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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE DIREITO

MARIA ISABELA HARO MELONCINI

A arbitragem nos contratos administrativos


no âmbito da Lei n° 8.666/93

São Paulo
2013
MARIA ISABELA HARO MELONCINI

A arbitragem nos contratos administrativos


no âmbito da Lei n° 8.666/93

Tese de Láurea apresentada à


Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo para a
obtenção do grau de “bacharel” no
Curso de Graduação.

Orientador: Prof. Dr. Fernando Dias


Menezes de Almeida

São Paulo
2013
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

Catalogação da Publicação
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

MELONCINI, Maria Isabela Haro.

A arbitragem nos contratos administrativos no âmbito


da Lei n° 8.666/93 / Maria Isabela Haro Meloncini;
orientador: Fernando Dias Menezes de Almeida. São Paulo,
2013.

Tese de Láurea--Universidade de São Paulo, 2013


Nome: MELONCINI, Maria Isabela Haro.
Título: A arbitragem nos contratos administrativos no âmbito da Lei n°
8.666/93

Tese de Láurea apresentada à


Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo para a
obtenção do grau de “bacharel” no
Curso de Graduação.

Aprovado em:

Banca Examinadora

Prof. Dr. _________________ Instituição: _______________________

Julgamento: ________________ Assinatura: _______________________

Prof. Dr. _________________ Instituição: _______________________

Julgamento: ________________ Assinatura: _______________________

Prof. Dr. _________________ Instituição: _______________________

Julgamento: ________________ Assinatura: _______________________


AGRADECIMENTOS

Ao meu pai, por me despertar a curiosidade e o gosto pelo estudo.

A toda minha família, pelo apoio contínuo durante a Graduação e sempre.

Ao Professor Dr. Fernando Dias Menezes de Almeida, pela dedicada orientação e


discussão.

À Sociedade Brasileira de Direito Público, por despertar meu interesse em Direito


Administrativo e pesquisa.

Aos colegas dos escritórios Manesco, Ramires, Perez e Azevedo Marques Advocacia e
Sampaio Ferraz Advogados, que propiciaram um aprendizado que foi além de um
simples estágio.

À Professora Elena Zucconi Galli Fonseca, pelas orientações dadas à pesquisa para
esta tese durante o intercâmbio na Universidade de Bologna.

Aos colegas e amigos da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, que


pacientemente escutaram os meus dilemas durante a redação desta tese.
“Mas se a proibição se impõe à força da baioneta é
porque o código do poder tomou o lugar do código da economia
e a satisfação das necessidades políticas subsistiu a satisfação
das necessidades econômicas. Esta situação tem o mérito de
relevar as vantagens e desvantagens de uma economia esteada
no mercado, mas nós podemos, apesar de tudo, nos perguntar se
é mesmo com os recursos limitados da baioneta que nos
interessa tratar do tema da regulação jurídica da sociedade.”

TEUBNER, Gunther. Droit et Reflexivité: L’auto-référence en


Droit et dans l’Organisation (trad. Nathalie Boucquey), LGDJ-
Bruylant, Paris, 1996, pp. 157 a 159.

“It is to Madame Justice that I dedicate this concerto, in honor


of the holiday that she seems to have taken from these parts, and
in recognition of the impostor that stands in her stead. “

V for Vendetta. Dir. James McTeigue. Warner Bros.2005.


Filme.
RESUMO

A tese de láurea teve por escopo analisar a possibilidade de dirimir litígios advindos da
execução de contratos regidos pela Lei n° 8.666/1993 através da via arbitral. Foram adotadas
duas premissas, que pautaram toda a análise: a ideia de que a arbitragem pode apresentar
vantagens à execução do contrato administrativo e o contexto de consensualidade da
Administração Pública que está em voga atualmente. Restou comprovado que a arbitragem no
âmbito dos contratos regidos pela Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos é uma
possibilidade. Não há qualquer disposição na Lei n° 8.666/1993 que proíba o juízo arbitral e a
omissão ao mecanismo de solução de controvérsia não opera como proibição. A Lei de
Arbitragem é suficiente para autorizar à Administração Pública a firmar convenção arbitral
tendo por objeto as matérias no âmbito das quais lhe compete contratar.

Palavras-chave: Contratos Administrativos. Arbitragem.


ABSTRACT

This thesis has the purpose to analyze the possibility of resolving disputes arising from the
execution of contracts subject to Federal Law No. 8.666/1993 to arbitration. Two premises
guided the whole analysis: the idea that arbitration may be advantageous to the execution of
administrative contracts and the actual context of an consensual Public Administration. It was
proven that arbitration is a possible for the contracts governed by General Law of
Procurement and Administrative Contracts. There is no provision on the Federal Law No.
8.666/1993 prohibiting the arbitration and the omission to the dispute settlement mechanism
does not operate as a prohibition. The Federal Arbitration Act is sufficient to authorize the
Public Administration to enter into an arbitration agreement having as its object the subjects
under which it is capable of contracting.

Keywords: Administrative Contracts. Arbitration.


SUMÁRIO

I. INTRODUÇÃO ……………………………………………………………………….. 1
I.1 Exposição do problema e hipótese…………………………………………………..… 1
I.2. Metodologia………………………………………………………………………….... 4
I.3. A arbitragem: vantagens e desvantagens da arbitragem dos
contratos administrativos………………………………….……………………...... 5
I.4. O contrato administrativo: paradigma atual de
consensualidade da Administração………………………………………………. 10
II. POSIÇÕES ACERCA DA ARBITRAGEM NO CONTRATO
ADMINISTRATIVO……………………………………………………………… 20
II.1 Teses contrárias à arbitragem no âmbito dos
contratos administrativos…………………………………………………………. 20
II.1.1. Suposta inconstitucionalidade da solução arbitral
aos contratos administrativos………………………………………………….… 20
II.1.2. Suposta necessidade de autorização expressa…………………………………….. 21
II.1.3. Posicionamento do Tribunal de Contas da União………………………………… 23
II.1.4. Mapeamento dos argumentos contrários………………………………………….. 25
II.2. Teses favoráveis à arbitragem para dirimir conflitos
decorrentes de contratos administrativos................................................................ 27
II.2.1 Da constitucionalidade da arbitragem....................................................................... 27
II.2.2. Compatibilidade entre §2o do art. 55 e o §6o do art. 32
da Lei n. 8.666/93 e a arbitragem............................................................................ 30
II.2.3. Da legalidade da arbitragem: a suficiência do disposto
na Lei de Arbitragem............................................................................................... 31
II.2.4. Dos direitos patrimoniais disponíveis no âmbito dos
contratos administrativos......................................................................................... 36
II.2.5. Da imprecisão da indisponibilidade do interesse
público para resolver a questão.............................................................................. 38
III. QUESTÕES ACERCA DA PRÁTICA DA ARBITRAGEM PELA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA .................................................................................... 45
III.1. Objeto possível de ser submetido à arbitragem........................................................ 45
III.2. Possibilidade de a Administração celebrar compromisso arbitral............................ 48
III.3. Vedação da arbitragem obrigatória........................................................................... 50
III.3.1 O debate italiano..................................................................................................... 51
III.3.2 A questão se põe no Brasil? ................................................................................... 54
III.4. Escolha do árbitro..................................................................................................... 56
IV. CONCLUSÃO............................................................................................................ 58
V. BIBLIOGRAFIA......................................................................................................... 60
I. INTRODUÇÃO

I.1 Exposição do problema e hipótese

Se a arbitragem já se consolidou como meio de solução de conflitos entre entes


privados no direito brasileiro, o mesmo não se pode dizer sobre as arbitragens envolvendo a
Administração Pública. Ainda que a história do direito aponte para posições favoráveis à
arbitragem em causas da Fazenda Pública já no tempo do Império1, a doutrina ainda diverge
quanto ao cabimento da arbitragem às causas administrativas.
Atualmente, alguns contratos regulados por leis especiais já possuem disposição
autorizando a arbitragem. É o caso dos contratos de concessão (art. 23-A da Lei nº 8.987/95,
inserido pela Lei nº 11.196/05), das parcerias público-privadas (art. 11 da Lei nº 11.079/04),
dos contratos de concessão e permissão no setor de transportes terrestres e aquaviários (arts.
35, XVI e 39, I, da Lei nº 10.233/2001), do setor de petróleo (art. 43, X, da Lei nº 9.478/97) e
do setor de telecomunicações (art. 93, XV, da Lei nº 9.472/97). Mesmo com autorização
legal, há discussão quanto à possibilidade do emprego da arbitragem como meio para
solucionar os conflitos advindos destas relações contratuais. Nestes casos, a doutrina
majoritária tem aceito a solução arbitral, enquanto os autores que persistem contrários
argumentam que há violação da indisponibilidade do interesse público e de dispositivos da
Constituição Federal.
A questão é ainda mais polêmica no caso dos contratos administrativos em que não há
previsão legal expressa à arbitragem. Dentre eles, destacam-se os contratos regulados pela Lei
nº 8.666/93, instrumento normativo que por 20 anos tem sido o principal comboio do sistema
de contratações do Brasil.
A Lei Geral de Licitações e Contratações Públicas abrange larga escala dos contratos
celebrados por todos os entes federativos, incluindo obras, serviços, compras, alienações e
locações. Os resultados positivos e as debilidades e limitações da Lei de Licitações foram tais
a ponto de os operadores do direito nela personificarem o bem e o mal2 Há a crença geral de

1
O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Bilac Pinto, em voto sobre o famoso “Caso Lage”, assinala que
durante o Império houve uma discussão sobre a aplicabilidade do Decreto n? 3.900/1867, que dispunha sobre
o juízo arbitral do comércio, às causas da Fazenda Pública. Pronunciaram-se favoravelmente Lafayette,
Visconde de Ouro Preto e o Conselheiro Silva Costa.
Para uma análise da história da arbitragem nos contratos administrativos, veja-se: LEMES, Selma.
Arbitragem na Administração Pública. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 63-82.
2
ROSILHO, André Janjácomo. Qual é o modelo legal das licitações no Brasil? As reformas legislativas
1
que, com a promulgação da Lei nº 8.666/93, os procedimentos e modalidades de contratação
foram unificados e o dever de licitar foi ampliado, contribuindo para a queda da corrupção3. A
Lei foi aprovada com um conteúdo detalhista e minucioso, cercando a discricionariedade do
Poder Público4.
Com o passar dos anos de aplicação, críticas à Lei nº 8.666/93 surgiram, destacando-se
entre elas a indagação quanto à efetividade e adequação da excessiva minúcia da lei, que
amarra o gestor público. Como resposta, foram criados novos regimes jurídicos de
contratações públicas, gerais ou em áreas específicas5, nenhum substituindo a Lei nº 8.666/93
por completo, mas excepcionando-a em certos casos. Dentre tais novidades legislativas, foram
marcantes as disposições da Lei nº 12.462/11, que institui o Regime Diferenciado de
Contratações (RDC), tendo em vista o oportunismo político em expandir as matérias que lhe
são sujeitas6. Inicialmente, eram submetidas ao RDC apenas as contratações relacionadas aos
Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016 e à Copa de 2014, além de obras aeroportuárias.
Posteriormente, incluíram em seu escopo as obras de ação do PAC, as obras e serviços de
engenharia no âmbito do SUS e as obras e serviços de engenharia do âmbito dos sistemas
públicos de ensino7. As principais características diferenciadoras do RDC em face da Lei nº
8.666/93 são a (i) previsão, como regra, da “inversão de fases”, procedendo-se à habilitação
após a apresentação das propostas, sendo que, por ato motivado, pode-se “reinverter” tal
ordem (art. 12); (ii) possibilidade de regime de contratação integrada no caso da contratação

federais no sistema de contratações públicas. São Paulo: Fundação Getúlio Vargas – Escola de Direito.
Dissertação de Mestrado, 2011, p. 13. Disponível em <bibliotecadigital.fgv.br/>. Acesso em 15 de janeiro de
2013.
3
O Projeto de Lei n° 1.491/91, que posteriormente deu origem à Lei n° 8.666/93, foi criado sob o motivo,
principalmente, de suspeitas de compras superfaturadas na Administração durante o Governo Collor, fato que
corroborou com seu impeachment. André Rosilho explica que a Lei de Licitações na forma como foi
aprovada favorece as empreiteiras emergentes. (ROSILHO, André Janjácomo. Qual é o modelo legal das
licitações no Brasil? As reformas legislativas federais no sistema de contratações públicas. São Paulo:
Fundação Getúlio Vargas – Escola de Direito. Dissertação de Mestrado, 2011, p. 74-75; 112-115. Disponível
em <bibliotecadigital.fgv.br/>. Acesso em 15 de janeiro de 2013.)
4
ROSILHO, André Janjácomo. Qual é o modelo legal das licitações no Brasil? As reformas legislativas
federais no sistema de contratações públicas. São Paulo: Fundação Getúlio Vargas – Escola de Direito.
Dissertação de Mestrado, 2011, p. 79. Disponível em <bibliotecadigital.fgv.br/>. Acesso em 15 de janeiro de
2013.
5
São eles: Lei nº 8.958/94 (Lei das Fundações de Apoio); Lei nº 8.987/95 (Lei das Concessões); Lei nº
9.472/97 (Lei das Telecomunicações); Lei nº 9.478/97 (Lei do Petróleo); Lei nº 9.637/98 (Lei das
Organizações Sociais); Lei nº 9.790/99 (Lei das Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público); Lei
nº 10.520/02 (Lei do Pregão); Lei nº 11.079/04 (Lei das Parcerias Público-Privadas); Lei Complementar nº
123/06 (Lei das Micro e Pequenas Empresas); Lei nº 12.232/10 (Lei das Agências de Publicidade) e Lei nº
12.462/11 (Lei do Regime Diferenciado de Contratações).
6
Aliás, a Presidente Dilma Rousseff já se manifestou neste sentido, afirmando que gostaria que o Regime
Diferenciado de Contratação substituísse a Lei nº 8.666/93. (Jornal Estado de São Paulo, 28 de junho de
2011. )
7
Lei nº 12.688/2012, Lei nº 12.745/12 e Lei nº 12.722/12, respectivamente.
2
de obras e serviços, caso em que o edital conterá apenas anteprojeto de engenharia, sendo que
o projeto básico será elaborado pelo participante (art. 9º, §2º, inciso I, alíneas “a”, “b”, “c”,
“d”) e (iii) previsão expressa de negociação das condições mais vantajosas com o primeiro
colocado (art. 26). Há, portanto, uma flexibilização nos critérios de contratação, em
contrapartida à rigidez da Lei nº 8.666/93, que não permite ao gestor público escolher dentre
os instrumentos dispostos na lei, de forma motivada.
Pode-se dizer, portanto, que a fase histórica das licitações brasileiras na qual a Lei nº
8.666/93 insere-se, ou seja, aquela marcada pela tentativa de estipular legalmente todas as
escolhas e caminhos que conduziriam à boa contratação pública, está em crise. Por que, então
continuar a estudá-la?
Ora, em primeiro lugar, o estudo que se propõe abarca reflexões que poderão ser úteis
para outras leis além da Lei nº 8.666/93, ainda que seja limitado a ela. As ideias que serão
abordadas podem ser transplantadas a outras leis de licitações e contratações públicas,
principalmente àquelas que não apresentam menção expressa à arbitragem (por exemplo, a
própria lei que institui o Regime Diferenciado de Contratações). O trabalho foi delimitado à
Lei Geral de Licitações por razões metodológicas. Em segundo lugar, a Lei Geral de
Licitações foi escolhida como objeto de análise tendo em vista o seu caráter abrangente e os
vários anos de aplicação8. Ademais, o seu escopo é amplo tanto no que tange aos entes
públicos a ela subordinados9, quanto ao rol contratos regidos por ela nesses 20 anos de
vigência. Por fim, é importante identificar os problemas da Lei Geral de Licitações e
Contratações Públicas para que se pensem em soluções legislativas alternativas.
Vez que a Lei nº 9.307/1996 (Lei de Arbitragem) autoriza a celebração de convenção
de arbitragem por pessoas capazes para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais
disponíveis (art. 1º), e que a Lei Geral de Licitações autoriza o Poder Público a celebrar

8
“Coube, precisamente, às Comissões de Licitação o papel preponderante da praxis, que se expressa pela
reflexão quotidiana sobre casos concretos e vai, lentamente, suavizando a frieza dos caracteres normativos,
plasmando sua face definitiva.
Consolida-se, destarte, o processo que denominamos de aprendizagem institucional da lei. Um processo que
tem dado frutos ao longo dessa década de vigência, e que trabalhou, notadamente, em favor da assimilação e
adequação da letra legal, tendo absorvido sua paradoxal vitalidade, hoje reconhecida por todos os segmentos
de um vasto campo de abrangência” (MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Treze anos de aplicação da Lei Nacional
de Licitações e Contratos. In Curso de Direito Administrativo Econômico, Vol. III, São Paulo: Malheiros,
2006, p. 641-704.).
9
Lei n° 8.666/93: Art. 1o Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos
pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos
especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e
demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
3
contratos, pergunta-se: pode a Administração firmar convenção arbitral? É necessária
autorização legal expressa? Há violação ao princípio do interesse público? Este meio de
solução de controvérsia é o mais indicado? É necessária previsão no edital? Deve-se licitar a
contratação de árbitro? Essas perguntas se relacionam ao problema objeto desta tese.
O presente trabalho põe-se à análise do cabimento da arbitragem como meio de
solução de controvérsias no âmbito dos contratos administrativos regidos pela Lei nº 8.666/93
e alguns de seus desdobramentos práticos, no caso de cabimento. Toma-se como premissa o
atual paradigma consensual da Administração Pública, ideia que será desenvolvida no item
I.4. A arbitragem, sendo fruto da consensualidade das partes, seria um meio de solução de
controvérsias que se coaduna com a nova face do Poder Público ante os administrados.
Também se assume como premissa as vantagens que a arbitragem pode apresentar em
comparação aos demais meios de resolução de conflitos, tema que será desenvolvido no item
I.3.
A hipótese deste trabalho é que é possível o emprego da arbitragem nos contratos
administrativos submetidos às regras da Lei nº 8.666/93. Acredita-se que há uma série de
inconsistências argumentativas nas teses contrárias ao utilizo da solução arbitral. Supõe-se
que o texto da Lei nº 9.307/1996 seja suficiente para que os agentes públicos revestidos de
competência contratual possam – e, em alguns casos, devam – firmar convenção arbitral.
Ademais, toma-se como hipótese que a Lei de Arbitragem não viola a Constituição, pois a
exclusão da competência do juiz togado em questões que envolvem direitos patrimoniais
disponíveis advém da vontade das partes.

I.2. Metodologia

Esta tese adota como instrumento técnico-científico para desenvolvimento de pesquisa


o modelo conceitual e teórico, porém sem se afastar com os problemas práticos relacionados à
doutrina analisada, tanto que decisões de tribunais judiciais e do Tribunal de Contas da União
também foram objeto de reflexão.
Em primeiro lugar, desenvolvi as premissas do trabalho. Tratei do instrumento da
arbitragem e analisei os benefícios que o meio de solução de controvérsia pode trazer quando
da sua utilização pela esfera pública. Em seguida, tratei do atual paradigma de
consensualidade na Administração. Não cabe no âmbito desta tese de láurea um estudo

4
aprofundado sobre um tema tão complexo, portanto ele foi abordado sumariamente, apenas
como base para situar a discussão no contexto atual da teoria dos contratos administrativos.
Após, apresentei as posições sobre a arbitragem nos contratos administrativos, com
ênfase nos contratos regidos pela Lei nº 8.666/93. Comecei pelas teses contrárias e passei
àquelas favoráveis. Levei em conta também as doutrinas que tratam da arbitragem em
contratos administrativos regidos por outras leis, quando o argumento também serviu para os
contratos administrativos submetidos à Lei Geral de Licitações e Contratações Públicas. As
decisões do Tribunal de Contas da União que tratam do tema também foram analisadas. Após
mapear as teses, comentei e critique-as com base nos pressupostos do trabalho, bem como
averiguei se as hipóteses se confirmam.
Como foram positivas as hipóteses deste trabalho, intentei tratar de algumas
características do desenrolar do procedimento arbitral com repercussão no Direito
Administrativo, sem a pretensão de exauri-las, a fim de dar utilidade prática à tese. Foram
abordados os seguintes temas: (i) o objeto possível de ser arbitrado, (ii) a (des)necessidade de
previsão editalícia, (iii) a caracterização de cláusula compromissória prevista no Edital como
arbitragem obrigatória e a necessidade de colher manifestação da vontade específica do
licitante, e (iv) modo de escolha do árbitro. Não foram analisadas a fundo questões acerca da
execução da atividade arbitral ou seus procedimentos por serem matérias de Direito
Processual que não estão no objeto desta tese de láurea.

I.3. A arbitragem: vantagens e desvantagens da arbitragem dos contratos


administrativos

A arbitragem é o “meio alternativo de solução de controvérsias através da intervenção


de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com
base nela, sem intervenção estatal, sendo a decisão destinada a assumir a mesma eficácia da
sentença judicial”10-11. É regulada principalmente por lei própria – a Lei nº 9.307, de 23 de

10
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à lei n. 9.307/96, 3° edição, São Paulo:
Atlas, 2009, p. 33.
11
Tendo em vista tal definição, não é arbitragem o método de solução no qual a própria Administração Pública
“arbitra” a questão, como ocorre em diversas Agências Reguladoras. São exemplos deste procedimento
aquele disposto no art. 4º, inciso XLI, do Regimento Interno da ANTAQ (Resolução n° 646/06), ou no art. 9°
do Decreto n° 5.731/06 (ANAC), entre outros. Entendemos que nesses casos trata-se de procedimento
administrativo, e não de arbitragem, haja vista que o “árbitro” não é imparcial, mas compõe o quadro de
servidores da Agência Reguladora, sendo que a decisão não é alternativa à sentença judicial.
5
setembro de 1996 (Lei de Arbitragem) -, que autoriza a arbitragem no caso de conflitos
relativos a direitos patrimoniais disponíveis. O Código Civil (Lei nº 10.406/2002) também
apresenta dispositivos sobre a arbitragem12.
Trata-se de um instituto que ganhou destaque recente no Brasil, se comparado a outros
países. Apesar das tímidas disposições sobre juízo arbitral presente nos arts. 1.031 a 1.046 do
Código de Processo Civil de 1939, bem como aquelas presentes no Código de Processo Civil
de 1973, nos arts. 1.072 a 1.102, a prática da arbitragem só passou a ser recorrente a partir da
publicação da Lei de Arbitragem13.
Ainda que a arbitragem tenha sido devidamente regulamentada no ordenamento
brasileiro com certo atraso, nos 17 anos de vigência da Lei de Arbitragem o meio de solução
de controvérsia ganhou considerável importância, comprovada pelas diversas câmaras de
arbitragem difundidas pelo país, que em 2011, já eram em torno de cem14, bem como pela
expressiva participação de partes brasileiras nas arbitragens conduzidas perante a tradicional
Corte de Arbitragem Internacional da Câmara de Comércio Internacional (CCI)15.Porém,
ainda é de tímida aplicação da arbitragem em lides tendo como parte a Administração
Pública16.

