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O NOMEE O PIOR © que induz a gente para mis ages estranhas, & que a gente est pertinho do que € nosso, por dircito, ¢ nio sabe, nlio sabe, nio sabel, J: Guimarites Rosa! A eposigao entre “o nome” e “o pior” anuncia © pior como uma dimensio humana que os nomes nao alcangam. Walter Benjamin descreveu esta impossibilidade quando se referiu ao mutismo dos soldados que voltavam da Primeira Guerra Mundial. No entanco, alguns, Primo Levi ¢ Jorge Semprun, por exemplo, souberam usar a escrita para contar o impossivel rescemunho dos horrores dos campos de-extecminasSo: O pior transborda o nome, 0 lago, a civilizagio, a nao ser que se saiba usar todos os nomes possiveis com sagacidade ¢ desenvoltura, Iégica e poesia, para contornar o pior e dar a volta por cima. A INSUSTENTAVEL LEVEZA DO SER Ha implicagao do pior como causa na estruturagio do ser humano desde 0 mecanismo inaugural chamado “identificagao”. A identificagio ¢ a passagem de um ser paradoxalmente sem esséncia a um sujeito inexoravelmente evanescente. A identificagio ¢ 0 recurso do humano que responde a auséncia de identidade do ser consigo mesmo: a insustentavel leveza do ser. 0 1) Guimandss Rosa, J. Giunde Sertde: Veredas, Rio de Janeiro, Nova Fromtcira, 1997, p. 82. 21 insustentdvel do ser, a sua leveza, é um dos nomes do pior que causa © humano desde o comego, desde a sua identificagio inaugural. Os homes sio responsdveis pela identificagio do sujeito, mas isso nZo protege o humano do pior. A identificagio pelo Outro, isto ¢, deixar- se representar pelo nome que vem do Outro (a alteridade do simbélico), é um recurso salvador e humanizador, porém falho, que marca indelevelmente uma falha interpretada como falta, falta de ser. Falamos em “processo” de identificagio, porque a identificagio humana nao ¢ um dado, nao ¢ um 4 priori do ser humano, herdado geneticamente. E um processamento de dados que tem procedéncia, tem um marco, um ponto de origem, uma identificagio primordial, ou origindria, que funda o processo ¢ toda a série das multiplas identificagées que caracterizam um sujeito. A identificacdo € 0 processo necessdrio & bumanizagdo, que notamos geralmente como subjetivapdo evocando o duplo aspecto de sujeigio e distingdo. A constituigéo do sujeito, a sua estruturagdo sao termos freqitentemente usados para explicar esse mesmo processo ¢ sua légica a partir da estrutura do significante, dividindo o sujeito entre seus nomes € seu inomindvel, Lacan precisa esse processo como causagdo do sujeito, discriminando af dois tempos de produgdo do sujeito: a alienagio (a passagem pelo Outro) ¢ a separacio (a distingao: tornar-se distinto). A identificagio é 0 processo de humanizagio que ao se efetivar deixa de lado uma parte maldita que, embora exclufda, constitui o cerne, 0 amago do ser humano. Esse amago, ponto de exflio do ser, €0 que ele tem de mais humano, embora quase sempre esteja revestido pelas aparéncias mais inumanas possiveis. A identificagao é 0 processo inicial da humanizagao, que é também um primeiro tempo de civilizag’6, desde que inaugura © lago social. Mas, como explicita Freud, a civilizagio, ao excluir a parte maldita, a inclui como seu mal-estar necessirio. O mal-estar na civilizagao é um eufemismo para falar do pior, comenta Colette Soler. 2 “SE ACHAR” E NAO SE ENCONTRAR Mas depois de tanto tempo, ¢ de tanta civilizagio, serd que ¢ mesmo tio problemdtico ser humano? Basta abrir os olhos, os jornais, escutar 0 vizinho ou o filho, assim como os sujeitos em andlise, para pereeber que a identificagio € um problema para o humano; nio se trata de uma questio acessdria, ou acidental, nem de um capitulo reservado da pesquisa dos analistas. A questio ¢ grave, misteriosa, espantosa, dolorosa: por onde o ser humano anda para se encontrar? Tantos se “acham” e nfo se encontram!’ E se ¢ tio dificil se encontrar, como conseguem se perder tio facilmente? Como cada um faz para ser? Como cada um faz para ancorar, afirmar sua existéncia, jd que nenhuma esséncia dada ¢ garantida jamais o confirmard na sua individualidade distinta e nica? Como cada um faz para suportar a insustencivel leveza do ser? Esta expressio, emprestada de um romance de Milan Kundera, tem uma resson4ncia imediata e intima para cada um de nds. A insustencdvel leveza do ser causa o necessdrio recurso humano 4 identificagio ao Outro. Este recurso ¢ necessério para sair do nada ¢ da indistingio, mas transforma a leveza insustentdvel no peso da falta 4 ser, pois se uma parte se encontra na identificagio ao Outro, na identificagio pela linguagem ¢ pelos simbolos que permitem representar, “a owtna parte ¢ ninguém... fundo sem fund... exstranheza ¢ soliddo... espanto,.., vertigem", como diz Ferreira Gullar* no seu pocma “Traduzir-se". Uma parte € amparada, obrigada, forgada; a outra, tio leve que ¢ insustentdvel. ‘Os avatares dessa leveza ¢ os equivocos dos processos de identificagio — &s vezes suas proezas — sio carados quotidianamente no mundo: abram o jornal: “Mundo”, “Cidades”, “Esportes”, “Cultura” também, ¢ ficario bem informados, espantados, admirados, fascinados, estupefatos: O que é isso? Por onde o ser 2) "Se achar": expreusio de piria adolescente que denota a vaidade © a suficidncia; “se achar ¢ nfo ut encontraz™ denota uma pewsoa vaidoua que exibe uma soluglo de identidade ‘mas nem por isso s¢ encontra. 3) Idem. 4) Fenn, Guan (Jost Ribamar Ferreira). “Tradsuir-se”, A vertigem de dia. Pocsias. 2. ed. Rio de Janeiro, Editors José Olympio, 2004. 23

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