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Palmada Pedagógica

Bater não educa. O debate em torno desta afirmação gera polêmica. Apesar dos
conflitos entre pais e educadores, especialistas se mostram a favor do diálogo e
afirmam que qualquer tipo de agressão pode ser prejudicial para o
desenvolvimento psicossocial

Marcelo Jucá

O projeto de lei que colocou mais


lenha nesta fogueira não é recente.
Apresentado formalmente pela
primeira vez em 2003, a deputada
Maria do Rosário (PT/RS) discutia a
punição e a proibição ao castigo
físico em crianças e adolescentes.
Como consta no documento oficial
(disponível na Internet), o projeto de
lei n. 2.654, "Dispõe sobre a
alteração da Lei no 8.069, de 13 de
julho de 1990, o Estatuto da Criança
e do Adolescente, e da Lei no
10.406, de 10 de janeiro de 2001, o
Novo Código Civil, estabelecendo o
direito da criança e do adolescente a
não serem submetidos a qualquer
forma de punição corporal, mediante
a adoção de castigos moderados ou
imoderados, sob a alegação de
quaisquer propósitos, ainda que
pedagógicos, e dá outras
providências".
A discussão em torno da lei ganhou força no último mês, promovendo mais uma
terapia em grupo do que a análise simples, séria e objetiva da "palmada
pedagógica", termo frequentemente usado - com complemento de sorriso no rosto
- para não comprometer o ato da agressão.
Assim, de supetão, vem a surpresa e uma imposição que, tal como na agressão
discutida, causa estranhamento e revolta, por mais que os motivos alegados sejam
politicamente corretos.

Cultura enraizada
No inconsciente coletivo de uma geração, a lembrança é de uma régua castigando
a mão solitária na sala de aula. A punição ganhou palmatória com mães, e mais
frequentemente os meios de comunicação retratam o absurdo espancamento
cometido por babás e empregadas do lar, inclusive em bebês com menos de um
ano. O "limite", até onde seja possível nomear esta falta de moderação, ultrapassa
cada vez mais a linha moral e do bom senso dentro e fora dos lares brasileiros.
Quais são os motivos que incentivam um, aparentemente, simples beliscão ou o
tapa selvagem que arranca sangue da "boca maldita"?
Afinal, bater é uma forma incomprendida de mostrar à criança a realidade ou a
conversa é o melhor negócio? Os entrevistados desta reportagem encontram um
denominador comum: "bater não educa". Até o presidente Luiz Inácio da Silva
declarou ser favorável à proibição da violência domestica. As respostas e o
burburinho geram então a questão. Por que essa "educação" faz parte de nossa
cultura?
A psicóloga Daniela Pedroso afirma que sempre faltou instrução educacional às
famílias brasileiras. "Talvez muitos pais façam uso do castigo físico simplesmente
por não terem acesso a formas eficazes de educação e imposição de limites em
seus filhos, pois muitas vezes desconhecem outras formas de criação de
disciplina", explica.
Há algumas gerações, acreditava-se que a violência era uma forma de punir o
erro. Daniela, especialista em saúde materno-infantil e violência sexual, conta: "A
punição física foi fortemente utilizada até o início do século XX, fazendo parte do
processo educacional, tanto em casa como nas escolas, sendo minimizada a partir
da inclusão de novos conceitos psico-pedagógicos, deixando de ser usada nas
escolas e passando a ser menos frequente nos lares."

Direitos da criança
♦ Em 13 de julho de 2010, o ECA completou 20 anos de
atuação. Com a missão de garantir os direitos básicos das
crianças, como saúde, alimentação e o lar, o Estatuto é um
exemplo a ser seguido. Os cuidados com os direitos das
crianças foram instaurados na Suécia, em 1979. Outros
países europeus seguem o modelo, enquanto na América
Latina, somente Uruguai e Venezuela contam com leis
nesse sentido. O Brasil, simplesmente, promete...