12
Código Civil (Lei n° 10.406/2002): Art. 851. É admitido compromisso, judicial ou extrajudicial, para
resolver litígios entre pessoas que podem contratar.
Art. 852. É vedado compromisso para solução de questões de estado, de direito pessoal de família e de outras
que não tenham caráter estritamente patrimonial.
Art. 853. Admite-se nos contratos a cláusula compromissória, para resolver divergências mediante juízo
arbitral, na forma estabelecida em lei especial.
13
Carlos Alberto Carmona explica que eram duas as barreiras ao deslancho da arbitragem no Brasil: em
primeiro lugar, a falta de previsão legal de cláusula arbitral; em segundo lugar, a necessidade de
homologação judicial da sentença arbitral. (CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um
comentário à lei n. 9.307/96, 3° edição, São Paulo: Atlas, 2009, p. 4-5).Tais problemas foram superados com
a Lei de Arbitragem.
14
Tomou-se como base o número de associados ao Conselho Nacional das Instituições de Mediação e
Arbitragem (http://www.conima.org.br/ ), na data de 3 de agosto de 2011.
15
“De acordo com as estatísticas divulgadas pela CCI sobre o número de partes brasileiras em processos
administrados por este órgão, o Brasil passou de 3 partes em 1996, ano de promulgação da lei de
arbitragem, para 67 partes em 2006. Isso fez com que o Brasil se tornasse o 4° país do mundo com mais
partes envolvidas na CCI e o primeiro da América Latina. Em 2007, embora não ocupe mais o 4o lugar, o
país manteve um patamar elevado: 35 partes em novos casos, o que equivale ao 11o lugar.” Escola de
Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas e pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem, Arbitragem e
Poder Judiciário, Relatório Inicial, disponível em http://www.cbar.org.br/. Acesso em 10 de janeiro de 2013,
nota de rodapé 2.
16
Não encontrei uma análise quantitativa de arbitragens envolvendo contratos administrativos. Não tive
condições, no âmbito desta tese, de criar tal banco de dados. Porém, a própria pesquisa Arbitragem e Poder
Judiciário realizada pela FGV-CBAr analisou 790 decisões judiciais sobre arbitragem, coletadas entre 2007 e
2008, sendo que apenas 14 delas tratavam de arbitragens envolvendo o Poder Público. (Escola de Direito de
São Paulo da Fundação Getulio Vargas e pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem, Arbitragem e Poder
Judiciário, 2° Fase – Existência, Validade e Eficácia da Convenção de Arbitragem , disponível em
http://www.cbar.org.br/. Acesso em 03 de julho de 2013, p. 38-41). Tais números mostram como é tímida a
arbitragem envolvendo parte público. É possível, porém, que alguns casos não sejam levados ao Poder
6
Se admitida a arbitragem dos conflitos decorrentes de contratos administrativos, esta
constitui-se como mais uma opção às partes para dirimir litígios, apresentando vantagens e
desvantagens em relação aos demais meios de solução de controvérsias17.
Em primeiro lugar, a arbitragem é marcada pela autonomia da vontade das partes, que
podem escolher o árbitro e o procedimento. Enquanto nos litígios submetidos ao Poder
Judiciário o juiz não é conhecido pelos litigantes, na arbitragem as partes podem escolher um
árbitro ou um colégio de árbitros que lhes apresente segurança. O árbitro nomeado deve ser
agente capaz e ter a confiança das partes18. Ademais, pode-se requisitar que o árbitro possua
conhecimento técnico em outros campos do saber ou ainda domínio na língua dos
documentos envolvido no litígio, dispensando perito ou tradutor e garantindo a qualidade da
decisão de um caso complexo.
Outra característica do procedimento arbitral é a flexibilidade procedimental, pois as
partes podem estipular as regras processuais, submeter o litígio ao regulamento de uma
câmara arbitral ou deixar a definição dos procedimentos à cargo do árbitro19. Salienta-se que a
Lei de Arbitragem determinou que, na falta de estipulação acerca do procedimento, caberá ao
árbitro ou ao tribunal arbitral discipliná-lo20. A maior liberdade dada às partes ou ao julgador
permite uma maior adequação do procedimento ao caso litigioso.
Em comparação aos métodos de solução de controvérsias autocompositivos, a
arbitragem tem como vantagem o respeito a princípios garantidores do devido processo legal,
quais sejam o contraditório, a igualdade das partes, a imparcialidade do árbitro e seu livre
convencimento21. Em outras palavras, ainda que as partes possam definir o procedimento
arbitral, não podem dispor de tais princípios fundamentais do processo.

Judiciário. Todavia, tendo em vista que o tema é polêmico, é de se imaginar que muitas das arbitragens em
que a Administração Pública seja parte conduzam a uma ação judicial para análise da validade da convenção
arbitral, de forma que as poucas decisões judiciais sobre o tema são ilustrativas do pouco emprego da
arbitragem nos contratos administrativos.
17
Para uma análise aprofundada das vantagens e desvantagens da arbitragem nos litígios envolvendo o Poder
Público, veja-se: AMARAL, Paulo Osternack. Vantagens, desvantagens e peculiaridades da arbitragem
envolvendo o Poder Público. In: PEREIRA, Cesar Augusto Guimarães. TALAMINI, Eduardo. Arbitragem e
Poder Público. São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 329-348.
18
Lei n° 9.307/96: “Art. 13. Pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes.(...) §6°
No desempenho de sua função, o árbitro deverá proceder com imparcialidade, independência, competência,
diligência e discrição. ”
19
Lei n° 9.307/96: “Art. 21. A arbitragem obedecerá ao procedimento estabelecido pelas partes na convenção de
arbitragem, que poderá reportar-se às regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada,
facultando-se, ainda, às partes delegar ao próprio árbitro, ou ao tribunal arbitral, regular o procedimento.”.
20
Esses são os exatos termos do § 1º do art. 21 da Lei n° 9.307/96.
21
Lei n° 9.307/96: “Art. 21.(...) §2° Serão, sempre, respeitados no procedimento arbitral os princípios do
contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento.”. Também,
Constituição Federal, 1988: Art. 5° (...) LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o
7
Outra vantagem marcante da arbitragem é a celeridade, se comparada ao moroso
processo judicial. A Lei de Arbitragem autoriza as partes a estipularem um prazo para que a
sentença arbitral seja proferida22, sob pena de extinção do compromisso arbitral e nulidade da
sentença arbitral23. Porém, tal característica deve ser relativizada. Caso uma das partes pleiteie
perante o Poder Judiciário a nulidade da sentença arbitral, o tempo do procedimento arbitral
será somado ao tempo do trâmite judicial, ainda que o objeto de análise do Poder Judiciário
neste caso seja bem restrito24.
A celeridade é desejável, pois uma solução da lide em tempo hábil garante a utilidade
do resultado alcançado ao final da demanda, de forma a atender à efetividade do processo. A
rapidez da arbitragem em comparação ao processo judicial pode ser um estímulo à celebração
do contrato administrativo que obrigue à solução arbitral. Luciana Nardi enfatiza que
“contratos envolvendo a administração pública quase
sempre sofrem interferências políticas, com consequências na
liberação de verbas e no cumprimento do cronograma das obras,
o que pode dificultar a execução do contrato e a amortização dos
investimentos nos prazos previstos. Neste cenário, a arbitragem
ganha importância, pois representa uma segurança de que o
contrato será respeitado e que os conflitos envolvendo a
contratação serão resolvidos de forma mais célere e por árbitros
especializados, diferentemente do que ocorre no Poder
Judiciário.”25

devido processo legal; LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral
são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”
22
Lei n° 9.307/96: “Art. 32. É nula a sentença arbitral se:(...) VII - proferida fora do prazo, respeitado o disposto
no art. 12, inciso III, desta Lei”
23
Lei n° 9.307/96: “Art. 23.A sentença arbitral será proferida no prazo estipulado pelas partes. Nada tendo sido
convencionado, o prazo para a apresentação da sentença é de seis meses, contado da instituição da arbitragem
ou da substituição do árbitro.”
“Art. 12. Extingue-se o compromisso arbitral:(...) III - tendo expirado o prazo a que se refere o art. 11, inciso
III, desde que a parte interessada tenha notificado o árbitro, ou o presidente do tribunal arbitral, concedendo-
lhe o prazo de dez dias para a prolação e apresentação da sentença arbitral.”.
24
A Lei nº 9.307/96 que determina que questão de nulidade da arbitragem seja levada ao Poder Judiciário: Art.
32. É nula a sentença arbitral se:
I - for nulo o compromisso;
II - emanou de quem não podia ser árbitro;
III - não contiver os requisitos do art. 26 desta Lei;
IV - for proferida fora dos limites da convenção de arbitragem;
V - não decidir todo o litígio submetido à arbitragem;
VI - comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva;
VII - proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e
VIII - forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 21, §2°, desta Lei.”
25
NARDI, Luciana. A arbitragem na administração pública. Disponível em http://www.camarb.com.br/. Acesso
em 08.01.2013.
8
Não obstante as vantagens, a arbitragem possui um problema: o seu custo geralmente
mais elevado do que o processo estatal26. Em contratos de baixo valor, talvez a arbitragem
não seja o meio de solução de controvérsia mais indicado. Todavia, não deve ser afastada de
pronto, não existindo regra abstrata que indique quando a arbitragem será adequada porque
pode ser que as demais vantagens se sobreponham ao custo elevado.
Por outro lado, a arbitragem pode reduzir os custos de transação de determinado
contrato administrativo, entendidos como a coleta de informações, a negociações e os demais
atos relacionados à celebração de um contrato27-28. Trata-se de elementos que são decisivos
para que o parceiro privado pactue, pois, em termos econômicos, influem em seu objetivo de
maximizar o valor da produção29. O Poder Público, por sua vez, é regido pelo princípio da
eficiência30, que consiste na concretização dos ditames legais com o mínimo de ônus social31
através da busca pela boa administração e da utilização dos meios de produção com os
menores custos-meio (eficiência econômica). Portanto, a redução dos custos de transação é
interesse comum das partes envolvidas num contrato administrativo.
A teoria dos custos de transação admitiu também que há contratos necessariamente
incompletos devido à incapacidade dos agentes econômicos de preverem todas as
contingências futuras32. Tal ideia foi criticada por Scott Baker, por entender que ainda que

26
A comparação entre custos da arbitragem e do processo judicial foi feita por Paulo Osternack Amaral
(Vantagens, desvantagens e peculiaridades da arbitragem envolvendo o Poder Público. In: PEREIRA, Cesar
Augusto Guimarães. TALAMINI, Eduardo. Arbitragem e Poder Público. São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 341-
343).
27
COASE, Ronald H. The institutional structure of production. American Economic Review, n. 82, 1991, p.
713-719.
28
Tomemos, apenas por amor ao exemplo, alguns dos custos de transação envolvidos numa contratação sobre a
égide da Lei n° 8.666/93. O Poder Público deve suportar o custo da informação quanto à necessidade de
contratar determinado objeto, o custo da elaboração de projeto básico e projeto executivo (art. 7°, I e II), a
especificação do orçamento detalhado (art.7°, §2°, II), a elaboração do edital, a consulta de técnicos (art. 13),
dentre outros. Durante a execução do contrato, a Administração deve fiscalizar (art. 58, III) e, muito
frequentemente, dar início a causas judiciais ou administrativas (art. 13, V), arcando com as custas e despesas
processuais. Da parte do particular, os custos de transação do contrato administrativo envolvem a análise do
edital, o estudo da previsão impacto das cláusulas do contrato e dos projetos básico e executivo, a prestação
de garantias (art. 56), o eventual dispêndio com um litígio e negociações, a previsão de demora no pagamento
pela Administração Pública, dentre outros.
29
COASE, Ronald H. The Poblem of Social Cost. Jornal of Law and Economics, vol. III, oct. 1960, pp. 1-44.
30
Constituição Federal (com a redação dada pela EC n° 19/98). “Art. 37. A administração pública direta e
indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”
(grifo nosso).
31
MOREIRA, Egon Bockmann. Processo Administrativo e princípio da eficiência. In: Carlos Ari Sundfeld;
Guillermo Andrés Muñoz. (org.). As leis do processo administrativo: Lei federal 9.784/99 e Lei paulista
10.177/98. São Paulo: Malheiros Editores, 2000, p. 320-341.
32
CHUNG, Tai-Yeong. Incomplete Contracts, Specific Investiment and Risk Sharing. Review of Economics
Studies, n. 58, 1991, pp. 1031-1042. Disponível em http://web.cenet.org.cn/upfile/61238.pdf. Acesso em
05.01.2013.
9
seja impossível firmar um “contrato completo”, a legislação prevê soluções ao estabelecer os
direitos e deveres das partes33. No caso da Lei nº 8.666/93, as condições para a alteração
contratual estão dispostas no artigo 65, sendo questão controversa em diversas lides que têm
por objeto os contratos administrativos.
A arbitragem pode reduzir os custos de transação na medida em que constitui relação
que aproxima as posições contratuais assumidas pelo Poder Público e pelo particular, sendo
isenta da incidência das cláusulas exorbitantes34. Ademais, a arbitragem é um sinalizador ao
privado da efetividade dos acertos contratuais35, pois é mais uma porta para a solução de
conflitos tendo por objeto do contrato administrativo. Insere-se entre as disposições legais que
garantem a “completude” dos contratos, pois, ainda que não estipule deveres e obrigações às
partes, é meio de solução das controvérsias quanto às lacunas contratuais.
Por fim, a arbitragem é coerente com o contexto em que à Administração foram
atribuídas tantas funções quanto os diversos interesses sociais existentes. Não se vislumbra
possível indicá-la abstratamente como opção melhor do que o processo judicial ou mesmo do
que outros métodos de solução de lides para os contratos administrativos36. Porém, diante da
gama de contratos celebrados pelo Poder Público, alguns certamente terão a arbitragem como
forma mais adequada e eficiente para dirimir os conflitos deles decorrentes, tendo em vista os
benefícios que esta trará na execução do contrato.

I.4. O contrato administrativo: paradigma atual de consensualidade da Administração

“Do I believe in arbitration? I do. But not in arbitration


between the lion and the lamb, in which the lamb is in
the morning found inside the lion.”

33
BAKER, S. & KRAWIEC, K. Incomplete contracts in a complete contract world. Florida State University
Law Review, Forthcoming; UNC Legal Studies Research Paper no. 899160, 2007. Disponível em
<http://ssrn.com/abstract=899160>. Acesso em 05.01.2013.
34
A prerrogativa do Poder Público de alteração unilateral do contrato não incide sobre a cláusulas arbitral, como
será analisado mais detidamente adiante. Nesse sentido: SALLES, Carlos Alberto de. Arbitragem em
Contratos Administrativos.1a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 147.
35
SALLES, Carlos Alberto de. Arbitragem em Contratos Administrativos.1° ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011,
p.76.
36
Nesse sentido, Carlos Alberto de Salles ensina que “Há de se considerar, sem dúvida, um certo relativismo
nesse tipo de comparação, não sendo possível afirmar, a princípio, a prevalência dos procedimentos arbitrais
sobre aqueles judiciais. Deve-se, para esse fim, considerar fatores concretos do caso e do órgão específico ao
qual a controvérsia será submetida.” (Arbitragem nos Contratos Administrativos. 1° ed. Rio de
Janeiro:Forense, 2011, p. 31). No mesmo sentido: AMARAL, Paulo Osternack. Vantagens, desvantagens e
peculiaridades da arbitragem envolvendo o Poder Público. In: PEREIRA, Cesar Augusto Guimarães.
TALAMINI, Eduardo.(coord.) Arbitragem e Poder Público. São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 329-348.
10
Samuel Gompers

“At all events, arbitration is more rational, just, and


humane than the resort to the sword.”

Richard Cobden

Para a melhor compreensão do contexto atual no qual se insere o debate da arbitragem


celebrada pelo Poder Público, uma breve construção histórica sobre a teoria do contrato
administrativo faz-se necessária. A partir de tal análise, será possível afirmar se a arbitragem é
um instrumento consentâneo com o paradigma de atuação do Poder Público vigente, marcado
pela isonomia entre a Administração e o administrado.
O Conselho de Estado francês elaborou os fundamentos da teoria do contrato
administrativo no Século XX. Surgiram controvérsias acerca do tema sob o argumento de que
o interesse público impedia o vínculo contratual, pois se entendia que a Administração estava
em uma posição de supremacia e apenas poderia relacionar-se com os particulares através da
edição de atos administrativos37. Segundo esta concepção, a atividade da Administração
Pública é necessariamente imperativa e consiste em impor unilateralmente decisões sobre os
particulares. Para os anticontratualistas, o contrato, instituto necessariamente paritário, não
poderia ser firmado numa relação administrativa, marcada pela verticalidade38. Ademais,
alguns autores entendiam que a Administração Pública não agia com autonomia, o que seria
um obstáculo à celebração de contratos, cuja essência é a autonomia contratual39. Por fim,
consolidou-se a concepção de contrato administrativo, porém incorporando a nota da
imperatividade aclamada pelos anticontratualistas através das cláusulas exorbitantes, assim
nomeadas por não serem possíveis para os contratos privados.

37
Odete Medauar. Direito Administrativo em Evolução, 2° ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 206.
A autora aponta que o próprio Direito Administrativo é criado a partir de uma contradição histórica e
principiológica, pois nasce num Estado autoritário, o que justifica a noção de prerrogativas da
Administração; por outro lado, trata-se também de um Estado de Direito, pois a Administração está vinculada
à lei (princípio da legalidade) (p. 23-25). O debate acerca dos contratos administrativos também é permeado
por esse paradoxo.
38
Odete Medauar analisa o pensamento dos seguintes anticontratualistas: Mayer, Alessi, Cammeo, Ranelletti,
Santi Romano. Otto Mayer entendida serem possíveis apenas contratos por submissão. Já os italianos
admitiam contratos administrativos entre entidades públicas, sendo que o contrato entre particulares e o
Poder Público deveria ser regido pelo Direito Privado. (Odete Medauar. Direito Administrativo em Evolução,
2° ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, pp. 206-208.)
39
MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias. Contrato Administrativo. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p. 64-
68.
11
Admitiu-se, também, que a Administração Pública possui alguma liberdade de
contratar, ainda que seja uma liberdade reduzida. Salienta-se a existência de regramento sobre
a forma de contratação não é característica exclusiva dos contratos administrativos, mas é
também presente em contratos privados em que há um interesse público a ser tutelado40.
Os contratos administrativos podem ser conceituados como
“o acordo de vontades opostas, realizado intuito personae,
consensual, comutativo e sinalagmático, do qual participa a
Administração Pública, para a produção de obrigações que
envolvam finalidade pública, ou não contrariem o interesse
público, contento explícita ou implicitamente cláusulas de
privilégio que o submetem a regime de direito administrativo,
informado por princípios publicísticos.”41.

