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Debate - ARCOweb - revista PROJETO DESIGN

Lessandro Lessa Rodrigues Participe


envie suas opiniões.
A habitação social pode e
deve ser mais do que uma
casa LESSANDRO LESSA RODRIGUES é arquiteto e
urbanista graduado e pós-graduado pela UFMG,
com mestrado (2003) em regeneração urbana pelo
Liverpool Hope University College, de Liverpool,
O autor deste artigo procura mostrar uma experiência Inglaterra
não-governamental bem-sucedida de habitação social
na Inglaterra. Diante do contexto político-social por
que passa nosso país, o exemplo da Maritime Housing
Association, de Liverpool, pode ser referencial de
habitações de interesse social para locação.

No momento histórico em que nosso país passa por possível e


esperada mudança no fazer político, algumas das
transformações que a maioria da população urbana brasileira
ainda continua vislumbrando são as mais básicas possíveis.
Em cenário de extrema desigualdade social, a produção de
habitação digna para a massa de excluídos continua sendo
dos principais desafios para o governo que se iniciou em
janeiro último. Nesse sentido, vale sonhar com conceito
abrangente de habitação, no qual casa também queira dizer
acesso à cidade e àquilo que representa a vida no espaço
urbano, como emprego, educação, cultura, transporte, saúde,
esporte, lazer etc.

As perspectivas iniciais do governo federal são as melhores


possíveis. A começar pela criação do Ministério das
Cidades, cuja equipe é composta por alguns dos
representantes da luta pela reforma urbana no Brasil.
Paralelamente à criação do ministério, a recente aprovação do
Estatuto das Cidades representa a base legal para a
implementação das mudanças e para a viabilização dos
diversos projetos e parcerias necessários para trazer
qualidade de vida aos cidadãos brasileiros.

Nesse ambiente político e institucional favorável à


implementação das transformações necessárias, nada mais
natural que diferentes propostas e experiências sejam
trazidas para o debate. Uma delas é a da associação
habitacional baseada na região noroeste da Inglaterra, mais
precisamente na cidade de Liverpool, a Maritime Housing
Association. Esse interessante modelo deve ser analisado
sob a ótica das condições inglesas, completamente distintas
das vigentes no Brasil. Por outro lado, é interessante tê-lo
como mais um exemplo a ser analisado antes de criarmos o
nosso.

A visão ética
A Maritime Housing Association, organização sem fins
lucrativos, foi criada em 1963 com o objetivo de produzir e
gerenciar habitação de interesse social para a população
da região de Merseyside, no noroeste inglês. Quarenta anos
depois, a instituição é responsável por um estoque de quase
5 mil unidades habitacionais localizadas em diferentes
cidades daquela área. Nesse mesmo período, aperfeiçoou e
expandiu suas funções e conta hoje com o respeito das várias
instituições com as quais trabalha, no setor público, privado

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ou comunitário.

O reconhecimento adquirido durante os anos é decorrente,


principalmente, do entendimento que a entidade tem do que
seja habitação de interesse social. Sua produção recente
demonstra especial atenção com garantir o
desenvolvimento sustentável das comunidades onde atua.
Dessa forma, a Maritime acredita que o investimento em
arquitetura de qualidade seja primordial para assegurar
melhor condição de vida aos inquilinos. A organização
também entende que uma comunidade só se sustenta caso os
aspectos sociais e econômicos sejam levados em
consideração. A Maritime investe ainda no trabalho em
parceria com os setores público, privado e comunitário
e acredita que somente assim garantirá o êxito dos diversos
projetos em que se envolve.

Com relação aos aspectos físico e arquitetônico, a Maritime se


distingue da grande maioria das associações habitacionais
locais por crer que o desenvolvimento sustentável das cidades
passa pela qualidade estética e técnica do ambiente
construído. Num país onde o tema habitação de interesse
social ainda é tratado com certo tradicionalismo e a maioria
da população sonha com a casinha com jardim e quintal,
qualquer inovação vem acompanhada de grande risco. No
entanto, a entidade tem trabalhado no sentido de
implementar uma nova agenda, pela qual a construção de
seus empreendimentos é articulada à revitalização e
reutilização de antigos prédios (geralmente armazéns em
estado de abandono) na área central das cidades.
Paralelamente, a Maritime também privilegia
empreendimentos de uso múltiplo (live, work and play), nos
quais habitação, comércio e lazer coexistem em uma mesma
edificação.

Essa visão, que pode ser considerada até radical para os


padrões ingleses de habitação de interesse social, embasa-se
na compreensão de que é necessário trabalhar no mesmo
sentido das diretrizes apontadas para as cidades onde a
entidade atua. No caso específico de Liverpool, por exemplo,
existe o entendimento de que a revitalização da área
central é o projeto prioritário para a retomada do
desenvolvimento sustentável local. Essa visão, construída por
meio do trabalho conjunto de vários atores urbanos, dentre
eles o poder local, através da Liverpool Vision, e o governo
central, por intermédio da agência regional de planejamento,
é a base de ação estratégica da Maritime. Assim, mesmo
investindo em projetos com considerável risco comercial
em curto prazo, a entidade acredita que sua contribuição para
a construção do futuro da cidade será compensada em longo
termo.

