seção D
que modula para Mi menor, tonalidade homônima de Mi maior. Essas características aliadas a não
repetição de seções, torna fluido o desenvolvimento da obra.
A textura presente na Introdução e seção A é homofônica, expondo a melodia sem melismas
e acompanhada pela harmonia dos baixos. O preenchimento harmônico das vozes intermediárias do

37 Como original virtual, escolhi a gravação do próprio Luiz Gonzaga, no ano de 1953 em um disco 78RPM,
encontrada no site:<www.luizluagonzaga.mus.br>, dedicado ao compositor. Saliento, que não encontrei no site o título
do álbum supracitado. Endereço eletrônico para consulta:<http://www.luizluagonzaga.mus.br/000/index.php?
option=com_content&task=view&id=37&Itemid=52>. Acesso em: 11/02/2017.

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acorde é reduzido se comparada as duas peças anteriores do Pot-pourri, apenas ocorrendo o uso de
terças descendentes na seção C. A seguir, a exemplificação do uso de terças na seção C:

Figura 24 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 185 – 188.

Na gravação escolhida como original virtual, o final da obra se dá por uma Coda posterior à
seção D. Porém, Nonato Luiz opta por criar uma Ponte precedendo a seção final, e substituir a Coda
original por outra com caráter mais conclusivo. Não observei na Ponte, um trecho de passagem que
precede a Coda, nenhum vínculo com motivos da obra original, provindo estritamente da
criatividade do autor da adaptação. Essa seção caracteriza-se pela utilização de escala mixolídia (em
Mi) subdividida em semicolcheias.

Figura 25 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 229 – 232.

O tema da Coda original é baseado na melodia representada pela figura 26. Já a Coda
desenvolvida por Nonato, conta com um pequeno motivo de apenas um compasso, encontrado no
tema da subseção b, exposto na figura 27. Este motivo é repetido em diversos registros e intercalado
com a sétima menor (nota ré3) do acorde de Mi maior, que permanece durante toda a Coda:

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Figura 26 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 142 e 143.

Figura 27 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compasso 156.

Figura 28 – Música Juazeiro, Assum Preto e Algodão, compassos 246 – 251.

3.2.4. Outras considerações

Como já foi abordado, observei que Nonato dispôs o Pot-pourri analisado como uma suíte,
com a seguinte estrutura: Prelúdio/ Movimento introdutório de caráter improvisado (Juazeiro),
Movimento lento/ Canção (Assum Preto) e um Movimento rápido como finale (Algodão).
Todos os movimentos possuem uma unidade decorrente do uso das mesmas tonalidades, e
de tonalidades homônimas em algumas seções, além de em decorrência do gênero, permanecerem
com a mesma fórmula de compasso.

- 52 -
3.3. ANÁLISE DA OBRA “VEM MORENA” (LUÍS GONZAGA E ZÉ DANTAS)