As cláusulas exorbitantes, caracterizantes do regime de direito público, permitem a


modificação unilateral do contrato pela Administração, a rescisão unilateral, o amplo poder de
controle; o acompanhamento da execução do contrato, o direito de impor sanções ao
particular contratado, a anulação de contrato ilegal e, antigamente, também permitiam o
impedimento de invocação da exceptio non adimpleti contractus pelo particular. Para que o
contrato administrativo fosse considerado contrato ainda que dotado de cláusulas
exorbitantes, o princípio do pacta sunt servanda foi relativizado pela doutrina.
Para justificar a exorbitância dos contratos administrativos, aclamou-se o princípio da
supremacia do interesse público42, concebido como interesse superior à soma dos interesses
individuais, que a estes se contrapunha43 e que apenas o Estado era capaz de resguardar.
Salienta-se que o interesse público não era o interesse da pessoa-Estado – dito interesse
público secundário -, mas um interesse da coletividade, beneficiária da ação estatal. Portanto,
o regime de exorbitância de tais contratos decorria do conteúdo do contrato, e não do sujeito
Administração Pública.
Para Gaston Jèze, autor francês que contribuiu para a consolidação do conceito, o
contrato administrativo é um “procedimento de técnica jurídica posto à disposição dos agentes
públicos para assegurar o funcionamento regular e contínuo dos serviços públicos.”.44 Cabe

40
Nos contratos regidos pelo Direito do Consumidor, nos contratos bancários, entre outros, há regras cogentes
que se aplicam à celebração ou definição do conteúdo do contrato.
41
ARAÚJO, Edmir Netto de. Contrato Administrativo. São Paulo: RT, 1987, p. 42-50.
42
BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Princípios gerais de Direito administrativo, V. I, 3° ed., São
Paulo: Malheiros, 2007, p. 676-677.
43
ARAGÃO, Alexandre. A “supremacia do interesse público” no advento do Estado de Direito e na
Hermenêutica do Direito Público Contemporâneo. In: Interesses Públicos versus Interesses privados:
descontruindo o princípio de supremacia do interesse público. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2007, p.1-22.
44
JÈZE, Gaston. Notes de Jurisprudence – Théorie du Contrat Administratif, in Revue du Droit Public et de la
12
salientar que o serviço público que cita Jèze assume uma acepção ampla, não condizente com
o significado atribuído pela Constituição Federal de 1988. Para o autor, os serviços públicos
seriam “todas as atividades exercidas pelo Estado em regime de Direito Público por uma
decisão política dos órgãos de direção do Estado (critério formal)”45.. De qualquer modo,
significa dizer que o regime especial de direito público, responsável por atribuir poderes
unilaterais à Administração, desde os primórdios da teoria dos contratos administrativos
decorre do objeto do contrato e não em razão da pessoa da Administração46.
Ocorre que, naquela época, entendia-se que a Administração era a única detentora do
interesse público, portanto a diferenciação entre legitimidade do regime público pelo sujeito
ou pelo objeto não tinha grande relevância.
As transformações ocorreram com o advento do constitucionalismo moderno47, com a
inserção de mecanismos de controle do poder na Constituição escrita, bem como a previsão
de liberdades negativas e, com as seguintes ondas de direitos fundamentais, direitos que
imprimiam deveres ao Poder Público. A partir de então, Administração Pública submeteu-se
aos limites dos direitos fundamentais e seus interesses deixaram de ser os únicos
contemplados pela ação estatal, que também passou a garantir os interesses daqueles cujos
direitos são garantidos constitucionalmente48.
No Brasil, a partir dos anos 70, algumas inovações do Direito Administrativo e
mudanças na realidade social colocaram em cheque a teoria consolidada. Percebe-se, a “fuga
de poderes” do Poder Legislativo, que perdeu sua força representativa à órgãos da sociedade
civil ao Poder Executivo, este que passou a ser o órgão encarregado de mediar os conflitos
sociais49. Vê-se a ruptura da ideia da lei como fonte normativa absoluta, ante sua perda de

Science Politiche en France et à l'ètranger. LI année, t. 60, Paris: Librairie Générale de Droit et de
Jurisprudence, 1945, apud MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias. Contrato Administrativo. São Paulo:
Quartier Latin, 2012, p. 350.
45
ARAGÃO, Alexandre Santos de. O Conceito de Serviços Públicos no Direito Constitucional Brasileiro.
Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, n. 17, fev/mar/abr, 2009. Disponível em
http://www.direitodoestado.com. Acesso em 08.01.2013.) Ainda que possa haver discussão quanto ao
conceito, a noção proposta pelo autor demasiadamente ampla se comparada com os dispositivos da
Constituição Federal de 1988.
46
MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias. Contrato Administrativo. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p.
350.
47
Salienta-se que o constitucionalismo é um tipo ideal, uma “técnica da liberdade contra o poder arbitrário”.
Possui como características (i) a existência de uma constituição escrita, a fim de racionalizar os aspectos
organizacionais do Estado e dar certeza e publicidade às normas fundamentais, (ii) a sua legitimidade de dá
através de princípios jusnaturalistas, nela positivados, e no pacto social dos indivíduos; (iii) possui a função
de impedir um governo arbitrário, prevendo mecanismos de controle do poder.; e (iv) é formalmente rígida.
(MATTEUCCI, Nicola. Organización del poter y liberdad. Madrid: Trotta, 1998, p. 23-24)
48
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutaçõe do Direito Público. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 38.
49
NACCI, Paolo Giocoli. Legalità, evoluzione e deviazione. In: Scritti in onore di Massimo Severo Giannini.
13
legitimidade50. A heterogeneidade de interesses detectados numa sociedade complexa e a
demanda por uma pluralidade de funções a serem exercidas pela Administração Pública,
previstas constitucionalmente principalmente na Constituição de 1988, acarretaram a
alteração de institutos do Direito Administrativo e da relação entre o Poder Público e o
administrado, conduzindo à maior proximidade entre Estado e sociedade. Portanto, o Poder
Público dividiu a posição de detentor do interesse público51.
As mudanças sofridas pelos contratos administrativos foram as seguintes: (i) a
simplificação do procedimento de contratação pública, (ii) a outorga de maior liberdade à
Administração na escolha de contratados, (iii) a maior paridade das partes, devido à
percepção que a desigualdade é ruim sob o aspecto econômico, pois o parceiro privado é
capaz de diminuir o preço do objeto contratado se os custos de transação forem menores e se
a relação jurídica for mais segurança, (iv) a ruptura do dogma da não invocação da exceptio
non adimpleti contractus para admitir seu reconhecimento em certos casos; (v) a posição do
particular, visto como colaborador do serviço público 52.
Todas essas características podem ser resumidas como sendo características da
Administração concertada no regime contratual, substituindo a concepção de Administração
autoritária por administração consensual.
Cássio Telles Ferreira Neto sintetiza o Direito Administrativo participativo como
sendo “aquele que valoriza o princípio da cidadania e aproxima o Estado de seus
administrados, colocando-os como colaboradores privilegiados para a consecução do interesse
público.”53. Alexandre Santos de Aragão preceitua que
“a clássica imagem de uma Administração que opera por
formas unilaterais e autoritativas está superada, até mesmo
porque, por força da Constituição, a busca do consenso dos
cidadãos é um critério de legitimidade substancial, de
justificação e guia das decisões administrativas. Por isso, a

Vol. II, Milão: Giuffrè, 1988, 197-222.


50
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutaçõe do Direito Público. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 40.
51
“Questi interessi pubblici, collettivi, dei quali l’amminiatrazione deve curare il soddisfacimento, non sono, si
noti bene, semplicemente l’interesse dell’amministrazione intesa come soggetto giuridico a sè stante, sebbene
quello che è stato chiamato l’interesse collettivo ‘primario’, formato dal complesso degli interessi individuali
prevalenti in una determinata organizzazione giuridica della collettività, mentre l’interesse del soggetto
amministrativo è semplicemente uno degli interessi secondari che si fanno sentire in seno alla collettività, e
che possono essere realizzati soltano in caso di coincidenza, e nei limiti di siffatta coincidenza, con
l’interesse collettivo primario.” (ALESSI, Renato. Sistema istituzionale del diritto amministrativo italiano. 2°
ed. Milão: Giuffrè Editora, 1958, p. 179-180).
52
Odete Medauar. Direito Administrativo em Evolução, 2° ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, pp. 206-
210.
53
FERREIRA NETO, Cássio Telles. Contratos Administrativos e a arbitragem. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008,
p. 31.
14
Administração consensual é um corolário necessário da tese que
vê a legitimação da Administração não mais na lei, mas na
satisfação das necessidades sociais dos cidadãos.”54.

A nova forma de atuação da Administração, ao contrário do que se possa imaginar,


não exclui a anterior forma imperativa. Ambas convivem e se adicionam em maior ou menor
medida a depender do caso concreto. Não se trata de excluir dos institutos imperativos da
Administração Pública, mas sim de buscar a convivência destes com os modelos consensuais,
aplicando um ou outro dependendo de sua aptidão na persecução das finalidades legais e do
princípio da eficiência.
Juliana Palma coloca em questão a prevalência da atividade imperativa pela
Administração Pública, indicando para a coexistência desta com a atividade consensual. A
autora caracteriza as prerrogativas públicas como exorbitantes e instrumentais55. A primeira
qualidade consiste na derrogação ao Direito Comum, afim de que a Administração possa
impor unilateralmente a decisão administrativa sobre o administrado. Já a instrumentalidade
pode ser traduzida como a aptidão das prerrogativas de serem meio para que o Poder Público
possa realizar as finalidades públicas, em benefício da sociedade. Ou seja, a posição de
supremacia da Administração Pública só pode ser exercida quando for imprescindível para a
realização de fins públicos, e não como regra.
Fernando Dias Menezes de Almeida explica que as prerrogativas tradicionais da
Administração, quando presentes em determinados contratos administrativos, custam a
atender a finalidade administrativa. As razões apontadas pelo autor são a elevação dos custos
de transação, o estímulo à ineficiência da Administração, a facilitação à corrupção e a
legitimação da prática autoritária dos agentes da Administração56. O autor também afirma que
teoria do contrato administrativo sofreu distorção que “induz ao comprometimento da
essência funcional do contrato, ligada à pacificação decorrente do respeito à confiança que se
origina do acordo consensualmente estabelecido” e que as previsões legais de prerrogativas da

54
ARAGÃO, Alexandre Santos de. A Consensualidade no direito Administrativo: acordos regulatórios e
contratos administrativos. Revista de Direito do Estado, ano 1, n. 1, 155-173, jan/mar, 2006, p. 158.
55
PALMA, Juliana Bonacorsi de. Atuação administrativa consensual: estudo dos acordos substitutivos no
processo administrativo sancionador. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo, 2010, pp41-56;309.
Em sua pesquisa, a autora destaca a baixa efetividade do processo administrativo sancionador no âmbito do
CADE, prática que é exemplo da imperatividade do Poder Público. Em oposição, atenta para a efetividade
dos acordos substitutivos de processo administrativos, que são alternativos à sanção, já que o Poder Público
deixa de aplicá-la para firmar o acordo
56
p. 325-329. MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias. Contrato Administrativo. São Paulo: Quartier Latin,
2012, p. 328-333.
15
Administração em face do particular são a “institucionalização da desconfiança”57.
Tendo em vista a origem do conceito de contrato administrativo, que trouxe um
regime diverso aos contratos em razão do objeto de função pública, não há sentido em tratar
as prerrogativas da Administração como sendo em razão da pessoa do Poder Público, de seu
interesse. Ademais, atualmente entende-se que a Administração não é a única detentora do
interesse público, que é formado pelos interesses prevalentes na coletividade58. Como
consequência, a exorbitância deixa de ser necessária à persecução do interesse público, pois
nem sempre é necessário impô-lo ao particular.
Uma vez que as prerrogativas da Administração Pública são funcionais e que os
mecanismos consensuais podem atingir as mesmas finalidades de que tais prerrogativas, e
ainda, muitas vezes, com ganho de eficiência, propõe-se a convivência dos dois modelos, sem
que haja prevalência de um deles, a serem aplicados, um ou outro, a depender das
necessidades do caso concreto. Juliana Bonacorsi Palma observa que “a escolha entre a
atuação sancionatória ou consensual concentra-se na avaliação dos efeitos que cada
instrumento congrega no caso concreto”59.
No direito comparado, os sistemas italiano, espanhol e alemão possuem permissiva
genérica à atuação administrativa consensual60. Já ordenamento brasileiro não traz tal
disposição, sendo que a lei federal de processo administrativo é omissa e os instrumentos e
meios deste modo de se portar estatal estão dispersos na legislação.
A partir da inexistência de permissivo legal genérico à atuação consensual do Estado,
questiona-se, sob o manto do princípio da legalidade, a possibilidade de uma atuação
consensual ainda que sem disposição legal expressa. Ora, a concepção rígida do princípio da
legalidade, que preceitua que a Administração Pública só pode agir conforme a lei – em
contrapartida aos privados, que gozam da autonomia da vontade – está ultrapassada, pois a lei
não é capaz de antever todos os aspectos do ato administrativo, necessariamente deixando
margem à discricionariedade do gestor.

57
MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias. Contrato Administrativo. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p.
318.
58
ALESSI, Renato. Sistema istituzionale del diritto amministrativo italiano. 2a ed. Milão: Giuffrè Editora,
1958, p. 179-180.
59
PALMA, Juliana Bonacorsi de. Atuação administrativa consensual: estudo dos acordos substitutivos no
processo administrativo sancionador. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo, 2010, p. 307.
60
PALMA, Juliana Bonacorsi de. Atuação administrativa consensual: estudo dos acordos substitutivos no
processo administrativo sancionador. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo, 2010, p. 309.
16
O princípio da legalidade então sofreu transformações. Nas palavras de Odete
Medauar, “significa não mais a relação lei - ato administrativo, mas a dimensão global,
ordenamento - Administração”61. Gustavo Binenbojm pontua que a Administração Pública
está vinculada à juridicidade, que além da legalidade, abarca também o fundamento
Constitucional62. Portanto, a aplicação da lei passou a exigir o acomodamento perante os
valores constitucionais.
Paralelamente, foram criados princípios como a segurança, previsibilidade,
publicidade dos atos estatais, proporcionalidade, entre outros, para garantir a proteção do
administrado em face dos atos do Poder Público, mas também para dar flexibilidade à
Administração em suas relações.
Juliana Palma responde a questão da falta de permissivo legal genérico para atuação
consensual da Administração de maneira edificante, razão pela qual citamos ipis litteris
trecho extenso de sua dissertação:
“Ocorre que a consensualidade na prática do Direito
Administrativo assume evidente viés pragmático, voltado à
resolução de casos concretos com negociação de prerrogativas
públicas para alcançar a resposta mais eficiente. Em um cenário
marcadamente complexo, em especial no âmbito das Agências
Reguladoras, em que os problemas levados à deliberação pela
Administração Pública são cada vez mais particularizados, a
celebração de acordos administrativos demanda elevado grau de
discricionariedade para se adotar soluções efetivamente
próximas ao caso concreto.
A atuação administrativa por meio de acordos suscita,
assim, reflexões acerca da existência de margem de autonomia
da vontade no âmbito do aparato público na medida em que os
atos consensuais formalizam-se por meio da aquiescência
bilateral, pública e privada, acerca dos termos do pacto
(autonomia da vontade x vontade legal). Também questiona a
centralidade da lei na disciplina da ação administrativa ao ter
sede eminentemente regulamentar e se efetivar
independentemente de previsão legal específica (preferência de

61
Odete Medauar. Direito Administrativo em Evolução, 2a ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 146-
147.
62
“A idéia de juridicidade administrativa, elaborada a partir da interpretação dos princípios e regras
constitucionais, passa, destarte, a englobar o campo da legalidade administrativa, como um de seus princípios
internos, mas não mais altaneiro e soberano como outrora. Isso significa que a atividade administrativa
continua a realizar-se, via de regra, (i) segundo a lei, quando esta for constitucional (atividade secundum
legem), (ii) mas pode encontrar fundamento direto na Constituição, independentemente ou para além da lei
(atividade praeter legem), ou, eventualmente, (iii) legitimar-se perante o direito, ainda que contra a lei, porém
com fulcro numa ponderação da legalidade com outros princípios constitucionais (atividade contra legem,
mas com fundamento numa otimizada aplicação da Constituição).”(BINENBOJM, Gustavo. Uma teoria do
Direito Administrativo: direitos fundamentais, democracia e constitucionalização, 2ª ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2008).
17
norma x preferência de lei).”63.

Portanto, quando a Administração se depara com casos complexos, uma solução


efetiva pode exigir atos administrativos inovadores, eivados de maior discricionariedade e em
prol da consensualidade.
Cabe notar que a arbitragem, diferentemente dos acordos substitutivos analisados pela
autora, não substituem as prerrogativas públicas da Administração, mas sim a recorrência ao
Poder Judiciário. Porém, o que têm em comum é a opção de escolha da Administração.
A possibilidade de escolha pressupõe discricionariedade, que constituiu uma esfera de
liberdade ao gestor público, cabendo-lhe decidir segundo a conveniência e a oportunidade
dentro das soluções legais admitidas. Celso Antonio Bandeira de Mello leciona que a
discricionariedade surge quando a lei exige do agente público um juízo subjetivo no (i)
reconhecimento da situação fática, para enquadrá-la no conceito indeterminado da lei; (ii) na
escolha da ocasião para agir e/ou (iii) na escolha da forma jurídica através da qual se veiculará
o ato64. O autor explica que nem sempre a lei é capaz de fixar, de antemão, a melhor solução
para determinado caso concreto, escolhendo atribuir discricionariedade ao gestor público65.
Não se trata de dar ao administrador total liberdade de escolha, pois há o dever de
adotar a melhor solução segundo a finalidade da norma. Porém, o administrador detém
“liberdade intelectiva”, liberdade de interpretar qual será a melhor escolha dentre as
possíveis66. A faculdade do gestor pressupõe também que este absorva recomendações da
sociedade através dos meios de participação do cidadão na decisão administrativa, garantidos
constitucionalmente (art. 37, §3º)67.
No caso na arbitragem, é desejável que o texto da convenção arbitral não seja
rigidamente estabelecido por via legal. Pode haver casos em que seja preferível a indicação de

63
PALMA, Juliana Bonacorsi de. Atuação administrativa consensual: estudo dos acordos substitutivos no
processo administrativo sancionador. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo, 2010, p. 227.
64
MELLO, Celso Antonio Bandeira. Discricionariedade e controle jurisdicional. 2a ed. São Paulo: Malheiros,
2010, p. 20-32.
65
“é exatamente porque a norma legal só quer a solução ótima, perfeita, adequada às circunstâncias concretas,
que ante o caráter polifacético, multifário, do fatos da vida, se vê compelida a outorgar ao administrador –
que é quem se confronta com a realidade dos fatos segundo seu colorido próprio – certa margem de liberdade
para que este, sopesando a circunstâncias, possa dar verdadeira satisfação à finalidade legal” MELLO, Celso
Antonio Bandeira. Discricionariedade e controle jurisdicional. 2a ed..São Paulo: Malheiros, 2010, p. 35.
66
Celso Antonio cita Bernatzik:“Existe um limite além do qual nunca terceiros podem verificar a exatidão ou
inexatidão da conclusão atingida”. (Discricionariedade e controle jurisdicional. 2a ed..São Paulo: Malheiros,
2010, p. 20-32. )
67
No âmbito federal, a Lei nº 9.784/1999 regula o processo administrativo no âmbito da Administração
Federal. Os regimentos internos das agências reguladoras também dispõem sobre a realização de consultas
públicas e outros procedimentos de abertura ao público.
18
determinada câmara arbitral em cláusula arbitral; em outros casos, pode ser preferível a
estipulação de compromisso arbitral para solução, pois é desinteressante encaminhar todos os
conflitos decorrentes daqueles contratos ao árbitro; ainda, em outras situações, pode ser que a
própria cláusula arbitral delimite o objeto a ser eventualmente dirimido por árbitros. Pode ser,
ainda, que o prazo de seis meses estabelecido pela Lei de Arbitragem seja demasiadamente
longo, sendo interessante determinar um prazo menor... Enfim, várias são as situações de
contratação pelo Poder Público e igualmente várias serão as respostas.
Como já visto, a arbitragem nem sempre é o método de solução de conflitos que
melhor se adéqua à determinado contrato, administrativo ou privado. O escolha do método de
solução de controvérsias e da redação de convenção arbitral mais adequados dependerá da
atenta análise do caso concreto.
Portanto, a ausência de regulação minuciosa acerca da arbitragem para dirimir conflito
advindo de contratos administrativos permite maiores opções ao redator da convenção
arbitral. Como se verá, a previsão genérica da Lei de Arbitragem possui as disposições
necessárias para que o gestor público, no exercício discricionário, escolha (ou não) pela
solução arbitral. Ademais, a arbitragem se coaduna com a nova face da atuação da
Administração Pública em face ao administrado. Nesse sentido, o ilustre Themístocles
Brandão Cavalcanti ensina:
“a Administração não preenche os seus fins somente com o ato
formal de uma decisão administrativa, ela se realiza procurando
soluções de equilíbrio e com a proteção de todos os interessados
legítimos. Ora, sendo o juízo arbitral uma solução aceita pelas partes,
criada ou admitida pela lei, nenhum conflito pode haver quanto à sua
aceitação como procedimento normal e legítimo da Administração”68

Portanto, em determinado caso concreto, a arbitragem será a opção apta a reduzir os


custos de transação e propiciar maior participação e concorrência, além de melhores ofertas.

68
CAVALCANTI, Themístocles B. Concessão de Serviço Público. Encampação. Juízo Arbitral. RDA, 45/517,
jul./set., 1956.
19
II. POSIÇÕES ACERCA DA ARBITRAGEM NO CONTRATO
ADMINISTRATIVO

II.1 Teses contrárias à arbitragem no âmbito dos contratos administrativos

Parcela da doutrina e o Tribunal de Contas da União (TCU) mostram-se contrários à


possibilidade de os conflitos advindos de contratos administrativos serem dirimidos através da
arbitragem.

II.1.1. Suposta inconstitucionalidade da solução arbitral aos contratos administrativos

Para Celso Antonio Bandeira de Mello, Edmir Netto de Araújo, Lúcia Valle
Figueiredo e Ricardo Marcondes Martins, o Poder Público não pode, sob qualquer hipótese,
firmar convenção arbitral. Tais autores sequer admitem autorização legal expressa à
arbitragem nos contratos administrativos, reputando que tal disposição seria inconstitucional.
Celso Antonio Bandeira de Mello, ao tratar da arbitragem no âmbito da Lei nº
11.079/2004 (art. 11, inciso III), a Lei das parcerias público-privadas, entende que os serviços
públicos envolvem uma dignidade constitucional que impede que “simples árbitros”
disponham sobre matéria litigiosa que os circunde. Acrescenta que todos os bens relacionados
a serviços públicos são indisponíveis69.
Edmir Netto de Araújo, por sua vez, afirma que o dispositivo da Lei das Parcerias
Público-privadas é de “constitucionalidade duvidosa”, por ser incompatível com inciso
XXXV do art. 5º da Constituição Federal, que dispõe que “ a lei não excluirá da apreciação do
Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”70. Ricardo Marcondes Martins argumenta que o
ordenamento jurídico, atribuiu ao magistrado, e somente à ele, a função de “oráculo do
direito”; de pôr fim ao conflito; de dizer, em última instância, sobre o interesse público71.
Lúcia Valle Figueiredo afirma que nos contratos administrativos estão envolvidos
interesses públicos, enquanto a arbitragem destina-se a direitos disponíveis. Para a autora, a

69
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de Direito Administrativo. 28a ed. São Paulo: Malheiros,
2011, p. 796.
70
ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de Direito Administrativo. 5a ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 183.
71
MARTINS, Ricardo Marcondes. Arbitragem e Administração Pública: contribuição para o sepultamento do
tema. Interesse Público: Revista Bimestral de Direito Público, v. 12, n. 64, nov./dez., 2010, p. 85-104. O
autor também trata das razões políticas para a criação da lei de arbitragem, que argumenta ser a desconfiança
do investidor estrangeiro no Poder Judiciário brasileiro.
20
previsão de arbitragem constitui violação aos incisos XXXV, LXIX72, LXX73 e LXXIII74 do
art. 5º da Constituição Federal, que dispõem sobre o mandado de segurança e a ação popular.
O art. 1875 da Lei de Arbitragem, ao afastar a homologação pelo Poder Judiciário, estaria
impedindo a apresentação das ações previstas constitucionalmente. Ademais, para a autora, a
previsão de arbitragem nos contratos administrativos viola as regras de competência da
processual da Fazenda, que são de ordem constitucional e não podem ser derrogadas pela
legislação infraconstitucional76.