Roda-viva
O Brasil é muito atrasado e a ignorância de
seu povo confirma isso. E é fácil se chegar a
esta conclusão. Como pessoas e famílias,
totalmente isoladas das discussões e
problemas do mundo, vão filosofar e concluir
que o diálogo, a comunicação e a paciência
com as crianças pode ser uma forma mais Está inserida no inconsciente coletivo a
imagem da palmatória usada antigamente.
Aa mídia propulsiona a propagação desta
imagem, relatando os espancamentos
cometidos nos lares contra crianças e
bebês
harmônica de se contornar o problema?
O maior problema é sobreviver diariamente, embaixo de sol ou de chuva, em
terras secas ou inundadas, passar fome e frio. Em muitos lugares, não há tempo
para a infância. Quem é pequeno tem que deixar de ser. E rápido! A palmada é só
um ensaio de como será o restante da vida. A reflexão é convidativa. É exigir
demais de um país tão atrasado como o Brasil, de uma megalópole como São
Paulo onde ainda não há esgoto para todos.
O exemplo é pertinente. Pela inconcebível situação de se viver entre excrementos,
é que a sociedade começou a funcionar como tal. No redemoinho familiar, se a
palmada funcionou, qual a razão de não fazer isso com o próprio filho?

Ação e efeito
O problema da violência doméstica é a geração de novas violências. A criança,
traumatizada, pode tornar-se uma pessoa agressiva. E por mais que consiga, a
princípio, superar as dores, suas cicatrizes poderão fazer pares nos filhos, ou
mesmo extraviar a raiva contida em outras situações que em algum momento o
prejudicarão também.
A psicóloga Daniela Ribeiro observa que "é possível afirmar que pais com níveis
de escolaridade mais baixa pratiquem mais a punição física por se tratar de um
modelo introjetado da educação por eles recebida, além do fato de terem menos
acesso a outras formas educacionais e disciplinares."
Estudos ainda apontam que grande parte dos atos de violência doméstica são
cometidos pelas mulheres, pelas mães, pois são elas ainda as grandes
responsáveis por acompanhar o crescimento das crianças e que se frustram ao
tentar educá-las. Não há, porém, uma diferença visível nos números entre meninos
e meninas que apanharam.
A questão a se pensar é que em muitos casos, os castigos corporais acontecem
por coisas pequenas. Sim, crianças quebrarão vasos na casa, falarão o que era
segredo para a vizinha e muitos verbos de ação ainda serão conjugados. Assim
como adolescentes vão experimentar um cigarro, tomarão um porre e vão tirar
nota vermelha na escola. "Crianças apanham por diversas razões, mas o mais
comum são em situações associadas à desobediência das normas de convívio
social estabelecidas pelos pais", afirma outra psicóloga, Daniela Pedroso. O que
os pais devem entender é que essas atitudes são saudáveis e naturais. Claro,
deve sim haver um limite para tudo, mas o diálogo ainda é mais interessante do
que a agressão física, pois por um lado, a criança - em forma de desafio - repetirá
em maior gênero, número e grau a ação castigada, ou por outro, será infeliz e não
se dará ao direito de conhecer as coisas boas e ruins da vida.

Explicação científica
A neurociência pode esclarecer algumas características consideradas normais no
comportamento dos filhos. Segundo o neurocientista Richard Destak, no livro
Mente Saudável, Mente Brilhante: "Boa parte do comportamento 'imaturo' típico da
adolescência, por exemplo, resulta da imaturidade do córtex pré-frontal
adolescente. A boa notícia é que, com o tempo, o julgamento, o autocontrole e
outras funções do lobo frontal melhorarão" (veja quadro Rebeldia natural). Destak
explica mais um aspecto sobre o cérebro adolescente: "ele não lida muito bem
com o estresse. Tipicamente, o estresse num adulto causa uma elevação nos
níveis de cortisol, seguida de um decréscimo gradual ao longo de uma hora ou
duas."

