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SÉRIE: CÍRCULO VERMELHO


VOLUME: 34
TÍTULO: EM NOME DA VERDADE
AUTOR: WILLIAN HARRISON
DESENHO DA CAPA:
EDITORA: CEDIBRA
ANO DE PUBLICAÇÃO: 1975
PREÇO: CR$ 3,50
PÁGINAS: 125

SCANS E TRATAMENTO: RÔMULO RANGEL


romulorangel@bol.com.br

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—3 —
COLEÇÃO CÍRCULO VERMELHO

Próximo lançamento:

35. HIENAS DO SINAI - William Harrison

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O texto deste livro não pode ser, no todo ou em parte,


nem registrado, nem reproduzido, nem retransmitido por
qualquer meio mecânico, sem a expressa autorização do
detentor do Copyright.

—4 —
EM NOME
DA VERDADE
Willian Harrison

—5 —
ONDE UM COLT
É O MELHOR ARGUMENTO

Toda a crueza e violência do Velho Oeste, narradas


pelos melhores autores do gênero, em nossas emocionantes
coleções:

CORISCO KANSAS
TERRA BRAVA PRADARIA
LEI DO OESTE CORCEL
XERIFE WINCHESTER
MUSTANG VINGADORES
CACTUS OESTE LEGENDÁRIO
TERRA BRUTA KID-BEN
DESAFIO OESTE HEROICO
FÚRIA CALIBRE
TRIGGER VAQUEIRO
OESTE SELVAGEM RIFLE
COLORADO RANCHO
OESTE BRAVIO RIO BRAVO
NEBRASKA VALENTES
BRAVO OESTE LAÇO
GUN-MAN CARAVANA
CALIFÓRNIA

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CAPÍTULO 1
Confortavelmente instalada no assento traseiro de seu
Rolls Royce particular, Maggie Doyle se encaminhava para
mais um dia de trabalho na L.E.S.B. Enquanto seu
motorista se ocupava com o confuso trânsito matinal de
Nova Iorque, ela examinava documentos em código de sua
organização e meditava sobre as decisões a tomar naquele
dia.
Havia duas coisas importantes a fazer: receber uma
encomenda de um novo soro da verdade, capaz de
revolucionar todas as técnicas usadas em interrogatórios, e
combinar com Eva Brooklin os detalhes de sua nova missão
a ser desempenhada nas Caraíbas. Quanto ao resto, seriam
medidas rotineiras e burocráticas, inerentes a uma
organização gigantesca como a L.E.S.B., que possuía
ramificações nos quatro cantos do mundo.
De repente, seus pensamentos foram interrompidos por
uma observação de seu fiel motorista:

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— Acho que estamos sendo seguidos.
Maggie Doyle não se perturbou com suas palavras.
Veterana na profissão de agente secreto, havia muito tempo
que perdera o hábito de reagir com impetuosidade diante de
acontecimentos inesperados e incômodos.
— Tem certeza, Bill? — perguntou, lentamente.
— Quase absoluta.
— Então, dê umas voltas por Manhattan, para ver no
que vai dar.
— Entendido.
O motorista, durante uns vinte minutos, percorreu o
labirinto de ruas e avenidas da ilha de Nova Iorque. Depois,
enquanto observava o espelho retrovisor, deu o seu
veredito.
— É. Não tem jeito, não. Há gente de olho em nós,
mesmo. O que faço agora?
Maggie Doyle se manteve em silêncio por um curto
momento. O que estava acontecendo não era muito comum.
Geralmente, os inimigos de sua organização procuravam
atingir suas agentes, que agiam sobre os fatos, atrapalhando
os planos de muita gente. Ela, embora chefe suprema da
L.E.S.B., em geral não funcionava como alvo de ataques.
Exceto quando havia gente interessada em desmantelar a
sua organização. O que, aliás, bem podia ser o objetivo de
quem a estava seguindo.
— Vamos direto para o escritório da “Doyle Enterprises
Inc.” — decidiu ela, por fim, depois de meditar acerca das
alternativas possíveis.
A “Doyle Enterprises Inc”, empresa-chefe do império
controlado por Maggie, ocupava todo um andar de um
edifício localizado na parte sul de Manhattan. O prédio fora
construído recentemente para, segundo a versão oficial,
concentrar em um só ponto as empresas, departamentos e

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subsidiárias do grupo financeiro de Maggie Doyle que, para
todos os efeitos, não passava de uma velha milionária
empenhada em obras de caridade e na direção de seus
múltiplos interesses econômicos. Mas, no fundo, tudo fora
apenas manobra para conseguir um moderníssimo quartel-
general para a L.E.S.B., que ocupava todo o imenso subsolo
do edifício.
Maggie acendeu um cigarro, com total tranquilidade e,
depois de soltar a primeira baforada de fumaça, apanhou um
fone engatado em um suporte na parte lateral do carro.
Apertou um botão nele e imediatamente soou uma voz
feminina.
— Pronto. Escritório Central à escuta.
— Aqui, Maggie Doyle. Estou com um pequeno
problema. Devo chegar ao nosso prédio dentro de dez
minutos e há um carro me seguindo. Não sei o que
pretendem fazer comigo, mas precisamos tomar
providências preventivas. Destaque três agentes para me
dar cobertura. Que elas fiquem na entrada do edifício, mas
disfarçadas. E que ajam com discrição, caso seja preciso
entrar em ação.
— Entendido, Maggie. Tomarei conta do caso
pessoalmente.
Maggie se despediu de sua secretária e recolocou o fone
no lugar. Como se nada de mais estivesse acontecido,
continuou a fumar tranquilamente o seu cigarro.
Bill, que além de motorista também funcionava como
agente especial do quadro suplementar da L.E.S.B., não
parava de observar o espelhe retrovisor.
— Eles diminuíram a distância que estavam mantendo
em relação a nós — informou. — Devo acelerar, também?
— Não — retrucou Maggie, amassando seu cigarro no
cinzeiro lateral do carro.

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— Talvez eles tentem um sequestro...
— Duvido muito — atalhou Maggie, meneando a
cabeça. — Só um louco seria capaz de tentar uma coisa
dessas, numa avenida cheia de carros, em plena luz do dia
e às vistas de centenas de pessoas.
— Mas acontece que o mundo anda cheio de loucos —
argumentou o motorista, sem abandonar seu ponto de vista.
— De qualquer maneira, continue na sua velocidade
normal.
Quando o Rolls Royce estacionou diante do prédio
ocupado pelas empresas de Maggie, o outro carro estava
praticamente colado à sua traseira.
Sem demonstrar qualquer medo ou agitação, a chefe
suprema da L.E.S.B. saltou de seu automóvel. Mal deu dois
passos na calçada, duas moças vieram ao seu encontro e a
cumprimentaram sorridentes. Quem as observasse, tão
lindas e tão femininas, jamais poderia imaginar que se
tratavam de especialistas em caratê e exímias atiradoras,
capazes de usar com total precisão as pistolas que
carregavam em suas bolsas.
— Susy ficou lá na porta do edifício, para nos dar
cobertura — avisou uma delas.
— Ótimo — murmurou Maggie. — O carro é aquele
ali...
As duas agentes acompanharam o olhar de sua chefe,
que focalizou rapidamente um Lincoln Continental negro
parado junto à calçada.
— Vamos entrar agora — disse Maggie. — E só tomem
qualquer atitude em último caso. Detesto demonstrações
públicas de violência.
Ladeada pelas agentes, Maggie se encaminhou para a
entrada do edifício. Antes de atingi-la, porém, parou e se
amparou no braço de uma das moças.

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— O que aconteceu? — perguntou a agente. — Está se
sentindo mal?
— Não, não... — murmurou Maggie, com voz sumida.
— Foi apenas uma tonteira momentânea. Mas já passou...
Vamos, meninas.
Assim que puseram os pés no saguão do edifício, uma
das agentes olhou para trás.
— O carro está indo embora — informou ela.
— Estranho, não? — comentou a outra, de sobrancelhas
franzidas. — O que será que eles queriam?
— Na certa, perceberam a nossa presença e desistiram
de tentar o que tinham em mente.
— Certamente foi isso — concordou Maggie.
As três entraram no elevador privativo da diretoria do
conjunto de empresas. O ponteiro, no saguão, indicou que
eles estavam subindo para o vigésimo andar. Mas, na
verdade, ele desceu para o subsolo, onde ficava o quartel-
general da L.E.S.B.
Quando a placa de aço se abriu, Maggie se despediu das
duas agentes, agradecendo a cobertura dada na rua, e se
encaminhou para o seu escritório.
Intrigada, constatou que não estava se sentindo bem.
Uma espécie de névoa invadira sua mente, confundindo seu
raciocínio, normalmente ági.1 e ligeiro. Ela passou a mão
pela nuca, onde fisgadas agudas se sucediam, semelhantes
à ardência provocada pela picada de um mosquito. Aliás, as
fisgadas tinham começado no exato momento em que
sentira a estranha tontura junto à porta do edifício.
Lutando contra aquele incômodo e súbito mal-estar, ela
entrou em seu escritório privativo.

***

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Eva Brooklin chegou à sede da L.E.S.B. por volta das
nove e meia da manhã. Estava meia hora atrasada, com
relação ao horário marcado por Maggie Doyle. Mas, para
quem fora dormir depois das três da madrugada, após uma
noite animada e curtida no maior embalo, até que o atraso
não era dos maiores. Principalmente se tratando dela, que
nunca morrera de amores por relógios e horários.
Após a identificação eletrônica na entrada do subsolo,
ela se encaminhou diretamente para o escritório privativo
de Maggie Doyle. Lucy, a bela secretária da chefe da
L.E.S.B., a cumprimentou com um sorriso nos lábios.
— Já sei — assinalou Eva, erguendo a mão. — Nem
precisa dizer. Estou meia hora atrasada e nossa querida
chefinha detesta que a gente não obedeça a sua agenda
diária.
O sorriso se ampliou nos lábios de Lucy.
— Pelo justo, Maggie Doyle não deveria lhe dar uma
bronca hoje — explicou ela. — Nossa chefinha chegou a
uns dez minutos atrás...
— O quê?! — exclamou Eva, franzindo as
sobrancelhas. — Você está querendo insinuar que Maggie
se atrasou vinte minutos hoje?!
— Exatamente.
— Mas como pôde acontecer esse milagre?
— Parece que andaram seguindo o carro dela —
esclareceu Lucy, com às feições sérias. — Ela chegou a
pedir um esquema da proteção, em emergência. Mas não
aconteceu nada demais... Bem, vamos ver se ela vai atendê-
la agora, Eva.
Lucy se comunicou com Maggie Doyle pelo interfone
e recebeu ordens para mandar Eva Brooklin entrar
imediatamente.

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— Sinal verde para você — brincou da, fitando a agente
069, enquanto pousava o interfone no lugar. — E vá
preparando seus ouvidinhos, querida.
— Quero ver se ela hoje vai ter coragem de dar bronca
em mim — retrucou Eva, sorrindo.
Eva ultrapassou a porta ao lado da mesa de Lucy e
penetrou no luxuoso escritório de Maggie Doyle.
Encontrou-a, como de hábito, sentada atrás de sua
escrivaninha. Mas não viu em seu rosto a mesma expressão
severa e serena de sempre.
— Sente-se — murmurou Maggie, apontando com um
dedo trêmulo a cadeira colocada ao lado de sua mesa.
Eva obedeceu, enquanto seus olhos observavam
atentamente as feições de Maggie.
— O que há? — perguntou, quando viu a chefe da
L.E.S.B. recostar a cabeça em sua cadeira e respirar fundo,
de olhos fechados. — Está sentindo alguma coisa?
— Desde que cheguei, estou meio zonza e com um peso
na cabeça. — Maggie sorriu. — Acho que a velhice está me
pegando para valer.
— Quer que eu peça a Lucy para chamar nossa médica
de plantão?
— Não, não é preciso — retrucou Maggie, meneando a
cabeça. — Vamos ao trabalho, garota. Aliás, você como de
hábito se atrasou bastante...
— Pelo que Lucy me contou se eu chegasse às nove,
conforme o combinado, eu não a encontraria aqui —
retrucou Eva, prontamente, com voz ferina.
Um débil sorriso curvou os lábios finos de Maggie.
— O que eu gosto em você é esse raciocínio rápido e
preciso — comentou ela, com um toque de ironia. — Acho
isso fundamental para a nossa profissão... — Ela se pôs de
pé. — Bem, vamos tratar de sua próxima missão agora.

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Estão acontecendo problemas nas Caraíbas, e eu gostaria
que você fosse dar uma olhada lá...
Maggie fez menção de caminhar até um armário, onde
guardava seus documentos mais secretos. Mal deu dois
passos, porém, uma violenta vertigem invadiu sua mente e
ela perdeu a firmeza sobre as pernas. Teve que se agarrar na
borda de sua escrivaninha, para não cair.
Eva se pôs de pé prontamente. Contornou a mesa e,
passando o braço ao redor dos ombros dela, conduziu-a de
volta à sua cadeira.
— É melhor chamar Lucy — murmurou Eva,
estendendo a mão na direção do interfone.
— Espere — ordenou Maggie, com voz sumida.
— Mas, você está mal!
— Antes, quero lhe dizer uma coisa. Não sei o que há
comigo e posso apagar de um momento para o outro...
Nossa organização, porém, não pode parar. Quero lhe
confiar uma pequena missão extra, mas muito importante...
Com mão trêmula, ela abriu uma das gavetas de sua
mesa. Retirou dela uma folha de papel e a entregou a Eva.
— Aí, estão todas as especificações de uma remessa que
deverá chegar esta tarde para a L.E.S.B. É um negócio
muito importante e eu ia me encarregar pessoalmente de
receber o pacote no aeroporto. Mas, como posso não estar
em condições para dar um pulo até lá, quero que você vá...
E lembre-se: isso é uma mercadoria importantíssima.
Ela enfiou a mão na gaveta novamente e apanhou uma
fotografia. Exibiu-a a Eva.
— Veja bem esse rosto. É o homem com o qual deverá
estabelecer contato hoje, quando...
Maggie Doyle não chegou a completar sua frase. Sua
cabeça pendeu para o lado, seus olhos se fecharam e o corpo
se afundou, flácido, na cadeira.

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— Maggie! — exclamou Eva, ajoelhando-se ao seu
lado.
Constatando que ela desmaiara, Eva se comunicou com
Lucy, pelo interfone. Instante depois, a médica de plantão
na organização surgiu na sala. Examinou Maggie
cuidadosamente e lhe aplicou uma injeção para arrancá-la
daquele estado de inconsciência. A droga reanimadora,
contudo, não surtiu o menor efeito.
— Não estou entendendo — murmurou a médica,
relanceando o olhar desde Eva até Lucy, que também viera
ver o que estava acontecendo. — Maggie apresenta os
sintomas de um desmaio comum, mas não reagiu à injeção
que lhe apliquei...
— O que vamos fazer, então? — perguntou Lucy,
nervosa.
— Acho melhor levá-la para um hospital, onde haverá
meios de submetê-la a um exame mais minucioso.
Lucy tomou as necessárias providências. Primeiro,
pediu a presença de uma ambulância do “St. Paul Hospital”,
onde normalmente as agentes da L.E.S.B. recebiam
assistência médica. Depois, convocou Thelma, uma das
agentes mais antigas da organização que funcionava como
eventual substituta de Maggie.
Thelma, embora na casa dos cinquenta anos,
conservava muito da beleza que, na juventude, virara a
cabeça de muito homem. Amiga antiga de Maggie,
trabalhava na L.E.S.B. desde a sua fundação.
Ela apareceu na sala no momento em que Eva, Lucy e
a médica se preparavam para transportar Maggie para o
elevador. Quando a ambulância chegasse, era preciso que
os padioleiros encontrassem a velha milionária no escritório
privativo de sua organização comercial. Mesmo em uma

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situação de emergência, não valia a pena colocar em risco a
segurança e o anonimato do quartel-general da L.E.S.B.
Thelma ficou profundamente chocada com o estado de
sua amiga e crivou a médica de perguntas. Observou
colocarem o corpo inanimado de Maggie em uma espécie
de maca e a acompanhou de perto, quando Eva e Lucy a
transportaram para o elevador.
Em silêncio, o grupo subiu para o vigésimo andar do
prédio. O elevador parara no interior da sala privativa da
diretora da “Doyle Enterprises Inc.” Elas saltaram lá e
deitaram Maggie em um longo e macio sofá. Mais uma vez,
a médica da L.E.S.B. a examinou. Nada mudara em seu
estado físico: fora a prolongada e inexplicável
inconsciência, suas funções fisiológicas transcorriam
dentro da mais total regularidade.
Como nada mais era possível fazer a não ser aguardar a
chegada da ambulância, Eva, Lucy, a médica e Thelma se
espalharam em silêncio pelo luxuoso escritório.
De repente, Thelma abandonou a cadeira onde se
instalara e veio se sentar ao lado de Eva.
— Parece que o dia hoje não começou bem para nós —
comentou ela, respirando fundo. — Primeiro, esse mal-estar
súbito de Maggie. Depois, o desaparecimento de Louise
Simpsey.
Eva franziu a testa e girou o rosto para fitar Thelma.
— Louise desapareceu? — perguntou, lentamente.
— Ao que tudo indica, sim. Estava justamente
averiguando isso, quando Lucy me chamou. Desde ontem
ela não dá notícias, e eu temo que lhe tenha acontecido algo
grave...
Louise Simpsey ocupava uma posição de destaque
dentro dos quadros da L.E.S.B. Agente veterana, fora
deslocada do serviço ativo, para o setor burocrático da

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organização e atualmente respondia pelas atividades do
grupo de agentes operando dentro dos Estados Unidos.
— Louise não veio trabalhar ontem, alegando que
precisava tomar algumas providências — recomeçou
Thelma, após um curto momento de silêncio. — Como não
apareceu hoje também, telefonei para a sua casa. Ninguém
respondeu. Mandei então uma de minhas auxiliares até lá,
para averiguar. A garota me telefonou momentos antes de
Lucy me chamar. Encontrou o apartamento de Louise
vazio, todo desarrumado e a cama por fazer, dando a
impressão de que Louise saiu às pressas, sem ter tempo para
dar um jeito nas coisas... Você não acha isso estranho?
Eva meneou a cabeça afirmativamente.
— Muito estranho, até — murmurou, devagar. — E
tudo isso que aconteceu me faz pensar em uma
possibilidade tenebrosa. Maggie doente e Louise
desaparecida... Não parece até que há uma ação em
movimento para desmantelar a nossa organização?
Thelma pousou um olhar penetrante no belo rosto da
agente 069.
— Então, você acredita que a doença de Maggie não é
algo natural e tem alguma ligação com e aparente
desaparecimento de Louise Simpsey?
Eva encolheu os ombros e abriu os braços.
— Eu não afirmei nada — retrucou. — Apenas levantei
uma hipótese. Mas, de qualquer maneira, você há de convir
que dois fatos estranhos acontecendo ao mesmo tempo têm
que fazer a gente pensar no pior.

