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“TÚ ME ENSINAS A FAZER RENDA QUE EU TE ENSINO A

NAMORAR”: TECENDO RENDAS NA DESCOBERTA DO


MUNDO NOSSO DE CADA DIA – REFLEXÕES SOBRE O
OFÍCIO DA PESQUISA.()

Alba Maria Pinho de Carvalho


Fevereiro de 2004

Vivemos num estado de sono... despertar o mundo, eis a coragem da existência. E


esta coragem é o trabalho da pesquisa e da invenção. O essencial é que
permaneçamos sempre em estado de apetite (Gaston Bachelard in Japiassu Hilton
1991:77)

”O mundo é a provocação do homem” (Bachelard)


desvendar/compreender os mistérios da vida... entender/ explicar o mundo ou os
mundos em que vive... ou, em outras palavras, apropriar-se da realidade no
pensamento, explicando-a ao pensá-la – eis o desejo do conhecimento que convive
com o homem ao longo de séculos... De fato, “a ciência, como o homem, não é
criação da necessidade, mas do desejo” – é o que diz Bachelard. Em verdade, o
desejo de conhecer, natural segundo Aristóteles, coloca o conhecimento como
condição necessária, embora não suficiente, para viver no mundo, exercitando as
dimensões da razão e da imaginação...

Movido por este desejo, ilimitado, o homem na sua caminhada, criou


diversas formas de conhecimento: a religião, a arte, o mito, a filosofia, a ciência,
entre outros. Em última instância, são os homens os únicos criadores dos diversos
tipos de conhecimento ante as provocações do mundo. No dizer, de Bachelard, os
homens, são os únicos “despertadores do mundo”, respondendo a todas as
provocações pela criação e pela invenção.

Nestes múltiplos percursos de conhecimento do mundo, a ciência,


como criação do homem, tem um lugar privilegiado em termos de desvendamento
dos fenômenos da natureza, da vida social, da consciência, da cultura.

Em verdade, constitui uma forma de pensamento capaz de adentrar


no âmago dos fenômenos, captando a lógica que lhes confere sentido. Apontando
para esta peculiaridade explicativa/ compreensiva da ciência é que Albert Einstein
declara: “Não podemos resolver os problemas que nós criamos com o mesmo tipo
de pensamento que os criou”.

Marx, em conhecida passagem de suas reflexões metodológicas


sobre a produção do conhecimento, enuncia: “... e toda ciência seria supérflua,


Texto elaborado para discussão com integrantes de Movimentos Sociais que participaram de Curso “Análise
da Realidade Brasileira a partir de Autores Brasileiros”, promovido pela Fundação Florestan Fernandes em
parceria com a UFMA. Este texto constitui a referência para o estudo de disciplina Metodologia Científica que
trabalhei com esta turma em 2 módulos: 1º semestre 2004/ 2º semestre 2004.

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se a forma de manifestação e a essência das coisas coincidissem
imediatamente”

Colocando a ciência em foro, adentrando na reflexão epistemológica,


enfrentamos uma primeira questão de fundo:

CIÊNCIA: PARA QUE?

O “para que” da ciência reside na explicação e desvendamento do


mundo. A Ciência, em suas múltiplas expressões e divisões, busca descobrir/
explicar/ compreender, no sentido iluminar o que se apresenta nebuloso, revelar a
lógica do que parece caótico, desordenado, sem sentido. Assim, a explicação e
compreensão científica da realidade encarna-se em práticas efetivas de diferentes
ordens, atendendo a interesses sociais distintos. Logo, a ciência no seu tempo e
em espaços sociais específicos, tem uma dimensão histórico-política essencial. É
preciso ter presente que o conhecer é processo e, assim sendo, “o conhecimento é,
por essência, uma obra-temporal” (Japiassu, 1991, 68)

Cabe, aqui, um esclarecimento: quando falamos da “encarnação


do conhecimento científico em práticas de diferentes ordens” não estamos
querendo dizer aplicação direta, imediata, automática da teoria na prática. De
fato, longe de qualquer visão mecanicista, queremos apontar para esta
dialética ciência/ sociedade em termos da dimensão política essencial do
conhecimento científico. Com efeito, o conhecimento científico está
enraizado no mundo em que vivemos e interfere efetivamente na dinâmica da
sociedade, na perspectiva de orientar a prática social.