"Em muitos lugares do Brasil, não há tempo para a infância!


Quem é pequeno tem que deixar de ser.
A palmada é só um ensaio de como será o restante da vida"

O neurocientista escreve que "em adolescentes, esse fluxo de cortisol permanece


por muito mais tempo e resulta em exposição do cérebro a efeitos danosos, como
encolhimento das células do hipocampo - que causa perda de memória e
depressão - e na amígdala - que resulta em ansiedade e outras emoções
opressivas. Isso tem consequências, pois especialistas em saúde mental ligam o
estresse adolescente a problemas comportamentais e emocionais de adulto."
Esse é um ponto a ser analisado. A palmada "corretiva" pode gerar estresse e não
causar o efeito pretendido pelos pais: a reflexão dos filhos sobre a ato cometido.
Ao contrário, como forma de desafio, pode haver a repetição do erro.

Anti-Esparta
♦ A Grécia Antiga, raiz da história social, sempre oferece, como
base de pesquisa, relatos e curiosidades das leis e da cultura
do homem. Antigamente, a punição corporal era algo comum, e
não significava uma transgressão das regras morais do povo.
Os meninos espartanos, por exemplo, a partir dos sete anos,
eram encaminhados para o treinamento de guerra, entre
espancamentos e exercícios físicos a fim de alcançar a forma
física ideal.

O Contraponto...
Toda a história tem um "mas", e com essa não podia ser diferente. Apesar de
grande parte da população se mostrar a favor da lei, vozes ainda um pouco
abafadas também apontam que esse burburinho todo esconde e deixa de lado
outras questões.
O psicanalista Ernesto Duvidovich afirma: "Eu sou um profissional totalmente
contra esta lei". Para Ernesto, que também é diretor do Centro de Estudos
Psicanalíticos (CEP), a lei comete um erro no momento em que o Estado tenta
legislar o íntimo humano e sua subjetividade. "Ao contrário de assumir a função
paterna, faz exatamente o oposto, violentando a mãe e o pai, excluindo o direito
deles como família". Que fique claro, o psicanalista se mostrou contra a violência
gratuita, e o que ele põe em questão são os "limites" que foram abandonados.
"Esta lei é abusiva tentando cuidar de forma pública o íntimo de cada um", conclui.

Especialistas afirmam ser normal alguns comportamentos infantis


e adolescentes, afinal, nessa idade o juízo e o senso moral ainda
estão se definindo. Para eles, no caso de punição física por
desobediência, a criança, como desafio, tenderá a repetir a ação
castigada

Para o professor titular de Ética e Filosofia Política da USP, Renato Janine Ribeiro
existe de fato uma violência contra as crianças que deve ser limitada, mas ele não
crê que a via criminal e punitiva seja muito eficiente no sentido de promover
mudanças de conduta, conciliação e reconciliação. "Além disso, num país em que
são tantas as crianças abandonadas, que ninguém adota, oque faremos com
aquelas que a lei for proteger? Irão para a Fundação Casa?", reflete o filósofo.
A imprensa também tem servido como canal de desabafo de observadores de
nossa cultura. O psicanalista Contardo Calligaris escreveu em sua coluna na Folha
de S.Paulo, que se tivesse sido consultado na pesquisa, provavelmente se teria
declarado contra a nova lei, por duas razões. "A primeira (e menos relevante) é
que existem violências contra crianças piores do que a violência física". E
segundo, "é que a nova lei não surge num contexto em que os pais teriam poder
absoluto sobre o corpo dos filhos."
O psicanalista conclui com sua visão crítica. "Sou absolutamente contra qualquer
castigo físico. Sou também contra a extensão do poder do Estado no campo da
vida privada, por temperamento anárquico e porque sou convencido que, neste
campo, as famílias erram muito, mas o Estado, quase sempre, erra mais."

"A lei comete um erro no momento em que o Estado


tenta legislar o íntimo humano e sua subjetividade"

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