II.1.2. Suposta necessidade de autorização expressa

Os outros autores, por sua vez, admitem a arbitragem nos contratos administrativos
desde que haja autorização expressa. Dentre eles, muitos exaltam a arbitragem como meio
eficaz de solução dos litígios administrativos, com a ressalva de que haja autorização legal
para solução arbitral especificamente para aquela espécie de contrato. Como a Lei nº 8.666/93
não possui tal permissivo explícito, tais argumentos foram classificados como contrários à
arbitragem, a despeito do entusiasmo dos autores à arbitragem em contratos administrativos
regidos por outras leis77.
Dora Maria de Oliveira Ramos afirma que a arbitragem é “meio privado de
composição” e que a “a indisponibilidade do interesse público é óbice que se opõe de forma
irrefutável para que se transfira a um órgão alheio ao poder estatal a decisão, em última

72
LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-
corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou
agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.
73
LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação no
Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em
funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados.
74
LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio
público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao
patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus
da sucumbência.
75
Lei nº 9.307/96: Art. 18. O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso
ou a homologação pelo Poder Judiciário.
76
FIGUEIREDO, Lúcia Valle Figueiredo, Curso de Direito Administrativo. 9a ed. São Paulo: Malheiros, 2008,
pp. 115-116.
77
Leon Fejda Szklarowsky (Arbitragem e os contratos administrativos. Revista de Direito Administrativo, Rio de
Janeiro, n. 209, jul./set. 1997, p.105-107.) é um deles. Já alguns autores favoráveis à arbitragem no
Administração Pública em geral não se posicionaram acerca da necessidade de autorização legal expressa.
São eles: Diogo de Figueiredo Moreira Neto (Arbitragem nos Contratos Administrativos, Revista de Direito
Administrativo, Rio de Janeiro, n. 209, jul./set. 1997, p.81-90) e Marçal Justen Filho, em seu livro
Comentários à Lei de Licitações e contratos administrativos (14a ed. São Paulo: Dialética, 2010, p. 562-566),
também não se posiciona quanto à legalidade.
21
instância, de matérias que envolvem o Estado.”78. Para autora, o interesse público advém do
ordenamento jurídico, sendo necessária autorização legal expressa79.
Em sua análise, Dora Maria de Oliveira Ramos examinou o “Caso Lage”80, famoso
acórdão do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, para concluir que tal decisão não autoriza
a celebração de arbitragem em litígios envolvendo a União nos dias atuais81 sem que haja
previsão legal. A Procuradora aponta como razões o fato de que, naquele caso, foi editado
Decreto-lei82 autorizativo, além de que estava vigente o Código de Processo Civil de 1939,
que regulava a matéria em seus arts. 1.031 a 1046. O Código de Processo Civil de 1973 e a
Lei de Arbitragem teriam restringido a aplicação do instituto ao Poder Público ao dar à
arbitragem nova definição.
Luís Roberto Barroso entende que para que um interesse público como regra
indisponível torne-se disponível, é necessária manifestação legislativa que afaste a presunção
legal83. Sem a autorização legal expressa, haveria violação do princípio da legalidade84.
Especificamente quanto à Lei nº 8.666/93, o autor afirma que o §2º do art. 55, ao prever a
obrigatoriedade de cláusula que disponha sobre o foro competente, opera como vedação
lógica à possibilidade de instituição de arbitragem85.
Carmen Tibúrcio invoca o mesmo dispositivo para proibir as arbitragens envolvendo
contratos regidos pela Lei de Licitações. Afirma também que só caberia a arbitragem nos

78
RAMOS, Dora Maria de Oliveira. Da Impossibilidade de uso da arbitragem nos Contratos Administrativos.
Revista Licitar, ano 1, n. 4, out., 1997, pp. 23-28.
79
Também nesse sentido, ROCHA, Fernando Antonio Dusi. Da possibilidade do uso da arbitragem nos
contratos administrativos, in Revista Licitar: licitações, contratos e gestão de suprimentos, v.1, n.1, jul.,
1997, p. 24-33.
80
Supremo Tribunal Federal, Agravo de Instrumento n° 52.181 – GB, Tribunal Pleno, rel. Min. Bilac Pinto, j.
14.11.1973, DJ 15.02.1974. Revista Trimestral de Jurisprudência, n° 68, p. 382-397.
81
O texto da autora é de 1997, mas o argumento se aplica atualmente.
82
Decreto-lei n° 9.521, de 26 de julho de 1946.
83
Luís Roberto Barroso. Sociedade de economia mista prestadora de serviço público. Cláusula arbitral inserida
em contrato administrativo sem prévia autorização legal. Invalidade. Revista de Direito Bancário, do
Mercado de Capitais e da Arbitragem. São Paulo, n. 19, jan/mar, 2003, p.419-439.
84
Também nesse sentido: SALLES, Carlos Alberto de. Arbitragem em Contratos Administrativos.1° ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2011, 215, 237-243; FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Arbitragem, jurisdição e execução.
2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999; ROCHA, Fernando Antonio Dusi. Da possibilidade do uso da
arbitragem nos contratos administrativos, in Revista Licitar: licitações, contratos e gestão de suprimentos,
v.1, n.1, jul., 1997, p.24-33; DINAMARCO, Júlia Raquel de Queiroz. Arbitragem e administração pública.
Revista de Processo, n. 101, jan/mar., 2001, pp. 264-282.
85
Lei n° 8.666/93: Art. 55 (…) §2° Nos contratos celebrados pela Administração Pública com pessoas físicas ou
jurídicas, inclusive aquelas domiciliadas no estrangeiro, deverá constar necessariamente cláusula que declare
competente o foro da sede da Administração para dirimir qualquer questão contratual, salvo o disposto no
§6° do art. 32 desta Lei.
22
casos de licitações internacionais, pelo exposto no §6º do art. 3286. Afirma que, “como
exceções à regra geral, tais hipóteses são taxativas e devem interpretar-se restritivamente.” 87.
Ademais, Suzana Domingues Medeiros88, Carlos Alberto de Salles89 e Márcia
Walquiria Batista dos Santos90 entendem que a Lei nº 8.666/93, ao omitir quanto à
arbitragem, retirou autorização à solução arbitral antes existente no art. 45 do Decreto-lei
2.300/86, antecessor à Lei de Licitações, com a redação dada pelo Decreto-lei 2.248/87.
Salles acrescenta que por se ter estabelecido expressamente em outras leis a autorização ao
uso da arbitragem, esta seria vedada aos contratos regidos pela Lei de Licitações.

II.1.3. Posicionamento do Tribunal de Contas da União

O Tribunal de Contas da União (TCU) não admite a solução arbitral de litígios


relacionadas aos contratos administrativos, argumentando que haveria violação dos princípios
da supremacia do interesse público e da legalidade. Ainda nos casos em que há autorização
legal expressa, o TCU decidiu restringir a abrangência na cláusula arbitral91.
O Tribunal posicionou-se acerca do tema pela primeira vez em 1993, ao ser consultado
pelo Ministro de Minas e Energia sobre a possibilidade de adoção de juízo arbitral para
dirimir conflitos relacionados aos contratos firmados entre a CHESF, sociedade de economia
mista, e seus fornecedores. Naquela ocasião, decidiu que “juízo arbitral é inadmissível em

86
Lei n° 8.666/93: Art. 32.(...) §6. O disposto no §4 deste artigo, no §1° do art. 33 e no §2° do art. 55, não se
aplica às licitações internacionais para a aquisição de bens e serviços cujo pagamento seja feito com o
produto de financiamento concedido por organismo financeiro internacional de que o Brasil faça parte, ou
por agência estrangeira de cooperação, nem nos casos de contratação com empresa estrangeira, para a
compra de equipamentos fabricados e entregues no exterior, desde que para este caso tenha havido prévia
autorização do Chefe do Poder Executivo, nem nos casos de aquisição de bens e serviços realizada por
unidades administrativas com sede no exterior.
87
TIBURCIO, Carmen. A Petrobras e a arbitragem. Disponível em <http://www.migalhas.com.br/>. Acesso em
08.01.2013. Também adotam esse entendimento: PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à Lei de
Licitações e Contratações da Administração Pública. 7a ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 629-630;
MEDEIROS, Suzana Domingues. Arbitragem envolvendo o Estado no Direito brasileiro, in Revista de
Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 233, jul./set., 2003, p. 71-101; LIMA, Cláudio Vianna de. A Lei de
arbitragem e o art. 23, XV, da Lei de Concessões. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 209,
jul./set. 1997, p. 91-104.
88
MEDEIROS, Suzana Domingues. Arbitragem envolvendo o Estado no Direito brasileiro, in Revista de Direito
Administrativo, Rio de Janeiro, n. 233, jul./set., 2003, p. 71-101.
89
SALLES, Carlos Alberto de. Arbitragem em Contratos Administrativos.1a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011,
p. 247-248.
90
SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. Licitação internacional. Proibição de previsão de juízo arbitral. In:
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella (org.) Temas polêmicos sobre licitações e contratos. 5a ed. São Paulo:
Malheiros, , pp. 279-281.
91
As decisões do TCU analisadas foram obtidas através do site do Tribunal, com o utilizo da ferramenta
“acórdãos e decisões” e “pesquisa livre”, sendo que o termo utilizado foi “arbitragem”. Em 21.01.2013,
foram encontradas 128 decisões e acórdãos, cuja leitura rápida permitiu a seleção dos casos mencionados.
23
contratos administrativos, por falta de expressa autorização legal e por contrariedade a
princípios básicos de direito público (princípio da supremacia do interesse público sobre o
privado, princípio da vinculação ao instrumento convocatório da licitação e à respectiva
proposta vencedora, entre outros)”92.
O Tribunal também não admite a Lei de Arbitragem como instrumento legal
autorizador da celebração de convenção arbitral por entes e órgãos estatais. Em decisão
relativa à contração de obras de adequação de Trechos Rodoviários na BR -101 no Estado do
Rio Grande do Sul, Divisa SC/RS, o TCU determinou “ao Departamento Nacional de Infra-
Estrutura de Transportes - DNIT que: 9.2.1 suprima as cláusulas 31.7 a 31.7.4 do Edital de
Licitação nº 04/02-0 e as menções à arbitragem na Cláusula Décima Quarta da minuta do
contrato, por serem contrárias ao art. 1º da Lei nº 9.307/96 e ao interesse público, e, portanto,
nulas”93.
Nos casos em que a lei que regula o contrato administrativo prevê expressamente a
arbitragem, o Tribunal de Contas aceita o método de solução de controvérsias. A Instrução
Normativa TCU nº 52, de 4 de julho de 2007, que dispõe sobre o controle e a fiscalização de
procedimentos de licitação, contratação e execução contratual de Parcerias Público-Privadas
(PPP), a serem exercidos pelo Tribunal de Contas da União, dispõe em seu art. 10 que o órgão
ou entidade federal concedente deve manter os documentos de convenções arbitrais no âmbito
de parcerias público-privadas para fins de fiscalização.
Todavia, mesmo nos casos de contratos administrativos para os quais há autorização
legal expressa à arbitragem, o TCU manifesta-se contrariamente à cláusula compromissória,
pois, para o Tribunal, sua abrangência é limitada a questões técnicas. Em levantamento de
auditoria nas obras de construção de unidades estacionárias de produção no exterior da
Petrobras, determinou à empresa estatal que “restrinja a resolução de eventuais litígios

92
TCU, Decisão nº 0286/1993, ATA 29, Plenário, Rel. Homero Santos, j. 15.07.1993, DOU 04.08.1993. Esse
também foi o posicionamento do tribunal nos seguintes Acórdãos: Decisão 0763/1994, Plenário, Rel. Carlos
Átila Álvares da Silva, j. 13.12.1994, DOU 03.01.1995; Decisão 0188/1995, Plenário, Rel. Paulo Affonso
Martins de Oliveira, j. 10.05.1995, DOU 22.05.1995; Acórdão 0584/2003, Segunda Câmara, Rel. Ubiratan
Aguiar, j. 10.04.2003, DOU 28.04.2003; Acórdão nº 0587/2003, Plenário, Rel. Adylson Motta,j. 28.05.2003,
DOU 11.06.2003; Acórdão 0631/2003, Plenário, el. Marcos Vinicius Vilaça, j. 04.06.2003, DOU
13.06.2003; Acórdão 906/2003, Plenário, Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha, j. 16.07.2003; Acórdão
1271, Plenário, Rel. Marcos Bemquerer, j. 24.08.2005, DOU 02.09.2005; Acórdão 1099/2006, Plénário, Rel.
Augusto Nardes, j. 05.07.2006, DOU 10.07.2006; Acórdão 0537/2006, Secunda Câmara, Rel. Walton
Alencar, j. 14.03.2006, DOU 17.03.2006;Acórdão 1330/2007, Plenário, Rel. Raimundo Carreiro, j.
04.07.2007, DOU 06.07.2007; Acórdão 2035/2010, Plenário, Rel. Valmir Campelo, J. 18.08.2010, DOU
27.08.2010.
93
TCU, Acórdão nº 0587/2003, Plenário, Rel. Adylson Motta,j. 28.05.2003, DOU 11.06.2003. Também nesse
sentido: Acórdão n° 1271, Plenário, Rel. Marcos Bemquerer, j. 24.08.2005, DOU 02.09.2005 e Acórdão nº
1330/2007, Plenário, Rel. Raimundo Carreiro, j.'04.07.2007, DOU 06.07.2007.
24
[através da arbitragem] a assuntos relacionados à sua área-fim e disputas eminentemente
técnicas oriundas da execução dos aludidos contratos” 94. Em acompanhamento do processo
de outorga de concessão para prestação do serviço público de transporte ferroviário de
passageiros por meio de Trem de Alta Velocidade, no trecho entre os Municípios do Rio de
Janeiro e de Campinas, o Tribunal decidiu pela “inaplicabilidade da Comissão Técnica e da
Arbitragem para resolução de divergências relativas às questões econômico-financeiras do
contrato de concessão” 95. A mesma decisão foi adotada em acompanhamento de processo de
outorga de concessão de trecho da rodovia BR-101/ES/BA pela ANTT96.
Há autores que sugerem que há uma gradativa mudança no posicionamento do
Tribunal97, que passou a aceitar a arbitragem e apenas restringiu-a à certas matérias. Porém,
da analise dos acórdãos, percebe-se que não houve alteração de entendimento do TCU. A
partir dos votos dos ministros, verificou-se reiteradamente, de 1993 a 2010, decisões
admitindo a arbitragem em caso de lei expressa autorizativa, e outras proibindo-a nos casos de
contratos regidos por leis que não possuem a autorização ao método de solução de
controvérsias. Recente acórdão de 2010 decidiu sobre a inadequação da cláusula do edital de
obras de Centro de Convenções no Município de Umuarama, regido pela Lei nº 8.666/93, que
elegeu a arbitragem como forma de dirimir conflitos98. O que há de novidade nas decisões
mais recentes do TCU é a análise das cláusulas arbitrais dos editais, sendo que o Tribunal tem
definido as matérias que entende não serem passíveis de serem submetidas ao juízo arbitral,
que serão tratadas adiante, no item III.1.

II.1.4. Mapeamento dos argumentos contrários

Os argumentos contrários à convenção arbitral pelo Poder Público expostos podem ser
resumidos nos seguintes itens:

a. Inconstitucionalidade, tendo em vista a “dignidade constitucional” dos serviços


públicos;

94
TCU, Acórdão nº 2094/2009, Plenário, Rel. José Jorge, j. 09.09.2009, DOU 11.09.2009.
95
TCU, Acórdão nº 1796/2011, Plenário,Rel. Augusto Nardes, j. 06.07.2011, DOU 11.07.2011.
96
TCU, Acórdão nº 2573/2012, Plenário, Rel. Min. Raimundo Carreiro, j. 26/09/2012.
97
A questão foi abordada pelo Prof. Gustavo Justino de Oliveira no “III Colóquio de Direito Administrativo,
Aspectos polêmicos envolvendo Arbitragem e Poder Público", que ocorreu na Faculdade de Direto da
Universidade de São Paulo em 16.10.2012.
98
TCU, Acórdão nº 2035/2010, Plenário, Rel. Valmir Campelo, J. 18.08.2010, DOU 27.08.2010.
25
b. Inconstitucionalidade em face do inciso XXXV99 do art. 5º da Constituição Federal;
c. Inconstitucionalidade em face dos incisos LXIX100, LXX101 e LXXIII102 do art. 5º da
Constituição Federal;
d. Indisponibilidade dos bens relacionados aos serviços públicos contratados pela
Administração;
e. Indisponibilidade do interesse público da Administração, que exige autorização legal
expressa para a arbitragem;
f. Violação do princípio da legalidade no caso de convenção arbitral sem autorização
legal expressa;
g. Vedação tácita à possibilidade de instituição de arbitragem envolvendo o Poder
Público no âmbito da Lei nº 8.666/93 tendo em vista o §2 do art. 55103 e o §6º do art.
32104;
h. Vedação à possibilidade de instituição de arbitragem em relação aos contratos regidos
pela Lei nº 8.666/93, pois a omissão interpreta-se como proibição, haja vista a
autorização expressa contida em outras leis, bem como no Decreto-lei nº 2.300/86,
com a redação dada pelo Decreto-lei nº 2.248/87, antecessor à Lei de Licitações;
i. Ilegalidade em face do art. 1º da Lei nº 9.307/96105.

99
“XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
100
“LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por
"habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade
pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”
101
“LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação no
Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em
funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados.”
102
“LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao
patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente
e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do
ônus da sucumbência”.
103
Lei nº 8.666/93: Art. 55 (…) §2º Nos contratos celebrados pela Administração Pública com pessoas físicas ou
jurídicas, inclusive aquelas domiciliadas no estrangeiro, deverá constar necessariamente cláusula que declare
competente o foro da sede da Administração para dirimir qualquer questão contratual, salvo o disposto no
§6° do art. 32 desta Lei.
104
Lei nº 8.666/93: Art. 32. (...) §6º. O disposto no §4º deste artigo, no §1º do art. 33 e no §2º do art. 55, não se
aplica às licitações internacionais para a aquisição de bens e serviços cujo pagamento seja feito com o
produto de financiamento concedido por organismo financeiro internacional de que o Brasil faça parte, ou
por agência estrangeira de cooperação, nem nos casos de contratação com empresa estrangeira, para a
compra de equipamentos fabricados e entregues no exterior, desde que para este caso tenha havido prévia
autorização do Chefe do Poder Executivo, nem nos casos de aquisição de bens e serviços realizada por
unidades administrativas com sede no exterior.
105
Lei n° 9. 307/96: Art. 1° As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios
relativos a direitos patrimoniais disponíveis.
26
II.2. Teses favoráveis à arbitragem para dirimir conflitos decorrentes de contratos
administrativos

Já os autores Caio Tácito106, Gustavo Henrique Justino de Oliveira107, Carlos Ari


Sundfeld e Jacintho Arruda Câmara108, Edison Eduardo Borgo Reinert109, Selma Lemes110 e
Paulo Osternack Amaral111 entendem que a disposição da Lei de Arbitragem que autoriza
pessoas capazes a celebrarem convenção arbitral para dirimir litígios relativos a direitos
patrimonais disponíveis é bastante para permitir tal meio de solução de controvérsias nas
matérias passíveis de contratação pelo Poder Público. Nesse sentido é que os contratos
regidos pela Lei n° 8.666/93 podem ser sujeitos à solução arbitral112.
Passo a analisar, uma a uma, as “respostas” aos argumentos contrários à arbitragem,
agregando também os ensinamentos dos autores favoráveis.

II.2.1 Da constitucionalidade da arbitragem

O Supremo Tribunal Federal tem competência exclusiva para julgar ação de


constitucionalidade de norma federal113. Destarte, foram analisadas algumas de suas decisões
a fim de solucionar a questão da constitucionalidade da arbitragem pelo Poder Público.

106
TÁCITO, Caio. A Arbitragem nos litígios administrativos. Revista de Direito Administrativo, Rio de
Janeiro, n. 210, out/dez, 1997, p. 111-115.
107
OLIVEIRA, Gustavo Henrique Justino de. A arbitragem e as parcerias público-privadas. In: Parcerias
Público-privadas. 1a ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 567-606.
108
SUNDFELD, Carlos Ari. CÂMARA, Jacintho Arruda. O cabimento da Arbitragem nos contratos
administrativos. Revista de Direito Administrativo. FGV, n. 248, maio/ agosto 2008, pp.117-126.
109
REINERT. Edison Eduardo Borgo. Contratos Administrativos e a aplicabilidade de Lei de Arbitragem, in
Revista Brasileira de Direito Público, Belo Horizonte: Fórum, ano 8, n. 28, jan./mar., 2010, pp. 93-112.
110
LEMES, Selma. Arbitragem na Administração Pública: Fundamentos Jurídicos e Eficiência Econômica. São
Paulo: Quartier Latin, 2007.
111
AMARAL, Paulo Osternack. Arbitragem e Administração Pública: aspectos processuais, medidas de
urgência e instrumentos de controle. Belo Horizonte: Fórum, 2012.
112
Alguns autores dividem os contratos celebrados pela Administração Pública entre contratos administrativos e
contratos privados, sendo que os contratos discriminados pelo inciso I do §3°, art. 62 da Lei n° 8.666/93 seria
exemplos de contratos privados. (“Art. 62. (...)§ 3°: Aplica-se o disposto nos arts. 55 e 58 a 61 desta Lei e
demais normas gerais, no que couber: I - aos contratos de seguro, de financiamento, de locação em que o
Poder Público seja locatário, e aos demais cujo conteúdo seja regido, predominantemente, por norma de
direito privado;”). Outro autores ainda não fazem essa diferenciação, entendendo que todos os contratos
firmados pelo Poder Público seriam contratos administrativos, sujeitos em maior ou menos medida ao regime
de direito público, derrogatório do direito privado. Tal dicotomia não tem utilidade prática neste trabalho,
pois admite-se a submissão à arbitragem de todos os contratos regidos pela Lei Geral de Licitações e
Contratações.
113
Constituição Federal de 1988. “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da
Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: a) a ação direta de inconstitucionalidade de
lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo
27
O Supremo Tribunal Federal fez juízo de constitucionalidade, perante a Constituição
de 1967, da arbitrabilidade das causas contra a Fazenda Pública no ultracitado “Caso
Lage”114. No presente caso, o Tribunal decidiu pela constitucionalidade do Decreto-lei nº
9.521/46, que dispôs que o valor da indenização a ser paga pelos bens e direitos confiscados
dos espólios de Henrique Lage e Renaud Lage seria fixado em juízo arbitral, que também
decidiria sobre as impugnações oferecidas pelos espólios, pelos herdeiros e legatários. O
relator, Ministro Bilac Pinto argumentou em seu voto que a interdição do juízo arbitral
importaria numa restrição à autonomia contratual do Estado, que é legitimado a prevenir
litígio pela via transacional.
Discute-se se tal acórdão seria um precedente ainda útil atualmente, na vigência da
Constituição Federal de 1988. A Constituição vigente, tal qual as Constituições anteriores de
1937, 1946 e 1967, não contém qualquer dispositivo que vede de modo expresso a arbitragem
dos litígios envolvendo o Poder Público. Ademais, subsiste ao Estado a capacidade de
contratar, prevista constitucionalmente115. Portanto, a despeito do entendimento de alguns
autores, o decidido no “Caso Lage” continua tendo relevância nos dias atuais.
Alguns autores entendem que o inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal, que
dispõe que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”,
tem como consequência lógica a inconstitucionalidade do art. 18 da Lei de Arbitragem, que
afasta o recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário do laudo arbitral. A questão foi
objeto do “Caso MVB Comercial” 116, no qual o Supremo Tribunal Federal decidiu que “a
manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória, quando da celebração do
contrato, e a permissão legal dada ao juiz para que substitua a vontade da parte recalcitrante
em firmar o compromisso não ofendem o artigo 5º, XXXV, da CF.”. O relator, Ministro
Sepúlveda Pertence, decidiu que “o que a Constituição não permite à lei é vedar o acesso ao
Judiciário da lide que uma das partes que quisesse submeter.”. Portanto, a Constituição
Federal veda a arbitragem obrigatória, porém admite que as questões sobre as quais as partes

federal;(Redação dada pela Emenda Constitucional n° 3, de 1993).”.