A obra “Vem Morena” possui uma particularidade na sua forma, decorrente da existência de
um único período na peça. A forma da obra é baseada na sua única seção, encarando-se os dois
temas em pergunta e resposta como que desenvolvendo-se em subseções, logo, considerei a obra
como uma variação. As seções A e sua variação A’, alternam-se entre as seções de Introdução,
Ponte, Interlúdio e Coda.
Desta forma consideramos a forma do arranjo a seguinte: ||Introdução – |:A (a – b) – A’ (a’ -
b’) - Ponte:| - Interlúdio – A – A’ - Ponte – A – CODA||. A curta Introdução, as seções de Passagem e
o Interlúdio foram elaborados pelo arranjador e incluídas na obra. A Coda da gravação original 38 foi
substituída por outra elaborada pelo Nonato.
Na gravação original, observei que o reduzido tamanho dos temas, aliado ao número de
repetições não tem como consequência a redução no interesse pela obra, tendo em vista que as
repetições da melodia são acompanhadas pela mudança na letra, o que torna a audição atrativa.
Embora na versão original a exposição do material musical seja apelativa, o recurso da poesia
perde-se na versão instrumental.
Para manter a obra interessante e torná-la idiomática, Nonato Luiz optou por alterar poucos
aspectos estruturais da obra, mantendo a tonalidade em Mi menor e a textura homofônica durante a
obra, além de limitar-se a apenas uma rearmonização.
O arranjador optou em incluir as seções de Introdução, Ponte, Interlúdio e Coda, entre as
exposições do tema original da obra, encontrado na seção A e suas variações, numa tentativa, em
minha percepção, de tornar a obra mais dinâmica. Baseado numa experimentação da obra sem as
seções incluídas por Nonato, pude constatar que a música se desenvolve com mais fluência no
arranjo, tendo em vista a condução das seções e a exploração de recursos instrumentais do violão.
A Introdução que Nonato elabora encontra-se sobre a harmonia dos acordes de Mi menor e
Si menor. Ela inicia com o arpejo de Mi menor no primeiro dos quatro compassos nos quais se
desenvolve, fazendo uso das três primeiras cordas do violão soltas, explorando um caráter
intrínseco ao instrumento, criado pelos timbres e harmônicos proporcionados pelas cordas.
Após a aura proporcionada pelo arpejo nas cordas soltas, a introdução segue com os arpejos
de Si menor e Mi menor com sétima para encerrar com um fragmento melódico nos baixos. A
baixaria e o arpejo de Mi menor explorando as cordas soltas do violão configuram-se como uma
ferramenta de adaptação idiomática da melodia original ao instrumento:

38 Consideramos como original virtual, a gravação encontrada no álbum “Quadrilhas e Marchinhas Vol.2” - 1979 –
RCA.

- 53 -
Figura 29 – Música Vem Morena, compassos 1 – 4.

As seções A e A’ da obra, são formadas por duas subseções, onde encontram-se os dois
temas complementares que constituem a sentença melódica de ambas as seções. A harmonia durante
essas seções mantêm-se em Mi menor e Lá maior, com exceção de alguns finais. Devido à
tonalidade, a fundamental dos acordes da harmonia podem ser executadas nas cordas mais graves
soltas. Esse recurso foi utilizado por Nonato, que ao explorar a harmonia nos baixos das cordas
soltas, proporciona ao arranjo uma sonoridade idiomática, além de que a mecânica torna-se mais
natural, pois, não faz-se necessário ao instrumentista manter nenhum dedo preso para executar o
acompanhamento.
Comparando a harmonização encontrada no final da subseção b’ do arranjo com a gravação
escolhida como original virtual, podemos observar que o arranjador modificou a harmonia,
substituindo a sequência original: I, IV (Maior), III (Maior) e IV (Maior), para: I, I7, IV (Maior), IV
(Menor) e V (Maior). Essa rearmonização justifica-se pela linha do baixo criado por Nonato, que é
valorizada pelos acordes da progressão.
A linha do baixo constitui-se de uma escala descendente, que vai do mi2 (fundamental do
acorde de mi menor) até o si2 (tônica do acorde de si maior). Devido a limitação da tessitura grave
do violão, o autor utiliza o recurso da permutação pontual após o mi2, ou seja, a nota seguinte é
oitavada e toda a sequência é alterada para corresponder a oitava de chegada.

Figura 30 – Música Vem Morena, compassos 29 – 32.

- 54 -
Após a ponte, a seção A é reexposta uma oitava abaixo. Já a reexposição das demais seções
preservam-se em suas oitavas inicias, alterando-se elementos pontuais, como apogiaturas e ritmos
do acompanhamento.
O Interlúdio criado pelo arranjador, embora contrastante com as demais seções, mantêm-se
com as mesmas características em seu interior. O primeiro elemento característico está no baixo,
que permanece inalterado durante todo o interlúdio na nota mi da sexta corda solta, em um ostinato
cuja célula rítmica é típica do baião.

Figura 31 – PEREIRA, 2007, p.64.