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CAPÍTULO 2
Depois que a ambulância chegou e Maggie partiu para
o hospital, acompanhada por Thelma, Lucy e a médica da
organização, Eva seguiu para a sua casa. Como explicou a
Thelma, precisava estudar a missão que Maggie lhe
confiara para aquela tarde.
Assim que chegou em seu apartamento, tratou de tirar a
roupa e seguiu direto para o banheiro. O dia estava muito
quente e um banho bem morninho serviria não só para
refrescar como também para repousar seu corpo ainda
cansado das brincadeiras do dia anterior.
Depois de encher a banheira e temperar a água, ela
voltou ao quarto e, de sua bolsa, apanhou a folha de papel
que Maggie lhe entregara antes de desfalecer. De regresso
ao banheiro, mergulhou seu corpo curvilíneo na água
tépida. Por um momento, entregou-se à sensação
reconfortante que ela proporcionava aos seus músculos.

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Então, encostando a cabeça na parede por trás da banheira,
começou a ler a folha de papel.
Maggie Doyle anotara nela informações fraccionadas e
rápidas, para uso pessoal. No entanto, lendo-as com
cuidado, era possível fazer uma idéia clara do assunto em
questão.
Logo no topo da página, havia a seguinte anotação:
“Voo 351, Panam, 16 horas. Portador: Enrico Mattei, da
parte de Monica D’Angelo”.
Mais abaixo, outra anotação em letra corrida e
apressada: “Usar identificação Alpha, código 45”.
Depois, vinha um lembrete, que Maggie certamente
escrevera para si própria, pois era uma mulher atarefada,
com mil e uma coisa« a fazer: “Mercadoria em experiência,
ainda. Entregar à Dra. Chesterson, para análise química.”
Eva repassou os olhos pela folha de papel. Leu os
detalhes mais importantes e tratou de gravá-los na mente.
Depois, estendeu a mão até uma pequena prateleira perto da
banheira e apanhou uma caixa de fósforos. Acendeu um e
aplicou a pequena labareda na extremidade da folha de
papel, que foi imediatamente lambida pelo fogo. Quando a
folha se reduziu ao mínimo e não foi mais possível segurá-
la sem se queimar, Eva %e ajoelhou na banheira. Jogou o
que restou do papel na privada e acionou a descarga. Como
dizia a primeira lição que lhe haviam ensinado na L. E. S.
B., documentos importantes nunca devem andar dando
sopa.
Ela se recostou novamente na banheira e, de olhos
fechados, repassou o que lera. A julgar pelos nomes
anotados, a encomenda vinha da Itália. Aliás, tinha a vaga
impressão de que Monica D’Angelo fosse a representante
da L.E.S.B. em Roma.

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Quanto à identificação Alpha, código 45, era óbvio que
se tratava de uma senha para travar contate com o tal Enrico
Mattei. Desconhecia as palavras que deveria usar, mas isso
não chegava a ser problema, pois Thelma poderia fornecê-
las.
Não havia, portanto, dúvida algum para ela cumprir a
tarefa que Maggie Doyle lhe confiara. Ficavam faltando
somente esclarecimentos a respeito da tal “mercadoria em
experiência.” Mas esse detalhe corria apenas por conta de
sua curiosidade, pois saber ou não saber o que Enrico Mattei
trazia não chegava a ser fundamentalmente importante para
o desempenho daquela missão.
Eva se deliciou durante mais alguns minutos com o
banho e depois se levantou. Apanhou uma toalha felpuda e,
lentamente, começou a se enxugar. Depois, vestiu um
roupão e passou para o seu quarto. Deitou-se na cama,
indecisa quanto a atender ou não a vontade de tirar um
cochilo. Ainda eram onze horas e, portanto, faltava bastante
tempo para o encontro com Enrico Mattei.
Com os olhos fixos no teto, ela deixou que os
pensamentos circulassem livremente por sua mente.
Meditou acerca da súbita e estranha doença de Maggie
Doyle, lembrou-se do aparente desaparecimento de Louise
e tentou concluir o que tudo isso poderia significar.
Não chegou a nenhuma idéia concreta, pois suas
suspeitas, na verdade, não dispunham de qualquer indício
real em que se basear. Não iam além de um simples palpite.
Ela estendeu os braços e se espreguiçou gostosamente.
Bocejou e se abandonou à lassidão que invadia seu corpo,
já disposta a aproveitar aqueles momentos de tranquilidade
para uma soneca.
Mas, mal fechou os olhos, a campainha da porta tocou.
Levantou-se e, rosnando um palavrão, abandonou o quarto.

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Atravessou a sala e se aproximou da porta. Como sempre
fazia, observou primeiro pelo visor. Não sem espanto, viu
através dele o rosto de Louise Simpsey.
No fundo de sua mente, faiscou um sentimento difuso
de suspeita. Mas ela girou a chave na fechadura.
— Abra logo! — exclamou a outra agente. — Preciso
muito falar com você, Eva. É urgente!
Eva soltou os dois trincos de segurança e começou a
abrir a porta lentamente.
— O que deu em você, Louise? — perguntou, enquanto
observava a outra mulher.
— Thelma até pensou que a tivessem sequestrado...
— Deixe-me entrar, Eva. Tenho um assunto muito sério
para conversar com você — insistiu Louise, com o rosto
tenso e um brilho febril nos olhos.
Vendo que ela estava sozinha, a agente C69 colocou de
lado seus vagos receios. Recuou um passo e escancarou a
porta, para lhe dar passagens. Louise entrou rapidamente na
sala.
Com o olhar fixo nela, Eva começou a fechar a porta.
— Por que você não avisou à nossa central que ia se
demorar, Louise? Aposto que a essa hora Thelma já
decretou um esquema de emergência para tentar...
Antes que Eva fechasse a porta, esta foi empurrada para
trás com um violento trance. Surpresa, a agente apenas
recuou, para não levar uma paulada da pesada porta. E,
então, viu dois sujeitos truculentos invadirem seu
apartamento, cada um portando uma pistola munida de
silenciador.
Um pensamento ligeiro brilhou em sua mente: Louise a
traíra. Tocara a campainha só para evitar suspeitas de sua
parte e forçá-la a abrir a porta. Os dois gorilões

— 21 —
naturalmente tinham ficado de tocaia, colados junto à
parede e longe de seu olhar.
O truque fora inteligente, pois conseguira desarmar
suas possíveis suspeitas. Mas qual seria a finalidade
daquela emboscada? E como explicar a traição de Louise?
Essas perguntas, contudo, ficaram sem resposta, pois o
momento não era nada propício para especulações e
meditações. As duas pistolas apontadas na sua direção
significavam perigo. Portanto, a hora pertencia totalmente
ao seu instinto de sobrevivência.
— Fique quietinha e nada lhe acontecerá — resmungou
um dos sujeitos, enquanto fechava a porta. — Não viemos
aqui para abotoá-la. Apenas desejamos que faça um passeio
conosco.
Eva girou a cabeça para fitar Louise. A agente parara a
um canto da sala, completamente imóvel, e fixara o olhar
em algum ponto da parede.
— Qual é a sua jogada, hem? —perguntou-lhe Eva,
asperamente. — Resolveu mudar de time? Na certa, estão
lhe pagando muito mais, agora...
— Deixe-a em paz — resmungou um dos gorilões,
enterrando o cano de sua pistola na cintura de Eva. — O seu
problema é conosco. Esqueça-se dela.
— E o que vocês querem de mim? — perguntou Eva,
em tom de desafio.
O rosto rude e sombrio do sujeito se iluminou com um
sorriso de deboche:
— Está aí uma boa pergunta, garota. Você é tão ingênua
que não sabe o que um homem pode querer de uma mulher
enxuta como você? — Ele soltou uma sonora gargalhada.
— Mas não precisa se assustar. Estamos com pressa e não
temos tempo para brincadeiras. — Ele correu os olhos pelo
corpo de Eva, totalmente oculto pelo roupão. — O que é,

— 22 —
sem dúvida alguma, uma grande lástima... Mas o que se há
de fazer, não? Quem nos contratou paga muito bem e não
gosta de falhas. Por isso, nada me fará contrariar suas
ordens...
— Chega de conversa fiada, Paul! — reclamou o outro
sujeito, asperamente. — Não podemos perder a manhã
inteira aqui!
— Está bem, está bem! — rosnou o gorilão parado
diante de Eva. — Não precisa engrossar, também! — Com
o cano da pistola, ele empurrou a agente 069 para trás: —
Vamos até o quarto. Acho que não fica bom você sair por
aí nesses trajes...
Eva deu meia volta e, com o grandalhão nos seus
calcanhares, entrou no quarto. Paul se sentou na beira da
cama e arreganhou os dentes num sorriso feroz:
— Trate de arranjar uma roupa bem bacana, tá? Detesto
passear com garotas malvestidas...
A agente 069 o fitou por um momento. Pelo visto,
estava diante de uma montanha de músculos vidrada em
sexo e sem nada na cabeça. O que, dadas as circunstâncias,
poderia ser muito t>om.
Ela desfez o laço que sustentava o cinto de tecido do
roupão ao redor de sua cintura. Jogou-o para o lado e
deslizou o roupão ao longo dos ombros.
Paul se curvou ligeiramente para a frente e seus olhos
quase saltaram das órbitas.
— Caramba! — exclamou ele, extasiado. — Com esse
material todo, você é bem capaz de matar um homem do
coração, garota!
Eva permitiu que o olhar ardente do gorilão cobiçasse
todos os atrativos de seu belo corpo. Depois, caminhou até
seu armário, onde, de uma gaveta, pescou um minúsculo
biquíni que rapidamente colocou no corpo.

— 23 —
Sem pressa, parou diante da parte do armário onde
guardava suas roupas. Quanto mais ostentasse a sua
exuberante beleza diante do grandalhão, melhor. Um
homem perturbado pelos encantos de uma mulher é sempre
um homem com os sentidos amortecidos.
Por fim, ela apanhou num dos cabides uma blusa. Aliás,
uma blusa especialmente escolhida para a ocasião. De
tecido inteiriço na frente, ela era fechada por trás, através
de uma fileira de pequenos botões.
Eva a colocou no corpo e caminhou até a cama. Parou
bem junto de Paul e girou, ficando de costas para ele.
— Seja cavalheiro e feche a blusa para mim — pediu,
com voz mansa.
Maravilhado com sua beleza, o sujeito prontamente a
atendeu. Pousou a pistola na cama, a seu lado, e estendeu as
mãos até as costas de Eva. Lentamente, começou a abotoar
a fileira de botões.
Eva sorriu, intimamente. Mais uma vez, o estupendo
apelo feminino de seu corpo estava trabalhando a seu favor.
Bem podia imaginar o estado em que se encontrava o
gorilão, desafiado de tão perto pela pujança de sua silhueta.
Seus dedos trabalhavam nos botões, mas seus olhos
certamente se banqueteavam com a visão de suas pernas
roliças e de seus quadris mal contidos pelo minúsculo
biquíni.
Com o canto dos olhos, ela observou a posição da
pistola sobre a cama. Calculou suas chances de êxito no
plano que arquitetara. Eram mínimas, mas ia tentar de
qualquer maneira. Se a jogada da blusa dera certo, talvez o
resto funcionasse, também...
Antes de chegar ao último botão da fileira, Paul
sucumbiu ao desafio da feminilidade de Eva. Baixou as

— 24 —
mãos e, com as pontas dos dedos, experimentou a maciez
da pele de seus quadris.
— Você é um caso sério, boneca — murmurou, com
voz rouca. — Só lamento que tenhamos nos conhecidos
nessas circunstâncias...
Para Eva, sua atitude representou uma espécie de sinal
de alerta. Não poderia haver melhor momento para pegá-lo
desprevenido. Fixado em sua beleza, fatalmente ele iria
reagir com lentidão diante de uma surpresa.
Com imensa agilidade, ela girou o corpo, da cintura
para cima, e plantou o cotovelo esquerdo no meio da cara
de Paul, com toda a violência que seus músculos lhe
permitiam.
Espanto e dor se misturaram no cérebro do grandalhão,
retardando qualquer atitude de sua parte. E Eva, mal lhe
acertara a cotovelada, já estava curvando o corpo na direção
da pistola. Como não haveria tempo de empunhá-la
corretamente, segurou-a pelo cano, mesmo, com a mão
direita.
Saltando para trás, ela desferiu uma violenta coronhada
ria parte lateral da cabeça de Paul. O cabo de aço da arma o
atingiu um pouco acima da orelha e ele ficou imediatamente
grogue.
Isso deu tempo a Eva de empunhar a pistola direito.
Quando seus dedos se fecharam ao redor do cabo e seu
indicador se enganchou no gatilho, ela se sentiu mais
tranquila e confiante.
Acertou nova paulada na cabeça de Paul e ele se curvou
para trás, desfalecido, e ficou estatelado na cama. Sem
perda de tempo, Eva passou para a sala. O outro sujeito, que
resolvera passar o tempo bebericando do seu uísque, virou-
se ligeiro, quando pressentiu a sua presença. Ao vê-la de

— 25 —
arma em punho, arregalou os olhos. E o espanto o fez reagir
de forma insensata.
Quando Eva o viu erguer a pistola para alvejá-la,
apertou prontamente o gatilho de sua arma. Foi um disparo
perfeito. Houve o estalido, amortecido pelo silenciador, e
um profundo berro de dor. O sujeito rodopiou no mesmo
lugar, como que querendo escapulir do chumbo quente que
invadira a sua carne, e despencou no chão. Na queda, largou
a arma.
Eva caminhou na sua direção, para desarmá-lo e se
garantir de que não teria mais problemas com ele. Mesmo
ferido, seria sempre uma ameaça, se sua pistola continuasse
ao alcance de seus dedos.
No momento em que se curvou ao seu lado, para
apanhar a pistola, sentiu uma dor aguda na nuca. Seus
pensamentos se embaralharam e a vista ficou turva. Ela se
lembrou de Louise e se xingou por não ter se precavido de
um ataque da parte dela. Mas agora era tarde demais para
arrependimentos... Tudo ficou negro e ela mergulhou no
pesado sono da inconsciência.

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CAPÍTULO 3
Eva voltou a si lentamente. Constatou que estava
deitada de bruços no chão. O chão de sua sala, per sinal.
Tentou erguer a cabeça, mas as fisgadas na nuca e fizeram
mudar de idéia. Preferiu continuar deitada e imóvel por
mais alguns minutos, até que a dor abrandasse. Procurou
colocar os pensamentos em ordem, mas antes que a pesada
névoa abandonasse sua mente, sentiu dedos fortes se
fecharem ao redor de seu braço.
— Vamos, sua filha da mãe! Chega de dormir! Levante-
se e trate de se vestir!
Apesar da impressão da voz ter soado muito ao longe,
ela a identificou prontamente: pertencia ao gorilão chamado
Paul.
Com brutalidade, ele a ergueu e a empurrou na direção
da porta do quarto. Ainda zonza e incapaz de se aguentar
sobre as pernas, Eva deu alguns passos e acabou caindo por
cima de uma poltrona.