114
Supremo Tribunal Federal, Agravo de Instrumento n° 52.181 – GB, Tribunal Pleno, rel. Min. Bilac Pinto, j.
14.11.1973, DJ 15.02.1974. Revista Trimestral de Jurisprudência, n° 68, p. 382-397.
115
Nesse sentido, Constituição Federal de 1988: “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (…)
XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas
diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no
art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, ¨§1º,
III;(Redação dada pela Emenda Constitucional n° 19, de 1998)".
116
Supremo Tribunal Federal, Agravo Regimental em Sentença Estrangeira 5.206-7, Reino da Espanha,
Plenário, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 12.12.2001, DJ 30.04.2004.
28
possam transigir sejam dirimidas por juízo arbitral. É a realização do princípio do juiz natural,
através da mútua concessão das partes117.
Carmona enfatiza que a arbitragem de questões nas quais o Estado é partes também
não contraria o art. 109, inciso I da Constituição Federal, que confere a competência aos
juízes federais para processar e julgar as causas em que a União, entidade autárquica ou
empresa pública federal foram parte: “a regra constitucional citada estabelece apenas e tão
somente distribuição de competência entre os órgãos do Poder Judiciário brasileiro, de modo
que se uma demanda for proposta perante tais órgãos caberá ao juiz federal decidi-la.”118. Na
mesma toada manifestaram-se Castro Nunes119 e Mendes Pimentel120. Moreira Neto ensina
que o monopólio de jurisdição é diferente do monopólio da justiça, sendo que somente o
primeiro é possível ante a “busca de justiça'” inerente ao ser humano121.
Também há autores que levantam argumentos de inconstitucionalidade
especificamente relativos à arbitragem nos contratos administrativo. Lúcia Valle Figueiredo
afirma que a arbitragem seria inconstitucional perante os dispositivos que estabelecem o
direito ao mandado de segurança e ação popular. Ocorre que não há impedimento para a que
tais ações sejam propostas perante o Poder Judiciário, pois a convenção arbitral vincula
apenas as partes, ou seja, a Administração Pública e o privado com que contratou. Eventual
arbitragem tem como objeto os litígios relativos às obrigações que envolvem as partes
contratuais, enquanto o mandado de segurança ou a ação popular tem como objeto questões
que envolvam interesse de terceiro ou interesse geral (lesão ao patrimônio público, à
moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural), maculado
pela execução do contrato administrativo. Portanto, não há incompatibilidade entre a
arbitragem e mandado de segurança e ação popular propostos perante ao Poder Judiciário,
pois as partes do processo e o objeto da causa são diferentes.

117
AMARAL, Paulo Osternack. Arbitragem e Administração Pública: aspectos processuais, medidas de
urgência e instrumentos de controle.Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 59.
118
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei n° 9.307/96. 3a ed. São Paulo:
Atlas, 2009, p. 47.
119
Castro Nunes, Da Fazenda Pública em Juízo. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1950, p. 281, apud LEMES,
Selma. Arbitragem na Administração Pública. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 77.
120
PIMENTEL, F Mendes. Fronteiras Interestaduais Pareceres, Contestação à ação de nulidade de sentença
arbitral. RF, p. 26/38, julho a dezembro, 1916. apud LEMES, Selma. Arbitragem na Administração Pública.
São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 77.
121
“É chegada, assim, a hora da consensualidade alcançar também a solução dos conflitos pela larga viam já
extensamente desenvolvida universalmente, que vem a ser a ampla adoção da arbitragem, afastando-se, de
vez, a confusão entre monopólio da jurisdição, que tem sentido coercitivo, e um inexistente monopólio da
justiça, uma vez que é a força do consenso das partes em conflito que leva a uma fórmula de composição.”
(MOREIRA NETO, Diogo Figueiredo. Mutações do Direito Público. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 263.)
29
Um último argumento de inconstitucionalidade da arbitragem nos contratos
administrativos diz respeito à “dignidade constitucional” do serviço público, objeto de alguns
destes contratos. De fato, a Constituição Federal prevê um regime especial aos serviços
públicos, de titularidade do Poder Público e prestados por este ou por particulares, sob regime
de concessão ou permissão122. Todavia, não há disposição constitucional que permita concluir
que as questões havidas da execução dos contratos de prestação de serviço público não
possam ser sujeitas à apreciação arbitral. A questão da indisponibilidade do interesse público,
também por vezes relacionada a tal discussão, será analisada mais adiante. O que se percebe é
a rejeição imotivada de certos autores à solução arbitral, que consideram que a decisão de
“meros” árbitros num grau inferior à decisão judicial, preconceito que não encontra
fundamento objetivo.
Mesmo assim, o argumento de “dignidade superior” dos serviços públicos não se
aplica a diversos contratos regidos pela Lei nº 8.666/1993 – contratos de obras, serviços,
compras, alienações -, que não estão relacionados diretamente à prestação de serviços
públicos. É possível que o objeto de um dos tipos de contratos previstos na Lei de Licitações e
Contratações Públicas sirva para a execução de determinado serviço público, porém não é a
prestação deste que é contratada – senão, tratar-se-ia de contrato de concessão de serviço
público.
Não só a arbitragem não é inconstitucional, como é constitucionalmente
recomendável. Eros Grau enfatiza que, não apenas a arbitragem pelo Poder Público é
constitucional, como é solução recomendável perante os princípios constitucionais da
eficiência administrativa (art. 37, caput) e a razoável duração dos processos (art. 5º,
LXXVIII)123.

II.2.2. Compatibilidade entre §2º do art. 55 e o §6º do art. 32 da Lei nº 8.666/93 e a


arbitragem

O art. 55, §2º, da Lei nº 8.666/93 dispõe que os contratos celebrados pela
Administração Pública deverão conter cláusula que declare a sede da Administração como
foro para dirimir qualquer questão contratual. O §6º do art. 32 admite exceção à regra nos

122
Constituição Federal, art. 175.
123
GRAU, Eros. Arbitragem e contrato administrativo. Revista da Escola Paulista da Magistratura, v. 3, n. 2,
jul./dez., 2002, p. 49-58.
30
casos de licitações internacionais. Tais dispositivos são compatíveis com a arbitragem124, pois
esta não afasta a necessidade de recorrer ao juiz para se requerer a imposição dos atos de
força125, como para o ajuizamento de eventual ação de execução ou de anulação de sentença
arbitral126. A Lei de Arbitragem também reserva à apreciação do Poder Judiciário a resistência
de uma das partes quanto à instituição da arbitragem127 ou a nomeação dos árbitros na falta de
acordo128; a fixação de honorários do árbitro, no caso de falta de estipulação das partes129 e a
apreciação de controvérsias acerca de direitos indisponíveis sobrevindas no curso da
arbitragem130. Portanto, a cláusula de eleição de foro pode coexistir com convenção arbitral,
sendo, aliás, bem-vinda, por eliminar eventual demora na solução da lite decorrente de dúvida
quanto ao juízo competente.

II.2.3. Da legalidade da arbitragem: a suficiência do disposto na Lei de Arbitragem

Não há dúvidas quanto à submissão do Poder Público ao princípio da legalidade.


Ocorre que, no debate sobre a arbitragem para dirimir conflitos relativos à contratos
administrativos, discute-se qual é o nível de detalhamento legal a fim de que o princípio da

124
Nesse sentido: AMARAL, Paulo Osternack. Arbitragem e Administração Pública: aspectos processuais,
medidas de urgência e instrumentos de controle. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p.62; OLVEIRA, Gustavo
Henrique Justino de. A arbitragem e as parcerias público-privadas. In: Parcerias Público-privadas. 1a ed. São
Paulo: Malheiros, 2007, p. 567-606.
125
Lei nº 9.307/1996. “Art. 22. Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral tomar o depoimento das partes, ouvir
testemunhas e determinar a realização de perícias ou outras provas que julgar necessárias, mediante
requerimento das partes ou de ofício. (...)§ 4º Ressalvado o disposto no §2º, havendo necessidade de medidas
coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão solicitá-las ao órgão do Poder Judiciário que seria,
originariamente, competente para julgar a causa.”
126
Lei nº 9.307/1996. “Art. 33. A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a
decretação da nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos nesta Lei.”
127
Lei nº 9.307/1996. “Art. 6º (...)Parágrafo único. Não comparecendo a parte convocada ou, comparecendo,
recusar-se a firmar o compromisso arbitral, poderá a outra parte propor a demanda de que trata o art. 7º desta
Lei, perante o órgão do Poder Judiciário a que, originariamente, tocaria o julgamento da causa.
Art. 7º Existindo cláusula compromissória e havendo resistência quanto à instituição da arbitragem, poderá a
parte interessada requerer a citação da outra parte para comparecer em juízo a fim de lavrar-se o
compromisso, designando o juiz audiência especial para tal fim. ”
128
Lei nº 9.307/1996. “Art. 13. (…) §2º Quando as partes nomearem árbitros em número par, estes estão
autorizados, desde logo, a nomear mais um árbitro. Não havendo acordo, requererão as partes ao órgão do
Poder Judiciário a que tocaria, originariamente, o julgamento da causa a nomeação do árbitro, aplicável, no
que couber, o procedimento previsto no art. 7º desta Lei..”
129
Lei nº 9.307/1996. “Art. 11. (...) Parágrafo único. Fixando as partes os honorários do árbitro, ou dos árbitros,
no compromisso arbitral, este constituirá título executivo extrajudicial; não havendo tal estipulação, o árbitro
requererá ao órgão do Poder Judiciário que seria competente para julgar, originariamente, a causa que os fixe
por sentença.”
130
Lei nº 9.307/1996. “Art. 25. Sobrevindo no curso da arbitragem controvérsia acerca de direitos indisponíveis
e verificando-se que de sua existência, ou não, dependerá o julgamento, o árbitro ou o tribunal arbitral
remeterá as partes à autoridade competente do Poder Judiciário, suspendendo o procedimento arbitral. “
31
legalidade seja atendido, a fim de que o juízo arbitral seja permitido ao contratos
administrativos. Diversos autores reputam necessária disposição legal expressa que autorize a
arbitragem dos conflitos decorrentes de contratos administrativos. Já outros autores entendem
que a disposições da Lei de Arbitragem são bastantes para autorizar a arbitragem pela
Administração Pública.
Alguns autores tomam por base as disposições já existentes em campos específicos,
como é o caso da Lei de Concessões, e comparam-na à ausência de previsão da Lei nº
8.666/93 para concluir pela vedação tácita da arbitragem aos contratos regidos pela Lei Geral
de Licitações e Contratações Públicas. Trata-se de uma comparação desmedida, pois há uma
distinção entre os contratos que a Administração celebra com particulares visando à atribuição
de funções próprias do Estado (serviço público) e os contratos que celebra com os particulares
visando interesses primários (compras, contratação de obra ou serviço, locações)131. Como já
analisado no Capítulo I, item I.4, o regime derrogatório dos contratos administrativos
justifica-se em razão da função pública que permeia seu objeto. Por isso é que no caso dos
contratos de concessão e permissão de serviço público, é necessário prever a cláusula arbitral
em lei, pois a regra nesses contratos é a posição de superioridade da Administração Pública
para preservação da finalidade pública. A previsão legal de cláusula arbitral como conteúdo
facultativo do edital garante que o poder exorbitante de modificação unilateral do contrato
não atinja a cláusula compromissória, dando-lhe a devida efetividade.
Diferentemente, os contratos regidos pela Lei nº 8.666/93 não estão diretamente
relacionados à prestação de serviços públicos. Por exemplo, ainda que a Administração
contrate a construção de um edifício para depois utilizá-lo como local de prestação de serviço
público, não há uma relação imediata entre o interesse da Administração em obter o edifício
em troca de um bom preço e a prestação do serviço público em tela132. Portanto, nos contratos
dispostos na Lei nº 8.666/93, há menos espaço para o regime de exorbitância, sendo mais

131
Tal apontamento foi feito por Eros Grau. (Arbitragem e contrato administrativo. Revista da Escola Paulista
da Magistratura, v. 3, n. 2, jul/dez, 2002, p. 49-58.).
132
Há autores que entendem que a prestação de serviço não econômico constitua serviço público. Vitor Rhein
Schirato, em artigo sobre as parcerias público-privadas, afirma que a previsão legal das concessões
administrativas expandiu a oção brasileira de serviço público, pois permitiu a concessão de outros serviços de
interesse direto da Administração além dos serviços públicos econômicos. (SCHIRATO, Victor Rhein. A
noção de serviço público nas parcerias público-privadas. Revista de Direito Público da Economia. Belo
Horizonte: Fórum, ano 5, n. 20 out./dez, p. 219-235).
Porém, também em referência à Lei nº 11.079/2004 (“Lei de PPPs”), há autores, como Carlos Ari Sundfeld,
que entendem que as concessões administrativas de serviços ao Estado são diferentes das concessões
administrativas de serviços públicos. (SUNDFELD, Guia Jurídico das Parcerias Público-Privadas. In:
SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Parcerias Público Privadas, São Paulo: Malheiros, 2005).
32
adequada a utilização de um regime próximo ao regime de direito privado133. Nesses
contratos, deve-se dar mais espaço à flexibilidade e à consensualidade, não se podendo
comparar a ausência de disposição na Lei Geral de Licitações e Contratações com a
disposição da Lei de Concessões.
Outros autores ainda fazem a comparação entre omissão da Lei nº 8.666/93 e o
disposto no Decreto-lei nº 2.300/86, com a redação dada pelo Decreto-lei nº 2.248/87,
antecessor à Lei de Licitações, que vedava a arbitragem expressamente, com exceção das
concorrências internacionais, em que era permitida134. O Projeto de Lei nº 1.491/1991,
proposto pela Câmara dos Deputados, que posteriormente deu origem à Lei Geral de
Licitações de 1993, já era omisso quanto à previsão de arbitragem. Ainda que previsse a
criação da Câmara de Arbitragem de Licitações Pública, a ser organizada por cada esfera de
governo, composta igualmente por representantes da Administração Pública, de entidades
representativas da atividade privada e do Tribunal de Contas135, as decisões proferidas por tal
Câmara seriam definitivas apenas na esfera administrativa. O procedimento proposto,
portanto, não se configura em arbitragem por não ter a aptidão de substituir decisão judicial.
Mesmo assim, tal disposição não foi trazia ao texto final da Lei nº 8.666/93.
Diante da ausência de previsão da arbitragem pela Lei nº 8.666/93, questiona-se se tal
omissão deve ser interprestada como proibição. Ora, a análise da arbitrabilidade dos contratos
regidos pela Lei Geral de Licitações e Contratações Públicas não se limita ao disposto nesta
lei. Não há óbice que a autorização à arbitragem esteja fora da Lei nº 8.666/93, como ensinam
Carlos Ari Sundfeld e Jacintho Arruda Câmara:
“A legislação sobre contratações públicas não é exaustiva
quanto à instituição de modelos contratuais que podem ser empregados
pela Administração. Muito pelo contrário. As contratações públicas
foram disciplinadas de maneira genérica, prevendo-se cláusulas gerais
que deveriam constar em qualquer tipo de pacto, mas sem excluir outras

133
MENEZES DE ALMEIDA, Fernando Dias. Contrato Administrativo. São Paulo: Quartier Latin, 2012,
p.229-231.
134
Decreto-lei n° 2.300/86. “Art. 25(...)§13. O disposto no §2º do artigo 3º, no §10 do artigo 25, no §1º do artigo
26 e no parágrafo único do artigo 45, não se aplica às concorrências internacionais, para a aquisição de bens
ou serviços cujo pagamento seja feito com o produto de financiamento concedido por organismo
internacional, de que o Brasil faça parte, nem nos casos de contratação com empresa estrangeira, para a
compra de equipamentos fabricados e entregues no exterior, desde que para este caso tenha havido prévia
autorização do Presidente da República. (Incluído pelo Decreto-lei nº 2.348, de 1987).(...) Art 45.
(...)Parágrafo único. Nos contratos celebrados pela União Federal ou suas autarquias, com pessoas físicas ou
jurídicas domiciliadas no estrangeiro, deverá constar, necessariamente, cláusula que declare competente o
foro do Distrito Federal para dirimir qualquer questão contratual, salvo o disposto no §13, do artigo 25,
permitido nesses casos o Juízo arbitral. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 2.348, de 1987).”
135
Art. 88 do Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 1.491/1991, de autoria do Deputado Luis Roberto
Ponte.
33
previsões. Qualquer modelo contratual previsto em lei, desde que não
contrarie as previsões específicas da Lei 8.666/93, pode ser empregado
pelas entidades integrantes da Administração Pública. Assim ocorre
com a arbitragem.”136\

Diante a falta de disposição legal expressa na Lei Geral de Licitações e Contratações


Pública, cabe analisar se a Lei nº 9.307/1996, que regula a arbitragem de modo geral, também
autoriza a arbitragem pelo Poder Público.
Em primeiro lugar, não há qualquer disposição no texto da Lei de Arbitragem que a
repute como “norma de direito privado”. E, ainda que assim fosse, art. 54 da Lei nº 8.666/93
autoriza a aplicação supletiva das disposições de direito privado137.
Em segundo lugar, o art. 1º da Lei de Arbitragem é claro quanto (i) àqueles que podem
celebrar convenção arbitral e (ii) a matéria que pode ser sujeita à arbitragem. Veja-se: “As
pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a
direitos patrimoniais disponíveis.”. A Administração Pública enquadra-se no primeiro
requisito, pois detém capacidade de contratar, prevista inclusive constitucionalmente, no art.
37, inciso XXI. No tópico seguinte, será abordada a questão do objeto da arbitragem ser
somente relativo a direitos patrimoniais disponíveis. Por ora, basta concluir pela
arbitrabilidade subjetiva das causas do Poder Público.
Cabe salientar que previsão genérica da Lei de Arbitragem diferencia-se muito do
detalhismo da Lei Geral de Licitações e Contratações Públicas, daí a dificuldade se aplicarem
os dois modelos legais contemporaneamente138: um que cerca o gestor público, procurando
minar a discricionariedade (Lei nº 8.666/93) e outro que dá uma opção, uma faculdade, ao
administrador (Lei nº 9.307/96). A arbitragem figura-se como mais um instrumento de
unidade contratual, posta à disposição do gestor público e daqueles que contratarem com a

136
SUNDFELD, Carlos Ai. CÂMARA, Jacintho Arruda. O cabimento da Arbitragem nos contratos
administrativos. Revista de Direito Administrativo. FGV, n. 248, maio/ agosto 2008, pp.117-126.
137
Lei nº 8.666/93. “Art. 54. Os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas e
pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos
contratos e as disposições de direito privado.”
138
André Janjácomo Rosilho fala dos modelos legais minimalista e maximalistas em termos de licitações,
descrevendo o primeiro como uma norma-guia para que a discricionariedade administrativa, “importante
ingrediente” dos tos administrativos, atinja os objetivos desejados; enquanto o modelo maximalista pressupõe
uma norma detalhada a fim de cercar a discricionariedade do gestor. (ROSILHO, André Janjácomo. Qual é o
modelo legal das licitações no Brasil? As reformas legislativas federais no sistema de contratações públicas.
São Paulo: Fundação Getúlio Vargas – Escola de Direito. Dissertação de Mestrado, 2011, p. 21-23.
Disponível em <bibliotecadigital.fgv.br/>. Acesso em 15 de janeiro de 2013.)Tal divisão parece se encaixar
também neste trabalho, eis que a arbitragem é faculdade do gestor público, pressupõe uma decisão deste,
enquanto os dispositivos da Lei Geral de Licitações e Contratações Públicas deixam pouco espaço para a
escolha do administrador.
34
Administração para sinalizar que o contrato será seguido e que eventuais litígios serão
solucionados de forma eficaz. A diferença entre o modelo legal da Lei de Arbitragem e da Lei
Geral de Licitações e Contratações é positiva: é em razão dela que a autorização à arbitragem
aos litígios surgidos na execução dos contratos regidos pela Lei nº 8.666/93 traz o regime
desta lei mais próximo ao modelo de atuação da Administração Pública consensual. Assim,
através de instrumento externo à Lei nº 8.666/93, seu regime ganha novos contornos,
adaptando-se ao paradigma atual de atuação consensual.
A disposição genérica da Lei de Arbitragem é desejável, pois, por sua baixa densidade
normativa139, dá espaço para que o agente público exerça seu poder discricionário,
estabelecendo o conteúdo da cláusula arbitral ou de compromisso arbitral140. Assim o é
devido a complexidade dos contratos administrativos firmados pelo Poder Público, que cada
vez mais exigem modulações específicas às peculiaridades concretas. A lei está em
consonância com o processo de deslegificação dos sistemas jurídicos, caracterizado pela
atribuição de maior liberdade ao poder normativo do Poder Executivo, através de estipulações
mais genéricas, principiológicas.
Lúcia Valle Figueiredo afirma que

“o princípio da legalidade não pode ser compreendido de


maneira acanhada, de maneira pobre. E assim seria se o
administrador, para promover, para praticar determinado ato
administrativo, tivesse sempre de encontrar arrimo expresso em
norma específica, que dispusesse exatamente para aquele caso
concreto.”141.

