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O Valor da Ciência

Richard Feynman - Outono de 1955


Tradução: Fábio Machado Ardito

De tempos em tempos as pessoas insinuam a mim que os cientistas deveriam dar mais atenção aos
problemas sociais - especialmente que eles deveriam ser mais responsáveis em considerar o impacto
da ciência na sociedade. Parece ser uma crença comum que se os cientistas se dedicassem somente
a estes problemas sociais tão difíceis e, se não gastassem tanto tempo brincando com problemas
científicos menos vitais, teríamos grande sucesso.
Parece que nós pensamos nestes problemas de tempos em tempos, mas não dedicamos todos os
nossos esforços a eles - a razão é que não sabemos nenhuma fórmula mágica para resolver
problemas sociais, que problemas sociais são muito mais difíceis que os científicos, e que geralmente
não chegamos a lugar algum pensando neles.
Eu acredito que um cientista estudando problemas não científicos é tão idiota quanto qualquer outro
cara - e quando ele fala sobre problemas não científicos, ele parece tão ingênuo quanto qualquer um
que não seja treinado no assunto. Como a questão do valor da ciência não é um assunto científico,
esta aula é dedicada a provar meu ponto - por exemplos.
A primeira maneira pela qual a ciência é valiosa é familiar a todos. É que o conhecimento científico
nos permite fazer todos os tipos de coisas e construir todos os tipos de coisas. Claro que se fizermos
coisas boas, não é apenas mérito da ciência; também é mérito da escolha moral que nos levou ao
bom trabalho. Conhecimento científico é um poder que possibilita fazer tanto coisas boas ou ruins -
mas isso não inclui instruções de como usá-lo. Este poder tem valor evidente - até mesmo o poder
pode ser negado pelo uso que alguém faz dele.
Eu aprendi uma maneira de expressar esse problema humano bastante comum numa viagem a
Honolulu. Num templo budista que existe lá, a pessoa responsável pelo lugar explicou um pouco
sobre a religião budista aos turistas, e então terminou a conversa falando que ele tinha algo a dizer
que não deveriam esquecer nunca - e eu nunca esqueci isto. Era um provérbio budista:

A todo homem é dada a chave dos portões do céu; a mesma chave abre os portões do inferno.
Então, qual é o valor da chave para o céu? É verdade que se não tivermos instruções claras que nos
permita determinar qual é o portão para o céu e qual é para o inferno, a chave pode ser um objeto
muito perigoso de ser usado.
Mas, obviamente, a chave tem seu valor: como entraríamos no céu sem ela?
Instruções não teriam valor algum se a chave. Então é evidente que, a respeito do fato que ela possa
produzir enormes horrores ao mundo, a ciência tem valor porque pode produzir algo.
Outro valor da ciência é a diversão chamada satisfação intelectual que algumas pessoas têm através
de leitura e de aprendizado e de reflexão, e que outros têm por trabalhar nisso. Este é um ponto
importante, um que não é considerado o suficiente por aqueles que nos dizem que é nossa
responsabilidade social refletir no impacto da ciência na sociedade.

É essa mera satisfação pessoal de valor para a sociedade como um todo? Não! Mas também é uma
responsabilidade considerar os objetivos da própria sociedade. Seriam eles encontrar maneiras para
que as pessoas possam aproveitar as coisas? Se sim, então a satisfação da ciência é tão importante
quanto qualquer outra coisa.
Mas eu gostaria de não subestimar o valor da visão de mundo que é resultado do esforço científico.
Somos levados a imaginar todas as coisas infinitamente mais maravilhosas do que as imaginações
dos poetas e sonhadores do passado. Isso mostra que a imaginação da natureza é muito, muito maior
do que a imaginação do homem. Por exemplo, quanto mais memorável é para todos nós estarmos
presos - metade de nós de cabeça pra baixo - por uma atração misteriosa a uma bola que gira e está
balançando no espaço há bilhões de anos do que sermos carregados nas costas de um elefante sobre
uma tartaruga nadando num mar sem fundo.
Estive pensando sobre essas coisas tantas vezes sozinho que eu espero que você vá me desculpar se
eu te lembrar desse tipo de ideia que tenho certeza que muitos de vocês já tiveram, que ninguém
poderia ter tido no passado porque as pessoas de então não tinham o conhecimento que temos do
mundo hoje.
Por exemplo, estou na praia, sozinho, e começo a pensar.

Existem as agitadas ondas


montanhas de moléculas
cada uma pensando estupidamente nos seus próprios problemas
trilhões separadas
e ainda assim formando branca arrebentação em uníssono

Eras e eras
antes que meus olhos pudessem ver
ano após ano
como um trovão atingindo a praia como agora.
Por quem, para que?
Num planeta morto
sem vida para entreter.

Nunca em repouso
torturado por energia
perdida prodigiosamente pelo sol
esguichada no espaço.
Um ácaro faz o mar rugir.

Fundo no mar
todas as moléculas repetem
os padrões de uma a outra
até que complexos novos são formados.
Eles fazem outros como eles
e uma nova dança começa.