— 27 —
Implacável, 'Paul a agarrou pelos cabelos e a fez se
erguer.
— De pé! — rosnou ele, cruelmente. — Não podemos
perder mais tempo!
Eva ganhou novo empurrão. Avançou uma curta
distância e acabou despencando de joelhos no chão.
Respirou fundo, tentando recuperar o controle sobre os
músculos e a clareza de sua mente. Paul se aproximou
ligeiro e lhe acertou um chute nas coxas. O deslumbramento
que a beleza de Eva lhe causara a princípio se transformara
em um sádico ódio, por causa do papel de trouxa que ela o
obrigara a desempenhar.
Com um curto gemido, a agente da L.E.S.B. se curvou
para frente. Novamente, Paul a agarrou pelos cabelos e a
forçou a se pôr de pé. À dor na nuca, veio se juntar o agudo
formigamento nas raízes dos cabelos e Eva teve a impressão
de que sua cabeça ia estourar.
Paul a arrastou pelo quarto adentro e com extrema
violência, a empurrou na direção do armário. Eva esbarrou
nele e teve que se segurar na sua porta, para não cair de
novo.
— Vamos, vista-se de uma vez! — berrou Paul, com
ferocidade.
Com um supremo esforço de vontade, Eva conseguiu
recuperar o domínio sobre sua mente e seu corpo. Estendeu
a mão e apanhou uma saia no armário. Vestiu-a lentamente,
enquanto respirava fundo seguidas vezes, para espantar em
definitivo o resto de névoa que ainda toldava seu raciocínio
e amortecia seus músculos.
Assim que fechou o zíper da saia, virou-se para
contemplar Paul. Fuzilou-o com um olhar frio e penetrante:

— 28 —
— Você vai se arrepender de toda essa violência
gratuita, seu macaco nojento! Não costumo perdoar esse
tipo de coisas!
O brutamontes contraiu o rosto numa expressão de ódio
e revolta:
— E eu também não costumo perdoar quem tenta me
fazer de trouxa! Você até que está com sorte. Se não fossem
as ordens que recebi, eu iria fazê-la se arrepender
amargamente por ter tentado me ludibriar.
Um sorriso irônico brotou nos lábios de Eva:
— O único culpado do que aconteceu foi você mesmo.
Quem mandou ser tão burro?
Suas palavras aumentaram a irritação do pistoleiro. Ele
deu um passo na sua direção, brandindo a pistola que
empunhava:
— Cale a boca, sua cadela! Se disser mais uma
gracinha, quebro-lhe os dentes na mesma hora!
Eva percebeu que Paul estava falando a sério e o bom-
senso a aconselhou a ficar de bico fechado. Em
determinadas ocasiões, excesso de valentia não passa de
excesso de estupidez. Para que cutucar a fera com vara
curta, se estava completamente sem condições de se
defender?
Com passos um tanto inseguros, ela caminhou na
direção da porta do quarto, seguida de perto pelo
grandalhão. Na sala, viu Louise parada a um canto. Teve
vontade de descarregar sua frustração, dizendo-lhe umas
verdades cabeludas, mas acabou se mantendo calada. O
olhar distante da agente e a expressão vazia em seu rosto
pareciam indicar que ela nem sequer ouviria os
xingamentos. Estranha, a sua atitude, pensou Eva,
ligeiramente ressabiada. O que estaria acontecendo com
ela?

— 29 —
— Quer dizer que nossa leoazinha já está pronta para
sair — rosnou uma voz fraca.
Eva girou o pescoço, a fim de olhar para o ponto onde
ela soara. Deparou com o sujeito que alvejara levantando-
se de uma poltrona. Ele estava muito pálido e tinha ao redor
da cintura um curativo de emergência, feito com tiras de
lençol.
O sujeito caminhou sem firmeza na sua direção e
fechou o paletó, para cobrir O curativo.
— Nós vamos sair agora — resmungou, lentamente. —
Trate de se comportar direitinho. Estamos ganhando muito
dinheiro para entregá-la a alguém sã e salva. Mas fique certa
de uma coisa: se tentar outra gracinha, terei a imensa
satisfação de mandá-la para o inferno na mesma hora!
Os três se encaminharam até a porta do apartamento. De
lá, Paul chamou Louise que, com passos rijos e lentos, foi
se juntar a eles.
Desceram pelo elevador e ganharam a rua. Quem os
visse, tão tranquilos, jamais desconfiaria da verdade.
Pensaria que estava observando um grupo de conhecidos e
jamais que estava presenciando um sequestro.
Eva atravessou a calçada com os músculos retesados,
pronta para aproveitar qualquer chance de fuga. Mas o
sujeito ferido não se distraiu um momento sequer.
Permaneceu com os olhos cravados nela e a mão enfiada no
bolso do paletó. Seria o caso de se perguntar se ele teria
coragem de baleá-la em plena luz do dia, caso ela tentasse
uma fuga. Mas Eva preferiu não botar à prova essa dúvida.
Mansinha, entrou no carro dos sequestradores. Ficou no
banco traseiro, ao lado do tipo que baleara. Paul se instalou
diante do volante e Louise, ainda distante e silenciosa, se
sentou ao seu lado.

— 30 —
Observando o trajeto que o carro ia percorrendo, Eva
concluiu que se encaminhavam para o Brooklin. Depois de
atravessarem a Ponte do Brooklin, seguiram pela Quarta
Avenida. Perto do Cemitério de Greenwood, tomaram uma
rua secundária e, então, aconteceu o inesperado: um imenso
engarrafamento de trânsito.
Paul rosnou dezenas de palavrões, quando se viu
imobilizado pelo mar de carros. O sujeito que viajava ao
lado de Eva apontou para um ponto bem a frente. Por entre
os edifícios, erguia-se um grosso rolo de fumaça negra.
— Deve ter havido algum incêndio por aí — comentou.
— Infernos! — rosnou Paul. — Ele disse para a gente
chegar no máximo até as duas horas. Já passa de uma hora
e, desse jeito, não vamos chegar lá a tempo.
— Calma — recomendou o outro. — Entre na primeira
rua que puder e tente contornar a zona do incêndio.
— Mas não vê que os carros nem andam?! — vociferou
Paul, apontando com as duas mãos as fileiras de veículos
parados à frente deles.
Seu comparsa se recostou no banco. Estava mais pálido
ainda, mas sua resistência parecia ilimitada, pois
continuava firme e bem lúcido. Girando a cabeça, ele fitou
Eva:
— Sei que essa parada forçada pode botar
minhoquinhas na sua cabeça. Mas nem pense em tentar
fugir. Antes que abrisse a porta do carro, já estaria com uma
ameixa quente no corpo.
Eva não disse nada. Continuou quieta e atenta a tudo.
Nada, porém, estava ao seu alcance fazer. Infelizmente, e
ela tinha consciência disso, só lhe restava aguardar o
desenrolar dos acontecimentos.
Paul usou todo o seu repertório de palavrões para
amaldiçoar aquele contratempo. Muito lentamente, os

— 31 —
carros seguiram em frente até uma rua estreita, por onde
estava sendo escoado o trânsito.
Livre da arapuca provocada pelo incêndio, ele tentou
desenvolver maior velocidade. Mas não foi possível, pois
nas outras ruas o trânsito também estava confuso e mais
lento do que o normal.
Somente quando atingiram os arredores de Bensenhurst
as coisas melhoraram. Então, rapidamente alcançaram o
objetivo visado: uma casa de dois pavimentos, em uma rua
decadente perto da Ocean Parkway. Os quatro saltaram do
carro e penetraram nela rapidamente. Paul e seu comparsa
conduziram Eva até uma sala no primeiro pavimento.
Louise veio atrás deles, igual a uma sombra.
Na sala, havia dois homens. Um, musculoso e
grandalhão, escarrapachado em uma poltrona, dando toda a
pinta de ser pistoleiro profissional. E outro, mais baixo,
magro e de óculos, andava nervosamente de um lado para o
outro.
Assim que viu a chegada do grupo, ele avançou na
direção dos quatro. Relanceou um olhar feroz de Paul até
seu comparsa.
— Isso são horas de chegar?! — berrou, com uma voz
estridente, enquanto apontava para seu relógio de pulso.
— Desculpe, Vernon — murmurou Paul, com muita
humildade. — Fizemos todo o possível, mas aconteceram
contratempos...
— Estou pagando muito bem a vocês para que não haja
contratempos! — berrou o sujeito, ainda mais irritado.
Paul apontou para Eva:
— Ela tentou reagir e baleou Karl. Por sorte, Louise
intercedeu a nosso favor. Depois, enfrentamos um imenso
engarrafamento de trânsito. Parece que houve um incêndio

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lá para os lados do Cemitério de Greenwood... Pode crer
que fizemos todo o possível para não falhar...
— Desculpas não resolvem nada! — esbravejou
Vernon, ainda com o rosto retorcido numa expressão de
feroz irritação. — Acontece que já passa das duas horas t,
agora, não terei mais tempo de preparai ela.
“Ela”, no caso, era Eva Brooklin, na direção de quem o
sujeito apontou o dedo, rapidamente.
Paul fez uma cara de tremendo desconsolo:
— Quer dizer que foi tudo por água abaixo?
— Não. Ainda nos resta uma chance. Não quis lançar
mão dela porque seria uma jogada muito arriscada. Mas
agora não temos mais escolha — retrucou Vernon,
meneando a cabeça nervosamente. — Vamos ter que sair
agora mesmo.
— E ela? — perguntou Paul, apontando para Eva.
Vernon, que fora apanhar uma valise e seu paletó
jogados sobre uma cadeira, voltou para junto da agente da
L.E.S.B. Observou-a por um momento e um curto sorriso
curvou seus lábios estreitos.
— Então, você é Eva Brooklin, a mais bela e a mais
perigosa agente da organização de Maggie Doyle... —
murmurou ele, com uma pitada de zombaria na voz. —
Louise me falou muito a seu respeito. Garantiu-me que
Maggie, impossibilitada de comparecer hoje ao aeroporto,
fatalmente a escolheria para ir apanhar a encomenda, pois
tem total confiança na sua eficiência e na sua lealdade.
Eva não pôde deixar de se surpreender com as palavras
de Vernon. Então, ele sabia de tudo. Louise colocara a seu
serviço toda a sua argúcia e todos os seus conhecimentos
acerca da L.E.S.B. Mas por que tal traição da parte dela?
— Eu pretendia usá-la para apanhar a encomenda,
mas...

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— Eu jamais faria uma coisa dessas! — cortou Eva,
com firmeza.
Vernon soltou uma gargalhada.
— Não diga uma coisa dessas, minha cara! —
murmurou ele depois, bem-humorado. — “Jamais” é uma
palavra que não existe mais para mim. — E, dando uma
palmadinha na valise que segurava na mão direita,
completou: — Depois que eu consegui esse soro
maravilhoso, a vontade das pessoas deixou de ser problema
para mim. Você mesma iria constatar isso, mas infelizmente
não dá mais tempo de prepará-la para o servicinho em que
eu iria usá-la...
— O que vai fazer comigo, então?
Vernon analisou o belo rosto de Eva com um olhar
profundo e frio.
— Não me agrada riscar do rol dos vivos uma coisinha
tão linda quanto você. Mas, infelizmente, não me resta outra
alternativa, pois não quero ninguém atrapalhando os meus
planos.
Dito isso, ele se encaminhou rapidamente na direção da
porta.
— Lew, Louise, vamos embora — ordenou ele. E,
virando-se para Paul: — Você e Karl se encarregarão dela.
E vejam se dessa vez não vão falhar!
— Estou com uma bala no corpo — lamuriou-se Karl.
— Estou precisando ver um médico.
— Então venha conosco.
Rapidamente, os quatro saíram. Paul, que sacara sua
pistola e ajustara o silenciador no cano, olhou para Eva com
um sorriso feroz nos lábios:
— Agora, boneca, vamos ter uma longa conversa, sem
pressa ou horários para nos atrapalhar!

— 34 —
CAPÍTULO 4
Paul enterrou o cano de sua arma na barriga de Eva e a
forçou a recuar até um dos sofás da sala.
— Deite-se — ordenou, então.
Eva não obedeceu e ele lhe acertou uma violenta
bofetada no rosto, que a fez perder o equilíbrio. Suas pernas
esbarraram na borda do sofá e a agente caiu sentada nele.
Paul pousou a arma em seu peito e, diante da pressão que
ele exerceu em sua carne macia, Eva não teve outro recurso
senão se deitar.
— É assim que eu gosto — rosnou ele, satisfeito. —
Muita obediência. Garotas bonitas não devem ser
malcriadas...
Ele se sentou na borda do sofá e pousou o cano de sua
arma n° pescoço de Eva. Com a mão livre, começou a
acariciar o corpo da agente.
— Vernon a quer morta e não posso deixar de obedecer
à ordem dele, mas nada me impede que antes tenhamos uma

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conversinha muito particular. Quando você chegar ao
inferno, vai se lembrar, arrependida, de ter desafiado Paul
Garfield.
— Não estou vendo homem na minha frente capaz de
me assustar — retrucou Eva, visando mexer com os brios
de Paul e, assim, fazê-lo perder o sangue-frio.
Mas ele não ligou para a sua provocação. Limitou-se a
sorrir, de forma feroz:
— Vá botando sua banca, boneca. Mas aposto como
daqui a meia hora você estará suplicando para que eu acabe
de uma vez com a sua raça.
Com crueldade, ele apertou um dos seios de Eva. Ela
tentou não fraquejar, mas, quando a dor se tomou
insuportável, seu rosto se contraiu numa expressão de
angústia. Paul aumentou a pressão dos dedos enquanto a
observava fixamente. Os menores sinais de sofrimento que
ela ostentava serviam para deliciar profundamente o ímpeto
sádico dele.
— Isso, boneca — murmurou de, lentamente — Resista
bastante. Quanto mais valente, melhor. Só que no fim você
vai botar a boca no mundo como todas as outras. É só uma
questão de tempo.
Sempre com o cano da pistola cravado no pescoço de
Eva, Paul girou ligeiramente o corpo, segurou a barra da sua
saia e a puxou para cima. Observou suas belas pernas e
experimentou a maciez da pele bronzeada.
Diante de tamanho desafio feminino, seu ímpeto sádico
deu lugar a um forte desejo sexual. Ao invés de flagelar
aquele belo corpo, numa espécie de desforra pelo que Eva
lhe fizera, decidiu conhecer as delícias prometidas per sua
imensa carga de sedução.

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Aprofundou suas carícias, por um momento, e depois se
levantou. Segurando Eva pelo braço, puxou-a brutalmente
do sofá, fazendo-a cair de costas no assoalho.
Com os olhos fixos nela e a arma apontada na direção
de seu corpo, tirou o paletó. Jogou-o para o lado e
desafivelou o cinto da calça. Abriu sua braguilha e a deixou
escorrer ao longo das pernas.
— Agora, vamos brincar um pouco, boneca — rosnou
ele, ajoelhando-se diante de Eva. — Não é todo dia que
tenho ao meu alcance um material de qualidade tão
magnífica.
Lentamente, ele se curvou para a frente, a fim de cobrir
Eva com seu corpanzil. Apoiou os cotovelos no chão, um
de cada lado do corpo dela, enquanto mantinha a arma
voltada na direção de sua cabeça.
— Você, agora, pode escolher entre uma morte suave e
uma morte longa e sofrida — murmurou ele, com um
sorriso cruel nos lábios. — Se for boazinha comigo,
prometo que não a deixarei sofrer. Case contrário, você se
arrependerá mil vezes de ter nascido...
A oferta de Paul nada tinha de atraente, pois a ninguém
interessa escolher entre uma morte suave e uma morte
sofrida. Eva, contudo, nada disse a esse respeito.
Abandonando a expressão de nojo que ostentava no rosto,
sorriu de forma doce e provocante.
— Olha, eu vou ser mais do que boazinha com você —
murmurou, suavemente. — Depois, quero ver se você terá
coragem de me matar...
— Vamos ver, vamos ver — rosnou Paul, todo
animado.
Sufocando sua repugnância, Eva passou os braços ao
redor de pescoço de Paul e o beijou longamente. A ação de
seus lábios macios deixou o sujeito completamente

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transtornado. Com a mão livre, ele passou a acariciá-la e,
depois, muito impaciente, quis consumar de uma vez o
objetivo a que se propunha.
Ofegante, ergueu ligeiramente os quadris, para
encontrar uma posição mais adequada. Com o movimento,
sua mão direita girou ligeiramente e a pistola deixou de
apontar para a cabeça de Eva. Ela notou isso. Sorrindo
docemente, mexeu as pernas, como se pretendesse
harmonizar seu corpo com o de Paul. Ele chegou a rosnar
um palavrão de satisfação, diante das agradáveis
perspectivas que se abriam à sua frente.
Mas sua alegria durou pouco. Mais uma vez, a beleza
de Eva e a certeza de raciocínio dele enrolaram as coisas
para o seu lado.
A agente da L.E.S.B. ergueu ligeiramente a perna
direita e, num movimento brusco, acertou uma violenta
canelada nos testículos de Paul. O infeliz viu estrelas.
Soltou um profundo urro de dor e rolou para o lado, com o
rosto vermelho e crispado em uma expressão de terrível
sofrimento.
Livre de seu corpanzil, Eva se pôs de pé, prontamente.
Chutou sua mão direita, para obrigá-lo a largar a arma, e
agarrou uma cadeira. Sua idéia inicial foi arrebentá-la na
cabeça do grandalhão, para botá-lo fora de combate. Mas,
após acertar-lhe a primeira paulada, não resistiu ao ímpeto
de lhe acertar outra, e mais outra, outra, outra... A
humilhação e o sofrimento que Paul lhe impusera tinham
explodido em suas entranhas, transformando-se em um
cego desejo de desforra.
Quando ela finalmente jogou para o lado o que restara
da cadeira e recuou ofegante, a cabeça e o rosto do
grandalhão estavam transformados em uma posta de
sangue.