Portanto, não é de se esperar que cada lei sobre contratações públicas preveja
expressamente a arbitragem, e que cada previsão legal à arbitragem contenha detalhadamente
o conteúdo da convenção arbitral. A Lei de Arbitragem já coloca à disposição de quem tem
capacidade de contratar – inclusive a Administração Pública - o instrumental necessário para
que a arbitragem seja (ou não) o método de solução de controvérsia escolhido.

139
Termo de Alexandre Santos de Aragão. (ARAGÃO, Alexandre Santos de. O princípio da legalidade e poder
regulamentar no Estado contemporâneo. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 225, jul./set.,
2001, pp. 109-129.).
140
Nesse sentido: “Politiquement la théorie de la légalité est le siège d'un conflit entre deux grands intérêts:
l'exigence de garanties au profit des administrés pousse, on vient de le voir, à developper à l'extrême la
limitation de l'administration; mais, à l'inverse, le pouvoir administratif a besoin de liberté d'ation. Cette
liberté d'action est assurée au moyen de techniques diverses, dont l'une est d'une application normale et
courante: c'est le pouvoir discrétionnaire; alors que d'autres, exceptionnelles ou casuelles, trouvent leur
expression dans les théories des circonstances exceptionnelles et des actes de gouvernement.”
(LAUBADÉRE, André de. VENEZIA, Jean-Claude. GAUDEMET, Yves. Traité de droit administratif.
Tomo I. 15a ed. Paris: LGDJ, 1999, p. 639.)
141
FIGUEIREDO, Lúcia Valle Figueiredo, Curso de Direito Administrativo. 9ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
35
II.2.4. Dos direitos patrimoniais disponíveis no âmbito dos contratos administrativos

A Lei nº 9.307/96 prevê que só podem ser objeto de arbitragem os litígios relativos a
direitos patrimoniais disponíveis. A patrimonialidade caracteriza-se pelo valor econômico dos
direitos, ou seja, direitos cuja violação enseja reparação e compensação monetária. No que
tange a disponibilidade, Carlos Alberto Carmona explica que
“um direito é disponível quando ele pode ser ou não exercido
livremente pelo seu titular, sem que haja norma cogente
impondo o cumprimento do preceito, sob pena de nulidade ou
anulabilidade do ato praticado com sua infringência. Assim, são
disponíveis (do latim dispondere, dispor, pôr em vários lugares,
regular) aqueles bens que podem ser livremente alienados ou
negociados, por encontrarem-se desembaraçados, tendo o
alienante plena capacidade jurídica para tanto.”142

Em outra palavras, há um direito é disponível quando a questão é passível de


resolução extrajudicial. Cabe salientar que a existência de direitos e deveres previstos em lei
que tangenciam a questão levada ao juízo arbitral não têm o condão de afastar a arbitragem,
tanto que a Lei de Arbitragem autoriza o direito como critério de julgamento. Se assim fosse,
o árbitro só estaria autorizado a julgar por equidade, pois qualquer lei aplicada seria o atestado
de sua incompetência.
No caso dos contratos administrativos, o cumprimento dos deveres contratuais poderá
ser espontâneo, não sendo lógico que as mesma hipótese não possa ser submetidas à
arbitragem. Como bem coloca Paulo Osternack Amaral:
“Se o conflito patrimonial puder ser legitimamente resolvido
diretamente pelas partes, sem a intervenção estatal (i.e.,
extrajudicialmente), não parece razoável que a mesma solução
não possa ser atingida por meio de processo arbitral, que é
permeado de um amplo rol de garantias, em especial a do devido
processo legal”143

Os direitos indisponíveis são tomados por alguns autores como sinônimo da


indisponibilidade do interesse público sobre o particular, princípio clássico do Direito

142
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei nº 9.307/96. 3ª ed. São Paulo:
Atlas, 2009, p. 38.
143
AMARAL, Paulo Osternack. Arbitragem e Administração Pública: aspectos processuais, medidas de
urgência e instrumentos de controle. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 54 e 82.
36
Administrativo. Tais autores interpretam o art. 1º da Lei de Arbitragem como uma vedação ao
emprego da arbitragem para dirimir conflitos de contratos administrativos.
Percebe-se que há uma confusão entre os direitos disponíveis e interesses
disponíveis144: Enquanto os primeiros relacionam-se à indisponibilidade material (de bens) ou
normativa (regras), os segundos relacionam-se à indisponibilidade de fins (princípios ou
valores). A arbitragem nos contratos administrativos é possível sem que haja a violação dos
direitos, normas ou interesses indisponíveis145.
Quanto aos bens, a arbitragem sobre contratos administrativos não necessariamente
relaciona-se a um bem indisponível. Floriano Azevedo Marques, em ensaio sobre emprego
econômico de bens públicos, salienta que estes não são necessariamente indisponíveis, mas
possuem uma disponibilidade condicionada146. Nesse sentido, observa que não existe uma
“inalienabilidade intrínseca aos bens públicos. O que existe são utilidades insuprimíveis que
tornam o bem inalienável enquanto não for possível oferecê-las sem o seu concurso.”. Ainda
sim, no caso dos contratos administrativos, o problema da inalienabilidade não se põe, pois a
Administração Pública, ao contratar, compromete-se ao cumprimento das obrigações

144
Marçal Justen Filho também atenta para a confusão feita pela doutrina, e afirma: “indisponibilidade dos
interesses sob tutela estatal não significa a indisponibilidade dos direitos de que a Administração Pública é
titular.” (Comentários à lei e licitações e contratos administrativos. 14ª ed. São Paulo: Dialética, 2010, p.
563.).
145
Tal classificação é de Carlos Alberto de Salles SALLES, (Arbitragem em Contratos Administrativos.1ª ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2011, p.291-295). O autor, ao atentar para a imprecisão da doutrina ao empregar o
princípio da indisponibilidade do interesse público, distinguiu quatro possíveis indisponibilidades: (i)
indisponibilidade material, (ii) indisponibilidade normativa; (iii) indisponibilidade de jurisdição e (iv)
interesse público finalístico. A essas, Juliana Palma incluiu uma quinta: a indisponibilidade do dever de agir
da Administração (Atuação administrativa consensual: estudo dos acordos substitutivos no processo
administrativo sancionador. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo,
2010, p. 46). A primeira é a indisponibilidade a qual são sujeitos os bens coletivos, por exemplo o meio
ambiente ou um bem de valor cultural, pois não podem ser desafetados. Os demais bens públicos não são,
como se costuma dizer, indisponíveis, mas teriam uma disponibilidade condicionada à observância de
requisitos substanciais e procedimentais, com destaque para a desafetação e mudança de titularidade dos bens
públicos (MARQUES NETO, Floriano de Azevedo Marques. Bens Públicos: função social e exploração
econômica. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p. 304-305). A indisponibilidade normativa, por sua vez, é a
impossibilidade de se afastar a aplicação de uma norma, como ocorre com diversas regras processuais, bem
como as normas da Constituição. Já a indisponibilidade de jurisdição, ou reserva de jurisdição, pressupõe a
necessária submissão à jurisdição brasileira, como é por exemplo a instauração de inventário e partilha de
bens situados no Brasil (Código de Processo Civil, art. 89). Acrescenta-se também a essa classificação os
casos em que se há a necessidade de processo jurisdicional para que alguns atos administrativos se efetivem,
como é o desapropriação. Por sua vez, a indisponibilidade finalística é admitida como a perseguição
compulsória de interesses maiores em detrimento de interesses privados ou dos agentes públicos. Por último,
a indisponibilidade do dever de agir da Administração seriam os casos em que o Poder Público não poderia
se omitir.
146
Para os bens de uso comum e de uso especial, é necessária a desafetação, que é a retirada da destinação do
bem. Ademais, o art. 17 da Lei nº 8.666/1993 prevê os requisitos de alienação dos bens públicos e estabelece
a exigência de demonstração de interesse público, prévia avaliação, licitação e, no caso de bens imóveis,
autorização legislativa. No caso de bens imóveis da União, a Lei nº 9.636/98 exige autorização do Presidente
da República.
37
pactuadas. Por tal razão que há previsão legal de necessidade de dotação orçamentária para a
realização de contratações públicas147. Assim, o valor a ser pago em virtude de contrato não
pode ser obstaculizado sob o argumento de indisponibilidade dos bens públicos.
Também não é o caso de indisponibilidade normativa, que consiste na impossibilidade
de se afastar a aplicação de uma norma. Em primeiro lugar, a arbitragem não significa que a
lei deixará de ser observada, mas é através da arbitragem que se aplicará o direito no caso
concreto. Caberá ao árbitro aplicar as normas vigentes, obrigando o Poder Público a realizar o
que lhe é devido legalmente. Em segundo lugar, as partes envolvidas podem solucionar os
conflitos sem que seja necessária a intervenção judicial, não havendo de se falar em direito
indisponível.
Por último, cabe-nos especial atenção à indisponibilidade finalística, ou seja,
indisponibilidade do interesse público. Nas palavras de Diogo de Figueiredo Moreira Neto, as
modalidades de composição de conflitos não conduzem à negociação do interesse público,
mas de negociação dos modos de atingi-lo com maior eficiência148. Passa-se a tratar da
questão com mais detalhe.

II.2.5. Da imprecisão da indisponibilidade do interesse público para resolver a questão

147
Lei nº 8.666/1993: Art.57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos
respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos:
I - aos projetos cujos produtos estejam contemplados nas metas estabelecidas no Plano Plurianual, os quais
poderão ser prorrogados se houver interesse da Administração e desde que isso tenha sido previsto no ato
convocatório;
II - à prestação de serviços a serem executados de forma contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada
por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a
administração, limitada a sessenta meses; (Redação dada pela Lei n° 9.648, de 1998)
III – (Vetado). (Redação dada pela Lei n° 8.883, de 1994)
IV - ao aluguel de equipamentos e à utilização de programas de informática, podendo a duração estender-se
pelo prazo de até 48 (quarenta e oito) meses após o início da vigência do contrato.
V - às hipóteses previstas nos incisos IX, XIX, XXVIII e XXXI do art. 24, cujos contratos poderão ter
vigência por até 120 (cento e vinte) meses, caso haja interesse da administração. (Incluído pela Lei n° 12.349,
de 2010)
(...)
Art. 65. (...)§ 8º A variação do valor contratual para fazer face ao reajuste de preços previsto no próprio
contrato, as atualizações, compensações ou penalizações financeiras decorrentes das condições de pagamento
nele previstas, bem como o empenho de dotações orçamentárias suplementares até o limite do seu valor
corrigido, não caracterizam alteração do mesmo, podendo ser registrados por simples apostila, dispensando a
celebração de aditamento.
148
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do Direito Público. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p.
346.
38
O interesse público é de difícil precisão149. Carlos Alberto de Salles chega a afirmar
que a indisponibilidade do interesse público é critério irrelevante para determinar a
arbitrabilidade dos conflitos travados pela Administração Pública por ser um conceito
demasiadamente genérico150. É necessário analisar o que se entende por interesse público para
que seja possível concluir se se trata de parâmetro útil (ou não) de distinção da arbitrabilidade
objetiva.
Celso Antonio Bandeira de Mello conceitua o interesse público como “interesse do
todo”, interesse “que transcende os interesses próprios de cada um”, ou ainda “dimensão
pública dos interesses individuais”, afirmando que tais interesses prevalecem sobre os
interesses particulares151. Edmir Netto de Araújo, por sua vez, define interesse público como
“interesse da coletividade”152.
Tais definições explicam de quem são os interesses públicos, mas não define como
acessá-los, não diz quais são tais interesses. Admite-se, é claro, que o conteúdo do interesse
público varie no tempo e conforme a situação, e, portanto, uma definição que enumere o seu
conteúdo também seria falha. Mas é de se pensar a quem se incumbirá a tarefa de defini-lo no
caso concreto e com qual critério.
Gustavo Binenbojm atenta que a vagueza do conceito é proposital desde sua origem.
Explica o autor que o princípio do interesse público foi criado como sendo o interesse da
pessoa do Estado, em contraposição ao interesse dos cidadãos, e serviria para dar legitimidade
ao conjunto de privilégios do regime jurídico administrativo, afastando a isonomia entre a
Administração Pública e os cidadãos153. Como na França, berço do Direito Administrativo, o

149
Tal percepção é compartilhada André Laubaudére, Jean-Claude Venezia e Yves Gaudamet (Traité de droit
administratif. Tome 1. 15ª ed. Paris: LGDT, 1999, p. 49), para quem o “intérêt général” não é preciso o
suficiente para servir de critério para a incidência do regime de direito administrativo. Tercio Sampaio Ferraz
Junior considera o interesse público com um lugar-comum (Interesse Público. Revista do Ministério Público
do Trabalho da 2ª Região, Centro de Estudos, n. 1, 1995, p. 10).
150
Carlos Alberto de Salles. Arbitragem em Contratos Administrativos.1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p.
128). O autor entende ser necessária autorização legal para que determinado conflito tendo como parte a
Administração seja dirimido através da arbitragem e afirma que o critério do interesse público é suprido por
lei autorizadora da arbitragem (pp.219 e 288).
151
MELLO, Celso Antonio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 28ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p.
59-62.
152
ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de Direito Administrativo. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 72.
153
Portanto, sequer seria possível se falar em interesse primário ou secundário, pois todos os interesses públicos
seriam secundários. Tal distinção foi criada por Renato Alessi, que para quem o interesse público primário é
formado do complexo de interesses individuais prevalentes em determinada sociedade, enquanto o interesse
público secundário limita-se ao interesse da Administração como pessoa jurídica. (ALESSI, Renato. Sistema
istituzionale del diritto amministrativo italiano. 2ª ed. Milão: Giuffrè Editora, 1958, p. 179-180). Massimo
Severo Gianini observa que a clássica divisão de Alessi entre interesse público primário e secundário é
demasiadamente simplificadora, pois até mesmo os interesses da esfera pública são heterogêneos (Diritto
Amministrativo. Volume Primo. 3ª ed. Milano: Giufrrè, 1993, p. 111.
39
Conselho de Estado era o único autorizado à controlar os atos da Administração Pública - ante
uma concepção rígida de separação dos poderes -, a escolha do que seria o interesse público
era inteiramente pela Administração Pública154. Os administrados eram meramente
beneficiários da decisão administrativa, não lhes sendo dado participar desta.
Ocorre que, atualmente, a discricionariedade administrativa não é apenas limitada pela
lei, mas também pela Constituição Federal, que protege e persegue direitos individuais e
coletivos em pé de igualdade, e demais princípios do ordenamento. Com o advento do
constitucionalismo, “a Constituição transforma-se em filtro através do qual se deve ler todo o
direito infraconstitucional”155. Diante da heterogeneidade de princípios fundamentais
dispostos na Constituição Federal, não se admite que um princípio seja superior, sob pena de
anular os demais princípios156. Como consequência, conclui-se que não existe supremacia
absoluta do interesse público.
O próprio Supremo Tribunal Federal, em sede de recurso extraordinário, afastou a
aplicação do interesse público de forma absoluta. O Tribunal decidiu que
“em regra, os bens e o interesse público são indisponíveis,
porque pertencem à coletividade. É, por isso, o Administrador,
mero gestor da coisa pública, não tem disponibilidade sobre os
interesses confiados à sua guarda e realização. Todavia, há casos
em que o princípio da indisponibilidade do interesse público
deve ser atenuado, mormente quando se tem em vista que a
solução adotada pela Administração é a que melhor atenderá à
ultimação deste interesse.”157.

Porém, não se pode ignorar que há uma série de previsões legais que normativizaram
interesses, tanto coletivos como individuais. Marçal Justen Filho, que também observa que o
interesse público não tem conteúdo próprio, sugere que o conteúdo do interesse público seja

154
BINENBOJM, Gustavo. Da supremacia do interesse público ao dever de proporcionalidade: um novo
paradigma para o Direito Administrativo. Revista de Direito Administrativo, n. 239. Rio de Janeiro: Renovar,
jan./março 2000, p. 1-31.
155
BARROSO, Luís Roberto. O Estado Contemporâneo, os Direitos Fundamentais e a Redefinição da
Supremacia do Interesse Público. In: Interesses Públicos versus Interesses privados: descontruindo o
princípio de supremacia do interesse público. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. vii- xvii.
156
“Se um princípio se refere a interesses coletivos e é absoluto, as normas de direitos fundamentais não podem
estabelecer limites jurídicos a ele. Assim, até onde o princípio absoluto alcançar não pode haver direitos
fundamentais. Se o princípio absoluto garante direitos individuais, a ausência de limites desse princípio
levaria à seguinte situação contraditória: em caso de colisão, os direitos de cada indivíduo, fundamentados
pelo princípio absoluto, teriam que ceder em favor dos direitos de todos os indivíduos, também
fundamentados pelo princípio absoluto. Diante disso, ou os princípios absolutos não são compatíveis com
direitos individuais, ou os direitos individuais que sejam fundamentados pelos princípios absolutos não
podem ser garantidos a mais de um sujeito de direito.” (ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais,
2a ed., São Paulo: Malheiros, 2012, p. 111. ).
157
Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário nº 253.885-0/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Ellen
Gracie, j. 04.06.2002, DJ 21.06.2002.
40
preenchido por aquilo que é mais essencial no ordenamento jurídico: a realização de direitos
fundamentais, por sua inviabilidade de concretização caso fossem atribuídos aos
particulares158.
Tendo em vista os direitos fundamentais em jogo, Gustavo Binenbojm159 e Marçal
Justen Filho propõe a utilização a regra de proporcionalidade pelos os gestores públicos no
momento de tomada de decisões.
A regra da proporcionalidade é uma regra de interpretação e aplicação do direito,
criada pelo Tribunal Constitucional Federal alemão, que tem como objetivo impedir que, num
conflito entre princípios, um direito não seja restringido a níveis desproporcionais160. Tal
regra decorre da estrutura e da forma de aplicação dos princípios, tais quais os direitos
fundamentais, entendidos como mandados de otimização. Ou seja, o critério de interpretação
não é adequado para dirimir conflito de regras, que são aplicadas numa base de “tudo ou
nada”, pois através do conteúdo das regras o legislador já sopesou os valores em jogo161.
A regra da proporcionalidade prescreve três fases de análise: (i) adequação, entendida
como a efetividade de certa medida fomentar o objetivo pretendido pela lei; (i) necessidade,
auferida através da comparação entre ações alternativas, sendo necessária aquela menos
danosa aos demais direitos fundamentais; e (iii) proporcionalidade em sentido estrito, que
envolve o contraponto entre as razões motivadoras da medida empregada e o peso do direito
fundamental restringido no caso concreto162.
Ainda que contenha etapas de análise, diferenciando-se do critério do interesse público
que sequer dispõe de um esquema de ponderação, o juízo da proporcionalidade também pode
apresentar problemas em sua aplicação. Luís Virgílio Afonso da Silva atenta para o emprego
pouco criterioso da regra de proporcionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, que não

158
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo, 8ª ed., Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 114-124.
159
BINENBOJM, Gustavo. Da supremacia do interesse público ao dever de proporcionalidade: um novo
paradigma para o Direito Administrativo. Revista de Direito Administrativo, n. 239. Rio de Janeiro: Renovar,
jan./março 2000, p. 1-31. Também: BINENBOJM, Gustavo. Uma teoria do Direito Administrativo: Direitos
Fundamentais, Democracia e Constitucionalização. 1ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 33.: "Não
obstante, mais do que uma mera técnica de decisão judicial ou administrativa, a ponderação erige-se
hodiernamente em verdadeiro princípio formado do direito (e, por evidente, também do direito
administrativo) e de legitimação dos princípios fundantes do Estado democrático de direito.(...) Assim, as
relações de prevalência entre interesses privados e interesses públicos não comportam determinação a priori e
em caráter abstrato, senão que devem ser buscadas no sistema constitucional e nas lei constitucionais, dentro
do jogo de ponderações proporcionais envolvendo direitos fundamentais e metas coletivas da sociedade."
160
SILVA, Luís Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 51, v. 798, abril,
2002, p. 23-50.
161
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais, 2a ed., São Paulo: Malheiros, 2012, p. 85-94.
162
SILVA, Luís Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 51, v. 798, abril,
2002, p. 23-50.
41
analisa corretamente o caso concreto à luz das sub-regras de adequação, necessidade e
proporcionalidade em sentido estrito, além de não justificar a utilização do critério
decisional163.
Portanto, a partir da observação da utilização prática da regra da proporcionalidade,
nota-se que, como a supremacia do interesse público, o princípio da proporcionalidade
também corre o risco de ser empregado como uma “carta super trunfo”164, como se a
discussão terminasse no momento em que a carta é jogada à mesa; como se sua evocação
desse a certeza do resultado certo e dispensasse o dever de motivação. E é exatamente a
existência de noções ex ante (anteriores ao conflito concreto) e absolutas que servem de tripé
à atuação Administração Pública autoritária, distanciada da realidade e da ponderação de
interesses variados.
Por outro lado, a regra da proporcionalidade, diferentemente da supremacia do
interesse público, estabelece critérios objetivos de ponderação que devem ser preenchidos
com peculiaridades do caso concreto. Acredito que, se utilizada corretamente, de forma
motivada, com extensa análise das medidas possíveis no caso concreto e de seus efeitos, a
regra da proporcionalidade poderá ser um critério melhor do que a régua do interesse público,
que sequer possui parâmetros fixos de análise.
Ademais, a regra da proporcionalidade é usualmente tratada no contexto do controle
de constitucionalidade judicial. Ocorre que, para que a ação da Administração Pública seja
efetiva, é importante que esta anteveja os critérios de seus controladores, evitando que seus
atos sejam declarados ilegais ou inconstitucionais. Num contexto em que o gestor decide pelo
critério da supremacia do interesse público, e o Poder Judiciário decide pelo sopesamento de
direitos fundamentais, muitos atos administrativos serão declarados nulos. Destarte, se o
Poder Público utilizar a mesma “linguagem”, o mesmo critério de escolha de seu controlador,
terá mais chances de que suas decisões não sejam modificadas, reforçando a segurança
jurídica das relações por ele travadas165. Salienta-se como segurança jurídica que é cara

163
SILVA, Luís Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 51, v. 798, abril,
2002, p. 23-50.
164
Alusão ao jogo infantil com esse nome, que possui diversas cartas contendo a pontuação de determinados
atributos, sendo que vence aquele que apresentar o maior valor do atributo escolhido. Ocorre que, uma das
cartas do jogo o “supertrunfo”, possui a maior pontuação em todos os atributos, sendo certa a vitória de
quem a possuir. A metáfora foi aludida em discussão travada durante o curso de Atos Administrativos,
ministrada pelo Professor Fernando Dias Menezes de Almeida, na Faculdace de Direito do Largo São
Francisco, no primeiro semestre de 2013.
165
Carlos Ari Sundfeld nota que, desde a Constituição Federal de 1988, tem-se vivido “uma maré montante na
judicialização de questões envolvendo a administração”(SUNDFELD, Carlos Ari. Direito Administrativo
para Céticos. 1ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2012.p. 34). Ocorre que também utilização de princípios
42
àqueles que contratam com a Administração Pública e relevante para a redução das propostas
oferecidas.
Portanto, o interesse público não é o melhor critério a ser adotado para a definição
sobre a possibilidade ou não de arbitragem relativa aos contratos administrativos, pois, sendo
genérico e não prevendo regras objetivas de acesso ao seu conteúdo prático, pouco resolve o
problema do gestor público que precisa tomar uma decisão, dando margem para que o
interesse público seja qualquer coisa. A regra da proporcionalidade, por sua vez, se adotada
corretamente, serve como o critério apto para a interpretação normativa, pois possui regras de
ponderação a serem preenchidas com a lei e com as características do caso concreto.
Por outro lado, a regra da proporcionalidade não é o único método de acessar a melhor
solução concreta166. O conteúdo normativo somente pode ser identificado através do exercício
de interpretação, mas são vários os critérios interpretativos167.
O mais importante, portanto, não parece ser a eleição de um ou outro critério de
interpretação, mas a preocupação do gestor público em acessar as características concretas de
sua decisão. Ele deverá (i) analisar as opções dadas pela lei, (ii) analisar a peculiaridade do
caso concreto; (iii) atentar para as implicações fáticas, os impactos, de cada uma das opções
possíveis; e, principalmente (iv) motivar a eleição de uma solução sobre as demais possíveis.
De que forma, pois, todas essas questões se relacionam à problemática da
possibilidade de arbitragem tendo como parte a Administração Pública? Conforme o exposto,
muitos autores apresentam “cartas supertrunfo” para afastar o cabimento da arbitragem pelo
Poder Público. Porém, dizer que a arbitragem é contrária ao interesse público é dizer que tal
instrumento nunca, em nenhuma hipótese, estará de acordo com a finalidade disposta em lei.
Parece uma afirmação desconcertada, visto que, conforme já analisado, a solução arbitral
possui algumas vantagens em relação aos demais meios de solução de controvérsia possíveis
de serem auferidas dependendo do caso concreto. Nas palavras de Diogo de Figueiredo
Moreira Neto, “jamais se cogita negociar o interesse público, mas, sim, de negociar os modos

imprecisos para o controle da Administração Pública provoca insegurança jurídica.


