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WATHALIA BUTT matematico Nuno Crato, 61 anos, B notabitizou-se por divulgar e tra- q duzir para o cotidiano os grandes DF ‘eoremas e equagdes — trabalho que 0 fez merecedor do cobigado Euro- pean Science Award, em 2008. Ha dois anos como ministro da Educagao e da Ciencia em Portugal, ele comanda hoje uma radical reforma no ensino que se baseia em metas, avaliagdes e mérito. Mesmo antes, Crato era figura conhe- ida e muito discutida por seus colegas da educaco. E do ministro 0 livro 0 “Eduqués” em Discurso Direto: uma Critica da Pedagogia Romdntica ¢ Construtivista — em que disseminou 0 termo “eduqués” para se referir & lin- guagem empolada e vazia adotada por uma ala de educadores. Lisboeta que adora o Brasil. Crato falou a VEJA em uma de suas visitas ao pats. 0 senhor provocou debate acirrado en- ‘re educadores do mundo todo a0 afir mar que a escola moderna é vitima do “eduqués”. Por que o assunto causou tanto barulho? Minha critica bate de frente com uma linha muito celebrada nas escolas de hoje. E uma corrente que dé énfase excessiva as atitudes € & formagio civica do aluno e deixa em segundo plano 0 conhecimento pro- priamente dito. Pergunto: como inves- tir em formacao civica se 0 estudante ndo consegue nem ler 0 jomal? Vejo varios educadores por ai se perdendo em uma linguagem hermeética, dubia e Fasc) demagégica — que ¢ 0 mais puro Tt “eduqués” — para falar sobre seus ob- eT Sa) jetivos difusos para a sala de aula. Es- Suma nao sé essa como acca AES ttre do padsasio péra Comte Sear préticas na educacto que jé tiveram La Sy sua eficiéncia amplamente atestada = pela ciéncia. Alguns me acusam ETO NS eT) de ser insensivel ao dizer tais coisas, - Te ‘mas sou um entusiasta do saber cienti- fico e desprezd-lo, a meu ver, 6 prejudica o ensino. Cee ae Vole | SDEIUNHO, 2 Entrevista NUNO CRATO ‘Quais boas praticas exatamente essa ala de educadores rejeita? Muitos batem na tecla de que prova faz mal. Acham que ela submete o aluno a um alto grau de stress, sem necessidade. Vao af na con- tramfo do que afirmam 0s grandes pes- quisadores. Eles jd sabem que, ao ser questionada e posta a refletir sobre um contetido, a crianga consegue absorvé-lo melhor, avangando no conhecimento. ‘Também a disciplina é um ponto em ‘que a condescendéncia e a leitura envie~ sada de velhas teorias ofuscam a raza. Esse grupo de educadores admite que 0 aluno pode ser no méximo incentivado a respeitar a ordem na sala de aula, mas rnunca, sob nenhuma hipstese, ele deve ser forcado a fazer isso. Nesse caso, no € preciso de muita ciéncia para saber que 0 resultado final sera muita bagunga € pouco aprendizado. No Brasil, mais da metade das escolas se define como constnutivista. Isso é bom ou ruim? Antes de tudo, é bom es- clarecer que, embora muita gente nao saiba, 0 construtivismo de hoje é uma interpretacdo livre da teoria sobre 0 aprendizado lancada pelo psicslogo Jean Piaget hd um século. Para mim, sua vertente mais radical € um equivo- co pedagégico completo. Ela se baseia na ideia de que o professor no passa de um mero “facilitador” do aprendiza do — esse um termo muito em voga na linha politicamente correta. Soa bonito, mas € prejudicial ao ensino por derru- bar pilares fundamentais. (Quais s3o esses pilares? Um mestre tem dever de transmitir a seus alunos os ccontetidos nos quais se graduou. E, sim, precisa ter objetivos bem claros e defini- dos sobre 0 que vai ensinar. E ingénuo achar que 0 estudante vai descobrir tudo por si mesmo e ao seu ritmo, quando Julgar interessante. Quem de bom-senso tem diivida de que, se a crianga puder esperar a hora que bem Ihe apetecer pa- Ta mergulhar num assunto, talvez isso nunca acontega? ‘A neurociéncia vem mapeando os cami- tnhos que a informacdo percorre no cére- ‘bro de uma crianca até ser assimilada. As 20] SDEJUNHO.2013 | velS escolas jd comegaram a fazer uso desse ‘conhecimento? Infelizmente. a grande maioria passa ao largo dessas descober- tas, E isso as mantém congeladas no tempo, aferradas a pensamentos anacro- nicos. A neurociéncia descobriu que € possivel acelerar, e muito, o aprendiza- do de uma crianga a