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— Agora, você sabe que não é um bom negócio querer
engrossar com Eva Brooklin — murmurou, devagar, com
os olhos fixos no corpo inerte no chão.
Apanhando a arma que chutara da mão de Paul, e sua
carteira de dinheiro, ela se encaminhou para a porta da sala.
Saiu ligeiro da casa e apanhou o primeiro táxi que apareceu.
O tempo corria e era preciso fazer todo o possível para
impedir que a tal encomenda caísse nas mãos de Vernon.
O retomo à Manhattan foi complicado e demorado, pois
o incêndio continuava a atrapalhar o trânsito. Tensa e
irritada, Eva acompanhava a passagem dos minutos
preciosos perdidos no trajeto.
Pensou em parar em um telefone público qualquer para
entrar em contato com Thelma, na sede da L.E.S.B., mas
desistiu da idéia. Dificilmente, Thelma concordaria em
fornecer um código ultra-secreto através do telefone.
Mesmo em uma situação de emergência, ela não iria
quebrar uma regra primária de segurança, O jeito, portanto,
era torcer para que houvesse tempo de ir ao quartel-general
da organização e chegar ao Aeroporto John Kennedy antes
de Vernon.
Quando o táxi parou diante do prédio da “Doyle
Enterprises Inc”, já passava das três e vinte. Eva atravessou
a calçada correndo e entrou no elevador privativo da
diretoria das empresas da velha milionária. Desceu ao
subsolo e, depois da identificação eletrônica, correu até a
sala de Thelma.
Ela não estava lá e foram perdidos novos minutos
preciosos até que sua secretária a localizasse nas
dependências do subsolo.
Assim que ela apareceu em sua sala, Eva a pôs a par dos
acontecimentos com rápidas palavras. Thelma a ouviu com
muita atenção e, sem argumentar nada, encaminhou-se para

— 39 —
o seu cofre, a fim de apanhar o volume de codificações
especiais usadas pela L.E.S.B.
— E Maggie? — perguntou Eva, enquanto observava,
tensa da cabeça aos pés, os dedos de Thelma manipularem
as esferas do segredo do cofre.
— Continua mergulhada naquele estado de
inconsciência. Pelo menos estava assim, quando saí do
hospital há uma hora atrás, mais ou menos. Deixei-a a cargo
do Doutor Rice... Você o conhece, não?
— Claro. É um excelente médico, por sinal.
Thelma abriu a porta do cofre embutido na parede e
começou a manipular a papelada guardada no seu interior.
— Ele me confessou que desconhece totalmente a
possível causa do desfalecimento de Maggie — explicou
ela, relanceando o olhar até Eva, que continuava parada
junto à sua mesa, cheia de expectativa. — Segundo o que
me disse, jamais viu um caso assim.
— Estranho, não? — murmurou Eva. Quem ficou
tomando conta de Maggie?
— Deixei Nancy, uma de nossas agentes de minha
inteira confiança — respondeu Thelma, enquanto retirava
uma pasta de papelão do cofre.
Ela a pousou sobre sua mesa e consultou as folhas de
papel guardadas no seu interior.
— Identificação Alpha, código 45 — murmurou,
enquanto as manuseava. — Pronto, aqui está. Senha a ser
usada: “O senhor sabe onde fica o portão de embarque 16?”
Contra-senha: ‘‘Infelizmente, não sei. Estou acabando de
chegar agora. Mas, acredito que fique entre os portões 15 e
17.” Resposta final: “Grata pela informação. O senhor é
muito gentil.” — Thelma ergueu o olhar até Eva: — Deu
para decorar?

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— Perfeitamente — resmungou Eva, meneando a
cabeça. E, depois, com um sorriso de ironia nos lábios,
acrescentou: — Em plena era da espionagem eletrônica, a
gente ainda usa essas coisas... Maggie é muito nostálgica,
mesmo.
— E gozadora, também — assinalou Thelma,
sorridente. — Você há de convir que essa contra-senha é
uma obra-prima do sarcasmo.
— É, parece que sim — concordou Eva. — Bem, agora
eu vou embora. Não posso perder mais um minuto sequer.
Thelma olhou para seu relógio de pulso, enquanto Eva
caminhava com passadas largas até a porta.
— Passa das três e trinta — assinalou Thelma. —
Talvez você não chegue ao aeroporto a tempo de fazer o
contato... Não acha melhor levar o endereço do hotel onde
ficará o agente?
Eva parou junto à porta e se virou para fitá-la:
— E você tem o endereço dele?
— Aqui comigo, não. Mas aposto como Maggie e
anotou em seus registros. Você sabe como e.la é organizada
e gosta de cuidar dos mínimos detalhes de todas as
operações. — Thelma contornou sua escrivaninha e se
encaminhou até uma porta lateral, que deva aceso direto ao
escritório da chefe da L.E.S.B. — Vamos lá. É melhor você
se prevenir, para o caso desse italiano ser impaciente e
desistir de esperá-la, na hipótese de um atraso.
— Acho que você não entendeu bem a situação —
rebateu Eva, seguindo-a de perto. — O meu problema
principal é impedir que o tal sujeito chamado Vernon se
apodere da encomenda antes de mim.
— De qualquer maneira, é bom você levar o endereço.
Se esse tal Vernon tentar alguma coisa, não acredito que o
faça dentro do aeroporto. Na certa, esperará que o italiano

— 41 —
saia de lá. Por isso, acho importante você saber o rumo que
ele tomará.
As duas penetraram na sala de Maggie Doyle e Thelma
imediatamente começou a mexer em seus papéis, à cata de
uma agenda onde havia anotações dos compromissos mais
recentes.
— Francamente, eu não consigo imaginar qual será a
jogada desse Vernon — murmurou Eva, de repente,
enquanto seus olhos impacientes acompanhavam os
movimentos de Thelma. — Sei que Louise se aliou a ele.
Mas, segundo o que creio, nem Louise conhecia detalhes
precisos da operação, tais como a identidade do agente
italiano e o código a ser usado... Portanto, como ele poderá
localizar Mattei?
Thelma não se aventurou a formar uma hipótese para
responder à difícil pergunta 56 de Eva. Folheou a agenda,
até localizar o que desejava:
— Aqui está — murmurou, por fim. — Dia vinte e dois
de julho; reserva no “Sydney Hotel”, da Quinta Avenida,
para o Sr. Giuseppe Marconti, procedente da Itália... O dia
confere e esse deve ser o nome que o agente usa em sua vida
normal. Você sabe onde fica esse hotel, Eva?
— Sei, sim — respondeu a agente 069, afastando-se na
direção da porta. — Agora, eu vou embora. Não posso mais
perder um minute, sequer. Até logo, Thelma.
— Até logo, Eva. E boa sorte. Qualquer coisa, ligue
para mim. sim?
— Perfeito.
Quase correndo. Eva abandonou o escritório de Maggie
Doyle. Saiu da sede da L.E.S.B. o mais rápido que pôde e
atravessou a calçada correndo. Acenou nervosamente para
o primeiro táxi que passou. Entrou nele e pediu ao motorista

— 42 —
para seguir o mais depressa possível para o Aeroporto John
Kennedy.
Fez todo o percurso com os nervos tensos e cheia de
ansiedade. Cada sinal luminoso que se tornava vermelho,
atrasando a passagem do táxi, foi motivo para uma
imprecação de irritação expelida entre dentes.
Quando o táxi parou diante do imponente prédio do
Aeroporto, eia pagou ao motorista com o dinheiro que
apanhara na carteira de Paul e, para a imensa satisfação do
sujeito, não exigiu o troco.
Penetrou no prédio e correu pelo imenso saguão
fervilhante de gente. Encaminhou-se para o setor de
desembarque. Um relógio de parede indicava quatro e dez
e ela rosnou um novo palavrão para extravasar sua
inquietação.
No setor de desembarque, não encontrou ninguém que
se enquadrasse nas feições apresentadas na fotografia do
agente italiano. Perambulou pelo setor, a fim de eliminar a
possibilidade de qualquer desencontro. Depois, certa de que
Enrico Mattei não se encontrava ali, dirigiu-se ao balcão da
Panam. Lá ouviu a informação que temia ouvir:
— O voo 351 chegou dentro do horário, senhorita.
Todos os passageiros desembarcaram às dezesseis horas,
conforme o previsto.

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CAPÍTULO 5
Eva Brooklin saiu do Aeroporto John Kennedy
amargando uma profunda sensação de frustração. Depois de
tanta correria e peripécias, a quase certeza do mais absoluto
fracasso.
Era bem verdade que ainda havia a chance de Enrico
Mattei ter ido para o seu hotel, num rasgo de impaciência
diante do atrase de contato. Mas ela não se sentia muito
inclinada a acreditar nessa hipótese. Primeiro, porque seu
atraso não foi tão grande assim: dez minutos normalmente
nunca chegam a impacientar ninguém. Segundo porque
Vernon lhe parecera muito confiante na possibilidade de
interceptar a encomenda.
Assim, embora nunca fosse dada a pessimismos, algo
lhe dizia que falhara redondamente na missão que Maggic
lhe confiara.
De qualquer maneira, porém, pegou um táxi e seguiu
direto para o “Sydney Hotel”. Na portaria, informaram-lhe

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que o Sr. Giuseppe Marconti havia chegado uma meia hora
atrás, e que no momento se encontrava em seu quarto.
Incontinenti, Eva subiu até lá.
Bateu à porta do quarto indicado na portaria. Ela foi
aberta devagar e apenas o suficiente para que um olho
observasse o lado de fora.
— Preciso falar urgentemente com você, Mattei —
murmurou Eva. — Pertenço à organização de Maggie
Doyle.
Houve um momento de hesitação da parte do ocupante
do quarto. Mas ele acabou abrindo a porta. Eva viu-se,
então, diante de um sujeito alto e moreno, idêntico à
fotografia que Maggie lhe mostrara na parte da manhã. Suas
feições de linhas elegantes, mais seus olhos pretos e
brilhosos, formavam um conjunto para mulher alguma
botar defeito. Eva constatou isso imediatamente. Mas não
permitiu que seu entusiasme feminino se acendesse. No
momento, havia coisas mais importantes em que pensar.
Ela penetrou no quarto e se virou para observar Mattei.
Ele fechou a porta do cômodo e guardou em um pequeno
coldre, junto à cintura, a pistola que sacara por medida de
precaução.
— Então, você trabalha para a L.E.S.B. — assinalou
ele, aproximando-se de Eva.
— Isso mesmo. E fui designada para estabelecer
contato com você...
— Muito interessante — retrucou o italiano, sentando-
se em uma poltrona, de onde a observou com um longo
olhar, no qual se mesclavam admiração e desconfiança.
— Por que não me esperou? — reclamou a agente da
L.E.S.B. — Atrasei-me apenas dez minutos... Ou será que
você sofreu o ataque de alguém?

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Os olhos negros continuavam a observá-la atentamente.
Mostravam-se profundamente encantados com a sua
beleza. Mas, em compensação, também não perdiam o
brilho de suspeita.
— Talvez fosse melhor você abrir o jogo — murmurou
ele, aproximando a mão direita da pistola que carregava à
cintura. — Não estou entendendo onde pretende chegar.
Eva se sentou em uma cadeira, a frente do italiano, e
cruzou as pernas. Por um momento, os alhos negros se
concentraram na graciosa faixa de carne bronzeada que se
descortinou à sua apreciação. Depois, relutantes,
retomaram ao rosto da bela agente.
— Maggie Doyle me encarregou de entrar em contato
com você, para apanhar a encomenda que você trouxe. Ela
pretendia ir pessoalmente ao aeroporto, mas um mal súbito
a fez mudar os pianos... pois bem, eu devia abordá-lo no
setor de desembarque e lhe perguntar: “O senhor sabe onde
fica o portão de embarque 16?” Você deveria responder:
“Infelizmente, não sei. Estou acabando de chegar agora.
Mas acredito que fique entre os portões 15 e 17.” Eu, então,
completaria: “Grata pela informação. O senhor é muito
gentil.”
Mattei franziu as sobrancelhas:
— Estranho, muito estranho... — resmungou,
pensativo.
— Afinal de contas, o que aconteceu? Você foi
assaltado ou ainda está com a mercadoria? — Eva se curvou
ligeiramente para a frente e abriu os braços, em um gesto de
profunda impaciência: — Bolas, fale logo de uma vez!
O agente italiano se remexeu na poltrona, enquanto seus
olhos, instintivamente, lançavam-se de novo na direção das
belas pernas da agente.

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— Há algo nessa história toda que não está bem contado
— resmungou ele, coçando a cabeça. — Ou você ou a outra
mulher não passa de uma tremenda mentirosa.
— Outra mulher? — perguntou Eva, pondo-se de pé
num salto.
— Exato. Estou me referindo à mulher que estabeleceu
contato comigo no aeroporto, assim que desembarquei —
explicou Mattei, com a testa franzida. — Ela usou a senha
corretamente e eu lhe entreguei o pacote que Monica
D’Angelo enviou por meu intermédio.
— Oh, não! — exclamou Eva, voltando a se sentar na
cadeira, dominada por profundo desânimo. — Então, ele
conseguiu!
— Ele, quem? — perguntou o italiano, cada vez mais
confuso.
— Havia um sujeito chamado Vernon de olho nessa
encomenda. Ele tentou me tirar da jogada, mas escapei do
pistoleiro que designou para me matar... De qualquer
maneira, porém, conseguiu chegar ao aeroporto na minha
frente..., mas, me diga uma coisa: como era essa mulher que
estabeleceu contato com você?
Mattei pousou a cabeça no encosto da poltrona e
semicerrou os olhos, enquanto espremia sua memória.
— Era idosa. Eu lhe daria entre cinquenta e sessenta
anos, embora fosse bastante conservada e saudável. Alta,
esguia e muito simpática... Parecia uma dama da velha
aristocracia. Tinha gestos elegantes e muito comedimento
ao falar. Seus cabelos eram grisalhos, possuía olhos claros
e se vestia com grande aprumo. Aposto como o colar de
pérolas que carregava no pescoço custa uma fortuna.
— Estava com um vestido estampado, cheio de flores
verdes e azuis?

— 47 —
— Exato...— concordou Mattei. E, franzindo as
sobrancelhas, acrescentou: — Você por acaso a conhece?
— Por incrível que pareça, você acaba de dar uma
descrição completa de Maggie Doyle, inclusive com o
vestido que ela usava hoje de manhã.
— E o que há de tão incrível nisso? Talvez sua chefe
tenha decidido ir pessoalmente ao meu encontro...
— Acontece, porém, que Maggie Doyle, desde esta
manhã, está recolhida a um hospital, vítima de um profundo
estado de inconsciência. Portanto, seria humanamente
impossível ela comparecer ao aeroporto.
— Então, o que você acha que aconteceu? — murmurou
Mattei, pensativo. — Será que mandaram uma sósia dela?
— E para que terem esse trabalho, se você não a
conhecia pessoalmente e iria fazer o contato baseado apenas
na senha e contra-senha combinadas?
Eva se pôs de pé.
— Não, não — prosseguiu, meneando a cabeça. — Essa
hipótese não me parece muito plausível.
— Então, o que você acha que aconteceu?
— Sei lá! — explodiu Eva, abrindo os braços. — Está
tudo tão confuso que nem consigo raciocinar direito.
Ela se encaminhou para a porta e Mattei levantando-se
prontamente, alcançou-a no momento em que pousava a
mão na maçaneta do trinco. Eva o fitou:
— Você sabe o que continha o tal pacote? — perguntou.
— Monica D'Angelo me falou a respeito da encomenda
por alto. Para todos os efeitos, tratava-se de um amarrado
de produtos farmacêuticos comuns. Mas ela disse que as
embalagens continham um poderoso soro da verdade, mais
forte que o Pentotal Sódio e capaz de obscurecer por
completo a vontade de uma pessoa.

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— Engraçado — murmurou Eva, prontamente,
enquanto um vago pensamento flutuava em sua mente.
— O que foi? — perguntou Mattei, fitando-a fixamente.
— Nada, nada. Apenas uma idéia louca que me passou
pela cabeça... Bem, eu agora vou embora. Preciso tomar
umas providências. Quanto a você, aconselho-o a esticar
sua permanência em Nova Iorque. Só deverá partir quando
receber ordens nesse sentido de nossa organização.
Mattei sorriu, bem-humorado.
— Quer dizer que entrei para a lista dos suspeitos? —
perguntou, de imediato.
— No meio dessa confusão, todos são suspeitos —
explicou Eva, girando a maçaneta da porta.
Mattei segurou sua mão, impedindo que ela
completasse o movimento. Fitou-a fixamente dentro dos
olhos:
— O que vai ser de mim, perdido em uma cidade tão
grande quanto esta?
Eva captou o sentido da pergunta de Mattei e curvou os
lábios em um curto sorriso:
— O que não falta em Nova Iorque são divertimentos
para matar o tempo.
O italiano aumentou a pressão de seus dedos quentes na
mão de Eva.
— Não gosto de fazer nada sozinho — lamuriou-se.
com voz branda. — Por que você não banca a boa menina
e se prontifica a me fazer companhia? Poderíamos ir a uns
lugares bacanas, especialmente escolhidos por você.
Eva observou o rosto do italiano, carregado de
expectativa e desejo. Suavemente, alargou o sorriso nos
lábios.
— Você não é de se jogar fora. Muito pelo contrário,
até — assinalou. — Em outras circunstâncias, talvez eu

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topasse esse convite. Adoro homens bonitos e desinibidos.
Hoje, porém, não dá pé. Tenho muita coisa a fazer...
Mattei continuou com a mão pousada sobre a sua e
parado no mesmo lugar. Contemplou seu gracioso rostinho
e viu nele uma expressão de firmeza irremovível.
Reconhecendo sua derrota, encolheu os ombros e
recuou:
— Bem, já vi que não adianta mesmo insistir. Vocês, da
L.E.S.B. não são ossos fáceis de se roer... Fica para a
próxima, então, não é?
— Claro — concordou Eva, com brandura.
Ela abriu a porta e saiu. Sob um olhar cobiçoso de
Mattei, que parecia seco para desvendar os encantos ocultos
pela saia e pela blusa, atravessou o corredor na direção dos
elevadores.
Eva abandonou o hotel e tomou novo táxi. Deu ao
motorista o endereço, de “St. Paul Hospital” e afundou no
assento. A tentativa de botar os pensamentos em ordem,
porém, mostrou-se completamente inútil. Como entender e
analisar fatos tão absurdos quanto aqueles que estavam
acontecendo? Ou Mattei teria pregado a maior mentira,
quando afirmara ter realizado a entrega da encomenda à
própria Maggie Doyle? Afinal, a hipótese de uma traição da
sua parte jamais poderia ser afastada.
Respirando fundo, ela decidiu colocar de lado, até
segunda ordem, a análise dos acontecimentos. Primeiro,
devia fazer as investigações que decidira. Depois, então,
procuraria dar um sentido lógico aos fatos que se haviam
amontoado ao longo do agitado dia.
No hospital, subiu direto ao andar onde se encontrava
Maggie. A ala em que a haviam posto era constituída de
pequenos apartamentos, dotados de total conforto. Eles

— 50 —
possuíam uma espécie de saleta de estar anexada ao quarto
do doente.
Assim que abriu a porta, Eva topou com Nancy lendo
uma revista sentada em uma poltrona na ante-sala. A agente
ergueu um rápido olhar na sua direção, mas sorriu
alegremente, quando a reconheceu.
— Olá, Eva — cumprimentou. — Veio visitar sua
chefinha?
— Maggie está no quarto? — perguntou Eva,
atravessando a saleta.
— Claro que está! — exclamou Nancy, jogando a
revista para o lado e se levantando. — Ela continua
inconsciente.
Eva abriu a porta do quarto e viu o corpo da chefe
suprema da L.E.S.B. estirado na cama e completamente
imóvel. Virou o rosto na direção de Nancy:
— Ela não saiu daqui um momento sequer? —
perguntou.
— Ora, Eva, como ela ia poder sair, nesse estado?!
— E você? Afastou-se desse quarto durante algum
tempo?
— Não. Desde que Thelma foi embora, estou sentada
nesta saleta lendo revistas.
— Alguém veio ver Maggie?
— Não. Ninguém. Desde que estou aqui, somente
entrou uma enfermeira, para ver se estava tudo bem com
Maggie..., mas por que tantas perguntas, Eva? Aconteceu
alguma coisa?
— Aconteceu muita coisa! — explodiu Eva, dando
vazão à sua frustração. — E o pior é que não dá para
entender nada!
Ela caminhou até uma porta localizada em uma das
paredes laterais do quarto.