A perspectiva marxista tem como um de seus supostos está


vinculação essencial entre teoria e prática, no sentido da transformação da
realidade, consubstanciando esta tese no conceito de práxis. De fato, em Marx, o
conhecimento pressupõe, exige, implica a possibilidade de transformar o real. É a
noção de que o conhecimento científico envolve “teoria” e “práxis”, ou seja,
envolve uma compreensão do mundo que implica uma prática e uma prática que
depende deste conhecimento. Na visão marxiana, o conhecimento é comprometido
com uma determinada via de transformação (ANDREY et SÉRIO 1988:)

No seu trabalho de explicar e compreender – que lhe é próprio e


peculiar – a ciência precisa ser regida pela LÓGICA DA DESCOBERTA, em
detrimento da lógica da prova. Em verdade, é esta uma perspectiva que se
contrapõe a uma visão positivista do conhecimento científico que visa comprovar,
demonstrar idéias/ hipóteses/ formulações. Em verdade, esta perspectiva da
descoberta é a perspectiva hoje aceita e difundida nos circuitos científicos
contemporâneos. Para tanto, é importante considerar

a EPISTEMOLOGIA HISTÓRICA DE GASTON BACHELARD (1884 –


1962 – Filósofo francês, historiador das ciências e epistemólogo, com profunda
influência nos pensadores contemporâneos).

De fato, o racionalismo aberto e crítico de Bachelard - de caráter


eminentemente anti-positivista – consubstancia, no âmbito das ciências, uma

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revolução que visa a “FILOSOFIA DA DESCOBERTA CIENTÍFICA” (JAPIASSU,
1991: 70)

A nossa tese básica é que essa lógica da descoberta científica


encarna-se na PESQUISA. E, assim, chegamos a uma segunda questão de fundo:

O QUE É PESQUISA ?

O nosso entendimento de Pesquisa vincula-se, em essência, a


descoberta/ desvendamento/ explicação/ interpretação. A rigor, pesquisa é
aventurar-se nos caminhos íngremes e apaixonantes do desconhecido, do que está
escondido nas aparências, nas evidências, buscando relações e determinações
que conferem sentido e significado aos fenômenos. É por em questão, questionar
representações, classificações e visões do senso-comum, desnaturalizando o que
é dado como “natural”, desconstruindo o que se apresenta como “construído”.

Nesta direção, é fecundo, aqui, retomar a tese marxiana de que “se a


essência e aparência coincidissem, toda ciência seria supérflua”... Esta tese aponta
no sentido de que conhecer os fenômenos não é tarefa fácil porque, nesta
perspectiva marxiana, há uma distinção fundamental entre as coisas tal como
aparecem e tal como são na realidade, ou seja, há uma distinção básica entre
a “aparência” e a “essência”.

Maria Amália Andery e Tareza Maria Sério, em artigo sobre a


construção do conhecimento em Marx (1988), assim explicitam: “O conhecimento
não se produz, portanto, a partir de um simples reflexo do fenômeno, tal como este
aparece para o homem; o conhecimento tem que desvendar, no fenômeno, aquilo
que lhe é constitutivo e que é em princípio obscuro; o método para a produção
deste conhecimento assume, assim, um caráter fundamental: deve permitir tal
desvendamento, deve permitir que se descubra por trás da aparência o fenômeno
tal como é realmente, e mais, o que determina, inclusive, que ele apareça da forma
como o faz”. (p 422, 423)

Assim, a investigação científica busca, no plano do pensamento,


apropriar-se da essência dos fenômenos, permitindo, assim, que o pesquisador
supere a visão caótica do real em sua aparência, recompondo-o como totalidade
rica de determinações e relações.

Esse trabalho de desvendamento da pesquisa é um trabalho racional.


Como bem enuncia Pierre Bourdieu (1989) a “pesquisa é uma atividade
racional” que exige investimentos e esforço, devendo estar orientada para a
“maximização do rendimento dos investimentos e para o melhor aproveitamento
possível dos recursos, a começar pelo tempo de que se dispõe” (p. 18). Nas
palavras de Bourdieu (1989), a pesquisa é, antes de tudo, um ofício.