O recurso do paralelismo harmônico em formas também fica evidente graficamente na


partitura, aliado ao intervalo de quarta ascendente está presente constantemente. Nonato Luiz
desenvolve a harmonia sobre o modo dórico, que fica claro a partir das aparições nota dó#4,
responsável por caracterizar a harmonia modal.

Figura 32 – Música Vem Morena, compassos 81 – 84.

Após o Interlúdio, são reexpostas as seções A e A’. Ao final da seção A’ o registro da melodia
é alterado uma oitava abaixo, preparando para o registro da Coda. A Coda encontrada na gravação
original de “Vem Morena” consiste da repetição literal de um tema da subseção b (da gravação
original), exposto a seguir:

- 55 -
Figura 33 – Música Vem Morena, compassos 49 – 52.

A Coda criada por Nonato possui duas partes. A primeira constitui-se de um período
melódico que é repetido três vezes, a harmonia neste trecho está no modo dórico como no
Interlúdio. O arranjador explora o recurso do pizzicato na reexposição, que aliado ao registro mais
grave e as cordas soltas proporciona uma cor diferenciada à melodia. Saliento ainda a dificuldade
do pizzicato empregado por Nonato, pois, deve ser feito em cinco cordas do violão numa
velocidade de difícil execução devido a angulação dos dedos que atacam, e da limitação do
movimento relacionada à posição estática da mão direita.
Já o segundo tema é mais peculiar, pois consiste inicialmente em uma escala de tons inteiros
em sentido ascendente, além do uso do intervalo harmônico de terça maior e quarta diminuta (seu
enarmônico) na construção melódica.

Figura 34 – Música Vem Morena, compassos 175 e 176.

Os últimos quatro compassos são completamente distintos do restante da obra no tocante à


harmonia. O autor emprega uma cadência estendida, a saber: E9 (6), Bm7 (4), D e B9 (6), valendo-
se de acordes com notas acrescentadas e alguns com a fundamental omitida, onde os acordes nos
três primeiros tempos são extensões do acorde de Mi maior39.

39 Esses acordes são interessantes, pois, possuem muitos intervalos de quarta em sua formação, destacamos ainda, que,
e interpretamos o primeiro e último acordes como tendo a fundamental no baixo ambos possuirão quarta aumentada e
sétima menor, intervalos importantes para a cultura musical nordestina.

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Figura 35 – Música Vem Morena, compassos 182 – 183.

No último compasso observa-se um cromatismo entre a subdominante e a dominante,


cadenciando para a fundamental.

Figura 36 – Música Vem Morena, compasso 185.

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3.4. ANÁLISE DA OBRA “XANDUSINHA” (LUIZ GONZAGA E HUMBERTO TEIXEIRA)