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— Onde vai dar isso? — perguntou a Nancy.
— É uma espécie de porta de aceso ao apartamento
vizinho, para o caso de pessoas conhecidas ocuparem esses
conjuntos. Mas está trancada.
Nancy se aproximou da porta e apontou para a sua
fechadura, onde havia uma chave.
— Por medida de precaução, Thelma pediu a chave e a
deixou no lugar, para eliminar a hipótese de alguém tentar
entrar pelo apartamento vizinho. Com a chave enterrada na
fechadura, é completamente impossível abrir a porta pelo
outro lado. A própria Thelma testou isso pessoalmente.
— Quer dizer que ninguém entrou aqui, com exceção
da tal enfermeira — murmurou Eva, pensando em voz alta.
— E a janela fica fora de cogitações, porque estamos em
um décimo andar...
— Afinal de contas, o que está acontecendo?! —
interveio Nancy, com as sobrancelhas franzidas. — Palavra
como não estou entendendo nada!
Eva sorriu ligeiramente e se encaminhou para a porta:
— Então, console-se comigo, minha cara, pois estou
nas mesmas condições que você!

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CAPÍTULO 6
Depois de aconselhar Nancy a não se afastar um
momento sequer do quarto de Maggic, Eva desceu à
portaria do hospital. Recebeu duas negativas, como
resposta às suas indagações: a enfermeira de plantão na ala
do quarto de Maggie por volta das duas horas já fora embora
e o Doutor Rice tinha ido para casa e só deveria voltar ao
entardecer.
Ela tentou conseguir o endereço da enfermeira, pois
queria tirar umas dúvidas a limpo, mas a atendente se negou
a lhe fornecer. Não insistiu no pedido, porque não via
necessidade de se apressar, e abandonou o hospital.
Ao invés de tomar um táxi, seguiu a pé pela calçada. No
quarteirão seguinte, entrou em um prédio residencial. Subiu
ao quarto andar e tocou a campainha da porta que ocupava
a extremidade do corredor.
Se não tinha mudado, ali morava o jovem Doutor Rice,
que ficara encarregado de cuidar de Maggie Doyle, Eva o

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conhecia muito bem. Bem demais, até. Meses atrás, fora ele
quem a tratara, quando ela voltara ferida de uma de suas
missões no exterior. Rapaz simpático, dono de um sorriso
cativante e mãos muito macias, Rice conseguira despertar o
seu interesse. O simples relacionamento médico-paciente
foi ampliado e Eva acabou tendo suas últimas consultas ali
naquele apartamento, em meio a muito entusiasmo e ardor.
A porta finalmente foi aberta.
— Eva! Que surpresa! Pensei que você tivesse se
enchido de mim e nunca mais quisesse me ver pela frente!
— Tenho andado muito ocupada, Rice — retrucou a
agente, penetrando no apartamento.
Rice fechou a porta e veio se acomodar ao lado de Eva,
que se sentara em um sofá.
— Depois de tanto tempo, eu não tenho direito nem a
um beijinho?
Eva sorriu, enquanto observava o rosto simpático do
médico, onde os dois olhos azuis eram perigosamente
irresistíveis.
— Desculpe, Rice, mas estou muito preocupada. Não
posso perder tempo com essas coisas.
Uma expressão de tristeza destruiu a alegria estampada
no rosto do rapaz.
— Quer dizer, então, que sou mesmo carta jogada fora
do baralho — murmurou ele, com forte dose de decepção
na voz.
— Não se trata disso — retrucou a agente. — Procure
entender, Rice. Há hora para tudo e, no momento, eu tenho
um problema muito sério a resolver.
— Problema de saúde?
— Não. não se trata disso. É algo muito mais confuso...
— Ela se pôs de pé. — Você guarda as bebidas no mesmo
lugar, ainda?

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Rice fez que sim, com a cabeça. Ela caminhou até um
armário colocado no outro lado da sala. Apanhou um copo,
uma garrafa de uísque e se serviu de uma dose.
Voltou para o sofá e se sentou ao lado de R:ce. Tomou
um longo gole da bebida, respirou fundo e pousou a cabeça
no encosto do sofá.
— Eu bem que estava precisando de um pouco disso —
murmurou, baixinho. — Depois de tanta confusão, faz um
bem danado aos nervos.
Com um olhar penetrante, Rice a analisou detidamente.
Observou as longas pernas brotando da saia curta, a curva
do busto altivo sob a blusa justa e os contornos graciosos de
seu belo perfil. Ele sentiu uma contração na garganta e se
aproximou mais da agente.
— E o seu ferimento? — perguntou. — Ficou bom?
Você nunca mais me procurou para eu examiná-lo.
— Está tudo em ordem — murmurou Eva, tomando
novo gole de uísque.
— Não dói mais nada?
— Nem um pouquinho — retrucou Eva, fechando os
olhos para melhor usufruir o efeito reconfortante que a
bebida estava exercendo em seu corpo tenso e agitado.
— Nem quando aperta? — perguntou Rice,
pressionando os dedos da mão direita na parte superior da
coxa de Eva.
— Não.
A mão permaneceu no lugar onde pousara. E a pressão
inicial se transformou em uma suave carícia.
— Pare com isso — exigiu Eva, brandamente.
Já hipnotizado pelos encantos de Eva, Rice achou que
valia a pena não a obedecer. Ao invés de afastar a mão,
deslizou-a pele corpo de Eva. em busca de pontos mais
vulneráveis.

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— Pare, Rice — repetiu ela, com firmeza. — Não seja
teimoso!
O médico, porém, julgou que podia vergar a sua
vontade e, muito empolgado, agarrou a bainha de sua saia.
Antes que a erguesse, Eva empurrou sua mão para o lado e
se pôs de pé.
— Muita gente já levou bolacha pela cara, per tentar
fazer isso contra a minha vontade! — reclamou ela,
momentaneamente exasperada.
— Não se esqueça que sou seu médico. Tenho todo o
direito de examiná-la — assinalou o rapaz, meio
desconcertado e querendo sair da mancada pelo recurso da
galhofa.
— Per favor, nada de piadinhas infames! Procure
entender, Rice: tenho um sério problema a resolver e não
tenho cabeça para mais nada!
Dito isso, ela esvaziou o copo e foi se sentar em uma
poltrona distante do sofá onde o rapaz se encontrava.
Recostou-se com as pernas estendidas e o corpo bem
flácido. Com satisfação, percebeu o calor do uísque se
espalhar pelo corpo. Logo, sentiu-se menos tensa e em
melhores condições de raciocinar sem a atrapalhação da
inquietação.
— O que tem Maggie Doyle? — perguntou ela, de
repente, depois de um denso silêncio se arrastar por vários
minutos.
Rice permanecera sentado no sofá. Depois do fora que
levara, preferia sufocar seus ímpetos masculinos. Pelo
menos, momentaneamente. Ante a pergunta de Eva, ele se
levantou e se aproximou da sua poltrona. De pé, ficou a
observá-la.

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— Para lhe ser franco, ainda não sei. Ela parece estar
sob o efeito de alguma droga, mas não sei qual seja, nem
que antídoto lhe aplicar.
Eva se levantou. Caminhou até o armário de bebidas e
se serviu de nova dose de uísque. Voltou para a poltrona.
Sentou-se flacidamente e ergueu o olhar até Rice, que
continuava de pé no mesmo lugar.
— Eu hoje soube que existe um soro da verdade muito
poderoso e mais forte do que tudo que conhecemos —
assinalou ela, depois de tomar um gole de uísque. — Acha
que Doyle pode estar sob a ação de algo assim?
— Não conheço esse soro que você mencionou, mas a
hipótese é perfeitamente viável.
— E, nesse caso ela poderia intercalar o estado
constante de inconsciência com pequenos momentos de
lucidez, durante os quais andaria e se movimentaria
normalmente?
Rice encolheu os ombros e abriu os braços:
— É difícil responder a uma pergunta dessas, sem
conhecer a droga. À primeira vista, o que você falou parece
ser uma possibilidade absurda..., mas, bolas eu estou
cansado de ver coisas absurdas acontecerem todos os dias!
Ele se aproximou mais da poltrona onde Eva estava
sentada.
— Por que você não explica tudo direitinho a mim?
Gostaria de poder ajudá-la... Se houvesse jeito de submeter
a uma análise química essa droga que você mencionou,
talvez eu encontrasse um modo de curar Maggie.
— Mas o problema é que não tenho esse maldito soro,
nem sei onde consegui-lo! — exclamou Eva, pondo-se de
pé.
Ela andou de um lado para o outro, dando vazão à súbita
irritação que a invadira. De repente, parou e fitou o rapaz:

— 57 —
— Sabe o que é andar numa casa às escuras, de olhos
vendados? Pois é exatamente assim que me sinto! Não sei
de nada, não sei o que vou fazer, não sei a quem recorrer!
Francamente, acho que jamais me vi enfiada em uma
situação tão louca e absurda quanto esta! Tenho suspeitas e
penso em pistas, mas tudo parece levar a conclusões
fantásticas, sem nenhuma condição de serem reais!
Aliviada a frustração que a corroía internamente, ela
voltou para a poltrona. Afundou-se nela e, praticamente de
uma vez só, esvaziou o copo que tinha na mão. Pousou a
cabeça no encosto da poltrona e fechou os olhos.
— Sabe qual é a minha vontade, agora? Tomar o maior
porre da história, para esquecer essa embrulhada toda!
— Procure se acalmar — murmurou o médico,
aproximando-se da poltrona. — Você está muito nervosa.
— E não é para estar, com a porcaria desse problema
entalado na garganta?
— Nesse estado, você não conseguirá raciocinar direito.
Tente relaxar os músculos e recuperar a serenidade...
— É o que estou tentando fazer. Mas nem o uísque
parece ter condições de dar um jeito no meu sistema
nervoso.
— Talvez eu possa ajudá-la — murmurou Rice,
colocando-se por trás da poltrona de Eva.
Ele pousou as mãos nas têmporas de Eva e passou a
massageá-las suavemente.
— Agora, respire fundo, procure não pensar mais nesse
assunto e fique caladinha.
Por um momento, Eva esteve a pique de se levantar,
instigada pela certeza de que precisava fazer alguma coisa
e tentar encontrar uma, solução para aquele quebra-cabeça.
Mas, ela acabou mudando de idéia. Tivera um dia cheio e
ninguém podia lhe negar o direito de descansar um pouco.

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Assim, ela se abandonou às brandas massagens e ao
calor da bebida que continuava invadindo seus músculos.
Se pudesse se desligar daquela confusão por alguns
minutos, não seria nada mal.
Um denso silêncio baixou na sala, enquanto os dedos
experimentados de Rice continuavam pressionando
ritmicamente a5 têmporas de Eva. Do ponto onde ele se
encontrava, podia observar o lento movimento do busto da
agente, que acompanhava sua respiração profunda.
Pensamentos imperiosos circularam pela mente de Rice,
mas ele não se apressou.
Somente depois de vários minutos, suas mãos desceram
lentamente. Passaram, então, a massagear a parte traseira do
pescoço de Eva, enquanto os polegares pressionavam
mansamente a sua nuca.
Em dado momento, ao soltar a respiração, Eva deixou
escapar um longo suspiro, que bem traduzia a sensação de
tranquilidade que começara a invadi-la. As massagens de
Rice, conjugadas com o efeito do uísque, estavam
derrubando as últimas cidadelas de tensão e irritação no seu
íntimo.
Ele percebeu isso e não pôde mais conter o ímpeto que
formigava ao longo de seu corpo. Agora, era tudo ou nada,
disse para si mesmo, profundamente agitado. Num
movimento muito discreto, suas mãos desceram pelos
ombros de Eva, deslizaram ao longo dos contornos laterais
dos seios da agente e, com extrema delicadeza, os
aprisionaram. Apertaram-nos com lentidão, para testar sua
maciez e provocar sua sensibilidade.
Eva girou a cabeça para trás, a tiro de poder fitar Rice.
— Isso também é massagem para relaxar a tensão? —
perguntou ela, brandamente.

— 59 —
Temeroso de sua reação, Rice fez menção de erguer as
mãos. Ela, contudo, as segurou, impedindo que se
afastassem.
— Não seja bobinho — censurou. — Assim também é
gostoso.
Rice sentiu o sangue latejar mais rápido nas veias, ante
a certeza de que vencera a oposição daquela bela mulher
que tanto o perturbava. Prolongou as carícias por mais
alguns instantes e, contornando a poltrona, ajoelhou-se
diante de Eva.
Olhou-a dentro dos olhos e viu um brilho de doce
abandono que o fez estremecer no mais profundo de sua
masculinidade. A sedução e a beleza de Eva simplesmente
não tinham limites. Maravilhado, ele a segurou pelos
ombros e a puxou na sua direção. Roçou a boca em seus
lábios entreabertos, beijou-a, depois, e passou a mordiscar
a pele quente e acetinada de seu pescoço.
Eva se retesou ligeiramente. De seus lábios escaparam
curtos suspiros e, erguendo as mães, ela arranhou
carinhosamente os flancos do rapaz. Por fim, afastou-o de
si. Observou-o, por um memento, analisando suas feições
simpáticas agora retesadas peja expectativa.
— Seu danadinho -— sussurrou, com um sorriso terno
nos lábios. — É assim que você faz com todas as suas
pacientes que o procuram nervosas e tensas?
Rice abriu a boca para falar alguma coisa, mas Eva não
permitiu. Segurou-lhe o rosto com as duas mãos e o puxou
para junto do seu. Com impetuosidade, esmagou os lábios
em sua boca, em um beijo ávido e ardente, que decretou o
fim das carícias mansas e delicadas.
A longa temporada que haviam passado sem se verem
despertou a irreprimível ânsia de reviverem deliciosas
sensações guardadas em suas lembranças. Depois de vários

— 60 —
beijos, que os deixaram ofegantes e trêmulos, Rice se
ergueu. Tomou Eva nos braços e a conduziu até seu quarto.
Depositou-a na cama e e.la se virou de bruços, a fim de
lhe permitir a tarefa de abrir sua blusa. Impaciente. Rice
arrancou das respectivas casas a fileira de botões, o que,
para ele, pareceu irritantemente interminável.
Aberta a blusa, ele distribuiu uma série de beijinhos na
pele macia e sedosa das espáduas de Eva, enquanto suas
mãos se perdiam em contornos carnudos e ricos de sedução.
Ela se contorceu, gemendo baixinho, e girou o corpo,
para ficar deitada de costas. Rice acabou de lhe tirar a blusa
e, sem perda de tempo, ocupou-se de sua saia. Num abrir e
fechar de olhos, Eva ficou totalmente nua. Enquanto
observava seu estupendo corpo, uma verdadeira sinfonia de
sedução e feminilidade, ele tratou de se despir.
Depois, deitou-se e puxou Eva para junto de si. Quando
os dois corpos se encontraram, houve uma espécie de
descarga elétrica entre ambos. O inevitável desfecho, então,
precipitou-se de forma avassaladora.
Rice estreitou Eva nos braços, impondo-lhe as
exigências de sua masculinidade. Sentia-se vitorioso:
afinal, o medo de jamais voltar a desfrutar das carícias da
bela agente se convertera em uma ameaça superada. Tal
constatação, fazendo-o vibrar de satisfação, tornou-o
impetuoso e quase implacável.
Com os olhos fechados e as unhas cravadas em suas
costas, Eva não tentou conter sua explosão de desejo.
Enquanto curtos suspiros morriam em sua garganta, sem
alcançar seus lábios escancarados, ela se limitou a ajustar
seu corpo flexível ao ritmo vertiginoso que Rice lhe
impunha.