base de incentivos permanentes. Isso tromba de frente com 0s principais postulados de Piag. Ele acreditava que 0 processo de reten- ‘¢40 de conhecimentos se dava por eta- [pas muito bem definidas, divididas se- ‘gundo as faixas etérias. Muitas escolas ainda se fiam nisso e perdem grandes ‘oportunidades de fazer seus alunos dis- pararem. Outro problema comum & a demonizagio da decoreba por essas cor- Tentes que se autoproclamam modemnas. ‘A memorizacio nao € descartavel como querem fazer parecer. Em que medida a memorizacdo pode ser til? Embora o construtivismo ingénuo pregue que a memorizacao prejudica a ‘compreensao, 0s cientistas afirmam o contrério — que ela € essencial a0 aprendizado. Isso porque tem o papel de automatizar certos raciocinios, ajudando Jjustamente a fazer pensar melhor sobre uestdes mais relevantes e complexas. Numa operagto basica de soma ou de subtrago, por exemplo, a crianga nao precisa a cada nova conta parar para re fletir sobre por que passa 0 nimero 1 para cé ou para Id. Seria um desperdici de energia valiosa, que pode ser bem despendida nos desafios que verdadeir mente interessam. Afinal, 0 que deve ser memorizado por uma erianga? E importante decorar a tabuada, 0 nome e a localizacao de ce tos rios e cidades e as datas mais im- portantes no curso da historia, ainda ue elas nao sejam precisas. Nao ha como 0 estudante nao saber. no mit mo, que a independéncia do Brasil aconteceu no século XIX ou que Aris. 1teles viveu antes de César, Se ele se recusa a ter esses marcos basicos na cabeca e acha que pode sempre asso- ciar 0s fatos para chegar a uma respos la, estd perdido. A experiéncia deixa claro que uma pessoa passa a fazer co exes cognitivas de muito mais quali dade e valor quando jé detém um bom repertério de conhecimentos elementa res, Nao € preciso relacioné-los com 0 Universo todo o tempo inteiro. Um pensamento muito em voga nas escolas modernas é 0 de que a crianca 86 aprende de verdade aquilo de que ela realmente gosta. 0 senhor concorda Esse € um pensamento limitado. Veja caso da leitura. Muitos educadores acham que para ler bem a crianca pre- cisa, antes de qualquer coisa, ser des- pertada para o gosto pela literatura. Sé assim ela lerd muito € ganharé fluencis dizem. A neurociéncia lanca uma luz interessante sobre essa questo, colo- cando-a exatamente ao avesso, Ela ‘mostra que ter fluéncia na decodifica- (edo dos grafemas é crucial para ler ‘bem. Em resumo: tem de se ler muito, ‘mesmo sem gostar. O treino precisa se permanente, exaustivo. Quanto mais automitica se tomar a leitura, mais chances ela terd de ser prazerosa. (© senhor se notabilizou pela divulgacao ja matematica, a mais temida e odiada todas as disciplinas escolares. Que cami- tnhos sugere para torné-la mais atraente? A formula que eu defendo nao tem nad de mirabolante. A maior parte dos estu- dantes repudia a matemiética porque no consegue ultrapassar os obstéculos que ela vai colocando pelo caminho. Eles ‘Jo entendem bem os conceitos, mas, ainda assim. o professor faz com que avancem na matéria. Assim, deficiéncias celementares acabam ficando para tris. E ‘uma bola de neve. Numa disciplina co- ‘mo historia, mesmo sem ter assimilado toda a narrativa sobre a colonizacao no Brasil, 0 aluno pode se embrenhar pelo ‘capftulo da Revolueao Industrial na tn sglaterra. Mas na matemitica nao € pos- ‘ivel progredir sobre uma base frdgil ¢ ccheia de lacunas. Nessa dea, 0 conheci- mento € cumulativo — um depende do ‘outro. Sem dominar a aritmética, no dé para passar & trigonometria. Se isso acontecer, ¢ acontece muito, 0 estudo vai se tomar improdutivo e frustrante. (0 que falta entéo para um bom ensino da matemética? Organizacio do contetido por parte dos professores e muito treino do lado dos alunos. O ensino deve ser progressivo, sem pular etapas e sempre Teforgando 0 mais basico. Se for preci- 0, que se volte ao inicio. As socieda- des hoje frequentemente no valorizam © conhecimento rigoroso, aquele que exige método, empenho e exercicio pa- ra ser bem sedimentado. Acham que as criangas vao acabar aprendendo mate- ‘mética por osmose. Mas elas no aprendem. AS avaliagdes costumam ser