A obra “Xandusinha” foi composta por Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. Sua letra faz
referência a uma jovem que deixa a riqueza de lado em busca do seu amor, temática expressa no
verso “Como foi que você deixou tanta riqueza pelo meu ‘amô’”.
Esta obra possui seções maiores que as dos outros baiões analisados. Porém, mesmo com o
tamanho das seções, encontramos relevantes características da estética da simplicidade nesta obra.
Composta por |Introdução – A – B – Introdução 40| a obra é disposta na gravação estabelecida como
original virtual41 de forma a promoverem uma rápida assimilação do ouvinte, sem repetições. A
disposição das seções possui uma linha sequencial única, favorecendo a audição.
Considerei a obra do Nonato Luiz como um arranjo, em decorrência do número de
alterações estruturais feitas por ele na peça, além da presença de sua criatividade quando comparado
à obra original. No arranjo o autor preocupou-se com a manutenção do ostinato no baixo, do ritmo
sincopado e da tonalidade, mantendo os aspectos característicos do baião, porém explorando
harmonizações diferenciadas das típicas no baião (em alguns momentos com acordes de passagem,
outros adicionando tensões a estes), métricas não usuais (compassos binários seguidos de fórmulas
ternárias etc.) e passagens de ligação.
Em uma primeira análise do arranjo, podemos notar que Nonato Luiz deixou uma marca
pessoal na obra, ao incluir quatro seções elaboradas por ele, sendo uma Introdução, dois Interlúdios
e duas Codas (devendo o intérprete escolher por uma delas). Logo, interpretamos a estrutura do
arranjo como sendo a seguinte: |Introdução – A – B – C – A – Interlúdio I – C – Interlúdio II – C – A
– Coda|.
Decorrente da introdução elaborada por Nonato Luiz surge uma problemática inicial, pois a
obra original já possui sua própria introdução. Logo, esta mudança estrutural do arranjo, altera a
interpretação das seções originais. Consideramos que a seção de introdução da obra original, deixa
de ser uma seção introdutória e passa a ser a seção A do arranjo, consequentemente a seção A da
obra original passa a ser a seção B do arranjo, e assim por diante.
A Introdução do arranjo possui duas subseções que se complementam, ambas mantêm a
tonalidade em Ré maior e a métrica em 2/4. A subseção a, explora a fundo o baixo em ostinato, que
permanece, em quase toda sua extensão, na nota ré2, alcançada devido a técnica do corde avalle,
modificando a afinação da sexta corda um tom abaixo, tornando a execução idiomática e fluida.

40 A introdução reexposta ao final, adquiri o caráter de Coda.


41 GONZAGA, Luiz. Meus sucessos com Humberto Teixeira. São Paulo: RCA Camden, 1968. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=nIP4jv37L98>. Acesso em: 27/12/2016.

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O arranjador permutou o motivo da seção B na elaboração da melodia da introdução,
diferenciando a nova seção com o desenvolvimento do motivo em arpejos com ritmo sincopado e a
repetição do padrão, ao contrário da seção A onde esses arpejos intercalam-se em uma relação de
pergunta e resposta com escalas descendentes.

Figura 37 – Música Xandusinha, compassos 37 – 39 (Motivo da seção B).

Figura 38 – Música Xandusinha, compassos 1 – 4 (Início da subseção a da introdução).

Nesta subseção a, o autor não faz uso de extensões harmônicas, movendo os acordes em
cadências plagais e perfeitas. Movimento harmônico este que prepara para o caráter da subseção b,
onde acordes permanecem nas mesmas cadências e intenções harmônicas anteriores. A melodia
neste momento muda seu registro para a região aguda dos arpejos.

Figura 39 – Música Xandusinha, compassos 12 e 13.

Uma característica desta seção, constatada a partir de sua reprodução ao instrumento, foi à
dificuldade técnica e musical de manutenção do legato, devido aos deslocamentos de posição
proporcionados pela mudança dos acordes, além de uma modificação na angulação no braço para
dar uma melhor estabilidade aos dedos no acorde de Ré maior.

- 59 -
Logo, o intérprete deve valer-se dos recursos proporcionado pelo violão para tentar deixar as
notas mais ligadas. O glissando e um leve vibrato, poderiam ser interessantes, dentro é claro das
possibilidades, pois, o glissando deve ser com o dedo mínimo (dedo que possui menos força e
estabilidade) e o vibrato torna-se limitado pela posição estática da pestana.
A seção A, possui um tema de oito compassos, onde a melodia permanece quase inalterada
em ritmo de colcheia. Um recurso interessante utilizado por Nonato foi a reexposição do tema uma
oitava abaixo, tornando idiomática a transição da melodia por várias regiões do violão. O próprio
tema favorece essa mudança de oitava por iniciar na nota ré5 e terminar uma oitava abaixo (com o
ré4), que apenas é mantido e aproveitado como nota inicial da reexposição.

Figura 40 – Música Xandusinha, compassos 26 – 28.