Seguindo esse mesmo raciocínio, a Maritime também acredita


que seus investimentos somente se farão viáveis nas
comunidades onde existir razoável nível de desenvolvimento
econômico e social. Considerando-se o fato de que ela atua
em região fortemente afetada pelo processo de
desindustrialização ocorrido durante os anos 1970 e 1980
na Inglaterra, a garantia de comunidades econômica e
socialmente desenvolvidas só pode ser alcancada por meio de
considerável investimento. Conseqüentemente, a Maritime
criou uma organização não-governamental, a Heartlands, que
é diretamente responsável pela criação, viabilização e
implementação de projetos comunitários que têm por
objetivo alavancar o desenvolvimento socioeconômico dos
grupos em que atua.
A participação efetiva e contínua da Heartlands em todos os

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projetos implementados pela Maritime, além de garantir a


viabilidade de seus investimentos em longo prazo, é sinônimo
do entendimento que a organização tem da complexidade do
conceito de moradia. Para ela, o significado de habitação é
muito mais abrangente do que somente garantir às famílias
casa para morar: as pessoas que vivem nessas áreas
necessitam de qualidade de vida e acesso à cidade. Esse
foi o principal motivo para a Maritime investir na construção e
na manutenção de estrutura interna que atenda às
necessidades sociais e econômicas das comunidades onde
trabalha.

A visão pública e de mercado


A interpretação do trabalho desenvolvido pela Maritime pode
ser feita sob dois prismas. Num deles, que acaba de ser
explorado, aceita-se o fato de que a entidade compreende a
necessidade e o direito que todos têm de viver em uma
sociedade mais justa e em ambiente urbano sustentável sob
os pontos de vista físico, econômico e social. Nessa versão, os
diversos projetos que ela desenvolve teriam enorme grau de
altruísmo e apresentariam considerável risco sob o ponto de
vista mercadológico em curto prazo.

É preciso considerar, no entanto, a possibilidade de que o


trabalho desenvolvido pela Maritime seja interpretado sob
ótica estritamente racional. Nesse caso, estaríamos falando
de uma organização não-governamental e sem fins lucrativos
que sobrevive de subsídios públicos e do retorno do
aluguel das quase 5 mil unidades habitacionais das quais é
proprietária. Nessa perspectiva, torna-se essencial que se
considere a necessidade de seguir as diretrizes de
desenvolvimento urbano apresentadas pelo poder público,
que passa a ser entendido como importante parceiro
financeiro. Da mesma forma, deve-se pensar em estratégias
que garantam a vitalidade do espaço urbano onde suas
propriedades estão localizadas, pois somente assim haveria
clientes para elas.

Durante os últimos dez anos, a região de Merseyside tem


recebido considerável investimento da União Européia. Esses
recursos são parte do extenso programa de regeneração
urbana que a UE tem implementado para diminuir as
desigualdades regionais em seu território. Objetivando
estabelecer regras para a utilização das verbas disponíveis, a
UE acaba exercendo influência sobre as políticas nacionais,
regionais e municipais de desenvolvimento urbano.

Nesse contexto, para ter acesso aos recursos financeiros


disponíveis, a Maritime passa a ter a obrigação de seguir as
diretrizes de regeneração urbana estabelecidas pela
UE, pelo governo britânico, pela Agência Regional de
Desenvolvimento e, finalmente, pela administração
municipal das cidades onde atua. Considerando-se que
todas essas instâncias governamentais definem habitação de
interesse social de forma ampla, conclui-se que à Maritime
não resta outra alternativa senão acreditar que casa significa
arquitetura de qualidade acompanhada de desenvolvimento
econômico e social.

Nessa mesma perspectiva, a Maritime também tem que


considerar a satisfação dos seus clientes como garantia de
recursos para projetos futuros. Deve-se compreender que
grande parte dos recursos financeiros de que a entidade
dispõe para sobreviver e para ampliar suas atividades advém
dos aluguéis pagos por seus inquilinos. Essas pessoas, que
vêm de classes sociais e faixas etárias diversas, não querem
viver em comunidades decadentes ou em áreas urbanas
degradadas. Cabe à Maritime criar as condições para que

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seus clientes desejem viver em suas propriedades.

Assim, a Maritime trabalha no sentido de construir e manter


comunidades onde as pessoas tenham acesso a lazer, cultura,
educação e emprego. E procura garantir meio ambiente de
qualidade, em que tanto as unidades habitacionais quanto o
espaço público sejam atrativos e interessantes. Somente
assim a Maritime garantirá a permanência de seus
inquilinos, que, por sua vez, garantirão a sustentabilidade
financeira da organização.
Imagino a Maritime como um dos exemplos que podem ser
considerados como positivos e factíveis de estudos e análises
mais aprofundados por pessoas envolvidas na produção de
habitação de interesse social em nosso país. Não importa sob
qual das duas diferentes perspectivas apresentadas neste
artigo.

Publicada originalmente em PROJETODESIGN


Edição 282 Agosto de 2003

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