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PESQUISA É UM OFÍCIO

E, como ofício, implica num “modus operandi” que se aprende no


próprio exercício da pesquisa, com a devida orientação de um mestre deste ofício.
Concretamente, Bourdieu refere-se aos orientadores como uma espécie de guia ou
de treinador, que protege e incute confiança, que dá o exemplo e que corrige ao
enunciar, em situação, os preconceitos diretamente aplicados ao caso particular.
(BOURDIEU, 1988: 21)

Em verdade, a Pesquisa como ofício é um trabalho a aprender/


treinar/ exercitar.

E, neste processo de aprendizagem no próprio exercício do ofício,


enfrenta-se sempre dificuldades que se colocam como desafios ao pesquisador. Na
intimidade do “laboratório”, da oficina ou escritório o pesquisador vivencia sempre
dúvidas, inseguranças, hesitações, embaraços, renúncias. Em verdade, nos
percursos da pesquisa, as dificuldades complexificam-se, apresentam novas
nuances a exigir do pesquisador competência, analítica, criatividade, esforço
metódico e vigilância permanente. Bourdieu – um mestre no ofício da pesquisa –
sustenta uma tese que se coloca como um suposto na aventura do pesquisar:
“Nada é mais universal e universalizável do que as dificuldades” (1988:18).

Adentrando na reflexão sobre este ofício, a Pesquisa se funda numa


relação básica: RELAÇÃO SUJEITO/OBJETO , ou seja, a relação que o
pesquisador vai gestando com o seu objeto, tecendo os fios da pesquisa. Para bem
configurar esta relação fundante, necessário se faz aqui apresentar dois
esclarecimentos básicos:

✓ O SUJEITO PESQUISADOR FAZ PARTE DE UMA DADA


SOCIEDADE, VIVENCIANDO UM MOMENTO HISTÓRICO
ESPECÍFICO, ou seja, está inserido num mundo peculiar que lhe
provoca de forma particular, que desperta a sua curiosidade para
determinados fenômenos. E mais: o pesquisador ocupa um
determinado lugar social que lhe confere modos peculiares de ver
e de sentir. Como pesquisador o sujeito dispõe de uma bagagem
teórica em construção que lhe possibilita vias de estudo em
função da sua capacidade de fecundar a teoria a partir das
provocações da realidade. Em verdade o pesquisador como
sujeito, encarna uma dimensão histórica e teórica a exigir uma
vigilância permanente, no sentido de aprimorar uma consciência
das suas possibilidades e limites e dos desafios a enfrentar e das
opções cotidianas no exercício do ofício.

✓ O OBJETO DE ESTUDO É UMA CONSTRUÇÃO DO SUJEITO,


a partir das provocações do mundo em termos dos fenômenos
que despertam e aguçam a sua curiosidade. Em verdade, em
contraposição radical com o empiricismo, sustentamos a tese de

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que o objeto da investigação é construído pelo pesquisador na
tessitura teoria/empiria.

Neste ponto da reflexão, abre-se uma instigante via de análise acerca


do
OBJETO DA PESQUISA COMO OBJETO CONSTRUÍDO

Bourdieu (1989), em sus reflexões metodológicas no intuito de balizar


o ensino do ofício da pesquisa, enfatiza que, sem dúvida, a operação mais
importante e, no entanto, a mais completamente ignorada é a CONSTRUÇÃO DO
OBJETO.
De fato, ainda de constata, nos circuitos acadêmicos, resquícios da
perspectiva empiricista do “objeto dado”, confundindo-se o “fenômeno de estudo”
ou a própria “temática” com o objeto da investigação.
Em uma de suas elaborações epistemológicas mais instigantes, ao
discutir o que denomina de “demissão empirista”, Pierre Bourdieu (1999)1
estabelece uma distinção fundamental nos percursos da pesquisa:

DISTINÇÃO entre

OBJETO REAL e OBJETO CIENTÍFICO

E, assim define: o objeto real é o objeto pré-construído pela


percepção. O objeto científico é um sistema de relações construídas
propositalmente.
Esclarecendo mais esta distinção fundamental, Bourdieu, em seus
trabalhos, de caráter epistemológico, publicados em português em 1989 e 1999,
mostra que este objeto ”real” está em nível do senso comum, afirmando categórico:
“pré-construído está em toda a parte”. Declara, então, que “construir um objeto
científico é, antes de mais e sobretudo, romper como senso comum, quer dizer,
com representações partilhadas por todos, quer se trate dos simples lugares –
comuns da experiência vulgar, quer se trate das representações oficiais,
frequentemente inscritas nas instituições, logo, ao mesmo tempo na objetividade
das organizações sociais e nos cérebros.
Na visão de Pierre Bourdieu, romper com o senso comum é submeter
essas representações da existência cotidiana e essas representações oficiais a um
processo de dúvida radical, quer dizer, coloca-las em questão, refleti-las,
problematiza-las. A rigor, o exercício da dúvida radical – proposição básica de
Bourdieu no ensino do ofício da pesquisa – coloca, como primeira exigência, tomar
como objeto de reflexão e discussão o próprio trabalho social de construção do
objeto pré-construído, ou seja, discutir como as representações do senso comum
foram construídas em dado contexto de relações sociais. Em verdade, é um
esforço de desconstrução do que aparece como “natural” e, neste ponto, é que
reside o verdadeiro ponto de ruptura com o senso comum (BOURDIEU, 1989:28).

1
Trata-se de obra “A profissão de sociólogo – Preliminares epistemológicas”, publicado, em português, pela
Vozes, em 1999. o título original é “Lê métier de socioloque, Préalables epistemologiques”, publicado em
1968, tendo como autores: Pierra Bourdieu; Jean – Claude Chamboredon; Jean – Claude Passeron. O texto aqui
referido, em muitos enfoques, é o relativo à segunda parte da obra, mas precisamente, um capítulo de Pierre
Bourdieu, intitulado “O fato é construído: as formas de demissão empirista”.

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Enfatiza Bourdieu que construir o objeto de investigação exige do
pesquisador uma postura ativa e sistemática perante os fatos, fenômenos e
representações constituintes do objeto real, no sentido de trabalha-lo buscando
constituir um sistema coerente de relações que deve ser submetido a um processo
investigativo.
E, para que o pesquisador possa construir este sistema de relações é
preciso interrogar sistematicamente o objeto real – tomado como caso particular –
para “dele retirar as propriedades gerais ou invariantes que só se denunciam
mediante uma interrogação assim conduzida”. Em termos operacionais, trata-se de
ligar os dados pertinentes de tal modo que funcionem como um programa de
pesquisa que põe questões sistemáticas, apropriadas a receber respostas
sistemáticas (BOURDIEU, 1989:32).
Nesta perspectiva é que Bourdieu, ao refletir sobre o que denomina
de “abdicações do empirismo”, chama atenção de que “não se pode esquecer, de
modo algum, que o real nunca toma a iniciativa já que só dá resposta quando é
questionado” (199:48). Em verdade, é o assumir desta postura ativa do
pesquisador enquanto sujeito que conduz o processo investigativo, tecendo a sua
relação com o objeto de estudo em construção.
Nestas reflexões epistemológicas sobre exigências básicas no ofício
da pesquisa, cabe, aqui, destacar um elemento – chave: esta construção do objeto
efetiva-se no plano do pensamento, através de um processo de raciocínio em que o
pesquisador vai pensando, refletindo sobre o fenômeno a partir de luzes da teoria.
É o que costumamos chamar de .RACIOCÍNIO PROBLEMATIZADOR.

Este raciocínio problematizador vai se gestando quando o


pesquisador pensa, reflete as múltiplas expressões do fenômeno de estudo a partir
das pistas e indicações da teoria, problematizando o objeto real e conseguindo,
assim, adentrar nas relações constituintes do real que provoca e instiga o desejo e
compreende-lo e explica-lo. De fato, nestes percursos de problematização,
deflagra-se a tessitura teoria/empiria, a pedra de toque no exercício do ofício da
pesquisa.
Em verdade, articular, relacionar, tecer teoria e empiria a partir do fenômeno
de estudo é o elemento essencial nesta lógica da descoberta encarnada na
pesquisa que nos permite apropriar-nos do mundo nosso de cada dia no plano do
pensamento, fazendo-o um “concreto pensado”, como bem enfatiza Marx em seu
método de investigação. Inegavelmente, é essa tessitura teoria/ empiria que, no
dizer marxiano, permite a apropriação do mundo pelo cérebro pensante,
produzindo o “concreto pensado” que, então, aparece na mente do pesquisador
como “totalidade pensada” (MARX, Introdução Geral de 1857 de Crítica de
Economia Política).

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