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CAPÍTULO 7
Eva girou as pernas e sentou-se na borda da cama.
Percebendo seu movimento, Rice curvou-se na sua direção
e a segurou pela cintura.
— Não vou deixar você ir embora — murmurou,
beijando-lhe a pele acetinada das costas. — Ainda é muito
cedo.
— Tenho muita coisa para fazer — retrucou Eva.
— E eu tenho muita saudade para matar...
Seus dedos deslizaram ao longo da curva macia do
ventre de Eva. Mas ela não permitiu a investida perigosa.
Segurou suas mãos com resolução e as afastou para o lado.
Pôs-se de pé rapidamente e tratou de se afastar da cama.
— Malvada! — murmurou Rice, baixinho.
Eva recolheu suas peças de roupa espalhadas pelo chão
e em um instante se vestiu, roubando aos olhos de Rice a
visão perturbadora de sua exuberante nudez.

— 62 —
— Estou precisando de um favor seu — disse ela, então,
sem se aproximar da cama.
— Para pessoas que me maltratam, não costumo fazer
favores — brincou o rapaz, fazendo cara de sofrimento.
Eva ignorou sua observação:
— É fácil você conseguir o endereço de uma enfermeira
do “St. Paul Hospital”?
— É. Eu conheço todo o pessoal da portaria..., mas para
que você quer essa informação? Afinal de contas, o que está
acontecendo?
— Isso eu não posso explicar — retrucou a agente. —
Você terá que me ajudar sem fazer perguntas.
Rice abriu os braços, enquanto meneava a cabeça:
— Essa é muito boa! Você pede ajuda e ainda impõe
condições...
— Por favor, Rice, não é hora para brincadeiras.
— Pois eu vou fazer o meu preço. Só consigo o
endereço para você em troca de um beijo.
— Ora, não seja criança...
— Ou eu ganho um beijo, ou nada de ajuda!
Vendo que Rice estava irredutível, EY3 SS aproximou
da cama, onde ele se sentara. Curvou-se para a frente e,
apoiando as mãos em seus ombros, pousou a boca em seus
lábios.
Sua intenção era lhe conceder um beijo ligeiro, mas
Rice segurou seu rosto com as duas mãos e esmagou a boca
na sua. Ela não protestou e o rapaz, cedendo ao desejo que
ainda se agitava em seu íntimo, baixou as mãos até a sua
cintura. Segurou-a com firmeza e rapidamente curvou o
corpo para trás. Eva perdeu o equilíbrio e se projetou para
a frente. Ou seja: caiu deitada por cima dele.

— 63 —
Em silêncio, Rice desferiu um ataque impetuoso,
visando os pontos mais vulneráveis do sensível corpo da
agente.
— Pare com isso — murmurou ela, contorcendo-se em
seus braços. — Já lhe disse que estou com pressa!
— E eu também, e eu também... — retrucou o médico,
ofegante.
Ele girou o corpo e se pôs sobre Eva, a fim de imobilizá-
la com o seu peso. Enquanto beijava-lhe o rosto e o pescoço
acetinado, subiu a mão ac longo de sua perna. Sua
finalidade era vergar a vontade de Eva com carícias que
atingissem fundamente a sua ardente feminilidade.
— Eu já lhe disse para parar — reclamou a agente,
baixinho. — Não me obrigue a tomar uma atitude...
Rice nem deu bola à sua advertência. No momento,
estava muito mais interessado em vencer os obstáculos de
brim e ‘‘nylon’’ que impediam a ação de seus dedos.
— Pela última vez, Rice... Pare com isso!
No estado em que o rapaz já estava, simples palavras
não resolveriam nada. Vencido pela sedução que Eva
exercia sobre ele, Rice só tinha ouvidos agora para as
exigências de seu instinto masculino. A agente percebeu
isso e, antes que também chegasse ao ponto de perder o
autodomínio, decidiu agir com firmeza. Ergueu a mão
direita e lhe acertou um curto golpe na base do pescoço. O
rapaz gemeu baixinho e toda a sua impetuosidade cessou.
Percebendo que ele ficara meio grogue, Eva o empurrou
para o lado. Deslizou o corpo pela cama e se pôs de pé.
— Não é um bom negócio afrontar a vontade de uma
mulher que sabe lutar caratê — assinalou ela, com um
sorriso nos lábios, çnquanto1 ajeitava a saia no corpo.

— 64 —
Rice se sentou na cama, ainda tonto, e começou a
massagear o local atingido. Lançou um olhar carregado de
frustração na direção de Eva, mas não disse nada.
— Como é? — perguntou ela. — Você vai me arranjar
o endereço da tal enfermeira? Pelo que pude apurar na
portaria do hospital, ela se chama Çarolyn Stampford...
O rapaz observou a agente da L.E.S.B. por um
momento e depois balançou a cabeça. Curvou-se na direção
da mesinha de cabeceira e pousou a mão. no telefone que
havia lá.
— Pelo visto, é melhor eu atender logo ao seu pedido
— murmurou, com um sorriso curto nos lábios. — Se não,
já vi que vou baixar hospital com todos os ossos do corpo
quebrados.

***

Eva Brooklin deu um pulo a sua casa. Trocou de roupa


e colocou na bolsa que escolheu usar a sua inseparável
pistola. Não fazia muita fé na idéia que tivera, mas, come
as coisas sempre poderiam esquentar de uma hora para a
outra, valia a pena estar prevenida para o que desse e viesse.
No seu carro, ela se dirigiu para o endereço que Rice
conseguira da portaria do hospital com o telefonema.
Enquanto subia no elevador, procurou armar um esquema
de ação, mas acabou deixando tudo à cargo da improvisação
e de sua reação instintiva.
Precisou tocar a campainha da porta várias vezes.
Finalmente, a porta foi aberta. Mas apenas uma estreita
fresta, até onde permitia a correntinha do trinco de
segurança. Um olho azul a observava fixamente.
— O que você deseja? — perguntou uma áspera voz
feminina.

— 65 —
— Você é Carolyn Stampford?
— Sou.
— Preciso muito falar com você.
— O que você quer? Nunca a vi antes.
— Estou com um sério problema e o Doutor Rice me
recomendou conversar com você. Ele é muito amigo de
minha família e disse que você poderá me ajudar.
— Ajudar em quê? — perguntou a outra mulher, com
voz ressabiada.
— Deixe-me entrar. É um assunto muito pessoal.
A enfermeira ficou em silêncio por um momento.
Depois, superando a relutância, meneou a cabeça:
— Olha, agora não dá para conversar. Eu estava
dormindo. Preciso descansar, pois terei um turno de plantão
esta noite.
— Por favor — murmurou Eva, dando um tom de
ansiedade à voz. — Trata-se de um assunto urgente. E eu
lhe garanto que você não se arrependerá, se me ajudar.
Novamente, a outra mulher relutou. Mas acabou
erguendo a mão até o fecho de segurança.
— Bem, já que você foi recomendada pelo Doutor
Rice...
Ela abriu a porta e deixou Eva entrar em seu
apartamento. Fechou a porta e veio se sentar em um sofá. A
agente se acomodou na poltrona à sua frente e analisou per
um momento. Carolyn era loura e já devia ter passado da
casa dos quarenta anos. Ainda era uma mulher bonita e
devia atrair a atenção de muitos homens. Seu cabelo
desgrenhado e o roupão colocado de qualquer maneira no
corpo indicavam que ela saíra da cama, mesmo, para
atender a porta.
— Bem, pode contar seu problema agora...
Francamente, não consigo atinar com o que se trata. Anos

— 66 —
atrás, eu pensaria lego na possibilidade de um aborto. Mas,
hoje em dia, com ele legalizado aqui no Estado de Nova
Iorque, as coisas mudaram muito. — Ela se curvou até uma
mesinha colocada junto ac sofá e apanhou um maço de
cigarros e um isqueiro. — Afinal, o que você deseja?
— Para quem você abriu a porta interna do quarto da
paciente chamada Maggie Doyle, lá no “St. Paul Hospital”?
Carolyn, que começara a aproximar a chama do
isqueiro do cigarro que botara na boca, retesou-se da cabeça
aos pés e desviou o olhar até o rosto de Eva.
— O que foi que você disse? — perguntou, tensa.
Eva, que decidira jogar na base do tudo ou nada, insistiu
na sua brusca investida. Às vezes, um bom blefe ganha uma
rodada:
— Não se faça de desentendida — retornou, com voz
seca. — Você sabe muito bem do que estou falando.
Alguém entrou no quarto de Maggie Doyle hoje, por volta
das duas e pouco. E só pode ter sido com a sua ajuda.
A enfermeira acabou de acender o cigarro e soltou uma
longa baforada.
— Nem sei quem é essa tal Maggie Doyle —
murmurou, evitando o olhar penetrante da agente da
L.E.S.B.
— Ela está na ala dos apartamentos reservados. Quarto
1011. — Esclareceu Eva. — Foi internada hoje pela manhã,
vítima de um profundo estado de inconsciência. Mas
alguém lhe fez uma visita, entrando pela porta lateral do
quarto. Como a chave ficou na porta e apenas você entrou
no quarto, a conclusão é um bocado óbvia, não? Você abriu
a porta interna para esse visitante fortuito!
— Acho que você está completamente louca! -—
exclamou Carolyn, dando um toque de indignação à sua
voz. — Por que eu iria fazer uma coisa dessas?

— 67 —
— Ê justamente isso que você vai me explicar agora.
A enfermeira se pôs de pé bruscamente.
— Vou ser obrigada a mandá-la se retirar. Preciso
dormir e não estou com a mínima vontade de perder tempo
com uma conversa absurda dessas...
Eva enfiou a mão na bolsa. Retirou do seu interior a
pistola e a apontou na direção da outra mulher:
— Sente-se — ordenou, secamente.
Carolyn arregalou os olhos e, flacidamente, largou o
corpo no sofá.
— O qu-que você está pretendendo fazer? — balbuciou,
com o olhar grudado no cano da arma.
— Tudo dependerá de você.
— Não acredito que você tenha coragem de me matar a
sangue-frio — choramingou a mulher. — Mesmo porque,
está cometendo um terrível equívoco... Não fui eu quem
abriu a tal porta.
— Isso é mentira. Fui informada de que apenas você
entrou no quarto de Maggie Doyle.
— Quem lhe disse isso, mentiu!
Eva se curvou ligeiramente para a frente, ampliando no
rosto a expressão ameaçadora.
— Vamos lá. Carolyn. Eu não posso perder tempo. Ou
você se abre comigo ou serei obrigada a tomar providências
drásticas.
Encolhendo-se no sofá, » mulher esfregou as palmas
das mãos nas coxas. Paulatinamente, seu sistema nervoso
chegava ao limite de sua resistência.
— Você não pode fazer isso comigo — choramingou,
balançando a cabeça. — Jamais fiz mal a alguém.
— Percebendo o estado de pânico em que a mulher
estava prestes a mergulhar, Eva decidiu apressar o desfecho

— 68 —
daquela situação. Se ela tinha algo a ocultar, dificilmente
iria resistir agora a uma pressão psicológica maior.
A agente da L.E.S.B. se levantou e caminhou até o sofá,
sempre com a pistola em riste. Carolyn se encolheu mais,
enquanto seus olhos azuis continuavam fixos no cano da
arma. Eva sentou-se ao seu lado.
— Você não está sendo sensata, Carolyn — murmurou
ela, com voz lenta. — Se me ajudar e contar tudo que sabe,
prometo que a deixarei em paz. Não a entregarei à polícia,
nem tomarei qualquer atitude contra você. Mas, se insistir
nessa tola decisão de me ocultar a verdade, serei obrigada a
agir de forma implacável.
Dito isso, Eva estendeu a mão direita para a frente e
aproximou a pistola do peito da enfermeira. O roupão,
aberto na frente, deixava à mostra as curvas internas do
opulento busto de Carolyn. Mansamente, Eva pousou o
cano da arma no estreito vale que separava os seios
volumosos.
A enfermeira chegou a estremecer, quando sentiu o
metal duro e frio se grudar em sua came macia. Baixou os
olhos até a arma e depois fitou Eva, com uma expressão de
pavor no rosto.
— Pelo amor de Deus, não me mate! Não me mate!
— O seu destino está em suas mãos — retrucou Eva. E,
pressionando o cano da arma no corpo da mulher: — Vou
contar até três. Um... dois...
— Não, não! — berrou a enfermeira, pousando dedos
gelados e úmidos de suor na mão direita de Eva. — Afaste
isso, eu falo! Eu lhe conto tudo que sei! Mas, pelo amor de
Deus, não me mate! Não me mate...
Soluços violentos estrangularam sua voz na garganta e
ela mergulhou em um choro convulsivo. Eva recuou a mão

— 69 —
direita e por um momento permitiu sua explosão de
nervosismo e tensão. Depois, segurou-lhe o braço:
— Pronto, já chega de chorar. Fale logo de uma vez
tudo que você sabe.
O corpo da enfermeira ainda estremeceu ao compasso
de violentos soluços. Depois, ela respirou fundo e se
aquietou. Amassou num cinzeiro o cigarro que ainda tinha
entre os dedos e enxugou as lágrimas do rosto com as mãos.
— Eu fui obrigada a fazer aquilo — balbuciou,
baixinho.
— Não estou interessada nesses detalhes — atalhou
Eva, impaciente. — Já lhe disse que não vou tomar
nenhuma atitude contra você. Ninguém saberá nada do que
me contar. Mas, desembuche logo de uma vez, pois não
posso perder tempo!
Carolyn baixou a cabeça e, com os olhos fixos no chão,
começou a falar:
— Eu estava me preparando para começar a visita de
inspeção aos quartos, quando eles me abordaram no
corredor.
— Eles, quem?
— Dois homens que nunca vi antes — esclareceu
Carolyn. — Conduziram-me a um quarto vazio e me
pediram informações sobre a ocupante do 1011. Expliquei-
lhes o que sabia e eles disseram que queriam entrar pela
porta lateral do quarto e que, para tanto, iriam precisar da
minha ajuda. Falei-lhes que não podia fazer uma coisa
dessas, mas os dois não se deram por satisfeitos.
Apontaram-me uma arma. Ou eu os ajudava e ainda
ganhava cinco mil dólares ou iria direto para o cemitério...
Ela respirou fundo, enquanto meneava a cabeça:
— Fiquei apavorada e não vi outra saída senão obedecer
a eles. Entrei no quarto 1011 e abri a porta lateral. Os dois

— 70 —
já estavam no apartamento contíguo e penetraram logo no
quarto.
— E o que fizeram, então?
— Isso, eu não sei, pois mandaram eu sair
imediatamente.
— Você se lembra de algo que possa me ajudar a
localizá-los?
A enfermeira relutou por um momento. Depois,
respirando fundo, respondeu bem devagar:
— Eles deixaram um número de telefone comigo.
Disseram que eu deveria chamá-los esta noite, para receber
os cinco mil dólares prometidos. Explicaram que, por causa
da pressa, não tinham podido arranjar o dinheiro para levá-
lo ao hospital.
— E você já ligou para eles?
A mulher fez que não, com a cabeça.
— Eu estava, até com vontade de nem ligar. Não tenho
a mínima vontade de apanhar esse dinheiro. Só queria
sossego e distância dessa confusão toda.
— Mas acontece que você vai ligar — retrucou Eva,
prontamente.
De imediato o rosto da enfermeira se contraiu em uma
expressão de medo.
— Por favor, isso não — murmurou ela, lançando um
olhar de súplica até a agente da L.E.S.B. — Se eles
souberem que eu os traí, serão Capazes de me matar.
— Infelizmente, não há outra alternativa — retornou
Eva, inflexível. — Onde está o número?
Duas lágrimas brilharam nos olhos de Carolyn.
Trêmulos, seus lábios chegaram a se entreabrir,
naturalmente para formular nova súplica. A frieza
estampada no rosto da agente da L.E.S.B. contudo,

— 71 —
representava uma certeza de que não adiantaria espernear.
Conformada, Carolyn se levantou.
Sob o olhar atento de Eva, caminhou até o canto da sala,
onde havia uma bolsa jogada. Apanhou-a, abriu-a e fez
menção de enfiar a mão dentro dela.
— Não, não — avisou Eva, prontamente. — Deixe que
eu vejo isso.
Carolyn se aproximou do grupo de poltronas e entregou
a bolsa à agente. Com a mão direita em riste, Eva enfiou a
esquerda na bolsa. Sua precaução se mostrou
completamente inútil, pois não havia arma alguma ali.
Encontrou, apenas, objetos tipicamente femininos, além de
uma carteira de dinheiro. Mas a regra era essa, mesmo:
sempre desconfiar, para nunca se estrepar.
— É esse, o telefone? — perguntou ela, por fim,
estendendo um pedaço de papel na direção da enfermeira.
Carolyn o apanhou e fez que sim com a cabeça.
— Então, ligue para eles — ordenou a agente.
Novamente, a expressão de pavor se desenhou no rosto
da mulher.
— E o que vou dizer? — perguntou, com voz sumida.
— Diga, apenas, que deseja receber o dinheiro e nada
mais. E também procure manter uma voz normal. Nada de
nervosismo ou gagueira.
Carolyn se aproximou do telefone. Olhou-o como se
fosse um monstro prestes a devorá-la e, depois, respirou
fundo. Resignada com a única escolha que dispunha,
estendeu a mão até o fone. Discou o número e ficou
aguardando, com os olhos fixos em Eva, que viera se postar
ao seu lado, de pistola apontada na direção de seu estômago.
O diálogo foi curto. Carolyn falou pouco e isso serviu
para velar a tensão contida em sua voz. Por fim, com a

— 72 —
expressão de quem desperta de um pesadelo, ela. pousou o
fone no lugar.
— E então? — indagou Eva.
— O sujeito que me atendeu marcou um encontro para
daqui a vinte minutos no Central Park. Disse que estará me
esperando perto do obelisco situado nos arredores do Lago
Belvedere. Disse para eu ir só e aguardar que eles entrem
em contato comigo.