mpiedosas ao escancarar as deficién- cias. Na maioria das disciplinas, 0 alu- no pode chegar & resposta certa por aproximago, mas na matemética € di- ferente. Nao canso de repetir que tam- ‘bém os pais tém um papel importante af, No lugar de enfatizar a aversio aos ‘niimeros, eles devem, isto sim, reforcar a ideia de que a matematica ¢ essencial para o crescimento de qualquer pessoa em qualquer drea. Também podem falar 205 filhos sobre a importancia do esfor- 0 e do treino mental. Enfim, devem ‘ajudar a consolidar em casa 0 valor © 0 habito do estudo. Curriculos muito detathades costumam ‘suscitar resisténcias por parte de educa dores que se dizem tolhidos em sua liber- 60s alunos sao diferentes entre sie por isso devem ser tratados de forma diferenciada. A utopia do igualitarismo, essa que muitos na educa¢ao defendem, so seria possivel num tinico e nao desejavel cenario — aquele em que todos sao mediocres®® dade de ensinar. 0 senhor concorda? ‘Sempre aparece uma turma para empu- nhar a bandeira da liberdade do aluno, dizendo que ele deve aprender sem as amarras de um curriculo. Esse pessoal sustenta ainda que os curriculos sao um. Timitador da aula porque podam as asas do professor. Felizmente, em Portugal, ‘do uma minoria. E verdade que, as ve- es, 0 didlogo fica duro com os sindica- tos. Reconheco seu papel de brigar por melhorias para sua prdpria classe, mas rem sempre eles tém colocado as ques- es fundamentais e inadidveis do ensi- ‘no a frente das outras que pouco interes- sam a sociedade. Que resultados a implantacao da politica de reconhecer e premiar as melhores ¢s- ccolas tem alcancado em seu pais? As ‘boas escolas recebem mao de obra extra ‘de qualidade para que ajudem a consoli- dar 0 ensino de alto nivel. Essas escolas ‘conseguem assim dar reforgo a alunos ‘com mais dificuldade ¢ apoiar os que ‘esto prontos para evoluir em um pata- ‘mar mais avangado. Sim, os alunos so diferentes entre si e por isso mesmo de- ‘vem ser tratados de forma diferenciada. A titopia do igualitarismo, essa que muitos na educacdo defendem, s6 seria possfvel num tinico e niio desejvel ce- nério — aquele em que todos so me- diocres. Esse é ainda um tabu. Dizer ‘que uma crianca precisa de um apoio especial ndo significa que ela serd ex- cluida. Num outro espectto, 0s étimos alunos também nao devem ser escondi- dos, mas, sim, radicalmente incentiva- dos a seguir em frente. E um fundamen- to basico da meritocracia, de eficiéncia pprovada no setor privado. ‘Que principios empresariais uma escola poderia adotar? Toda escola publica de- veria poder escother quem contrata e quem demite, com base no mérito. E 0 ue planejo para os préximos anos em Portugal. Visto como um todo, o mode- lo de gestio da educacio do século XX! ainda faz lembrar muito o velho sistema soviético, em que um comité central concentra todas as decis6es. As escolas publicas precisam de mais autonomia para atrair os melhores cérebros e avan- gar mais rapidamente. ‘falta de dinheiro & sempre citada como ‘um fator que impede a methoria do ensi- ‘no. 0 senhor concorda? Acho que nossos desafios dependem menos de dinheiro e ‘mais de objetivos claros, ambiciosos € de organizacio. Para avangarmos, precisa- ‘mos formar mais e mais engenheiros, médicos e cientistas. As criangas devem ser despertadas desde cedo para 0 inte- Tesse por essas dreas. Nao sera a base do velho e empolado “eduqués” que conse- guiremos dar o grande salto. Portugal ocupa apenas 0 27° lugar entre (05 65 paises do ranking mundial de ensi- no da OCDE. Qual é a estratégia para me- Ihorar? As escolas portuguesas sempre se basearam em recomendacdes peda- gogicas mais gerais e amplas do que propriamente em objetivos claros ¢ or- ganizados. Estou mexendo justamente af, ao sistematizar metas de aprendizado ano a ano, matéria a matéria, no detalhe. Ter metas para a sala de aula é crucial para orientar ndo s6 os professores co- mo também os préprios pais. Sim, por- que, bem informados sobre os objetivos da escola, eles podem ir Id cobrar se um determinado contexido foi mal dado ou ficou para tris. . ‘veja | SDETENHO, 2013 | 21

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