166
A “melhor solução” no âmbito da discricionariedade é um problema de política, como ressalta Kelsen: “a
questão de saber qual é, de entre as possibilidades que se apresentam nos quadros do Direito a aplicar, a
'correta', não é sequer – segundo o próprio pressuposto de que se parte – uma questão de conhecimento
dirigido ao Direito positivo, não é um problema da teoria do Direito, mas um problema de política do
Direito.” (KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 393)
Todavia, o Direito traz parâmetros além da letra pura da lei, tal qual os princípios constitucionais.
167
São critérios interpretativos: interpretação histórica, literal, teleológica; princípio da eficiência, reserva do
possível, vedação do não retrocesso social, teoria dos motivos determinantes, regra da proporcionalidade,
razoabilidade, entre outros
43
de atingi-lo com maior eficiência”168-169.
Entendo que a opção pela via arbitral não constitui renúncia ao direito material objeto
da controvérsia ou transação do interesse público, mas sim a adoção de forma mais adequada
ao caso concreto para atingimento de princípios como eficiência administrativa e
economicidade. Seria o caso de ponderar, em cada caso concreto, se a arbitragem será ou não
uma boa escolha dentre os meios de solução de controvérsia.

168
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar,
2006, p.77.
169
Juliana Bonacorsi Palma, em tese de mestrado, analisa os acordos substitutivos ao processo administrativo
em relação aos princípio da supremacia e indisponibilidade do interesse público: “Ainda que se reconheça o
valor metodológico aos princípios da supremacia e da indisponibilidade do interesse público, os acordos
administrativos podem ser entendidos como o interesse público do caso concreto, tendo em vista os
potenciais efeitos positivos decorrentes da transação. A celebração de acordo administrativo não caracteriza,
assim, uma ofensa aos referidos princípios, mas a própria satisfação do interesse público.” (PALMA, Juliana
Bonacorsi de. Atuação administrativa consensual: estudo dos acordos substitutivos no processo
administrativo sancionador. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo,
2010, p. 310.) Acreditamos que o mesmo pode-se dizer quanto à arbitragem.
44
III. QUESTÕES ACERCA DA PRÁTICA DA ARBITRAGEM PELA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A partir da analise que se traçou sobre o cabimento da arbitragem nos contratos


administrativos, especialmente no que tange os contratos submetidos ao regime da Lei n°
8.666/93, não só se pretende concluir quanto à possibilidade da arbitragem para tais contratos,
mas também pretende-se avançar sobre algumas características é determinante para a
realização da arbitragem na prática.

III.1. Objeto possível de ser submetido à arbitragem

A arbitrabilidade objetiva significa a possibilidade de certa matéria ser submetida à


arbitragem. Relaciona-se diretamente à previsão do art. 1º da Lei de Arbitragem, que dispõe
serem arbitráveis os direitos patrimoniais disponíveis. Para Carlos Alberto de Salles, que
entende ser necessária autorização expressa para que determinado contrato administrativo seja
submetido à arbitragem, a questão da disponibilidade material resta superada, vez que
autorizada por lei170. Como não é este o posicionamento adotado e como a Lei n° 8.668/1993
não possui autorização expressa à arbitragem, cumpre explicitar o que são direitos
patrimoniais disponíveis no âmbito do contrato administrativo (tendo em vista a definição já
traçada no item II.2.4.).
Os contratos administrativos são celebrados após um procedimento, que poderá ser de
licitação ou de dispensa ou inexigibilidade de licitação. Eventual problema relacionado ao
procedimento de contratação não poderá ser dirimido pela arbitragem por não se relacionar ao
objeto do contrato, mas à fase anterior à sua celebração. A relação existente antes da
celebração do contrato administrativo é jurídico-administrativa complexa e não contratual.
Por exemplo, ao publicar um aviso de licitação, a Administração Pública trava relações com a
coletividade, pelo princípio da impessoalidade (CF, art. 37), e, especialmente, com os
interessados em participar no certame. Eventual litígio sobre a licitação extrapola o interesse
das partes do contrato administrativo, não podendo ser dirimido pela arbitragem.
Já durante a fase de execução do contrato administrativo, são arbitráveis todos as
questões relacionadas ao contrato. No caso de ato administrativo exercido tendo em vista o

170
SALLES, Carlos Alberto de. Arbitragem em Contratos Administrativos.1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011,
p.218.
45
poder-dever da Administração Pública ou poder discricionário, as consequências patrimoniais
também poderão ser dirimidas através da arbitragem171. Nesse sentido, Selma Lemes afirma
que “a Administração Pública pode submeter-se à arbitragem e é conveniente que o faça
quando não se trate de examinar nem decidir sobre a legitimidade de atos administrativos,
mas de suas consequências patrimoniais” 172.
Carlos Alberto de Salles adota posicionamento ainda mais ampliativo, pois admite o
controle dos atos administrativos pelos árbitros. Para o Professor, a postura dos árbitros diante
de cláusulas exorbitantes não destoa daquela adequada ao juízes, pois ambos, ao se depararem
com atos decorrentes do exercício de um poder discricionário, podem analisar se a prática do
ato administrativo se coaduna com a finalidade e com os motivos pretendidos. Ou seja, cabe
juízo de desvio de finalidade também no âmbito do processo arbitral173.
O Tribunal de Contas da União, por sua vez, conforme analisado no item II.1.3, limita
demasiadamente o objeto da arbitragem no âmbito dos contratos administrativos. Em decisões
mais recentes relacionadas a contratos administrativos para os quais há autorização legal
expressa à arbitragem, Tribunal autorizou a resolução arbitral de disputa acerca que questões
técnicas174, porém proibiu o meio de solução de litígios no caso de questões relativas à
equação econômico-financeira do contrato175.
A equação econômico-financeira traduz-se na “relação (de fato) existente entre o
176
conjunto dos encargos impostos ao particular e a remuneração correspondente” . Opera
como proteção ao particular, em contrapartida às prerrogativas da Administração Pública; mas
não só, pois é possível a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro seja em favor da
Administração Pública. Tal cláusula pode ser modificada pela Administração Pública, sequer
através de seu poder de alteração unilateral do contrato. Todavia, isto não significa que as
consequências do reequilíbrio econômico-financeiro não sejam arbitráveis. Rompida a
equação intangível, as partes devem promover à alteração do contrato a fim de restabelecer as

171
TALAMINI, Eduardo. Arbitragem e parceria público-privada. In: TALAMINI, Eduardo; JUSTEN, Monica
Spezia (Coord.). Parcerias Público-Privadas: um enfoque multidisciplinar. São Paulo: RT, 2005.
172
LEMES, Selma M. Ferreira. A Arbitragem e os Novos Rumos Empreendidos na Administração Pública – A
Empresa Estatal, o Estado e a Concessão de Serviço Público. In: Pedro Batista MARTINS, Selma M.
Ferreira LEMES e Carlos Alberto CARMONA (coords.). Aspectos Fundamentais da Lei de Arbitragem,, Rio
de Janeiro, Forense, 1999, p. 194.
173
SALLES, Carlos Alberto de. Arbitragem em Contratos Administrativos.1a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011,
p.260.
174
TCU, Acórdão nº 2094/2009, Plenário, Rel. José Jorge, j. 09.09.2009, DOU 11.09.2009.
175
TCU, Acórdão nº 1796/2011, Plenário, Rel. Augusto Nardes, j. 06.07.2011, DOU 11.07.2011 e TCU,
Acórdão nº 2573/2012, Plenário, Rel. Min. Raimundo Carreiro, j. 26/09/2012.
176
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética,
2010, p. 775.
46
condições pactuadas no ato de celebração do contrato administrativo. Assim procedem sem
necessidade de confirmação judicial, no caso de solução pacífica. Tal modificação contratual
tem cunho patrimonial, e é, portanto, arbitrável177.
A divisão traçada pelo TCU opera como um grande desestímulo à arbitragem nos
contratos administrativos, pois lhe retira a celeridade e a eficiência. Ao limitar a arbitragem a
questões técnicas, ignora que elas podem ser o suporte fático para aplicação de direitos que
também sejam ponto de conflito entre as partes. Ademais, uma alteração técnica pode ser a
causa do reestabelecimento da equação econômico-financeira do contrato, como bem
estabelecido pela Lei nº 8.666/93 (art. 65, I, “a”; II, “b”). Não é eficiente ou célere que as
partes tenham que dirimir o conflito em matéria técnica perante o árbitro, para depois se
dirigirem ao juiz, que se pronunciaria sobre as questões de direito.
Outro ponto dúvida recorrente nos contratos administrativos são as alterações
contratuais ou eventuais rescisões promovidas unilateralmente pela Administração Pública.
Também estas são passíveis de serem objeto de arbitragem, porém, tal qual no caso de
reequilíbrio econômico-financeiro, não é dado ao árbitro entrar no mérito das cláusulas
exorbitantes, mas somente decidir sobre as consequências patrimoniais destas. Ou seja, o
árbitro não pode substituir o agente público no juízo de conveniência e oportunidade na
definição sobre o que venha a ser “a melhor adequação técnica às finalidades de interesse
público” (art. 58, inciso I, da Lei nº 8.666/1993) ou “razões de interesse público, de alta
relevância” (art. 79, II da Lei nº 8.666/1993), mas está restrito à verificar se não houve desvio
de finalidade e decidir sobre seus desdobramentos.
Seria impossível enumerar todos as questões litigiosas que poderiam surgir durante a
execução de um contrato. Todavia, a doutrina trata de alguns exemplos. Ari Sundfeld e
Jacintho Arruda Câmara mencionam as seguintes questões:
“Preços, condições de pagamento, cronograma de investimento,
financiamentos, enfim, tudo o que estiver relacionado à
exploração econômica do serviço pode ser objeto de
contratação, e, nesta condição, ter seus conflitos dirimidos por
arbitragem, se as partes assim pactuarem.(...) A duração do
contrato, a remuneração do contratado e as condições de
177
Selma Lemes também adota este entendimento: “assim, não são matérias que possam ser submetidas aos
árbitros as decisões adotadas pela Administração Pública quanto à pertinência ou legitimidade de
particularidades dos contratos administrativos, tais como as que giram em torno das denominadas cláusulas
exorbitantes, como a decisão de rescindir unilateralmente o contrato, a de rever seu objeto e escopo, etc. Mas
nada impediria de o árbitro decidir sobre as consequências patrimoniais delas advindas, em especial para
indenizar e recompor o equilíbrio econômico financeiro do contrato” (LEMES, Selma. Arbitragem na
Administração Pública: Fundamentos Jurídicos e Eficiência Econômica. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p.
114).
47
pagamento, multas pecuniárias e, se assim dispuserem, a
sujeição do contrato à arbitragem são exemplos de temas que,
embora digam respeito à prestação de um serviço público,
podem ser perfeitamente objeto de negociação entre as partes
envolvidas.” 178

Marçal Justen Filho cita os fatores que influem no equilíbrio econômico-financeiro,


que, no entendimento adotado na presente tese, são arbitráveis:
“os prazos de início, de execução, recebimento provisório e
definitivo previstos no ato convocatório; os processos
tecnológicos a serem praticados; as matérias-primas a serem
utilizadas; as distâncias para entrega dos bens; o prazo para
pagamentos, etc. O mesmo se passa quanto à remuneração.
Todas as circunstâncias atinentes à remuneração são relevantes,
tais como prazos e formas de pagamento.” 179.

Ademais, as alterações contratuais surgidas a partir de fato do príncipe, fato da


administração e ocorrência de fatos supervenientes imprevistos ou de consequências
incalculáveis também são sujeitas à arbitragem, tendo em vista serem de cunho patrimonial.

III.2. Possibilidade de a Administração celebrar compromisso arbitral

Assim como inexiste previsão específica à arbitragem para os contratos submetidos ao


regime da Lei n° 8.666/1993, também não há norma que obrigue que a arbitragem esteja
prevista no edital de licitação. Mesmo assim, parcela da doutrina entende ser necessária a
estipulação de cláusula arbitral no instrumento editalício, em razão (a) da natureza de contrato
de adesão do contrato administrativo, (b) do princípio da vinculação ao instrumento
convocatório e (iii) da igualdade dos concorrentes e competitividade no certame licitatório180.
Contudo, tais princípios não são suficientes para vedar a celebração de compromisso arbitral.

178
SUNDFELD, Carlos Ari. CÂMARA, Jacintho Arruda. O cabimento da Arbitragem nos contratos
administrativos. Revista de Direito Administrativo. FGV, n. 248, maio/ agosto 2008, pp.117-126.
179
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética,
2010, p. 775.
180
LA CHINA, Sergio. L’arbitrato: il sistema e l'esperienza. 3a ed. Milano:Giuffré, 2007. BELLANTE, Marco.
L'arbitrato nell'appalto di opere pubbliche. In: CASSANO, Giuseppe (coord.). Transazione, arbitrato e
resoluzione alternative delle controversie. Torino: UTET Giuridica, 2006. SALLES, Carlos Alberto de.
Arbitragem nos Contratos Administrativos.1a ed. Rio de Janeiro:Forense, 2011, p. 112-113.
48
Diz-se que os contratos administrativos tem natureza de contratos de adesão, pois as
cláusulas são fixadas unilateralmente pelo Poder Público. No caso de contrato administrativo
que não preveja arbitragem, não há adesão à arbitragem, mas também não há proibição. Ora,
deixar de prever a obrigação de resolver os litígios por meio de arbitragem não é o mesmo
que proibi-la.
Também o princípio da vinculação ao instrumento convocatório não proíbe a
celebração de compromisso arbitral. Há autores que defendem que é o princípio obstaculiza a
celebração de compromisso arbitral, pois a omissão à arbitragem e a posterior celebração de
pacto arbitral provocaria desigualdade entre o adjudicatário e os demais licitantes. Carlos
Alberto Salles defende que a existência de cláusula compromissória na minuta do contrato do
edital poderia conduzir a um resultado licitatório diverso por ser a arbitragem uma vantagem
ao particular181. Todavia, conforme salientado (c.f. item I.3.), os benefícios da arbitragem não
são auferíveis objetivamente, dependendo da análise de caso. A arbitragem poderia tanto ser
um vantagem ao particular em certo caso, como uma desvantagem182.
O princípio da vinculação ao instrumento convocatório relaciona-se com os limites à
alteração do contrato administrativo. Como salienta Marçal Justen Filho, a modificação dos
contratos administrativos não é uma exceção, mas uma prática institucionalizada, para que a
finalidade do contrato não seja desvirtuada183. A Lei n° 8.666/1993 estabelece os limites para
alterações consensuais e unilaterais dos contratos administrativos (art. 58 e 65). A alínea “d”
do inciso II do art. 65 dispõe que as partes, em comum acordo, podem modificar o contrato
para restabelecer a relação pactuada inicialmente, na hipótese de sobrevirem fatos
imprevisíveis ou previsíveis, porém de consequências incalculáveis, retardadores ou
impeditivos da execução do ajustado, ou ainda em caso de força maior, caso fortuito ou fato
do príncipe184.

181
SALLES, Carlos Alberto de. Arbitragem em Contratos Administrativos.1a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011,
p. 112.
182
AMARAL, Paulo Osternack. Arbitragem e Administração Pública: aspectos processuais, medidas de
urgência e instrumentos de controle. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 77-81. TALAMINI, Eduardo.
Arbitragem e parceria público-privada. In: TALAMINI, Eduardo. JUSTEN, Monica Spezia (coord.).
Parcerias Público-Privadas: um enfoque multidisciplinar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 351.
KLEIN, Aline Lícia. A arbitragem nas concessões de serviço público. In: Arbitragem e Poder Público. São
Paulo: Saraiva, 2010, p. 94-95.
183
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo, 8ª ed., Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 771.
184
Lei nº 8.666/93: Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas
justificativas, nos seguintes casos: (...)II - por acordo das partes: (…) d) para restabelecer a relação que as
partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa
remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-
financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de
conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de
49
Portanto, se restar comprovado que o conflito entre as partes poderá retardar ou
impedir a execução do contrato, e se as partes concordarem que a arbitragem será mecanismo
para promover a celeridade na execução contratual, será possível a celebração de
compromisso arbitral. O atendimento aos requisitos do art. 1° da Lei de Arbitragem (a
capacidade civil para contratar e objeto disponível e patrimonial) é suficiente para que o
compromisso seja firmado.
À mesma conclusão chegou Paulo Osternack Amaral, que também entende ser
possível a celebração de compromisso arbitral nos casos de contratação direta por dispensa ou
inexigibilidade de licitação, que prescindem de edital185.
O posicionamento também encontra guarida no âmbito judicial. No Caso
Compagás186, confirmado em sede de recurso187, decidiu-se pela possibilidade de realização
de arbitragem pelo Poder Público para resolver questões envolvendo direitos patrimoniais
disponíveis, independentemente de previsão no edital ou contrato.
Cumpre salientar que a desnecessidade legal não retira a utilidade prática da cláusula
arbitral. A estipulação desde a fase licitatória é, muitas vezes, aconselhável, pois o ambiente
de celebração contratual é mais propício para acordos sobre mecanismos de solução de
controvérsias. Por outro lado, quando o litígio está pendente de resolução, as partes podem ter
dificuldade de entrar em acordo inclusive sobre questões processuais.

III.3. Vedação da arbitragem obrigatória

A arbitragem obrigatória é aquela que decorre de imposição normativa, e não da


vontade das partes. No Brasil, a doutrina majoritária entende que ela foi abolida com a Lei nº
1.350/1866, que revogou os artigos do Código Comercial de 1850 que obrigavam à solução
arbitral. Em outros países, a arbitragem obrigatória ainda existe, como é o caso de Portugal e
da Costa Rica188.
Na Itália, tanto a doutrina como a jurisprudência tratam longamente da questão da
arbitragem obrigatória especificamente no que tange os contratos administrativos. Há, neste

força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual.
185
Arbitragem e Administração Pública: aspectos processuais, medidas de urgência e instrumentos de controle.
Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 77-81
186
TAPR, 7º Câmara Cível, AC nº 247.646-0, rel. Des. Lauro Laertes de Oliveira, j. em 11.02.2004.
187
STJ, Resp nº 904.813/PR, 3º Turma, rel. Min, Nancy Andrighi, j. em 20.10.2011.
188
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à lei n. 9.307/96, 3º edição, São Paulo:
Atlas, 2009, p. 36.
50
país, uma forte corrente que defende a inconstitucionalidade da previsão editalícia de
arbitragem, sem a possibilidade do licitante de afastá-la, por considerar o caso como
arbitragem obrigatória. No Brasil, não se tem notícia do debate: todos os autores estudados
favoráveis à arbitragem nos contratos administrativos não veem problema na impossibilidade
de o licitante afastar cláusula compromissória. Mesmo que se admita que o contrato
administrativo tenha natureza de contrato de adesão, o § 2º do Art. 3° da Lei de Arbitragem,
que prevê a necessidade de aceitação expressa à arbitragem189, não é aplicado nos contratos
administrativos, por se tratar de “um outro tipo de contrato de adesão”190.
Como a discussão italiana gira em torno de elementos comuns à teoria brasileira, como
a natureza de adesão do contrato administrativo e a discussão sobre a natureza da arbitragem
(contratual ou jurisdicional), optei por analisá-la191. Conforme se verá, os fundamentos
levantados pela doutrina e pelos tribunais italianos são normas semelhantes às do direito
brasileiro, o que nos leva à pergunta se também no Brasil não seria necessário adotar a
solução italiana de dar opção ao licitante na escolha pela arbitragem.

