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O
na como sendo a porta de entrada do paciente no s diferentes procedimentos que são exi-
tratamento. É a partir dela que o terapeuta conse- gidos na prática clínica do fonoaudiólogo
gue reunir dados para analisar e viabilizar sua de- têm sua devida importância e formam um
cisão em face da problemática da linguagem que é conjunto necessário que possibilita a constituição
apresentada, daí pensarmos que apenas uma da clínica fonoaudiológica, enquanto espaço
anamnese em forma de questionário não poderá terapêutico.
dar conta de encadeamentos da história do paci- Mais precisamente, irei enfocar situações que
ente. dizem respeito ao início do tratamento
fonoaudiológico, especificamente, sobre a primei-
Palavras-chave: anamnese, entrevista, clínica, ra entrevista.
fonoaudiológica, terapeuta. É possível constatar que, para a realização
da primeira entrevista, boa parte dos
Abstract fonoaudiólogos continuam optando pelo uso de
roteiros de anamneses previamente elaborados,
All procedures involving speech therapist clinical visando a detectar, principalmente, o quadro clíni-
practice are important and make a whole that in- co da patologia. Não estou desmerecendo a im-
forms the therapeutic process. However, in this portância de se conhecer o quadro clínico, pois
Sra. V. : Antes de vir aqui, fui numa outra fono, ída do pai de casa, por vários dias.
mas não quis voltar lá. Numa sociedade como a nossa, normativa e
TP : Por quê ? prescritiva, que tende a gerar muitos preconceitos
Sra. V. : Não gostei do jeito que ela falava comigo. sociais (Freire, 1997), manter um casamento dian-
Ela parecia muito mecânica, às vezes insegura. Ela te de tais circunstâncias acaba por ser visto como
perguntava e eu respondia . Era assim o tempo algo negativo e que interfere no desenvolvimento
todo. e no comportamento do filho.
Quando a mãe de R. saiu, analisei, mais uma Dessa forma, pude constatar que a confis-
vez, as questões que podem envolver este primei- são não poderia se dar em qualquer situação. No
ro momento entre paciente e terapeuta. O nosso primeiro encontro, a Sra. V. não se sentiu
insucesso que ela relatara do primeiro encontro fez encorajada a entregar ao outro os relatos da sua
com que a mesma desistisse de retornar e verificar história de vida.
qual a proposta terapêutica que seria dirigida a seu
filho. Situação 2
Esse caso se tornou mais significativo para
mim, porque, aproximadamente um mês depois da J., sexo masculino, 39 anos, compareceu à
primeira consulta, algo de novo surgiu ao avaliar a primeira entrevista, apresentando um encaminha-
escrita de R. e perceber que as trocas de letras apre- mento do neurologista, solicitando um parecer
sentadas por ele aconteciam de for ma fonoaudiológico sobre seu caso .
assistemática. Como ele ainda se encontrava na al- O paciente relata que, desde criança, sente
fabetização, não poderia ver este quadro do ponto muita dificuldade para ler e escrever. Preferia não
de vista patológico. Porém, o que mais me chama- ir à escola e, por isso, às vezes, a mãe batia nele.
va a atenção em R. era seu comportamento bas- Seus irmãos e irmãs não apresentavam problema
tante instável: ora mostrava-se participativo, aten- semelhante ao dele .
to, colaborativo, ora comportava-se como uma cri- J. é o sétimo filho do casal e o caçula, por
ança dispersa, pouco participativa e desinteressa- isso ficava sempre mais evidente a problemática
da. dele quando a mãe o comparava com os demais
Convoquei a Sra. V. para uma sessão onde filhos. O entrevistado referiu como nível de esco-
pudéssemos expor as observações sobre o caso, laridade o Primeiro Grau completo, que, segundo
assim como recomendar um acompanhamento psi- ele, só conseguiu concluir quando já havia com-
cológico para R. Nessa mesma sessão, e pela pri- pletado 20 anos, tendo sido reprovado várias ve-
meira vez, a Sra. V. faz referência a uma série de zes.
acontecimentos que passaram a configurar melhor O mesmo disse ter um curso técnico em
a história de vida de R. manutenção de máquinas industriais que exigia
A Sra. V. confessa que seu filho era submeti- pouca leitura e mais atuação prática. Trabalha como
do a acompanhamento psicológico, mas que foi técnico em manutenção há 13 anos e, ultimamen-
interrompido por motivos financeiros: o marido te, tem sido uma exigência da empresa que os téc-
encontrava-se desempregado. Ademais, tem sido nicos participem de cursos de atualização e aper-
a família do cônjuge que vem assumindo as men- feiçoamento. Conseqüentemente, ele se vê obriga-
salidades da escola e do tratamento do a ler os vários manuais de instrução. Como sen-
fonoaudiológico, e o marido, dificilmente, terá te dificuldade para entender sua própria leitura, re-
chances de conseguir um novo emprego, por se tra- solveu procurar um neurologista, na tentativa de
tar de um alcoólatra e com tendências ao uso de saber como solucionar o seu problema.
drogas. Ele relata que se submeteu, a pedido do neu-
Toda situação vivida pela família é geradora rologista , a um exame de E.E.G. e tomografia axial
de muitos conflitos domésticos: a criança sempre computadorizada, e os laudos foram normais. Por
presenciava brigas do casal, culminando com a sa- essa razão, o médico recomendou que se subme-