— 73 —
CAPÍTULO 8
Eva Brooklin deixou a enfermeira junto ao portão da
Passagem Transversa número dois do Central Park. Fez-lhe
duas recomendações: agir naturalmente e não ficar olhando
para os lados e para trás, como se tivesse certeza de estar
sendo seguida.
— Deixe tudo por minha conta e lhe garanto que nada
de mal acontecerá com você. Depois, volte para casa e se
esqueça dessa confusão toda.
— Se isso for possível — murmurou Carolyn,
respirando fundo.
Com o rosto retesado numa expressão de medo e tensão,
ela penetrou no Central Park. Eva estacionou o carro, saltou
e começou a segui-la de longe, com os músculos 98 em
estado de alerta e a mão pronta para mergulhar na bolsa em
busca de sua pistola.
Ela sabia muito bem que estava jogando uma cartada
arriscada. Em todos os sentidos, aliás. A sensação era

— 74 —
idêntica a de alguém andando em um pântano, sem saber a
localização de diversos focos de areias movediças.
Em primeiro lugar, não podia confiar totalmente em
Carolyn. Seu medo parecia autêntico, mas ela bem podia
tomar a decisão de virar a mesa, na hora H. De repente,
podia sair correndo e não comparecer ao encontro. Ou,
apesar das ameaças de Eva, dar com a língua nos dentes,
quando o sujeito entrasse em contato com ela.
Por outro lado, era preciso não se esquecer que Vernon
não parecia ser otário. Desde o início, certamente contara
com a possibilidade de a enfermeira ser apertada por
alguém e contar tudo o que sabia. Usá-la naturalmente fora
uma medida de emergência e, como tal, passível de
restrições da sua parte.
Ela seguiu nela East Drive, sempre conservando uma
boa distância da enfermeira. Quando a viu se aproximar do
Obelisco, diminuiu o passo. Apesar da escuridão crescente,
podia observar tudo, ainda, com relativa facilidade. E o
número cada vez menor de transeuntes, embora lhe desse
menos cobertura, em compensação garantia-lhe a
possibilidade de maior mobilidade, no caso de precisar
entrar em ação.
Carolyn parou diante do obelisco. Abriu a bolsa e,
lentamente, acendeu um cigarro. Eva, que. se sentara em
um banco na curva de uma alameda, observava-a
atentamente. Os vinte minutos estavam prestes a se esgotar
e, se o pessoal de Vernon pretendia mesmo comparecer ao
encontro marcado, seria agora ou nunca.
De repente, uma mulher alta e esguia se aproximou de
Carolyn. Os músculos de Eva se contraíram, quando ela a
identificou: Louise em pessoa!
A agente da L.E.S.B. parou ao lado da enfermeira.
Cumprimentou-a e lhe passou um pacote que retirou da

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bolsa. Sem dizer mais nada, nem dar tempo a Carolyn de
falar alguma coisa retirou-se com passadas rápidas,
tomando o rumo justamente do loca] onde Eva ficara
aguardando o desenrolar dos acontecimentos.
Eva a viu passar pela alameda paralela àquela onde se
encontrava. Deu-lhe alguma distância de vantagem e se pôs
de pé. Relanceou o olhar até a enfermeira, que continuava
parada diante do Obelisco sem saber o que fazer, e começou
a seguir Louise.
Ela andava depressa, com passos rígidos, e em dado
momento penetrou em uma estreita alameda do parque,
cercada por árvores frondosas. Eva foi atrás dela e, no fundo
de sua mente, seu instinto de sobrevivência deu um brado
de alerta: perigo à vista. Realmente, aquele lugar ermo seria
ideal para uma emboscada. Mas, como ela não tinha outra
escolha, seguiu em frente. Apenas, tomou o cuidado de
aproximar mais a mão direita de sua bolsa.
Em dado momento, ouviu um ruído à sua retaguarda.
Parou de caminhar e enfiou a mão na bolsa. Mas, antes que
seus dedos se fechassem ao redor do cabo de sua pistola,
sentiu a pressão dura do cano de uma arma em suas costas.
— Tire a mão dessa bolsa e fique quietinha. Se tentar
alguma coisa, morre agora mesmo.
Engolindo sua frustração, Eva obedeceu à ordem
recebida. E seguiu em frente, quando o sujeito que a
mantinha colado às suas costas exigiu que continuasse a
andar.
Em silêncio, ambos saíram do Central Park. Eva foi
conduzida até um carro estacionado nas suas imediações e
não estranhou nada quando viu Louise sentada no banco da
frente, ao lado do motorista. Ela e seu captor se instalaram
no banco traseiro e o veículo se pôs em movimento. Tomou
o rumo de um distante bairro de Queens e Já penetrou em

— 76 —
uma rua deserta e de aspecto bucólico. O tipo do local onde
ninguém se mete com o vizinho do lado; portanto, um ponto
ideal para gente como Vernon se esconder e poder agir sem
perturbações.
O carro penetrou na garagem de uma casa isolada e
todos os seus ocupantes saltaram. Vigiada pelo sujeito que
a agarrara, Eva foi conduzida para o interior do prédio.
Louise seguiu na sua frente, ao lado do motorista, sempre
com seu ar distante e olhar perdido no vazio.
O homem conduziu Eva até um pequeno cômodo no
primeiro pavimento da casa, mandou que ela se sentasse e
ficou plantado à sua frente, de arma em punho.
Antes que Eva perguntasse o que pretendia fazer com
ela, um vulto surgiu na porta. Relanceou o olhar até ele:
Vernon.
— Olá — saudou ele, com um sorriso nos lábios. —
Mais uma vez, nossos caminhos se cruzam, não?
Eva não disse nada. Limitou-se a observá-lo se
aproximar e se sentar em uma cadeira. Sem pressa, Vernon
acendeu um cigarro. Depois de soltar a primeira baforada
de fumaça, pousou um olhar irônico no rosto de Eva.
— Então, você quis me pegar pelo pé hem?
A agente da L.E.S.B. manteve o seu silêncio.
— Louise me disse que você era a agente mais esperta
da organização de Maggie Doyle. Eu já estava inclinado a
acreditar nisso, depois das demonstrações de argúcia e
valentia que você deu. Mas, sua atuação no Central Park foi
simplesmente deplorável. Deixou-se agarrar como uma
principiante.
— Mas você também cometeu uma mancada —
retrucou Eva. irritada com ó persistente sarcasmo de
Vernon. — Dar o seu telefone àquela enfermeira foi uma

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jogada muito pouco inteligente. Através dessa bobeira, bem
que poderia ter se estrepado.
Vernon soltou uma gostosa gargalhada:
— Puro engano seu, minha cara — retrucou ele, depois.
— Dar o número daquele telefone à enfermeira fazia parte
de um plano meu. Digamos que foi um lance arriscado. para
tornar a brincadeira mais divertida... Ou você acha que,
espontaneamente, eu iria cometer tamanha estupidez? Se
nem confio nas pessoas que trabalham comigo, quanto mais
em uma estranha arrebanhada às pressas, em uma
emergência... Não, pode crer que estava tudo planejado.
— Francamente, eu não entendo — murmurou Eva,
franzindo as sobrancelhas ligeiramente.
— O que está acontecendo agora faz parte, em verdade,
de uma velha história. Tenho velhas dívidas a acertar com
a L.E.S.B. e resolvi tornar minha desforra mais divertida.
Por isso, deixei aquela “pista” da enfermeira. Queria que o
pessoal da L.E.S.B. viesse louco para cima de mim, crente
de que ia me agarrar, para, então, eu ter o prazer de impor
mais uma derrota à organização.
— Isso está me parecendo idéia de um desequilibrado
mental — assinalou Eva, com desprezo.
— Nem tanto. Anos atrás, agentes da maldita Maggie
Doyle desmantelaram um esquema de distribuição de
tóxicos que montei na Jamaica e por pouco não me
mandaram para o inferno. Jurei, então, que as coisas não
iriam ficar assim. Pensei durante vários anos, mas agora
estou de volta. E em condições de deixar todas vocês em
polvorosa, amargando derreta em cima de derrota. Talvez,
até, consiga desmantelar por completo sua organização!
— Muitos já tentaram isso e se deram mal no final.
— Comigo vai ser diferente — rebateu Vernon, com
um sorriso feroz nos lábios. — Depois que tive a tremenda

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sorte de botai as mãos nessa droga miraculosa, ninguém
poderá mais me deter... — Ele riu baixinho, como se tivesse
se lembrado de uma piada muito engraçada. — Você não
pode imaginar o quanto tenho me divertido, nesses últimos
dias. Por acaso, imagina quem foi que vendeu aquele soro
da verdade à. L.E.S.B.?
Eva encolheu os ombros, como resposta.
— Eu mesmo, minha cara! — exclamou ele, cem uma
expressão de triunfo.
A agente da L.E.S.B. não pôde evitai que uma
expressão de espanto dominasse seu rosto.
— Como disse? — murmurou.
— Foi um lance magnífico! — vangloriou-se Vernon.
— Por acaso, tomei conhecimento das experiências que um
cientista estava fazendo na Europa, por conta própria e
quase secretamente. Matei-o e me apoderei de toda a droga
que ele já tinha aprontado. Entrei em contato com a
representante da L.E.S.B. em Roma e lhe ofereci o soro.
Depois de um teste, em que ele foi aprovado, a agente se
entendeu diretamente cem Maggie. Como seria de se
esperar ela topou o negócio. Pagou cem mil dólares em
dinheiro vivo. Uma pequena fortuna, não acha?
Sua pergunta ficou sem resposta da parte de Eva e ele
prosseguiu:
— Mas isso foi apenas o começo da brincadeira, para
me garantir um tutu alto que pudesse financiar outros
lances. Assim que fechei o negócio, voei aqui para os
Estados Unidos. Mal cheguei em Nova Iorque, agarrei
Louise, que tinha sido uma das agentes mais ativas na
Jamaica contra a minha organização. — Um brilho cruel
dominou seus olhes. —Nada pode se comparar ao prazer
que tive ao lhe aplicar o soro e, dominando a sua vontade,
obrigá-la a fazer tudo o que eu queria... Obtive por seu

— 79 —
intermédio preciosas informações a respeito da estrutura
localização do quartel-general da L.E.S.B.
— E, então, partiu para o seu segundo passo, que foi
atacar Maggie Doyle?
— Isso foi, digamos assim, uma jogada extra, só para
deixar vocês mais confusas. No momento, a minha
preocupação principal era recuperar o soro da verdade que
tinha vendido a vocês, a fim de faturar mais dinheiro,
oferecendo-o ‘a uma outra organização de espionagem.
Mas não pude me furtar à chance daquele lance ousado.
Vernon sorriu. Sua satisfação estava totalmente exposta
na expressão de vitória que mantinha no rosto. E, cada vez
mais empolgado com suas façanhas, não parecia disposto a
parar de falar sobre elas.
— Como Louise me forneceu detalhes precisos sobre a
vida de Maggie Doyle, pude segui-la facilmente esta
manhã. Para injetar em seu corpo a primeira dose da droga,
usei os serviços de um sujeito que conheci na Jamaica. Ele
vem da América do Sul. É meio índio e sabe usar uma
zarabatana como ninguém. A minúscula seta que ele lançou
não chegou a se enterrar no pescoço de Maggie. Mas picou
a pele e isso foi o suficiente para injetar um pouco da droga.
Ela é extremamente forte e uma dose mínima provoca efeito
por várias horas...
Vernon esmagou seu cigarro em um cinzeiro e
prosseguiu:
— Foi até melhor a seta da zarabatana não ter se
grudado na nuca de Maggie. Assim, vocês devem ter
achado tudo aquilo ainda mais misterioso... Bem, deixei
momentaneamente de lado meus planos de vingança e me
ocupei, então, da recuperação do soro da verdade. Louise
conhecia todos os detalhes da operação e me garantiu que
você fatalmente seria a escolhida para substituir Maggie no

— 80 —
contato a ser realizado no aeroporto. Louise só não sabia
qual seria o código escolhido para a ocasião e, por isso,
resolvi agarrar você... A partir daí, acho que você já
conhece a história toda.
— Nem tudo — retrucou Eva, lentamente. — Como foi
que você usou Maggie para ir ao aeroporto?
— A aplicação do soro da verdade se divide em duas
etapas — explicou Vernon. — Primeiro, injeta-se na pessoa
uma droga que lhe provoca um estado de inconsciência
geral. É preciso que ela permaneça sob o efeito do primeiro
estágio pelo menos uma hora e meia, a fim de que atinja um
relaxamento completo que destruirá toda a sua resistência.
Então, usa-se uma droga suplementar que a faz despertar já
com a vontade passível de ser controlada.
— Então, você foi ao hospital para aplicar em Maggie
esse segundo estágio?
— Exato. Eu queria usar você, mas, com aqueles
contratempos todos, não iria dar mais tempo de aprontá-la
para o contato às dezesseis horas no aeroporto. Tive, então,
que optar pelo caminho difícil. Mas deu tudo certo. Foi fácil
obrigar a enfermeira a nos ajudar e entramos no quarto pela
porta lateral, sem que a agente da L.E.S.B. de plantão
percebesse. Apliquei a segunda droga em Maggie. Ela se
levantou prontamente e a levamos ao aeroporto. Ela
apanhou a droga com o sujeito que a trouxe e regressamos
ao hospital, onde lhe apliquei nova dose do estágio um.
Ele sorriu, arreganhando os dentes de forma feroz:
— Agora, é tratar de revender o soro e continuar na
minha brincadeira de gato-e-rato com a L.E.S.B. Já tenho
Maggie e Louise sob o meu controle. Agora, imagine sé
agarro Thelma, também, e outras figuras importantes da
organização... Não iria ser divertido ter a L.E.S.B. na minha

— 81 —
mão, forçando-a a cometer loucuras até irritar o governo
americano e levá-lo a acabar com suas atividades?
— Isso é uma idéia digna de um louco, mesmo —
rosnou Eva secamente.
— Mas as ideias loucas, no fundo, têm muito de
geniais! — rebateu Vernon, sorridente.
— E quanto a mim, o que você pretende fazer? —
perguntou Eva.
Vernon recolheu o sorriso e ficou muito sério.
Observou Eva por um longo momento. Analisou seu busto
imponente contido pela malha colante e as belas pernas mal
ocultas pelo vestido curto.
— Você é uma mulher muito perigosa — murmurou,
lentamente. — Pelo que já demonstrou, não é um páreo
fácil, não. O bom senso aconselha que o melhor a fazer no
seu caso seria meter uma bala na sua cabeça agora mesmo.
— Um curto sorriso abrandou suas feições sombrias. —
Mas acontece que sou um simples mortal de carne e osso.
Nesses últimos dias. Louise vem demonstrando o quanto é
delicioso a gente dispor da vontade de uma bela mulher.
Você é linda e está me dando uma vontade danada de repetir
a experiência...
Ele lançou um último olhar carregado de crueza e
intensões ao exuberante corpo de Eva e se pôs de pé. Sem
dizer mais nada, retirou-se, acompanhado pelo sujeito que
montara guarda o tempo todo.
Eva observou a porta se fechar e uma chave girar duas
vezes na fechadura. Olhou em volta e constatou que a
tinham fechado em um cubículo interno, pois ele não
dispunha de uma única janela.
Levantou-se e perambulou de um lado para o outro,
com a inquietude de uma leoa selvagem aprisionada em
uma jaula. Depois, voltou a se sentar na cadeira.

— 82 —
A sensação de nada poder fazer no momento não a
levou ao desânimo. Continuava viva e isso era o mais
importante. Se ficasse atenta e permanentemente em guarda
talvez lhe surgisse uma chance de cavar a sua fuga.
Lembrou-se das últimas palavras de Vernon e lutou
para expulsar de sua mente as perspectivas sombrias
contidas nelas. Nada de apavoramentos, disse para si
mesma. Para quem já enfrentara coisas muito piores, a
decisão de Vernon não chegava a ser o fim do mundo. O
importante era manter a tranquilidade e o sangue-frio,
fatores indispensáveis para qualquer tentativa de se livrar
daquela enrascada.
De repente, o encadeamento de seus pensamentos foi
interrompido por algo que a fez se retesar da cabeça aos pés:
uma folha de papel fora empurrada por baixo da porta Dara
o interior do quarto. Levantou-se e foi apanhá-la. Havia um
curto bilhete escrito nela:
“Vou tentar ajudá-la. Troquei as drogas que irão aplicar
em você por injeções inofensivas. Finja que ficou dopada e
aguarde os acontecimentos. Depois de ler, rasgue esse
papel”.