Crescendo em tamanho e complexidade


coisas vivas
multidões de átomos
DNA, proteína
dançando um padrão ainda mais intrincado.

Fora do berço,
na terra firme
aqui está
em pé:
átomos com consciência;
matéria com curiosidade.
Em pé no mar,
pensa sobre pensar: eu
um universo de átomos
um átomo no universo.

A mesma emoção, o mesmo temor e mistério, vêm de novo e de novo quando olhamos esta questão
de maneira profunda o suficiente. Com mais conhecimento vem um mais profundo, mais
maravilhoso mistério, atraindo em penetrar ainda mais profundamente. Nunca considerando que a
resposta possa se provar desanimadora, com prazer e confiança nós viramos cada nova pedra para
encontrar estranhezas inimaginadas levando a mais questões maravilhosas e mistérios - certamente
uma grande aventura!
É verdade que poucas pessoas não científicas tem esse tipo particular de experiência religiosa.
Nossos poetas não escrevem sobre isso; nossos artistas não retratam este fato memorável. Eu não
sei por quê. Ninguém é inspirado pela nossa figura atual do universo? Este valor da ciência continua
não cantado pelos cantores: você é reduzido a ouvir não uma música ou poema, mas a uma aula
sobre isso durante a noite. Esta ainda não é uma era científica.
Talvez uma das razões para esse silêncio seja que você precisa saber como ler a música. Por exemplo,
o artigo científico pode dizer, "o fósforo radioativo contido no cérebro de um rato diminui para a
metade num período de duas semanas." Agora, o que isso significa?
Significa que o fósforo no cérebro do rato - e também no meu e no seu - não é o mesmo fósforo que
estava lá duas semanas atrás. Significa que os átomos no cérebro estão sendo substituídos: aqueles
que estavam lá se foram.
Então o que é essa nossa mente: o que são esses átomos com consciência? Eram as batatas da
semana passada! Elas agora podem lembrar o que se passava na minha mente um ano atrás - uma
mente que foi substituída há muito tempo atrás.
Para notar que a coisa que eu chamo de minha individualidade é apenas um padrão de dança, que é
o que significa quando alguém descobre quanto tempo leva para os átomos do cérebro serem
substituídos por outros átomos. Os átomos chegam no meu cérebro, dançam uma dança, e então
vão embora - sempre há novos átomos, mas sempre fazendo a mesma dança, lembrando a dança de
ontem.
Quando lemos sobre isso no jornal, ele diz "cientistas acreditam que essa descoberta pode ser
importante na busca pela cura do câncer." O artigo se interessa apenas pelo uso da ideia, não pela
ideia em si. Dificilmente alguém pode entender a importância de uma ideia, isso é tão marcante.
Exceto que, possivelmente, alguma criança possa conseguir. E quando uma criança pega uma ideia
como essa, temos um cientista. É muito tarde para elas pegarem o espírito da coisa quando
estiverem nas nossas universidades, então precisamos tentar explicar essas ideias para as crianças.
Eu gostaria agora de dar atenção a um terceiro valor que a ciência tem. Ele é um pouco menos direto,
mas não muito. O cientista tem um monte de experiência com a ignorância, a dúvida e a incerteza,
e essa experiência é de grande importância., eu acho. Quando um cientista não sabe a resposta de
um determinado problema, ele é um ignorante. Quando ele tem um palpite do que o resultado deve
ser, ele não tem certeza. E quando ele tem muita certeza do que o resultado deve ser, ele ainda tem
alguma dúvida. Descobrimos ser de fundamental importância que para progredir precisamos
reconhecer nossa ignorância e deixar margem para a dúvida. O conhecimento científico é um corpo
de sentenças de vários graus de certeza - algumas muito incertas, outras quase certas, mas nenhuma
absolutamente certa.
Agora, nós cientistas estamos acostumados a isso, e garantimos que é perfeitamente consistente ser
incerto, que é possível viver e não saber. Mas eu não sei se alguém percebe que isso é verdade.
Nossa liberdade à dúvida nasceu da nossa luta contra autoridade nos primeiros dias da ciência. Era
uma luta muito profunda e forte: permite a nós questionar - a duvidar - a não ter certeza. Eu acho
importante que não nos esqueçamos essa luta sob risco de talvez perder o solo que ganhamos. Aqui
está a responsabilidade para a sociedade.
Ficamos todos tristes quando pensamos o assombroso potencial que os seres humanos parecem ter
quando contrastado pelas suas pequenas conquistas. De novo e de novo as pessoas acharam que
poderíamos ter feito muito melhor. Aqueles do passado viram no pesadelo de seu tempo um sonho
para o futuro. Nós, do futuros deles, vemos que seus sonhos, de certo modo superados, tem de
muitas maneiras continuado como sonhos. As esperanças para o futuro hoje são, em grande parte,
aqueles de ontem.