Na seção B o autor emprega o preenchimento harmônico de forma a tornar a seção fluida,


explorando todos os acordes e as regiões/posições do violão, além fazer uso dos harmônicos
naturais e da mudança de métrica, como exemplificado a seguir:

Figura 41 – Música Xandusinha, compassos 55 e 56 (Trecho da mudança de região no violão).

Figura 42 – Música Xandusinha, compassos 46 e 47 (Trecho do harmônico natural e mudança de métrica).

- 60 -
A seção C do arranjo, que originalmente seria interpretada como seção B, é uma das partes
mais importantes da obra, sendo o refrão do original virtual gravado por Luiz Gonzaga. O
tratamento desta seção por Nonato Luiz foi menos elaborado, conservando-se o texto original, e
expondo-o com um preenchimento harmônico mais comedido.
Por conseguinte não iremos nos deter tanto nesta seção, mas observei que o Nonato não
desenvolveu ideias interpretativas como nas seções anteriores, nem dificultou sua execução com um
preenchimento harmônico mais elaborado, logo, a liberdade do intérprete pode ser um diferencial
neste trecho, principalmente pela ausência de dificuldades técnicas.
Posteriormente, a seção A é reapresentada com uma única diferença: a exposição acontece
na oitava mais grave e a reexposição na mais aguda. O Interlúdio começa com o trecho inicial da
Introdução inspirado no motivo principal da seção B, porém finaliza o motivo em uma harmonia
menos convencional, que dá um caráter de improvisação à seção, reforçado pela métrica em 5/4 a
seguir:

Figura 43 – Música Xandusinha, compassos 87 e 88.

Figura 44 – Música Xandusinha, compassos 92 e 93.

Seguindo, a seção C e a Introdução são reexpostas com a função de passagem para o


segundo Interlúdio. O segundo Interlúdio é marcado primeiramente pelo contraste, criado na
modulação para Ré menor e na harmonização que flutua entre os acordes de Ré menor e Lá maior.
A continuidade do ritmo sincopado e dos baixos evoca continuamente o material sonoro exposto
anteriormente na obra. Esta seção encerra-se com uma passagem onde a harmonia mantêm-se em
turn-around (repetição da harmonia em grupos de acordes) nos acordes de Ré maior e Lá maior,
que inicia-se no registro grave.

- 61 -
Figura 45 – Música Xandusinha, compassos 131 – 134.

Figura 46 – Música Xandusinha, compassos 143 – 146.

Continuando, o arranjador reexpõe a seção A explorando outros efeitos e timbres do violão,


com o uso do pizzicato na melodia apresentada nos baixos, para, na repetição, voltar à tessitura
inicial sem este efeito.

Figura 47 – Música Xandusinha, compassos 163 – 166.

O emprego do pizzicato na melodia na região grave atribui um caráter diferenciado à obra,


possibilitando uma sonoridade nova e ressaltando a melodia.
Por fim, abordei as Codas, muito peculiares neste arranjo. Nonato Luiz escreveu duas Codas
diferentes, para o intérprete escolher. Ambas compartilham o trecho de passagem, que consiste em
uma cadência V/V – V – I, onde o segundo cadencial adquiri a função de dominante secundária.
Logo, duas cadências perfeitas consecutivas acontecem entre Mi maior e Lá maior, e entre Lá maior
e Ré maior.

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Figura 48 – Música Xandusinha, compasso 178 – 186.

Analisando harmonicamente, podemos observar que o acorde de Mi maior adquiri a função


de dominante, porém o arranjador não escreve a sétima menor. Sugiro que o intérprete inclua esta
sétima, pois não altera a melodia e reforça o sentido harmônico.
Ela começa com o acorde de Ré maior em staccatto, seguindo com um glissando que vai do
ré3 para o mib2, gerando uma suspensão devido a nota de tensão, para repousar no acorde de Ré
dominante, que é seguido por uma escala descendente com as alterações da tonalidade de Sol menor
(sib e mib). Terminado com um acorde de Ré maior com sétima, nona e décima primeira, que é
explorado no ritmo e com técnica percussiva.