III.3.1 O debate italiano

Na Itália, foram continuamente editadas leis de permissão e proibição da arbitragem


nos contratos administrativos. No Reino de Sardenha, os tribunais administrativos dirimiam
litígios relacionados à execução dos contratos de empreitada pública sob fundamento da
supremacia do interesse público. Após a Unificação Italiana, a Lei sobre as obras públicas
aboliu o contencioso administrativo e admitiu o deferimento das controvérsias relacionadas a

189
Lei n° 9.307/1996. Art. 3º (…) § 2º Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o
aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição,
desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa
cláusula.
190
“O contrato administrativo, como sustentado neste trabalho, possui um caráter de adesão. No entanto, essa
sua característica não permite confundi-lo com o que vem sendo designado de ‘contrato de adesão’, nos
termos do que vem expresso na Lei de Arbitragem. (…) No caso do contrato administrativo, grande parte das
estipulações contratuais é definida prévia e unilateralmente pela Administração, mas alguns elementos
fundamentais, como o preço e, algumas vezes, a própria especificação do objeto do contrato, são definidos
processualmente, por meio de licitação. Há, portanto, nesse caso, uma participação decisiva do particular
contratante na formação do contrato. Essa participação excede, em muito, a mera aceitação contratual,
característica da típica posição do aderente.” (SALLES, Carlos Alberto de. Arbitragem em Contratos
Administrativos.1a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 271-272).
191
A pesquisa teve como base a bibliografia colhida durante intercâmbio institucional da Universidade de São
Paulo, junto à Università di Bologna, entre setembro de 2011 e junho de 2012. O principal livro consultado
foi a completa obra do Professor Emanuelle Odorisio: Arbitrato rituale e 'lavori pubblici'. Milão: Giuffrè,
2011. Ainda que o autor adote o posicionamento minoritário de que a arbitragem obrigatória não é
inconstitucional, em sua obra ele trata com detalhe o debate.
51
contratos de empreitada públicos à arbitragem192. Em seguida, foram editados decretos
regulamentares prevendo as condições gerais e o conteúdo necessário dos contratos de obras
193
públicas, os chamados “Capitolati Generali” . Tais decretos estabeleciam a arbitragem
como cláusula necessária do contrato administrativo. Como o contencioso administrativo fora
extinto, a exigência de que todo contrato de empreitada público contivesse cláusula
compromissória era a solução política encontrada para afastar a apreciação dos contratos
celebrados pela Administração Pública do crivo dos juízes194.
A previsão da arbitragem obrigatória passou a ser contestada em face da proibição do
estabelecimento de jurisdição especial195. Com a Constituição italiana de 1947, vários autores
adicionaram ao debate a regra constitucional de inafastabilidade da apreciação judicial196.
Porém, a Corte Constitucional só apreciou a questão pela primeira vez anos depois.
Nos anos 60, a Corte de Contas197 e do Conselho de Estado198 decidiram diversamente
sobre a previsão de arbitragem presente no Capitulato Geral então vigente. Enquanto a Corte
de Contas entendia que o Capitulato Geral tinha natureza regulamentar, portanto,
indevidamente submetia à arbitragem as controvérsias decorrentes da execução contratual; o
Conselho de Estado atribuía ao Capitulato a natureza contratual, concluindo que a cláusula
compromissória era legítima, pois estipulada voluntariamente pelas partes.

192
O Art. 1 do anexo 1 da Lei de 20 de março de 1865, de número 2248 dispunha que “I Tribunali speciali
attualmente investiti della giurisdizione del contenzioso amministrativo, tanto in materia civile, quanto in
materia penale, sono aboliti e le controversie ad essi attribuite dalle diverse leggi in vigore saranno d'ora in
poi devolute alla giurisdizione ordinaria, od all'autorità amministrativa, secondo le norme dichiarate dalla
presente legge” ; e o Art. 349 do anexo F da Lei de 1865 estabelecia que “Nei capitoli d'appalto potrà
prestabilirsi che le questioni tra l'amministrazione e gli appaltatori siano decise da arbitri.”.
193
“CAPITOLATO (fr. cahier des charges; sp.pliego de condiciones; ted.Betriebsvorschriften; ingl.spectfication
of contract). - Il capitolato, talora detto anche "capitolato d'oneri" o "quaderno d'oneri", è, in diritto
amministrativo, un atto amministrativo che contiene le condizioni e modalità relative all'esecuzione di un
contratto fra l'amministrazione pubblica e un privato o all'esercizio di una concessione fatta da quella a
questo.(...) I capitolati generali hanno indole sostanziale di regolamenti, anche se formalmente ne
differiscono, e l'amministrazione per la quale sono stati dettati deve attenersi a essi nei contratti o negli atti
concessivi in considerazione dei quali sono stati redatti;”. (BORSI, Umberto. Capitolato. In: Enciclopedia
Italiana. Treccani, 1930).
194
Emanuelle Odorisio: Arbitrato rituale e 'lavori pubblici'. Milão:Giuffrè, 2011, p. 53. Posteriormente, com a
Lei de 7 de março de 1907, n. 62, o Conselho de Estado volta a ter natureza jurisdicional.
195
Estatuto Albertino (Constituição Italiana de 1848): Art. 71. - Niuno può essere distolto dai suoi Giudici
naturali. Non potranno perciò essere creati Tribunali o Commissioni straordinarie.
196
Constituição da República Italiana de 1947: Art. 24. comma 1 e 2: Tutti possono agire in giudizio per la
tutela dei propri diritti e interessi legittimi.
La difesa è diritto inviolabile in ogni stato e grado del procedimento.
Art. 102. comma 1 e 2: La funzione giurisdizionale è esercitata da magistrati ordinari istituiti e regolati dalle
norme sull'ordinamento giudiziario.
Non possono essere istituiti giudici straordinari o giudici speciali.
197
Corte de Contas Italiana, Decisão n. 81, Seção Contratual, j. em 25 de outubro de 1956.
198
Conselho de Estado Italiano, Decisão n. 376, j. em 26 de julho de 1957.
52
Ante a incerteza jurídica de decisões opostas, foi adotada uma solução legislativa
intermediária, a “declinatória”: o novo Capitolato Geral (Decreto Presidencial de 16 de julho
de 1962, n. 1063) previa que as partes pudessem excluir processo arbitral já instaurado pela
outra parte ou recorrer diretamente ao Poder Judiciário199. A facultatividade da arbitragem
funcionou com um desincentivo à arbitragem, pois a parte interessada em retardar a solução
do litígio sempre exprimia a declinação e então a outra parte teria que propor ação judicial200.
Percebeu-se que a arbitragem somente seria eficaz se a cláusula compromissória
realmente afastasse a apreciação do Poder Judiciário. Nesse sentido, a Lei sobre normas para
aceleração de procedimento para execução de obras públicas (Lei de 10 de dezembro de 1981,
n. 741) alterou disposição do Capitulato Geral então vigente para determinar que a
arbitragem, quando prevista, fosse vinculante. Porém, a cláusula compromissória passou a ser
uma opção ao gestor público, que poderia ou não incluí-la no edital. Aos licitantes, por sua
vez, não era dada a possibilidade de alterar da minuta do contrato anexa ao instrumento
convocatório. Se quisessem participar do certame licitatório, estariam submetidos à
disposição editalícia - exatamente o que e prática hoje no Brasil.
Em 1996, a regra foi objeto de decisão da Corte Constitucional italiana201, que julgou-
a inconstitucional por afastamento da jurisdição estatal (art. 24, comma 1 da Constituição da
República Italiana) sem a aceitação específica de ambas as partes:
“Risulta pertanto evidente il contrasto della norma impugnata
con gli invocati parametri costituzionali in quanto questa, con il
prevedere che la competenza arbitrale può essere derogata solo
con una clausola inserita nel bando o invito di gara oppure nel
contratto nel caso di trattativa privata, finisce con il rendere
obbligatorio l'arbitrato, in spregio al principio, più volte
ribadito, secondo cui solo a fronte della concorde e specifica
volontà delle parti (liberamente formatasi) sono consentite
deroghe alla regola della statualità della giurisdizione.”
(grifo nosso)

Como consequência da decisão, foi autorizado ao licitante a participação no certame


mesmo que optasse pelo afastamento da cláusula arbitral. Para não se retornar ao cenário da

199
Decreto Presidencial italiano de 16 de julho de 1962, n. 1063: Art. 49 Deroga alla competenza arbitrale
In deroga alle disposizioni degli articoli 43 e seguenti, la parte attrice ha facolta' di escludere la competenza
arbitrale, proponendo, entro il termine di cui all'articolo precedente, la domanda davanti al giudice
competente a norma delle disposizioni del Codice di procedura civile e del testo unico 30 ottobre 1933,
n. 1611. La parte convenuta nel giudizio arbitrale a sensi dell'articolo precedente, ha facolta', a sua volta,
di escludere la competenza arbitrale.
200
Emanuelle Odorisio: Arbitrato rituale e 'lavori pubblici'. Milão:Giuffrè, 2011, p. 97-102.
201
Corte Constitucional Italiana, Decisão n. 152, j. em 9 de maio de 1996.
53
declinatória, a opção pela arbitragem passou a ser feita no âmbito do processo licitatório, e,
caso o particular adira à cláusula compromissória, a arbitragem será vinculante. Após a
decisão, a legislação italiana foi modificada para se adequar ao posicionamento da Corte
Constitucional. Hoje, é vigente o Código dos Contratos Administrativos (Decreto legislativo
n. 163, de 12 de abril de 2006), que determina que o vencedor da licitação pode recusar
cláusula arbitral prevista no edital no prazo de 20 dias contados da adjudicação202.

III.3.2 A questão se põe no Brasil?

Não há, no ordenamento brasileiro, previsão legal que determine que a arbitragem
deverá ser aceita pelo particular em bloco ou em separado do contrato administrativo. O art.
23, inciso XV da Lei de Concessões e o art. 11, inciso III, da Lei de PPP determinam que o
modo amigável de solução de divergências contratuais é cláusula essencial do contrato, porém
nenhuma destas leis ou qualquer outra faz menção à posição do particular contratante perante
à cláusula.
Pode-se imaginar, com respaldo na posição majoritária italiana, que a inclusão de
cláusula compromissória na minuta do contrato anexo ao edital também seja constitutiva de
arbitragem obrigatória, pois o particular não pode, em qualquer circunstância, modificá-la. O
Professor Emanuelle Odorisio - que adota a posição minoritária - discorda, pois, para o autor,
o caso de um contraente que está numa posição mais forte, capaz de impor a cláusula arbitral,
não se confunde com a arbitragem obrigatória, que necessariamente se verifica com a
imposição da lei203. Todavia, a impossibilidade de alteração do edital de licitação não é em
razão de o Poder Público ser “parte mais forte” - tanto é que lhe é garantido o equilíbrio
econômico-financeiro204- , mas uma configuração imaginada para o cumprimento do princípio
da impessoalidade e da licitação.
No caso de certames licitatórios, o particular raramente negocia com a Administração
Pública as cláusulas contratuais. A recente Lei do RDC prevê a possibilidade de negociações

202
Decreto legislativo n. 163, de 12 de abril de 2006: art. 241, comma 1-bis: La stazione appaltante indica nel
bando o nell'avviso con cui indice la gara ovvero, per le procedure senza bando, nell'invito,se il contratto
conterra',o meno, la clausola compromissoria. L'aggiudicatario puo' ricusare la clausola compromissoria,
che in tale caso non e' inserita nel contratto, comunicandolo alla stazione appaltante entro venti giorni dalla
conoscenza dell'aggiudicazione. E' vietato in ogni caso il compromesso.
203
Emanuelle Odorisio: Arbitrato rituale e 'lavori pubblici'. Milão:Giuffrè, 2011, p. 475.
204
Esse foi o argumento de Paulo Osternack Amaral, ainda que o autor discorde de que os contratos
administrativos sejam contratos de adesão (AMARAL, Paulo Osternack. Arbitragem e Administração
Pública: aspectos processuais, medidas de urgência e instrumentos de controle. Belo Horizonte: Fórum,
2012, p. 79.).
54
mais vantajosas com o primeiro colocado (art. 26), porém não há previsão análoga na Lei
Geral de Licitações e Contratações Públicas. Assim, caso o particular queira contratar com a
Administração Pública, tem que se submeter a todas as cláusulas previstas. Mesmo que a
proposta do particular passe a configurar o preço do contrato, sua participação na formação do
contrato é menor que a da Administração Pública. O fato de o contrato ser determinado por
uma das partes configura-o como contrato de adesão.
Cumpre esclarecer por que a cláusula compromissória, diferentemente das demais
cláusulas, não deverá ser vinculante a partir de manifestação da vontade genérica do contrato.
O que há de diferente entre a cláusula compromissória e as demais cláusulas do contrato
administrativo? Ora, a convenção arbitral exige manifestação da vontade específica ante a
gravidade da renúncia ao direito postulatório perante o Poder Judiciário. Nos termos da
própria Lei de Arbitragem, a submissão à arbitragem exige a com a assinatura ou visto
especialmente do contraente no caso de contrato de adesão205.
Conforme mencionado supra, a doutrina italiana emprega dois argumentos de
ilegitimidade constitucional da arbitragem obrigatória: (i) proibição do juízo de exceção e (ii)
impossibilidade de previsão legal que afaste a apreciação pelo Poder Judiciário. Ambas as
regras também estão previstas na Constituição brasileira, nos arts. art. 5°, XXXVII e art. 5°,
XXXV, respectivamente.
O primeiro argumento não é bastante para proibir a arbitragem. Se assim fosse,
também a arbitragem “facultativa” seria inconstitucional (cf. item II.2.1). Ademais, sem que
seja necessário analisar os posicionamentos sobre a natureza jurídica da arbitragem, se
contratual ou jurisdicional206, a finalidade do direito fundamental de proibição dos tribunais
de exceção é impedir o Estado de criar tribunais antes inexistentes, e não vedar a escolha de
outras soluções de controvérsia além da ação judicial.
Já a previsão de inafastabilidade da apreciação judicial parece, num primeiro
momento, apresentar um real obstáculo à previsão editalícia obrigatória da arbitragem, ante o
fundamento de vontade formador da arbitragem. O edital, ainda que seja um ato normativo, é

205
Lei n° 9.307/1996. Art. 3º (…) § 2º Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o
aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição,
desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa
cláusula.
206
Esquivo-me de me delongar no assunto valendo-me do mesmo argumento do professor Carmona: “A
verdade, porém, é que o debate adquiriu um colorido excessivamente acadêmico e, pior, pouco prático, de
sorte que não parece útil continuar a alimentar a celeuma” (CARMONA, Carlos Alberto. A Arbitragem e
Processo: Um comentário à Lei n° 9.307/96. Atlas: São Paulo, 2009, p. 27).
55
aplicável à generalidade de participantes interessados na licitação e, ao impossibilitar a
manifestação específica da vontade sobre a cláusula arbitral, cria arbitragem obrigatória.
O Supremo Tribunal Federal já se manifestou contrariamente a arbitragem obrigatória,
ainda que não fosse essa a questão a ser decidida no caso (obter dictum). O Ministro
Sepúlveda Pertence, em controle incidental de constitucionalidade da Lei de Arbitragem,
manifestou-se pela inconstitucionalidade da arbitragem obrigatória, como decorrência
princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário (art. 5°, XXXV, CF): “o que a Constituição
não permite à lei é vedar o acesso ao Judiciário da lide que uma das partes que quisesse
submeter.” 207 .
Portanto, a realidade jurídica brasileira assemelha-se à realidade normativa que
conduziu à declaração de inconstitucionalidade do Decreto italiano pela Corte Constitucional
daquele país. O debate da arbitragem obrigatória ainda não está maduro no Brasil – ouso
supor que é porque, para os licitantes, costuma interessar a cláusula arbitral, nos raros casos
em que é prevista. Mesmo assim, há uma interessante solução adotada pelo Conselho Arbitral
do Estado de São Paulo - CAESP a fim de impedir qualquer vício de vontade gerado nos
contratos envolvendo o Poder Público: a “cláusula híbrida”. Tal cláusula prevê que a parte
mais forte do contrato aceita submeter-se à arbitragem desde que a parte mais fraca também o
deseje. Não aceitando a arbitragem, o Poder Judiciário é automaticamente eleito para dirimir
o conflito208.

VI.4. Escolha do árbitro

A escolha do árbitro ou da câmara arbitral é caso de inexigibilidade de licitação por


caracterizar contratação de serviços de natureza singular de profissionais de notória
especialização, nos termos do art. 25, inciso II da Lei n° 8.666/93. Embora não conste no rol
do art. 13, que menciona serviços técnicos profissionais especializados, o dispositivo
apresenta natureza exemplificativa, pois são vários os serviços que assim podem ser
qualificados209-210.

207
Supremo Tribunal Federal, Agravo Regimental em Sentença Estrangeira nº 5.206-7, Reino da Espanha,
Plenário, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 12.12.2001, DJ 30.04.2004.
208
A cláusula foi mencionada por Cássio Telles Ferreira Neto. (Contratos Administrativos e a arbitragem. Rio
de Janeiro: Elsevier, 2008, p. 13). Ainda que discordemos que a Administração seja a parte mais forte, mas
apenas detém controle do conteúdo do contrato administrativo.
209
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de licitações e contratos administrativo. São Paulo: Dialética,
2010, p. 174.
210
Adota posicionamento diverso Luciana Nardi, que afirma que a omissão quanto à dispensa ou inexigibilidade
56
Para a verificação da inexigibilidade de licitação, é necessário examinar o fator
objetivo, relacionado aos serviços técnicos especializados, e o fator subjetivo,
consubstanciado no notório conhecimento do profissional. Ora, o árbitro será pessoa ímpar
capacitada a prestar serviço de natureza singular e técnica. Deverá ter experiência no direito
em discussão e/ou na questão técnica litigiosa. Não se trata de trabalho mecânico ou
padronizado, pois os litígio no âmbito dos contratos administrativos tendem a ser complexos e
peculiares.
O Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento de inexistência do dever de
licitar serviço de advocacia quando presentes os requisitos da notória especialização do
advogado211. A escolha do árbitro também está sujeita à mesma condição.

de licitação, somada à exigência prevista no artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal e a relevância dos
princípios da igualdade e impessoalidade no direito administrativo conduzem necessariamente à escolha da
câmara arbitral través ade licitação (NARDI, Luciana. A arbitragem na administração pública. Disponível
em http://www.camarb.com.br/. Acesso em 08.01.2013).
211
Supremo Tribunal Federal, Recurso Ordinário em Habeas Corpus 72.830-8/RO,Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª
Turma, j. 24/10/1995, no Recurso Extraordinário 466.705-3/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, j.
14/03/2006, na Ação Penal 348-5/SC, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, j. 15/12/2006 e Habeas Corpus
86.198-9/PR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, j. 17/04/2007.
57
IV. CONCLUSÃO

“I wanted a perfect ending. Now I've learned, the


hard way, that some poems don't rhyme, and
some stories don't have a clear beginning, middle
and end.”

Gilda Radner

A presente tese de láurea teve por escopo analisar a possibilidade de dirimir litígios
advindos da execução de contratos regidos pela Lei n° 8.666/1993 através da via arbitral.
Toda a análise foi pautada pelas duas premissas traçadas inicialmente: a ideia de que a
arbitragem pode apresentar vantagens à execução do contrato administrativo e o contexto de
consensualidade da Administração Pública que está em voga atualmente.
A análise dos posicionamentos contrários à arbitragem demonstrou, por da parte de
alguns autores e do TCU, o preconceito com o meio de solução de controvérsia, devido à má
compreensão de características; a exaltação exacerbada do serviço público como objeto tão
digno a ponto de não ser possível de ser submetido à arbitragem; o emprego inconstitucional
e da ultrapassada noção de supremacia do interesse público; e, por fim, a confusão entre a
cláusula de eleição de foro e a cláusula arbitral.
Restou comprovado que não há qualquer disposição na Lei n° 8.666/93 que proíba o
juízo arbitral; ainda que a Lei Geral de Licitações e Contratações Públicas seja omissa quanto
à arbitragem, o regime dos contratos ali estipulados não se limita ao disposto em seu texto
normativo. A Lei Geral de Licitações e Contratações cria competência contratual do Poder
Público e, ao fazê-lo, torna arbitráveis as matérias sobre as quais dispõe. Portanto, conclui-se
que a Lei de Arbitragem é suficiente para autorizar à Administração Pública a firmar
convenção arbitral tendo por objeto as matérias no âmbito das quais lhe compete contratar.
O argumento muito recorrente de que a arbitragem é contrária ao interesse público é
insustentável, pois é conceito genérico. Se por um lado, o princípio sintetiza a ideia de
finalidade pública perseguida pela Administração Pública, por outro não é apto a defini-la.
Propõe-se a utilização da regra da proporcionalidade e de outros critérios de análise a
posteriori para que, no caso concreto, sejam avaliados os interesses em conflito e os caminhos
a serem trilhados. Ademais, se a arbitragem apresenta-se, em alguns casos, como um meio de
58
controvérsia vantajoso na execução do contrato, não pode ser de pronto descartada na busca
pela finalidade pública.
Para a escolha da arbitragem para solucionar questões de determinado contrato
administrativo, é necessário acessar as peculiaridades do caso concreto, ponderando a
celeridade, economicidade, eficiência, redução de custos de transação e competitividade. A
depender de cada caso, a arbitragem poderá ou não apresentar benefícios à execução dos
contratos administrativos, figurando-se como instrumento de otimização na realização das
novas funções administrativas, que cada vez mais ganham diversificação.
A simplicidade da Lei de Arbitragem é positiva neste sentido, pois permite que a
convenção arbitral contenha o procedimento mais adequado para determinado contrato,
conforme opção feita pelo gestor público e pelo contratante. Ante a vasta gama de contratos
sob o regime da Lei n° 8.666/1993, serão diversas as configurações de soluções de conflitos
ideais.
O paradigma atual da atuação administrativa, marcado pela consensualidade e
mediação da heterogeneidade de interesses sociais, exige meios e instrumentos de acordo
entre o Poder Público e os administrados, sendo que a arbitragem é apta para, em algumas
situações, promover tal aproximação com eficiência. O método de solução de conflitos indica
aos privados que queiram contratar com o Poder Público que este está disposto a cumprir o
contrato e que dispõe de meios para fazê-lo de forma célere. Ademais, a possibilidade de
firmar compromisso arbitral quebra o modelo unilateral de criação das regras contratuais para
permitir a conjunção de interesses e a flexibilização da atuação autoritária da Administração
Pública.
Das questões práticas analisadas, percebe-se que o estudo das questões práticas
relativas à arbitragem nos contratos administrativos é ainda é incipiente na doutrina brasileira,
pois questões como a necessidade de aceitação do participante da licitação à cláusula
compromissória sequer é discutida no Brasil. Talvez um caminho seja a realização de
pesquisas empíricas a partir das arbitragens já realizadas, estudo que, porém, não coube no
espaço intentado para esta tese de láurea.

59
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