Já foi pensado que as possibilidades que as pessoas tinham não foram desenvolvidas porque a maior
parte delas era ignorante. Com educação universal, poderiam todos os homens serem Voltaires?
Mau pode ser pensado pelo menos tão eficientemente quanto o bom. Educação é uma força forte,
mas tanto para o bem quanto para o mau.
Comunicação entre as noções deve promover entendimento - então se foi outro sonho. Mas as
máquinas da comunicação podem ser manipuladas. O que é comunicado pode ser verdade ou
mentira. Comunicação é uma força forte, mas também para o bem ou para o mau.
As ciências aplicadas deveriam livrar o homem dos problemas materiais pelo menos. Medicina
controla doenças. E o registro aqui parece ser todo para o bem. Entretanto existem aqueles
trabalhando pacientemente para criar pragas e venenos para usar nas guerras de amanhã.
Quase todo mundo não gosta da guerra. Nosso sonho hoje é paz. Na paz, o homem pode desenvolver
melhor as enormes possibilidades que tem. Mas talvez os homens do futuro venham a descobrir que
a paz pode ser boa ou ruim também. Talvez os homens de paz comecem a beber por causa do tédio.
Talvez a bebida se torne o grande problema que parece afastar o homem de conseguir tudo o que
acha que poderia a partir de suas habilidades.
Claramente, a paz é uma grande força - como é a sobriedade, poder material, comunicação,
educação, honestidade e os ideais de muitos sonhadores. Nós temos mais dessas forças para
controlar do que nossos antepassados. E talvez tenhamos feito pouco melhor do que eles
conseguiriam fazer. Mas o que deveríamos ser capazes de fazer parece gigantesco se comparado às
nossas confusas conquistas.
Por que isso? Por que não podemos conquistar a nós mesmos?
Porque descobrimos que até as grandes forças e habilidades não parecem carregar com elas
instruções claras de como usá-las. Como exemplo, a grande acumulação de entendimento sobre
como o mundo físico se comporta apenas convence alguém que esse comportamento tem algum
tipo de falta de significado. As ciências não ensinam diretamente o que é bom e mau.
Através de todas as eras de nosso passado, as pessoas tentaram sondar o significado da vida. Eles se
deram conta que se alguma direção ou significado pudesse ser dado às nossas ações, grandes forças
humanas poderiam ser libertadas. Então, muitas respostas foram dadas sobre o significado disso
tudo. Mas as respostas foram de todos os tipos, e os proponentes de uma resposta olhavam com
horror para as ações dos que acreditavam em outras - horror, porque de um ponto de vista em
desacordo todas as potencialidades da raça são canalizadas num beco escuro e sem saída. De fato,
é da história das enormes monstruosidades criadas por falsas crenças que os filósofos perceberam
as infinitas e assustadoras capacidades dos seres humanos. O sonho é encontrar o canal aberto.
Qual é, então, o significado disso tudo? O que podemos dizer para dissipar o mistério da existência?
Se levarmos tudo em conta - não apenas o que os antigos sabiam, mas tudo o que sabemos hoje que
eles não sabiam - então acho que temos que admitir francamente que não sabemos.
Mas, admitindo isso, nós provavelmente encontramos o canal aberto.
Esta não é uma ideia nova; essa é a ideia da era da razão. Esta é a filosofia que guiou os homens que
criaram a democracia que vivemos hoje. A ideia de que ninguém sabe realmente como administrar
um governo levou à ideia de que deveríamos criar um sistema no qual novas ideias poderiam ser
desenvolvidas, tentadas, e jogadas fora caso fosse necessário, com novas ideias sendo criadas - um
sistema de tentativa e erro. Esse método foi o resultado do fato de que a ciência foi se mostrando
um empreendimento de sucesso no fim do século XVIII. Até mesmo nessa época era claro para as
pessoas que estudavam a sociedade que a abertura de possibilidades era uma oportunidade, e que
a dúvida e a discussão eram essenciais para o progresso rumo ao desconhecido. Se quisermos
resolver um problema que nunca foi resolvido antes, precisamos deixar a porta para o desconhecido
entreaberta.
Estamos no começo do tempo para a raça humana. Não é sem razão que lutamos com os problemas.
Mas existem milhares de anos no futuro. Nossa responsabilidade é o fazermos o que pudermos,
aprendermos o que pudermos, melhorar as soluções, e passá-las adiante. É nossa responsabilidade
deixar para as pessoas do futuro uma mão livre. No ímpeto juvenil da humanidade, podemos
cometer erros graves que podem atrapalhar nosso crescimento por um longo período. Iremos fazer
isso se dissermos que temos as respostas agora, tão jovens e ignorantes como somos. Se
suprimirmos toda a discussão, toda crítica, proclamando "esta é a resposta, meus amigos; a
humanidade está salva!" iremos condenar a humanidade por um longo período às correntes da
autoridade, confinados aos limites da presente imaginação. Isso já foi feito muitas vezes antes.
É nossa responsabilidade como cientistas, conhecendo o grande progresso que vem com a
satisfatória filosofia da ignorância, o grande progresso que é fruto da liberdade de pensamento, para
proclamar o valor dessa liberdade: para ensinar como a dúvida não deve ser temida mas bem-vinda
e discutida; e demandar essa liberdade como nossa obrigação com as gerações seguintes.

O Valor da Ciência - Richard Feynman


O Valor da Ciência - Richard Feynman
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