Figura 49 – Música Xandusinha, compassos 181 – 183.

A primeira Coda possui diversos efeitos interessantes, como descritos acima, nela
encontramos uma escala com notas alteradas, acordes com tensões, glissando e golpe, porém, a
segunda Coda possui um caráter lírico mais presente, devido à rítmica e intervalos apelativos, além
da modulação para menor.
A segunda Coda transita entre os acordes de Ré menor e Lá menor, o que cria uma aura
diferenciada, reforçada por sua melodia repetitiva em terças menores. Esta seção encerra-se com
uma passagem do acorde de Ré menor com nona e décima segunda aumentada para o acorde de Ré
menor com nona, criando uma suspensão devido a nota de tensão no registro mais agudo.

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Figura 50 – Música Xandusinha, compassos 191 – 193.

Figura 51 – Música Xandusinha, compassos 204 – 205.

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4. CONCLUSÃO

Neste trabalho busquei expor e analisar processos adaptativos de obras do gênero Baião que
não foram compostas para o violão. Baseei-me nos arranjos de Nonato Luiz ao longo do processo
de pesquisa para o estudo dos procedimentos inerentes ao violão com a relação a performance de
obras compostas para formações distintas, constatando e analisando as preferências estéticas e
técnicas do arranjador em suas reelaborações.
Para alcançar os objetivos propostos, utilizei um referencial teórico que embasou os
conceitos utilizados ao longo da pesquisa. Abordei as terminologias “arranjo”, “transcrição”,
“adaptação”, entre outras que fomentaram as análises. Logo, desenvolvi um breve panorama
histórico dos processos reelaborativos na formação do repertório violonístico.
Encerrei a fundamentação teórica problematizando os conceitos de “nacionalismo” e
“regionalismo” relacionados com a temática deste trabalho. Neste ponto, justifiquei a escolha do
gênero ao qual o repertório escolhido pertence, expondo o seu valor social para as pessoas inseridas
no meio cultural.
Conclui que o violão possui recursos específicos, únicos e intrínsecos ao instrumento, que
possibilitam uma performance expressiva das obras do gênero Baião. Observei, ainda, que as
escolhas feitas por Nonato Luiz proporcionaram à sua obra um estilo pessoal, que pode servir de
modelo para violonistas que desejam iniciar uma produção de arranjos e afins relacionados a este
gênero.
Considero que o objetivo geral deste trabalho foi atingido, pois pude expor ao longo do texto
uma análise dos arranjos de Nonato Luiz, seus processos reelaborativos, composicionais, como
também técnicas instrumentais utilizadas pelo arranjador, destacando suas contribuições para um
idiomatismo e fluência da obra ao violão.
Os processos de reelaboração musical e transfonação instrumental são considerados, ainda
hoje, como afirma César Souza Funck, “uma arte que se aprende essencialmente com a experiência”
(2006, p.42). Logo, existe uma discrepância entre a quantidade da produção acadêmica nessa área e
o número de reelaborações disponíveis para violão. Ao observar a produção acadêmica na área de
reelaborações musicais de música regional para violão solo, essa discrepância aumenta
consideravelmente, tendo em vista a predominância de material teórico sobre transcrições de obras
pertencentes à cultura musical europeia, principalmente do século XVII.
Destaco que esta pesquisa possui relevância científica no aprofundamento e na fomentação
de um material de referencial teórico do tema proposto. Porém, essa pequena contribuição faz parte
de um universo de pesquisa vasto, e muitas questões existentes e de grande relevância na área das

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reelaborações musicais ainda não foram efetivamente investigadas. Diversos temas ainda nos dias
atuais necessitam de uma maior perscrutação, a título de exemplos podemos considerar: as
reelaborações musicais para grupos instrumentais, a vigência social deste repertório, as convenções
normativas destas práticas, as fontes legitimadoras dos originais, entre outras perspectivas deste
belo campo de estudo, que pode cada vez mais aproximar o público da prática musical efetiva.

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