— 83 —
CAPÍTULO 9
Dois homens armados de pistolas vieram buscar Eva.
Através de gestos ríspidos, mandaram que ela os seguisse.
A agente os acompanhou em silêncio. Nada perguntou, pois
bem podia imaginar o que estava a caminho. Naturalmente,
iam levá-la para a aplicação da droga em seu corpo.
Lembrou-se mais uma vez do misterioso bilhete e a
expectativa aumentou em seu íntimo.
Os três atravessaram o corredor central do primeiro
pavimento e subiram pela escada para o andar superior.
Sempre de arma em riste, os dois pistoleiros conduziram
Eva até um quarto, onde o próprio Vernon a aguardava.
Ele a recebeu com um sorriso nos lábios, que traduzia
divertimento e sadismo:
— Bem, minha cara, nossa brincadeira vai continuar
agora — assinalou ele. E, apontando para a cama que
dominava uma das paredes: — Deite-se, por favor.

— 84 —
Depois de fingir uma certa relutância, Eva obedeceu.
Sob o olhar atento de seus capangas, Vernon se sentou na
borda da cama. Olhou para a agente, com um misto de
sarcasmo e satisfação, e estendeu a mão até a mesinha de
cabeceira, onde apanhou uma seringa. Preparou-a, sem
pressa e, então, ajeitou o braço de Eva na cama.
— Não se aflija — murmurou, suavemente. — Garanto
que não dói nada.
Eva não esboçou o menor gesto de reação. Manteve-se
firme e altiva, olhando para Vernon com uma expressão de
desafio em seu rosto. Sentiu a picada na veia e, passados
alguns instantes, Vernon recuou a mão.
— Pronto — murmurou ele, esfregando um pedaço de
algodão com álcool no local da fisgada. — Agora, é só
aguardar alguns instantes e logo você estará sonhando’ com
os anjinhos. Com uma dose dessas, o estado de
inconsciência deve chegar em menos de cinco minutos.
Internamente, Eva agradeceu-lhe pela informação, pois
assim poderia fingir de forma correta. Isto é, se realmente a
droga tivesse sido trocada, conforme fora prometido no
bilhete.
Os primeiros minutos se arrastaram carregados de
expectativa e tensão para Eva. Mas, como não sentiu
qualquer entorpecimento no corpo, ela começou a se
convencer que a troca fora realizada mesmo. Isso a encheu
de animação, mas procurou se conter. Qualquer falha de sua
parte, agora, iria botar tudo a perder.
Calculando que já se haviam passado mais de quatro
minutos, ela começou a piscar lentamente, para dar a
impressão de que um sono irresistível estava pesando em
suas pálpebras. Vernon, que a observava atentamente,
curvou os lábios em um imenso sorriso. Ela, então, fechou
os olhos mansamente e deixou a cabeça pender para o lado.

— 85 —
Passou a respirar em um ritmo mais lento, fingindo que
mergulhara em um sono profundo.
— Pronto — murmurou Vernon. Agora, é só esperar
uma hora e meia e teremos mais um pouco de divertimento.
Eva sentiu os dedos dele deslizarem pelo seu peito, mas
não esboçou qualquer mudança no seu comportamento.
— Ela é uma graça, não acham? — perguntou ele a seus
capangas. — Francamente, tenho que admitir agora que foi
um bom negócio ela ter escapado de Paul. Enfiar uma bala
num corpinho desses, sem mais nem menos, chega a ser até
um sacrilégio...
Seus dedos, animados com a maciez da pele quente sob
o vestido, continuaram sua lenta peregrinação.
— Acho que vou até perdoar Paul. Afinal, se não fosse
a sua mancada, eu não teria, agora, essa chance de ter nas
mãos uma coisinha tão fofa. Além do mais, ele já levou um
belo castigo pelo erro que cometeu...
— A cabeça dele está com mais pontos do que um
vestido de mulher — assinalou um dos pistoleiros, em tom
de chacota.
— Talvez, até eu dê a ele uma chance de acertar suas
contas com essa mulher — continuou Vernon, com um
toque de sadismo na voz. — Já imaginou o que será largá-
la completamente dopada e sem vontade nas mãos dele? E
o mais interessante é que essa droga não tira a consciência
da pessoa. Durante o tempo todo, ela tem conhecimento do
que está acontecendo, embora nada possa fazer...
Depois de percorrerem o peito de Eva, os dedos de
Vernon se afastaram. Então ela sentiu sua saia ser erguida
bem alto.
— Vejam só! — exclamou ele. — Isso não é uma
mulher para botar qualquer um cem a cabeça virada?

— 86 —
Houve um momento de silêncio e ele largou o vestido
de Eva. A diminuição do peso no colchão indicou a ela que
ele se levantara.
— Vamos agora — disse Vernon, para seus asseclas. —
: Daqui a uma hora e pouco, poderemos começar a
brincadeira.
— Você vai mesmo chamar Paul? — perguntou um dos
pistoleiros.
— Acho que sim.
— Bem, se ele vai ter direito...
O sujeito interrompeu a frase, mas Vernon captou o
sentido de suas palavras.
— Todos terão direito — garantiu ele, com frieza. —
Para mim, o mais importante é humilhar ao máximo essas
malditas! Cada uma que eu agarrar terá que pagar muito
bem pago tudo o que sofri nas mãos dessa organização!

***

Pouco depois que Vernon saiu acompanhado por seus


capangas, Eva se levantou e examinou o quarto. A porta
trancada e a janela gradeada fizeram-na concluir, porém,
que não haveria chance alguma para uma fuga por conta
própria. O jeito, portanto, era confiar no autor do bilhete
anônimo.
Sentada na borda da cama, esperou a lenta passagem do
tempo. Para uma mulher acostumada à ação, uma
inatividade tão prolongada chegava a ser irritante. Mas ela
procurou não se enervar. Ocupou o período de espera com
uma série de pensamentos a respeito do autor do bilhete e
do desfecho que logo chegaria para aquela farsa toda.
Quando ouviu movimentação do lado de fora do quarto,
deitou-se rapidamente e assumiu sua expressão de alguém

— 87 —
mergulhado em um profundo sono. A porta foi aberta e. a
julgar pelos passos no assoalho, pelo menos três pessoas
entraram no quarto.
— Agora, é só aplicar o segundo estágio da droga e ela
estará cm condições de participar da nossa brincadeira —
assinalou uma voz, que pertencia a Vernon.
Ele sentou-se na borda da cama e Eva sentiu uma nova
picada no braço. Tensa da cabeça aos pés, a agente da
L.E.S.B. ficou aguardando o desenrolar dos
acontecimentos, quando Vernon arrancou a agulha de seu
braço.
Passaram-se alguns segundos e a voz dele soou lenta e
persuasiva:
— Pronto, minha querida. Você agora pode acordar.
Temos uma longa conversa pela frente. Uma deliciosa
conversa, aliás...
Eva sentiu a pressão de uma mão quente em seu ventre.
Abriu os olhos, piscando lentamente, e fitou o rosto de
Vernon.
— Tudo bem? — perguntou ele, acariciando-a devagar.
A agente fez que sim, com a cabeça, enquanto
relanceava o olhar em volta. Junto à cama, dois pistoleiros
de Vernon a fitavam com a expressão de lobos famintos
diante de um cordeiro.
— Agora, vocês podem sair — ordenou ele aos dois. —
Chamem Paul lá embaixo. Depois que eu terminar com ela,
todo o mundo terá a sua chance de se divertir um pouco.
Os dois saíram imediatamente do quarto e fecharam a
porta. Vernon, então, fitou Eva dentro dos olhos. Deliciado,
deslizou os dedos por suas pernas.
— Você vai ser boazinha comigo, não é? — murmurou,
curvando-se para a frente.

— 88 —
— Tudo o que eu mandar, fará com imenso prazer.
Mesmo que no fundo de sua mente não esteja com vontade
de fazer, vai me obedecer... Essa é a regra do jogo.
Eva raciocinou ligeiro. O autor do bilhete mandara que
aguardasse os acontecimentos. Pois bem: estava sozinha
com Vernon naquele quarto e havia uma pistola junto à
cintura dele. Poderia haver melhor momento para entrar em
ação?
Antes que o sujeito pousasse os lábios em sua boca, ela
curvou rijamente os dedos da mão direita e lhe acertou um
violento golpe na região do plexo solar. Vernon arregalou
os olhos e se imobilizou, paralisado pela dor e pelo espanto.
Mais do que depressa, Eva acertou-lhe uma cutelada na
carótida e outra no pomo-de-adão. O rosto dele se contorceu
em uma expressão de profunda dor, enquanto a
inconsciência obscurecia sua mente e lhe roubava as forças.
Vernon podia ser astuto, mas fisicamente não era grande
coisa. Desfalecido, deslizou da cama para o chão.
Eva levantou-se de um salto. Curvou-se ao seu lado e
arrancou a arma que ele carregava na cintura. O contato frio
do cabo da pistola em sua mão a fez sentir um frêmito de
alegria pelo corpo inteiro. Resolutamente, caminhou na
direção da poria.
Pousou a mão na maçaneta e respirou fundo. As vozes
no corredor indicavam que iria ter uma parada dura pela
frente. Mas chegara a hora da decisão: ou tudo ou nada.
Girou a trinco e escancarou a porta. De arma em riste,
passou para o corredor. Quando os três homens a viram,
pararam de conversar e a fitaram cheios de surpresa. Um
recuperando-se mais rápido do que os outros, levou a mão
até o coldre sob o ombro: não sabia o que estava
acontecendo, mas tivera a certeza de que algo ia mal.

— 89 —
Sem a menor hesitação, Eva recheou seu corpo com
uma minúscula, mas mortífera lasca de chumbo quente.
Berrando de dor, ele se curvou para a frente e caiu de cara
no chão.
O tiro fez seus companheiros despertarem do estupor
em que haviam mergulhado. Ao mesmo tempo, levaram as
mãos até suas armas. Eva fuzilou um e, percebendo que o
outro já empunhara a arma, jogou-se para o lado. Seu
reflexo, mais uma vez, salvou-a de morte certa: não fizesse
isso e teria levado um balaço em pleno peito.
Agachada, fez pontaria e pressionou o gatilho. Como de
hábito, foi um disparo perfeito. A bala se cravou na testa do
pistoleiro e ele mergulhou para trás, já sem vida.
No momento em que ia se levantar, Eva percebeu um
vulto ao seu lado. Virou-se ligeiro, mas nem sua extrema
rapidez adiantou alguma coisa. Recebeu um violento chute
à altura do rim esquerdo. Cega de dor, perdeu o controle
sobre si mesma. A visão ficou turva e um entorpecimento
percorreu seus músculos, percebeu que lhe arrancavam o
revólver da mão e tentou reagir. O corpo, porém, não
atendeu ao comando de sua vontade.
Dedos brutais se infiltraram entre seus cabelos e a
puxaram para rima. Aos trambolhões, colocou-se de pé,
sofrendo com as lancinantes fisgadas ao longo de todo o
couro cabeludo.
— Agora, vamos acertar nossas contas, boneca.
Quando eu terminar com você, vão ter que costurá-la mais
do que me costuraram.
A voz estava carregada de um ódio insano. E pertencia
a Paul. Eva percebeu, no meio da névoa que oprimia sua
mente, que um destino negro a aguardava. Precisava reagir,
disse para si mesma. Mas como, se as forças teimavam em
abandoná-la?

— 90 —
Com uma sádica violência, Paul a arremessou na
direção da parede. Eva tentou se firmar sobre as pernas, mas
perdeu o equilíbrio e acabou se chocando na parede de
frente. Novas dores na testa e no busto aumentaram a
cortina nevoenta que embrulhava seus pensamentos.
Respirou fundo, procurando reagir, mas novamente os
dedos firmes agarraram seus cabelos.
— Gostou? — perguntou Paul, com uma insana alegria.
— Pois terá mais. Muito mais...
Eva sentiu a mão de Paul se retesar entre seus cabelos,
pronta para arremessá-la para a frente. Mas a promessa de
novas dores não se concretizou. Ecoou um disparo, no
silêncio do corredor, e os dedos do grandalhão se
afrouxaram e largaram os seus cabelos.
Ela se apoiou na parede e relanceou o olhar para trás.
Paul acabara de se estatelar no chão, estremecendo ao
compasso de espasmos característicos da chegada de uma
morte violenta.
— Você está bem? — perguntou uma voz feminina.
Eva girou mais a cabeça e deparou com uma Louise
sorridente, caminhando na sua direção. Com dificuldade,
respondeu que sim e se encostou na parede. Respirou fundo
várias vezes, para recuperar o autodomínio, e, quando a
névoa começou a abandonar sua mente, sorriu para Louise,
que parara à sua frente.
Quer dizer que foi você quem escreveu aquele bilhete...
— murmurou, lentamente.
— Exato. As doses deste soro da verdade têm uma
duração incerta. Na confusão dos últimos acontecimentos,
Vernon se esqueceu de renovar minha dose. Ou calculou
errado a duração da anterior... Bem, o fato é que há três
horas atrás, mais ou menos, recuperei minha lucidez. Mas
nada pude fazer, cercada por esses gorilões todos. Botei

— 91 —
aquele bilhete no seu quarto e troquei as ampolas de soro
por simples injeções contra resfriado, que Vernon comprou
para ele. E fiquei aguardando uma chance... — Ela sorriu,
suavemente. — Acho que tivemos a idéia de entrar em ação
ao mesmo tempo.
Mal dominei os dois sujeitos que estavam lá embaixo e
subi para cá, você já estava botando pra quebrar.
— O importante é que conseguimos acabar com esse
pesadelo — retrucou Eva, devagar.
— Tem razão — concordou Louise.
— Talvez vocês estejam um tanto equivocadas! —
berrou uma voz trêmula. — Não é tão fácil assim me
derrotar!
Ambas giraram na cabeça e depararam com Vernon
saindo do quarto onde Eva estivera presa. Ele caminhava
com passos pouco firmes, trazia uma pistola na mão S seu
olhar brilhava com uma expressão de quase demência.
— A L.E.S.B. jamais me derrotará! — exclamou ele. —
Eu é que vou destruir todas vocês!
Antes que ele disparasse sua arma, Louise ergueu a mão
direita e apertou o gatilho de sua pistola. Foi um disparo
perfeito. Vernon estremeceu da cabeça aos pés e escorou o
ombro na parede, para não cair. Baixou a mão direita,
enquanto uma mancha rubra se alastrava em seu peito, e
fitou Louise com uma expressão de desespero.
Eva notou o rosto da agente se crispar. Novamente,
Louise apertou o gatilho de sua pistola. Vernon estremeceu
de novo e começou a deslizar para o chão, esfregando os
ombros na parede. Louise, contudo, continuou a disparar.
Observando suas feições vincadas pelo ódio, Eva
compreendeu que o desejo de se vingar das humilhações
sofridas a dominara por completo.

— 92 —
Louise continuou atirando, mesmo depois que Vernon
se estatelou no chão, totalmente imóvel. Só parou mesmo
quando um estalido seco indicou que esvaziara o pente de
balas de sua arma.
Então, jogou a pistola para o lado e fitou o corpo
ensanguentado de Vernon com um olhar de desprezo:
— Esse não fará mal a mais ninguém. Nem mesmo a
uma mosca.

— 93 —
EPÍLOGO
Depois de um longo banho, que deixou sua pele mais
macia e perfumada, Eva começou a se vestir.
Cuidadosamente, escolheu, uma roupa que realçava seus
inúmeros encantos. Observou o resultado no espelho e,
satisfeita, apanhou sua bolsa. Saiu de seu apartamento e
desceu direto à garagem, onde guardava o carro.
Sentia-se alegre e de bem com a vida. Naquela manhã,
estivera na L.E.S.B. e pudera constatar que tudo voltara ao
normal. Louise retomara às suas atividades e Maggie Doyle
a recebera com a serenidade costumeira. O pesadelo que
Vernon representara para a organização já começava a ser
encarado como coisa do passado. Quanto ao soro da
verdade, recuperado no casarão onde ele morrera com seus
pistoleiros, estava guardado no cofre particular de Maggie
Doyle. Sua fórmula desaparecera com a morte do cientista
assassinado por Vernon e ele talvez nunca mais saísse dali.

— 94 —
Aliás, conforme Maggie confessara a Eva, possivelmente
iria ser destruído, dado o seu alto grau de periculosidade.
Sem pressa, Eva percorreu as ruas de Nova Iorque,
Estacionou junto a um edifício de apartamentos, não muito
distante do “St. Paul Hospital”. Subiu no elevador até o
quarto andar e se encaminhou até a porta localizada na
extremidade do corredor. Tocou a campainha. Um Doutor
Rice ligeiramente ressabiado a atendeu.
— Não vai me convidar a entrar? — perguntou Eva,
sorrindo, quando percebeu a hesitação dele.
O médico a deixou entrar em seu apartamento e fechou
a porta. Lentamente, então, aproximou-se da poltrona onde
ela se sentou.
— O que você deseja? — perguntou, parando à sua
frente.
Eva fez uma carinha de angústia:
— Estou me sentindo tensa e nervosa. Acho que só boas
massagens podem resolver o meu problema. — E,
pousando a mão na parte superior da coxa, concluiu: —
Aquela dor provocada pelo meu antigo ferimento também
voltou a se manifestar.
Rice observou suas belas pernas cruzadas e o busto
ansioso em saltar por cima do amplo decote.
— Não costumo atender pacientes rebeldes —
murmurou, com um sorriso no canto dos lábios.
— Prometo que dessa vez me comporto direitinho.
Estou com o dia todo livre.
— Então, nada de agressões?
— Nada de agressões — garantiu Eva. meigamente.
Rice contornou a poltrona e se colocou atrás dela.
Estendeu as mãos e começou a massagear suas têmporas.
Eva segurou seus dedos e os puxou para baixo, forçando-os
a se fechar ao redor da curva de seu busto.

— 95 —
— Acho que podemos deixar de lado esse estágio
inicial, doutor — sussurrou, com brandura.

FIM

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